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Jesús Chucho Garcia Desconstrução, transformação e construção de novos cenários das práticas da afro americanidade

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Tel.: (5521) 2565'7569 I 2234'1896
Impresso no BÍasil
2003
Sumário
Capítulo I
Descontrução, transformação e construção de novos
cenários das práticas da afro-americanidade
Jesús "Chucho" Garcia
Capítuto ll
Raça, demografia e indicadores sociais
Andr é Augusto P ereira Br andã o
Capítuto ttl
Professoras negras no Rio de faneiro:
história de um branqueamento
Maria Lúcia Rodrigues Müller
Capítuto lV
A prática pedagógica de especialistas
crn relaçôes mciais e educação
Iolanda de Oliveira
Capítuto V
O negro na confluência da educação e da literatura
Márcia Maria delesus Pessanha
Capítuto Vl
O pré-vestibular para negros como instrumento
rle política compensatória 
- 
o caso do Rio de Janeiro
Sér§o da Rocha Souza
Capítuto Vll
Ncgros egressos de uma universidade pública
no Rio de Janeiro
Moema De Poli Teixeira
19
73
107
145
173
i'i"J)"{t;Iii,i,tl i;ri;i":.iili;r,,\i. i,f i,, lr,ii;;,i);i,{i f t }li{]T J:[
*l!iJj-ii.rl-,:üsi",).',irtr__iti?:r,.:_:)ti:,,11:,,,-,'.i-:i1..1,,.,,)jiÀ,L]êüÂ.'
193
Capituto I
Desconstrução, transformação
e construção de novos cenários
das práticas da afro-americanidade
lesús "Chucho" García-
A temática afro-americana, principalmente na América
Latina e no Caribe, foi reduzida por uma vasta bibliografia que
limitou sua caracterização apenas a aspectos "folclóricos" como
música, dança e religião. Esta bibliografia reducionista, que na
maioria dos casos era carregada de preconceitos, obscurecia
outros aspectos de grande significação na vida dos afro-
descendentes por afirmação. Em primeiro lugar, não se difundiam
seus códigos culturais ancestrais transferidos para o novo mundo
(em suas diferentes fases de conservação, criação, recriação e
ir-rovação), tampouco se falava da luta pela conquista de espaços
nas esferas sociais, políticas e jurídicas das sociedades latino-
americanas e caribenhas nos processos de moclernização dos
estados.
No século XIX, após as guerras de independência dos países
de nosso continente, surgiram as ConstituiçÕes, mas nem os
indígenas nem os afro-descendentes foram considerados
cidadãos; além disso, os afro-subsaarianos que haviam sido
* Formou se em educação, pela Universidade Central da Venezuela (UCV). Foi
coordenador do centro de estudos afro-americanos Miguel Acosta Saignes da
UCV (1988-1993), além de editor da Revista AJro-América, coordenador da
fundação afro-américa e rede afio-venezuelana, membro do diretório da aliança
estratégica afro-latino americana, que agrupa mais de cluzentas organizações
afro do continente e membro permanente da agência de consulta sobre raça e
pobreza na América Latina, Banco Mundial, Banco Interamericano de
Desenvolvimento e Diálogo Interamericano. Washir-rgton.
I)P&A editora
seqüestrados para nossos países continuaram submetidos à
escravidào duranle nluitos altcls'
As primeiras constituiçÕes das repúblicas que então estavam
nascendo, foram responsáveis pelas primeiras açÕes cle "exclusão"
e "anti-cidadania". Essa aberrante exclusão foi baseada e
conduzida por fundamentos ideológicos da época' ao contrário
do que afirma Frank Thnnenbaum: "Nttnca se questionou se o
negro era apto ou não para a liberdade: o negro liberto era
considerado como um homem livre e não como um liberto'
Legalmente este homem era visto como igual a todos os demais
homerts livrcs" 11972, P.45).
Talvez o autor de "De escravos a cidadãos" desconhecesse as
colocações dos icleólogos clas novas repúblicas' que discutiarn
sobre a questão c1a libertação dos afro-descetldentes
perguntandà-se: "Mas será que estes homens ffIerecem este nome?
Éstes filhos de escravos, nascidos e educados entre escravos' que
viveram e serviramconito seus pais a um mesmo senhor até os ltt
itnos?" ( Mt 
'sçurtrc, I 830)'
Durante o século XX, houve a consideração sobre a
mo<lernização de nossos Estados e discutiu-se sobre quais grupos
humanos deveriam ser usados nessa tnodernização, e_ nessa época
ain<la prevaleciam as proposiçoes elaboradas pelos arquitetos
du, ,oru, repúblicas que vitoriosamente haviam passado de un-t
século ao outro. Ressurge então a questão ética e cria-se um novo
trauma para sua integração nas novas repúblicas' A bibliografia
do períoclo que abarca os primeiros cinqüenta anos do século
XX nos revela esta questào.
O intelectual argentino losé Ingenieros afirmava: "Povoar
não é civilizar quando esse povoamento é feito com chineses e
índios da Ásia e com negros da Africa i Mais adiante acrescenta'
referindo-se aos negros como "seres mais próximos dos sírrios
antropóides do que o homem civilizado e tudo o que já se tem
feito a favor das raças inferiores é anti-científico' O nláximo que
podemos fazet é protegê-los para que morratll comodamente"
(Cel,rpur,l, 2000).
RetaÇões raciais e educaçáo: novos desafios l)(-,(:onstruÇão, transformação e construção
I)rrr sua vez, o marxista peruano iosé Carlos Mariategui
( S( l'(lveu:
A contribuição do negro que chegou como escraYo parece ser menos
vtrliosa e mais negativa. O negro trouxe consigo sua sensualidade, sua
sr-rperstição e sua natureza primitiva. Não está em condiçÔes de contribuir
com a criação de nenhuma cultura, o único que faz é obstruí-la por
meio cla influência crua e vir.ente de sua barbárie (C,rn'lpsEl-, 2000).
O intelectual losé Vascoucelos afirmava que "às diferenças
íísicas é preciso acrescentar as profundas particularidades de
lristória e de raça que caracterizam cada um dos grupos étnicos
tla América contemporânea, pois, como todos sabem, nós
procedemos de uma cultura hispânica e latina e os do norte são
lrcrpetradores de uma da tradição germânica e saxônica" (1992,
p. 125). É evidente que para o critrdor teórico da novtr
americanidade expressa em sua raça cósmica, as contribuiçÕes
rlos africanos e sells descendentes estavam totalmente úrvisíveis
aos seus olhos. Na construção teórica da modernidade
venezuelana, na década de 1930, o economista Alberto Adriani
Í.rzia a seguinte colocação:
O perigo negro é o mais grave e suzr solução é mais difÍcil. AVenezueia
já tem uma popuiação considerável ile negros, e não é conveniente
tratá-los corro raça inferior. Por outro lado, seria difícil recusar
irnigrantes negros dos Estados Unidos. Talvez fosse prossível proceder
de outra tnaneira cont os negros antilhanos que têm um nível inferior
ao de nossos negros nacionais e que, mesmo que pudessem favorecer
temporariamente nossa propriedade econômica, seriam um elementcl
nclcivo para nossa vida intelectual, social e política. Em nosso país (os
negros) têrn sido a matéria prima, o elemento no qual os exércitos
recrutaram quase todas as suas revoluçoes. Um aumento sensível da
população negra poderá perturbar o desenvolvimento normal de
nossas instituições democriiticas e de toda nossa vida nacional, e
principaimente comprometer gravemente nossa ur.ridade moral ( 1987).
Na maioria dos países do continente americano, o discurso
teórico da modernidade e da cidadania da década de1930 foi
construído sobre a base da exclusão dos setores sociais menos
I{t't;rqocs raciais e educação: novos desafios
l,rvort't itlos, t' tliscrintinados do ponto de vista étnico, ou seja,
sol» t' o.s irlr-o-clcscendentes e indígenas. Estas consideraçÕes seriam
pr.ojctadas até os nossos dias. Como afirma Martín Hopenhayn:
...há duas tarefas funclamer-rtais que são claramente necessárias para
unr projeto integraclor. En-r prirneiro lugar, é preciso superar a longa
tradição do que aqui chamamos de clialética da negação do outro,
aonde uma cultura (da mulher, do índio, do negro, do pagão, do
mestiço, clo homem do campro, do r-narginal-urbano etc.) constitui o
cimento sobre o qual se constrói uma longa tradição de exclusãc'r
socioeconômica, cr-rltural e sociopolítica (2000).
No fim da década de 1980 e ao longo de toda a década de
1990, principalmente em toda a América do Sul, o movimento
aÍio-americano começou a impulsionar processos de auto-
reconhecimento e rcconhecimento que foram marctrdos por uma
prolongada luta pela inserçào nos espaços públicos e pelo
reconhecimento jurídico, que ao mesmo tempo tem sido uma
luta pelo reconhecimento de urna cidadania da afro-
americanidade contra a exclusão dos setores historicamente
menos favorecidos. Não tem sido fácil introduzir o tema afro na
esfera das políticas públicas e jurídicas. Foi necessário que se
abrissem espaços de discussão contra impérios conceituais que
apagam nossas realidacles com as concepções de que "todos somos
mestiços" e, portanto, "sonlos iguais", concluindo assim que
vivemos em uma "democracia racial".
As organizaçoes sociais afros, como atores sociais
protagonistas de seus respectivos destinos, começaram a
clesconstruir os referentes estobelecidos sobre a negação da cidadania
e da participação nos processos de transformação da complexa
realidade ltrtino-americana e caribenha.
Como diz Mato: 'As práticas de todos os atores sociais, sejam
eles empresas, organizaçÕes govemalnentajs ou organizações não-
governamentais, envolvem aspectos econômicos, aspectos
culturais e aspectos políticos (ou seja, todas têm conseqüências e
aspectos nas relaçÕes de poder estabelecidas, seja reforçando-as
ou alternando-as)" (2000, p. 20).
I r,.'., ( )il,,ttLtÇao, transformaÇão e construcão
l.strr prática da desconstrução da ausência da afro-
rrrrt ritrtniclade na integração social foi diferente dtr
, \lr('rinrcntada pelas proposições que foram defendidas pelos
r,l, ,,loros do movimento afro dos Estados Unidos, como Williams
I )rr liois ou Marcus Garvey, no início do século XX.
| )rr Ilois afirmava que "os negros norte-americanos erarn
r,r lr' alrericanos por nascimento, cidadania, ideais políticos,
lrrrrirrir c religião" (Dnerrn, 1977, p.56). Du Bois "era partidário
rlr' rnr caminho que reconhecesse a segregação dos negros como
rrrrr lrrto na vida norte-arnericana ê que procLlrasse transformá-
1,, 1'111 1s-u de um pensamento cuidadoso e um planejamento
rrrlt'li{ente, por parte dos próprios negros. Ao invés de combater
.r scurcgação, acreditou que poderia tirar vantagem dela, seja o
,1rrt' fosse que o futuro puclesse reservar" (Dr,Llr.n, 1977, p. 57).
l,rlvcz seja nestas noçÕes de Du Bois que estejam baseadas as
lolrrrulaçÕes do movimento contemporâneo neo-afro-norte-
,rrrrcricarro que reivindica a aÇão a.firmatita, o racismo positivo.
Por outro lado, Marcus Garvey tinha a seguinte opinião:
" ( lonsidero que os negros norte-americanos têm contribuído para
,, cstabelecimento da civilização norte-americana e, portanto,
It\rrr o perfeito direito de viverem nos Estados Unidos e desejarem
itiLraldade de oportunidade e tratamento. Cada negro pode ser
, itladão do país no qual tenha nascido ou escolhido viver.
l,ntrctanto, prevejo a edificação de um grande Estado na ÁÍiica,
{) qual, agindo em concordância com as grandes nações, fará
( ()r.[ qlle a raça negra seja respeittrda como as demais" (GaRCÍ,t,
.l(X)O, p. 54). Estas considerações foram difundidas pelo próprio
( iarvey em diferentes países c1o Cirribe como Cuba, Panamá e
Arnérica Central. No fundo, o objetivo de Garvey era qlle os
ir Íl-cl-americanos clos Estados Unidos voltassem para a África.
Irstas posiçÕes serviram conro argumento para o atual
rrrovilnento Rastafarie, que ergue a bandeira do retorno à África.
lhr-nbém houve um outro argumento que marcou a visão da
construção da cidadania afro-descendente, que foi o da Nação
tlo lslã, elabolado pelo afro-americano W. D. Fard:
11
Retações rac'iais e educação: novos desafios
Aqueles que pertencem a ela (ANação Islã) não eram norte-americanos
e deveriam se envolver o menos possÍvel com as instituições da América
do Norte. Eran-r cidadãos cta Ciclacla Santa de Meca, não eram cidadãos
norte-americanos. Sua bandeira era a muçulmana, não era a bandeira
clos Estados Unidos. A universidade cle seus filhos era a Universidade
do Islã, não as escolas norte-americanas. Não eram obrigados a
obedecer a ConstituiÇão ott a servir às forças armadas da América do
Norle ( Dtr rrrR, 1977.p.84).
Estes três argulnentos representaram, em grande medida, o
início da desconstrução dos princípios de cidadania excludente
que haviam sido elaborados pelos ideólogos dos sistemas
democráticos americanos. Em termos culturais, podemos somar
a eles as colocaçÕes do movimento da negritude, formuladas por
Airne Cesairey Leopold Shengor, que tinham como objetivo a
reivindicação cultural africana e sua diáspora no mundo, o que
também representou uma maneira cle se discutir a cidadania
cultural.
Estas proposiçÕes representaram os primeiros passos na
desconstrução da exclusão dos afro-descendentes, mas não
necessariamente reuniam as realidades e ponto exatos da agenda
necessária para a conquista de uma participação mais efetiva
para a construção da cidadania a partir da perspectiva dos afro-
descendentes.
A elaboração da agenda dos atores sociais
afro-descendentes na construção de sua cidadania
Voltamos a afilmar que, a elaboração de uma agenda para a
construção da cidadania de afro-clescendentes precisava passar
pela desconsúução do discurso teórico eurocêntrico, sustentado
sobre a base do desprezo e da exclusão étnica dirigidos ao coletivo
de origem africana nas Américas e no Caribe.
Como afirma Adriana Maya:
A desconstrução destas irnagens em todos os âmbitos da vida social e
cultural é indispensável se quisermos contribuir com a construção cla
paz e da conüvência que todos nós colombianos desejamos. Apesquisa
lr,.,,( rln\tr ução, transformação e construção
I ilior.0srr acerca das culturas afro-latino-americanas é importante nãcl
I 
ro l scr étnica, afinal de cor-rtas este é outro vocábulo colonial, mas sim
,' t,r'incipalmente Porque sua redignificação permitirá que r.rós
,"'lrrboremos estratégias de sobrevivência cultural em âmbitos de
r('l)rcssão e constante rnigração. Ou seja, é importante porque
('nccrram em si mestnzrs respostas Para os desafios trazidos pelo
rrrrrndo globalizado e pós-moderno (2000).
trlaborar a agenda era começar pelo auto-reconhecimento
,l,rs contribuiçÕes dos africanos e de seus descendentes na
Iornração da diversidade cultural, pelo reconhecimento das
r orrtribuiçÕes políticas e religiosas deste continente e do Caribe.
lrsla agenda também está vinculada à territorialidade que por
,ul()s os cimarrones' e seus descendentes haviam conquistado nas
Itrtas coloniais. Um território que foi acolhido com uma visão
,tilcrente a dos enfoques ocidentais de que o homem vence a
nil(Lrreza: o hornem compartilha com a natureza, respeitando-a
, harmonizando-a em sua vida cotidiana.
Com exceção de alguns países do continente, as comunidades afi-o-
clescendentes possuem um reconhecimento legal com o conseguinte
clispositivo de medidas que favorecem seu papel na sociedacle' Ainda
clue alguns estados tenham se definido nas últimas clécadascomo
pluriétnicos e multiculturais, estas denominações são aplicadas de
maneira geral às comunidacles e povos indígenas (Oxu, 2000a).
A luta pelo reconhecimento externo deveria começar pelo
rcconhecimento direcionado ao interior das próprias
rornunidades, e nada melhor do que começar pelo espaço, pelo
tcrritório.
A temática da territorialidade como espaço a ser reivindicado
cm urrra agenda de cidadania afro-americana surgiu, pela
lrrirreira yez, lTaluta das comunidades afro da costa Atlântica da
Nicarrágua, quando foi pror-novida a Lei de Autonomia número
.113, emitida em 1987, na qual se afirmava qlle as terras comunitárias,
incluindo as águas, bosques, terras e minas que pertenceram
13
Assim erarn chan'rados os escravos que fugiar-l-r para os montes. (N'T')
Retações raciais e educaçào: novos desafios
tradicionalmente às comunidades étnicas de nossas costas do
Caribe, não poderiam ser vendidas, doadas, embargadas, nem
ser produtos de troca em negócios (Croluca, 1997). Também se
garante nesta lei a proteção e a promoção das línguas (garifuna),
danças, tradições, religiões, receitas e outros aspectos que formam
a identidade dos povos que habitam a costa atlântica da
Nicarágua.
O enfoque da territorialidade, como parte do auto-
reconhecimento dos afro-colombianos, também fica muito claro
na Lei 70 de comunidades negras, artigo l9:
As práticas tradicionais que sejam exercidas sobre as águas, as praias
ou rios, os frutos secundários dos bosques ou sobre a fauna e flora
terrestre e aquática para fins alimentícios ou autílízaçáo de recursos
naturais renováveis para a construção ou reforma de moradias, cercas,
canoas e outros elementos domésticos para uso dos integrantes da
respectiva comunidade negra são considerados usos pela lei e em
conseqüência não precisam de permissão ( 1993).
Um suporte jurídico para a auto-apropriação da territorialidade
é a Decisão 391, no marco da Comunidade Andina das NaçÕes,
emitida no mês de outubro de 1993, que "reconhece a contribuição
histórica das comunidades indígenas, afro-americanas e locais à
diversidade biológica e se atribui a seus conhecimentos, inovaçÕes
e práticas um valor estratégico, que deverá ser considerado para
efeito de repartir os benefícios que esta contribuição histórica
gera" (Fr-onrs, 1999).
A luta na esfera da educação pública (separada das propostas
da territorialidade) é a necessidade de colocar o tema das
contribuições dos afro-descendentes nos currículos educativos
como parte do respeito à cidadania. Tanto na experiência da
costa atlântica da Nicarágua quanto na experiência colombiana
e, mais recentemente, no Brasil, foram conquistados importantes
avanços. As colocaçoes feitas pelas ONGs afro destes países
consideram a esfera educativa como um dos ângulos essenciais
para a reafirmação cultural e a derrota da vergonha étnica,
implantada nos sistemas educacionais oficiais.
[)r,sconstrução, transformação e construção
Na Lei 70 de comunidades negras da Colômbia, o artigo 39
rliz que: "O Estado velarâ para que no sistema nacional educativo
sejam conhecidas e difundidas as práticas próprias das
iomunidades negras e suas contribuições à história e à cultura
r'olombiana, a fim de que ofereçam uma informação eqüitativa e
lirrmativa das sociedades e culturas destas comunidades" (1993).
Mas um dos pontos essenciais na agenda da prática da afro-
irnrericanidade é a luta contra o racismo e discriminação racial.
A mobilização internacional que nos últimos dois anos vem sendo
rcalizada pelas ONGs afro-descendentes tem sido muito
significativa. Em setembro do ano 2000 foi criada, em São Iosé de
( losta Rica, a Aliança estratégica afro-latino-americana, constituída
por ONGs, redes, lideranças e grupos do continente com o fim de
prepararem uma agenda de trabalho dirigida à III Conferência
llniversal contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia, a
Intolerância e suas formas conexas, que seria realizada na cidade
cle Durban.
O racismo, como produto do tráfico de negros e do sistema
escraüsta praticados pelas potências européias e posteriormente
pelos setores econômicos e políticos dominantes de ascendência
curopéia, continua crescendo em todos os continentes, em
detrimento dos descendentes de africanos e indígenas. Como dizia
Fanon: "O racismo não ficou esclerosado. Foi preciso renová-lo,
nalizâ-lo, mudar sua fisionomia" (1975).
De acordo com Isidro Cisnero, "O racismo muito
freqüentemente conduz à discriminação e à segregação de
indivíduos e grupos pelo simples fato de pertencer a uma
determinada categoria social, étnica ou racial. O racismo se
associa indissoluvelmente à exclusão e à rejeição da alteridade
(...) o racismo representa um conjunto de doutrinas que no
momento em que se incorporam ao espaço público se
transformam em uma verdadeira ideologia" (2000, p.2).
No mês de dezembro, a Aliança estrategica latino-americana,
em conjunto com a Fundação Idéias do Chile, promoveu antes
da pré-conferência das Nações Unidas contra o Racismo, a
15
1716 Relações raciais e educação: novos desafios
Conferência Cidadã contra o Racismo, realizada em Santiago do
Chile de 3 a 4 de dezembro de 2000, na qual foram analisadas
novas formas de racismo e as ONGs do continente, chegando a
uma conclusão: o racismo tinha noyas formas e além disso havia
se aprofundado em muitos países do continente.
Definimos a Aliança como um pacto de instituições nacionais,
transnacionais, redes nacionais e transnacionais, cujo objetivo principal
é aglutinar os líderes afro-descendentes para que, de forma coletiva,
atuem coordenadamente sob uma clireção política cuja meta é a
construção de resoluções que serão incluídas na Declaração e no Plano
de Ação da Conferência Mundial contra o racismo, que será aprovada
em Durban, África do Sul (AuaNçe rsrnarÉGrcA Ar-Ro-LMrNo-AMERTcANA,
2001 ).
A força dos argumentos das ONGs afro de todo o continente
conseguiu inserir o tema na pré-conferência das Nações Unidas
em Santiago do Chile, de 5 a7 de dezembro, na qual os governos
reconheceram, pela primeira yez na história, que
A conquista, o colonialismo, a escravidão e outras formas de servidão,
foram fonte de racismo, discriminação racial, xenofobia e formas
conexas de intolerância nas Américas; e condenamos as injustiças que
foram cometidas especialmente contra os povos indígenas, os
africanos e seus descendentes (...) seus efeitos persistem em muitas de
nossas sociedades e são fontes cle discriminação sistemática que
continuam afetando vastos setores da populaçào.
Reconheceram também "que o racismo e a discriminação
racial que a população de origem africana tem sofrido nas
Américas, está na origem da situação de marginação, pobreza e
exclusão em que se encontra a maioria destes indivíduos em
muitos países do continente e que, apesar dos diversos esforços
realizados, esta situação persiste em diversos graus" (ONu, 2000b).
A participação ativa no processo da IiI Conferência Universal
contra o racismo é parte de uma agenda na qual os atores sociais
afro-descendentes pretendem inserir na pauta de discussões das
Naçoes Unidas uma série de formulaçÕes que se incorporam ao
Decênio Mundial contra o Racismo para conseguir avançar nas
l)esconstrução, transformação e construçáo
esÍeras políticas, econômicas, educativas, tecnológicas, culturais,
tlc saúde e sociais de amplo seguimento da população latino-
rrnrericana e caribenha, constituída por mais de cem milhOes de
irlio-descendentes nas Américas e no Caribe. Os caminhos da
tlcsconstrução do pensamento dominante, que oculta a presença
rrl'ro, estão abertos para serem percorridos para que se possa
continuar construindo criativamente norros referentes na práxis
tlc uma agenda inesgotável.
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VlscoNcst-os, José. Obra selecta. Caracas: Biblioteca Ayacucho, 1992.
Capítuto ll
Raça, demografia e indicadores sociais
André Augusto Pereira Brandão-
liste texto se insere no esforço de pesquisa que busca
r (r)rpreender a taçat como um fator que possui peso muito
,,i11niíicativo na lógica de estruturação e desenvolvimento das
trl,rç<)es sociais. Mais precisamente, a questão racial em nossa
yr'r'spectiva está diretamente relacionada com a continuidade
lrislririca e a reprodução das desigualdades sociais e econômicas
lntrc os brancos e os afro-descendentes no Brasil.
(lonstruímos aqui um estudo de séries econômicas e
'|,'uiográficas que relacionam a pobreza urbana e as diferenças
t,rt iais dentro desta, a partir da delimitação de uma área
1i,'ogr'áfica específica, a saber: a Baixada Fluminense, parte da
llr'1iiao Metropolitana do Rio de faneiro (RM-Ri).
Na formação de séries estatísticas utilizamos principalmente
,r:, tlaclos demográficos e econômicos do IBGE obtidos para
r otrrposição dos Censos Demográficos e dos Censos Econômicos
,Ir llstado do Rio de faneiro, bem como nas pNADs.
Nosso objetivo demandou que identificássemos padrões
,'rr, iocconômicos gerais e desagregados por Íaça, para tanto
,rlÍ,tcg,amos os "pretos" e "parclos" da classificação do IBGE na
not,u«l cle afro-descendentes, posto que ambos os grupos, além
,l,r origem histórica comum, apresentam nos estudos até agora
' I )orrlor em Ciências Sociais e professor da Universidade Federal Fluminense 
-
t I I il', c-r.r.rail: <aapbuff@hotmail.com>.
' lis;urros o termo não em sentido biológico, mas sim como um indicador de
lrillcns e trajetórias históricas comuns, ou seja como "atributo socialmente
ll,rl rorlrclo" (Hasnvn,tc, I 99 1 ).
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