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ADDOR, C. Um homem vale um homem - memória, história e anarquismo em Edgar Rodrigues

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE 
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E FILOSOFIA 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CARLOS AUGUSTO ADDOR 
 
 
 
 
 
 
 
UM HOMEM VALE UM HOMEM 
MEMÓRIA, HISTÓRIA E ANARQUISMO NA OBRA DE EDGAR RODRIGUES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NITERÓI 
2012 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CARLOS AUGUSTO ADDOR 
 
 
 
 
 
UM HOMEM VALE UM HOMEM 
MEMÓRIA, HISTÓRIA E ANARQUISMO NA OBRA DE EDGAR RODRIGUES 
 
 
 
 
 
 
 
Tese de doutorado apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação em História da Universidade 
Federal Fluminense, como requisito parcial para 
a obtenção do grau de Doutor em História. Área 
de concentração: História Contemporânea. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Orientadora: Profª. Drª. ISMÊNIA DE LIMA MARTINS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Niterói 
2012 
 
CARLOS AUGUSTO ADDOR 
 
 
 
UM HOMEM VALE UM HOMEM 
MEMÓRIA, HISTÓRIA E ANARQUISMO NA OBRA DE EDGAR RODRIGUES 
 
 
Tese de doutorado apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação em História da Universidade 
Federal Fluminense, como requisito parcial para 
a obtenção do grau de Doutor em História. Área 
de concentração: História Contemporânea. 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
__________________________________________________________________________ 
Profª. Drª. ISMÊNIA DE LIMA MARTINS – Orientadora 
Universidade Federal Fluminense 
 
 
__________________________________________________________________________ 
Prof. Dr. JORGE LUÍS FERREIRA 
Universidade Federal Fluminense 
 
 
__________________________________________________________________________ 
Prof. Dr. FREDERICO ALEXANDRE DE MORAES HECKER 
Universidade Mackenzie 
 
 
__________________________________________________________________________ 
Profª. Drª. MAGALI GOUVEIA ENGEL 
Universidade do Estado do Rio de Janeiro 
 
 
__________________________________________________________________________ 
Prof. Dr. ALEXANDRE RIBEIRO SAMIS 
Colégio Pedro II 
 
Suplentes 
 Profa. Dra. DENISE ROLLEMBERG (UFF) 
Profa. Dra. ÂNGELA MARIA ROBERTI MARTINS (UERJ) 
 
 
Niterói 
2012 
 
 
 
 
 
 
 
Para Alexandre, meu pai (in memoriam) e Altair, minha mãe (in memoriam), 
que tanto me amaram, que tanto me ensinaram. 
 
 
 Para Ana Lúcia, mais uma vez, com amor. 
 
 
 Com amor, também mais uma vez, para minhas filhas Elisa e Laura, 
minha vida que segue... 
 
 
 À memória de Afonso Carlos Marques dos Santos e Francisco Medeiros Soeiros, 
 historiadores, queridos amigos, e de Ana Cristina César, poeta, amiga querida. 
 
 
 Para José Saramago e Lima Barreto. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
 
A elaboração de uma tese de doutorado é sempre um processo longo e complexo. No 
meu caso, foi um processo duplamente longo e complexo. Portanto, há muitas pessoas a 
agradecer, e não pretendo poupar palavras, nem páginas. 
Meu primeiro agradecimento é para minha orientadora, a Professora Ismênia de Lima 
Martins. Sua orientação serena e segura, sem me pressionar nem, a cada momento, cobrar 
resultados parciais, foi fundamental para o êxito dessa empreitada. Conheço Ismênia, e posso 
dizer que somos, além de colegas de trabalho, amigos, há décadas, desde os anos setenta. A 
professora participou, ao longo da minha formação intelectual e da minha vida acadêmica, de 
nada menos que seis bancas. Em 1974, a Professora Ismênia esteve na banca de concurso ao 
mestrado da UFF e, em 1976, na banca – momento fundamental na minha vida profissional – 
de concurso público para o corpo docente do Departamento de História da Universidade 
Federal Fluminense, na área de História do Brasil, ou seja, para a carreira do magistério 
público federal. Em setembro de 1985, quando defendi, no programa da UFF, minha 
dissertação de mestrado, Rio de Janeiro, 1918: a Insurreição Anarquista, a Professora 
Ismênia Martins estava na banca, que recomendou a publicação do trabalho, ao lado dos 
saudosos colegas Victor Vincent Valla (então meu orientador) e Eulália Lahmeyer Lobo. Na 
virada de 2007 para 2008, quando decidi retomar o projeto do doutorado, Ismênia estava na 
banca do concurso para a área de História Contemporânea II. Em março de 2011, já como 
minha orientadora, a professora estava, naturalmente, na banca do exame de qualificação. E 
agora, abril de 2012, na banca de defesa da tese de doutorado. Neste último trabalho, a 
Professora Ismênia sugeriu o tema – um estudo da obra de Edgar Rodrigues, memorialista do 
anarquismo – e, ao longo do processo de elaboração da tese, fez importantes indicações e 
sugestões. Obrigado por tudo, Ismênia. 
Agradeço ao Professor Jorge Ferreira, meu ex-aluno, e colega, já há muitos anos, no 
departamento de História da UFF. Jorge, ao lado de Ismênia, foi quem mais me incentivou a 
retomar o doutorado, depois de uma experiência não concluída, por razões basicamente de 
ordem pessoal, na Unicamp. A bibliografia de seu curso sobre “A Experiência Democrática 
no Brasil (1945-1964) – Historiografia e História” foi importante para a elaboração dos 
Capítulos 4 e 5 da minha tese; além disso, algumas de suas sugestões e propostas 
encaminhadas no exame de qualificação foram incorporadas à tese. 
O Professor Alexandre Hecker também fez valiosas sugestões e propostas para 
aprimorar o meu trabalho, não só no exame de qualificação, como também numa posterior 
conversa informal. Obrigado, Alexandre. 
Agradeço a Professora Magali Engel, também minha ex-aluna e também historiadora 
brilhante e reconhecida, por ter aceitado o convite para participar da banca de defesa da minha 
tese de doutorado. Temos, Magali e eu, assim acredito, afinidades ideológicas, 
historiográficas e literárias, dentre as quais o apreço pela obra de Lima Barreto. 
Agradeço o Professor Alexandre Samis, historiador e militante do anarquismo, autor 
de belas teses sobre a Clevelândia e sobre Neno Vasco, companheiro no processo de fundação 
do Grupo de Estudos do Anarquismo (GEA), e em vários colóquios sobre o anarquismo, 
também por aceitar o convite para participar da banca de defesa da tese de doutorado. Samis 
também me emprestou seu exemplar do livro, esgotado, de Edgar Rodrigues, Na Inquisição 
do Salazar. 
Em 2008 a Professora Denise Rollemberg ofereceu, no programa da UFF, o curso 
“Memória, História e outros conceitos: uma revisão historiográfica do Tempo Presente”. O 
curso, centrado nas discussões em torno da França ocupada pela Alemanha nazista, foi para 
mim de grande proveito, principalmente no que diz respeito às leituras e debates sobre teoria e 
metodologia da história, as relações entre memória e história e as reflexões em torno da 
chamada história do tempo presente. Agradeço a Denise pelo curso, pela sugestão de algumas 
outras leituras e também por aceitar a indicação de seu nome para compor a suplência da 
banca de defesa da tese. 
Agradeço a Professora Ângela Roberti Martins, que gentilmente me cedeu uma cópia 
da Musa Libertária, de Lily Litvak; e também aceitou a indicação de seu nome para compor a 
suplência da banca. 
Alguns amigos dos tempos do IFCS/UFRJ, anos setenta, sempre me estimularam a 
retomar e concluir o doutorado. Agradeço a José Ricardo Ramalho (meu compadre), 
sociólogo, e a Lana Lage e Leila Duarte, historiadoras. 
Dos tempos do IFCS vem a amizade com Guilherme Neves e Humberto Machado, 
hoje colegas na UFF, que também sempre me incentivaram no mesmo sentido. Obrigado aos 
dois. 
Alguns amigos da UFF também me incentivaram a concluir a tese. Agradeço então a 
Luiz Carlos Soares, Théo Piñeiro, André Luiz Campos (hoje na UERJ), Carlos Gabriel 
Guimarães, Luis Felipe Neves e Fernando Faria. 
Agradeço a Ronaldo Vainfas, que me emprestou um exemplar de seu instigante livro 
sobre a Micro-história, e também me sugeriu, há anos, a (re)leitura dos Combates pela 
História, de Lucien Febvre. 
Meu agradecimentoa Fernanda Bicalho e a Georgina Santos, com quem, em 
diferentes momentos e ocasiões, troquei impressões e opiniões sobre a obra de José 
Saramago. 
Ao amigo Francisco José Silva Gomes, ex-colega na UFF (e também no Colégio 
Estadual Amaro Cavalcanti) por vários anos, agradeço a lembrança da Livraria Camões, onde 
encontrei vários bons livros sobre a história da República Portuguesa. 
Agradeço as amigas e colegas da UFF Mariza Soares (minha vice-chefe de 
departamento no biênio 2000-2002), Regina Celestino e Cecília Azevedo, que nos sucederam 
na chefia, pelo estímulo para retomar e concluir o doutorado. 
O colega Marcelo Badaró gentilmente me cedeu um exemplar da tese, por ele 
orientada no programa da UFF, de Tiago Bernardon sobre o anarquismo no Brasil; e também 
foi suplente da banca do exame de qualificação. Obrigado, Marcelo. 
Agradeço ao amigo e colega do departamento de Ciência Política da UFF, Cláudio 
Farias Augusto, companheiro de viagens ao PURO, que também gentilmente me cedeu uma 
cópia do livro, esgotado, de Edgar Rodrigues, O Retrato da Ditadura Portuguesa. 
Muitos amigos e/ou colegas (ou ainda, ex-colegas) do departamento de História da 
UFF também me deram “força”, em vários sentidos, para concluir o doutorado. Seguem os 
agradecimentos: Ana Mauad, Angela Gomes, Antonio Edmilson Rodrigues, Bernardo 
Kocher, Cezar Honorato, Daniel Aarão Reis, Fátima Gouveia (in memoriam), Gizlene Neder, 
Gladys Ribeiro, Hebe Mattos, Helena Muller, Ilmar Rohloff de Mattos, Jorge Miguel Mayer, 
Laura Maciel, Leandro Konder, Luciano Figueiredo, Manuel Rolph, Marcelo Bittencourt, 
Márcia Motta, Marco Pamplona, Marcos Alvito, Margarida Neves, Mario Grynzspan, Martha 
Abreu, Norberto Ferreras, Paulo Knauss, Rachel Soihet, Rogério Ribas (in memoriam), 
Ronald Raminelli, Sheila de Castro Faria, Sonia Mendonça, Sonia Rebel, Vânia Fróes e 
Virgínia Fontes. 
Agradeço também a outros amigos e/ou colegas do ICHF, pelo mesmo incentivo: Ana 
Motta, Antonio Serra, Bárbara França, Francisco Palharini, José Novaes, Luis Carlos 
Fridman, Márcia Moraes, Maria Lúcia Pontual, Maurício Martins e Renato Lessa . 
Agradeço a Robson Achiamé, editor, com quem adquiri muitos livros, alguns raros 
e/ou esgotados, de Edgar Rodrigues, ampliando assim consideravelmente meu acervo pessoal 
sobre a obra do autor estudado na tese de doutorado; e a Renato Ramos, pesquisador do 
anarquismo, que xerocou para mim algumas obras de Edgar Rodrigues, também raras, 
pertencentes ao acervo da Biblioteca Social Fábio Luz. 
Agradeço, mais uma vez, aos meus irmãos Alex (Alexandre Addor Neto), Mario 
(Augusto Addor) e Avelina (Addor), por nossa longa e sólida amizade, sempre renovada. 
Alex foi importante na minha formação intelectual, e também para duas opções que fiz, ainda 
bem jovem: uma, profissional, pelas Ciências Humanas e pela História; outra, política e 
existencial, pela esquerda. Um abraço, Alex, do irmão caçula, extensivo aos manos Mario e 
Avelina. 
Agradeço ao meu sogro (e amigo) Nicolau Mader, por muitas boas conversas, 
inclusive sobre história do Brasil, algumas vezes regadas por vinhos de excelente qualidade. E 
também aos meus enteados Luiza e Leonardo e ao meu sobrinho Alexandre, aos quais amo 
(quase) como meus filhos, pelos anos de amistosa convivência. Agradeço ainda ao amigo José 
Luiz Mader, pelas ótimas conversas e caminhadas. 
A Moacyr Fonseca, amigo desde os tempos do Colégio Pedro II, no Humaitá, anos 
sessenta, agradeço o incentivo. E também aos amigos de infância ou de juventude, Álvaro 
Machado, Heros Vital Brazil, Marco van Hombeck, Eliane Costa e Paulo César Bottas. 
Agradeço a Renata Bondim, que formatou a primeira versão de uma parte da tese, 
encaminhada ao exame de qualificação. E a Maria Cristina Jeronimo, que fez uma excelente 
revisão da versão final da tese. Laura Addor também ajudou na revisão: obrigado, Laurinha. 
Quero agradecer aos servidores técnico-administrativos da área de História, ou do 
ICHF, da UFF, Silvana, Inez, Haydée, Lívia, Etelma, Joceli, Roberto, David, Rafael, Manuel 
e Tião, por sua amizade e solicitude. 
Agradeço às colegas do doutorado, Cacilda Sayuri, Janaína Cordeiro e Luíza Lamarão, 
pelo incentivo para a conclusão da tese. E também às ex-alunas do curso de graduação em 
História da UFF, Mariana Affonso Penna e Priscila Carvalho, que participaram da fase inicial 
da pesquisa sobre a obra de Edgar Rodrigues. 
Um agradecimento (tardio) à CAPES. No final dos anos oitenta, início dos noventa, 
com licença da UFF vinculada ao PICD, comecei a cursar o doutorado em História Social do 
Trabalho na Universidade Estadual de Campinas, instituição onde fui muito amistosamente 
acolhido. Completei os créditos e cheguei a esboçar um projeto de tese, que seria naquela 
ocasião sobre a Esquerda Democrática, um dos núcleos (re)fundadores do Partido Socialista 
Brasileiro, nos anos quarenta. Entretanto, por razões basicamente de ordem pessoal, não 
consegui concluir a tese. Penso que agora, apresentando esta tese no programa de doutorado 
em História da Universidade Federal Fluminense, estou saldando essa dívida institucional; e 
também, e talvez principalmente, uma dívida comigo mesmo. 
De qualquer forma, fiz na Unicamp excelentes cursos, e aproveito a oportunidade para 
agradecer (também tardiamente) aos Professores Marilena Chauí, Edgar de Decca, Marco 
Aurélio Garcia e Michael Hall, que seria (começou a ser) meu orientador. Agradeço também a 
alguns colegas do doutorado na Unicamp: Regina Beatriz Guimarães, em cuja casa nosso 
grupo preparou um seminário sobre Claude Lefort para o curso da Marilena; Osvaldo 
Machado, que gentilmente me cedeu um exemplar do Boletim da Comissão Executiva do 
Terceiro Congresso Operário Brasileiro, documento que usei nesta tese; Carlos Roberto 
(Beto) Horta, da Universidade Federal de Minas Gerais, companheiro de muitas viagens no 
trajeto Campinas – São Paulo; Miriam Baía, que nos hospedou (a mim e ao Beto) algumas 
vezes em Campinas. 
Agradeço ao meu primo, e amigo, Eduardo Alberto Addor, que, quando eu estudava 
na Unicamp, me hospedou inúmeras vezes em sua casa em São Paulo; e a outro primo, 
também amigo, João Celestino Correa Cardozo Neto, que confirmou para mim algumas 
informações sobre nossos ascendentes portugueses. 
Agradeço aos meus genros, Uirá Bueno e Tiago Tostes, que me ajudaram a trocar o 
cartucho da impressora nova. Confesso ter uma certa dificuldade para colocar em prática o 
princípio da pedagogia libertária da articulação do trabalho intelectual com o trabalho manual. 
E também a Aldo José Ribeiro, sempre eficiente e atencioso na manutenção, há anos, do meu 
computador. 
Mais um importante agradecimento: a Sérgio Freitas, meu terapeuta, doutor em 
Psicanálise e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro; seu apoio e incentivo 
foram fundamentais para o êxito dessa longa empreitada. Agradeço também ao meu médico 
homeopata, Maurício Tatar, que muito tem contribuído para manter minha saúde em bom 
estado. 
Por fim, agradeço a Oscar Zola dos Santos Correia, filho de Edgar Rodrigues, que 
gentilmente me prestou algumas informações sobre a sua família. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 “SER HISTORIADOR É, PELO CONTRÁRIO, NUNCA SE RESIGNAR.” 
Lucien Febvre 
 
 
 
“AO PODER, A PRIMEIRA COISA QUE SE DIZ É ‘NÃO’. 
NÃO POR SER UM ‘NÃO’, MAS PORQUE O PODER TEM DE SER PERMANENTEMENTE VIGIADO. 
O PODER TEM SEMPRE TENDÊNCIA PARA ABUSAR, PARA EXORBITAR.” 
José Saramago 
 
 
 
“O ÚNICO VERDADEIRO REALISTA É O VISIONÁRIO.” 
Federico Fellini 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
 
 
 
O tema desta tese é a obra de Edgar Rodrigues, memorialista do anarquismo no Brasil e em 
Portugal. A partir da análise da obra deste autor, composta por mais de cinquenta livros e 
cerca de mil e oitocentosartigos, publicados, tanto os livros como os artigos, em vários 
países, e produzida ao longo de um período que ultrapassa cinco décadas, procuramos 
escrever, ou reescrever, uma história do anarquismo e de suas relações com o movimento 
operário e sindical no Brasil, num recorte cronológico bastante amplo, que se estende da 
Proclamação da República, em 1889 até o Golpe Civil-Militar de 1964. Buscamos sempre 
relacionar a obra de Edgar Rodrigues à sua vida e ao contexto histórico no qual o autor viveu 
e produziu: num primeiro momento, Portugal, do seu nascimento em 1921 até a migração 
para o Brasil, em 1951. Desse ano, e até a sua morte em 2009 na cidade do Rio de Janeiro, 
trabalhamos com a vida e, principalmente, com a vasta obra de Edgar Rodrigues, produzida, 
em sua quase totalidade, nesse segundo momento, no país que o acolheu, e onde se 
naturalizou brasileiro. Pensamos que a tese pode contribuir para estudos, pesquisas e debates, 
não só sobre a obra de Edgar Rodrigues, mas também sobre a história do anarquismo, em 
especial no Brasil, e seus valores fundamentais: socialismo e liberdade. 
 
 
Palavras-chave: Edgar Rodrigues; Anarquismo; Classe e movimento operário; Sindicalismo; 
História e memória. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
 
 
The theme of this thesis is the work of Edgar Rodrigues, memoirist of anarchism in Brazil and 
Portugal. Based on the analysis of his work, which is composed of over fifty books and about 
eighteen hundred articles – published, both books and articles, in many countries – and 
produced over a period exceeding five decades, we write, or rewrite, a history of anarchism 
and its relations with the labor movement and unions in Brazil in quite a broad chronological 
cut, extending from the Proclamation of the Republic, in 1889, to the 1964 Civil-Military 
Coup. We try to relate Edgar Rodrigues’s work to his life and the historical context in which 
he lived and produced: firstly, Portugal, from his birth in 1921 until he migrated to Brazil in 
1951. Then, from this year, and until his death in 2009 in the city of Rio de Janeiro, we work 
with his life and, especially, with his extensive work, produced almost entirely in this second 
stage, in the country that sheltered him and where he naturalized Brazilian. We think that this 
thesis can contribute to studies, researches and debates, not only about his work, but also 
about the history of anarchism, particularly in Brazil, and its core values: socialism and 
freedom. 
 
 
Keywords: Edgar Rodrigues; Anarchism; Class and labor movement; Unions; History and 
memory. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO.....................................................................................................................14 
 
1. EDGAR RODRIGUES, PESQUISADOR INSTINTIVO................................................28 
 
2. A PLANTA EXÓTICA: ANARQUISMO E MOVIMENTO OPERÁRIO NAS 
PRIMEIRAS DÉCADAS DA REPÚBLICA (1889-1913)...................................................70 
 2.1 Antecedentes do anarquismo e formação da classe operária.......................................71 
 2.2 Anarquismo e movimento operário: divulgando ideias, mobilizando, organizando – do 
início do século XX ao Segundo Congresso Operário Brasileiro (1901-1913)....................94 
 
3. O JOIO E O TRIGO: ANARQUISMO E MOVIMENTO OPERÁRIO NAS ÚLTIMAS 
DÉCADAS DA PRIMEIRA REPÚBLICA (1913-1930)...................................................133 
 3.1 Anarquismo e movimento operário: ascenso e visibilidade – do Segundo Congresso 
Operário Brasileiro à fundação do PCB (1913-1922)........................................................134 
 3.2 Anarquismo e movimento operário: descenso e transição – da fundação do PCB à 
Revolução de Trinta (1922-1930).......................................................................................209 
 
4. TEMPOS DIFÍCEIS: ANARQUISMO NA ERA VARGAS (1930-1945)...................244 
 4.1 O anarquismo diante da polarização direita versus esquerda (1930-1937)..............245 
 4.2 Anarquismo e ditadura (1937-1945).........................................................................272 
 
5. A NOVA AURORA LIBERTÁRIA: ANARQUISMO E EXPERIÊNCIA 
DEMOCRÁTICA (1945-1964)........................................................................................287 
 5.1 Ressurgindo do silêncio (1945-1954).....................................................................288 
 5.2 Reafirmando valores (1954-1964)..........................................................................326 
 
CONCLUSÃO.................................................................................................................348 
 
 
 
6. BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................357 
 6.1 Obras de Edgar Rodrigues......................................................................................358 
 6.2 Outras fontes primárias...........................................................................................360 
 6.2.1 Periódicos...................................................................................................360 
 6.2.2 Relatórios...................................................................................................361 
 6.2.3 Fontes oficiais............................................................................................361 
 6.3 Obras sobre Anarquismo, Socialismo e movimento operário.................................362 
 6.4 Obras sobre o Brasil República e a República Portuguesa......................................377 
 6.5 Obras de referência teórico-metodológica...............................................................384 
 
7. ANEXOS......................................................................................................................387 
 7.1 Troca de correspondências..................................................................................388 
 7.2 Diversos...............................................................................................................396 
 
 
 
 
 
 
 
CARLOS AUGUSTO ADDOR 
 
 
 
 
 
UM HOMEM VALE UM HOMEM 
MEMÓRIA, HISTÓRIA E ANARQUISMO NA OBRA DE EDGAR RODRIGUES 
 
 
 
 
 
 
 
Tese de doutorado apresentada ao Programa de 
Pós-Graduação em História da Universidade 
Federal Fluminense, como requisito parcial para 
a obtenção do grau de Doutor em História. Área 
de concentração: História Contemporânea. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Orientadora: Profª. Drª. ISMÊNIA DE LIMA MARTINS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Niterói 
2012 
 
RESUMO 
 
 
 
 
O tema desta tese é a obra de Edgar Rodrigues, memorialista do anarquismo no Brasil e em 
Portugal. A partir da análise da obra deste autor, composta por mais de cinquenta livros e 
cerca de mil e oitocentos artigos, publicados, tanto os livros como os artigos, em vários 
países, e produzida ao longo de um período que ultrapassa cinco décadas, procuramos 
escrever, ou reescrever, uma história do anarquismo e de suas relações com o movimento 
operário e sindical no Brasil, num recorte cronológico bastante amplo, que se estende da 
Proclamação da República, em 1889 até o Golpe Civil-Militar de 1964. Buscamos sempre 
relacionar a obra de Edgar Rodrigues à sua vida e ao contexto histórico no qual o autor viveu 
e produziu: num primeiro momento, Portugal, do seu nascimento em 1921 até a migração 
para o Brasil, em 1951. Desse ano, e até a sua morte em 2009 na cidade do Rio de Janeiro, 
trabalhamos com a vida e, principalmente, com a vasta obra de Edgar Rodrigues, produzida, 
em sua quase totalidade, nesse segundo momento, no país que o acolheu, e onde se 
naturalizou brasileiro. Pensamos que a tese pode contribuir para estudos, pesquisas e debates, 
não só sobre aobra de Edgar Rodrigues, mas também sobre a história do anarquismo, em 
especial no Brasil, e seus valores fundamentais: socialismo e liberdade. 
 
 
Palavras-chave: Edgar Rodrigues; Anarquismo; Classe e movimento operário; Sindicalismo; 
História e memória. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO.....................................................................................................................14 
 
1. EDGAR RODRIGUES, PESQUISADOR INSTINTIVO................................................28 
 
2. A PLANTA EXÓTICA: ANARQUISMO E MOVIMENTO OPERÁRIO NAS 
PRIMEIRAS DÉCADAS DA REPÚBLICA (1889-1913)...................................................70 
 2.1 Antecedentes do anarquismo e formação da classe operária.......................................71 
 2.2 Anarquismo e movimento operário: divulgando ideias, mobilizando, organizando – do 
início do século XX ao Segundo Congresso Operário Brasileiro (1901-1913)....................94 
 
3. O JOIO E O TRIGO: ANARQUISMO E MOVIMENTO OPERÁRIO NAS ÚLTIMAS 
DÉCADAS DA PRIMEIRA REPÚBLICA (1913-1930)...................................................133 
 3.1 Anarquismo e movimento operário: ascenso e visibilidade – do Segundo Congresso 
Operário Brasileiro à fundação do PCB (1913-1922)........................................................134 
 3.2 Anarquismo e movimento operário: descenso e transição – da fundação do PCB à 
Revolução de Trinta (1922-1930).......................................................................................209 
 
4. TEMPOS DIFÍCEIS: ANARQUISMO NA ERA VARGAS (1930-1945)...................244 
 4.1 O anarquismo diante da polarização direita versus esquerda (1930-1937)..............245 
 4.2 Anarquismo e ditadura (1937-1945).........................................................................272 
 
5. A NOVA AURORA LIBERTÁRIA: ANARQUISMO E EXPERIÊNCIA 
DEMOCRÁTICA (1945-1964)........................................................................................287 
 5.1 Ressurgindo do silêncio (1945-1954).....................................................................288 
 5.2 Reafirmando valores (1954-1964)..........................................................................326 
 
CONCLUSÃO.................................................................................................................348 
 
 
 
6. BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................357 
 6.1 Obras de Edgar Rodrigues......................................................................................358 
 6.2 Outras fontes primárias...........................................................................................360 
 6.2.1 Periódicos...................................................................................................360 
 6.2.2 Relatórios...................................................................................................361 
 6.2.3 Fontes oficiais............................................................................................361 
 6.3 Obras sobre Anarquismo, Socialismo e movimento operário.................................362 
 6.4 Obras sobre o Brasil República e a República Portuguesa......................................377 
 6.5 Obras de referência teórico-metodológica...............................................................384 
 
7. ANEXOS......................................................................................................................387 
 7.1 Troca de correspondências..................................................................................388 
 7.2 Diversos...............................................................................................................396 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
________________________________________________________________INTRODUÇÃO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“FORA DA HISTÓRIA NÃO HÁ NADA.” 
 
“TUDO O QUE SOMOS, HERDAMOS E TRANSFORMAMOS PARA PASSAR AOS OUTROS. 
NESTA PERSPECTIVA, TODA A HISTÓRIA É HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA.” 
José Saramago 
 
“A HISTÓRIA É UMA LUTA CONTRA A MORTE.” 
 
“AQUILO QUE PROCURO LEMBRAR E LEMBRAR-ME É UMA MEMÓRIA. 
AQUILO QUE ME ESFORÇO POR CONSTRUIR É UMA HISTÓRIA.” 
Jacques Le Goff 
 
“A MEMÓRIA É DEVERAS UM PANDEMÔNIO, MAS ESTÁ TUDO LÁ DENTRO, 
DEPOIS DE FUÇAR UM POUCO O DONO É CAPAZ DE ENCONTRAR TODAS AS COISAS.” 
Chico Buarque 
 15 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Esta é uma tese sobre a obra e a vida de Edgar Rodrigues, memorialista do anarquismo 
no Brasil e em Portugal. Inverti propositalmente a formulação mais frequente do binômio, 
presente em teses ou livros que também estudam a vida e a obra de um autor – vida e obra de 
Karl Marx, vida e obra de Lima Barreto, dentre inúmeros possíveis exemplos – apenas para 
afirmar o caráter do trabalho. Trata-se de uma tese mais sobre a obra do que sobre a vida de 
Edgar Rodrigues. Na verdade, um trabalho sobre alguns aspectos – aqueles que nos pareceram 
mais importantes – de sua vasta obra, que não pretendemos, nem acreditamos ser possível, 
“esgotar” nos limites de um trabalho acadêmico. 
É claro que, até certo ponto, vida e obra estão sempre entrelaçadas, são indissociáveis. 
Entretanto, cada uma delas possui e guarda uma relativa autonomia. A vida, obviamente, 
precede cronologicamente a obra, a elaboração da obra. Entretanto, a vida humana é tão 
efêmera, enquanto a obra, sobretudo a obra relevante, a obra de qualidade, pode, como 
sabemos, sobreviver a séculos, preservando sua importância e mesmo sua atualidade. Afinal, 
“a obra feita é sempre maior do que quem a fez”. (SARAMAGO, 2010, p. 145). 
Talvez seja o caso da obra do autor que escolhi estudar, Edgar Rodrigues, 
recentemente falecido, no Rio de Janeiro, em junho de 2009, aos 88 anos. Penso que sua obra 
sobrevive, e permanecerá por longo tempo contribuindo para os estudos, pesquisas e trabalhos 
sobre o anarquismo e o movimento operário e sindical, no Brasil e em Portugal. 
Esta é apenas uma advertência inicial ao leitor, no sentido de deixar claro que a tese 
não é uma biografia, um estudo da vida, de Edgar Rodrigues. Entretanto, certamente 
consultamos, pesquisamos e apresentamos, ao longo do trabalho, dados biográficos que nos 
pareceram imprescindíveis ou, ao menos, relevantes para as nossas reflexões e para a 
elaboração de nossas conclusões. 
 16 
Nesse sentido, acreditamos ser importante comentar as relações entre a biografia e a 
história. Dois autores, Giovanni Levi e Philippe Levillain, foram importantes para as nossas 
reflexões sobre o tema. O primeiro, que fala do “recente entusiasmo dos historiadores pela 
biografia e pela autobiografia”, enfatiza a “relação permanente e recíproca entre biografia e 
contexto”. (LEVI, 2006, p. 168-180). Levillain, num ensaio mais denso e instigante, elabora 
uma interessante reflexão sobre as relações entre a história, a literatura e a biografia, e 
conclui: “A biografia é o lugar por excelência da pintura da condição humana em sua 
diversidade, se não isolar o homem ou não exaltá-lo às custas de seus dessemelhantes”. 
(LEVILLAIN, 1996, p. 176). 
Procuramos, então, nesta tese, analisar a obra de Edgar Rodrigues, relacionando, 
sempre, a sua produção à vida do autor e ao contexto histórico no qual ele viveu e produziu. 
Três trabalhos recentes articulam biografia e história, no campo das reflexões sobre o 
anarquismo, e foram importantes referências para a elaboração da nossa tese. São eles: Entre 
a história e a liberdade: Luce Fabbri e o anarquismo contemporâneo, de Margareth Rago 
(RAGO, 2000); Oreste Ristori: uma aventura anarquista, de Carlo Romani (ROMANI, 
2002); e Minha pátria é o mundo inteiro: Neno Vasco, o anarquismo e o sindicalismo 
revolucionárioem dois mundos, de Alexandre Samis (SAMIS, 2009), este último resultante 
de uma tese de doutorado defendida na Universidade Federal Fluminense. Ainda no campo da 
biografia, duas outras obras, indiretamente relacionadas ao anarquismo, foram para mim 
fontes inspiradoras: Marx: vida e obra, de Leandro Konder (KONDER, 1999); e A vida de 
Lima Barreto, de Francisco de Assis Barbosa (BARBOSA, 1981). 
Uma tese sobre aspectos da história, e da memória, do anarquismo no Brasil se 
inscreve, certamente, no âmbito de uma história política. Tentamos, então trabalhar com 
referências de uma história política renovada, que já incorporou as críticas da École des 
Annales a uma história política tradicional, conservadora, que privilegiava as datas, as guerras 
e batalhas, os reis e generais. Em suma, nessa história política renovada, a política aparece – 
na genial imagem braudeliana – como “espuma”, móvel, rápida, leve e frágil, flutuando na 
superfície do profundo, lento, vasto e denso mar da economia.1 
Entretanto, mesmo essa história política renovada continua a ter como referência 
central o Estado, seus fundamentos, suas bases, a origem de sua legitimidade, seus 
procedimentos e mecanismos de funcionamento. Em suma, democracia, ditadura, república, 
liberalismo, cidadania, soberania popular, partidos, parlamentos, eleições, opinião pública, 
 
1 Ver FEBVRE, Lucien, “Esperanças à chegada: caminhando para uma outra história”. In: ______. Combates 
pela história. Lisboa: Editorial Presença, 1989. 
 17 
estes são os temas e questões centrais da nova história política.2 Ora, este é exatamente o 
universo que o anarquismo rejeita, que o pensamento libertário recusa. 
Recusando a luta política institucional, o anarquismo privilegia a luta econômica e a 
luta cultural-ideológica. Errico Malatesta escreveu: “Por luta política, entendemos a luta 
contra o governo”. (MALATESTA, 2000, p. 22). Penso que as relações entre anarquismo e 
história política estão bem sintetizadas na seguinte passagem de George Woodcock: 
 
Os anarquistas sempre repudiaram a ação política, afirmando que a máquina do 
Estado não deve ser tomada, mas abolida; que a revolução social não deve levar à 
ditadura de qualquer classe, mesmo do proletariado, mas à abolição de todas as 
classes. Tal atitude pode na verdade ser descrita como antipolítica, mas, assim como 
antiutopias tais como o Admirável Mundo Novo e 1984 fazem parte da literatura 
utópica, a antipolítica dos anarquistas faz parte da história política, condicionada 
pelas próprias instituições governamentais contra as quais luta. (WOODCOCK, 
1983, p. 27). 
 
 
Assim, o anarquismo, mesmo recusando a luta política, se inscreve na história política. 
De forma análoga, a cultura anarquista também pode ser pensada como uma cultura 
política específica. A noção de cultura anarquista compreende um conjunto de valores e 
princípios – liberdade, igualdade, fraternidade, solidariedade, autonomia individual – que 
integram a visão de mundo libertária, bem como um conjunto de instituições e atividades que 
procuram criar, produzir e/ou divulgar esses valores e princípios, tais como: centros de cultura 
social, bibliotecas, jornais e revistas, escolas modernas, livres e racionais, grupos de teatro 
amador, festas e festivais operários. Este conjunto de instituições e atividades culturais tem 
por finalidade forjar e/ou reforçar consciências revolucionárias, em suma, formar o homem 
novo. Ou seja, a cultura, assim como a arte, estaria a serviço da revolução. 
Creio que o trabalho de Edgar Rodrigues se inscreve nesse processo bem mais amplo, 
e permanente, de construção de uma cultura libertária e, mais especificamente, de uma 
memória anarquista. Nesse sentido, é certo que o conceito de memória, bem como as relações 
entre a história e a memória, serão fundamentais para a análise da obra de um autor que estou 
tentando caracterizar como um memorialista do anarquismo. Já se vê que não se trata das 
memórias pessoais de Edgar Rodrigues, das memórias de sua vida privada, mas sim da sua 
participação no processo de construção da memória de um movimento social, ou seja, esse 
trabalho se dá exatamente “nos níveis em que o individual se enraíza no social e no coletivo”. 
(NORA, 1984, p. 44). Num sentido semelhante, afirma Henry Rousso: “A memória coletiva 
 
2 Ver RÉMOND, René (Org.), Por uma história política. Rio de Janeiro: UFRJ/FGV, 1996. 
 18 
não pode se compreender sem a memória individual [...]. A memória individual como a 
memória coletiva têm por particularidade preservar uma identidade”. (ROUSSO, 1998, p. 19). 
Jacques Le Goff também trabalha com o conceito de memória, articulando-o à luta 
política, à luta pelo domínio: 
 
Tornar-se senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes 
preocupações das classes, dos grupos, dos indivíduos que dominaram e dominam as 
sociedades históricas. Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores 
desses mecanismos de manipulação da memória coletiva. (LE GOFF, 1984, p. 13). 
 
Em suma, o processo de construção de uma memória do anarquismo é um processo ao 
mesmo tempo individual e coletivo; e o estudo desse processo se inscreve no campo de uma 
história que é, ao mesmo tempo, política e cultural. 
Henry Rousso elabora também reflexões a nosso ver importantes sobre as relações que 
podem ser engendradas entre o processo de construção/elaboração de uma memória e o 
processo de construção/preservação da identidade de um grupo social; seja este grupo 
definido a partir de critérios étnicos e/ou políticos, religiosos, regionais, socioeconômicos. 
Grupos sociais longa e/ou violentamente excluídos da História, ou mesmo politicamente 
derrotados, passam a reivindicar um lugar no espaço público não apenas através de uma ação 
política, mas também “por uma reapropriação de um passado, de uma história específica, 
pensada como singular e distinta da história geral, por exemplo da história nacional”. Esses 
grupos tenderão a “querer escrever eles mesmos sua história, fora dos circuitos habituais, 
oficiais, da Universidade [...]”. (ROUSSO, 1998, p. 32). 
Ora, esta é uma preocupação e um objetivo central de Edgar Rodrigues ao produzir 
sua obra: escrever uma história (uma memória) alternativa dos movimentos e das lutas 
sociais, para além de uma “história acadêmica”, fora dos cânones daquela que seria, na sua 
visão, uma “história oficial”, a produzida pelas universidades. Uma história “verdadeira”, que 
viesse valorizar o papel dos anarquistas e dos trabalhadores. São inúmeros os comentários 
depreciativos de Rodrigues em relação a essa “história acadêmica”, em algumas passagens 
conferindo mesmo a ela um suposto conteúdo “de classe” e/ou uma suposta dimensão 
“burguesa”. 
Outra autora cujas considerações sobre a memória foram importantes para as minhas 
próprias reflexões é Ecléa Bosi. É de sua autoria o seguinte trecho: “Na maior parte das vezes, 
lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e ideias de hoje, as 
experiências do passado. A memória não é sonho, é trabalho”. (BOSI, 1983, p. 17). 
 19 
Penso que a obra de Edgar Rodrigues sobre o anarquismo, e também minha leitura 
sobre sua obra, se apoiam, ou podem se apoiar, nessa concepção da memória como trabalho. 
E, mais que isso, a memória, e também a escrita, como missão e como militância. Assim 
como Nicolau Sevcenko3 considera – e fundamenta essa consideração com um belo estudo – 
que para Euclides da Cunha e Lima Barreto a literatura é uma missão, o autor desta tese 
pretende fazer o mesmo: fundamentar ao longo do trabalho que para Edgar Rodrigues a 
escrita é, também, uma missão: uma missão que, na prática, se traduz e se transforma numa 
militância de toda uma vida. 
Edgar Rodrigues não é, no sentido clássico do termo, um intelectual.Autodidata, ele 
mesmo chega a afirmar que não é um historiador: “[...] Nunca me disse nem me considero um 
historiador no sentido acadêmico [...]. Se eu tivesse que me dar um título seria o de 
pesquisador instintivo [...]”. (RODRIGUES, 2003a, p. 23). Entretanto, creio que poderíamos 
considerá-lo, a partir de uma perspectiva gramsciana, como um “intelectual orgânico” do 
anarquismo.4 Creio que também a partir da perspectiva da história política renovada – penso 
aqui nos critérios utilizados por J-F. Sirinelli, de engajamento e de exercer algum tipo de 
influência sobre a vida da sociedade, apesar do pertencimento a um “pequeno mundo estreito” 
– Edgar Rodrigues pode e deve ser considerado um intelectual, um produtor e divulgador de 
ideias. Penso, inclusive, que o caso de Rodrigues ilustra bem essa perspectiva da história 
política dos intelectuais com uma “história em construção”5. 
Nossa tese sobre o trabalho de memória de Edgar Rodrigues se inscreve, então, no 
âmbito de uma história política e de uma história cultural. Acreditamos também que ele se 
inscreve num campo de conhecimento mais recente, a chamada “história do tempo presente”. 
Citando Henry Rousso: 
 
De fato, a memória constitui a denominação atual, dominante, pela qual se 
designa o passado não de maneira objetiva e racional, mas com a ideia implícita de 
que é necessário conservar este passado, mantê-lo vivo, atribuindo-lhe um papel 
[...]. A memória é então por princípio um fenômeno que se conjuga no presente [...]. 
A renovação da história do tempo presente e a emergência de uma história da 
memória têm sido dois fenômenos intimamente ligados [...]. (ROUSSO, 1998, p. 16-
26). 
 
 
 
3 SEVCENKO, Nicolau, Literatura como missão: tensões sociais e criação cultural na Primeira República. São 
Paulo: Brasiliense, 1983. 
4 Ver GRAMSCI, Antonio, “A formação dos intelectuais”. In: ______. Os intelectuais e a organização da 
cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. 
5 Ver SIRINELLI, Jean-François, “Os intelectuais”. In: RÉMOND, René (Org.), Por uma história política. Op. 
cit. 
 20 
O mesmo historiador afirma que: “A história do tempo presente concerne o passado 
próximo, aquele para o qual existem ainda atores vivos”, e também que “o estudo histórico do 
passado próximo remonta às origens mesmo da história enquanto procedimento intelectual”, 
referindo-se nesse momento a Heródoto e Tucídides. Ou seja, num certo sentido, toda história 
é uma “história do tempo presente”. Concordando com o pressuposto mais geral de Marc 
Bloch, que fala de “uma dialética entre o passado e o presente como tensão original do ofício 
do historiador” (ROUSSO, 1998, p. 50-53), o que teria de específico a “história do tempo 
presente”? 
O contexto histórico no qual a história do tempo presente foi se constituindo enquanto 
um domínio historiográfico próprio foi o contexto europeu, e especificamente francês, da 
Segunda Guerra Mundial e das primeiras décadas do pós-guerra. O contexto da França 
ocupada pela Alemanha nazista, do regime de Vichy, da resistência, do colaboracionismo e do 
holocausto. E, em seguida, a vitória dos Aliados, a “libertação” da França, e a Guerra Fria. A 
consolidação institucional desse campo historiográfico se dá com a fundação em Paris do 
Instituto da História do Tempo Presente, em 1978-1979, com o desdobramento (e relativa 
autonomização) de outras instituições de pesquisa e reflexão histórica, surgidas a partir dos 
últimos anos da guerra, com o objetivo central de tentar compreender e explicar esse tão 
doloroso passado recente. 
A partir de 1945, como fim da guerra, e ao longo das décadas seguintes, foi sendo 
construído então na França (e também em outros países europeus) o que Rousso chama de o 
“tempo da memória”. 
A construção desse “tempo da memória” teria se dado em três momentos: da negação 
inicial do horror da guerra, do genocídio – o tempo do “recalque” – à elaboração, num 
segundo momento, do “dever da memória”, o dever, ao contrário do primeiro momento, de 
não permitir que a barbárie caísse no esquecimento6; e, como terceiro momento, a verdadeira 
“obsessão do passado” (La hantise du passé): a incansável e permanente busca, pelos grupos, 
num primeiro momento vencidos (ou “excluídos da História”) e, num segundo momento, 
libertados, não só de compreensão desse passado próximo, mas principalmente de justiça, de 
algum tipo de reparação. 
Mas seriam esses horrores e crimes de guerra passíveis de algum tipo de reparação? 
Esse é um dos dilemas da história do tempo presente ao longo dos anos oitenta e noventa na 
 
6 Ver, por exemplo, os livros de memória/denúncia de LEVI, Primo, dentre eles, Se não agora, quando?. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1999; ver também HUMBERT, Agnès, Resistência: a história de uma mulher que 
desafiou Hitler. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008. 
 21 
França, que se desdobra num dilema vivido pelos historiadores diante de apelos da sociedade 
civil no sentido de que a História viesse a assumir o papel de juiz num tribunal que iria julgar 
processos de crimes de guerra, e eventualmente atribuir punições aos culpados e reparações às 
vítimas. Apelo não aceito por H. Rousso, cuja recusa é fundamentada por sua clara 
compreensão da distinção entre o trabalho da memória e o trabalho da história (portanto, do 
historiador). 
Embora tanto a história quanto a memória, enquanto processos de elaboração 
intelectual, sejam criações de um determinado tempo presente, há distinções fundamentais. O 
trabalho da memória, ou a memória como trabalho – e em especial a memória individual – é 
um processo essencialmente subjetivo, emocional, com uma forte carga afetiva ligando 
passado e presente. A história, ao contrário, constitui-se num trabalho basicamente racional, 
uma atividade de erudição (“l’histoire savante”), que busca (e precisa) se confrontar com a 
alteridade, compreendê-la e explicá-la, quer essa alteridade se localize cronologicamente no 
medievo europeu ou nos anos sessenta do século XX. Em suma, a história é um trabalho de 
conhecimento, que não deve buscar “reparação” ou mesmo justiça, mas, na medida do 
possível, a verdade. 
Nesse sentido, seria possível uma “história do tempo presente”? As principais 
objeções formuladas contra uma história do tempo presente, ou mesmo contra uma história 
contemporânea, seriam três: a) em primeiro lugar, a esta história faltaria um necessário recuo 
no tempo (“somente eventos fechados seriam acessíveis ao conhecimento histórico”); b) 
segundo, esta história seria (mais que outras) presa de paixões e de conflitos ideológicos; c) 
terceiro, esta história seria impossível do ponto de vista técnico, já que os arquivos não 
estariam disponíveis. 
 Ao longo do seu texto, H. Rousso vai desqualificando ou ao menos relativizando 
(inclusive em comparação com outros campos ou domínios do conhecimento histórico) cada 
uma dessas objeções ou armadilhas formuladas ou plantadas contra a história do tempo 
presente. Por exemplo, a história do comunismo não é hoje [anos noventa] mais ou menos 
“objetiva” do que fora antes da queda do Muro de Berlim e da desagregação da União 
Soviética. As mesmas paixões, ou paixões muito semelhantes, continuam presentes, 
informando ângulos de análise, abordagens e orientando conclusões. Ao mesmo tempo, 
Rousso vai evidenciando e comentando “uma metodologia para estudar o tempo presente em 
seu conjunto”. (ROUSSO, 1998, p. 75). Talvez essa metodologia seja bem exemplificada pelo 
comentário do autor sobre uma obra de Marc Bloch: 
 
 22 
[...] em L’Etrange Defaite (A estranha derrota), obra escrita entre julho e setembro 
de 1940, Marc Bloch revela ser um historiador do tempo presente de uma lucidez 
fulgurante: ele se apresenta como um historiador, isto é como um sábio, armadode 
um método crítico, que deve se interessar pela vida e portanto recusar a ilusão de 
que o passado está morto, mas também como uma testemunha, que fala de sua 
experiência e que lança um olhar sobre seu próprio tempo. (ROUSSO, 1998, p. 53). 
 
 
Ainda sobre a história do tempo presente, escreve um historiador brasileiro: “[...] o 
diálogo com diferentes dimensões da própria História e com outras disciplinas das Ciências 
Humanas [são] as referências que têm garantido a diversidade – e a riqueza – dos estudos 
históricos do Presente”. (REIS FILHO, 2004a, p. 9). 
 No que diz respeito às relações da história do tempo presente com a história cultural, 
são muito instigantes algumas reflexões de J-F Sirinelli. Quando falamos, nesta “Introdução”, 
da cultura anarquista como uma cultura política específica, e também de uma história política 
renovada, já estávamos procurando antecipar que nossa tese se desenvolverá numa linha de 
investigação que buscará se situar numa interface da história política com a história cultural, 
ou utilizando “uma abordagem situada no cruzamento do político e do cultural”. (SIRINELLI, 
2004, p. 13-14). 
 De acordo com este autor: 
 
[...] observou-se, durante estes últimos vinte anos [o artigo é de 2004], no campo da 
história do século XX, o despontar real da história cultural [cujo campo de pesquisa] 
se situa [...] bem na junção das representações e das práticas, e seu espectro de 
intervenção [...] enfatiza tanto os comportamentos coletivos quanto os modos de 
pensamento, abarcando, assim, e tocando, então, no que é essencial, o sujeito agente 
tanto quanto pensante. (SIRINELLI, 2004, p. 16). 
 
Edgar Rodrigues é, para nós, exatamente um “sujeito agente e pensante”, um 
intelectual orgânico do anarquismo, um militante, produtor e divulgador de uma cultura 
libertária, um criador de uma memória anarquista, principalmente no Brasil e em Portugal. 
Com efeito, pensamos que Edgar Rodrigues realiza, com impressionante e incansável 
determinação, um meticuloso “dever da memória”: não permitir que as lutas dos 
trabalhadores, e a participação dos anarquistas nessa lutas, caiam no esquecimento; não deixar 
que a barbárie da exploração patronal e a barbárie da repressão estatal – prisões, 
espancamentos, torturas, deportações, fuzilamentos – caiam no esquecimento. Trata-se, então, 
de um trabalho de memorialista, extremamente rico e valioso, inclusive, e talvez 
principalmente, para historiadores de ofício, que podem encontrar na obra de Rodrigues um 
 23 
imenso manancial de fontes e documentos sobre a história do anarquismo e do movimento 
operário e sindical, em especial no Brasil e em Portugal. 
 Como afirmamos acima, e esta é uma das hipóteses centrais da nossa tese, para Edgar 
Rodrigues a dimensão básica da sua militância consiste em escrever e divulgar obras 
anarquistas. Mais ainda, acreditamos que ele encara essa atividade como a sua missão 
enquanto anarquista. Nas suas palavras: 
 
A coisa mais valiosa que fiz até hoje (é minha convicção pessoal) foi enviar 
centenas, milhares de livros anarquistas (meus e de outros autores) para arquivos, 
bibliotecas públicas e de universidades de países da Europa e da América [...]. 
Vamos semear ideias e levá-las a toda parte para que todos possam compreendê-las, 
assimilá-las, e sem que ninguém diga o que cada um deve fazer, cada militante faça 
o que sabe e pode, sem se preocupar com o anarquista perfeito, infalível. Estude-se o 
anarquismo, eduque-se o anarquista e a ideia fará o resto. (RODRIGUES, 2003a, p. 
35-45). 
 
Enfim, pretendemos estudar nesta tese a obra de Edgar Rodrigues, vinculada a cerca 
de oito décadas de militância libertária, e composta, como já afirmamos nesta “Introdução”, 
de mais de cinquenta livros e centenas de artigos, publicados, ao longo de cinco décadas, em 
muitos países. 
 Ao longo de seu texto, Henry Rousso, procura distinguir os conceitos de lembrança 
(souvenir) e de memória (mémoire). A lembrança seria ainda mais subjetiva, mais individual, 
mais carregada de emoção e afetividade do que a memória. Creio não ser por acaso que o 
último livro do pesquisador instintivo Edgar Rodrigues, publicado no fim de sua vida, foi por 
ele intitulado Lembranças incompletas.7 
 A amplitude quantitativa, a abrangência temática e a heterogeneidade tipológica (livros-
denúncia ou “de combate”, coletâneas de artigos, biografias, dicionários) da obra de Edgar 
Rodrigues, assim como o longo período (cerca de meio século) dedicado à sua produção, nos 
apresentaram, desde o início do trabalho, um grande desafio em relação a como organizar a 
estrutura da tese. Diante de várias possibilidades, optamos por elaborá-la em cinco capítulos, 
construindo do segundo ao quinto capítulo uma sequência cronológica, a partir da qual 
procuramos então (re)escrever, utilizando como fonte básica a obra de Rodrigues, uma 
história do anarquismo e suas relações com o movimento operário e sindical no Brasil, da 
Proclamação da República em 1889 ao Golpe civil-militar de 1964. Estamos conscientes dos 
riscos dessa empreitada. 
 
7 RODRIGUES, Edgar, Lembranças incompletas. São Paulo: Opúsculo Libertário, 2007. 
 24 
 No primeiro capítulo, “Edgar Rodrigues, pesquisador instintivo”, falamos sobre o autor 
e sua obra. Procuramos, então, estabelecer e comentar aquelas que seriam, a nosso ver, as 
relações mais significativas entre a vida e a obra de Edgar Rodrigues. 
 Falamos do seu nascimento, em 1921, em Angeiras, freguesia de Lavra, município de 
Matosinhos, na região do Porto, ao norte de Portugal, e seus primeiros trinta anos de vida na 
terra-mãe. Da sua migração, em 1951, para o Brasil, e da sua vida no país onde escolheu 
viver, se naturalizou, obtendo nova cidadania, e veio a falecer, na cidade do Rio de Janeiro, 
em junho de 2009, aos 88 anos. Escrevemos também, de uma maneira mais geral, procurando 
elaborar uma primeira avaliação, sobre sua vasta obra, privilegiando os livros em relação aos 
artigos. Na verdade, muitos de seus livros são coletâneas de artigos, publicados na imprensa 
de vários países, mas especialmente Brasil e Portugal. Comentamos também neste primeiro 
capítulo as críticas de Edgar Rodrigues à “história acadêmica” e sua própria concepção de 
História, bem como sua autodefinição como “pesquisador instintivo”. 
Sobre o movimento operário e sindical, e também especificamente sobre o 
anarquismo, na Primeira República Brasileira, muito já foi escrito. Muitos livros e artigos 
foram publicados, monografias, dissertações e teses foram concluídas e defendidas, em suma, 
inúmeras pesquisas foram feitas e muita reflexão levou à produção de um rico material, de 
uma “massa crítica” e, enfim, de uma historiografia sobre o anarquismo e sobre o movimento 
operário e sindical já bastante considerável. 
 Entretanto, sobre o Brasil pós-30, e talvez mais ainda sobre o Brasil pós-45, há 
pouquíssimos estudos e trabalhos, não sobre o movimento operário e o sindicalismo (é claro, 
basta lembrar a historiografia sobre o trabalhismo), mas especificamente sobre o anarquismo. 
É certo que, por um lado, a menor quantidade de pesquisas e trabalhos reflete o próprio 
declínio do anarquismo, em especial no que se refere à sua inserção sindical, ao seu papel 
mais imediato nos debates e processos políticos, entendidos num sentido amplo. Por outro 
lado, essa redução da quantidade de estudos sobre o socialismo libertário deve-se também ao 
permanente combate político-ideológico historicamente empreendido contra o anarquismo, 
buscando desqualificá-lo, tanto por setores burgueses e pelo Estado quanto também por uma 
esquerda “comunista”. 
 Porém, o anarquismo não morreu, nem nos anos trinta, nem nas décadas da 
“experiência democrática”, nem sob a ditadura militar, e continua hoje, a partirdessa última 
redemocratização, vivo e atuante, em pleno século XXI, e não só no Brasil, buscando novas 
formas de luta, se atualizando e reafirmando sempre suas principais bandeiras e seus valores 
fundamentais: socialismo e liberdade. 
 25 
No segundo capítulo, “A planta exótica”, trabalhamos com o anarquismo e o 
movimento operário nas primeiras décadas da República, da Proclamação do novo regime em 
1889 a 1913, data da realização do Segundo Congresso Operário Brasileiro. O capítulo está 
dividido em dois itens, o primeiro trata da formação da classe operária e dos antecedentes do 
anarquismo no Brasil, a partir basicamente da visão do autor analisado. No segundo item, 
abordamos o período que vai da virada do século XIX para o século XX até 1913: nesse 
momento, o anarquismo já aparece no Brasil como um movimento social organizado e 
desempenhando um papel político, no interior do movimento operário e sindical, de alguma 
relevância. Para a elaboração deste capítulo, a principal fonte, dentre muitas outras, e no 
conjunto da obra de Edgar Rodrigues, foi o livro Socialismo e sindicalismo no Brasil (1675-
1913)8. 
 O terceiro capítulo, “O joio e o trigo”, é o mais longo da tese. A principal razão para 
isso é a seguinte: o período abordado no primeiro item do capítulo, 1913 a 1922, é o 
momento, em especial o final dos anos dez, de maior ascenso, não só do movimento operário 
e sindical, como especificamente do anarquismo, em toda a Primeira República, momento que 
concentra um grande número de greves, algumas vitoriosas, com a participação de milhares 
de trabalhadores, e no qual surgem ou se fortalecem muitos sindicatos operários, num quadro 
de autonomia sindical. A segunda razão para o tamanho do capítulo é o fato de que eu já tinha 
trabalhado com o período na minha dissertação de mestrado, Rio de Janeiro, 1918: a 
Insurreição Anarquista9, publicada com o título A Insurreição Anarquista no Rio de 
Janeiro10. Utilizei, especificamente nesse item, com acréscimos e alterações, algumas 
passagens desse livro, que mereceu comentário e referências de Edgar Rodrigues. 
No segundo item de “O joio e o trigo”, trabalhamos com a década de vinte, período 
não só de descenso do movimento operário, de declínio do anarquismo e de formação do 
PCB, como também de transição entre duas ordens políticas: comentamos a trajetória que 
conduz o Brasil, e seus trabalhadores, do liberalismo federativo e excludente das oligarquias 
agrárias à construção do sindicalismo corporativista, peça-chave do trabalhismo e do Estado 
autoritário varguista. Na obra de Edgar Rodrigues, dois foram então os livros que nos 
 
8 RODRIGUES, Edgar, Socialismo e sindicalismo no Brasil (1675-1913). Rio de Janeiro: Laemmert, 1969. 
9 ADDOR, Carlos Augusto, Rio de Janeiro, 1918: a Insurreição Anarquista. Dissertação de Mestrado, 
Universidade Federal Fluminense, 1985. 
10 ______. A Insurreição Anarquista no Rio de Janeiro. 2ª edição revista e atualizada. Rio de Janeiro: Achiamé, 
2002. 
 26 
serviram como fontes principais, como referências básicas para a elaboração do nosso 
trabalho: Nacionalismo e cultura social (1913-1922)11 e Novos rumos (1922-1946)12. 
 No quarto capítulo, “Tempos difíceis”, trabalhamos com o anarquismo na Era Vargas. 
É o menor capítulo, como menores foram, compulsoriamente, a presença, a visibilidade e a 
importância política do anarquismo na vida e na história brasileiras. Este capítulo também 
está dividido em dois itens, o primeiro deles tratando do período de 1930 a 1937, no qual 
destacamos a posição do anarquismo, e dos anarquistas, diante da polarização política direita 
versus esquerda no Brasil (e no mundo). No segundo item, abordamos as dificuldades e os 
esforços do anarquismo, e dos anarquistas, para sobreviver à repressão e às arbitrariedades da 
ditadura estado-novista. No conjunto da obra de Edgar Rodrigues, Novos rumos (1922-1946), 
continuou a ser nosso livro de referência. Os três livros até aqui citados compõem, na obra do 
autor em análise, uma primeira e fundamental trilogia sobre as relações do anarquismo com o 
movimento operário e sindical no Brasil. 
O quinto e último capítulo, “A nova aurora libertária”, trata do anarquismo no período 
da chamada “experiência democrática” no Brasil, 1945 a 1964. Mais uma vez, o capítulo está 
dividido em dois itens, o primeiro abordando da conjuntura da redemocratização (1945-1947), 
quando o anarquismo vai “ressurgindo do silêncio” imposto pela ditadura, até o suicídio de 
Getulio Vargas. No segundo item, procuramos analisar a inserção do anarquismo na história 
brasileira, das crises políticas de 1954 e 1955, passando pelos “anos dourados” do governo 
Kubitschek, ao Golpe político-militar de 1964, que depôs Goulart e abriu caminho para a 
implantação de mais uma ditadura. Neste capítulo, outros três livros, uma segunda trilogia 
sobre o anarquismo e o movimento operário e sindical, foram nossas principais referências: A 
nova aurora libertária (1945-1948)13, que inspirou o título do nosso capítulo; Entre ditaduras 
(1948-1962)14 e O ressurgir do Anarquismo (1962-1980)15. 
 Na “Conclusão”, procuramos reafirmar algumas hipóteses centrais de nossa tese. Em 
primeiro lugar, a grande importância da obra do memorialista Edgar Rodrigues, autor do mais 
significativo conjunto de informações, compondo um verdadeiro painel, sobre a história do 
anarquismo e suas relações com o movimento operário e sindical, no Brasil e em Portugal. 
Em segundo lugar, sustentamos uma hipótese estratégica de nosso trabalho: para Edgar 
Rodrigues, produzir e escrever sobre o anarquismo, divulgar o socialismo libertário e seus 
 
11 RODRIGUES, Edgar, Nacionalismo e cultura social (1913-1922). Rio de Janeiro: Laemmert, 1922. 
12 ______. Novos rumos (1922-1946). Rio de Janeiro: Mundo Livre, 1978. 
13 ______. A nova aurora libertária (1945-1948). Rio de Janeiro: Achiamé, 1992. 
14 ______. Entre ditaduras (1948-1962). Rio de Janeiro: Achiamé, 1993. 
15 ______. O ressurgir do Anarquismo (1962-1980). Rio de Janeiro: Achiamé, 1993. 
 27 
principais valores e bandeiras, foi se constituindo numa verdadeira missão que, na prática, se 
traduziu numa militância de toda uma vida. 
Além disso, indicamos, como “considerações gerais”, algumas aproximações de Edgar 
Rodrigues e sua obra com outros autores, seus contemporâneos, dentre eles José Saramago e 
alguns historiadores franceses. 
Procuramos também, por fim, afirmar, ou reafirmar, não apenas a sobrevivência do 
anarquismo, como sua atualidade e vitalidade, em especial no campo das ideias e do debate 
político e intelectual, mas também na ação direta em ruas e praças públicas de vários países, 
neste início do século XXI. 
Nos “Anexos” da tese, reproduzimos alguns documentos. Em primeiro lugar, seis 
cartas que compõem a pequena, mas significativa, correspondência trocada entre Edgar 
Rodrigues e o autor deste trabalho, no período compreendido entre outubro de 2006 e março 
de 2009. Na sua primeira carta, Carlos Addor comunica a Edgar Rodrigues que está 
elaborando um projeto de tese de doutorado sobre sua obra, e Rodrigues se dispõe a ajudá-lo, 
prestando informações. Rodrigues e Addor trocam também livros, artigos e material diverso 
sobre o anarquismo. Creio ser interessante registrar que na segunda carta, escrita em 
dezembro de 2006, Edgar Rodrigues afirma: “Começo minha carta pedindo-lhe para abolir o 
Senhor. Acho uma palavra pesada para mim, para minha irreverência e minhas ideias. Se me 
voltar a escrever, o que espero faça, deixe fora o Senhor, combinado?”. Mais uma 
manifestação do espírito libertário do nosso autor, que dispensa títulos, hierarquias e 
distinções sociais. Na carta seguinte, naturalmente, aboli a palavra “senhor” e comecei por 
“Meu caro Edgar Rodrigues”. 
Ainda nesses “Anexos”, além das cartas,reproduzimos alguns outros documentos, a 
saber: a) um cartaz informativo da “Exposição Vida e Obra de Edgar Rodrigues”, organizada 
pela Câmara Municipal de Matosinhos, em 1996; b) a capa do Catálogo, editado pela 
Associação Cultural A Vida, da “Exposição Edgar Rodrigues – Pesquisador Libertário da 
História Social de Portugal e do Brasil”, montada nas cidades de Lisboa e do Porto, em 2002; 
c) a capa do volume IV da série Rebeldias, acompanhada da página na qual Edgar Rodrigues 
oferta um exemplar do livro para Carlos Addor. 
Concluindo a “Introdução”, esperamos que, assumindo e enfrentando os riscos da 
empreitada, nosso trabalho venha contribuir para a compreensão não apenas da obra de Edgar 
Rodrigues, mas da própria história do anarquismo no Brasil, bem como para o debate em 
torno dos seus principais valores: socialismo e liberdade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
____________________________________________________________CAPÍTULO 1 
 
 EDGAR RODRIGUES, PESQUISADOR INSTINTIVO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“SE O ESCRITOR TEM ALGUM PAPEL, É O DE INCOMODAR.” 
José Saramago 
 
“LIVROS NÃO MUDAM O MUNDO. 
QUEM MUDA O MUNDO SÃO OS HOMENS. 
LIVROS MUDAM OS HOMENS.” 
Mário Quintana 
 
 
 
 
 29 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
No dia 12 de março de 1921, numa velha casa assobradada no Caminho da Cal, sem-
número, Angeiras, na freguesia de Lavra, município de Matosinhos, ao norte de Portugal, 
próximo à cidade do Porto, nasceu Antonio Francisco Correia, filho de Albina da Silva Santos 
e Manuel Francisco Correia. 
Seu pai, operário, era membro ativo do Sindicato das Quatro Artes, que representava 
trabalhadores de vários ofícios do setor da construção civil em Matosinhos. Manuel Correia 
orientava sua militância a partir da concepção e dos princípios anarcossindicalistas. Ainda 
criança, Antonio observava, escondido, curioso e fascinado, as reuniões clandestinas, em sua 
casa, de que seu pai participava, junto com outros dirigentes e membros do sindicato, 
discutindo greves, salários, jornadas de trabalho, reivindicações, criticando o governo (a 
ditadura), os patrões, a polícia, o Estado. Desde então, o menino criou o hábito – que manteria 
ao longo de toda a sua vida – de recolher e guardar papéis, material escrito que sobrava das 
reuniões: jornais, revistas, folhetos, boletins, em suma, notícias sobre a questão social em 
Portugal. Criou também, muito cedo, o saudável hábito da leitura. “Começava a ler e escrever 
sozinho quando a ditadura portuguesa, implantada em 1926, chamou para chefiar, com plenos 
poderes, o dr. António Oliveira Salazar”. (RODRIGUES, 2003a, p. 17). 
A repressão ao movimento operário e ao sindicalismo livre vinha se intensificando 
desde o Golpe de Estado de maio de 1926, liderado pelo general Gomes da Costa e pelo 
comandante Mendes Cabeçadas, que derrubou a Primeira República e implantou a ditadura 
militar em Portugal. Derrotada a proposta de uma “ditadura temporária” que iria “regenerar” a 
República, o processo de depuração política intraforças golpistas vai consolidando, sob a 
liderança de Gomes da Costa e Carmona, uma ditadura militar de tendência fascista ou 
fascistizante. 
Ainda sobre esse processo, afirma Rodrigues: 
 30 
A CGT [Confederação Geral do Trabalho, anarquista, fundada em 1919, em 
substituição à UON, União Operária Nacional], com seus numerosos sindicatos, 
uniões e federações, é posta fora da lei, fechada e assaltada pela polícia, que destrói 
e rouba os haveres dos trabalhadores. A mesma sorte teve a redação do diário A 
Batalha, órgão da CGT [...]”. (RODRIGUES, 1957, p. 44). 
 
As forças que se opuseram à ditadura iriam formar um amplo e heterogêneo bloco 
antiditatorial, do qual participam não apenas anarquistas e sindicalistas revolucionários 
ligados à proscrita CGT, como também comunistas do PCP, fundado em 1921, e ainda 
socialistas, democratas e republicanos. Esse bloco desencadeou o chamado “Reviralho”, um 
“largo e demorado movimento revolucionário”, na verdade um conjunto de revoltas, mais de 
uma dezena, entre 1926 e 1939, mas principalmente entre 1927 e 1931, que buscavam a 
“reposição da situação democrática e das liberdades públicas e individuais”. (FARINHA, 
2010, p. 50). As mais importantes dessas revoltas ocorreram no Porto e em Lisboa em 
fevereiro de 1927, em Lisboa em julho de 1928, e nas Ilhas da Madeira e dos Açores, em 
abril/maio de 1931. A pesada repressão a esses movimentos, com a prisão e a deportação, 
inclusive para a África e para o Timor, de centenas de lideranças e militantes, republicanos, 
democratas, socialistas, comunistas, anarquistas, sindicalistas, iria simultaneamente 
enfraquecendo a resistência e fortalecendo e consolidando a ditadura. 
No início dos anos trinta, a ditadura militar é substituída, a partir de um acordo 
político entre vários grupos da direita, pela ditadura civil (com apoio da cúpula das Forças 
Armadas) do Estado Novo, formalmente estabelecido em 1933. 
Oliveira Salazar, no comando do governo desde 1932, impõe uma nova Constituição e 
começou o processo de construção, a partir da promulgação de um conjunto de leis e 
decretos-leis, do sindicalismo de feição corporativista e de inspiração fascista, dando origem 
aos “sindicatos nacionais”, que se tornariam uma das bases estratégicas do Estado autoritário. 
Assim, nos anos trinta, Antonio Francisco Correia ainda adolescente, a ditadura 
portuguesa deu início ao processo de construção do sindicalismo corporativista. Em 1933, já 
sob o Estado Novo, o decreto-lei nº 23.050 estabelece que os sindicatos operários deveriam se 
tornar, a partir de então, “sindicatos nacionais”, passando a agir em absoluto respeito aos 
“superiores interesses da Nação portuguesa”, renunciando a qualquer atividade contrária a 
esses interesses e a qualquer perspectiva internacionalista, colaborando com o Estado e com 
as outras classes e “repudiando a luta de classes”. O princípio fundamental passaria a ser o 
nacionalismo. Os sindicatos livres, inclusive aqueles onde eram importantes a atuação e a 
influência libertária, deveriam se submeter à nova orientação do Ministério das Corporações, 
depois Ministério do Trabalho; e o prazo para a “adesão” seria o final do ano de 1933. 
 31 
Aqueles que não quisessem aderir, adaptando-se ao modelo corporativo de conciliação de 
classes, seriam compulsoriamente fechados, o que ocorreu na grande maioria dos casos. 
Nas palavras de Edgar Rodrigues: 
 
O grosso do movimento anarcossindicalista português, orientado pela CGT 
(Confederação Geral do Trabalho) filiada à AIT (Associação Internacional dos 
Trabalhadores) promoveu reuniões em todo o país e decidiu resistir desencadeando a 
greve geral insurrecional em 18 de janeiro de 1934 [...]. (RODRIGUES, 2003, p. 
17).1 
 
São evidentes as semelhanças com o processo que ocorre, à mesma época, no Brasil, 
guardadas as especificidades. Entre elas, destaca-se o fato de que o Estado Novo português 
teve a sustentá-lo politicamente um partido (quase) único, a União Nacional, enquanto seu 
homônimo brasileiro, como sabemos, prescindiu de partidos políticos, cancelando seus 
registros e lançando-os na ilegalidade. 
Em Portugal, muitos sindicatos e militantes, principalmente aqueles vinculados à 
Confederação Geral do Trabalho (CGT), anarquista, mas também aqueles ligados à Comissão 
Intersindical (CIS), formada pelo Partido Comunista Português, e à Federação das 
Associações Operárias (FAO), vinculada aos socialistas reformistas, tentaram resistir ao 
enquadramento na sindicalização estatal. As três centrais sindicais formam a Frente Única 
Operária e, no dia 18 de janeiro de 1934, deflagraram uma greve geral revolucionária.2 
Entretanto, apesar da mobilização, mais uma derrota e mais repressão, mais prisões, 
deportações e exílio de líderes e militantes. 
Nas palavras de um historiadorportuguês: “Na realidade, a CGT, com a derrota de 18 
de janeiro de 1934, acentua irremediavelmente o seu declínio e perda de hegemonia no 
movimento operário”. (MADEIRA, 2010, p. 69). Mais adiante, afirma o mesmo autor: 
 
A derrota republicana na Guerra Civil de Espanha, acumulando-se à derrota do 
embate pelo sindicalismo livre em 1934, num contexto nacional de refluxo 
acentuado no movimento operário e num quadro internacional de emergência dos 
fascismos e de guerra mundial em eclosão, representaria [em Portugal] o encerrar 
 
1 Ver também do mesmo autor Lembranças incompletas, da Editora Opúsculo Libertário. São Paulo, 2007. Sobre 
a construção do sindicalismo corporativista e o Estado Novo em Portugal, ver MARTINHO, Francisco Carlos 
Palomanes, A bem da Nação: o sindicalismo português entre a tradição e a modernidade (1933-1947). Rio de 
Janeiro: Civilização Brasileira; FAPERJ, 2002. 
2 Para Edgar Rodrigues, no entanto, uma das causas do fracasso da greve insurrecional teria sido uma suposta 
“traição” de membros do PCP. Ver RODRIGUES, Edgar, capítulo “Introdução”, de Rebeldias. v. 1. Rio de 
Janeiro: Achiamé, 2003. 
 32 
penoso de um ciclo. O sindicalismo livre encerrar-se-ia por longos anos [...]. 
(MADEIRA, 2010, p. 71).3 
 
 
É no contexto da repressão, não só à insurreição de 1934, mas também às tentativas de 
resistência de um sindicalismo livre e autônomo, que Manuel Correia e seus companheiros do 
Sindicato das Quatro Artes conseguem retirar da sede sindical boa parte do acervo da 
associação (livros, estantes, bandeiras, emblemas e outros objetos), que, distribuído entre os 
sindicalistas, passa a ficar guardado (escondido) nas suas casas, inclusive na residência da 
família Correia, na rua da Agudela, em Lavra, Matosinhos. 
Reuniões sindicais passam a ser realizadas, clandestinamente, nas casas dos militantes, 
principalmente na casa de Manuel Francisco Correia. E é ainda nesse mesmo contexto, que 
Antonio Francisco Correia, com uma crescente “curiosidade de adolescente”, começa o seu 
“aprendizado ideológico”. Nesse aprendizado, também teve importante participação seu 
professor Raul Gonçalves Moreira, intelectual anticlerical e livre-pensador, que lecionava na 
primeira escola frequentada por Rodrigues.4 
Em julho de 1936, de madrugada, a casa da família Correia foi invadida pela PVDE5, 
a polícia política da ditadura salazarista. Manuel Correia foi preso e encarcerado no presídio 
da rua do Heroísmo, no Porto. Quebrada a incomunicabilidade, o jovem Antonio Francisco 
passa a visitar com regularidade seu pai, levando comida e roupa lavada e trazendo e levando, 
por vezes, bilhetes com informações. 
Podemos imaginar o impacto dessas vivências na formação política, ideológica e 
também emocional de um rapaz de 15 anos. A experiência certamente deixaria marcas 
profundas e permanentes na vida de Antonio Francisco Correia. 
Antonio foi desenvolvendo e amadurecendo, aos poucos, lenta mas irreversivelmente, 
um profundo sentimento de ódio à ditadura salazarista, de desconfiança em relação à 
autoridade (qualquer autoridade) e também uma ânsia por justiça e por liberdade. O jovem foi 
também “juntando papéis”, guardando informações e lendo muito. Os primeiros livros que 
comprou, “juntando uns tostões”, foram A velhice do padre eterno, do poeta português Guerra 
 
3 Ver também, na mesma publicação, LOFF, Manuel: “Lutar pela liberdade! Da alternativa republicana à 
resistência contra a ditadura (1891-1974)”; FARINHA, Luís: “O Reviralho contra a Ditadura Militar: o 3-7 de 
fevereiro de 1927 (Porto e Lisboa) e os levantamentos armados de 1928-1931”. 
4 Ver “A minha primeira escola”. In: RODRIGUES, Edgar. Diga não à violência. Rio de Janeiro: VJR Editores 
Associados, 1995, p. 350-352. A primeira escola do autor localizava-se na rua Dr. Manuel Domingos dos Santos, 
nº 3, na freguesia de Lavra, Conselho de Matosinhos. 
5 PVDE – Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, substituída depois, em 1945, pela PIDE – Polícia 
Internacional de Defesa do Estado. Para uma dura, refinada e irônica crítica à atuação da PIDE e ao fascismo 
luso, ver SARAMAGO, José, O ano da morte de Ricardo Reis. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. 
 33 
Junqueiro, e A conquista do pão, de Pedro Kropotkin6. Como tinha pouco dinheiro, copiava 
livros à mão, à caneta, “nas longas noites do inverno europeu”. Foi ainda firmando sua 
convicção “de um dia escrever e divulgar em livro os crimes da ditadura”. (RODRIGUES, 
2007d, p. 20). 
Além de guardar papéis, ler e copiar livros, inclusive peças de teatro social e o 
Almanaque de A Aurora, de 1913, o jovem Antonio Correia começou, às noites e com os 
companheiros Abel Silva, Fernando Costa e Fernando Neves, a estudar esperanto. Está 
começando a (auto)formação do “pesquisador instintivo” Edgar Rodrigues, ainda Antonio 
Correia. 
No dia 1º de Maio de 1939 esses rapazes, aos quais se agregaram Agostinho 
Gonçalves, Fernando da Madalena e Manuel Correia (irmão do autor e dois anos mais velho) 
resolveram faltar ao trabalho e fazer uma excursão de protesto em homenagem aos mártires 
de Chicago, viajando a Braga, Ponte de Lima e Viana do Castelo. Protesto simbólico, mas 
significativo, numa época em que a ditadura portuguesa proibia qualquer manifestação alusiva 
ao dia do trabalho. 
Nesse mesmo ano, a derrota dos republicanos, ao lado dos quais lutaram os 
anarquistas e também muitos exilados portugueses, na Guerra Civil Espanhola, representou 
um duro golpe para todas as forças políticas que lutavam contra a ditadura em Portugal, em 
casa ou no exílio, principalmente na Espanha e na França (a Liga de Paris). A vitória dos 
republicanos teria representado um forte estímulo, e provavelmente um apoio estratégico, ao 
bloco antiditatorial em Portugal. Ao contrário, a vitória de Franco e dos monarquistas no país 
vizinho e o profundo desânimo dela decorrente contribuíram para o fim do “Reviralho” 
lusitano. Salazar vai se consolidando no poder. 
Em março de 1940, Antonio Correia filia-se ao Grupo Dramático Flor da Mocidade, 
grupo de teatro amador fundado em 1939 em Santa Cruz do Bispo, município de Matosinhos. 
Nesse grupo, Antonio conheceu Ondina dos Anjos da Costa Santos, atriz amadora, que seria, 
a partir de um namoro e de um “casamento livre”, realizado em agosto de 1941, sua 
companheira de toda uma vida. 
Mais tarde, já casado, Correia fez parte da direção do Grupo Dramático Alegres de 
Perafita, onde passou a residir. Nesse grupo, formou uma “sortida biblioteca” e, para “criar o 
hábito de ler”, organizava concursos anuais, com prêmios em livros para quem lesse mais 
 
6 Ver a entrevista concedida por Edgar Rodrigues a Jorge Silva, publicada no “Catálogo da Exposição Edgar 
Rodrigues”, Associação Cultural A Vida, Lisboa, 2002. 
 34 
obras durante o ano. Edgar Rodrigues começava a ensaiar sua militância como divulgador de 
livros, atividade que continuaria a desenvolver ao longo de toda sua vida. 
De outubro de 1942 a novembro de 1943, Antonio Francisco Correia prestou o serviço 
militar obrigatório, no Regimento de Engenharia do Porto e na Escola Prática de Engenharia, 
em Tancos. No dia 26 de agosto de 1943 nasceu seu primeiro filho, Oscar Zola Correia7. O 
nome, obviamente, homenageia o romancista libertário francês Émile Zola, autor de 
Germinal. 
Nesse período, Edgar Rodrigues começou a escrever e a receber as cartas que serão a 
base para a publicação, já no Brasil em 1957, do seu primeiro livro: Na Inquisição do Salazar. 
O livro, publicado pela Editora Germinal, do Rio de Janeiro, foi prefaciado pelo editor 
Roberto das Neves, outro anarquista português exilado, já há alguns anos, no Brasil, e é 
composto basicamente por um conjunto de cartas trocadas entre o libertário Luís Joaquim 
Portela, preso político nos cárceres

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