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A democracia como razão pública - Amartya Sen

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Alexandre Donizete Roque – 6° período do curso de Filosofia – Unisal – Lorena 
Fichamento: A democracia como razão pública – Amartya Sem
A confusão das ‘nuvens de tinta’ tem um peso importante no tema desse livro. Enganamos a nós mesmos [...] ao supormos que a experiência da democracia não se limita ao Ocidente e pode ser encontrada em outras regiões, como a antiga índia, por exemplo? A crença de que a democracia não floresceu em qualquer outro lugar no mundo, mas apenas no Ocidente, é muito difundida e frequentemente externada. A ela se recorre também para explicar acontecimentos contemporâneos. Por exemplo, a culpa dos imensos problemas encontrados após a intervenção no Iraque é atribuída, em alguns casos, não à natureza peculiar da desinformada e mal concebida ocupação militar de 2003, mas sim a uma dificuldade imaginária que considera a democracia e a razão pública inadequadas para as culturas e tradições de países não ocidentais como o Iraque. 
O tema democracia tornou-se severamente confuso devido à forma como a retórica que o envolve tem sido utilizada nos últimos anos. De maneira crescente, observa-se uma dicotomia confusa entre aqueles que querem ‘impor’ a democracia a países do mundo não ocidental (no ‘próprio interesse’ desses países, é claro) e os que se opõem a essa imposição (por respeito às ‘próprias tradições’ desses países). Mas a linguagem toda da ‘imposição’, utilizada por ambas as partes, é extremamente inadequada porque supõe implicitamente que a democracia pertence exclusivamente ao Ocidente e é uma ideia essencialmente ‘ocidental’, que surgiu e floresceu apenas no Ocidente. (p. 356) 
A fim de compreendermos as raízes da democracia no mundo, temos de nos interessar pela história da participação popular e da razão pública em diferentes regiões e países. Temos de ultrapassar a ideia da democracia apenas com relação à evolução europeia e americana. Se virmos a democracia como uma espécie de produto cultural próprio do ocidente, fracassaremos em compreender as pervasivas exigências da vida participativa, das quais Aristóteles falava com extenso discernimento. (p. 356 – 357)
Ao ponderarmos os prós e os contras da democracia, devemos reconhecer devidamente que o fascínio pela governança participativa apareceu e reapareceu, com certa consistência, em diferentes partes do mundo. Não foi certamente uma força irresistível, mas em muitas partes do mundo desafiou, de maneira persistente, a crença irrefletida do autoritarismo como objeto inamovível. Em sua elaborada forma institucional, a democracia pode ser muito nova no mundo – é praticada por não mais do que duzentos anos; contudo, [...] ela expressa uma tendência na vida social com uma história muito mais longa e difundida. Os críticos da democracia – não importando quão vigorosamente a rejeitem – precisam achar alguma forma de enfrentar o profundo fascínio pela governança participativa, que continua sendo relevante atualmente e muito mais difícil de erradicar. (p. 357 – 358)
O tratamento habermasiano da argumentação pública é, em muitos aspectos, mais amplo que o rawlsiano, como o próprio Rawls reconheceu. A democracia também recebe uma forma processual mais direta na formulação de Habermas do que em outras abordagens, incluindo a de Rawls, embora [...] o contraste aparentemente nítido entre os usos rawlsiano e habermasiano dos aspectos processuais na caracterização do processo e do resultado da argumentação pública possa ser um tanto enganoso. No entanto, Habermas fez uma contribuição verdadeiramente definitiva para o esclarecimento do amplo alcance da argumentação pública e, em particular, da presença dupla no discurso político de ‘questões morais de justiça’ e ‘questões instrumentais de poder e coerção’. (p. 359)
O mais importante é observar que a totalidade dessas novas contribuições ajudou a trazer o reconhecimento geral de que os pontos centrais de uma compreensão mais ampla da democracia são a participação política, o diálogo e a interação pública. O papel crucial da argumentação pública na prática da democracia coloca todo o tema da democracia em estreita relação com o tópico central deste livro, isto é, a justiça. Se as exigências da justiça só podem ser avaliadas com a ajuda da argumentação pública. E se essa argumentação está constitutivamente relacionada com a ideia de democracia, então existe uma intima conexão entre a justiça e a democracia, que partilham características discursivas. (p. 360)
É evidente que o voto secreto tem um papel muito importante inclusive para a expressão e a eficácia do processo de argumentação pública, mas isso não é a única coisa que importa, e pode ser visto apenas como uma parte – reconhecidamente, uma parte muito importante – do modo como a razão pública opera em uma sociedade democrática. Com efeito, a própria eficácia das votações depende fundamentalmente do que as acompanha, como a liberdade de expressão, o acesso à informação e a liberdade de discordância. Por si só, o voto secreto pode ser completamente inadequado, como mostram abundantemente as insólitas vitórias eleitorais de tiranias que governam regimes autoritários, no passado e nos dias de hoje, como por exemplo na atual Coreia do Norte. A dificuldade reside em não apenas na pressão política e punitiva que é exercida sobre os eleitores na própria votação, mas na forma como as expressões da opinião pública são frustradas pela censura, pela exclusão de informação e por um clima de medo, junto com a supressão da oposição política e da independência dos meios de comunicação, bem como a ausência de direitos civis e das liberdades políticas fundamentais. Tudo isso torna redundante, para os governantes, usar muita força para garantir o conformismo no próprio ato de votar. Na verdade, uma grande número de ditadores no mundo tem conseguido gigantescas vitórias eleitorais, mesmo sem coerção evidente sobre o processo de votação, principalmente suprimindo a discussão pública e a liberdade de informação, e gerando um clima de apreensão e ansiedade. (p. 361)
[...] a importância do debate público é um tema recorrente na história de muitos países no mundo não ocidental. (p. 365)
Para reexaminar o contexto histórico das características democráticas no passado, também temos de reavaliar a história do Oriente Médio, pois há uma convicção comum de que esse bloco de países sempre foi hostil à democracia. A constante repetição dessa convicção irrita os combatentes pela democracia no mundo árabe, mas como generalização histórica é basicamente um contrassenso. Sem dúvida é verdade que a democracia como sistema institucional é de fato um fenômeno muito novo na maioria das regiões do mundo. (p. 367)
A tolerância da discordância é obviamente central para a oportunidade de exercitar a argumentação pública [...]. (p. 367)
Uma das iniciativas mais importantes para a promoção da argumentação pública no mundo é a de apoiar uma imprensa livre e independente, cuja ausência com frequência se destaca. (p. 369)
Uma mídia livre e saudável é importante por várias razões, e é útil separar as distintas contribuições que ela pode fazer. A primeira – e talvez a mais elementar – é a contribuição direta da liberdade de expressão em geral e da liberdade de imprensa em particular para a qualidade de nossas vidas. Temos razões suficientes para querer nos comunicar uns com os outros e compreender melhor o mundo em que vivemos. A liberdade de imprensa é extremamente importante para nossa capacidade de alcançar esses objetivos. A falta de liberdade para os meios de comunicação e a supressão de nossa capacidade de comunicação com os outros têm o efeito de reduzir diretamente a qualidade da vida humana, mesmo que o regime autoritário que impõe essa supressão seja muito rico com relação ao produto nacional bruto. 
Em segundo lugar, a imprensa tem um importante papel informativo, difundindo o conhecimento e permitindo a análise crítica. A função informativa da imprensa diz respeito não apenas à notícia especializada (por exemplo, sobre os avançoscientíficos ou inovações culturais), mas também à informação geral que mantém informado o público em geral. Mais ainda, o jornalismo investigativo pode desenterrar a informação que de outro modo teria passado despercebida ou permanecido desconhecida. 
Em terceiro lugar, a liberdade dos meios de comunicação tem uma importante função protetora, dando voz aos negligenciados e desfavorecidos, o que pode contribuir enormemente para a segurança humana. Os governantes de um país com frequência estão isolados, em suas próprias vidas, da miséria das pessoas comuns. Eles podem enfrentar uma calamidade nacional, como uma fome coletiva ou algum desastre, sem compartilhar o destino de suas vítimas. No entanto, se os governantes têm de encarar as críticas da opinião pública nos meios de comunicação e enfrentar eleições com uma imprensa sem censura, eles também têm um preço a pagar, e isso lhes dá um forte incentivo para tomar medidas oportunas para evitar essas crises. 
Em quarto lugar, a formação de valores, informada e sem arregimentação, exige a abertura na comunicação e na argumentação. A liberdade de imprensa é fundamental para esse processo. (p. 369 – 370)
A relação entre a regra da maioria e a proteção dos direitos das minorias, que são elementos constitutivos da prática democrática, depende especialmente da formação valores e prioridades que sejam tolerantes. (p. 370 – 371) 
[...] uma mídia em bom funcionamento pode ter uma papel extremamente importante no sentido de facilitar a argumentação pública em geral, cuja importância para a busca da justiça é um tema recorrente deste livro. A avaliação necessária para a ponderação da justiça não é um exercício solitário, mas envolve inescapavelmente o debate. Não é difícil ver por que uma mídia livre, enérgica e eficaz pode facilitar o necessário processo do debate. A mídia é importante não só para a democracia, mas para a busca da justiça em geral. Uma ‘justiça sem debate’ pode revelar-se uma ideia opressiva. (p. 371)

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