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Revista Mente & Cérebro #282 - Alzheimer

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TECNOLOGIA 
Buscas na internet revelam 
interesse de idosos por sexo 
CORPO 
Traços psicológicos que 
fazem um campeão olímpico 
ESTUPRO 
Como lógicas psíquicas e 
sociais "autorizam" a violência 
O que a ciência 
sabe sobre o 
tipo mais comum 
de demência e 
as maneiras de 
preveni-la 
N E U R O E D U C A Ç Ã O l 
NEUROCIÊNCIA • PSICOLOGIA • PEDAGOGIA 
ESPECIAL 
E D U C A Ç Ã O 
I N F A N T I L 
O q u e é u m a 
b o a c r e c h e ? 
O c é r e b r o 
d a s c r i a n ç a s 
E s p a ç o p a r a 
a i m a g i n a ç ã o 
COGNIÇÃO 
A relação entre 
emoção e 
aprendizagem 
DICASA DA NEUROCIÊNCIA 
p a r a a s a l a d e a u l a 
Conheça estratégias fundamentadas 
na psicologia cognitiva e na 
neuropsicologia que podem aprimorar 
(e muito) o trabalho do professor 
CÉREBRO EM FORMA: Exercícios físicos melhoram o desempenho dos alunos 
A neurociência tem feito descobertas importantes 
sobre os processos cerebrais envolvidos na aprendizagem. 
A sétima edição de NeuroEducação detalha e apresenta o significado 
dessas pesquisas e como elas podem ser aplicadas em sala de aula. NEUROEDUCAÇÃO _ _ _ i — Instituto ( FIESC r s 
MEUROCIÊNCIA • PSICOLOGIA • P F. D A G O C I A 
segmento 
www.lojasegmento. „om.br 
^ carta da editora Na corrida contra a demência 
lorte daqueles que 
não têm de mor-
d e r " , diz um pro-
vérbio t ibetano que volta 
e meia me v e m à cabeça. A 
frase - l igeiramente irónica, 
já que a finitude é inevitável 
- t em como contexto a cren-
ça na lei de causas e conse-
quênc ias , segundo a qual 
teremos de nos haver com as reper-
cussões de nossos atos, intenções e palavras -
nesta ou e m outras existências. E não porque tenhamos 
de ser cast igados , mas s im porque prevalece a ideia de 
que nada nos acontece sem que, em algum momento , te-
nhamos cr iado as causas para isso. Fazendo uma releitu-
ra do ditado oriental , tomo a liberdade de dizer ter íamos 
sorte se não t i véssemos de envelhecer. Esse desfecho não 
é inevitável, c laro, mas a alternativa t ambém não parece 
nada atraente. Na maioria absoluta, ans iamos pela v ida . 
O problema é que com o aumento dessa expectativa che-
gam t a m b é m os " m a l e s " dos desgastes impostos pelo 
tempo. A demênc ia , que nos rouba de nós m e s m o s , tal-
vez seja u m dos mais temidos . 
O ma i s prevalente desses quadros , é a doença de 
A lzhe imer . A patologia pode ter evolu ído concomi tan-
temente c o m a intel igência h u m a n a . E m artigo publi-
cado há a l g u m a s s e m a n a s no per iódico científ ico bioR-
x/V, c ient i s tas a f i rmaram ter encontrado ev idênc ias de 
que há entre 50 mi l e 200 mil anos a se leção natural 
impu l s ionou m u d a n ç a s em seis genes envolv idos no 
desenvo lv imento cerebra l , o que pode ter contr ibu ído 
para aumenta r a conect iv idade neurona l , to rnando os 
h u m a n o s mode rnos ma i s intel igentes à medida que 
evo lu í ram de seus ancest ra i s homin ídeos . E s sa nova 
capac idade inte lectua l , p o r é m , não veio s e m cus to : os 
g m e s m o s genes estão imp l i cados no A lzhe imer . O ge-
| net ic ista Kun Tang , do Inst i tuto de C iênc ias B io lógicas 
1 de Xanga i , na C h i n a , que l iderou a pesqu i sa , especu la 
•. • . • . . 
que o d is túrb io de memór i a se desenvo lveu à med ida 
que cérebros e m processo de enve lhec imento lu tavam 
c o m novas d e m a n d a s metaból icas impos ta s pela cres-
cente inte l igência . 
Mas essa é só uma parte da história: se a capacidade 
de aprender e memor izar nos penaliza, é ela t ambém que 
acena com a possibil idade de afastar a manifestação do 
Alzheimer, às vezes por vários anos ou até por toda a v ida . 
Nesta edição, o neurocientista David A. Bennett , diretor 
do Centro Rush da Doença de Alzheimer em Chicago, um 
dos mais renomados pesquisadores na área, revela uma 
descoberta surpreendente: pessoas com a m e s m a condi-
ção cerebral podem apresentar estado mental completa-
mente diferente, enquanto uma perde a memór ia , outra 
se mostra lúcida e capaz. O u seja, mais importante do 
que o estado físico dos tecidos, é o uso que se faz deles, 
apesar dos danos . 
Para ganhar a corr ida contra a demênc ia , duas a rmas 
são fundamenta i s : afeto e exercício intelectual . Apostar 
no que faz bem, manter pessoas quer idas por perto, 
cult ivar relações de int imidade, cuidar de an ima i s e se 
divertir, mov imentar o corpo, passear, falar ma i s de u m 
id ioma e aprender coisas contribui para postergar o sur-
gimento do A lzhe imer e d iminui r o número de anos que 
se passa doente no f im da v ida . Cur iosamente , parece 
que a prevenção está justamente no que tende a nos tor-
nar ma is fe l izes . Boa leitura! 
G L Á U C I A LEAL , editora-chefe 
glaucialeal@editorasegmento.com.br 
^ sumário | julho 2016 capa 
20 Criando reservas para resistir ao Alzheimer 
por David A. Bennett 
Por que algumas pessoas desenvolvem sintomas de 
demência e outras não, embora tenham o mesmo nível de 
lesão? A genética influi, mas não é sempre determinante. A 
ciência tem pistas úteis sobre como evitar a demência 32 Quando a demência chega mais cedo 
por Gary Stix 
O acompanhamento de um grupo de famílias colombianas 
com mutação genética rara pode ser a esperança de 
encontrar formas eficientes de prevenção 
14 A violência de todos nós 
por Susana Muszkat 
A marca do estupro é o submetimento 
do corpo alheio, o que subtrai do outro sua 
condição de sujeito, transformando-o em 
um corpo-objeto sem alma 18 A geração da tela sensível ao toque 
por David Pogue 
Dispositivos móveis prejudicam o desenvolvimento 
das crianças? Estudos ainda são recentes, mas 
há comprovação de que de fato há riscos -
e também benefícios 42 Quase todos do mesmo lado 
por Sandra Upson 
Com que mão você escreve? A pressão social em 
prol da homogeneidade pode explicar por que há seis 
vezes mais pessoas destras do que canhotas 
60 
A cabeça dos superatletas 
por Rachel Nuwer 
Características psicológicas são importantes para 
obter ótimos resultados; determinação, persistência 
e até traumas estão associados ao desempenho Sim, vovó também se interessa por sexo 
Falar sobre o tema pode ser tabu para idosos e 
até para os profissionais que cuidam deles, mas a 
internet pode ajudar a desmistif icar o assunto 
4 
seçoes 
CARTA DA ED ITORA 
PALAVRA D O LE ITOR 
8 
A S S O C I A Ç Ã O LIVRE 
Notas sobre atualidades, 
psicologia e psicanálise 
1 1 
NA REDE 
O que há para ver e ler na internet 
5 2 / 6 2 
N E U R O C I R C U I T O 
Novidades nas áreas de 
psicologia e neurociência 
5 4 
PS ICOLOGIA NA EMPRESA 
O psicopata na mesa ao lado por Senya Muller 
6 4 
L IVROS-LANÇAMENTOS colunas 
1 2 
PS ICANÁLISE 
Em algum lugar do passado por Christian Ingo Lenz Dunker 
6 6 
LIMIAR 
Lusarcas sem luz p o r Sidarta Ribeiro 
nas bancas 
Neurociência na sala de aula 
A edição n° 7 de NeuroEducação apresenta em lingua-
gem acessível , voltada para educadores, maneiras efi-
cientes e cientificamente comprovadas de ajudar os 
alunos a aprender, por meio da motivação e do est ímu-
lo do interesse pelo conteúdo das discipl inas. Pesqui-
sadores reconhecem que não existem "receitas infalí-
ve is" , mas a neuropsicologia da aprendizagem oferece 
orientações val iosas para aprimorar e valorizar o traba-
lho do professor. Nos artigos sobre educação infantil, 
especialistas discutem temas como critérios para avaliar uma boa creche e a 
importância de darespaço aos pequenos para que possam soltara imaginação. 
Nas bancas e no site lojasegmento.com.br. no site 
Pornografia virtual e violência 
A internet se institucionalizou como forma prática de encontrar parceiros 
- e posteriormente conectar-se "cara a cara", sem a mediação da rede. 
Porém, sob muitos aspectos esse meiotambém oferece respaldo para 
sintomas psicopatológicos, alguns capazes de prejudicar o 
próprio internauta e também terceiros. É o que ocorre 
no caso da pedofilia, que obviamente não está restrita 
ao mundo virtual, mas é inegável que esse recurso 
favorece a localização de possíveis vítimas. Pensando 
em uma situação talvez menos grave, a pessoa 
pode usar a tecnologia para se esconder, evitando 
o comprometimento afetivo. Pesquisas recentes 
sugerem que o excesso de pornografia de forma 
geral - e pela internet em particular - pode trazer 
riscos à saúde psíquica. Embora seja hipocrisia atribuir 
a essa mídia tamanha "responsabilidade", é indiscutível 
que a grande quantidade de material disponível e o aparente 
conforto do anonimato apresentam facilidades. Alguns cientistas receiam 
que a busca por esse tipo de conteúdo esteja associada à violência contra as 
| mulheres, reforce a insatisfação com a aparência e dúvidas sobre o valor do 
l relacionamento afetivo estável - o que pode causar prejuízos para as relações 
I da "vida real". Leia no site: www.mentecerebro.com.br 
Acompanhe a (amentecerebro no Instagram 
Saiba c o m antecedência qual será o t e m a da capa da próxima edição m 
www.mentecerebro.com.br 
N O T Í C I A S Notas sobre fatos relevantes nas áreas de psicologia, ps icanál ise e neuroc iênc ia . 
A G E N D A Programação de cursos , congressos e eventos . 
A localização das estruturas cerebrais nas imagens desta edição é apenas aproximada 
Os artigos publicados nesta edição são de responsabilidade dos autores e não expressam necessariamente a opinião dos editores 
julho 2016 • mentecérebro 5 
mente cérebro 
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Edição n° 282, julho de 2016, 
ISSN 1807156-2. 
Distribuição nacional: DINAP S.A. 
Rua Dr. Kenkiti Shimomoto, 1678. 
ANER anatec 
palavra do leitor 
BEBÉS IMPERDÍVEIS 
Está ót imo o texto sobre 
a maneira como os 
bebés compreendem o 
mundo (como se fossem 
pequenos cientistas , 
muito mais inteligentes 
do que se imaginava há 
alguns anos ) , tema da 
edição 281 de Mente e 
Cérebro. Acredito que 
não deveria ser lido 
apenas por psicólogos, 
pessoas que trabalham 
com cr ianças , pais e 
mães ou interessados no 
desenvolv imento infantil em geral , mas por qualquer 
um que tenha a consciência de que é fundamental cuidar 
da infância, olhando com respeito para os primeiros 
anos de v ida . É desse período que, em grande parte, 
depende a forma como os adultos vão lidar com os 
desafios pelo resto da v ida . A lém de muito bem escrito, 
o artigo é informativo e atraente. Já indiquei para meus 
alunos e reafirmo agora: imperdível ! Parabéns a toda a 
equipe de Mente e Cérebro. 
Patrícia F. Souza - São Paulo, SP 
ORDEM E PROGRESSO 
Quero parabenizar o 
neurobiólogo Sidarta Ribeiro 
pelo excelente artigo "Canto do 
povo de u m lugar" , publ icado na 
edição 280 de Mente e Cérebro. 
A elegância da d issertação 
sobre um intr incado tema que 
para mui tos de nós brasi le iros 
se t raduz em desesperança e 
descrédito . S o m o s um país j o v e m , cuja contribuição 
para o mundo ainda mal c o m e ç o u . Sou brasi leira, 
moro na Su íça , país que se t raduz e m pura democracia 
e estado de consc iênc ia . O n d e durante quatro meses 
úteis tira-se o sustento agrícola da nação. Falta-nos 
consc iênc ia da abundânc ia da nossa terra , água, 
r iqueza e alegria. Carcaça mais rica no mundo não 
há! Falta trabalho e ser iedade. O que todo c idadão 
brasi leiro precisa é ter a consc iênc ia do que t emos 
cravado em nossa bandeira : O R D E M . Pois daí v i rá 
nosso P R O G R E S S O . Mãos à obra! 
Cristiane Georges Zommerfelds - Novo Horizonte, SP 
SOBRE DINHEIRO O assunto de "Armadi lhas 
do d inhe i ro" , na edição 
280 de Mente e Cérebro, 
veio na hora cer ta . O 
dinheiro é o centro de 
muitas preocupações , 
conversas , d i s cus sões , 
gerando ans iedade e 
incertezas . . . Aparece nas 
sessões de terap ia , gera 
angúst ia e sof r imento 
ps íquico , provoca t ranstornos , 
desconstró i va lores e crenças . 
Concordo p lenamente com a 
autora , a editora e psicanal ista 
G láuc ia Leal . Estar atento às ci ladas 
A r m a d i l h a s 
d o d i n h e i r o 
que envolvem esse tema nos 
ajuda a lidar melhor com vár ias 
questões pessoa is , sufocadas pela 
necess idade de atender a tantas 
expectat ivas . 
Paula Rezini - Petrópolis, RJIDENTIDADE DE REFLEXÃO 
A revista de n ú m e r o 280 está 
excepc iona l . Mente e Cérebro 
retrata, por meio de seus ar t igos , 
t e m a s i n te re s san t í s s imos . 
E s se t ipo de conteúdo nos faz 
refletir sobre a soc ia l i zação 
e a const rução da ident idade 
socia l coletiva e ind iv idua l , nos 
a judando na fo rmação cr í t ica e 
na autorref lexão. Pa rabéns aos 
editores envolv idos nesse belo 
t rabalho . Aguardare i a n s i o s o a 
próx ima edição, e enquanto i s so , 
vou reler essa obra espetacu lar . 
Luciano Henrique Moreira Santos -
Uberaba, MG 
CONCURSO CULTURAL: ESCREVA E GANHE UM LIVRO! 
Mande sua opinião sobre um dos artigos desta edição para o e-mail redacaomec@editorasegmento.com.br ou uma sugestão e concorra a um livro. 
Por limitação de espaço, tomamos a liberdade de selecionar e editar as cartas recebidas. A premiada deste mês é Patrícia F. Souza - São Paulo, SP. 
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Na Loja Segmento você encontra 
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Acesse e confira. 
• o • o 
o o o o 
10E]seqmento 
w w w . l o j a s e g m e n t o . c o m . b r 
WXIQ |VPVe$RR 
T R A B A L H O S E M B L E M Á T I C O S : 
mortalha Manto da apresentação (à direita, 
abaixo) e fardão Eu vim (à direita, acima). A 
primeira peça, que Bispo costurou ao longo 
da vida para, segundo afirmava, vestir no 
juízo final, traz bordados nomes das pessoas 
que ele acreditava dignas da misericórdia 
de Deus; o casaco revela a data que ele 
considerava seu verdadeiro nascimento: dia 
e hora em que teve um surto psicótico e foi 
internado com diagnóstico de esquizofrenia. 
Acima, colagem com botões e fichas de 
ônibus - o uso de objetos descartados no lixo 
era uma maneira de representar "o material 
existente na Terra de uso do homem", dizia 
• EXPOSIÇÃO Um passeio pela vida e obra de Bispo do Rosário 
MOSTRA EM MUSEU DA COLÓNIA JULIANO 
MOREIRA, NO R IO DE JANEIRO, TRAZ 60 
PRODUÇÕES E FOTOS INÉDITAS DO ARTISTA 
PLÁSTICO, EX-I NTERNO DO HOSPITAL 
PSIQUIÁTRICO QUE FUNCIONOU NO LOCAL, 
PÚBLICO PODE VISITAR AS DEPENDÊNCIAS 
DA INSTITUIÇÃO ONDE ELE VIVEU 
uai a co rda minha aura?" - e r a uma das perguntas que Arthur 
V j C Bispo do Rosário (1911-1989) fazia para testar quem tentava 
visitar a cela que ocupava sozinho em um dos pavilhões da Colônia 
ju l iano Moreira , centro psiquiátr ico onde viveu por meio século , 
diagnosticado como "esquizofrênico-paranoico" depois de, durante 
um surto psicótico, ter invadido um mosteiro dizendo-se enviado de 
Deus . Aos poucos que ele permitia entrar em seu "castelo", como 
chamava sua cela-ateliê, apresentava suas assemblages (colagens com 
objetos t r id imensionais , como embalagens de plástico, garrafas e 
outros resíduos descartados nos arredores da colônia) , estandartes 
e roupas feitos com a linha de uni formes , bordados com palavras, 
nomes e textos de conteúdo míst ico. U m desses escritos - "Que 
venham as virgens em ca rdumes" - e a pergunta-senha de Bispo dão 
título à exposição Das virgens em cardumes e da cordas auras, reunião 
de 60 trabalhos do artista aberta para vis itação até 2017 no Museu 
Bispo do Rosário de Arte Contemporânea , que funciona em um dos 
prédios da colônia. 
A lém das obras de B ispo - dentre as quais se destacam oito 
estandartes que foram exibidos juntos pela últ ima vez há mais de 
30 anos - , a exposição traz instalações e apresentação de perfor-
mances de art istas contemporâneos que de a lguma forma se rela- | 
c ionam com Bispo. A performance que abriu a most ra e m junho , f 
de Eleonora Fabião, cons is t iu num cortejo pelas dependênc ias da J 
co lônia , levando trabalhos emblemát icos de B ispo n u m a caixa de ° 
8 
Jk* associação livre 
acrí l ico: começou com o Manto da apresentação - uma mortalha que ele bordou ao 
longo da vida para, d iz ia , vestir quando encontrasse Deus no ju ízo final - , e te rminou 
com o fardão Eu vim, que traz bordada a data que ele considerava seu verdadeiro 
nasc imento : hora, dia e ano do surto psicótico que resultaria em sua internação, em 
1938. Dentre as insta lações , destaca-se o Materializador de sonhos, de N a d a m Guer ra : 
dezenas de placas de cerâmica que retratam sonhos contados ao art ista . 
De acordo com a curador ia , a arte performática dialoga diretamente c o m a obra 
de Bispo - ele, em s i , um performer que circulava pela colônia usando suas 
uções . Esse aspecto é evidenciado pelas fotos feitas pelo 
rafo francês Jean Manzon em um ensaio com B ispo para a 
revista O Cruzeiro nos anos 40, que estão sendo expostas 
pela pr imeira vez . As performances ocorrerão no úl-
t imo sábado de cada mês e serão filmadas e exibidas 
nos demais d ias . O s materiais usados nas apresenta-
ções , em vez de descartados , serão acumu lados até o 
últ imo dia da exposição - uma referência c lara ao tra-
balho de B ispo, que uti l izava o lixo c o m o matér ia-pr ima 
para, segundo af i rmava, representar "o mater ia l existente 
Terra de uso do h o m e m " . O s cenár ios das per formances 
serão as galerias do m u s e u , dependências do antigo hospi-
psiquiátr ico e áreas externas da colônia , hoje tombada 
Patr imônio Histór ico . A curadoria criou um mapa com 
reas da colônia que podem ser v is i tadas para conhecer 
or o lugar onde viveu B ispo, caso o espectador queira ex-
r os prédios de forma independente ou por vis i ta guiada . 
Das virgens em cardumes e d a cordas auras. Museu B ispo do Rosár io de Arte 
Contemporânea . Colônia Jul iano More i ra . Est rada Rodrigues Ca ldas , 3400, Taquara , Jacarepaguá , 
Rio de Janeiro . De terça a sábado , das lOh às 17h. In formações : (21) 3432-2402. G rá t i s . Aos sábados , 
há ôn ibus direto do Museu de Arte Moderna ( M A M ) até a colônia , por R$ 20. Até jane i ro de 2017 . 
julho 2016 • mentecérebro 9 
associação livre 
• TEATRO 
Amor e culpa na perspectiva de 
um homem com esquizofrenia Inspirada em conto homónimo do escritor britânico Lawrence Durrell, a montagem As cerejas traz recortes da rotina de um 
interno de uma instituição psiquiátrica que acredita ter assina-
do a mulher por quem se apaixonou. Como na obra original, 
o diagnóstico que levou o protagonista ao confinamento não 
é explícito, mas ele apresenta s intomas característicos de 
esquizofrenia, como delírios e sensação de perseguição - as 
cerejas mencionadas no título são, a propósito, ilustrações de 
um papel de parede que o paciente crê serem frutas reais e 
que pode ser punido por tê-las lambido. 
Uma única atriz, Stefi Braucks, interpreta todas as personagens femininas do texto, que se 
confundem nas alucinações do protagonista, vivido por Alexandre Leal. O ponto de partida do 
espetáculo é a paixão do protagonista por uma desconhecida, o que o deixará ansioso e mais 
propenso a surtos psicóticos e delírios. O mistério em torno da morte da mulher permeia o texto. 
De acordo com o diretor Roberto Alv im, a intenção não é trazer ao público um "olhar voyeurístico 
sobre um doente mental" , mas s im estimular a alteridade, a possibilidade de se colocar no lugar 
de uma pessoa em intenso sofrimento mental, como, segundo ele, ocorre no conto de Durrell. 
PACIENTE de centro 
psiquiátrico acredita 
ter assassinado a 
mulher por quem se 
apaixona em As cerejas, 
adaptação de conto 
do escritor britânico 
Lawrence Durrell 
As cerejas. Teatro Jardim Sul - Shopping Jardim Sul . Avenida Giovanni Gronchi , 5819, Morumbi , São Paulo. Sexta, às 22h. Infor-
mações: (11) 3779-3965. R$ 30. Até 29 de julho. 
• ENCONTRO 
Coletivo propõe troca de 
olhares entre desconhecidos 
Centenas de pessoas que não se conhecem reunidas 
>em um parque ou praça com o propósito de olhar 
fixamente nos olhos de a lguém por umminuto. Essa é a 
proposta do projeto Entreolhares, organizado através de 
redes sociais , que tem ocorrido periodicamente em várias 
capitais brasileiras. 
É inspirado no Eye contact experiment (Experimento de 
contato v isual ) , do coletivo internacional The Liberators, 
que ocorreu em várias c idades do mundo , envolvendo 
no total mais de 100 mil participantes. Vídeos da inter-
venção no canal do coletivo na web - que partiu do tema 
"Para onde foi a conexão humana?" - já têm mais de 100 
milhões de v isual izações . "Dec id imos criar o evento em 
São Paulo e centenas de pessoas conf i rmaram em poucas 
horas. Muitas outras entraram em contato perguntando 
como podiam organizar em suas c idades" , conta Carolina 
Nalon, que articula edições do movimento no Brasi l . Ela 
considera a iniciativa atraente para um público que vive 
I M A G E N S 
D E V Í D E O 
da primeira edição 
do Entreolhares 
em São Paulo, 
no final de 2015. 
Movimento já foi 
realizado em 12 
capitais brasileiras 
e 156 cidades do 
mundo, envolvendo 
mais de 100 mil 
participantes 
"em tempos de aumento do relacionamento digital e pou-
co contato olho no olho" . A organização dos encontros é 
feita no grupo público do Facebook Entreolhares - Expe-
rimentando conexões humanas, em que são divulgados as 
datas e os locais das próximas edições. 
10 
o que há para ver e ler | T l â rede 
Vítimas exibem cartazes com frases dos agressores 
i # K T i nguém vai acreditar se você contar." "Você na 
J N verdade gosta d i sso . " Essas são duas das frases 
ma/s frequentes do projeto Unbreakable - centenas de 
fotografias de v í t imas de abuso sexual e de violência do-
mést ica segurando cartazes com frases ditas pelos agres-
sores . A iniciativa é da fotógrafa amer icana Grace Brown. 
"A intenção é dar voz a sobreviventes" , explica Grace , que 
decidiu começar a série depois de ter ouvido relatos de 
agressões sofr idas por amigas próximas - desde 2 0 1 1 , 
ela tem recebido milhares de e-mails de v í t imas de vários 
lugares do mundo . 
Interessados em compart i lhar sua experiência po-
dem enviar a própria fotografia para o endereço projec-
tunbreakab lesubmiss ions@gmai l . com. As imagens são 
reunidas notumbl rp ro jec tunbreakab le . tumbl r . com. Leia 
mais sobre o tema na pág. 14. 
A 
'MõHVK WH AT MAM . 
t)U TH INk TOU 
m « KJGHT Tc 
S\y W t o w? I f\M AN APULT «u ^ ' CHILO' 
F O T O S da série 
Unbreakable, da 
fotógrafa Grace 
Brown: "Você é 
linda (em um e-mail 
3 meses depois). 
Agradeço a Deus por 
você" (à esquerda). 
"Meu bem, o que 
faz você pensar que 
tem o direito de dizer 
não? Sou um adulto 
e você uma criança" 
(à direita) 
Adolescente cria aplicativo 
para mapear assédio nas ruas 
ASaiPraLó A ssov ios , palavras ofensivas, ou mes-mo toques invasivos, principalmente 
nos transportes públ icos, são tipos de as-
sédios corriqueiros às mulheres e vistos 
com certa indulgência em nossa cultura. 
A estudante Catharina Doria , de 17 anos , 
porém, decidiu colocar em prática uma 
ideia para ajudar as mulheres a circular 
com mais segurança nas cidades - o apli-
cativo Sai pra lá, que permite um mapea-
mento anónimo do tipo e local de assé-
dio sofrido, como forma de alertar outras 
usuárias e press ionar os órgãos públicos 
para reforçar o policiamento em locais 
determinados. Disponível para Android e 
IOS , a ferramenta é gratuita. A denúncia 
é feita rapidamente, cl icando no botão 
"Fui assediada" , que permite marcar o 
local específico, horário e tipo de agres-
são (f ísica, verbal ou sonora) . Também é 
possível conferir o mapa de assédios em 
alguma cidade ou bairro, criado com in-
formações de outras usuár ias . 
FERRAMENTA Sai pra lá é grátis, disponível 
para Android e IOS; usuárias podem fazer 
denúncias ou conferir informações sobre a 
segurança em determinada cidade ou bairro 
<3> $ | 
36 asséd os indefinidos registrados 
julho 2016 • mentecérebro 11 
V psicanálise inconsciente a céu aberto Em algum lugar do passado 
INCLUÍDA ENTRE AS TERAPIAS PSICODINÂMICAS DE L O N G O 
PRAZO, A PS ICANÁLISE NÃO É UMA T E O R I A SOBRE O 
CÉREBRO, MAS UM MÉTODO DE TRATAMENTO PELA PALAVRA; 
HÁ, PORÉM, G R A N D E D E S C O N H E C I M E N T O DE PESQUISAS 
Q U E DEMONSTRAM SUA EF ICÁCIA 
CHRISTIAN INGO LENZ DUNKER 
E m 27 de outubro de 1924 Freud foi capa da Time como u m dos maio-
res cientistas de sua época. E m 1993, 
a mesma revista anunciava: "Freud está 
morto". De lá para cá , a ps icanál ise 
desenvolveu um interessante e con-
troverso debate com a neurociência . 
Com é próprio das c i ênc ia s , certas 
ideias, que parecem obviamente equi-
vocadas em um momento , depois são 
redescobertas, ass im como métodos e 
fatos promissores ganham e perdem 
relevância em razão da osci lação entre 
modelos concorrentes. 
Uma síntese possível do atual esta-
do do debate diria que a neurociência , 
menos do que refutar a psicanál ise , a 
demonstra - conforme a opinião de 
psicanalistas de diferentes tendências , 
como Gerard Pommie re Peter Fonágy. 
Inversamente , pesqu isadores c o m o 
Eric Kandel, ganhador do Nobel , e o 
sul-africano Mare So lms a f i rmam que 
o método psicanalítico de tratamento 
pela palavra encontra fortes subsídios 
nas descobertas obtidas pelas novas 
tecnologias de neuroimagem e mapea-
mento cerebral . A psicanál ise não é 
uma teoria sobre o cérebro, mas um 
método de t ratamento pela palavra. 
Não há nenhuma incompatibi l idade, 
apenas a que é própria da ciência, para 
reunir achados de diferentes origens. 
Mas há sempre cientistas que vi-
vem fora de sua época, seja ela 1924 
ou 1993. Ivan Izquierdo é um caso 
paradigmático deste tipo de burocra-
ta da ciência que extrapola as regras 
do jogo científico querendo levar sua 
autoridade para além de onde ela foi 
estabelecida. Em entrevista publicada 
pela Folha de S.Paulo, em 18 de junho, 
ele afirma que "a psicanálise hoje é 
um exercício estético, não um trata-
mento de saúde. Se a pessoa gosta, 
tudo bem, não faz mal , mas é uma 
pena quando alguém que tem um 
problema real, que poderia ser trata-
do, deixa de buscar um tratamento 
médico achando que a psicanál ise 
seria uma alternativa". U m a ót ima 
síntese de como é possível alguém 
que, por posição e ofício na Acade-
mia Brasileira de Ciências , deveria 
representar o conjunto da pesquisa 
efetivamente praticada no país, mas , 
em vez disso, deixa-se levar pelo inte-
resse em valorizar sua própria área de 
investigação. 
O espírito de corrupção, que do-
mina nosso país, não é imune aos ór-
gãos de controle e representação da 
ciência. Primeiro: há um desconhe-
cimento soberbo das pesquisas que 
demonst ram a eficácia da psicanál ise 
como método de tratamento, incluí-
da entre as terapias ps icodinâmicas 
de longo prazo. Segundo: existe uma 
ignorância inaceitável com relação ao 
fato de que todo tratamento possui 
potenciais efeitos iatrogênicos, logo, 
a psicanál ise t ambém. Terceiro: em 
defesa das terapias cognitivas, ele 
argumenta , na m e s m a matéria, que 
"mudar uma palavra ressignifica toda 
a memór ia " , exatamente como a psi-
canál ise sempre postulou. Mudanças 
na experiência de l inguagem afetam 
todas as funções psicológicas: me-
mória , atenção, emoção e percepção. 
Quarto: fazer uma afirmação envol-
vendo a noção de "ressignif icação", 
conceito l inguístico, amplamente 
apropriado pela psicanál ise, é empre-
gar uma noção externa às ciências do 
cérebro, real izando uma autocontra-
dição flagrante entre o que se quer 
dizer e os meios argumentativos em-
pregados para tal . 
Tolice vem do lat im, stultos, ou 
seja, "obtuso , lento e embotado". 
Obtuso é aquele que incorre em falta 
de rigor, como se vê em juízos gené-
ricos sobre áreas tão extensas como 
psicanál ise e neurociência.Lentidão 
é atraso e fixação no passado, talvez 
em algum ponto entre 1924 e 1993. 
Embotado é aquele que perdeu o fio, 
a sensibi l idade ou a energia, deixan-
do de ler as últ imas pesquisas cien-
tíficas. Izquierdo, deixe de ser tolo e 
"ressignif ique" sua entrevista, agindo 
como um cientista de verdade. ® 
CHRISTIAN INGO LENZ DUNKER, 
psicanalista, professor livre-docente do 
Instituto de Psicologia da Universidade 
de São Paulo (USP). 
L 2016 2018 I N F L U E N C I A Ç A O 
15 a 
18 de A G O S T O 
Traasamerica Expo Cerrter 
São Paulo-SP Gestão que irtspijra pessoas que conquistam. 
.O 
E o 
Saúde em destaque no maior evento 
de Gestão de Pessoas da América Latina 
A s e m p r e s a s e s t ã o c a d a u e z maii c o n s c i e n t e s e m r e l a ç ã o a o b e m - e s t a r d o s f u n c i o n á r i o s . 
O C O N A R H 2 0 1 6 p r e p a r o u p a l e s t r a s e x c l u s i u a s s o b r e o t e m a , c o m f o c o n a m e l h o r i a 
d a q u a l i d a d e d e u i d a , e m n o u a s 1 o r m a s d e u i a b i l i z a r b e n e f í c i o s e m u i t o m a i s . 
CONFIRA ALGUMAS PALESTRAS JÁ CONFIRMADAS: 
PORQUE OS INDIVÍDUOS 
ADOECEM NAS ORGANIZAÇÕES? 
L I A D I S K I N - J O R N A L I S T A E C O F U N D A D O R A D A P A L A S A T H E N A 
J O Ã O R O N C A T I - S Ó C I O - D I R E T O R D A P E O P L E + S T R A T E G Y 
Foto: Klko Ferrlte 
1 DESAFIO DOS PLANOS DE SAÚDE NAS EMPRESAS - EXTENSÃO DO BENEFÍCIO 
T H É R A D E M A R C H I - S Ó C I A D O E S C R I T Ó R I O P I N H E I R O N E T O A D V O G A D O S 
R O D R I G O A R A Ú J O - F U N D A D O R D A A R A Ú J O , C O N F O R T I E 
J O N H S S O N A D V O G A D O S A S S O C I A D O S 
Confim a grade completa de palestras em 
w w w . c o n a r h . c o m . b r l n s c r e u a - s e 3 1 3 1 Programação sujeita à alteração. ( n ) 3 i á 8 - 3 c o a g r e s s i s t a 2 0 1 6 @ c o n a r h . c o m . b r 
VEÍCULO OFICIAL REVISTA OFICIAL PROOUTORA OFICIAL 
D A B R H B R A S I L D A B R H S P ^ESTADÃO Melhor J a b u T i c a b a COPASTUR ^LATAM io Brasileira de Recursos Humanos AIRLINES 
I Bradesco iguros ^ SLAC BRASILEIRO DE ISO 9001 I l M A S T E R 
• psicanálise A violência ta 
de todos nós 
O E S T U P R O , A T O C U j A M A R C A É O S U B M E T I M E N T O 
D O C O R P O A L H E I O , S U B T R A I D O O U T R O S U A C O N D I Ç Ã O 
D E S U j E I T O , T R A N S F O R M A N D O - O E M U M C O R P O - O B j E T O 
S E M A L M A , A S E R V I Ç O D A B R U T A L I D A D E por Susana Muszkat 
ãk v i ra l i zação de u m v ídeo postado nas redes 
sociais repercutiu de forma bombást ica , inicial-
MÊÊÊÊÊL mente chocando a opinião pública estrangeira. 
m m Como efeito, despertou as autoridades e a po-
pulação em geral por aqui . Tratava-se do estupro coletivo 
de uma menina carioca de 16 anos . O episódio, brutal e 
revoltante - para usar apenas dois dos inúmeros e insufi-
cientes adjetivos possíveis - , reacendeu o tema do estupro 
de mulheres, praticado de forma endémica e assustado-
ramente alta no Brasi l . De quando em quando, diante de 
algum novo episódio e de forma que poderíamos chamar 
e spasmód ica , ressurge , para e m seguida desaparecer 
(como assunto, que fique claro, e não como prática) - tal 
qual a dengue ou a Z ika , em tempos de pico epidêmico. 
Não foi diferente desta vez : a mídia , em todas as suas 
modalidades, vem incansavelmente abordando o assun-
to. Grupos feministas , intelectuais, jornal istas , políticos, 
a polícia e a população de maneira geral, dentro e fora 
da mídia , vêm se pronunciando. Es tamos em tempos 
de pico epidêmico novamente. Entenda-se aqui a falta 
de um real interesse em pensar, de forma consistente e 
permanente, políticas públicas eficazes para promover 
a equidade entre os géneros. Cada vez que há um novo 
A AUTORA 
SUSANA MUSZKAT é psicanalista, membro efetivo da Sociedade 
Brasileira de Psicanálise de São Paulo, autora de Violência e 
masculinidade, Casa do Psicólogo, 2011. 
episódio, o que se vê são promessas de acirramento das 
leis, aliadas a medidas punit ivas: sempre algo feito a pos-
teriori, como são os casos de polícia. Procura-se apurar 
os fatos, dá-se andamento a intermináveis processos, 
eventualmente punem-se os cu lpados , até que apareçam 
novas v í t imas e a roda volte a girar na mesma vergonho-
sa direção. Não existem programas de caráter preventivo, 
duradouros , de longo e amplo alcance para toda a popu-
lação, especialmente voltado para as cr ianças e os jovens. 
A mudança de um tipo de mental idade e, consequente-
mente, de comportamento só é possível com um trabalho 
permanente formulado e posto em prática com diversos 
setores de uma sociedade. A maneira como o estupro e a 
violência contra as mulheres são tratados em nossa socie-
dade é reveladora da ideologia subjacente: estupro é um 
tema que diz respeito exclus ivamente às mulheres! Não 
é pensado como assunto que nos implica a todos! Que 
nos agride eticamente como cidadãos e nos envergonha 
e ofende como seres humanos . 
Do ponto de vista da teoria psicanalít ica, pode-se dizer 
que o desejo de apoderar-se ou adentrar o interior do cor-
po da mãe/mulher é largamente descrito por fundadores 
do pensamento psicanalít ico, como Melanie Klein, Do-
nald Meltzer e outros. O desejo refere-se a forças muito 
primitivas do bebé ou da cr iancinha pequena, de nature-
za pré-verbal, que expressam o desejo de retorno a um 
estado fantasiado de plenitude, completude e poder. U m 
14 
estado originário em que não haveria falta, 
frustração, necess idades. . . enf im, o paraíso. 
Até aqui descrevo o que se dá no plano 
da fantasia e dos desejos inconscientes. Tudo 
certo quando se trata de desejos fantasiados 
da cr iança ou até m e s m o dos desejos infantis 
que perduram no adulto, com os quais depa-
ramos em nossa cl ínica psicanalítica e que é 
fonte de sofr imento. Também uti l izamos os 
mitos , os contos de fadas, as histórias bíbli-
cas , a literatura e as artes em geral como ins-
t rumentos para compreender a vasta gama 
de sent imentos e vivências humanas . 
O mito bíblico da expulsão de Adão e Eva 
do paraíso, metáfora fundadora da condição 
humana , aponta para a dupla implicação do 
evento do nascimento: a expulsão de todo ser 
humano do paradisíaco ventre materno e, ao 
mesmo tempo, fator imprescindível para a 
existência da vida! A s s i m , a ferida narcísica, 
marca da nossa incompletude, é nosso passa-
porte para a vida. Nesse, e unicamente nesse 
plano em nossa cultura, podemos afirmar que 
se verifica uma real equidade entre os géneros! 
g Somos todos incompletos , assustados , 
| ameaçados por nossa própria fragilidade, 
| pela morte, pelo poder dos outros, pelo fra-
casso , pelas doenças , pela imprevisibil idade 
da natureza em suas manifestações. Enfren-
tar todos os desafios da vida requer muita co-
ragem, não é fácil . 
Neste ponto já verif icamos uma primeira 
contradição, um paradoxo mesmo : para que 
tenhamos condição de enfrentarmo-nos com 
nossas fragilidades e incompletudes, há que 
admit i rmos a existência delas em nós mes-
mos . A violência é manifestação de falta de 
poder, ou seja, a recusa violenta em aceitar-
se l imitado e frágil. Desde sempre , nas tribos 
mais primitivas de que se tem notícia, pro-
curaram-se meios que pudessem controlar 
a força, a imprevisibil idade e a impiedade da 
natureza sobre nós, humanos , a fim de dri-
blarmos nossa condição de vulnerabil idade. 
Foram criados deuses , a quem se faz iam ofe-
rendas, instituíram-se religiões, na i lusão de 
que alguém olhasse por nós em nossa peque-
nez e fragilidade. E, caso fôssemos vit imados 
por sofr imentos, isso se explicaria como von-
tade divina ou como algo que nos houves-
se indisposto contra Deus , por erro nosso. 
Desse modo, poder-se-ia pensar que alguma 
lógica divina nospouparia ou orientaria, pro-
tegendo-nos das terríveis forças do universo. 
julho 2016 
| ^ psicanálise 
Do ponto de vista da teoria psicanalítica, pode-se dizer que 
o desejo de apoderar-se ou adentrar o interior do corpo da 
mãe/mulher é largamente descrito por fundadores do pensamento 
psicanalítico, como Melanie Klein, Donald Meltzer e outros 
Predomina em nossa cultura, ainda forte-
mente patriarcal , uma forma binária de do-
tação de valores, em que pares de opostos 
def inem os lugares dos sujeitos. Essa manei-
ra de classif icação atribui valores positivos e 
negativos às diferenças, estabelecendo ass im 
lugares hierarquizados de poder. Pensamos 
em termos de categorias dualistas que têm 
por finalidade regular as relações de poder. 
A lguns dos sem-número de pares de opostos 
são: homem/mulher , superior/inferior, incluí-
do/excluído, poderoso/submetido, forte/fra-
co, heterossexual/homossexual , mascul ino/ 
femin ino , certo/errado, e ass im por diante. 
A ingerência social sobre a sexualidade, o 
comportamento e o corpo feminino é de cará-
ter moral e regulatório e se dá inserida nessa 
formulação binária em que mulheres "natu-
ralmente" devem ser orientadas e protegidas, 
dada sua condição de "maior fragilidade". De-
v e m , portanto, submeter-se à lei do patriarca-
do, obedecendo ao desejo mascul ino. 
Nessa lógica, o desejo da mulher de ser 
objeto do desejo mascul ino compreende-se 
como movimento-de-i lusão de saída do lugar 
de exclusão e submet imento . De maneira per-
versa , podemos entender a inversão na quase 
totalidade dos casos de estupros, em que fica 
a cargo da vít ima provar sua inocência como 
possível incitadora do ato que a brutaliza. 
A ideia popular, aceita de forma naturaliza-
da, de que a mulher enlouquece o homem e, 
portanto, é responsável pelo comportamento 
deste evidencia como, sustentado pelas desi-
gualdades de género, aquilo que é do âmbito 
das fantasias originárias infantis de apoderar-
-se do interior do corpo da mãe torna-se "auto-
rizado" como ato, justificado pela "qualidade 
feminina" de "enlouquecer um homem" . 
O estupro, ato cuja marca é a do subme-
t imento do outro, subtrai à mulher sua con-
dição de sujeito, transformando-a em um 
corpo-objeto sem a lma , a serviço do desejo 
e prazer em ser brutalizada e dessubjetivada 
por aquele que a estupra. 
Inúmeras vezes , durante os anos em que 
trabalhei com grupos de homens envolvidos 
em violência familiar, surpreendia-me ver 
como tratavam ou fa lavam de suas mulhe-
res - mães de seus filhos - em comparação 
com suas mães , mulheres santificadas, idea-
lizadas e naturalmente dessexual izadas. He-
roínas sofredoras, que tudo suportavam por 
amor aos filhos, maltratadas por seus com-
panheiros brutos (muitas das vezes, os pais 
desses mesmos homens ) . 
A impossibi l idade que eu verificava de 
que pudessem pensar em suas companhei-
ras também como mães (mães de seus fi-
lhos) e em suas mães como mulheres de 
outros homens (e não s implesmente santas 
dessexual izadas) sempre me surpreendeu. A 
violência sádica e destrutiva contra um outro 
- já dizia Freud - dá-se à custa de uma cisão 
radical entre as pulsões de vida e morte. Po-
der unir essas mulheres cindidas - a puta e a 
santa - talvez levasse alguns desses homens 
a sentir dor por seus atos, ao identificarem 
essas mulheres a quem dirigem sua violência 
com suas tão amadas mães (ou com suas fi-
lhas mulheres ) . Reflexões desse tipo, de inte-
gração, e não de oposição binária, poderiam 
dar início a programas de questionamento 
e transformação de mental idades, em ações 
com os jovens , por exemplo. GRUPOS SELVAGENS 
E o que dizer sobre o estupro coletivo? Como 
ato realizado em grupo, não tem autoria. 
Não é, em princípio, sentido por seus inte-
grantes como sendo de responsabil idade de 
n inguém, não se personal iza. A característica 
do grupo é o anonimato criado pela homoge-
neidade da não discr iminação entre os mem-
bros: não há singularidades no grupo. Este, 
imbuído de uma ideia, ganha força e vo lume, 
não só pelo número de participantes como 
fundamentalmente por seu caráter de funcio-
namento mental regressivo e primit ivo, em 
que o sujeito se sente com força e coragem 
16 
de fazer aquilo que individualmente não faria. 
Grupos podem ser selvagens! 
Evidentemente, nem todos. Grupos podem 
ter força para concretizar mudanças importan-
tes, como, por exemplo, lutar contra injustiças 
ou realizar transformações sociais - como em 
situações como esta mesma da qual falamos 
aqui, o estupro e a desigualdade entre os gé-
neros. O estupro coletivo como fenómeno não 
é novo. É t ipicamente mascul ino e recorrente 
em situações de guerra ou dominação de ter-
ritórios, em que os vitoriosos tripudiam sobre 
os vencidos, usurpando e destituindo-os não 
apenas de suas posses, mas de sua dignida-
de e humanidade. O sujeito vencido é tratado 
como não humano, um não sujeito. 
Nessas condições , o estupro coletivo de 
mulheres é exibido como troféu, como prova 
de dominação e poder! Mas que fique claro: o 
poder que esses homens desejam evidenciar 
não é o poder sobre as mulheres! É, isso s i m , 
uma demonst ração de dominação e poder 
sobre os homens cujas mulheres são estu-
pradas. A necess idade de exibição de poder 
desses homens é para os outros homens , e 
não para as mulheres . 
Homens se exibem e medem força com ou-
tros homens - quem não conhece as brincadei-
ras entre homens de "quem mija mais longe" 
ou quem tem o pênis maior? As mulheres "do-
minadas" são os troféus, as provas por meio 
das quais homens fracos e inseguros sentem 
que se tornam poderosos. Trata-se mesmo da 
necessidade narcísica primitiva de resgate ou 
vivência de um sentimento de poder e força. 
Mas qual é a força e o poder em conse-
guir violentar em grupo uma única moça , in-
defesa e desacordada? Acertou! Não é poder; 
ao contrár io, evidencia a extrema fraqueza e 
impotência , sent imentos radicalmente recu-
sados, uma vez que se opõem ao desejo de 
plena potência. É essa a verdadeira cara do 
sujeito que brutaliza outra/o em grupo. O 
grupo primitivo não pensa , age. Transforma 
o outro em nada, em n inguém. O outro vio-
lentado não é humano e, a s s i m , está lá para 
ser usado e abusado, conferindo-lhes iluso-
riamente o lugar vitorioso. Exibem o troféu, 
replicam pela internet como se isso lhes ga-
rantisse fama e notoriedade de celebridades! 
Quanta inversão! 
Esse é um ato brutal e vergonhoso. Brutal 
e vergonhoso para todos nós, não somente 
para a menina contra quem essa barbárie foi 
praticada. Atos de barbárie desumana não 
são episódios cujo efeito recai exclusivamen-
te sobre os perpetradores ou os v i t imados. 
Penso que qualquer ato de barbárie social 
diz respeito a todos nós, c idadãos, homens 
e mulheres , seres humanos . Que esse tipo 
de prática se dê em nossa sociedade, com 
nossos jovens , nos implica a todos. Nós so-
mos essa sociedade onde esse tipo de prá-
tica endémica não é verdadeiramente tema 
de relevância (como tampouco são nossas 
cr ianças! ) , na qual relações desiguais de po-
der "autor i zam" ou " just i f icam" que homens 
possam desejar provar sua mascul inidade e/ 
ou poder à custa de nossas mães , filhas, ir-
mãs , amigas , cr ianças! 
Numa sociedade em que a dignidade e o 
respeito por seus cidadãos não são assunto de 
principal relevância, somos todos cúmpl ices , e 
todos deveríamos nos envergonhar. O estupro 
é contra todos nós. Citando o escritor Ernest 
Hemingway: "Nunca pergunte por quem os 
sinos dobram; eles dobram por t i ! " . £ 
PARA SABER MAIS 
Violência e masculinidade. 
S u s a n a Muszka t . Casa do 
Ps icó logo, Coleção Cl ín ica 
Ps icana l í t i ca , 2 0 1 1 . 
Género y família: poder, 
amor y sexualidad en 
la construcción de la 
subjetividad. M. Bur in , 
I. Meier. Paidós , 2006. 
A mínima diferença: 
masculino e feminino na 
cultura. Mar ia Rita Kehl . 
Imago , 1996. 
julho 2016 • mente 17 
tecnologia 
A geração da tela 
sensível ao tocfue 
O S D I S P O S I T I V O S M Ó V E I S P R E J U D I C A M O D E S E N V O L V I M E N T O D A S C R I A N Ç A S ? 
O S E S T U D O S A I N D A S Ã O R E C E N T E S , M A S A C I Ê N C I A JÁ M O S T R A Q U E D E F A T O 
E X I S T E M R I S C O S - M A S T A M B É M B E N E F Í C I O S Q U E N Ã O P O D E M S E R D E S P R E Z A D O S 
por David Pogue 
V ocê já deve ter ouvido alguém dizer algo como "essas engenhocas u l t ramodernas destroem nosso cérebro e arru ínam o desenvolvimento das cr ianças" . A preocupação é compreensível , 
e não apenas porque todas as gerações anteriores tendem 
a desaprovar os comportamentos das seguintes. Sob vários 
aspectos os aparelhos digitais estão (pelo menos aparente-
mente) minando nossa juventude, da m e s m a forma como 
O AUTOR 
DAVID P O G U E é jornalista especializado em divulgação científica e 
temas relacionados a tecnologia. É apresentador do Yahoo Tech e das 
minisséries NOVA, na rede pública de TV PBS, nos Estados Unidos. 
o rock "prejudicou" os jovens da década de 60, a televisão 
"comprometeu" a formação de nossos avós e os carros 
colocaram em risco nossos bisavós. Segundo essa lógica, 
estamos sendo arruinados há gerações. Mas o que a ciência 
diz sobre os efeitos nocivos da mais recente tecnologia? 
Parte da resposta depende de sua definição de "arrui-
nar" . É verdade que as coisas são diferentes agora. Mui-
tas cr ianças moradoras das grandes c idades não " s a e m 
para br incar" , pelo menos não desacompanhadas . Mas 
t ambém não prec isam mais decorar nomes de presiden-
tes e a tabela periódica, pois estão a apenas u m a tecla de 
distância do Google . E s tamos perdendo ve lhas destre-
18 
zas , é verdade. Poucos sabem agora como 
usar u m papel-carbono ou cuidar de cava-
los; escrever à mão e dirigir podem ser as 
próx imas habi l idades a desaparecer. 
Po rém, diferente não é s inón imo de pior. 
E, por ma is que psicólogos, educadores e pais 
se p reocupem, a inda é surpreendentemente 
difícil encontrar estudos l igando aparelhos 
modernos à ruína da juventude. A pesquisa 
leva tempo e a era das telas sens íve is é 
muito recente. O iPad , por exemplo, surgiu 
em 2010. 
Mas as pesqu isas já começaram - e lan-
çam a lguma luz sobre como esses repenti-
namente onipresentes disposit ivos podem 
afetar as c r ianças . E m 2009, um estudo na 
Univers idade Stanford relacionou hábitos 
de adolescentes modernos de executar mul-
titarefas no computador (que parecem ter se 
estendido a telefones e tablets) à perda da 
capacidade de concentração - um resultado 
um pouco preocupante . 
U m estudo publ icado na edição de feve-
reiro de Pediatrics revelou que cr ianças que 
têm aparelhos de tela pequena em seus 
quartos d o r m e m em média 21 m inu tos a 
menos que as que não têm . Quanto à razão, 
os c ient istas supõem que as cr ianças ficam 
acordadas até tarde para usar seus disposi-
tivos ou , ta lvez , que a luz das telas produza 
atrasos no r i tmo c i rcadiano. 
E quanto às habi l idades sociais? No ano 
passado , e m u m estudo da Univers idade da 
Cal i fórnia e m Los Angeles , foram acompa-
nhados dois grupos de a lunos do sexto ano 
(com idade média de 11 a 12 anos ) , O pri-
meiro , fo rmado por 51 jovens , passou cinco 
dias e m u m acampamento na natureza sem 
eletrônicos ; o segundo grupo, dè controle, 
com 54 part ic ipantes , não acampou . Depois 
d isso , foram real izados testes e foi constata-
do que aqueles que hav iam passado a tem-
porada no campo se sa íam signif icat ivamen-
te melhor na leitura de emoções humanas 
em fotografias. 
E o que há de concreto sobre ^câncer ce-
rebral e celulares? B e m , em pr imeiro lugar, 
não é preciso um estudo para dizer que ra-
ramente os jovens estão com o telefone na 
orelha; eles ma is d igi tam mensagens do que 
fazem l igações. De qualquer fo rma , os es-
Estudo na Universidade Stanford 
associou hábitos de adolescentes 
modernos de executar multitarefas em 
computadores, telefones e tablets à 
perda da capacidade de concentração 
tudos não comprovaram nenhuma relação 
entre o uso de celular e câncer. Pelo menos 
não a inda . 
É hora de começar a reclamar? Não neces-
sar iamente; nem todos os estudos chegaram 
a conclusões a larmantes . Em 2012 o grupo 
sem fins lucrativos de estudos sobre mídias 
e tecnologia C o m m o n Sense Media desco-
briu que mais da metade dos adolescentes 
dos Estados Unidos acreditam que as mídias 
sociais - agora acessíveis em qualquer lugar 
graças às telas sensíveis ao toque - ajudaram 
em suas amizades (apenas 4 % acham que 
prejudicaram). Em 2014 pesquisadores do 
National Literacy Trust , do Reino Unido, des-
cobriram que cr ianças pobres com aparelhos 
de tela sensível ao toque têm o dobro de pro-
babilidade de ler todos os dias . U m estudo 
publicado na Computers in Human Behavior 
revelou que enviar mensagens é benéfico 
para o bem-estar emocional dos adolescen-
tes - especialmente os introvertidos. 
Prec i samos c laramente de estudos mais 
amplos e de mais longo prazo antes de co-
meçar uma nova rodada de rec lamações . E 
eles estão a caminho ; por exemplo , os re-
sultados de uma grande pesquisa britâni-
ca com 2.500 cr ianças chamada Estudo de 
Cognição, Adolescentes e Telefones Móveis 
( Scamp , na sigla em inglês) , do Reino Uni-
do, com 2.500 cr ianças , sairão em 2017. 
Enquanto isso, os s inais de alerta das 
pesquisas iniciais não são altos o suficiente 
para t i rarmos aparelhos de nossas cr ianças 
e m u d a r m o s para território a m i s h . Por outro 
lado, o bom senso sugere que não é o caso 
de deixar a tecnologia ocupar todo o tempo 
dos jovens . O s achados até agora são sufi-
cientes para sugerir a prática de uma mui-
to sábia e antiga precaução: a moderação. 
O excesso de qualquer coisa é ru im para as 
c r ianças , sejam eletrônicos modernos , tele-
v isão ou esporte . ® 
julho 2016 • mentecérebro 19 
capa Criando reservas para resistir ao 
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1 
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X 
POR QUE ALGUMAS PESSOAS DESENVOLVEM 
SINTOMAS DE DEMÊNCIA E OUTRAS NÃO, EMBORA 
TENHAM O MESMO NÍVEL DE LESÃO? A GENÉTICA 
INFLUI, MAS NÃO É SEMPRE DETERMINANTE, 
A N DA HÁ CURA, MAS A CIÊNCIA JÁ TEM UMA 
SÉRIE DE PISTAS ÚTEIS PARA EVITAR QUE NOSSO 
CÉREBRO SEJA AFETADO PELOS EFEITOS NOCIVOS DO 
ENVELHECIMENTO E SE TORNE MAIS RESISTENTE por David A. Bennett 
O A U T O R 
DAVID A. . B E N N E T T é diretor do Centro Rush para 
Doença de Alzheimer, em Chicago, e professor de ciências 
neurológicas naquela instituição. Atua em numerosos 
conselhos nacionais e internacionais editoriais e de 
consultoria e é autor de mais de 600 artigos sobre o tema. 
capa 
Especialistas acreditam que é possível 
postergar o surgimento da demência 
e diminuir o número de anos que se 
passa incapacitado no fim da vida. 
A possibilidade de "comprimir" a 
morbidade é fundamental, tanto em 
termos emocionais quanto económicos 
-4 
Desde o ensino fundamental , sem-pre amei a arqueologia e passei muitas férias com minha mulher e meus filhos vis itando ruínas an-
tigas pelo mundo - desde as kivas, câmaras 
cer imonia is dos anasaz i , no sudoeste ame-
ricano, até as "cidades perdidas" de Machu 
Picchu e Petra e os moais , estátuas gigan-
tescas da ilha de Páscoa. Em algum lugar 
pelo caminho , a faculdadede medicina e a 
residência em neurologia fizeram com que 
esse meu namoro com o assunto tomasse 
outro rumo. Mas mesmo hoje me imagino 
a lgumas vezes como um arqueólogo do cére-
bro - selecionando del icadamente espécimes 
preservados, catalogando artefatos biológi-
cos e buscando alinhar meus achados com 
as histórias singulares das pessoas . 
T ive sorte em ter muitas oportunidades 
para satisfazer esse devaneio. No Centro 
Rush para a Doença de Alzheimer, em Chica-
go, onde sou diretor, cerca de 100 cientistas 
procuram formas de tratar e prevenir uma 
gama de doenças neurodegenerativas co-
m u n s . Por quase um quarto de século condu-
zi duas investigações longitudinais - o Estu-
do de Ordens Religiosas e o Projeto Rush de 
Memór ia e Envelhecimento - que contaram 
com mais de 3.200 adultos de meia-idade em 
diante, nos Estados Unidos . Todos os nossos 
voluntários, com idade entre 50 e 100 anos , 
iniciaram a participação sem apresentar si-
nais de demência e, por incrível que pareça, 
concordam em se submeter a a lgumas horas 
de exames e testes a cada ano. Passam por 
consultas médicas abrangentes, entrevistas 
detalhadas, aval iações cognitivas, oferecem 
amostras de sangue e, em alguns casos , são 
submetidos a tomograf ias cerebrais. O mais 
importante é que todos têm o compromisso 
de doar seu cérebro após a morte para nossa 
pesquisa . O acervo resultante ocupa vários 
gabinetes e duas estações de freezers com 
área de 370 metros quadrados, mantidas a 
menos de 80 graus e protegidas por s is temas 
de backup e a larme. 
Até agora, rea l i zamos dezenas de milha-
res de aval iações c l ín icas e mais de 1.350 
autópsias e obt ivemos um conjunto inédito 
de dados que compar t i lhamos com pesqui-
sadores em todo o mundo . Como arqueó-
logos em campo , vascu lhamos os vestígios 
que estão aos nossos cuidados na esperan-
ça de compreender por que algumas pesso-
as cont inuam lúcidas na segunda metade de 
sua trajetória enquanto outras começam a 
perder suas faculdades já quando comple-
tam 60 anos . L igamos os fatores de risco 
e escolhas de v ida à função cognitiva e a 
marcas biológicas da doença . É um traba-
lho demorado . Talvez a maior ia das pesso-
as imagine que, quanto maior a lesão real 
encontrada no cérebro, maiores os desafios 
cognit ivos exper imentados pelo paciente - e 
isso cos tuma ser verdade. Mas não sempre . 
A lgumas vezes , se ana l i sa rmos duas pesso-
as com quant idades comparáve i s de danos 
cerebrais , descobr i remos que somente uma 
2 2 
delas apresenta os efeitos adversos (veja 
quadro na pág. 26). 
Na verdade, é raro envelhecer com um cé-
rebro completamente saudável . Praticamente 
todos os cérebros que examinamos apresen-
tam pelo menos alguns dos emaranhados 
destruidores de neurónios associados à do-
ença de Alzheimer , de longe a cfeusa mais 
c o m u m da demênc ia . Em cerca de metade, 
encontramos as cicatrizes de um acidente 
vascular cerebral anterior, grande ou peque-
no. E em quase um quinto descobrimos os 
aglomerados anormais de proteína que são a 
marca da doença de Parkinson e da demên-
cia dos corpos de Lewy. Porém, qjuando co-
tejamos esses achados laboratoriais aos his-
tóricos de cada indivíduo, percebemos que 
só correspondem à metade das ialterações 
cognitivas medidas em testes de i memór ia , 
velocidade de processamento e s imi lares . 
Em outras palavras , a condição post mortem 
do cérebro de alguém nos dá uma mostra 
somente parcial de seu funcionamento nos 
anos precedentes à morte. 
A grande pergunta que nos intriga: por 
que a lgumas pessoas desenvolvem s intomas 
da demência de Alzheimer e outras não? Até 
certo ponto, a genética constitui um fator im-
portante: a lgumas pessoas têm o infortúnio 
de herdar genes de alto risco associados à 
doença. Mas esse não é o único determinan-
te. Pesquisadores que trabalham com nossos 
dados já identif icaram muitos fatores cruciais 
de estilo de vida que moldam a saúde de nos-
so cérebro, em especial na idade avançada 
(veja quadro na pág. 30). Alguns deles - como 
dieta saudável - provavelmente ajudam a re-
tardar o acúmulo de material tóxico que pode 
danificar a memór ia e o pensamento crítico. 
Por exemplo: a epidemiologista Martha Cla-
re Morr is , pesquisadora em Rush , constatou 
que a dieta da mente (rica em frutas verme-
lhas, legumes, grãos integrais e nozes) dimi-
nui radicalmente o risco de uma pessoa de-
senvolver Alzheimer. 
Outras escolhas de vida t ambém parecem 
de fato reforçar a habilidade do cérebro de li-
dar com a doença, ajudando a pessoa a com-
pensar eventuais perdas da capacidade men-
tal . Em especial , constatamos que, quanto 
mais engajados - e m termos f ísicos, sociais 
e intelectuais - nossos voluntários permane-
c iam ao longo de sua vida, mais resistentes 
eram à demência ao final da vida. 
Estamos começando a entender exata-
mente de onde vem essa resiliência em alguns 
indivíduos, o que nos traz a esperança de que 
possamos ser capazes de prevenir muito 
mais a doença de Alzheimer - ou pelo menos 
retardar sua aparição de modo que a morte 
a preceda. Desde os primórdios da raça hu-
mana até aproximadamente meio século, isso 
costumava acontecer, pois a maioria de nós 
não vivia o suficiente para se preocupar com 
doenças neurodegenerativas. À medida que a 
expectativa de vida aumentou, o Alzheimer se 
tornou cada vez mais prevalente e agora afeta 
mais de 5 milhões de americanos com idade 
superior a 65 anos - um em cada nove nessa 
faixa etária. No Brasi l , a estimativa do Minis-
tério da Saúde é que exista aproximadamente 
1,2 milhão de homens e mulheres com o diag-
nóstico, mas só metade recebe tratamento e, 
a cada ano, há 100 mil novos registros da do-
ença. O prognóstico é que os casos em todo 
o mundo tenham triplicado até 2050. Nossa 
pesquisa sugere que possamos ser capazes 
de impedir, ou pelo menos abrandar, essa 
crise iminente. De fato, há coisas que todos 
podemos fazer desde a infância para tornar o 
próprio cérebro menos vulnerável às degrada-
ções do envelhecimento. 
A POUPANÇA DA MENTE 
A demência não foi sempre um problema 
tão urgente. Minha avó nasceu em outubro 
de 1906, quando as pessoas t inham mais 
razões para se preocupar com as patologias 
t ransmiss íve is do que com aquelas relaciona-
das à idade. U m mês após seu nascimento, 
o neuropatologista alemão Alóis Alzheimer 
apresentou um caso inédito em uma reunião 
médica , e seus colegas ficaram tão atónitos 
que não fizeram uma única pergunta. A pa-
ciente, uma mulher de meia- idade chamada 
Auguste Deter, não tinha tido sífil is, conside-
rada na época a causa principal da demência . 
Alzheimer atribuiu seus s intomas a placas 
rígidas alojadas entre as células neurais e a 
estranhos emaranhados de fibras dentro das 
células, que ele observou durante a autópsia 
do cérebro da paciente. 
julho 2016 • mentecérebro 2 3 
capa 
Hoje sabemos que essas características 
c láss icas são acúmulos de proteínas disfun-
c ionais , em sua maior parte formados por 
f ragmentos mal dobrados de beta-amiloide 
nas placas e tau anormal . Por várias décadas 
após a descoberta de Alzheimer, a doença 
mister iosa permaneceu em grande parte es-
quecida. Só entre 1968 e 1970, o neuropato-
logista s/r Bernard Toml inson e seus colegas 
da Univers idade Newcastle , na Inglaterra, re-
a l izaram uma série de estudos que levaram 
a uma percepção importante: as pessoas 
idosas sem demência cos tumavam também 
apresentar placas e emaranhados no cére-
bro. Aquelas com demência s implesmente ti-
nham mais desse material e também sofr iam 
acidentes vasculares cerebrais (AVCs) com 
maior frequência. As descobertas sugeriram 
que o quadro poderia ser bem mais c o m u m 
do que até então se imaginava. 
Evidências dessa percepção começaram 
a aparecer nos anos seguintes. Em abrilde 
1976, o neurologista Robert Katzman (já fa-
lecido) , então chefe da cadeira de neurologia 
na Faculdade de Medicina Albert E instein, 
escreveu um editorial divisor de águas nos 
Arquivos de Neurologia da Associação Médica 
Americana, declarando a doença de Alzhei-
mer como a "principal causa de mortes" . As 
comportas se abriram e um pequeno fluxo de 
verbas começou entrar nos laboratórios nos 
Estados Unidos . Entre 1984 e 1991, o inci-
piente Instituto Nacional do Envelhecimento 
fundou 29 centros ativos de pesquisas , in-
cluindo o nosso. Desde o início, o interesse 
principal era encontrar formas de prevenir 
a doença . Esforços nessa direção estavam 
ainda começando, mas esperávamos adotar 
uma abordagem original: em vez de limitar 
nossa investigação à conexão entre os fato-
res de risco potenciais e o Alzheimer, como 
outros estavam fazendo, decidimos levar em 
Talvez um dos primeiros passos 
mais cruciais no sentido de 
assegurar uma melhor saúde 
do cérebro seja a educação -
e não só a formal mas outros 
tipos de aprendizagem. 
2 4 
conta também as alterações físicas associa-
das ao envelhecimento e à doença. 
U m grande desafio era poder dispor de cé-
rebros suficientes, especialmente de pessoas 
sem demênc ia . É relativamente fácil conse-
guir doações de órgãos de pacientes trazidos 
a uma clínica de Alzhe imer por membros de 
famíl ia interessados, mas obter esses órgãos 
de pessoas idosas saudáveis - que também 
terão de consentir na realização de múltiplos 
exames antes de sua morte - costuma ser 
muito mais difícil . No entanto, sabíamos que 
as pessoas ass intomát icas constituíam uma 
parte vital do quebra-cabeça. Em um estudo 
revelador de 1988, Katzman fez autópsias em 
137 idosos que foram residentes de um asilo, 
aproximadamente metade deles diagnostica-
dos com Alzheimer. Na outra metade, porém, 
ele identificou dez com lesões cerebrais signi-
ficativas relacionadas a Alzheimer - que esta-
vam também entre os residentes que haviam 
obtido as melhores avaliações nos testes de 
desempenho cognit ivo. Katzman observou 
que esse grupo apresentava cérebro com 
maior peso e mais neurónios do que o dos 
outros com cérebro em condições muito si-
milares. Então, a título de explicação, propôs 
que talvez essas pessoas s implesmente tives-
sem mais cérebro para perder - uma ideia 
que ativou nosso interesse naquilo que agora 
é chamado de reserva neural ou cognitiva. 
Quantas pessoas como essas havia mais? 
Seria possível a lguém estocar esse tipo de 
"superávit poupador de mente"? Planeja-
mos nossa investigação para desvendar essa 
questão nos inspirando no que se tornou co-
nhecido como "estudo das freiras", iniciado 
em 1986 pelo epidemiologista David Sno-
wdon , agora aposentado pela Universidade 
de Kentucky. A pesquisa monitorou aproxi-
madamente 700 membros da Congregação 
das I rmãs de Notre Dame , com idade supe-
rior a 75 anos - uma grande porcentagem 
delas doou o cérebro após a morte. Nosso 
plano era complementar , e não copiar, o estu-
do das freiras. Com o auxílio da Arquidiocese 
de Chicago e da falecida i rmã Katie M c H u g h , 
estabelecemos uma rede de contatos com or-
dens católicas em todo o país . Em 1993 tínha-
mos garantido o financiamento para lançar o 
Estudo de Ordens Rel igiosas, solicitando a 
doação de órgãos de todos os participantes 
que se candidatavam. Quatro anos depois , 
recebemos um financiamento adicional para 
começar o Projeto Rush de Memória e Enve-
lhecimento a fim de estudar idosos aposen-
tados leigos. 
Deliberadamente, projetamos nosso ex-
perimento de modo que estivesse isento do 
maior número de premissas possíveis sobre 
envelhecimento e Alzheimer. Por exemplo, não 
há nenhum critério de inclusão ou exclusão 
além de ser idoso o suficiente e concordar com 
a doação de órgãos. Perguntamos aos nossos 
participantes não só sobre sua dieta, sono e 
exercícios - fatores que sabidamente afetam 
a saúde e o envelhecimento - , mas também 
sobre sua educação, treinamento musical , ha-
bilidades de língua estrangeira, personalidade, 
atividades sociais , experiências traumáticas, 
status socioeconómico quando crianças etc. 
Anal isamos como todas essas variáveis se re-
lacionam a alterações no cérebro 6 s intomas 
da doença, ignorando rótulos convencionais 
de diagnósticos. Monitoramos como a cogni-
ção das pessoas muda , algumas vezes melho-
rando, mas com demasiada frequência decli-
nando. E observamos o ritmo: alguns passam 
pelo curso da doença rapidamente, enquanto 
outros decl inam devagar. Ou simplesmente 
não decl inam. Nossa questão-chave: como fa-
zer parte desse último grupo? 
O TRUNFO DA FLEXIBILIDADE 
Minha avó viveu até quase os 100 anos e gos-
tava de repetir "Envelhecer não é para os fra-
cos!" . Concordo com ela. Nos casos em que 
surge a demênc ia , a situação pode ser devas-
tadora. Ao longo do tempo, a doença seques-
tra as memór ias , o uso da l inguagem, a aten-
ção e a independência . Costumo comparar o 
agravamento da incapacidade de manter as 
lembranças à perda de páginas de um álbum 
de fotos cronológico de sua vida de trás para 
a frente - as recordações de infância são as 
últ imas que s o m e m . Ao final, os pacientes 
perdem a possibi l idade de funcionamento 
em qualquer nível essencia l . Misericordio-
samente talvez, muitos morrem em razão 
de outras condições médicas bem antes de 
chegar aos estágios finais da doença. A boa 
notícia é que, à medida que o quadro progri-
de, o cérebro resiste. Como todos os órgãos 
do corpo, o cérebro não fica de braços cruza-
dos, como mero espectador. Na verdade, o 
s istema cerebral é o mais plástico e adaptável 
(só para lembrar, é ass im que aprendemos) . 
E essa flexibilidade parece constituir grande 
parte de nosso estoque cognitivo. 
Para melhor compreender isso, examina-
mos minuciosamente o cérebro das pessoas 
que mant inham a capacidade cognitiva - ou 
que só apresentavam uma degeneração lenta 
- apesar da presença de placas, evidência de 
AVCs e outros danos . Como Katzman, cons-
tatamos que esses indivíduos tendem a ter 
mais neurónios - especialmente no locus coe-
ruleus, uma região azulada do tronco cerebral 
normalmente envolvida em nossas respostas 
ao estresse e ao pânico. O achado faz senti-
do: a maioria dos pacientes com Alzheimer 
acabava por perder até 7 0 % dos neurónios 
nessa região. Trabalhando com o psiquiatra 
B E N N E T T R E A L I Z O U , 
nas últimas duas décadas, 
grandes pesquisas 
longitudinais sobre a 
doença de Alzheimer; 
todos os participantes 
doam o cérebro após 
a morte. O acervo, 
armazenado em freezers 
especializados (esquerda), 
tem revelado pistas 
importantes sobre como 
prevenir a doença 
julho 2016 • mentecérebro 2 5 
O mistério sobre a lucidez de Marge 
Conhec i Marjorie Mason Heffernan 
e m janeiro de 2003 , quando comecei 
a recrutar part ic ipantes para o Projeto 
Rush de Memór ia e Envelhec imento e m 
u m a comunidade de aposentados , agora 
c h a m a d a Presence Bethlehem Woods , a 
40 minutos da Univers idade Rush . Não 
sei por que levamos tanto tempo para nos 
cadas t ra rmos lá , já que é prat icamente 
v i z inha da Congregação das I rmãs de St. 
Joseph , nosso pr imeiro local de pesquisa 
de Ordens Rel igiosas , onde t ínhamos 
ana l i sado part ic ipantes de estudo por uma 
década . 
U m mês após ter se registrado para 
nosso estudo, Marge - como era conhecida 
pelos amigos e famí l ia - veio para sua 
aval iação inic ial . Durante a pr imeira 
s e m a n a de março , sentei-me com ela para 
anal i sar os resultados . Aos 79 anos , estava 
mui to bem. No Mini-Exame do Estado 
Mental ( M M S E ) , teste mais amplamente 
usado para medir as capacidades cognit ivas 
tota is , t inha obtido a pontuação máx ima 
de 30. Na verdade, ela teve desempenho 
ext remamente bom em quase todos os 21testes cognit ivos que lhe ap l i camos . 
Ao longo de sete anos Marge mostrou-
se u m a voluntár ia d inâmica do estudo. 
Ela part ic ipou de uma série de subestudos 
- inc lu indo um de neuro imagem e outro 
de economia comportamenta l e tomada 
de dec isões . Ava l iamos sua cognição oito 
vezes , e cada vez ela obtinha a pontuação 
máx ima de 30 no M M S E - excluindo 
u m teste aos 80 anos , e m que ela quase 
pontuou 30 , e u m aos 84 , quando caiu para 
28 pontos . Ao final de 2010, Marge morreu 
t ranqui lamente e m sua casa , aos 87 anos , 
confortada por seu fi lho e duas sobr inhas . 
Como todos os participantes de nossa 
pesquisa, Marge havia generosamente 
doado seu cérebro. Durante a autópsia, 
constatamos que o órgão pesava 1.246 
gramas, praticamente a média para mulheres. 
Havia uma perda leve de tecido generalizada, 
o que é típico da doença de Alzheimer, e 
outras doenças neurodegenerativas que 
também podem ser observadas em cérebros 
saudáveis mais velhos. Sob o microscópio, 
seu cérebro apresentava o número suficiente 
de placas de beta-amiloides e emaranhados 
de tau compatíveis aos critérios patológicos 
da demência de Alzheimer. Não havia 
sinais de enfarte (áreas de tecido morto que 
podem indicar acidente cerebral) ou corpos 
de Lewy (marcas da doença de Parkinson 
e da demência dos corpos de Lewy). Em 
suma , os achados eram consistentes com 
um Alzheimer moderado, o que levantou a 
pergunta: Por que a cognição de Marge era 
tão boa? 
A resposta pode ser encontrada em 
sua história de v ida , que apresentava 
muitos dos fatores que nossos estudos 
indicam c o m o capazes de incrementar a 
reserva cognit iva e manter a demência a 
uma distância segura . Por exemplo, ela 
Acompanhando as mudanças cognitivas 
o em Avaliações Globais de _^ Cognição 
-2 
81 82 83 84 85 86 87 Idade 
Durante o estudo, as duas participantes foram submetidas a testes anuais de funcionamento intelectual. Embora ambas tivessem níveis semelhantes da doença, as pontuações de Marge permaneceram altas e as de Mary decaíram 
r 
t inha bom grau de instrução forrr a l , havia 
frequentado a escola por 22 anos o que era 
muito para u m a mulher nascida < m 1923. 
Ela e sua i rmã mais nova , Betty B ) rman , 
que ingressou e m nosso estudo após a 
morte de Marge , t inham se gradu ado no 
Chicago Teachers College nos anc s 40 . 
Marge era cognit iva e socialrm mte at iva. 
Betty ma i s tarde descreveu sua i rmã como 
uma leitora voraz , capaz de termi lar um 
livro e m u m dia . Ela me contou q le Marge 
t inha fundado u m clube do livro e que ela 
part icipara de u m a companhia de teatro 
local . Marge t a m b é m mant inha u na atitude 
posit iva , apesar das muitas adver: idades: 
havia enterrado dois de seus três i lhos e 
dois mar idos . 
Testes da personal idade e bem estar de 
Marge cor roboraram a descr ição de Betty. 
Ela t inha obtido uma pontuação e evada em 
"propósi to na v i d a " e consc ienc ios idade e 
baixa e m ans iedade , s in tomas dep ressivos 
e o que c h a m a m o s de evitação de danos 
(traço que engloba a t imidez , preocupação 
excessiva e p e s s i m i s m o ) . Apesar c e suas 
dores nas cos tas , Marge não era nada 
caseira e obteve a pontuação máx ima em 
"espaço de v i d a " - uma medida d< > âmbito 
geográfico da pessoa . 
É interessante contrastar Marg Í com 
outra de nossas part ic ipantes mui leres , 
a quem c h a m a m o s aqui de Mary. :1a 
t ambém se registrou aos 79 anos , como 
Marge, e conc lu iu oito aval iações < l ínicas 
anuais antes de sua morte aos 87 mos . 
O resultado de Mary na aval iação inicial 
eram firmes 28 pontos , mas decaiu para 
a metade em sua aval iação final. E a foi 
d iagnost icada com prejuízo cognit vo 
moderado aos 81 anos , demênc ia los 84 e 
A lzhe imer aos 85 . 
Na autóps ia , o cérebro de Mary pesava 
1.088 g ramas , bem menor que o d< Í Marge. 
O órgão t inha cicatr izes provenien* es de 
três pequenos enfar tes , embora não t ivesse 
nenhum histór ico de acidentes cembrais . 
Porém, como Marge, Mary revelava 
leve perda de tecido e lesões suficientes 
compat íve is aos critérios patológicos da 
doença de Alzheimer . E, cur iosamente , seu 
cérebro apresentava menos beta-amiloide e 
emaranhados do que o de Marge. 
Embora t ivesse menos indícios 
anatómicos da patologia em comparação 
co m Marge, Mary sofria de uma perda 
progressiva de cognição, que resultou 
na incapacidade de cuidar de si m e s m a 
no momento de sua morte . Apresentava 
s inais de pequenos enfartes e um pouco de 
beta-amiloide em seus vasos sanguíneos , 
e pode ter havido diferenças genéticas 
que a tornaram mais vulnerável . Mas , 
novamente , encontramos pistas para o 
seu decl ínio cognitivo em sua história 
de v ida : Mary t inha 10 anos a menos 
de escolar idade do que Marge, tendo 
somente concluído o ens ino médio . Obteve 
pontuações baixas em medidas de atividade 
cognit iva, propósito e espaço de v ida . E 
marcou muitos pontos em quesitos como 
evitação de danos , ansiedade e s intomas 
depress ivos . 
Todos os esforços para desenvolver 
terapias para prevenir A lzhe imer fa lharam 
até então, mas a comparação dessas 
duas mulheres tornou bastante vis íveis os 
efeitos protetores potenciais dos hábitos 
de vida - indo desde a escolar idade 
inicial a engajamento social numa fase 
mais avançada da v ida . Marge e Mary 
apresentavam níveis semelhantes de lesões 
relacionadas a Alzheimer , mas m e s m o 
a s s i m , seus cérebros func ionaram em 
níveis muito diferentes durante os anos 
finais de suas v idas . 
AS IRMÃS Betty Borman 
(esquerda) e Marge 
Mason Heffernan (direita) 
participaram do estudo de 
Bennett. Embora cientistas 
tenham encontrado sinais 
de Alzheimer no cérebro 
de Marge após a sua 
morte, ela nunca mostrou 
sintomas da demência 
julho 2016 • mentecérebro 2 7 
capa 
PARA SEMPRE ALICE 
(2014), com julianne 
Moore, ganhadora 
do Oscar de melhor 
atriz: filme retrata 
drama de especialista 
em neurociência 
diagnosticada com a 
demência. Embora o 
exercício intelectual seja 
um "protetor cerebral" 
poderoso, não há 
garantias de que a doença 
seja evitada (leia mais 
sobre Alzheimer precoce 
na pág. 28) 
Wil l iam Honer, da Universidade Columbia , 
descobr imos também que os que apresen-
tam degeneração mais lenta normalmente 
têm quantidades mais elevadas de proteínas 
específ icas, como a proteína de membrana 
associada à vesícula (VAMP) , complexina-l e 
complexina- l l , que ajudam a transmit ir men-
sagens através das s inapses , ou lacunas, en-
tre as células cerebrais. 
Uti l izando nossas amostras , o neurocien-
tista Bruce A. Yankner, da Universidade Har-
vard , descobriu ainda outra proteína que aju-
da a preservar ativamente nossas capacida-
des mentais . Níveis dessa proteína, chamada 
repressor elemento 1 - fator de transcrição 
ligado à diferenciação neuronal (REST, na si-
gla em inglês) , são mais elevados no cérebro 
de pessoas idosas que vivem entre 90 e 100 
anos . Talvez não surpreenda que Yankner te-
nha constatado em estudos com animais que 
R E S T protege os neurónios da morte causada 
por estresse oxidativo ou beta-amiloide, entre 
outras ameaças . Sua pesquisa demonstra que 
uma melhor cognição se correlaciona a níveis 
elevados de REST no córtex e no hipocampo, 
áreas normalmente vulneráveis à doença de 
Alzheimer. E, quando os pesquisadores de-
sat ivaram REST nos ratos, os animais come-
çaram a mostrar s inais de neurodegeneração 
típica da doença de Alzheimer. 
Nós e outros pesquisadores continuamos 
a buscar fatores bioquímicos adicionais que 
nos ajudem a proteger nossa mente à medi-
da que envelhecemos - e mais outros meca-
n ismos que a prejudiquem. Recentemente, a 
neurologista Julie Schneider, em nosso grupo 
em Rush , revelou o fato de que mais de

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