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Diagnóstico em Saúde Mental

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URGÊNCIA E EMERGÊNCIA 
EM SAÚDE MENTAL
DIAGNÓSTICO EM SAÚDE MENTAL
 
 Diana Malito
OBJETIVOS DA AULA:
Pesquisadores afirmam que a construção diagnóstica é o meio adequado de tratar os transtornos mentais. Outros, argumentam que o diagnóstico produz a estigmatização das singularidades dos indivíduos.
Tratando-se de uma ferramenta amplamente utilizada nos serviços de saúde mental, é necessário compreender sua utilização e os fundamentos da sua crítica. Propomos: 
 Mostrar a construção histórica da classificação dos sofrimentos psíquicos; 
 Ajudar a interpretar os sistemas diagnósticos utilizados na saúde mental.
DEFINIÇÃO GERAL:
O diagnóstico em saúde mental é uma ferramenta científica de avaliação e classificação do sofrimento psíquico a partir de seus sinais e sintomas. Busca identificar as várias dimensões de uma patologia (fatores biológicos, psicológicos, socioculturais), estabelecer hipóteses sobre suas causas, assim como construir um prognóstico, e planejar ações terapêuticas de tratamento. 
Os sistemas diagnósticos adotados oficialmente no Brasil são a Classificação Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde, e o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM, sigla em inglês), da Associação Americana de Psiquiatria.
1. CONSTRUÇÃO HISTÓRICA
O bosque em que as coisas não têm nome: Como seria uma realidade em que os signos clínicos não possuíssem os nomes conhecidos como os de hoje? (VILHENA; ROSA, 2008)
 Histórico x Natural
“Todo signo tem um sentido na medida em que exista alguém para compreender e aceitar aquele sentido, ou seja, os significados são atribuídos, ou melhor, convencionados. Pensando dessa maneira, precisamos interrogar o caráter circunstancial, convencional e político dos critérios diagnósticos em saúde mental”. (VILHENA;ROSA, 2012)
Ex.: Disputa sobre a legitimidade da Síndrome da Alienação Parental (SAP): “Dizer que a SAP não existe porque não é listada no DSM-IV é como dizer em 1980 que a AIDS não existia porque não foi listada até então em livros de textos médicos”. (GARDNER, 2002)
 Normal X Patológico
A decisão sobre o que é considerado dentro ou fora da norma depende de fatores contingenciais referidos ao contexto cultural, econômico e sociopolítico de cada época. O que atualmente nomeamos patológico em termos de comportamento, é reflexo de discussões entre a comunidade científica, e seus representantes, e a sociedade. 
Ex.: No DSM-II (1968) constava a categoria diagnóstica "homossexualidade" como um transtorno mental. 
Ex.: Atualmente grupos contestam que a transexualidade seja um transtorno mental (Disforia de Gênero, segundo o DSM-V).
HISTÓRIAS DO DIAGNÓSTICO
 Século XVIII: A invenção da doença mental
Valorização da razão humana como norteadora da vida. Desenvolve-se uma concepção de doença mental atrelada à irracionalidade (distúrbios das paixões), cujo tratamento deve ser moral (disciplina e reeducação dos alienados). 
Pinel inicia as primeiras classificações nosográficas, inserindo o louco no discurso científico. 
O diagnóstico em saúde mental nasce inspirado na classificação Botânica que separava as plantas de acordo com características observáveis. Na 1ª classificação, Pinel separa a ala dos “agitados”, dos “agressivos”, dos “deprimidos”, etc.
 Século XIX: Emerge a Psicopatologia
“A clínica médica tornou-se ciência das doenças, dos desvios e dos distúrbios. O espaço hospitalar, anteriormente tido como asilo, foi sendo medicalizado e reorganizado, proporcionando a observação contínua do doente e o acompanhamento da evolução da doença, tornando exequível a observação dos sinais e sintomas do fenômeno patológico”. (DIMENSTEIN; SEVERO, 2009)
O diagnóstico é fundamentalmente empírico: observação, descrição e categorização de enfermidades que compartilham sinais e sintomas. A Psiquiatria possui caráter psicopatológico e fenomenológico, fruto de suas raízes filosóficas. 
De acordo com Araújo e Neto (2014), em 1840 os EUA realizam um censo com a categoria “idiotia/loucura”, para registrar a frequência de doenças mentais na população. Quarenta anos depois realizam outro censo, no qual as doenças mentais aparecem divididas em sete categorias distintas (mania, melancolia, monomania, paresia, demência, dipsomania e epilepsia). 
Observa-se assim, que as primeiras classificações norte-americanas de transtornos mentais aplicadas em larga escala, tinham objetivo primordialmente estatístico. 
 Final do século XIX: 
Outras concepções de doença mental vêm à tona, passando a vigorar a corrente organicista de pensamento, havendo uma tentativa de localização anatômica para o fenômeno da doença mental. As classificações diagnósticas passam a girar em torno dessa localização e a anatomopatologia ganha espaço em detrimento da teoria pineliana em torno da loucura. 
(AMARANTE APUD DIMENSTEIN; SEVERO, 2009)
 Século XX: A invenção dos Manuais de Classificação
“Outras correntes teóricas psiquiátricas, psicológicas e psicanalíticas surgiram na tentativa de explicar os transtornos mentais. Dentre elas, a classificação nosológicoclínica feita por Kraepelin ganha destaque, por articular as explicações dos alienistas e dos organicistas, além de explicitar como a sintomatologia de cada quadro diagnóstico poderia evoluir, criando, desse modo, a ideia de curso e de prognóstico da doença”. 
(SEVERO; DIMENSTEIN, 2009)
 
É publicada em 1953 a primeira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), o primeiro manual de transtornos mentais focado na aplicação clínica. 
O DSM-I consistia basicamente em uma lista de diagnósticos categorizados, com um glossário que trazia a descrição clínica de cada categoria diagnóstica. 
Apesar de rudimentar, o manual serviu para motivar uma série de revisões sobre questões relacionadas às doenças mentais. O DSM-II, desenvolvido paralelamente com a CID-8, foi publicado em 1968, bastante similar ao DSM-I, trazendo discretas alterações na terminologia.
 
 Final do século XX: A eficácia dos psicofármacos
“É fácil perceber que o panorama da Psiquiatria na segunda metade do século XX não estava muito favorável. E iria piorar ainda mais com alguns estudos feitos pela Universidade de Cambridge, que argumentavam que os diagnósticos em saúde mental não possuíam confiabilidade. Tais estudos mostravam que uma mesma constelação sintomática era diagnosticada de maneiras diferentes em diferentes partes do planeta”. 
(ROSA; VILHENA, 2012)
A solução encontrada pela Psiquiatria é a super valorização das descrições nosotáxicas dos fenômenos clínicos. Nesse contexto, ganham força os manuais de classificação diagnóstica. 
“A perspectiva empirista e positivista passou a dominar os debates em Psiquiatria, relegando todas as demais formas de pensar o fenômeno psicopatológico à condição de excluídas do campo científico, e por consequência das pesquisas e financiamentos relativos à área de saúde mental”.
 (ROSA; VILHENA, 2012). 
A revisão do DSM-III em 1980 trouxe modificações metodológicas e estruturais. Apresentou um enfoque mais descritivo, com critérios explícitos de diagnóstico organizados em um sistema multiaxial, com o objetivo de oferecer ferramentas para clínicos e pesquisadores. 
Revisões e correções foram realizadas levando à publicação do DSM-III-R, em 1987. Em 1994, é lançado o DSM-IV. A “evolução” do manual representou um aumento significativo de dados, com a inclusão de diversos novos diagnósticos descritos com critérios mais claros e precisos.
 
 Final do século XX: A Anti-Psiquiatria
Para a Anti-Psiquiatria a noção de doença mental serviu para legitimar o poder do saber psiquiátrico sobre a loucura, traduzindo problema sociais sob a ideologia
médica e social, mantendo-os sob controle, mascarando as contradições sociais que a loucura aponta. 
“Pode-se falar em diagnóstico objetivo, fundado em alguns dados científicos concretos? Não se trata antes de um simples rótulo que - sob as aparências de um juízo técnico especializado - dissimula mais ou menos bem sua profunda significação discriminatória?”
(BASAGLIA APUD SEVERO; DIMENSTEIN, 2009) 
 
 Século XXI: 
Segundo Rosa e Vilhena (2012), as representações psíquicas passam a ser buscadas nas imagens fornecidas pelos "novos brinquedos" da ciência (tomografias, ultrassonografias, ressonâncias magnéticas). Aposta-se que os problemas psíquicos poderão ser resolvidos com o avanço das neurociências, pois essas descobrirão os genes das redes neurais. Freud, dois séculos antes, havia defendido que não existe uma relação biunívoca entre psiquismo e cérebro. 
Em 2000 é publicado o DSM-IV-TR, e em 2013 é lançada sua revisão mais atual, o DSM-V. 
MUDANÇAS NA ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO DO DSM 
(Tabela de Araújo e Neto, 2014) 
(Tabela de Araújo e Neto, 2014) 
(Tabela de Araújo e Neto, 2014) 
De acordo com Câmara (2016), O DSM foi em sua origem um instrumento para auxiliar o diagnóstico, unificar a linguagem psiquiátrica e validar instrumentos de pesquisa. Inesperadamente, causou uma revolução na psiquiatria americana, afetando a psiquiatria mundial. A classificação foi adotada não apenas por psiquiatras, mas por psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais, advogados. A partir do DSM-III, o manual se tornou autoridade em psiquiatria, alterando seu propósito original de guia auxiliar para o diagnóstico. 
“Se trata de um instrumento: provisório, parcial, e datado. E não de uma perspectiva totalizadora de reflexão sobre a complexidade humana”. (MALAGONI, 2013)
 Século XXI: A Reforma Psiquiátrica
Em 2001 é aprovada a Lei federal 10.216 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Dessa lei origina-se a Política Nacional de Saúde Mental.
A Reforma Psiquiátrica desconstrói a relação de tutela e objetificação sustentada pelo saber psiquiátrico sobre a loucura. Um dos pilares dessa relação é o diagnóstico psiquiátrico que produz efeitos importantes nas trajetórias institucional e de vida dos portadores de transtornos mentais. Entra em cena o protagonismo dos usuários e familiares. 
A Política Nacional de Saúde articulada com a Política Nacional de Atenção Básica descreve uma ferramenta para a construção do projeto terapêutico dos usuários dos serviços de saúde:
Diagnóstico situacional: traz a importância de identificar as necessidades, demandas, vulnerabilidades e potencialidades mais relevantes de quem busca ajuda. Valorizando tais potencialidades, permite a ativação de recursos terapêuticos que evitam ações estereotipadas, favorecendo a reconfiguração e a emergência de novos territórios existenciais. 
PONTOS POSITIVOS DO DIAGNÓSTICO:
 Sem o diagnóstico, haveria apenas a descrição de aspectos unicamente individuais, que, embora de interesse humano, são insuficientes para prover o cuidado na saúde mental.
 Viabiliza a padronização da linguagem, facilitando a comunicação e o diálogo entre diferentes profissionais.
 
PONTOS POSITIVOS DO DIAGNÓSTICO:
 Reúne e aprofunda a descrição de uma gama de comportamentos que podem trazer sofrimento a um grande número de pessoas.
 Permite a construção de prognóstico, e o estabelecimento de ações terapêuticas e preventivas.
 
PONTOS PROBLEMÁTICOS DO DIAGNÓSTICO:
 Patologiza o que escapa aos modos instituídos de viver, criando categorias cada vez mais flexíveis e permeáveis, com o poder de capturar as mais tênues diferenças da norma.
 Não descreve apenas características ou estados naturais, mas redefine a realidade social do indivíduo. Ex. dos laudos de invalidez. 
 
PONTOS PROBLEMÁTICOS DO DIAGNÓSTICO:
 Provoca mudanças no imaginário do indivíduo, em sua identidade e forma de conceber o mal do qual padece.
 Ignora seu caráter contingente e sua impossibilidade de fornecer a última e única palavra sobre o sujeito. 
 
2. CHAVES DE LEITURA PARA O DIAGNÓSTICO:
Diferenciar Neurose e Psicose; 
 Identificar questões relacionadas a depressão e a ansiedade; 
 Identificar questões neurológicas;
 Compreender as diferentes relações dos indivíduos com as substâncias psicoativas (álcool e outras drogas);
 Diferenciar questões circunstanciais de transtornos mentais. 
 Identificar o transtorno principal entre as comorbidades; 
PRÓXIMA AULA
A construção e a interpretação do diagnóstico em saúde mental.
REFERÊNCIAS :
ARAÚJO, Álvaro Cabral; NETO, Francisco Lotufo. A Nova Classificação Americana para os Transtornos Mentais - o DSM-5. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, v.16,nº1,p.67-82,2014. http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbtcc/v16n1/v16n1a07.pdf
CÂMARA, Fernando. O DSM, a Fenomenologia, e a Psiquiatria Contemporânea. Psychiatry Online Brasil, v.17, nº8, 2012. http://www.polbr.med.br/ano12/cpc0812.php
DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008. http://pablo.deassis.net.br/wp-content/uploads/Psicopatologia-e-semiologia-dos-transtornos-mentais-Paulo-Dalgalarrondo.pdf
REFERÊNCIAS :
DIMENSTEIN, Magda; SEVERO, Ana. O diagnóstico psiquiátrico e a produção de vida em serviços de saúde mental. Estudos de Psicologia UFRGN, v.14, 2009, p.59-67. http://www.scielo.br/pdf/epsic/v14n1/a08v14n1.pdf
GARDNER, Richard. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de Síndrome de Alienação Parental (SAP)? Departamento de Psiquiatria Infantil da Faculdade de Medicina e Cirurgia da Universidade de Columbia, New York, New York, EUA, 2002. Traduzido por Rita Rafaeli. http://www.alienacaoparental.com.br/textos-sobre-sap-1/o-dsm-iv-tem-equivalente
REFERÊNCIAS :
MALAGONI, Lúcio. As Polêmicas do DSM-V. Jornal Opção, 2013. http://www.jornalopcao.com.br/posts/reportagens/as-polemicas-do-dsm-v
ROSA, Carlos; VILHENA, Júlia. Diagnóstico em saúde mental: por uma concepção não objetivista das representações da loucura. Contextos Clínicos, vol. 5, nº1, 2012. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-34822012000100004
Site utilizado:
http://www.ccms.saude.gov.br/VPC/reforma.html, acesso em Abril de 2016.
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