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COF Resumos Aulas 1 a 5

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Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 1 
 
Curso Online de Filosofia 
 
OLAVO DE CARVALHO 
 
 
 
 
Resumos de Aulas 
 
Vol. IVol. IVol. IVol. I 
 
 
Elaboração: Mário Chainho 
 
 
 
ÍndiceÍndiceÍndiceÍndice Pag.Pag.Pag.Pag. 
Aula 01 – 14/03/2009 2 
Aula 02 – 21/03/2009 9 
Aula 03 – 04/04/2009 15 
Aula 04 – 18/04/2009 20 
Aula 05 – 25/04/2009 28 
 
 
 
Notas:Notas:Notas:Notas: 
1) Este material é para uso exclusivo dos alunos do Curso Online de Filosofia. Estes devem sempre 
recorrer às gravações e transcrições das aulas, como fontes primárias, para limitar a propagação dos 
erros involuntários aqui contidos e colmatar as lacunas. 
2) Estes resumos são um primeiro esforço de apropriação do conteúdo das aulas. É sobretudo um 
trabalho de compactação, edição e montagem que visa ultrapassar dificuldades de entendimento 
através da criação de foco. Isso originou divisões e catalogações artificiais, largamente discutíveis, que 
não ocorrem nas aulas, onde os temas se vão encadeando e permutando de forma quase 
imperceptível. Não há uma tentativa de fazer uma reexposição de tudo “com palavra minhas” e 
muitas das frases aqui presentes são quase indistintas das utilizadas nas aulas pelo professor Olavo de 
Carvalho. Em termos gerais, a sequência dos resumos segue a das aulas, mas ocorre com frequência a 
junção de material que estava na origem disperso e, por vezes, a separação do que antes estava junto. 
3) Os resumos foram escritos em português de Portugal, com as limitações inerentes a uma ainda 
deficiente capacidade expressiva. 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 2 
Aula 01 Aula 01 Aula 01 Aula 01 –––– 14/03/2009 
 
Sinopse:Sinopse:Sinopse:Sinopse: Este curso deve ser uma oportunidade para a formação de verdadeiras amizades, 
baseadas na comunidade de valores e objectivos. No Exercício do Necrológio iremos conceber o 
nosso “eu ideal”, que será a imagem que nos irá orientar ao longo da vida e a base de construção 
do nosso juiz interior. O juiz interior é a parte mais elevada em nós, a única qualificada para 
falar com o observador omnisciente, que é uma noção fundamental não só em religião mas em 
toda a filosofia, pois esta tem no seu cerne uma actividade confessional. O objectivo da filosofia 
não é aprender a pensar mas obter conhecimento que nos possa orientar. Desde Sócrates que se 
busca conhecimento que é ao mesmo tempo autoconhecimento e conhecimento científico do mais 
alto nível, e o ambiente propício para desenvolver essa tradição é o clube de aficionados. A técnica 
filosófica reside na conversão de conceitos gerais em experiência existencial efectiva e vice-versa. Só 
valem as ideias dos náufragos, segundo Ortega y Gasset, o que nos dá uma imagem da seriedade 
pretendida na filosofia. Sem uma adequada capacidade expressiva o conhecimento torna-se 
impossível, pois nunca será possível transpor de forma adequada a experiência para conceitos 
sobre os quais podemos raciocinar. No início da aprendizagem a ênfase será colocada na 
formação literária, e começamos com o estudo da Gramática Latina, de Napoleão Mendes de 
Almeida, que nos dará, para além de conhecimentos de latim, uma compreensão das relações 
entre a estrutura gramatical e a estrutura lógica na língua portuguesa. 
 
A formação de verdadeiras amizadesA formação de verdadeiras amizadesA formação de verdadeiras amizadesA formação de verdadeiras amizades 
Para S. Tomás de Aquino, o nosso amigo é aquele que quer e rejeita as mesmas coisas que nós. 
Só através da amizade é possível a existência da sociedade política, segundo Aristóteles, pois 
só assim é possível a formação de grupos unidos pela comunidade de objectivos e valores. A 
amizade é também um dos pilares sobre os quais se constitui a personalidade. Sem os amigos 
adequados estaremos isolados perante grupos hostis que nos irão enfraquecer bastante ao 
longo do tempo pela incompreensão, marginalização e julgamentos aviltantes. Esses grupos 
vendem a sua amizade em troca da nossa corrupção, do abandono dos nossos valores, em 
suma, em troca da nossa desistência em sermos o que somos. Este curso deve ser uma 
oportunidade para a formação de verdadeiras amizades, formadas na comunidade de 
objectivos vitais e valores; amar e odiar as mesmas coisas. 
 
 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 3 
Exercício do NecrológioExercício do NecrológioExercício do NecrológioExercício do Necrológio 
Neste exercício vamos imaginar que um nosso amigo, após a nossa morte, escreve a um 
terceiro uma carta a nosso respeito. Vamos supor que realizamos as nossas aspirações mais 
elevadas em temos humanos, não sociais. Esta imagem ideal da nossa vida altera-se ao longo 
dos tempos, vai sendo aprofundada, sofre correcções mas sobretudo amputações. Sem a 
imagem deste eu ideal para orientar a nossa vida, vamos permitir ser julgados por outras 
instâncias, por medos, preconceitos, pelo falatório do grupo de referência incorporado em 
nós pela audição contínua. A imagem do eu ideal afasta-nos do estado de dispersão geral; de 
todas as vozes que nos falam apenas uma pode nos julgar, corrigir e orientar, e é essa mesma 
voz a única capacitada para realizar a confissão. Começamos assim por ter uma noção prática 
da filosofia, entendida como a busca da unidade do conhecimento na unidade da consciência. 
 
A filosofia praticada por um clube de aficionadosA filosofia praticada por um clube de aficionadosA filosofia praticada por um clube de aficionadosA filosofia praticada por um clube de aficionados 
Este curso é inspirado na pessoa de Sócrates, naquilo que um exemplo tem de significativo e 
essencial para nós hoje. A filosofia como actividade distintiva começou com Sócrates e nasceu 
como filosofia política, uma meditação e análise crítica não só da sociedade em geral mas da 
própria situação social de Sócrates e dos seus interlocutores, pois eles não eram observadores 
externos da sociedade mas participantes. Na tradição socrática todo o conhecimento deve ser 
auto-conhecimento e, ao mesmo tempo, conhecimento científico do mais alto grau. O 
ambiente propício para a realização da filosofia assim estabelecida é o clube de aficionados, 
como aconteceu nos casos de Sócrates, Platão e Aristóteles, no início da universidade e agora 
no Curso Online de Filosofia. No seu início a universidade deu um grande impulso ao 
progresso da técnica filosófica mas, com o passar do tempo, as exigências internas e as 
impostas pela sociedade fizeram a instituição académica seguir directrizes contrárias ao 
espírito da filosofia. A filosofia académica passou a ter um campo de actuação delimitado a 
partir de fora, deixou de fazer um exame crítico das condições originárias, o que constitui um 
retrocesso em relação a Sócrates. 
 
O objectivo da filosofiaO objectivo da filosofiaO objectivo da filosofiaO objectivo da filosofia 
Nos Tópicos Aristóteles mostra que o objectivo do pensamento é provocar a intuição, ou seja, 
a percepção directa. Na dialéctica as várias ideias confrontam-se até se formar uma massa 
crítica e, num dado momento, veremos as coisas tal como elas são. O objectivo da filosofia é o 
conhecimento, de preferência o conhecimento materializado numa evidência imediata, que é 
preferível a uma certeza lógica. Aprender a pensar, ao contrário da opinião comum, não é o 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 4 
objectivo da filosofia, pois o raciocínio lógico é apenas um dos instrumentos para conhecer, 
mas até pode atrapalhar se não for domado. O conhecimento que obtemos em filosofia é para 
a nossa própria orientação e para descobrirmos quem somos. Tem que ser conhecimento que 
sirva para algo nas horas aflitivas. Aprender é saberalgo que ou outros não sabem e que até 
podem nem querer saber. Além de que podemos ser incapazes de exprimir esse 
conhecimento. Mas o importante é que estaremos despertos e permanecendo algum tempo 
nessa prática obteremos a deliciosa sensação de realidade. 
 
A técnica filosóficaA técnica filosóficaA técnica filosóficaA técnica filosófica e o observador omnisciente e o observador omnisciente e o observador omnisciente e o observador omnisciente 
A técnica filosófica consiste na conversão de conceitos gerais em experiência existencial 
efectiva e vice-versa. Sem dominar esta técnica, quando estamos no mundo dos conceitos 
apenas raciocinamos sobre coisas que não existem e, por outro lado, nada podemos entender 
relativo ao mundo da experiência, pois perdeu-se a relação entre a estrutura conceptual e a 
experiência. 
Desde Sócrates que se busca o conhecimento para além do mero conteúdo da consciência 
mediante a pergunta sincera de nós para nós mesmos, o que pressupõe um observador 
omnisciente ao qual confrontamos a experiência individual. A filosofia académica exclui 
totalmente a parte da auto-investigação, abstraindo-se assim da pessoa concreta que a realiza. 
A actividade filosófica passou a ser apenas uma encenação de um papel delimitado pela 
burocracia, rompendo com a tradição filosófica baseada na identidade entre a auto-
consciência e o conhecimento universal e científico. Essa tradição tornou-se evidente em 
Santo Agostinho, nas Confissões, onde ele percebeu a raiz do conhecimento filosófico no 
autoconhecimento tomado no sentido da confissão cristã. Agostinho sabia que existia um 
obstáculo entre ele e as ideias universais da filosofia, o espelho obscuro mencionado por S. 
Paulo. Esse espelho é a sua própria personalidade, que tem que ser contornada fazendo uma 
narrativa para um observador omnisciente a partir da sua individualidade concreta, com 
todas as suas falhas. Agostinho sabe que não pode revelar nada a Deus, está antes a pedir que 
Deus lhe revele coisas sobre ele mesmo que não estavam na sua consciência mas apenas na 
realidade. 
 
O juiz interiorO juiz interiorO juiz interiorO juiz interior 
O desenvolvimento de um juiz interior é necessário para a realização da confissão, pois só 
esta parte mais elevada de nós está qualificada para falar com o observador omnisciente. 
Contudo, a noção do observador omnisciente é fundamental não só em religião mas em toda 
a filosofia. A filosofia é a busca de uma capacidade interna para discernir a verdade dentro da 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 5 
máxima medida humana, pressupõe por isso um julgamento interno que não pode ser 
substituído por nenhuma instância externa. O juiz interior caracteriza-se pela consistência, 
racionalidade, credibilidade, sinceridade e seriedade. A seriedade implica presença na 
consciência, não algo na periferia que se esquece no dia seguinte. O juiz interior tem que ser a 
parte mais elevada de nós, aquela que vê todas as outras e pode comparar e pesar os vários 
factores. Se pensarmos na confissão, a parte que se arrepende é mais elevada que aquela que 
pecou, que foi seduzida por uma recompensa momentânea e engoliu o resto da consciência. 
O restauro da integridade da consciência é feito pela parte que se arrepende, que interpreta a 
norma geral e mede a gravidade da situação para não cair num arrependimento excessivo. 
Sem o juiz interior não é possível a actividade filosófica, que é a busca da credibilidade 
máxima na articulação do pensamento com a realidade. Mas mesmo para a absorção da 
cultura filosófica, se não existir esse juiz as coisas serão absorvidas pelo canal errado. O juiz 
interior é o alicerce para a construção da personalidade filosófica, que idealmente pretende 
cumprir o ideal remoto de nos tornarmos sábios. Essa caminhada refaz o percurso desde 
Sócrates a Aristóteles, começando pelas especulações de ordem moral e política até chegar ao 
domínio técnico que Aristóteles estabeleceu como padrão. 
 
A atitude filosóficaA atitude filosóficaA atitude filosóficaA atitude filosófica 
A atitude filosófica é a seriedade no conhecimento, o que difere da atitude crítica, onde se 
quer questionar tudo. A atitude de seriedade pretendida ficou expressa por Ortega y Gasset 
quando ele disse que só valiam as ideias dos náufragos. Esta imagem ajuda a elucidar o que é 
para nós superficial e aquilo que realmente tomamos como sério. Se uma investigação da 
verdade não for ela mesma verdadeira, o que quer que daí se obtenha não terá sentido, 
mesmo que se obtenha reconhecimento social. O método filosófico é a descoberta da 
substância experiencial contida nos conceitos. É um trabalho de autoconhecimento e de auto-
análise, onde teremos de ir à raiz de experiências que já tivemos há décadas atrás, e por isso 
transcende o aspecto intelectual, entrando bastante nas esferas moral e psicológica. Uma 
filosofia despida desta seriedade vai estar cheia de conceitos que serão utilizados como 
fetiches e restará um verbalismo desenfreado onde ninguém sabe do que se está a falar mas 
apenas o quê. 
A atitude filosófica não se compadece com a vaidade intelectual. Qualquer vaidade é a 
exibição de um certo aspecto nosso que queremos ver reconhecido e valorizado pelos outros. 
Mas esse aspecto pode não ter qualquer importância em nós e pode até ser a camuflagem de 
alguma coisa. O interesse pelo conhecimento tem que estar desligado de vantagens 
secundárias a serem obtidas, e neste curso tanto podemos vir a obter vantagens sociais como 
grandes desvantagens, nada está prometido. 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 6 
Autoridade públicaAutoridade públicaAutoridade públicaAutoridade pública 
Mário Ferreira dos Santos referia o ponto arquimédico como um ponto de credibilidade 
máxima onde uma verdade se tornava tão patente que não podia ser esquecida por instante. 
Esta seria a base firme segundo a qual se podia julgar todos os outros conhecimentos, uma 
busca constante ao longo da história da filosofia. Quando não é possível obter este nível de 
auto-evidência procura-se, então, a confiabilidade máxima. Mas para Sócrates não bastava o 
melhor conhecimento que pudesse ser fundamentado em termos racionais, tinha de ser 
também conhecimento com importância existencial para ele. A autoridade apenas advinha 
desta síntese inseparável da consciência pessoal com o conteúdo do conhecimento. 
A opinião geral hodierna reconhece a ciência como fonte de autoridade pública, o que 
levanta vários problemas. Na ciência moderna as crenças são subscritas apenas a nível 
profissional, não importando se a conduta privada as contraria. É apenas uma especulação 
intelectual de segundo nível, que não tem importância existencial efectiva, pretendendo 
obter validação social mas não tem autoridade intrínseca para julgar outros conhecimentos. 
Depois, o próprio método científico tem um âmbito limitado e nem sempre funciona, não 
podendo fornecer uma base irrefutável de julgamento de tudo o resto. A ciência não investiga 
a realidade concreta mas um seu recorte hipotético, na suposição de nesse cenário existir uma 
uniformidade interna que se possa exprimir como hipótese científica descritiva. Como 
depois há um esforço para encontrar essa uniformidade interna, a actividade tem um carácter 
tautológico; é um jogo de cartas marcadas que nem sempre funciona. 
 
O terreno da filosofiaO terreno da filosofiaO terreno da filosofiaO terreno da filosofia 
As constantes referências a Sócrates, Platão e Aristóteles não visam arrumar discussões 
mediante argumentos de autoridade. O território da filosofia foi delimitado por eles, que 
formularam as questões e as hipóteses que depois deram origem a quase todas as investigações 
filosóficas. Para impugnar algo que eles tenhamdito temos de partir deles novamente. 
Renunciar a tudo o que eles tenham feito, como Nietzsche tentou fazer, é querer inaugurar 
uma coisa nova que já não pode ser chamada filosofia. 
 
O conhecimento humano O conhecimento humano O conhecimento humano O conhecimento humano e a paralaxe cognitivae a paralaxe cognitivae a paralaxe cognitivae a paralaxe cognitiva 
Há conhecimentos internos difíceis de transpor para pensamento e quanto maior o esforço 
para o conseguir mais longe ficamos da intuição original. Este afastamento da experiência 
original deve-se a uma deficiente capacidade expressiva e para perceber isso é preciso ter 
noção do processo envolvido na formação do conhecimento. O conhecimento humano 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 7 
começa como percepção, depois passa a memória e imaginação e só quando as coisas se 
consolidam em conceitos verbalizáveis é possível exercer o raciocínio. Esta série de conversões 
é necessária porque o material dos sentidos não é transportável. Contudo, uma entidade real, 
com toda a sua estrutura e composição, não pode ser transposta totalmente para um 
conceito. As conclusões a que se cheguem sobre os conceitos terão de sofrer uma nova série 
de conversões para poderem ser aplicadas às entidades reais, caso contrário haverá apenas um 
exercício de puro abstratismo, apagando a experiência. Esta é a situação que ocorre na 
paralaxe cognitiva, onde é criada uma definição e feito um raciocínio sobre ela acreditando 
que ainda se está a lidar com o objecto real. Mas o objecto real tem muito mais coisas que as 
que pode conter uma definição, e esta pode até estar errada. Para evitar o fenómeno da 
paralaxe cognitiva é necessário desenvolver o senso do concreto e do abstracto, para nunca 
perder a ligação das frases à realidade. Mas antes disso é necessário aperfeiçoar o domínio da 
linguagem, porque sem expressar a experiência correctamente ou, pior ainda, trocá-la logo 
por um nome, tudo daí para a frente será desligado da realidade. O início da educação deve 
começar pela arte literária porque o conhecimento tem início quando a experiência que 
temos na memória encontra uma forma mental que pode ser repetida por palavras. Neste 
curso não se pretende obter propriamente um domínio literário mas sim domínio sobre 
alguns instrumentos de expressão literários. 
 
As três funções da linguagemAs três funções da linguagemAs três funções da linguagemAs três funções da linguagem 
Segundo Karl Bühler, a linguagem teria três funções: a função nominativa, que significa dar 
nome às coisas e descrever a realidade; a função expressiva, relativa à expressão de sentimentos 
e experiências; e a função apelativa, relacionada com a influência que se quer exercer no 
receptor. Actualmente quase só a terceira função se encontra em uso, as outras são simuladas 
para obter convencimento. Este decaimento da linguagem é muito grave porque a literatura é 
a expressão directa e completa do imaginário e nenhuma outra arte a pode substituir e, por 
isso, se a linguagem decai, tudo o resto será arrastado. Sem o trabalho dos escritores, poetas, 
romancistas, que fazem uma primeira síntese da experiência para a tornar do domínio 
público, os conceitos em circulação não veiculam nenhuma experiência real. Hugo von 
Hofmannsthal salientava a importância da literatura a partir de outro ponto de vista, 
chamando a atenção de que nada existe na política de um país sem antes ter estado na sua 
literatura. 
 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 8 
Estudo da Gramática LatinaEstudo da Gramática LatinaEstudo da Gramática LatinaEstudo da Gramática Latina 
Napoleão Mendes de Almeida elaborou uma gramática de latim que é uma obra-prima para a 
compreensão não só do latim mas do próprio português, ajudando também na aprendizagem 
de outras línguas. Só é possível compreender uma frase em latim a partir dos seus elementos 
constitutivos, pelo que a leitura é equivalente à análise sintáctica. Ao estudar o latim pela 
Gramática Latina de Napoleão Mendes de Almeida iremos perceber aos poucos as relações 
subtis entre a construção material das frases e a sua estrutura lógica subentendida. Isto abre-
nos a porta para a própria técnica filosófica, que depois vai pegar na estrutura lógica e vai 
transpô-la para a estrutura de percepção e desta para a realidade. 
 
 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 9 
Aula 02 Aula 02 Aula 02 Aula 02 –––– 21/03/2009 
 
Sinopse:Sinopse:Sinopse:Sinopse: Nesta aula são feitas várias considerações sobre o Exercício do Necrológio, desde as 
motivações para a sua realização e devido enquadramento a considerar, até chegar a alguns 
conselhos práticos. O grosso da aula aborda alguns pré-requisitos à actividade filosófica, 
entendida como a busca da verdade na realidade. O candidato a filósofo deverá ser uma 
testemunha fidedigna que conquistou a própria voz e que começa por relatar para si mesma o 
mundo da sua experiência genuína. Terá de ser iniciado através de um aprendizado artístico, 
onde enriquecerá o seu imaginário e o seu equipamento expressivo. O poder do símbolo será 
aludido a propósito de Platão. 
 
Considerações sobre o Exercício do NecrológioConsiderações sobre o Exercício do NecrológioConsiderações sobre o Exercício do NecrológioConsiderações sobre o Exercício do Necrológio 
Uma verdadeira personalidade não pode existir numa vida onde não existe um elemento 
unificante, onde qualquer sonho acaba sempre por se esfumar por nunca se transformar em 
projecto. O Exercício do Necrológio visa proporcionar esse elemento unificante. Os 
elementos dispersantes são também os inimigos da alma: o Mundo, o Diabo e a Carne. O 
Mundo é a circunstância de Ortega y Gasset. Não existimos num teatro mental concebido 
por nós mas num mundo partilhado por todos e que não é feito à nossa medida. Dentro 
desse mundo surgem alguns dos elementos mais corruptores, como o nosso grupo de amigos, 
os nossos pares, as pessoas que nos atraem e até a nossa família, que vendem a sua afeição a 
um preço altíssimo. O Diabo e a Carne são elementos que se manifestam internamente, por 
vezes difíceis de distinguir, que incluem os desejos de prazer, poder e riquezas, mas também, e 
cada vez mais, a cobardia induzida. Temos também as nossas tendências hereditárias, que 
Szondi aludia nas figuras dos nossos antepassados que nos exigem a repetição dos seus 
destinos, em especial quanto piores esses destinos tenham sido. A isto ainda se juntam outras 
figuras que se incorporaram em nós pela audição contínua e passaram a usar a nossa voz e a 
mobilizar a nossa vontade. 
Estes elementos externos e internos, que nos provocam anseios contraditórios, não 
constituem o que realmente somos mas são o nosso ponto de partida para o qual devemos 
ganhar consciência de modo a fazer os arranjos necessários. Estamos na situação de um 
escritor que trabalha com uma nova língua, lutando para tornar suas as palavras para que 
estas expressem o que ele quer realmente dizer e não veiculem apenas ideias estereotipadas. 
Fazer com que o factor unificante prevaleça sobre o factor dispersante passa por, na linha de 
Viktor Frankl, definir um objectivo que tenha real sentido para nós e buscar a sua consecução 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 10 
sem contar apenas com circunstâncias favoráveis e integrando as desfavoráveis. Acabaremos, 
assim, por realizar a reabsorção da circunstância que Ortega y Gasset dizia ser o destino 
concreto do homem. 
Para a realização do exercício não é necessário saber o que queremos fazer na vida, o próprio 
génio não tem profissão definida. A nossa vocação pode até passar por estar à disposição, ou 
pode ser uma vida pobre em realizações externas e concentrada em realizaçõesinteriores. O 
importante é imaginar que realizamos o melhor de nós, algo louvável e que mereça ser 
contado. A realização do exercício implica alguns dotes de romancista. Vamos conceber um 
eu ideal sem começar logo a pensar que será impossível atingi-lo, temos de imaginar que sim, 
mas temos de ser sinceros, aquilo tem de corresponder à nossa individualidade e, se não 
soubermos bem para onde apontar, podemos começar logo por excluir tudo aquilo que não 
queremos ser. Outras coisas que podem dificultar a realização do exercício são, por um lado, a 
idolatria do prazer, mas também a pressão que a sociedade coloca sobre nós para 
desvalorizarmos a realização da pessoa humana. 
Mas o exercício é apenas o início do caminho, não só não tem de estar na forma definitiva 
como deve ser refeito muitas vezes. Aquilo que queremos ser agora pode não ser a nossa 
verdadeira vocação mas é a única pista que temos e ter vindo parar ao Curso Online de 
Filosofia já terá algo a ver com a nossa vocação. Não devemos ter a pretensão de querer 
cultivar todas as virtudes, algo inacessível ao ser humano, mas apenas algumas e depois estas 
irradiarão para outras. Podemos até descobrir, ao realizar o exercício, que as nossas aspirações 
são motivadas por vaidade, mas é só a partir desta sinceridade que podemos aspirar 
verdadeiramente a um estágio mais elevado, onde faremos as nossas escolhas face à ideia da 
morte. Aquilo que queremos ser deve ter validade para além da morte. 
Existe ainda um exercício complementar a este, que ficará para mais tarde, e que consiste em 
aceitar tudo o que nos sucede. Enquadra-se dentro da moral da investigação da verdade e 
obriga-nos a colocar a realidade acima dos nossos desejos pois só assim saberemos distinguir a 
realidade dos acrescentos que lhe colocamos em cima. 
 
A dificuldade em praticar filosofia na instituição académicaA dificuldade em praticar filosofia na instituição académicaA dificuldade em praticar filosofia na instituição académicaA dificuldade em praticar filosofia na instituição académica 
A essência da filosofia ocorre na consciência do indivíduo num trabalho de apropriação de si 
mesmo como portador de conhecimento, onde não é possível consultar uma entidade 
externa. A filosofia é uma tradição e uma prática pela qual essa tradição é continuamente 
recuperada, restaurada e assim adquire continuidade ao longo dos tempos. O que o aluno 
tem de fazer é inserir-se nessa tradição e não procurar apenas obter conhecimentos, um 
trabalho inevitável mas não representando mais que 10% do total. As universidades, com a 
estabilização de rotinas burocráticas, prestam-se ao cumprimento de obrigações 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 11 
regulamentares e mesmo que estas sejam do mais alto nível e transmitam o legado 
acumulado, não se inserem naquilo que é pretendido na filosofia. Apenas em alguns períodos 
a instituição académica beneficiou a filosofia, como no próprio aparecimento da 
universidade, servindo no mais das vezes para a sufocar. 
 
O testemunho fidedigno sufocado num universo de linguagem viciadaO testemunho fidedigno sufocado num universo de linguagem viciadaO testemunho fidedigno sufocado num universo de linguagem viciadaO testemunho fidedigno sufocado num universo de linguagem viciada 
Um segundo pré-requisito da filosofia, depois do adestramento da linguagem, passa por nos 
tornarmos testemunhas fidedignas. O conhecimento depende desse testemunho, mesmo no 
caso da ciência, onde as experiências têm, no mínimo, de ser observadas por alguém que 
depois as irá relatar. Ninguém pode refazer todas as experiências mas apenas um número 
ínfimo. Maior importância ganha o testemunho em disciplinas onde nada pode ser repetido, 
como na História. O testemunho individual não é subjectivo por natureza, pois subjectivo é 
o que depende do arbítrio individual. Há certos dados que estão objectivamente em nós e só 
nós sabemos. Sem o testemunho fidedigno o universo da filosofia fica fechado para nós. Mas 
o testemunho autêntico torna-se difícil de obter num contexto onde a linguagem está 
viciada, onde a concentração dos mídia serviu para veicular nas palavras o seu universo de 
crenças, ideias e percepções. As palavras que usamos e as frases feitas, que são mais de metade 
da nossa linguagem, são de domínio público e têm os seus significados próprios associados, 
não sendo adequadas ao que queremos exprimir. 
 
A tA tA tA tensão entre a experiência genuína e os análogos culturaisensão entre a experiência genuína e os análogos culturaisensão entre a experiência genuína e os análogos culturaisensão entre a experiência genuína e os análogos culturais 
Um terceiro preliminar passa por averiguar se os termos da discussão filosófica estão fora do 
eixo da situação real. Ocorrendo isto, a investigação levará a conclusões erradas ou a uma 
série de perguntas sem fim que só pode ser terminada por decisão arbitrária. Apenas 
conseguimos pensar sobre conceitos extraídos a partir de imagens que se consolidaram na 
memória, segundo Aristóteles. Da passagem da experiência sensorial, individual, para a 
retenção na memória já existe a intervenção de um elemento externo de ordem colectiva. As 
imagens fornecidas pela cultura ajudam a reter os elementos dos dados sensoriais, mas 
também introduzem uma interpretação. Vai existir uma tensão entre a experiência directa e 
os análogos culturais que ajudam a exprimir a primeira. Nem sempre esses análogos são 
adequados, mas eles têm uma força enorme, podendo asfixiar a nossa experiência originária e 
o que permanecerá na nossa memória será apenas aquilo que esses análogos culturais 
permitirem. A ampliação do imaginário torna-se fundamental para ter um conjunto de 
análogos culturais, que se podem combinar entre si, grande o suficiente para se aproximar o 
mais possível das experiências reais. Na literatura brasileira predominam idiotas e 
personagens impotentes face à situação e, face a esta pobreza do imaginário, certas qualidades 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 12 
humanas passam a ser inverosímeis e deixam de ser colocadas em prática. Fica assim muito 
mal preenchida a escala de Aristóteles e Northrop Fried que gradua as personagens 
consoante o seu poder, onde, para além das personagens abaixo da situação havia também 
Deus, personagens com poderes divinos, personagens sem poderes divinos mas de altíssima 
qualidade e as pessoas de poder comum. Aristóteles dizia que aquelas coisas eram contadas 
por serem possíveis. 
Na passagem para a expressão verbal usamos palavras, que também são elementos culturais 
consolidados. Torna-se fundamental encontrar uma linguagem própria que possa exprimir o 
que realmente queremos dizer e não apenas os estereótipos da cultura dominante. Na origem 
da actividade filosófica existe uma actividade confessional, a actividade da testemunha que 
relata para si mesma de maneira fiel o mundo inteiro da experiência. Esta experiência pode 
ser difícil ou impossível de expressar, porém é o material genuíno que temos e que nos 
fornece os poucos elementos de certeza que possuímos. É daqui que percebemos claramente a 
diferença entre observar, receber uma informação e criar uma informação. 
Se conseguirmos transpor a experiência genuína, sem a desvirtuar, para um produto que 
possa ser expresso na linguagem colectiva, então estaremos a realizar a função do escritor, que 
não é obrigação do filósofo mas este terá de fazer algo disto pois é parte essencial da 
actividade filosófica. Não é possível raciocinar sobre a realidade a partir dos dados brutos, 
indizíveis, nem apenas sobre os elementos simbólicos fornecidos pela cultura de massas, 
altamente dizíveis, que criam a perigosa ilusão de estarem a falar da realidade por terem com 
esta uma relação analógica. Quem apenasse exprime através destes pobres análogos culturais 
acabará por acreditar que não existe realidade, pois nunca foi uma testemunha que teve a 
experiência do conhecimento genuíno por ela mesma descoberto, só sabe por ouvir falar. Esta 
experiência genuína é algo muito mais modesto do que a presença total de que falava Louis 
Lavelle, a experiência básica do ser, mas só podemos obter a segunda se já tivermos a primeira 
consolidada. 
 
A busca da verdade na reA busca da verdade na reA busca da verdade na reA busca da verdade na realidade alidade alidade alidade 
O conhecimento começa e é recuperado por aquelas pessoas raras que não aprenderam com 
ninguém. Para as restantes apenas é possível aprender filosofia na presença de um filósofo que 
mostra como se faz. No início da formação o centro pedagógico é a presença do próprio 
professor, que passará muitos elementos indizíveis, questões de estilo, indo depois o aluno 
ganhando autonomia. O conhecimento que o filósofo irá instigar nos alunos não passa pela 
obtenção de sentenças genéricas, como saber se Deus existe, pois coisas como essas não são 
verdades mas crenças. A filosofia começou precisamente quando as crenças já não bastavam e 
as pessoas queriam saber como as coisas eram mesmo. A verdade é o que pode ser dito e 
confirmado pela experiência, ela reside na realidade e não em sentenças gerais. O objectivo da 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 13 
filosofia é descobrir a verdade na realidade, partindo da experiência genuína e raciocinando 
sobre ela com o auxílio dos elementos culturais absorvidos de forma a nos servirem. Se não 
tivermos este cuidado em lidar com os elementos culturais, a acção inverte-se e seremos nós a 
ser absorvidos por eles, tornar-nos-emos repetidores de frases feitas nas quais, por cruel 
ironia, nos iremos reconhecer. 
Na época em que vivemos a verdade e a objectividade são procuradas apenas nas coisas que 
todos podem verificar ao mesmo tempo. Mas algo só é passível de ser verificado por todos 
mediante via lógica, não por experiência genuína. A lógica lida com o mundo limitado das 
possibilidades, não pode abarcar tudo o que o mundo contém. A lógica torna-se perigosa se 
lhe dermos primazia e abandonarmos as experiências que não são à sua medida. Devemos ver 
a lógica como uma ferramenta de processar os materiais que terão de ser apreendidos, em 
primeiro lugar, numa aprendizagem artística. Quando pedimos a alguém para dizer como 
chegou a determinada ideia, o mais frequente é a pessoa começar a montar um raciocínio 
lógico na hora, algo automático e muito mais fácil de fazer do que recorrer à memória. Isto é 
uma fuga à realidade e por isso a filosofia não pode servir para aprender a pensar. O seu 
objectivo é conhecer a realidade. A verdade reside na realidade e representa o seu conteúdo 
afirmativo, mas a realidade tem muitos mais aspectos do que a verdade. 
 
A literatura como moeda de troA literatura como moeda de troA literatura como moeda de troA literatura como moeda de troca e como meio de conquista da própria vozca e como meio de conquista da própria vozca e como meio de conquista da própria vozca e como meio de conquista da própria voz 
A boa literatura funciona como moeda de troca entre as pessoas, permitindo um 
relacionamento verdadeiramente humano através do intercâmbio de experiências internas e 
externas. Sem verdadeira literatura a situação é análoga à de uma sociedade sem moeda, onde 
a economia não tem qualquer eficiência. O caso presente não é o da ausência de moeda mas 
da má qualidade da moeda existente, isto é, o que está em circulação são símbolos que não 
veiculam a experiência real mas a encobrem. É a situação análoga à da inflação, onde o 
dinheiro vale pouco porque não tem bens para garanti-lo. A primeira coisa a fazer para 
restaurar a situação é absorver e actualizar a boa literatura do passado, começando pelos 
autores de língua portuguesa. Isto deve ser feito com um interesse humano e documental e 
não literário. Queremos conhecer a língua na qual as situações humanas são expressas mas 
também as próprias personagens e para isso teremos de nos abrir mais tarde para a literatura 
estrangeira. Apenas se tivermos a capacidade de imaginarmos personagens podemos 
compreender as pessoas reais. 
É preciso estar prevenido para a absorção de elementos linguísticos de outras línguas, 
especialmente aqueles provindos do inglês, que podem dar origem a uma imitação directa de 
efeito pavoroso, originando a perda da musicalidade do idioma, um dos seus principais 
elementos expressivos. Isto é contraproducente com o objectivo de expressar a experiência 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 14 
real por que o próprio acto de escrever já encobre a experiência real de estar falando. Primeiro 
há que recuperar as influências das línguas latinas com estruturas mais próximas à do 
português. 
O equipamento linguístico terá de ser aperfeiçoado até deixar de constituir um problema e 
uma vez conquistada a própria voz podemos exercer concentração directa no assunto que 
temos em mãos. Os objectivos secundários da linguagem, como obter simpatia ou compensar 
o desprezo por nós mesmos, têm que ser removidos da discussão filosófica. Isto também terá 
um efeito terapêutico sobre a nossa vida, porque agora sabemos quem somos e também 
sabemos que realmente sabemos algo, mesmo se não for possível provar isso para alguém. 
Não será a obtenção de uma voz própria que nos tornará incompreensíveis para os outros 
mas o conhecimento obtido. Subir na escala de consciência implica necessariamente 
tornarmo-nos incompreensíveis para os outros. Ninguém foi mais incompreendido que 
Cristo. 
 
O poder do símboloO poder do símboloO poder do símboloO poder do símbolo 
A ideia da reminiscência em Platão é paradoxal pois implicaria uma sequência infinita de 
reminiscências para poder funcionar. Contudo, esta ideia em Platão não é uma doutrina, é 
uma figura de linguagem, um símbolo poético. Não nos chegou o ensinamento técnico de 
Platão, destinado aos alunos mais avançados, mas apenas o seu material poético, que é a porta 
de entrada onde nada é muito preciso. Em vez de doutrina existem imagens, símbolos a serem 
compreendidos. Platão deve ser lido ficando aberto à sugestividade da linguagem, sem querer 
tirar conclusões filosóficas porque elas não estão lá, estão no segundo andar, nas chamadas 
leis não escritas. Sócrates vai discutindo as coisas, mostrando que as opiniões estão erradas e 
quando perguntam qual é a opinião dele, ele conta um mito, não dá opinião nenhuma, ou 
seja, ele sugere. O símbolo é uma matriz de ligações (Susanne Langer). A grande vantagem de 
ler Platão está nos símbolos que ele fornece e proliferam em centenas de intuições. O símbolo 
tem uma função hormonal na inteligência e as eventuais contradições estão montadas de 
maneira a abrir a inteligência para outras percepções, não estão fechando conclusões. É neste 
sentido que Platão nos alimenta de inspiração para o resto da vida. 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 15 
Aula 03 Aula 03 Aula 03 Aula 03 –––– 04/04/2009 
 
Sinopse: Sinopse: Sinopse: Sinopse: Um dos grandes problemas da moralidade reside na transposição das normas e valores 
universais para as situações concretas. Sem este problema resolvido corremos o risco de nos 
tornarmos fundamentalistas, na acepção de Eric Voëgelin, e passarmos a acreditar em frases 
independentemente do que queiram dizer. O Exercício do Testemunho, baseado num texto de 
Louis Lavelle, tendo isto em mente, pretende criar as condições na nossa vida concreta para 
mantermos a fidelidade à recordação do eu ideal delineado no Exercício do Necrológio. A 
questão da honestidade intelectual coloca-se, acima de tudo, no momento da formulaçãodo 
testemunho individual e não podemos esperar que o escrutínio dos pares corrija a falta de 
consciência moral. Essa mesma honestidade deve ser fortalecida pelo voto de abstinência em 
matéria de opinião, onde nos iremos libertar aos poucos da necessidade de aprovação e nos iremos 
preparar para formular uma opinião com suficiente experiência pessoal e cultural associada. A 
transmissão de conhecimento em filosofia implica um longo percurso para o qual devemos ganhar 
consciência e adestramento. 
 
O problema da moralidade e a intromissão do fundamentalismoO problema da moralidade e a intromissão do fundamentalismoO problema da moralidade e a intromissão do fundamentalismoO problema da moralidade e a intromissão do fundamentalismo 
Toda a regra moral é genérica, universal, e toda a situação humana é concreta e particular, 
assim enunciou S. Tomás de Aquino um dos principais problemas da moralidade. Fazer a 
transposição da situação concreta para o sistema geral de normas e valores implica uma 
correcta categorização e classificação, onde as possibilidades de erro são muitas. O Exercício 
do Necrológio pode ajudar neste processo, pois a ideia de quem queremos ser irá também nos 
dar um critério de moralidade que nos ajudará a julgar os próprios actos. O eu ideal tem que 
ser portador de virtudes reconhecidas por outros, logo universais, mas concretizáveis de 
alguma forma por nós mesmos, caso contrário seria sempre um ideal tão longínquo que nem 
tentaríamos colocá-lo em prática. O próprio exercício é uma forma de medirmos a distância a 
que nos encontramos desse ideal. 
Sem critérios de moralidade que nos obriguem a retroagir os pensamentos de volta à 
realidade caímos o risco de nos tornarmos fundamentalistas, na acepção de Eric Voëgelin. Ele 
definia um fundamentalista como alguém que acredita em frases independentemente do que 
queiram dizer. Os fundamentalistas vêm certas palavras como símbolos queridos, fetiches 
que defenderiam contra qualquer coisa. Um exemplo de fundamentalismo é a utilização do 
conceito de “democracia integral”, pois a democracia é por natureza um sistema de 
proporcionalidade entre poderes. É um conceito que não só não é realizável na prática como 
é contraditório consigo mesmo, não corresponde a nada no plano conceptual-lógico. Mas 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 16 
isso não impede um fundamentalista de tirar conclusões sobre a “democracia integral”, ter 
sentimentos por ela e mesmo usá-la como critério de julgamento. Para o fundamentalista é 
irrelevante que as suas palavras nada signifiquem no mundo exterior, porque elas 
representam qualidades que ele atribui a si mesmo, além de serem emblemas de troca a usar 
com outros fundamentalistas que os identificam como decentes e respeitáveis, ao passo que 
outras frases classificarão os seus adversários como malignos e perversos. Mas até os 10 
mandamentos podem tornar-se fetiches para um fundamentalista quando não é feito o 
exercício de perceber o que significam os mandamentos na experiência real. 
Outro exemplo de fundamentalismo é o do professor de Direito que disse que “extrair o 
sentido de um texto é o mesmo que extrair o sentido de uma garrafa, o leitor antes atribui 
sentido ao texto”. Foi uma frase a que ele se apegou sem perder um minuto para examinar o 
sentido, pois bastaria pensar que as próprias garrafas que ele usa têm de ter um sentido ou ele 
não saberia que uso lhes dar. E os seus alunos deviam logo ter perguntado se ele pretendia que 
eles captassem algum sentido no que ele tinha dito ou se deviam antes atribuir um sentido, 
pois a fala dele não deve ser assim tão privilegiada para ser a única a vir com sentido. A partir 
dos desacertos que podem existir na comunicação alguém deduziu que está sempre tudo 
errado, que apenas existe a projecção de sentido, mas se assim fosse o próprio indivíduo nem 
saberia o que projectou, pois quando fosse analisar a sua própria projecção precisaria de fazer 
outra em cima, o que levaria a uma série infinita. 
 
A honestidade intelectual resolvida no seio do testA honestidade intelectual resolvida no seio do testA honestidade intelectual resolvida no seio do testA honestidade intelectual resolvida no seio do testemunho individualemunho individualemunho individualemunho individual 
A confiabilidade do testemunho é essencial no conhecimento. No caso da filosofia temos de 
pensar nos seus efeitos a longo prazo e nada provoca danos tão monstruosos como os erros e 
mentiras dos filósofos, pensando apenas nos milhões de mortos do nazismo e do comunismo. 
Por isso deve existir sempre uma honestidade intelectual proporcional à situação, já que não 
existe honestidade integral. Se acreditarmos na nossa veracidade instintiva já estamos no 
caminho do engano, pois o apelo da mentira em nós terá uma proporção semelhante ao da 
verdade. Temos de nos lembrar sempre que podemos mentir como qualquer outra pessoa e 
isso já tem um efeito paralisante. Também não podemos achar que o julgamento dos pares irá 
resolver o problema, eles não garantem, pelo seu número, que o coeficiente de desonestidade 
diminui. O número nunca pode compensar a falta de consciência moral. Os pares têm como 
principal interesse nada mais que obter o seu próprio favorecimento, agora ou depois, porque 
também eles irão sofrer o mesmo julgamento. 
 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 17 
Exercício do Testemunho Exercício do Testemunho Exercício do Testemunho Exercício do Testemunho –––– Louis Lavelle Louis Lavelle Louis Lavelle Louis Lavelle 
Um novo exercício será baseado num excerto do texto “Testemunho”, colocado em apêndice 
no livro “Da Intimidade Espititual”, de Louis Lavelle, publicado em 1955. 
 
Há na vida momentos privilegiados nos quais parece que o universo se 
ilumina, que nossa vida nos revela sua significação, que nós queremos o 
destino mesmo que nos coube, como se nós próprios o tivéssemos escolhido. 
Depois o universo volta a fechar-se: tornamo-nos novamente solitários e 
miseráveis, já não caminhamos senão tacteando por um caminho obscuro 
onde tudo se torna obstáculo a nossos passos. A sabedoria consiste em conservar 
a lembrança desses momentos fugidios, em saber fazê-los reviver, em fazer 
deles a trama da nossa existência cotidiana e, por assim dizer, a morada 
habitual do nosso espírito. 
 
Este exercício, a realizar diariamente, consiste em reviver os momentos privilegiados, o que 
remete directamente para o Exercício do Necrológio, que visava induzir a entrada nesse 
estado. O grande problema da moralidade, a adaptação da regra geral à situação específica, é o 
propósito do Exercício do Testemunho, onde os nossos actos individuais passam a ser 
testemunho da realização progressiva do nosso eu ideal pela fidelidade à sua recordação. A 
forma prática de realizar isto dá-se através da imaginação, que permite que os valores 
universais sejam transpostos de forma concreta para a nossa pessoa. 
Louis Lavelle refere os momentos privilegiados, onde o universo revela-nos a sua significação 
e aceitamos a totalidade da nossa existência. Para aceitarmos a nossa vida temos de a ver no 
seu conjunto, na sua forma final, daí o artifício do necrológio. Está aqui implícita a noção 
básica no ser humano de chegar a ser, que está condicionada à noção da morte. Mas a vida que 
retratamos não pode reflectir valores que apenas tenham sentido para nós, ela tem de alguma 
forma de se inserir em valores universais. Esta vida só foi relatada em necrológio por ser 
louvável, e como foi louvável é um exemplo que soa como um conselho. Mas estes são 
momentos fugidios e no mundo a que chamamos de concreto tacteamos perdidos, somos 
personagens que foram parar ao romance errado, rodeadas de pessoas que mais do que 
estarem contra nós,simplesmente não têm forma de conceber o que tentamos fazer. A 
tentação será evadirmo-nos para a fantasia ou deixarmo-nos corromper, mas qualquer uma 
das opções é uma traição à nossa vocação. A nossa vida terá de ser concebida como um 
romance que engloba a nossa situação real mas também as ideias e projectos mais elevados 
que temos para nós mesmos. 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 18 
Sem a imaginação apenas podemos repetir os conceitos abstractos como um papagaio. É o 
intermediário imaginativo que permite relacionar o universal com a situação concreta que 
estamos vivendo. Existem mesmo sínteses de qualidades nas pessoas inseparáveis a tal ponto 
que se tornam impossíveis de definir, mas são perfeitamente alcançáveis pela imaginação. A 
imaginação permite conceber o arquétipo de alguma coisa, que pode ser uma vaca ou D. 
Quixote, que abrange tudo aquilo que tenha aquelas qualidades de modo parcial, e é a partir 
daqui que as verdades abstractas ganham substância de realidade. 
O ser humano não enfrenta apenas uma dificuldade lógica para relacionar o universal com o 
concreto, por este não vir com as suas categorias e conceitos lógicos correspondentes 
explicitados. Ele tem o mesmo dilema em termos psicológicos, porque nele mesmo também 
convivem o universal e o concreto; ele tem a sua vivência particular mas também a sua 
concepção de um universo dotado de sentido. Será o mundo imaginário, através das analogias 
que fornece, que poderá resolver esta dupla dificuldade e poderá dar corpo ao princípio 
estruturante delineado no necrológio. Não podemos chegar ao objectivo apenas através do 
pensamento lógico. O próprio génio distingue-se não pela inteligência mas pela organização e 
riqueza da memória, que lhe permite transitar mais facilmente entre analogias. 
 
A transmissão do conhecimento em filosofia A transmissão do conhecimento em filosofia A transmissão do conhecimento em filosofia A transmissão do conhecimento em filosofia 
A técnica filosófica consiste em ligar pensamento a realidade. Neste processo o filósofo irá 
conseguir transmitir muito pouco do que ele mesmo descobriu. Existe sempre um antes e um 
depois que não está escrito, que no caso de Platão é muito maior do que aquilo que ficou 
registado, e tem que ser completado por nós pela imaginação. Por isso é fundamental ter a 
noção de que em filosofia só existe obra inacabada, é uma prática que está continuamente se 
refazendo, nunca termina, e basta uma palavra que um filósofo disse 20 anos depois da 
publicação de um livro para modificar completamente a sua interpretação. Na literatura não 
é assim, a obra de Shakespeare contém tudo o que é necessário para a compreender e julgar. 
Ao filósofo não basta ter ideias, é preciso memorizá-las. O processo já é em si criativo, o que 
para Aristóteles era uma junção entre fantasia criativa com fantasia memorativa, e vai ser a 
repetição na memória que vai criar fórmulas cada vez mais concretas e duráveis. A 
experiência culturalmente compartilhada, ainda antes de nos oferecer pontos de referência 
acessíveis a outros, já nos ajuda no processo memorativo e criativo, pois as nossas recordações 
são evanescentes. Quando vamos contar as nossas ideias a alguém temos de usar a linguagem 
que é composta de três aspectos. Existe a sua construção material dada pela gramática 
(Dante). Dominando esta parte podemos avançar para a construção ideal, dada pela lógica. 
Mas quem nos vai ler ou ouvir é uma pessoa real que necessita ser convencida, e por isso há 
ainda uma construção psicológica, elaborada pela retórica. Este processo de construção da 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 19 
linguagem é neutro em relação ao seu conteúdo objectivo, mas é através dele que podemos 
comunicar as nossas intuições que ligam pensamento à realidade. 
 
 
Voto de abstinência em matéria de opiniãoVoto de abstinência em matéria de opiniãoVoto de abstinência em matéria de opiniãoVoto de abstinência em matéria de opinião 
Uma chamada de atenção repetida alerta-nos para nos privarmos de dar opinião. Devemos 
logo evitar opiniões inúteis. Se não fomos convocados para dar opinião e se essa opinião não 
acrescenta nada de válido, não há nenhum motivo para apresentá-la. Devemos também nos 
abster da opinião que não estiver carregada de experiência pessoal e cultura suficiente. Antes 
de elaborar uma opinião temos de saber o estado da questão. Sem isto, a opinião será um 
conjunto de palavras onde projectamos valores naquele momento e no dia seguinte, no 
parágrafo seguinte ou até na mesma sentença já estamos esquecidos do que estamos falando. 
O direito de emitir uma opinião corresponde ao direito do outro em não ouvi-la. Repetir os 
estereótipos que todos falam dá um certo ar de unidade que esconde a fragmentação na 
mente que está por trás. Isto é loucura em sentido estrito. Muitas vezes estaremos numa 
situação de conflito em que nem chega a existir divergência de opiniões; a única coisa que 
podemos fazer será mostrar que o outro não pensou nada, nem chegou a ter uma opinião 
errada, teve apenas uma reacção emotiva que, por ser similar à dos colegas, vai parecer que 
significa alguma coisa. No fundo, isso é desejo de aprovação social. 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 20 
Aula 04 Aula 04 Aula 04 Aula 04 –––– 18/04/2009 
 
Sinopse:Sinopse:Sinopse:Sinopse: Os elementos de dispersão moral diferem hoje bastante dos inimigos da alma inscritos 
nos sete pecados capitais. Os novos factores de alienação derivam da intromissão do Estado em 
todas as relações humanas e da pressão dos elementos exteriores, que fazem de nós fracas figuras 
desejosas de aprovação. O Exercício do Testemunho mostra-nos que a realidade exterior não é 
nenhum solo duro e a unidade da consciência só pode ser obtida quando assumimos o domínio da 
nossa biografia. A literatura deve ser usada para fortalecer a consciência ao povoar o nosso 
imaginário de um conjunto de situações e personagens humanas que nos sirvam para identificar 
situações reais por analogia. O nosso plano de estudos deve responder ao nosso reportório de 
ignorância, que tem que ser elaborado fazendo a distinção entre o que ignoramos mas devíamos 
saber e aquilo que ignoramos porque faz parte do desconhecido próprio da estrutura dos objectos. 
A paralaxe cognitiva coloca um mundo inventado no lugar do mundo real e teve origem na 
divisão entre fenómenos primários e secundários estabelecida pelos filósofos da entrada da 
modernidade. Para conhecermos uma pessoa temos de conhecer a sua biografia. 
 
Continuação do Exercício do TestemunhoContinuação do Exercício do TestemunhoContinuação do Exercício do TestemunhoContinuação do Exercício do Testemunho 
Na continuação da aula anterior, começamos por colocar um excerto mais alargado do texto 
“Testemunho”, de Louis Lavelle. 
 
Há na vida momentos privilegiados nos quais parece que o universo se 
ilumina, que nossa vida nos revela sua significação, que nós queremos o 
destino mesmo que nos coube, como se nós próprios o tivéssemos escolhido. 
Depois o universo volta a fechar-se: tornamo-nos novamente solitários e 
miseráveis, já não caminhamos senão tacteando por um caminho obscuro 
onde tudo se torna obstáculo a nossos passos. A sabedoria consiste em conservar 
a lembrança desses momentos fugidios, em saber fazê-los reviver, em fazer 
deles a trama da nossa existência cotidiana e, por assim dizer, a morada 
habitual do nosso espírito. 
Não há homem que não tenha conhecido tais momentos, mas ele os esquece 
depressa como um sonho frágil, pois ele se deixa captar, quase imediatamente, 
por preocupações materiais ou egoístas que ele não consegue ultrapassar porque 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 21ele pensa reencontrar nelas o solo duro e resistente da realidade. Mas aquilo 
que é próprio de uma grande filosofia é reter e reunir esses momentos 
privilegiados, mostrar como são janelas abertas para um mundo de luz cujo 
horizonte é infinito, do qual todas as partes são solidárias e que está sempre 
oferecido ao nosso pensamento e que, sem jamais dissipar as sombras da 
caverna, nos ensina a reconhecer em cada uma delas o corpo luminoso do qual 
ela é a sombra. 
 
Com a realização deste exercício iremos perceber o nosso medo de uma existência 
verdadeiramente humana. A desvalorização e esquecimento dos momentos privilegiados 
decorrem da covardia que nos fez cair de joelhos diante das pressões exteriores e justificamo-
nos retroactivamente dizendo que abandonamos o mundo dos sonhos para pisar o solo duro 
da realidade. As pressões exteriores estão sempre presentes e aqueles momentos onde existe 
unidade da consciência, em que não existe hiato entre realidade e idealidade, são fugidios, 
mas daqui não se pode concluir que a realidade resida nos primeiros. O mundo empírico e as 
situações externas têm uma natureza transitória, apresentam-se à nossa consciência como um 
fluxo de ilusões, mas se lhes prestarmos culto entraremos numa posição existencial onde a 
compreensão da nossa existência e da própria realidade externa torna-se impossível. Uma 
realidade mais estável e permanente remete necessariamente para a experiência da unidade da 
consciência. É este poder de perseverar em si mesmo que se subentende na definição de 
filosofia como a busca da unidade do conhecimento na unidade da consciência, mais do que a 
mera aquisição de conhecimento. É uma prática espiritual onde todos os factos são encarados 
à luz do que é definitivo e irrevogável, a morte, entendida como o final do ciclo de 
transformações. Aquilo que foi, foi e aquilo que não foi jamais será. Apenas neste nível pode 
existir uma verdadeira sinceridade e seriedade, caso contrário seremos presas fácies das 
expectativas do momento, que não são mais que a materialização da opinião dos outros, os 
nossos desejos e ilusões, a pressão que vem dos pares, da família, do emprego, de algo sempre 
transitório. Damos tanta importância a estas coisas em parte por elas serem a negação de 
tudo o que queremos ser. Traímos o que há de mais próprio, íntimo e verdadeiro em nós por 
respeito medroso a uma transitoriedade que nos afasta sempre do centro da nossa 
consciência. Tudo em filosofia tem de ser feito com a ideia da morte em nossa frente, só 
valem as ideias dos náufragos, como dizia Ortega e Gasset. Mas não é a morte o grande risco 
que corremos, segundo Georges Bernanos, mas sim morrermos como imbecis. Para quem é 
religioso pode haver a tentação de substituir a ideia da morte pela atitude face a Deus. Mas 
ninguém sabe o que é Deus, o nosso diálogo com Ele já está viciado pelos nossos preconceitos 
e pelas pressões do meio. Antes de falar com Cristo temos de encontrar a nossa própria voz 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 22 
pois Ele recusa-se a ouvir outra. Mas todos sabemos algumas coisas definitivas sobre a morte e 
esse será o nosso ponto de ancoragem. 
 
Os factores de dispersão moralOs factores de dispersão moralOs factores de dispersão moralOs factores de dispersão moral 
Os elementos de dispersão moral, aqueles que fazem esquecer o propósito moral da nossa 
vida, são muito diferentes daqueles que apareciam nas situações de vida no tempo de Santo 
Agostinho e na Idade Média, quando os clássicos da educação apontavam como principais 
inimigos da alma os próprios desejos, em especial os desejos de prazer e de riquezas. Naqueles 
tempos a criação de riqueza era quase nula e não existiam os inúmeros serviços disponíveis 
hoje. As doenças eram um flagelo e a insegurança generalizada. Mas estes problemas pesavam 
sobre o conjunto da comunidade e não opunham o indivíduo a ela. Supomos hoje, pelas 
conquistas de liberdades e direitos civis reflectidos na história jurídica, que aqueles tempos 
eram também de grande opressão. Mas o que é jurídico só vale em tribunal e o que decide a 
conduta no dia-a-dia passa muito mais pela organização económica das sociedades e pela 
disposição física das cidades. 
O ambiente de liberdade vivido na antiguidade e Idade Média é para nós inimaginável. A 
relação com o trabalho era totalmente diferente da existente hoje e muito menos opressiva. A 
maior parte das pessoas trabalhava em casa ou muito perto de casa, quando hoje é frequente 
ser necessário mais de uma hora em transportes para chegar ao local de trabalho. Também 
não existia uma separação rígida entre momentos de trabalho e de lazer. O elemento lúdico e 
o de trabalho estavam tão indistintamente ligados que não era necessária uma data específica 
para os lazeres. O cidadão comum também não vivia sobre a pressão dos horários. Apenas 
para os monges existiam horários rígidos, por razões de disciplina que eles mesmo desejavam 
e lhes faziam bem. Para as restantes pessoas era tudo altamente flexível, mas hoje uma 
desobediência ao relógio pode destruir uma vida. 
As inegáveis vantagens que a sociedade moderna oferece, progressivamente a partir da 
Revolução Industrial, vieram associadas a um enorme conjunto de pressões e exigências que 
seriam insuportáveis para um camponês da Idade Média. Nunca como hoje foi tão fácil ser 
marginalizado e ostracizado e a própria organização física da sociedade contribui para isso. 
São factores novos que não fazem parte da natureza humana e por isso não estamos 
automaticamente habilitados a lidar com eles. Os elementos alienantes inscritos nos sete 
pecados capitais, como a cobiça e a luxúria, pesam hoje muito menos que o próprio medo da 
cobiça e da luxúria. Um dos principais elementos alienantes nas sociedades modernas é o 
desejo de aprovação, o que faz de nós pessoas excepcionalmente tímidas que não têm a 
sinceridade de se conhecer a si mesmas. 
Os próprios elementos da moral cristã que se incorporaram nas leis do Estado e nos hábitos 
sociais, ao se desvincularem da sua raiz original, tornaram-se elementos de pressão alienantes 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 23 
ao ponto de impedirem uma vivência realmente cristã. O cristianismo intrometeu-se na 
sociedade antiga para dar uma família aos escravos, para acudir as mulheres repudiadas e 
proteger as crianças, que podiam ser alvo fácil de pedofilia ou até ser mortas à nascença se 
indesejadas. Mas passados muitos séculos o Estado chamou a si a supervisão das instituições 
criadas por inspiração cristã. O Estado passou a mediar todas as relações humanas e todos 
passaram a estar sobre vigilância constante à espera de um erro para serem punidos. A 
principal preocupação do Estado moderno é a sua própria manutenção e crescimento. Para 
isso utiliza a estratégia “dividir para reinar”, coloca todos sobre suspeição mútua pela 
exploração das pessoas que gostam de se vitimizar e fazer mexericos, e depois oferece a sua 
protecção. Esta protecção do Estado é um poderoso elemento de alienação. 
O tema do escritor cristão François Mauriac é mostrar que o maior obstáculo a uma vida 
cristã é precisamente um meio social construído sob o nome de valores cristãos, que depois 
foi contaminado pela ideologia burguesa e os valores positivistas. A alma assim sufocada 
entra muitas vezes em transgressão por desespero, mas a saída da alienação terá de passar por 
falar com Deus com a própria voz. 
O nosso discurso interno de acusação e defesa acaba por ser também uma teatralização 
alienante. Colocamo-nos numa posição do juiz omnisciente que julga as duas partes. Mas 
quem nos acusa é o diabo e quem nos defende è a nossa vaidade, personificados numa plateia, 
anónima ou de nossos conhecidos. Nem nós estamos qualificados para sermosjuízes em casa 
própria, isso cabe o verdadeiro observador omnisciente, nem nenhuma das partes, de 
acusação e defesa, fala a verdade. Se nos viciarmos neste teatro vamos achar que todas as 
outras pessoas com quem nos relacionamos também fazem parte dele e ficamos fechados à 
verdadeira comunicação humana. Uma solução simples, usada há séculos, para terminar com 
este teatro é simplesmente rezar, o que também serve para pôr fim ao discurso de queixas e 
recriminações. 
 
A restituição da unidade da consciênciaA restituição da unidade da consciênciaA restituição da unidade da consciênciaA restituição da unidade da consciência 
Se somos oprimidos pela presença dos elementos alienantes, também ficamos angustiados 
pela sua ausência. Já não sabemos viver sem a pressão dos horários ou sem as cidades que 
maldizemos ou sem aquelas relações que nos esfrangalham. Os elementos alienantes já foram 
integrados em nós. Há em nós um advogado que fala em seu favor e contra nós. Muitos 
querem vencer a sociedade materialmente mas falham porque o que há a vencer é a sociedade 
em nós, pois o nosso instinto alienante pesa mais que tudo o que venha de fora. Se tivermos a 
ideia que somos melhores que a sociedade, a ruptura com a sociedade só nos tornará mais 
falsos e alienados. Pior ainda é exibir uma pose de transgressão por saber que a caricatura do 
alienado tem sempre uma certa aprovação da sociedade em tempos de contracultura. Isto 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 24 
pode até ser recompensado com verbas públicas para recompensar os supostos serviços 
prestados. 
Temos um medo enorme das pressões exteriores, mas elas não nos irão destruir, como 
supomos; o medo deve ser sempre proporcional à ameaça real. Não aceitar as pressões vai nos 
tornar mais fortes, individualizados e até mais respeitados. Não devemos temer a solidão que 
vem do afastamento das pessoas que só nos querem puxar para baixo. Nem devemos 
continuar no jogo recorrendo aos alívios que a sociedade moderna coloca ao nosso dispor, 
pois estes não resultam para os fins a que nos propomos. Goethe achava que se devia fugir à 
escravidão da sociedade cumprindo todas as obrigações para com ela. Assim seremos 
superiores à sociedade e não permitiremos que ela nos derrube, faça de nós uma vítima e nos 
marginalize. No caso específico das pressões dos colegas, também não as devemos temer, é 
preferível seguir o conselho de Maquiavel, ser temido em vez de amado, mostrar que sabemos 
muito mais que eles e os podemos desmascarar a qualquer altura. 
A noção de que existe uma alma contra a sociedade originou o género romance, definido por 
autores como Balzac e Walter Scott. A identificação das pessoas com os heróis dos romances, 
que vivem uma falta de harmonia com a sociedade, só foi possível com numa situação real 
onde as forças de alienação tentavam demolir a unidade interior e onde a sociedade suscitasse 
nos indivíduos anseios muito acima dos concretizáveis para a maioria. O problema assim 
extremado e clarificado pode ser equacionado para uma solução, como fez Louis Lavelle. Ele 
percebeu onde estava o fulcro do problema e que era a partir dali que tinha de ser resolvido. 
A unidade da consciência é retomada assumindo o domínio da própria biografia. Passamos a 
aceitar totalmente o destino que nos coube, que tem um sentido apontado pelos momentos 
fugidios, dos quais devemos guardar memória, e a nossa oposição deve ir apenas para os 
elementos alienantes. Precisamos pensar durante muitos anos sobre a nossa vocação, para 
descobrir onde está a pureza daquilo que queremos ser, pois lidamos com material 
ambivalente. Os meios que servem para realizar a nossa vocação também podem ser meios de 
alienação, por isso temos de ser dotados de muita lucidez. Isto já é entrar no caminho da 
filosofia e sem esta postura os próprios estudos serão uma busca vã de erudição motivada pelo 
desejo de aprovação. É a nossa força moral que irá graduar a nossa quantidade de estudos, e 
quando essa força já estiver suficientemente desenvolvida, quando já não tivermos nenhum 
ponto de apoio na sociedade, nenhum ídolo mesmo que cristão, aí começamos a falar com 
Deus. 
 
A utilização da literaturaA utilização da literaturaA utilização da literaturaA utilização da literatura 
A consciência vai se apropriar da experiência através dos meios de expressão verbal e só 
depois pode raciocinar em cima. A literatura fortalece a consciência ao fornecer um 
dicionário de situações que será usado para reconhecimento de outras situações por analogia. 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 25 
O escritor, ao tornar a experiência dizível, vai retirá-la dos cofres individuais e transformá-la 
num bem comum. Proust elucida-nos sobre os mistérios do cair no sono nas páginas 
inaugurais de Em Busca do Tempo Perdido. Perceberemos também melhor os elementos de 
alienação da cultura brasileira depois de ter lido O Feijão e o Sonho, de Orígenes Lessa, e as 
obras de Lima Barreto como Recordações do Escrivão Isaías Caminha. Queremos da literatura 
aquilo que os escritores conseguiram verbalizar em termos de impressões autênticas. Os 
estudos literários propriamente ditos podem nos afastar disso, mas têm a sua utilidade para 
nos ensinar a ler autores antigos, elucidando questões formais e de vocabulário. 
A literatura do século XX pode nos afastar do caminho da filosofia porque foi perdendo a 
integridade do eu. Para a filosofia é fundamental essa integridade, pois só assim podemos 
contar a nossa própria história e falar com a sinceridade mostrada por Santo Agostinho. A 
dissolução do eu, que se vê em Kafka onde só existem fragmentos, ou em Proust que só lida 
com estados mentais, vai criar uma consciência psicótica que já não consegue juntar causa e 
efeito e onde a noção de responsabilidade individual torna-se impossível. Este padrão 
começou na alta cultura e transferiu-se depois para toda a sociedade. A própria civilização 
precisa de um referencial mínimo dado pela poesia e pela religião para poder existir. A poesia 
moderna tornou-se muito hermética e de difícil compreensão por remeter para experiências 
intelectuais e espirituais muito elaboradas. Mas a poesia usava originalmente toda uma série 
de recursos sonoros e formas repetíveis para mais facilmente invocar a experiência relatada, 
pois ela é a expressão mais primária da literatura que tenta exprimir de forma mais directa a 
experiência. 
O critério para saber se lemos com qualidade passa simplesmente por averiguar se as obras 
literárias que estamos lendo nos ajudam a compreender as situações reais da vida. O processo 
é gradual, só vamos poder fazer de início comparações muito genéricas, da mesma forma que 
a fala da criança utiliza poucas palavras para muitos significados e só depois parte à conquista 
do termo próprio. Devemos ir aumentando o nosso vocabulário de situações e personagens 
humanas, para que este se ajuste cada vez mais às situações concretas, utilizando para isso, em 
primeiro lugar, as grandes obras, pois estas possuem maior vitalidade e não são cópias de 
cópias. Para ler bem um livro é necessário ter lido muitos livros, dizia Jorge Luís Borges. 
 
A natureza do conhecimentoA natureza do conhecimentoA natureza do conhecimentoA natureza do conhecimento 
A ideologia científica parte do pressuposto que o estado de desconhecimento é algo 
provisório e que será futuramente corrigido. Isto é uma recusa em aceitar a estrutura da 
realidade, uma postura alienada. A realidade tem um coeficiente intrínseco de 
desconhecimento que não pode ser vencido. Nenhum objecto pode se mostrar a nós em 
todos os seus aspectos ao mesmo tempo. Por outro lado, a ideia de um conhecimento total 
aplicada a um ser humano não faz sentido, só seria aplicável a um ser eterno. O ser humanoCurso Online de Filosofia – Resumos de aulas 26 
lida naturalmente com o desconhecido na sua vida cotidiana, qualquer pessoa lida com o 
desconhecido quando conduz um automóvel e não sabe o que está depois da curva. Mas no 
domínio intelectual muitos acreditam que o desconhecido é um mero acidente a ser vencido. 
Um indivíduo dominado pela ideologia científica pode acreditar que já conhece tudo a seu 
respeito ou achar que tudo o que desconhece é irrelevante. Ele até acreditará que pode existir 
uma concepção científica do cosmos, sendo isso impossível pois todo o conteúdo da ciência 
não abarca um infinitésimo do cosmos e ela só pode se pronunciar sobre o que conhece. Se 
queremos nos dedicar seriamente ao conhecimento devemos começar por distinguir dentro 
do desconhecido aquilo que é fruto da nossa ignorância e aquilo que ignoramos por isso fazer 
parte da própria estrutura dos objectos. Daqui vai sair o repertório da nossa ignorância, que 
passa a ser um plano de estudos. Isto foi feito de forma notável por Eric Voëgelin a propósito 
dos fenómenos de massas. O processo pode ser atrapalhado se não reduzirmos o número de 
opiniões, que tornam difícil a graduação da confiabilidade dos conhecimentos. As opiniões 
podem vir de múltiplos lugares, mas a partir do momento em que as expressamos passam a 
compor a nossa auto-imagem. 
 
A origem da Paralaxe CognitivaA origem da Paralaxe CognitivaA origem da Paralaxe CognitivaA origem da Paralaxe Cognitiva 
Na entrada da modernidade os filósofos começaram a fazer uma separação entre os dados da 
realidade como primários e secundários. Os primários seriam os que podiam ser medidos, 
como o peso e o tamanho; os secundários aqueles que dependiam da presença de um 
observador, como a cor ou o gosto. Não é verdade que só os dados primários possam ser 
matematizáveis por poderem ser medidos, já que os secundários também podem ser medidos. 
Além de que as estruturas matemáticas não vão operar sobre os objectos em si mas sobre as 
próprias medidas. Só Deus pode conhecer a lei de proporcionalidade intrínseca dos objectos 
(conceito de Mário Ferreira dos Santos), e qualquer ciência faz as medições com vista a 
responder às próprias perguntas que essa ciência faz, servindo-se de medidas extrínsecas para 
tal, que também são relativas a um observador humano. Esta série de confusões colocou uma 
fórmula matemática inventada como realidade primária no lugar do objecto concreto com 
todo o seu tecido de relações e acidentes. Quando o mundo inventado substitui o mundo da 
experiência fica consolidada a paralaxe cognitiva. 
 
O conhecer uma pessoa em profundidadeO conhecer uma pessoa em profundidadeO conhecer uma pessoa em profundidadeO conhecer uma pessoa em profundidade 
Um exercício aconselhado consiste em imaginar a vida de pessoas que conhecemos como se 
fosse um romance. O conhecimento que temos das pessoas é em geral muito superficial, mas 
para aprofundarmos esse conhecimento será necessário abordar três níveis. O nível elementar 
é o conhecimento intuitivo que advém dos simples sinais que nos chegam da presença de 
alguém. Num segundo nível alargamos a nossa visão para abarcar a pessoa no meio onde ela 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 27 
vive, com as suas tensões, os seus problemas, a sua situação própria. O terceiro nível, que se 
enquadra dentro do exercício mencionado, consiste em conhecer a pessoa em termos 
biográficos. Temos de imaginar a pessoa dentro de um fio de desenvolvimento temporal que 
já começou há muito tempo e se irá projectar no futuro. Outro exercício, que também 
implica a utilização da veia de romancista, é fazer um roteiro de um filme a partir de um livro 
ou, pelo contrário, a partir de um filme elaborar uma narrativa verbal. 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 28 
Aula 05 Aula 05 Aula 05 Aula 05 –––– 25/04/2009 
 
Sinopse: Sinopse: Sinopse: Sinopse: Em filosofia a exposição lógica baseia-se em experiências reais para as quais devemos 
evocar análogos. Por vezes essa experiência está camuflada, como no caso de Descartes ao expor a 
“dúvida radical”, e se aceitarmos as contradições entramos num jogo de cartas marcadas onde 
seremos psicologicamente dominados. O filósofo só tem direito de argumentar em nome da 
realidade. O treino literário serve para compreender as evocações presentes na linguagem 
filosófica e para criar análogos experienciais. Refutar uma ideia poderá não limitar em nada os 
seus efeitos sociais. Os nossos modelos de entendimento são dados pelas formas consolidadas na 
memória. A ignorância faz parte da estrutura humana e o esquecimento persegue-nos sempre. A 
fé originalmente significava confiança numa pessoa – a presença do Cristo agindo – e não se lhe 
aplicam as mesmas categorias que a racionalidade. Para desenvolver o senso de realidade não se 
deve colocar a tónica na sensibilização mas na presença. A realidade deve ser vista apenas como 
indicadora dela mesma e não devemos querer tirar conclusões antes dos factos se desenrolarem. 
 
O fundo de experiência por detrás da exposição lógicaO fundo de experiência por detrás da exposição lógicaO fundo de experiência por detrás da exposição lógicaO fundo de experiência por detrás da exposição lógica 
Escreve Benedetto Croce na entrada do livro Lógica Como Ciência do Conceito Puro: 
O pressuposto da actividade lógica são as representações ou intuições. Se o 
homem não representasse coisa alguma não pensaria, se não fosse espírito 
fantástico não seria também espírito lógico. 
 
Na ficção e na vida a dificuldade é encontrar uma explicação para o sucedido. Na filosofia 
acontece o oposto, parte-se da explicação mas falta saber ao quê aquela explicação se refere. As 
coisas expressas na linguagem lógica exprimem apenas o mundo da possibilidade; se isto 
aconteceu então aquilo também acontecerá, mas não sabemos se isto aconteceu mesmo. 
Todas as certezas assim obtidas são vazias e uma filosofia trabalhada apenas a este nível pode 
apenas ser compreendida convencionalmente e não realmente. O raciocínio pode apenas 
lidar com conceitos verbalizáveis e não com dados puros da experiência, pois estes não são 
transportáveis. Contudo, foi a partir de experiências humanas que as discussões lógicas 
tiveram origem, pelo que é tarefa do filósofo retirar o fundo de experiência originário da 
exposição lógica. Este é um trabalho imaginativo, trata-se de uma transposição da linguagem 
filosófica para a linguagem poética. Não temos a obrigação de recriar exactamente as 
Curso Online de Filosofia – Resumos de aulas 29 
experiências que motivaram os filósofos, bastam-nos análogos que nos coloquem numa 
posição de compreensão tal que aquela exposição podia ter sido feita por nós. Isto é 90% do 
trabalho de leitura. Esse trabalho deve ser feito de início sem julgamentos, sem achar que 
aquilo é bom ou mau, verdadeiro ou falso. Tentaremos ver a experiência tal como o filósofo a 
viu, não negaremos esse grau de co-participação e simpatia por receio de sermos 
influenciados, pois essa influência será parcial e vai diluir-se no meio de outras influências. 
A própria discussão filosófica tem um confronto dramático por detrás. Para compreender 
uma filosofia temos de saber contra quem ela se levantou polemicamente, segundo Benedetto 
Croce. Em consonância, Julian Marías dizia que a fórmula filosófica não era “A=B” mas sim 
“A não é B mas sim C”. Mais que o confronto de ideias existe um confronto de pessoas que 
tem que ser reconstituído. Para isso partimos das doutrinas e usamos a experiência literária. 
 
O encobrimento da experiência por DescartesO encobrimento da experiência por DescartesO encobrimento da experiência por DescartesO encobrimento da experiência por Descartes 
Na apostila “Consciência

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