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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS 
CURSO DE DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O RECONHECIMENTO DO TRANSEXUAL PELO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 
 
 
 
 
 
RODRIGO CHANDOHÁ DA CRUZ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Itajaí (SC), 2009 
 16
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS 
CURSO DE DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O RECONHECIMENTO DO TRANSEXUAL PELO 
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 
 
 
 
 
 
 
 
RODRIGO CHANDOHÁ DA CRUZ 
 
 
Monografia submetida à Universidade do 
Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito 
parcial à obtenção do grau de Bacharel 
em Direito. 
 
 
 
 
 
Orientadora: Professora MSc. Andrietta Kretz Viviani 
 
 
 
 
Itajaí (SC), 2009
 
AGRADECIMENTO 
A Deus, que me deu forças para explorar este 
assunto, não só com o fim de obter a graduação no 
curso de Direito, mas para, de alguma forma, ajudar 
os transexuais e abrir os olhos da sociedade para 
este tópico tão importante. 
Aos meus pais, Hélcio e Suzana, por terem 
respeitado minha escolha por um tema tão 
controvertido, e acreditarem que eu seria capaz de 
trabalhar com um assunto tão complexo, de forma 
justa, além de seu constante apoio durante os meus 
anos de faculdade, e por me manterem no caminho 
certo. 
À minha madrinha, Lilian, pelo ombro de mãe nas 
horas difíceis, não só na construção deste trabalho, 
mas por ter sido um grande porto seguro durante 
toda a minha trajetória acadêmica. 
Ao Cartório da 2ª Vara Cível, da Comarca de Itajaí, 
principalmente à Naliete Polonia de Souza e Elisa 
Catarina Kleis, que foram muito, muito mais do que 
chefes para mim, pois foram a extensão da minha 
família e da faculdade de Direito, além de serem 
grandes exemplos de seres-humanos e 
profissionais, a quem terei eterna gratidão pelo 
ensino e pelo amor prestado. 
Aos meus amigos, que fiz na faculdade e no Fórum 
de Itajaí, que sempre alegravam minha vida, e que 
me ajudaram a crescer como ser humano e 
profissional. 
À Professora Andrietta Kretz Viviani, minha 
orientadora, pela orientação e suporte na construção 
deste trabalho. 
Por fim, a todos que, assim como eu, acreditam que 
nosso ordenamento jurídico necessita de reformas, 
para reconhecer que todas as pessoas têm os 
mesmos direitos para exercer, e que acreditam que 
a diferença não empobrece, mas enobrece. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 16
 
DEDICATÓRIA 
Dedico este trabalho à todas as pessoas 
sexualmente confusas, que lutam pelo 
reconhecimento de seus direitos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 17
 
 
 
 Àqueles que se comprometem autenticamente com o povo 
é indispensável que se revejam constantemente. 
Esta adesão é de tal forma radical que não permite a quem a faz,comportamentos ambíguos. 
 
(Paulo Freire - Pedagogia do Oprimido) 
 
 18
 
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE 
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte 
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do 
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de 
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. 
 
Itajaí, Novembro de 2009 
 
 
Rodrigo Chandohá da Cruz 
Graduando 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 19
 
PÁGINA DE APROVAÇÃO 
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do 
Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Rodrigo Chandohá da Cruz, sob o 
título “O reconhecimento do transexual pelo ordenamento jurídico brasileiro”, 
foi submetida em novembro de 2009 à banca examinadora composta pelos 
seguintes professores: MSc. Andrietta Kretz Viviani, Orientadora; Josemar Sidinei 
Soares, professor membro e Antônio Augusto Lapa, coordenador de monografia e, 
aprovada com a nota ( ) ( ). 
 
Itajaí, Novembro de 2009 
 
 
Profª. MSc. Andrietta Kretz Viviani 
Orientadora e Presidente da Banca 
 
 
 
 
Prof. Antônio Augusto Lapa 
Coordenação da Monografia 
 
 
 
 
Prof. Josemar Sidinei Soares 
Membro 
 
 
 
 
 
 
 20
 
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
 
 
Art. Artigo 
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 
CFM Conselho Federal de Medicina 
CID Classificação Internacional de Doenças 
CP Código Penal 
CRFB/1988 Constituição da República Federativa do 
Brasil 
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente 
GLBT Gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros 
MS Ministério da Saúde 
OMS Organização Mundial de Saúde 
SUS Sistema Único de Saúde 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ROL DE CATEGORIAS 
Bioética 
O termo bioética, literalmente, significa ética da vida. O vocábulo de raiz grega bios 
designa o desenvolvimento observado nas ciências da vida, como a ecologia, a 
biologia e a medicina, dentre outras. Ethos busca trazer à consideração os valores 
implicados nos conflitos da vida. 1 
Dignidade da Pessoa Humana 
[...] a dignidade, como qualidade intrínseca da pessoa humana, é irrenunciável e 
inalienável, constituindo elemento que qualifica o ser humano como tal e dele não 
pode ser destacado, de tal sorte que não se pode cogitar na possibilidade de 
determinada pessoa ser titular de uma pretensão a que lhe seja concedida a 
dignidade. Esta, portanto, como qualidade integrante e irrenunciável da própria 
condição humana, pode (e deve) ser reconhecida, respeitada, promovida e 
protegida, não podendo, contudo (no sentido ora empregado) ser criada, concedida 
ou retirada, já que existe em cada ser humano como algo que lhe é inerente. 2 
Ética 
[...] respeito aos outros, coerência, capacidade de viver e de aprender com o 
diferente, não permitir que o mal-estar pessoal ou a antipatia com relação ao outro o 
façam acusá-lo do que não fez [...].3 
Homossexual 
O homossexualismo consiste na perversão sexual que leva os indivíduos a sentirem-
se atraídos por outros do mesmo sexo, com repulsa absoluta ou relativa para os de 
 
1
 PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE, C.P. Problemas atuais de Bioética. 6. ed. São Paulo: Loyola; 
2002. 
2
 SARLET, Ingo Wolfang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição 
Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 40-41. 
3
 FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz e 
Terra, 1996, p. 20. 
 IX
sexo oposto. Há, portanto, um homossexualismo masculino (de homem para 
homem) e um homossexualismo feminino (de mulher para mulher). 4 
Intersexualismo 
O intersexualismo, também denominado de hermafroditismo, dá-se quando um 
indivíduo possui simultaneamente características de ambos os sexos, devendo se 
submeter à cirurgia para adequação do sexo genético, gonodal e fenotípico, que 
deve ser realizada após um estudo detalhado da identidade e do sexo psicossocial 
desenvolvido. 5 
Moral 
O conjunto de regras de conduta consideradas válidas, quer de modo absoluto para 
qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada. 6 
Registro Civil 
O registro Civil de nascimento é um direito do cidadão e tem a sua gratuidade 
garantida por lei. Esse documento é extremamente importante, pois ele é a prova da 
existência oficial e jurídica de todosos brasileiros. Maria Helena Diniz afirma que “o 
registro de nascimento é uma instituição pública destinada a identificar os cidadãos, 
garantindo o exercício de seus direitos”. 7 
Sexo 
O sexo é, mental em seus impulsos e manifestações, transcendendo quaisquer 
impositivos da forma em que se exprime. Reside na mente, a expressar-se no corpo 
espiritual e conseqüentemente no corpo físico8. O sexo deve ser visto por vários 
correntes, sendo resultante de um equilíbrio de vários planos, desde o físico até o 
 
4
 GOMES, H. Medicina Legal. 33 edição, ver. e atualiz. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2004. p. 476-
477. 
5
 PERES, Ana Paula Ariston Barion. Transexualismo: o direito a uma nova identidade sexual. Rio de 
Janeiro: Renovar, 2001. 
6
 LÓPEZ, M. Fundamentos da Clínica Médica: a relação paciente-médico, Rio de Janeiro: Medsin 
Editora Médica e Científica, 1997. p. 215. 
7
 DINIZ. M. H. Sistemas de Registros de Imóveis. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. 
8
 XAVIER, Francisco Cândido. Evolução Em Dois Mundos. Espírito André Luiz. [s.l]: FEB, 2002. 
 X
psicológico. Maranhão ainda divide o sexo em: genético; endócrino; morfológico; 
psicológico e jurídico. 9 
Sexualidade 
A sexualidade, entendida a partir de um enfoque amplo e abrangente, manifesta-se 
em todas as fases da vida de um ser humano, tendo na genitalidade (coito) apenas 
um de seus aspectos, talvez nem mesmo o mais importante. A sexualidade permeia 
todas as manifestações humanas10. “[...] um aspecto central do bem estar humano, 
do começo ao fim da vida, envolvendo sexo, identidade de gênero, orientação 
sexual, erotismo, prazer, intimidade e reprodução”. 11 
Transexual 
São pessoas que sofrem de neurodiscordância de gênero, nome que se originou em 
pesquisas norte-americanas, onde foi constatado em cadáveres de transexuais do 
sexo masculino, que a hipófise cerebral (que é a parte do cérebro que responde aos 
estímulos sexuais) possui estrias mais estreitas diferentes aos dos homens comuns, 
sendo idênticas a de uma mulher biológica. Baseando-se em tal pesquisa é que hoje 
alguns profissionais entendem o transexualismo como hermafroditismo hipofásico. 
Fato que faz com que a idéia de que um transexual seria uma pessoa que desejaria 
trocar ou mudar de sexo, seja ultrapassada e ultrajante, onde o transexual não deve 
ser colocado neste patamar discriminatório de mutantes, quando na verdade, a 
procura dos transexuais nada mais é do que a simples adaptação física, para 
exercer suas vidas emocionais, sociais, espíritas e sexuais, o que infelizmente não 
são alcançadas pela maioria, e numa minoria são conquistadas aos poucos e as 
duras penas. 12 
Transexualidade 
 
9
 MARANHÃO, O. R. Curso Básico de Medicina Legal. 8. ed., 4. tiragem. São Paulo: Malheiros, 
1998. p. 127. 
10
 LIMA, Junia Dias de. O Despertar da Sexualidade na adolescência. In: PEREIRA, José Leopídio; et 
al. (org.). Sexualidade na adolescência no novo milênio, 2007, p.15. 
11
 LIMA, Junia Dias de. O Despertar da Sexualidade na adolescência. In: PEREIRA, José Leopídio; et 
al. (org.). Sexualidade na adolescência no novo milênio, 2007, p.15. 
12
 IRIGUTI, Edna. Transexualismo. Disponível em: <http://www.grupoesperanza.com.br/EN 
TLAIDS/transexual.htm>. Acesso em jul. 2009. 
 XI
Transexualidade é a condição sexual da pessoa que rejeita sua identidade genética 
e a própria anatomia de seu gênero, identificando-se psicologicamente com o 
gênero oposto. Trata-se de um drama jurídico-existencial, por haver uma cisão entre 
a identidade sexual física e psíquica. 13 
Transexualismo 
O transexualismo é definido como patologia pela Organização Mundial de Saúde 
(OMS), na Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento (CID 10) que 
o reconhece como um transtorno de identidade sexual desde 1993. É considerado 
uma anomalia da identidade sexual, onde o indivíduo se identifica psíquica e 
socialmente com o sexo oposto ao que lhe fora determinado pelo registro civil. 14 
Transgenitalização 
A cirurgia de mudança de sexo, também conhecida pelo nome de transgenitalização, 
é altamente complexa, de recuperação dolorosa e requer um acompanhamento 
multidisciplinar não apenas no período que antecede a cirurgia, mas também na fase 
pós-operatória. O paciente que a ela é remetido necessita de revisões médicas 
constantes e de acompanhamento de psicólogos e assistentes sociais para encarar 
a sua nova situação, haja vista que, na maioria das vezes, passará a sofrer 
inúmeros preconceitos pelas diversas camadas da população. 15 
 
 
 
 
 
 
13
 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do Biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001. p.223 
14
 OMS Organização Mundial da Saúde. CID 10. 
15
 SUTTER, Matilde Josefina. Determinação e mudança de sexo. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
2003. p.109. 
 XII
SUMÁRIO 
RESUMO................................................................................................................. XIV 
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 15 
CAPÍTULO 1: ........................................................................................................... 17 
BIOÉTICA ................................................................................................................. 17 
 
1.1 MORAL E ÉTICA ................................................................................................ 17 
1.2 BIOÉTICA ........................................................................................................... 22 
1.2.1 Histórico .......................................................................................................... 22 
1.2.2 Conceito .......................................................................................................... 24 
1.2.3 Princípios Bioéticos ....................................................................................... 26 
1.2.3.1 Princípio da Beneficência ........................................................................... 27 
1.2.3.2 Princípio da Não-Maleficência .................................................................... 28 
1.2.3.3 Princípio da Autonomia .............................................................................. 29 
1.2.3.4 Princípio da Justiça ..................................................................................... 31 
1.2.4 Divisão da Bioética......................................................................................... 32 
1.3 RELAÇÃO DIREITO E BIOÉTICA ...................................................................... 33 
 
CAPÍTULO 2: ............................................................................................................ 36 
 SEXUALIDADE, IDENTIDADE DE GÊNERO E SEXO ........................................... 36 
 
2.1 A SEXUALIDADE SOB DIFERENTES OLHARES ............................................ 36 
2.2 IDENTIDADE DE GÊNERO OU SEXUAL .......................................................... 40 
2.3 SEXO .................................................................................................................. 42 
2.3.1 Sexo Genético ................................................................................................ 43 
2.3.1.1 Síndrome de Turner .................................................................................... 45 
2.3.1.2 Síndrome de Klinifelter ............................................................................... 45 
2.3.2 Sexo Endócrino .............................................................................................. 46 
2.3.3 Sexo Morfológico ...........................................................................................47 
2.3.4 Sexo Psicológico ............................................................................................ 47 
2.3.5 Sexo Jurídico .................................................................................................. 48 
 
 XIII
2.4 CONDIÇÕES SEXUAIS ...................................................................................... 49 
2.4.1 Heterossexualidade........................................................................................ 50 
2.4.2 Homossexualismo .......................................................................................... 50 
2.4.3 Intersexualismo .............................................................................................. 52 
2.4.4 Travestismo .................................................................................................... 52 
2.4.5 Transexualismo .............................................................................................. 53 
2.5 A CIRURGIA DE MUDANÇA DE SEXO ............................................................. 59 
 
CAPÍTULO 3: ........................................................................................................... 67 
PROCEDIMENTO PARA O RECONHECIMENTO DO TRANSEXUAL NO 
ORDENAMENTO JURÍDICO .................................................................................... 67 
 
3.1 RESPONSABILIDADE PENAL .......................................................................... 67 
3.1.1 Conseqüência morfológica resultante do procedimento cirúrgico ........... 68 
3.2 DESENVOLVIMENTO DA SEXUALIDADE PERCEBIDA PELO DIREITO ....... 72 
3.2.1 O valor do Registro civil como atestado de cidadania ............................... 73 
3.3 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A LEI DE REGISTROS 
PÚBLICOS ................................................................................................................ 76 
3.4 PROJETOS DE LEI ALTERANDO A LEI DE REGISTRO PÚBLICO E O 
CÓDIGO PENAL ....................................................................................................... 84 
3.5 JURISPRUDÊNCIAS .......................................................................................... 85 
3.6 LACUNA DA LEI E PROCESSAMENTO DA AÇÃO DECORRENTE DA 
MESMA ..................................................................................................................... 90 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 92 
 
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .................................................................. 95 
 
ANEXOS ................................................................................................................. 101 
Fotos: Exemplos de cirurgia de mudança de sexo de homem para mulher .... 101 
Fotos: Exemplos de cirurgia de mudança de sexo de mulher para homem .... 102 
Fotos: Implante de silicone em homens ............................................................. 103 
Fotos: Alterações na face para feminilização ..................................................... 104 
 XIV
RESUMO 
O presente trabalho tem como objetivo geral o reconhecimento do transexual pelo 
ordenamento jurídico brasileiro. Para tanto, fez-se um apanhado da legislação e da 
doutrina existente, que junto com os princípios bioéticos, oferecem suporte ao 
transexual. Com relação à metodologia, utilizou-se o método indutivo, na Fase de 
Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso 
na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da 
Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito 
Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. Seguindo-se este caminho metodológico, 
verificou-se que o transexual é reconhecido pelo ordenamento jurídico brasileiro e 
pode exercer seus direitos, pois a Constituição garante, através do princípio da 
dignidade da pessoa humana, que o mesmo tem direito a realizar o procedimento 
cirúrgico de adequação sexual, pois esta cirurgia é lícita, e posteriormente retificar o 
seu registro civil através de ação de retificação de registro civil. 
 
Palavras-chave: Bioética. Transexual. Retificação do Registro Civil. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
A presente Monografia tem como objeto o reconhecimento do 
transexual pelo ordenamento jurídico brasileiro. 
O seu objetivo institucional é produzir monografia para 
obtenção do título de bacharel em Direito-Universidade do Vale do Itajaí-Univali. 
O objetivo geral é verificar quais as possibilidades que o atual 
ordenamento jurídico brasileiro apresenta para o reconhecimento do transexual pelo 
ordenamento jurídico brasileiro, mediante um estudo doutrinário, legislativo e 
jurisprudencial. 
O objetivo específico é: a) conceituar a Bioética e seu histórico 
constatando sua relação com os avanços da área médica; b) abordar a sexualidade, 
o sexo e a identidade de gênero, direcionando o estudo para o transexualismo e a 
cirurgia de mudança de sexo; c) verificar as possibilidades para que ocorra o 
reconhecimento do transexual pelo ordenamento jurídico brasileiro. 
Para tanto, principiar–se-á, no Capítulo 1, tratando de moral, 
ética, bioética, abrangendo seu conceito, histórico, princípios, divisões e sua relação 
com o biodireito. 
No Capítulo 2, tratar-se-á de sexualidade, identidade de 
gênero, as diferentes classificações para sexo, as diferentes condições sexuais 
existentes, além de um estudo direcionado ao transexualismo e a cirurgia de 
mudança de sexo. 
No Capítulo 3, destacar-se-á de responsabilidade penal do 
cirurgião plástico, as conseqüências morfológicas da cirurgia de redesignação 
sexual, projetos de lei direcionados aos transexuais, a retificação do registro civil e 
as lacunas da lei. 
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as 
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, 
 
 
16
seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o 
reconhecimento do transexual pelo ordenamento jurídico brasileiro. 
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes 
hipóteses: 
• 1 → A cirurgia de mudança de sexo é amparada pela 
comunidade médica e jurídica. 
• 2 → A retificação do registro civil é possível em nosso 
ordenamento jurídico para os transexuais que efetuaram a 
cirurgia de mudança de sexo. 
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de 
Investigação foi utilizado o Método Indutivo16, na Fase de Tratamento de Dados o 
Método Cartesiano17, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente 
Monografia é composto na base lógica Indutiva. 
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas, 
do Referente18, da Categoria19, do Conceito Operacional20 e da Pesquisa 
Bibliográfica21. 
 
16
 Segundo Pasold (2002, p.110) o referido método trata de “pesquisar e identificar as partes de um 
fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral”. 
17
 O referido método pode ser resumido em quatro preceitos que são: 1. "nunca aceitar, por 
verdadeira, cousa nenhuma que não conhecesse como evidente " ; 2. dividir cada uma das 
dificuldades que examinasse em tantas parcelas quantas pudessem ser e fossem exigidas para 
melhor compreendê-Ias"; 3. "conduzir por ordem os meus pensamentos, começando pelos objeto 
mais simples e mais fáceis de serem conhecidos, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até 
o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo certa ordem entre os que não se 
precedem naturalmente uns aos outros"; 4.fazer sempre enumerações tão completas e revisões tão 
gerais, que ficasse certo de nada omitir" (grifo no original). In: PASOLD, César Luiz. Prática da 
Pesquisa Jurídica: idéiase ferramentas úteis para o pesquisador do Direito, p. 106-107. 
18
 "REFERENTE é a explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance 
temático e de abordagem para uma atividade intelectual. especialmente para uma pesquisa." In: 
PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do 
direito, p. 62. 
19
 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração elou expressão de uma idéia" In: 
PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do 
direito, p. 31. 
20
 "Conceito operacional (=cop) é uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de que tal 
definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos" In: PASOLD, Cesar Luiz. Prática da 
pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 56. 
 
 
17
CAPÍTULO 1 
BIOÉTICA 
Desde muito tempo vislumbram-se discordâncias a respeito 
das palavras Moral e Ética e isto se deve à própria etimologia destes termos os 
quais, gera confusão, visto que Ética vem do grego “ethos” que significa modo de 
ser, e Moral tem sua origem no latim, que vem de “mores”, significando costumes. 
Portanto, primeiramente, acredita-se de extrema importância diferenciar os institutos 
moral e ética, já que os mesmos servirão de base para este trabalho. 
Fundamental também para a realização desta pesquisa 
adentrar-se objetivando maiores esclarecimentos, na literatura pertinente á Bioética, 
pois nas aulas proferidas na Universidade, percebe-se que a matéria está sempre 
envolvida em assuntos relacionados com a medicina e o poder de intervenção dos 
médicos sobre o ser humano, objeto do presente estudo. 
Para tanto, realiza se um estudo específico neste capítulo, 
buscando na doutrina especializada, adequada fundamentação para melhor 
discernimento sobre moral, ética e bioética abrangendo histórico, conceito, divisões 
e princípios. 
 
1.1 MORAL E ÉTICA 
A origem do vocábulo “moral”, como já mencionado, vem do 
latim (mos-mores) e designa os costumes, a condução da vida, as regras de 
comportamento. Sua etimologia reflete um sentido razoavelmente amplo, 
direcionado ao agir humano, aos comportamentos cotidianos e, às escolhas 
existenciais. Induz ao pensamento espontâneo de hábitos sociais, normas, regras de 
 
21
 Para Gil (2006, p. 44): “A pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, 
constituído principalmente de livros e artigos científico”. 
 
 
18
comportamento, princípios e valores. 22 
Segundo López, a Moral pode ser conceituada como: 
O conjunto de regras de conduta consideradas válidas, quer de modo 
absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa 
determinada. Esse conjunto de normas, aceito livre e 
conscientemente, regula o comportamento individual e social das 
pessoas. 23 
Deste modo, prossegue o autor, tem-se como moral o conjunto 
de costumes, normas e regras de conduta estabelecidas em uma sociedade e cuja 
obediência é imposta a seus membros, variando de cultura para cultura e se 
modifica com o tempo, no âmbito de uma mesma sociedade. 24 
Comumente, os termos "ética" e "moral" são empregados como 
sinônimos, porém, entende-se que se reserva a este último apenas o próprio fato 
moral, enquanto o primeiro designa a reflexão filosófica sobre o mesmo. 
Segundo Carlim a moral se ocupa do comportamento das 
pessoas em sociedade, enquanto que a ética é a ciência prática de caráter filosófico, 
porque expõe e fundamenta princípios universais sobre a moralidade dos atos 
humanos. Cita Vasques, para o qual a moral é o conjunto de normas e regras 
designadas a regular as reações dos indivíduos numa comunidade social, sendo que 
a ética, é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens. Conclui Carlim 
ainda que a moral não é científica, mas pode ser objeto de uma ciência, que a 
investiga de forma sistemática, racional e objetiva; no seu entender este é o papel 
da ética. 25 
“A moral é a face subjetiva, nela a norma é regra da ação 
reconhecida interiormente pelo sujeito. A ética é face objetiva, já que a norma 
 
22
 DURAND, Guy. Introdução Geral à Bioética. História, Conceitos e Instrumentos. São Paulo: 
Loyola, 2003. 
23
 LÓPEZ, M. Fundamentos da Clínica Médica: a relação paciente-médico, p. 215. 
24
 LÓPEZ, M. Fundamentos da Clínica Médica: a relação paciente-médico. 
25
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas. Florianópolis: Terceiro 
Milênio, 1998, p. 27. 
 
 
19
constitui-se em princípios norteadores dos costumes do grupo social”. 26 
Etimologicamente, como já se viu, Moral, significa costume, 
conjuntos de normas adquiridas pelo homem, ao que complementa Silva, aludindo 
que: 
Moral é a moral prática, é a prática moral. É moral vivida, são os 
problemas morais. É a moral reflexa. Os problemas morais, 
simplesmente morais são restritos, nunca se referindo à 
generalidade. O problema moral corresponde à singularidade do 
caso daquela situação, é sempre um problema prático-moral. Os 
problemas éticos são caracterizados pelas generalidades, são 
problemas teórico-éticos. 27 
Castro Filho discorre sobre a moral comparando-a com a ética: 
A maioria dos estudiosos distingue ética de moral, argumentando 
que esta é originária da cultura da sociedade, da prática, e quanto 
aquela parte de uma reflexão filosófica (uma filosofia moral), mas só 
terá sentido se representar a realidade, haja vista as implicações 
temporárias. 28 
Logo, Cohen e Segre, para distinguir moral e ética, referem-se 
ao conceito de Barton e Barton. Para eles, a moral é uma reflexão, sobre o que é 
certo e o que é errado, no campo das condutas humanas, ou seja, são valores que 
dão origem a normas, desde os Dez Mandamentos, até o Código Penal29. Já a ética 
são as normas em si, que regulam como determinada pessoa deve comportar-se, 
seja ela um médico, ou um advogado. 30 
Concorda Chauí, para quem a moral refere-se ao 
comportamento normativo, em que as regras são definidas pela sociedade, e a ética 
refere-se ao comportamento autônomo do indivíduo capaz do desejo. Deste modo, a 
 
26
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas. Florianópolis: Terceiro 
Milênio, p. 28. 
27
 SILVA, Alcino Lázaro. Hérnias. São Paulo: Rocca, 2006. Temas de ética médica. Belo Horizonte: 
Cooperativa Editora de Cultura Médica, 1982, p. 23. 
28
 CASTRO FILHO, Sebastião de Oliveira. Congelamento de embriões: evolução legislativa. 2001. In: 
SCHAEFER, F. Procedimentos Médicos: Realizados à Distância e o Código de Defesa do 
Consumidor. Curitiba: Juruá, 2006. p.24. 
29 BARTON, W.E, BARTON, G.M. Ethics and law in mental health administration, 1984. In: SEGRE, 
M. e COHEN, C. (orgs). Bioética. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1999. p.15. 
30 BARTON, W.E, BARTON, G.M. Ethics and law in mental health administration, 1984. In: SEGRE, 
M. e COHEN, C. (orgs). Bioética. p.17. 
 
 
20
moral impõe as regras do comportamento e da ação e define as sanções para a 
prática desviante, enquanto a ética supõe um sujeito livre, capaz de estabelecer 
valores por si mesmo e de respeitá-los. 31 
Complementa a autora aludindo que mesmo diferentes quanto 
à sua origem, ética e moral aparecem imbricados em três pontos, quais sejam: 
primeiro, quando a prática da ética e o comportamento moral se definem pela 
disposição do indivíduo (ética) e da sociedade (moral) de dar fim à todo o tipo de 
violência, em seu sentido mais amplo; em segundo, quando ambas constituem ocampo da práxis, onde o agente da ação, a ação e a finalidade da ação são uma só 
e mesma coisa; e, terceiro, quando ambas operam no campo do necessário e do 
possível, de forma que o que será possa ser diferente do que é, pela ação 
humana.32 
Galvão refere-se à ética, reafirmando que a mesma tem origem 
grega, e discorrendo que seria uma boa-conduta, uma pessoa que possui valores 
internos. 33 
Já, Vásquez34 aponta que a Ética é teórica e reflexiva, 
enquanto a Moral é eminentemente prática. Uma completa a outra, havendo um 
inter-relacionamento entre ambas, pois na ação humana, o conhecer e o agir são 
indissociáveis. 
Segundo os ensinamentos do educador Freire, a ética é: 
[...] respeito aos outros, coerência, capacidade de viver e de 
aprender com o diferente, não permitir que o mal-estar pessoal ou a 
antipatia com relação ao outro o façam acusá-lo do que não fez [...].35 
Portanto, trata-se de obrigações a que o sujeito deve 
perseverantemente se dedicar. Dito de outro modo, não há ética nas ações 
 
31
 CHAUÍ, Marilena. Ética e democracia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1994. 
32
 CHAUÍ, Marilena. Ética e democracia. 
33 GALVÃO, Antônio Mesquita. Bioética: a ética a serviço da vida: uma abordagem multidisciplinar. 
Aparecida, SP: Santuário, 2004. p. 151. 
34
 VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. 18. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998. 
35
 FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz 
e Terra, 1996, p. 20. 
 
 
21
sorrateiras, na promoção da desarmonia, no fomento à intriga, na maledicência, na 
traição. Por isso, viável se ressaltar ainda Freire quando explica que “a ética de que 
se fala é marca da natureza humana, algo indispensável à convivência, que lhe dá 
suporte quando constata, compara, avalia, valora, decide e rompe". 36 
Por fim, uma das concepções que distingue, de forma sumária 
estes dois institutos é apresentada pelos autores Kipper; Oselka e Oliveira, os quais 
afirmam que enquanto a moral estabelece normas assumidas pelos seres-humanos, 
para garantir uma boa-convivência, a ética não faz referida função. A ética procura 
justificar a moral, e não estabelece normas, a ética é a norma em si, decorrente da 
moral. 37 
Para garantir a manutenção dos padrões morais através do tempo e 
sua continuidade, as sociedades tendem a naturalizá-la. A 
naturalização da existência moral esconde o mais importante da 
ética: o fato de ela ser criação histórico-cultural [...]. O homem como 
único ente, que só pode ser enquanto realiza o seu dever-ser revela-
se como ‘pessoa’ ou unidade espiritual, sendo a fonte, base de toda 
a axiologia e de todo o processo cultural. 38 
Enfim, sendo a ética a ciência da moral, isto é, de uma esfera 
de comportamento humano, é mister a discussão acerca dos padrões éticos da 
sociedade com a finalidade de apontar caminhos para uma nova moral, ou seja, 
para novas regras da orientação das relações dentro de grupos sociais em 
constante transformação”. 39 
Viável ainda a alusão de Carlin de que a sociedade antiga 
apresentava-se em duas classes, existiam duas morais: a dos homens livres que era 
efetiva, vivida e se fundamentava nas grandes doutrinas éticas dos filósofos da 
antigüidade e a dos escravos não conseguia desenvolver-se teoricamente. Na 
sociedade medieval, a moral correspondia às características econômica-sociais e 
espirituais. Era influenciada no conteúdo da Igreja, somente os servos não atinham 
 
36
 FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz 
e Terra, 1996, p. 14-22. 
37 KIPPER, D. J.; OSELKA, G W; OLIVEIRA, R. A. Bioética clínica. In: ANJOS, M. F. dos; SIQUEIRA, 
J. E. de. (Org.). Bioética no Brasil: tendências e perspectivas. Aparecida, SP: Idéias & Letras, 
2007, p. 117. 
38
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas. Florianópolis: Terceiro 
Milênio, p. 39. 
39
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas, p. 59. 
 
 
22
uma formulação codificada de seus princípios e regras. A moral aristocrática se 
assemelhava à dos homens livres. 40 
Já, com a produção industrial, o operário é visto como 
instrumento de produção e não como ser humano, alude o autor, porém, apesar 
desta transformação, a sociedade continua ainda a viver baseada na exploração do 
homem pelo homem, lançando mão da moral “para justificar e regular as relações de 
opressão e de exploração” no âmbito de determinadas políticas, o que nos faz 
considerar que ao longo do tempo a moral muda historicamente de acordo com as 
mudanças no desenvolvimento social. 41 
O interesse pelos temas relativos à moral, e por conseguinte, à 
ética, existem há séculos, tendo sua origem no mundo grego antigo. Entretanto, o 
termo bioética, também denominado ética biomédica, a qual relaciona-se com temas 
morais originados na prática da medicina ou na atividade de pesquisas biomédicas, 
juntamente com a disciplina que o designa, são novos, como se poderá constatar no 
texto a seguir. 
 
1.2 BIOÉTICA 
Antes de se definir a bioética, faz-se uma abordagem 
doutrinária sobre seu surgimento, ressaltando-se a importância da Bioética, cuja 
referência central é o ser humano, desde o nascimento até a morte. Aliás, “é sobre 
essas duas fases da vida que hoje a ciência está fazendo seus melhores progressos 
e, obviamente, colocando problemas éticos antes nunca postos”. 42 
 
1.2.1 Histórico 
A bioética propicia o entendimento das relações do homem 
 
40
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas, p. 59-60. 
41
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas, p. 61. 
42
 BARCHIFONTAINE, C. P. de; PESSINI, L. (Org.). Bioética: Alguns desafios. 2. ed. São Paulo: 
Loyola, 2001. p. 67. 
 
 
23
com a vida tornando-o responsável pelas escolhas boas ou más, o que, pode-se 
dizer, é justamente o ponto de vista ético. 
Diniz afirma com base em Clotet que a bioética surgiu há cerca 
de trinta anos, em decorrência do grande desenvolvimento científico, da biologia 
molecular e da biotecnologia, e em decorrência deste desenvolvimento acelerado, 
começaram a haver relatos de mau-uso destes âmbitos, que eles seriam utilizados 
não para o benefício, e sim para o malefício, já que não havia uma definição moral e 
ética para sua aplicação. Ademais, a teologia e filosofia passaram a participar destas 
aplicações. 43 
Costa, Garrafa e Oselka pontuam que foi publicada uma obra 
no ano de 1971, chamada de Bioethics: Bridge to the Future, pelo autor Van 
Rensselear Potter, que exercia a função médica de cancerologista. Os autores ainda 
exprimem que a obra foi publicada pois havia uma preocupação com a humanidade, 
os seres vivos e o meio ambiente, ou seja, da vida planetária.44 
Sgreccia alega, que foi o oncólogo, Van Rensellear Potter que 
cunhou o termo, acrescendo que no ano de 1970, já havia sido publicado um artigo, 
cujo título era The Science of Survival, em que fazia menção ao termo.45 Em 
colocação própria, Sgreccia aduz que a bioética surge devido à uma situação 
alarmante, uma preocupação pela vida, devido aos avanços tecnológicos.46 
Santos narra de forma semelhante aos doutrinadores 
anteriores, que Potter é responsável pelo surgimento da bioética, e com base no 
próprio Potter, destaca que a disciplina bioética une a ética e a biologia, mediante 
seus valores. 47 
Galvão traz uma fundamentação similar, discorrendo que a 
bioética surge devido aos precedentes do Tribunal de Nuremberg, o conhecido 
tribunal que julgava os crimes de guerra realizados pelos nazistas, contra os seres-43
 DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 5. 
44
 COSTA, Sergio Ibiapina Ferreira; OSELKA, Gabriel; GARRAFA, Volnei (coords). Iniciação à 
Bioética. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 1998, p. 15. 
45
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica. 2. Ed., São Paulo: 
Loyola,1996, p. 24. 
46
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica, p. 24. 
47
 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Equilíbrio de um pêndulo: bioética e a lei: implicações 
médico-legais. São Paulo: Ícone, 1998. p. 38. 
 
 
24
humanos. O autor indica que a preocupação teve fundamento nos avanços dos 
transplantes de órgãos e de outros descobrimentos científicos. 48 
Kipper, Oselka e Ayer seguem a mesma linha de pensamento, 
relacionada ao desenvolvimento tecnológico e sua aplicação sanitária. Os autores 
mencionam centros estrangeiros, nos quais são realizados estudos sobre este tema, 
como o Kennedy Institute of Ethics e o Hastings Center nos Estados Unidos. 49 
Portanto, verifica-se que o entendimento majoritário dos 
autores é que foi o oncólogo, ou cancerologista, Van Rensellear Potter que cunhou o 
tema, pois estava preocupado, alarmado, com o desenvolvimento da ciência médica, 
e temia o seu mau-uso, que fosse aplicado de forma indevida. Definido isso, busca-
se agora um conceito para a bioética. 
É interessante fazer um apontamento neste sentido. No 
período da década de setenta, houve o surgimento das histórias em quadrinhos, as 
“revistinhas” nos Estados Unidos, e nesta época, existiam autores que faziam 
referências à experimentos do governo americano aos soldados. É o caso do 
personagem “Wolverine”, famoso por compor o grupo de mutantes X-Men. Pode 
parecer inapropriado este comentário em um trabalho acadêmico, entretanto, as 
pessoas manifestavam seu temor de formas diferentes. Alguns criavam doutrinas, 
com embasamento legal, enquanto outros transformavam a situação em 
entretenimento. 
Referente ao conceito de bioética pode-se inicialmente aludir 
que o mesmo está relacionado com a própria palavra, como os autores pesquisados 
fazem menção e são referenciados no próximo tópico. 
 
1.2.2 Conceito 
O termo bioética, literalmente, significa ética da vida. O 
vocábulo de raiz grega bios designa o desenvolvimento observado nas ciências da 
 
48
 GALVÃO, Antônio Mesquita. Bioética: a ética a serviço da vida: uma abordagem multidisciplinar 
p. 55. 
49
 KIPPER, D. J.; OSELKA, G. W.; AYER, R. Bioética Clínica. In: ANJOS, M. F. dos; SIQUEIRA, J. E. 
de (orgs.) Bioética no Brasil: tendências e perspectivas. São Paulo: Idéias e Letras. p.117. 
 
 
25
vida, como a ecologia, a biologia e a medicina, dentre outras. Ethos busca trazer à 
consideração os valores implicados nos conflitos da vida. 50 
Concorda Kuramoto, discorrendo que a palavra ética tem 
origem grega, da palavra éthiké, e bio também vem do grego, especificamente da 
palavra bíos, a qual significa vida. Portanto, constata-se que é a ética da vida. 51 
Galvão advoga que a melhor maneira de entender uma 
palavra, é buscando o significado etimológico. Assim como Kuramoto, Galvão afirma 
que bio e ética são palavras advindas das expressões gregas, bios e éthicos, 
verificando que é uma vida seguida de modo ético. 52 
Segre declara de forma semelhante, que seria a parte da ética 
preocupada com a vida, na qual a vida seria o principal objeto de estudo, e 
envolvendo todos os seus aspectos, desde o nascimento, desenvolvimento, até a 
morte. 53 
Mesmo com este conceito firmado a partir da etimologia da 
palavra, a maioria dos autores destaca o conceito que consta na Encyclopedia of 
Bioethics. Na obra de Diniz, colhem-se dois conceitos operacionais, o primeiro do 
ano de 1978, que descreve a bioética como “o estudo sistemático da conduta 
humana no campo das ciências da vida e da saúde, enquanto examinada à luz dos 
valores e princípios morais”. Já em 1995, passou a referir-se a ela como “estudo 
sistemático das dimensões morais das ciências da vida e do cuidado com a saúde, 
utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto multidisciplinar”. 54 
Na introdução à segunda edição da Enciclopédia de Bioética 
encontra-se o termo bioética definido como: 
 
50
 PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE, C.P. Problemas atuais de Bioética. 
51
 KURAMOTO, J. B. Bioética e Direitos Humanos. In: SIQUEIRA, J. E. de; PROTA, L.; 
ZANCANARO, L. (orgs.). Bioética: estudos e reflexões. Londrina: UEL, 2000. P. 28. 
52
 GALVÃO, Antônio Mesquita. Bioética: a ética a serviço da vida: uma abordagem multidisciplinar, p. 
53. 
53 SEGRE, M. Definição de Bioética e sua relação com a ética, deontologia e diceologia In: SEGRE, 
M. e COHEN, C. (orgs). Bioética. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1999. p.23. 
54
 DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito, p. 10. 
 
 
26
[...] o estudo sistemático das dimensões morais, incluindo a visão, a 
decisão, a conduta e as normas, das ciências da vida e da saúde, 
utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto 
interdisciplinar. 55 
Portando, constata-se que a definição de bioética envolve um 
processo de confronto entre os fatos biológicos e os valores humanos na tomada de 
decisões envolvendo os problemas práticos em diferentes áreas da vida, como na 
assistência médico-sanitária: 
[...] cobra todo su sentido la definición de la bioética como el proceso 
de contrastación de los hechos biológicos con los valores humanos, 
a fin de globalizar los juicios sobre las situaciones y de esa forma 
mejorar la toma decisiones, incrementando su corrección y su 
calidad. Una área particular de la bioética sería la bioética sanitaria o 
bioética clínica, que en consecuencia se podría definir como la 
inclusión de los valores en la toma de decisiones sanitarias, a fin de 
aumentar su corrección y su calidad56. 
Como toda forma de instrumento ético, são necessários 
princípios para a sua utilização. Para tanto, adiante serão abordados os princípios 
bioéticos e o seu surgimento. 
 
1.2.3 Princípios Bioéticos 
A bioética surgiu com Potter, mas quem é responsável pelo seu 
polimento são Childress e Beauchamps. 
Sgreccia afirma que T.L. Beauchamps e J.F. Childress 
publicaram uma obra chamada de Principles of Biomedical Ethics. Nesta obra são 
citados princípios a serem seguidos para a boa aplicação da bioética, para suprir a 
preocupação que Potter mencionou. 57 
No mesmo entendimento, Santos pontua que os filósofos Tom 
L. Beauchamps e James F. Childress, na obra Princípios da Ética Biomédica, 
 
55
 REICH, W.T. (org.). Bioethics Enciclopedya. 1995. In: PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE, C.P. 
Problemas atuais de Bioética. 6. ed. São Paulo: Loyola; 2002. [s.p.]. 
56
 GRACIA D. Bioética clínica. Santa Fé de Bogotá: El Buho; 1998, p. 30. 
57
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica, p. 166. 
 
 
27
determinaram quatro princípios, Beneficência, Não-Maleficência, Autonomia e 
Justiça.58 Kipper, Oselka e Ayer, narram que os filósofos citados acima 
estabeleceram métodos para análise dos problemas que surgiam.59 
Clotet e Kipper complementam o estudo, argumentando que os 
princípios também vieram para que houvesse harmonia na solução dos conflitos, 
como, por exemplo, no caso de doação de órgãos e laqueadura de trompas. 60 
Verifica-se, portanto, que a bioética é principialista, uma ética 
de princípios, como exprime Kuramoto. 61 Constatado isto, os referidos princípios 
passam a ser estudados. 
 
1.2.3.1 Princípio da Beneficência 
Kuramoto trata do princípio da beneficência, alegando que a 
expressão tem origem latina, da palavrabonum facere, ou fazer o bem, no caso em 
tela, ao paciente. Este princípio faz referência ao juramento hipocrático dos médicos, 
de tratar bem os pacientes, os fazendo o bem. 62 
Clotet e Kipper seguem a mesma linha de pensamento ao 
definir o princípio da beneficência, argumentando que o médico deve ser 
benevolente quanto ao paciente. 63 Os autores ainda complementam seu ponto de 
vista, fazendo referência ao Relatório Belmont, na qual o princípio da beneficência é 
visto de duas maneiras: a princípio de não lesionar, e por fim, trazer o maior número 
 
58
 SANTOS, M. C. C. L. O equilíbrio de um pêndulo: bioética e a lei: implicações médico-legais, 
p.42. 
59
 KIPPER, D. J.; OSELKA, G. W.; AYER, R. Bioética Clínica. In: ANJOS, M. F. dos; SIQUEIRA, J. E. 
de (orgs.) Bioética no Brasil: tendências e perspectivas, p. 118. 
60
 CLOTET, J.; KIPPER, D. J. Princípios da beneficência e maleficência. In: COSTA, S. I., OSELKA, 
G.; GARRAFA, V. (coords.). Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho federal de Medicina, 1998, p. 
41. 
61
 KURAMOTO, J. B. Bioética e Direitos Humanos. In: SIQUEIRA, J. E. de; PROTA, L.; 
ZANCANARO, L. (orgs.). Bioética: estudos e reflexões, p. 28. 
62
 KURAMOTO, J. B. Bioética e Direitos Humanos. In: SIQUEIRA, J. E. de; PROTA, L.; 
ZANCANARO, L. (orgs.). Bioética: estudos e reflexões, p. 31. 
63
 CLOTET, J.; KIPPER, D. J. Princípios da beneficência e maleficência. In: COSTA, S. I., OSELKA, 
G.; GARRAFA, V. (coords.). Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho federal de Medicina, p.42. 
 
 
28
de benefícios possíveis.64 
Sgreccia refere-se ao princípio da beneficência chamando-o de 
princípio do benefício. No mesmo viés que os autores citados, fala da origem do 
princípio no juramento hipocrático, da palavra ser originada do latim. Todavia, traz 
ainda uma nomeação diversa ao princípio, ao chamado de “princípio de não 
malefício”, percebendo-se que o autor não faz distinção entre os princípios da 
beneficência e não-maleficência. Ademais, esclarece que o referido princípio está 
relacionado com um tratamento benevolente ao paciente. 65 
Kipper, Oselka e Ayer argumentam, assim como Clotet e 
Kipper, que o princípio da beneficência envolve duas ações, fazer o bem e prevenir 
o mal, pois é decorrente de uma obrigação moral com o paciente de beneficiá-lo. 66 
Constata-se que o conceito e aplicação do referido princípio 
tem descrição similar, senão idêntica, entre os autores mencionados, o qual seria 
fazer o bem. 
 
1.2.3.2 Princípio da Não-Maleficência 
Kuramoto argumenta que o princípio da não-maleficência seria 
também decorrente do juramento hipocrático, de ajudar, ou ao menos não agravar a 
situação. A palavra tem origem no latim, de primun non nocere, não fazer o mal, não 
lesionar. 67 
Clotet e Kipper ao esclarecerem o princípio da não-
maleficência, também mencionam o juramento hipocrático, e reafirmam que a 
palavra em origem no vocábulo latino primum non nocere. Sustentam ainda que o 
 
64
 COSTA CLOTET, J.; KIPPER, D. J. Princípios da beneficência e maleficência. In: COSTA, S. I., 
OSELKA, G.; GARRAFA, V. (coords.). Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho federal de Medicina, 
1998, p. 45. 
65
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica,1996, p. 167. 
66
 KIPPER, D. J.; OSELKA, G. W.; AYER, R. Bioética Clínica. In: ANJOS, M. F. dos; SIQUEIRA, J. E. 
de (orgs.) Bioética no Brasil: tendências e perspectivas. São Paulo: Idéias e Letras.P. 120. 
67
 KURAMOTO, J. B. Bioética e Direitos Humanos. In: SIQUEIRA, J. E. de; PROTA, L.; 
ZANCANARO, L. (orgs.). Bioética: estudos e reflexões. Londrina: UEL, 2000.P. 31. 
 
 
29
referido princípio envolve uma abstenção, uma inação por parte do profissional. 68 
Kipper, Oselka e Ayer advogam que o princípio da não-
maleficência obriga o médico a não lesionar o paciente, e ainda pontua que, 
especialmente na medicina, os riscos de causar danos ao paciente são grandes, por 
negligência. 69 
Verifica-se que os autores, assim como no princípio anterior, 
possuem entendimento uniforme quanto a este. Entretanto, existem relatos que, 
desde que o juramento hipocrático foi adotado pela comunidade médica, há aqueles 
que não o respeitam, por inúmeras razões. Entre elas, está o fato de acreditarem 
que, o sacrifício de uma pessoa, para salvar outras, pode ser justificado, 
desrespeitando o juramento e os princípios evidenciados. O tema foi abordado no 
filme alemão “Anatomia”, em que uma estudante de medicina depara-se com 
membros da Sociedade Anti-Hipocrática, a qual realiza experimentos em seres-
humanos para estudá-los. 
 
1.2.3.3 Princípio da Autonomia 
A palavra autonomia tem aplicação abrangente, já que é 
empregada tanto no ordenamento jurídico, quanto na bioética, como princípio. No 
espaço jurídico, Kretz faz a seguinte colocação: 
A autonomia da vontade, como princípio no ordenamento jurídico, 
toma contornos diversos. Vários autores têm se posicionado pelo uso 
da terminologia “autonomia privada”, uma vez que esse princípio se 
encontra intimamente ligado à idéia de relação jurídica, negócio 
jurídico e direito contratual. Essa questão de divergência, quanto à 
nomenclatura, se deve a si próprio posicionamento adotado pelos 
doutrinadores, isto é, quem prefere a expressão “autonomia da 
vontade”, defendem a Teoria da Vontade.70 
Já Kuramoto ao se referir ao princípio da autonomia no âmbito 
 
68
 CLOTET, J.; KIPPER, D. J. Princípios da beneficência e maleficência. In: COSTA, S. I.; OSELKA, 
G.; GARRAFA, V. (coords.). Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho federal de Medicina, p.47. 
69
 KIPPER, D. J.; OSELKA, G. W.; AYER, R. Bioética Clínica. In: ANJOS, M. F. dos; SIQUEIRA, J. E. 
de (orgs.) Bioética no Brasil: tendências e perspectivas, p. 119. 
70
 KRETZ, A. Autonomia da Vontade e Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais. 
Florianópolis: Momento Atual, 2005, p. 5 e 6. 
 
 
30
da bioética, pontua que a palavra tem origem grega, de autos e nomos, eu e lei, 
contatando-se que trata da vontade da pessoa de criar seu próprio código de 
conduta, de ser seu próprio governo, e fazer suas próprias escolhas, atuar da forma 
que entender melhor. 71 
Muñoz e Fortez, da mesma maneira de Kuramoto, referem-se 
ao princípio da autonomia aludindo à sua origem dos vocábulos gregos autos e 
nomos, uma lei própria. Neste sentido, argumentam que, quando há apenas uma 
linha a ser seguida, não há autonomia, pois a pessoa não tem opção de exercício do 
princípio. 72 
Sgreccia discorre que o referido princípio trata da consolidação 
das prerrogativas das pessoas, de escolherem, de se auto-determinar. O doutrinador 
faz menção à relação entre o médico e o paciente, no sentido que o médico deve 
indicar o melhor tratamento para curar a moléstia que atinge seu paciente, mas cabe 
somente ao paciente aceitar ou não o tratamento. Há, entretanto, exceções, nos 
casos de tratamento psiquiátricos, em que é necessária intervenção pelo bem do 
paciente, mas, estando ele em função de suas faculdades mentais, deve optar o 
caminho a percorrer. 73 
Kipper, Oselka e Ayer pontuam que o princípio da autonomia 
está relacionado com a capacidade da pessoa identificar o que lhe trará maior 
benefício. Neste sentido, assim como Sgreccia, fazem uma observação, que a 
pessoa deve racionalizar o seu problema, para poder tomar a melhor decisão, além 
de ter alternativas para escolher entre as mesmas. 74 
Atualmente, constata-se que muitas pessoas recusam-se a 
tratar-se das moléstias que as atacam, seja um câncer, ou até um quadro de 
diabetes. Nestes casos, o princípio da autonomia da pessoa evidencia-se. 
 
71
 KURAMOTO,J. B. Bioética e Direitos Humanos. In: SIQUEIRA, J. E. de; PROTA, L.; 
ZANCANARO, L. (orgs.). Bioética: estudos e reflexões. p. 31. 
72
 MUNÕZ, D. R.; FORTES, P. A. C. O princípio da autoomia e o consentimento livre e esclarecido. 
In: COSTA, S. I., OSELKA, G.; GARRAFA, V. (coords.). Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho 
federal de Medicina, 1998, p.57. 
73
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica, p. 167. 
74
 KIPPER, D. J.; OSELKA, G. W.; AYER, R. Bioética Clínica. In: ANJOS, M. F. dos; SIQUEIRA, J. E. 
de (orgs.) Bioética no Brasil: tendências e perspectivas, p. 120. 
 
 
31
1.2.3.4 Princípio da Justiça 
Assim como o vocábulo autonomia, a palavra justiça tem significação 
ampla, sendo que se registram manifestações de filósofos como Aristóteles quanto 
ao tema. Na filosofia Aristotélica a Justiça é elencada como a virtude principal. 
Aristóteles desdobra a justiça particular em dois tipos: a distributiva e a corretiva. A 
justiça distributiva é exercida pelo legislador, ou seja, na distribuição da honra, 
riqueza e demais bens da comunidade. Já a justiça corretiva é exercida pelo juiz ao 
aplicar punições aos delinqüentes quando da solução de litígios. O desenvolvimento 
de seu pensamento filosófico encontra fundamento na idéia de igualdade 
proporcional, uma vez que não existe igualdade nem na natureza e nem entre os 
homens. 75 
No âmbito da bioética, Kuramoto discorre sobre o princípio da 
justiça, destacando que, quando se trata de distribuir os recursos sanitários, isto 
deve ser feito de forma justa e imparcial. 76 
Sgreccia esclarece que o princípio da justiça está agregado à 
distribuição de tratamento de forma igual pelo Estado, ou seja, todos possuem os 
mesmos direitos, e por isto, devem ser tratados de forma igual. 77 
Santos argumenta que o princípio da justiça obriga ao Estado a 
distribuir de forma justa os serviços médicos, ou da área da saúde. Mesmo que as 
pessoas sejam diferentes, devem ser tratadas de forma igual. 78 
Kipper, Oselka e Ayer descrevem o princípio, como a maioria 
dos autores, de forma a tratar as pessoas de forma igual, e faz uma importante 
colocação. Em decorrência da dificuldade de todos terem acesso à saúde de forma 
uniforme, surge, por isso um conflito sobre a distribuição, à população, de 
 
75
 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Nova Cultural, 1996. (Coleção os Pensadores). 
76
 KURAMOTO, J. B. Bioética e Direitos Humanos. In: SIQUEIRA, J. E. de; PROTA, L.; 
ZANCANARO, L. (orgs.). Bioética: estudos e reflexões, p. 32. 
77
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica,1996, p. 167. 
78
 SANTOS, M. C. C. L. O equilíbrio de um pêndulo: bioética e a lei: implicações médico-legais, p. 
45. 
 
 
32
assistência médica. 79 
Basta ler um jornal, ou assistir algum noticiário para verificar 
que o sistema de saúde brasileiro ainda é precário e as pessoas custam a ter 
acesso ao mesmo. Mesmo sendo uma prerrogativa constitucional, nem sempre há 
cumprimento da mesma. 
 
1.2.4 Divisão da Bioética 
A bioética pode ser dividida quanto aos seus campos de 
atuação ou a situação de aplicação. 
Sgreccia narra que a bioética é dividida em três categorias: 
geral, especial e clínica. A bioética geral está relacionada basicamente com a 
legislação, no sentido de delimitação. A bioética especial preocupa-se com as 
“novidades” na medicina, dentre elas, a engenharia genética e a experimentação 
clínica. Por fim, a bioética clínica, ou de decisão, agrega as situação médicas 
práticas, e decide quais caminhos, ou neste caso, princípios a adotar, uma forma de 
utilização de critérios. 80 
Já Garrafa divide a bioética conforme sua situação, sendo ela 
emergente ou persistente. A bioética de situação emergente é similar com a bioética 
especial definida por Sgreccia, pois aborda o desenvolvimento desenfreado da área 
médica, como a clonagem e o projeto genoma humano. Já a bioética de situação 
persistente aborda a situação das pessoas que não conseguem ter acesso aos 
recursos médicos de forma igualitária. 81 
 
 
 
79
 KIPPER, D. J.; OSELKA, G. W.; AYER, R. Bioética Clínica. In: ANJOS, M. F. dos; SIQUEIRA, J. E. 
de (orgs.) Bioética no Brasil: tendências e perspectivas, p. 122. 
80
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica, p. 46. 
81
 GARRAFA, V. Bioética e ciência: até onde avançar sem agredir. In: COSTA, S. I., OSELKA, G.; 
GARRAFA, V. (coords.). Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho federal de Medicina, 1998, p. 100. 
 
 
33
1.3 RELAÇÃO DIREITO E BIOÉTICA 
Até o presente momento, verifica-se que a bioética é a ética da 
vida, ou seja, o conjunto de regras para todos os seres que habitam nosso planeta 
viverem em harmonia. Neste sentido, para o fechamento do presente capítulo, é 
importante identificar como a bioética interage com o Direito. 
A bioética em seu sentido estrito ou seja, a ética relacionada com as 
novas conquistas biotecnológicas, abrangente, estão, de questões 
como manipulação genética, reprodução assistida, transexualidade, 
manutenção da vida artificial, eutanásia [...] somente o limitado 
âmbito de problemas delas decorrentes já é o suficiente para impor 
ao direito uma modificação substancial. 82 
Galvão sustenta que por muito tempo, o médico era visto como 
um semi-Deus, pois era uma pessoa que trazia segurança às pessoas, 
principalmente em momentos ruins, em que alguém se encontrava doente, 
precisando de assistência. Nesta época, existiam poucos médicos e poucas 
faculdades de medicina. Com o decorrer do tempo, o aumento de faculdades de 
medicinas e o fato de as pessoas buscarem conhecimento específico e geral 
mediante a educação, os pacientes e seus familiares começaram a questionar as 
condutas médicas, alternando entre profissionais. 83 
No mesmo sentido, Sgreccia faz alusão à teologia, afirmando 
que o médico era tido como “servidor dos sofredores”, sendo o “Christus servus”, e o 
paciente sendo o “Christus patiens”. Nesta colocação, o médico é o servo de Cristo, 
cuidando dos pacientes, estando obrigado a cuidar dos doentes. 84 
Galvão ainda sustenta que, especificamente na década de 
oitenta, tornaram-se públicas denúncias, feitas pela bioética, contra médicos por 
mau-exercício da sua profissão. Neste viés, surge o biodireito, que busca a 
aplicação do direito mediante a utilização da bioética. O autor aduz que o biodireito 
está inserido na bioética, e que existem operadores do direito dedicados a este 
campo, tendo em vista o número de denúncias contra médicos e profissionais da 
 
82
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas, p. 98. 
83
 GALVÃO, Antônio Mesquita. Bioética: a ética a serviço da vida: uma abordagem multidisciplinar, p. 
156. 
84
 SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética, I. Fundamentos e Ética Biomédica, p. 39. 
 
 
34
área da saúde.85 
Coan no mesmo sentido que Galvão, acresce que o biodireito é 
uma disciplina que envolve direitos da quarta geração, que estão evidenciados pelo 
acelerado desenvolvimento da biomedicina. O autor ainda afirma que é um campo 
polêmico, pois aborda a responsabilidade do profissional da saúde. 86 
Para encerrar este capítulo, a contribuição de Carlin, o qual 
complementa que um dos objetivos do político-jurídico é preencher a lacuna 
legislativa existente, buscando uma norma melhor em busca de uma sociedade 
melhor, onde todos possam ter direito a uma vida digna e utilizar-se dos avanços 
médico-científicos que lhes são ofertados diariamente. Na realidade, a consciência 
jurídica é um fenômeno em constante evolução, sendo que o papel reservado a este 
direito deverá ser, sem dúvida realizador dos valoressociais, mas a partir de um 
interagir dialético com a Bioética. 87 
E, alude ainda o autor que a reflexão bioética enquanto 
reconhecimento do valor ético da vida humana, assume impressionante atualidade 
em virtude dos avanços das ciências biomédicas, o que significa dizer que a reflexão 
bioética, com seu anunciado compromisso democrático, nada mais é do que lidimo 
resultado da incorporação social dos direitos humanos de terceiras e quartas 
gerações. Com efeito a reflexão bioética é decorrência da crise de confiança cega 
na ciência, como se tudo o que se faz em seu nome necessariamente se resolve em 
vantagem para o homem. A ética é a ordenação destinada a conduzir o homem de 
acordo com uma hierarquia de bens, uma tábua de valores, um sistema axiológico 
de referência. “É a ordenação ideal para a atividade livre do ser humano. 88 
Portanto, constata-se que a bioética terá cumprimento 
mediante o biodireito, sendo que os dois estão estritamente interligados. A bioética 
 
85
 GALVÃO, Antônio Mesquita. Bioética: a ética a serviço da vida: uma abordagem multidisciplinar, p. 
157 . 
86 COAN, E. I. Biomedicina e biodireito: desafios bioéticos: traços semióticos para uma hermenêutica 
constitucional fundamentada nos princípios da dignidade da pessoa humana e da inviolabilidade do 
direito à vida. In: SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito: ciência da vida, os novos 
desafios. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p.247. 
87
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas, p. 113. 
88
 CARLIN, Volnei Ivo. Ética e Bioética: novo direito e ciências médicas, p. 119-123. 
 
 
35
apresenta princípios e a preocupação com a vida, e o biodireito serve para auxiliar a 
bioética, pois é o campo jurídico de discussão dos problemas bioéticos. 
Neste viés, no capítulo seguinte são abordados os tipos de 
sexo, identidade sexual, condições sexuais, além de direcionar o estudo ao 
transexualismo, objeto principal deste trabalho. 
 
 
36
CAPÍTULO 2 
SEXUALIDADE, IDENTIDADE DE GÊNERO E SEXO 
De maneira tradicional, a relação entre sexualidade, identidade 
e sexo, constituintes da identidade, tem sido considerada em uma seqüência lógica 
onde a um sexo físico-biológico correspondem um determinado comportamento de 
gênero e uma maneira específica de vivência da sexualidade. Ou, conforme salienta 
Louro (2004): “A coerência e a continuidade supostas entre sexo-gênero-
sexualidade servem para sustentar a normatização da vida dos indivíduos e das 
sociedades.”89 
 
2.1 A SEXUALIDADE SOB DIFERENTES OLHARES 
Na era vitoriana90 a sexualidade era abordada como prática 
legítima na família conjugal, mais exatamente no quarto dos pais, com a única 
função da reprodução. Não era concebida como tema de discursos e, de acordo 
com Giddens (1993), a sexualidade foi censurada e não foi um segredo aberto, 
representado, analisado ou avaliado junto à população. 
De acordo com Foucault, a sexualidade passou a ser 
enquadrada numa nova ordem discursiva, a partir da sua institucionalização, por 
meio dos diferentes mecanismos sociais91. O autor, contribui, retratando bem o 
comportamento sexual da época: 
Um rápido crepúsculo se teria seguido à luz meridiana, até as noites 
monótonas da burguesia vitoriana. A sexualidade é, então, 
 
89
 LOURO, G. L. Um corpo estranho: Ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: 
Autêntica, 2004, p. 78. 
90
 O período entre os anos de 1837 e 1901 na Grã-Bretanhã, referente ao reinado da rainha Vitória, 
ficou conhecido como Era Vitoriana, uma época de grande avanço econômico e consolidação do 
Império colonial britânico. (FLORES; VASCONCELOS, 2000). 
91
 FOUCAULT, M. A história da sexualidade. 1993. 
 
 
 
37
cuidadosamente encerrada. Muda-se para dentro de casa. A família 
conjugal a confisca. E absorve-a, inteiramente, na sociedade da 
função de reproduzir. Em torno do sexo, se cala. O casal, legítimo e 
procriador, dita a lei [...]. E se o estéril insiste, e se mostra 
demasiadamente, vira anormal: receberá este status e deverá pagar 
as sanções92. 
Atualmente, a sexualidade ultrapassou a intimidade do quarto e 
ganhou as ruas, os outdoors e as bancas de jornal. Faz parte do cotidiano das 
pessoas e é consumida no decorrer das horas, no rádio do carro, na televisão das 
casas, na Internet, nos jornais e nas revistas. Tornou-se um grande espetáculo para 
ser visto e consumido, tendo a mídia como sua grande difusora. Esta veicula 
simultaneamente campanhas educativas e imagens eróticas, reunindo um conjunto 
de informações que ambiguamente atende a transformações socioculturais e 
aprofunda estereótipos. A mídia veicula, ainda, corpos esculturais, padrões de 
relacionamento e de beleza e fórmulas de prazer e de felicidade, transformando 
pessoas e sentimentos em mercadorias, em resposta ao mercado publicitário. 
Sendo assim, frente a tanta publicidade, a sexualidade 
continua representando um desafio, questionamentos e debates entre autores em 
termos de forma e conteúdo, visualizando a promoção da saúde reprodutora dos 
indivíduos. 
No entanto, pode-se afirmar que em nossa sociedade o tema 
sexualidade persiste envolto em mistérios e tabus, pois, “Os conceitos atuais sobre 
sexualidade ainda guardam consigo a essência de gerações anteriores, carregados 
de mitos e crenças”93. O que representa um verdadeiro atraso, frente a um tema tão 
relevante, carente de clara discussão entre adultos e, principalmente entre os 
adolescentes. 
Teoricamente, a sexualidade assim como se conhece, inicia-se 
juntamente à puberdade ou adolescência, o que deve ocorrer por volta dos 12 anos 
de idade (Art. 2º - Estatuto da Criança e do Adolescente). Entretanto, em prática, 
sabe-se que não se configura exatamente desta forma. 
 
92
 FOUCAULT, M. A história da sexualidade, p. 9. 
93
 JESUS, M.C.P. de. Educação Sexual e compreensão da sexualidade na perspectiva da 
enfermagem. In: RAMOS, F.R.S., et al. Projeto adolescer: um encontro de enfermagem com o 
adolescente brasileiro. Brasília: ABEn, 2000, p.47. 
 
 
38
Para a maioria das pessoas, falar de sexualidade remete 
imediatamente ao ato sexual e à reprodução. Mas a sexualidade é muito mais 
abrangente. Pode ser definida como uma forma de expressão dos afetos, uma 
maneira de cada indivíduo se descobrir e descobrir os outros. A sexualidade engloba 
a identidade sexual (masculina e feminina); os afetos e a auto-estima; as alterações 
físicas e psicológicas ao longo da vida; o conhecimento anatômico e fisiológico do 
homem e da mulher; a higiene sexual; a gravidez, a maternidade e a paternidade; 
métodos anticoncepcionais; doenças sexualmente transmissíveis; os transtornos 
sexuais, entre outros. 
Declara Gherpelli que quando se fala de sexualidade, 
pressupõe-se falar de intimidade, uma vez que ela está estreitamente ligada às 
relações afetivas. A sexualidade é um atributo de qualquer ser humano. Mas para 
ser compreendida, não se pode separá-la do indivíduo como um todo. Ela é parte 
integrante e intercomunicante de uma pessoa consigo mesma e para com as outras. 
Portanto, é muito mais do que simplesmente ter um corpo desenvolvido ou em 
desenvolvimento, apto para procriar e apresentar desejos sexuais. 94 
Trata-se, também, de uma forma peculiar que cada indivíduo 
desenvolve e estabelece, para viver suas relações pessoais e interpessoais a partir 
de seu papel sexual. Daí pode-se afirmar que a sexualidade é um instrumento 
relacional importante, embora não seja o único. 
E, ainda afirma a autora que a sexualidade não é um fato 
isolado, mas é moldada e expressa concretamente nas relações que o sujeito 
estabelece, desde a mais tenra idade,consigo mesmo e com os outros. 95 
Assim, de acordo com o conceito contemporâneo, a 
sexualidade é uma experiência individual regida por diferentes desejos e condutas 
que a tornam um processo absolutamente pessoal e natural. A forma como cada 
indivíduo se percebe como um ser sexual é intrínseca à sua natureza e não pode ser 
 
94
 GHERPELLI, Maria Helena Brandão Vilela. A Educação Preventiva em Sexualidade na 
Adolescência. Série Idéias n. 29, São Paulo: FDE, 1996. Disponível em: <http://www. crm 
ariocovas.sp.gov.br/eds_a.php?t=002>. Acesso em: 4.maio de 2009. 
95
 GHERPELLI, Maria Helena Brandão Vilela. A Educação Preventiva em Sexualidade na 
Adolescência. 
 
 
39
modificada por fatores externos como a moral, a religião e a imposição de papéis 
sexuais, sem que isto resulte em grande sofrimento e angústia. 
Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a sexualidade 
representa “[...] um aspecto central do bem estar humano, do começo ao fim da vida, 
envolvendo sexo, identidade de gênero, orientação sexual, erotismo, prazer, 
intimidade e reprodução.” 96 
Vitiello define a sexualidade como: 
A sexualidade, entendida a partir de um enfoque amplo e 
abrangente, manifesta-se em todas as fases da vida de um ser 
humano, tendo na genitalidade (coito) apenas um de seus aspectos, 
talvez nem mesmo o mais importante. A sexualidade permeia todas 
as manifestações humanas. 97 
Em suma, como se afirmou inicialmente, nos últimos anos tem-
se falado muito no assunto. Criaram-se diversas teorias, realizaram-se vários 
estudos, e o tema conquistou um espaço fantástico nos jornais e revistas. No 
entanto, toda esta publicidade ocasiona, muitas vezes, uma idealização da vida 
sexual, dando a falsa impressão de que existe uma fórmula única de viver 
plenamente a sexualidade, um padrão sexual, um modelo estruturado ao qual todos 
os indivíduos devem se adaptar. E, desse modo, inverte-se o ritmo natural das 
coisas. 
Porém, conforme Gherpelli, seja qual for a sua visão íntima 
sobre o assunto, é interessante que se possa manter uma relação de compreensão 
e aceitação de sua própria sexualidade. O esclarecimento de dúvidas e a 
capacidade de se sentir a vontade com seus desejos e sensações, colabora 
imensamente ao amadurecimento desta, o que gera sensação de conforto e evita 
conflitos internos provenientes de dúvidas e medos, gerando uma experiência 
positiva e saudável. E, ainda complementa a autora declarando que a sexualidade 
existe para servir ao indivíduo e não o contrário, o indivíduo para viver a serviço da 
sexualidade. Até parece que ela é o seu objetivo de vida e não uma conseqüência 
 
96
 LIMA, Junia Dias de. O Despertar da Sexualidade na adolescência. In: PEREIRA, José Leopídio; et 
al. (org.). Sexualidade na adolescência no novo milênio, p.15. 
97
 LIMA, Junia Dias de. O Despertar da Sexualidade na adolescência. In: PEREIRA, José Leopídio; et 
al. (org.). Sexualidade na adolescência no novo milênio, p.15. 
 
 
40
natural de seu desenvolvimento como ser humano. 98 
Cano, Ferriani e Gomes, afirmam que a sexualidade é um dos 
importantes aspectos da adolescência, enfatizando que é nessa fase da vida do ser 
humano que a identidade sexual está se formando99, sobre a qual se disserta a 
seguir. 
 
2.2 IDENTIDADE DE GÊNERO OU SEXUAL 
Tem-se a noção de gênero o entendimento de relações 
estabelecidas a partir da percepção social das diferenças biológicas entre os 
sexos100, sendo essa percepção, por sua vez, fundada em esquemas classificatórios 
que opõem masculino/feminino, sendo esta oposição homóloga e relacionada a 
outras: forte/fraco; grande/pequeno; acima/abaixo; dominante/dominado. 101 
Prossegue o autor complementando que essas oposições são 
hierarquizadas, cabendo ao pólo masculino e seus homólogos a primazia do que é 
valorizado como positivo, superior. Essas oposições/hierarquizações são arbitrárias 
e historicamente construídas. Assim, 
[...] a divisão entre os sexos parece estar na ordem das coisas [...] 
ela está presente, ao mesmo tempo, em estado objetivado [...] em 
todo o mundo social, e em estado incorporado, nos corpos e nos 
habitus dos agentes, funcionando como sistemas de esquemas de 
percepção, de pensamento e de ação. 102 
Silva discorre sobre a identidade de gênero ou sexual 
afirmando que a mesma não tem necessariamente ligação com o sexo gonádico, ou 
 
98
 GHERPELLI, Maria Helena Brandão Vilela. A Educação Preventiva em Sexualidade na 
Adolescência. Série Idéias n. 29, São Paulo: FDE, 1996. Disponível em: <http://www. crm 
ariocovas.sp.gov.br/eds_a.php?t=002>. Acesso em: 4.maio de 2009. 
99
 CANO, Maria Aparecida Tedeschi; FERRIANI, Maria das Graças Carvalho; GOMES, Romeu. 
Sexualidade na adolescência: um estudo bibliográfico. Revista Latino-Am. Enfermagem, v. 8, n. 2. 
Ribeirão Preto, abr. 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-
11692000000600019&script=sci_arttext&tlng= pt >. Acesso em: jun./2009. 
100
 SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e Realidade, Porto Alegre, 
v.20, n.2, p. 71-99, jul./dez. 1995. 
101
 BOURDIEU, P. A dominação masculina. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1999. 
102
 BOURDIEU, P. A dominação masculina. 1999. p. 17. 
 
 
41
endócrino, ou até mesmo morfológico. A autora exprime que a identidade de gênero, 
ou sexual, possui elementos conscientes ou inconscientes, ou seja, influência 
psicológica, além de ser interligada com as características físicas da pessoa. 
Verifica-se que a identidade de gênero será compreendida por fatores internos e 
externos. 103 
Peres continua esta linha de pensamento, sustentando que a 
identidade de gênero será responsável em identificar a pessoa em homem ou 
mulher, pois a própria sociedade tem necessidade de rotular as pessoas, seus atos 
e suas funções. Desta forma, o que não se enquadra neste conjunto será excluído, 
porque não é bem visto. 104 
Erikson pontua que isto é importante para a sociedade, pois 
assim haverá a manutenção da ordem, já que cada um saberá o seu papel social, 
não havendo uma confusão. O autor ainda destaca que os questionamentos quando 
à identidade de gênero ocorre durante a puberdade, pois é durante esta fase de 
formação intelectual que a pessoa adquire um comportamento próprio, que pode ser 
alterado, mas que é necessário, pois não encontrar ou adquirir um papel, será 
causador de angústia à pessoa. 105 
Todavia, verifica-se atualmente que estas identificações de 
gênero não são necessariamente confiáveis, pois a sociedade é um ente mutável, e 
os papéis das pessoas mudam, pois aquilo que é visto como feminino e masculino 
não quer dizer que seja necessariamente ligado ao sexo da pessoa. Vemos 
atualmente que, com o movimento feminista, os papéis femininos mudaram, todavia, 
o seu sexo continua o mesmo, da mesma forma que os papéis masculinos 
mudaram. 
Por exemplo, se vê que as mulheres exercem papéis antes 
vistos como masculinos, de chefia de empresas ou de lares, papel anteriormente 
ocupado por homens, enquanto as mulheres eram objeto de domínio masculino. Na 
 
103
 SILVA, M. de C. A. Identidade de gênero e expressão sexual masculina e feminina. Scientia 
Sexualis – Revista do Mestrado em Sexologia da Universidade Gamão Filho, Rio de Janeiro, v.3, n. 
2, p. 80, dez 1997. 
104
 PERES, A. P. A. B. Transexualismo, o direito a uma nova identidade sexual. Rio de Janeiro: 
Renovar, 2001. p.91 
105
 ERIKSON, E. H. Identidade Juventude e Crise. 2. ed. Tradução por Álvaro Cabral. Rio de 
Janeiro: Guanabara, 1987, p. 186. 
 
 
42
mesma linha, percebe-se que alguns homens sentem-se ameaçados por esta 
mudança,

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