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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO DISCIPLINA: Introdução ao Estudo do Direito DISCENTE: Robson Felipe de Lima Junior Capítulo III - AS PROPOSIÇÕES PRESCRITIVAS Sumário: 15. Um ponto de vista formal - 16. A norma como proposição - 17. Formas e funções - 18. As três funções - 19. Características das proposições prescritivas - 20. Pode-se reduzir as proposições prescritivas a proposições descritivas? - 21. Pode-se reduzir as proposições prescritivas a proposições expressivas? - 22. Imperativos autônomos e heterônomos - 23. Imperativos categóricos e hipotéticos - 24. Comandos e conselhos - 25. Os conselhos no direito - 26. Comandos e instâncias. 15. UM PONTO DE VISTA FORMAL O ponto de vista pelo qual Bobbio se propõe a estudar a norma jurídica, nesta obra, é o ponto de vista formal, isto é, a norma em sua estrutura, sem se atentar ao seu conteúdo. Isso pode ser visto, por exemplo, tanto na estrutura do juízo, que está no campo do ser, “A é B”, que vale para as proposições “Fumar é ruim”, “O ser humano é um animal”, quanto na própria estrutura da norma, “se é A, então deve ser B”, que está no campo do dever ser e vale para as prescrições, como, por exemplo, “Se fumou em local fechado, deve pagar multa”, ou “Se matou, deverá sofrer pena de prisão”. Cabe lembrar que sob a ótica normativa de estudo do direito não se pretende formular um formalismo jurídico, isto é, uma consideração exclusiva do direito enquanto forma, mas sim interpretar a norma jurídica de uma dentre as várias possíveis e legítimas formas já elucidadas no presente resumo) Sob o nome genérico de “formalismo jurídico”, encontram-se, pelo menos, três teorias diferentes, com visões diferentes e que pedem argumentos diferentes para combatê-las. 1. Formalismo ético: a doutrina segundo a qual é justo somente o que é conforme a lei, ignorando todo critério de justiça do que esteja acima das leis e considerando a lei justa pelo simples fato de ser lei, ou seja, por ser emanada pelo soberano. 2. Formalismo jurídico: “a característica do direito não é a de prescrever aquilo que cada um deve fazer, mas simplesmente o modo em que cada um deve agir se quiser alcançar os próprios objetivos e, portanto, não cabe ao direito estabelecer o conteúdo da relação intersubjetiva, mas a forma que ela deve assumir para ter certas consequências”. 3. Formalismo científico: preocupa-se com o modo de conceber a ciência jurídica e o trabalho do jurista (estudioso do Direito). 16. A NORMA COMO PROPOSIÇÃO Do ponto de vista formal, uma norma é uma proposição. Assim sendo, um Código, uma Constituição, são um conjunto de proposições. O autor sustenta que as normas jurídicas pertencem à categoria das proposições prescritivas. Proposições são conjuntos de palavras que, em sua unidade, representam um significado. Sua forma mais comum são os juízos, proposições com sujeito e predicados que obedecem à estrutura “S é P”, mas vale ressaltar que nem toda proposição é um juízo: a frase “quantos anos você tem?”, por exemplo, não faz parte desse conjunto. Cabe aqui evidenciar que existe diferença entre proposições e seus enunciados, pode haver uma proposição com enunciados diversos: “Fulano ama cigarros” e “Cigarros são amados por Fulano”, por exemplo, são enunciados diferentes, com grafias diferentes, que exprimem o mesmo sentido, ou seja, a mesma proposição. Por outro lado, pode haver um mesmo enunciado que exprima diferentes proposições, como dizer para um amigo: “eu queria um cigarro” e dizer a mesma coisa para um atendente num balcão de bar, que, mesmo ambas situações tendo o mesmo enunciado, sugerem proposições diferentes, o primeiro como o informe de um desejo e o segundo como a imposição de uma conduta. Como já foi dito antes, uma proposição pode ser tida como o conjunto de palavras que tenha sentido em sua unidade. Assim, não se pode dizer uma proposição que, em sua unidade, não tenha sentido, como, por exemplo, “o cigarro é macaxeira” ou “toxinas são fascistas”, o que não pode ser confundido com proposições falsas, pois, para o serem, primeiro devem ser proposições: “o cigarro faz bem à saúde”. Quando dizemos que uma norma jurídica é uma proposição, significa que é um conjunto de palavras que têm um significado. Com isso, a mesma proposição normativa (ideia que deseja transmitir) pode ser formulada com enunciados diversos, importando a quem interpreta a lei apenas o seu significado. 17. FORMAS E FUNÇÕES Uma função pode ser expressa de várias formas gramaticais, não ficando presa somente a uma. Cabe a nós estudar mais profundamente os comandos. Os comandos podem ser proferidos em todas as formas gramaticais. Em artigos de lei, por exemplo, nota-se a forma predominantemente declarativa: “É proibido o uso de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou qualquer outro produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo fechado, privado ou público.”. Apesar de ter a forma gramatical declarativa, é indubitavelmente um comando sua função. Assim como um superior fala a um funcionário: “Você não acha que esse relatório está cheio de erros?”, mesmo tendo a forma gramatical interrogativa, tem a função de comando, ou seja, a função de impor um comportamento. Também existem comandos com as formas exclamativas e imperativas, que podem ser vistos nos exemplos “Cuidado com o cão!” e “Não fume”, respectivamente. De mesmo modo que uma mesma função pode ser expressão de diversas formas gramaticais, uma mesma forma gramatical pode exprimir diversas funções. Com a mesma forma declarativa, um texto dizendo que um certo país se divide em regiões, estados e municípios pode ter uma função em um livro de geografia e outra numa Constituição Federal. 18. AS TRÊS FUNÇÕES As três funções fundamentais da linguagem: 1. A função descritiva, que dá origem à linguagem científica - consiste em dar informações, em comunicar aos outros certas notícias, na transmissão do saber. 2. A função expressiva, que dá origem à linguagem poética - consiste em evidenciar certos sentimentos e em tentar evocá-los, de modo a fazer o interlocutor participar de uma certa situação sentimental. 3. A função prescritiva, que dá origem à linguagem normativa - consiste em dar comandos, conselhos, recomendações, advertências, influenciar o comportamento alheio e modificá-lo, em suma, no fazer fazer. Apesar de ser difícil de encontrar na natureza o estado puro da linguagem, as duas primeiras tendem ao isolamento. Sendo assim, uma linguagem científica procura sempre estar alheia de sentimentos e prescrições, assim como a linguagem poética tende à exclusão das prescrições e das descrições. A linguagem normativa, por outro lado, propende a se unir com as outras, pois, para que a pessoa receptora do comando resolva agir, nem sempre basta que escute o pronunciamento do comando puro e simples: é necessário, às vezes, que ela conheça certos fatos e deseje certas consequências, induzindo a um estado de espírito. Quando digo, por exemplo, “Não fume. Isso faz mal à saúde a as pessoas ao seu redor não gostam”,uno a prescrição à descrição e complemento com uma expressão. 19. CARACTERÍSTICAS DAS PROPOSIÇÕES PRESCRITIVAS Pode-se diferenciar as proposições descritivas das prescritivas em três pontos: a. Em relação à função: enquanto as proposições descritivas têm a intenção de informar algo a alguém, as proposições prescritivas procuram modificar o comportamento de outrem. b. Em relação ao comportamento do destinatário: o consentimento,isto é, a aceitação de uma proposição se dá diferentemente com relação ao tipo da proposição. Nas proposições descritivas, ou assertivas, manifesta-se a aceitação se o destinatário acredita que tal proposição é verdadeira. Nas prescritivas, manifesta-se a aceitação se o destinatário executa tal prescrição. Em outras palavras, o consentimento de uma asserção fomenta um esforço mental, enquanto o de uma prescrição resulta em um esforço prático. c. Em relação ao critério de valoração: 20. PODE-SE REDUZIR AS PROPOSIÇÕES PRESCRITIVAS A PROPOSIÇÕES DESCRITIVAS? Como sempre, existem tentativas de reduzir as teorias. Esta que vou apresentar agora tenta dizer que é possível transformar uma prescrição, “Faça X”, em uma alternativa, que tem a forma de uma descrição, usando a seguinte fórmula: “Se não fizer X, então Y”, em que Y é sempre um resultado desagradável, uma sanção negativa. Isso faz algum sentido, pois até cabe na regra que enunciei ali acima, que diz que as proposições descritivas são verificáveis por “verdadeiro ou falso”, pois essa fórmula é, basicamente, uma descrição do que acontece caso alguém não faça um tal ato; por conseguinte, posso examinar se ela é verdadeira simplesmente verificando se realmente acontece Y caso X não seja feito. Esse reducionismo não seria aceitável pelos seguintes motivos: 1. Utilizar a fórmula “Se não fizer X, então Y” implica dizer que um comando é seguido unicamente por temor a uma sanção; que todo descumprimento de comando implica em uma pena, o que não é verdade, pois comandos podem ser seguidos pela confiança em quem os emanou, por ascendência ou autoridade, prestígio, respeito etc. 2. A tentativa de mascarar a prescrição com uma descrição é ineficaz, pois retorta à prescrição. Como assim? Seguinte, a fórmula “Se não fizer X, então Y” define que Y é uma consequência desagradável; ora, ser desagradável é um juízo de valor, que está no campo da prescrição, pois, como na tabela acima, uma descrição é definida como verdadeira ou falsa. Se eu digo que a consequência de um ato é desagradável, estou querendo que o destinatário não realize esse certo ato, o que define uma prescrição. Então a prescrição não é eliminada, mas apenas mascarada. 3. Se um comando não for seguido, haverá uma consequência. Porém essa consequência não é um efeito naturalmente ligado à quebra de uma lei em si, mas sim uma consequência criada por quem criou a lei. Em outras palavras, entre a quebra da lei e a consequência não há uma relação de causalidade, mas sim uma relação de imputação. Tomemos o imperativo “Não fume em locais fechados”. Caso seja transformado em uma alternativa, “Ou não fume em locais fechados ou será punido”, a segunda parte é, ainda que mascarada, um comando; neste caso, um comando para quem deve executar a punição e a obrigação do destinatário do comando de segui-lo. Ou seja, a consequência da transgressão corrobora outro imperativo. Então não adianta querer reduzir uma prescrição a uma descrição, pois não dá certo. 21. PODE-SE REDUZIR AS PROPOSIÇÕES PRESCRITIVAS A PROPOSIÇÕES EXPRESSIVAS? Essa tentativa de reducionismo afirma que as proposições prescritivas podem ser enunciadas, ao invés de “você deve fazer X; faça X”, como “eu desejo (quero) que você faça X”. Ou seja, pela expressão de um estado de espírito que inspira outro estado de espírito. Eis os motivos pelos quais isso não é aceitável: 1. É certo que posso formular uma prescrição como “Eu gostaria que você fizesse a lição de casa”, e ela estará na forma de expressão, porém o que permite diferenciar as proposições não é a forma que são expressas, mas sim a funcionalidade e, nesse sentido, está claro que há a função de fazer alguém cumprir uma certa ação. 2. Não importa o estado de espírito provocado pela prescrição, ela não deixa de ser um comando por isso. É comum que duas pessoas cumpram comandos por motivos diferentes, realmente não importa se, afinal de contas, há a intenção de modificar um comportamento. 3. Uma lei perde, com o passar do tempo, a valoração e o desejo original do legislador que a criou e, não obstante, a lei continua a ser lei e a modificar o comportamento de outrem. 22. IMPERATIVOS AUTÔNOMOS E HETERÔNOMOS Nos tópicos anteriores deste mesmo capítulo procuramos diferenciar, entre si, os diversos tipos de proposições, quais sejam, descritivas, expressivas e prescritivas. Deste tópico em diante nos preocuparemos em definir os tipos de proposições prescritivas, que, como vimos, abrangem tanto uma prescrição médica quanto normas gramaticais, morais e, é claro, jurídicas. Apesar de haver outros tipos, preocuparemo-nos com três critérios de distinção específicos por estarem estes mais afins com a norma jurídica: 1) com respeito à relação entre sujeito ativo e passivo da distinção (este capítulo); 2) com respeito à forma (tópico 23); 3) com respeito à força obrigante (tópicos 24 e 25). Primeiramente, fala-se de autonomia e heteronomia em diversos sentidos. Kant, por exemplo, definiu a diferença entre moral e direito dizendo que a moral seria aquela norma criada e executada pela mesma pessoa, uma norma que seria interna, que não dependeria de fatores externos para ditá-la. Por isso seria um imperativo autônomo, pois não dependeria de fatores externos e alheios ao próprio ser para criá-la e executá-la. Do outro lado estaria o direito, cuja norma que deve ser seguida por alguém foi formulada por um terceiro, e por isso seria um imperativo heterônomo. Dispensando-se a ideia de Kant, há sistemas morais que são fundados na heteronomia. Dou-te algum tempo para citar algum; você quem deve pensar, sou apenas um amontoado de letras. Tempo acabado. Morais religiosas são exemplos de sistemas morais que, apesar de serem morais, são heterônomos, ou seja, formulados não pela mesma pessoa que os seguem, mas por aspectos alheios a si. No campo do direito, também, há usos da autonomia e, nem por isso, o direito se confunde com a moral. No direito privado, por exemplo, fala-se em autonomia privada para definir a regulamentação de comportamentos que os cidadãos dão a si mesmos. Um contrato, por exemplo, é algo cujas regras e sua execução são definidas e seguidas pelos próprios cidadãos independentemente da interferência do poder público. Na esfera do direito público, também, há indícios do uso da autonomia. Tendendo à democracia, o Estado democrático, pelo menos em princípio definido por Rousseau, é aquele que é fundado sobre as leis criadas e seguidas pelos próprios participantes, ou seja, dos cidadãos. Kelsen diferencia a democracia da autocracia dizendo que o primeiro é autônomo e o segundo heterônomo, no caso, aristocrático, ou seja, um Estado cujas regras que devem ser seguidas são criadas por figuras alheias e não participantes do próprio Estado. Por isso, para haver a perfeita autonomia, já defendia Rousseau que seria imprescindível a democracia direta em detrimento da indireta. 23. IMPERATIVOS CATEGÓRICOS E IMPERATIVOS HIPOTÉTICOS Kant ainda diferencia os diversos tipos de imperativos, quais sejam, categóricos e hipotéticos. Os imperativos categóricos são proposições últimas: devem ser seguidas não com a intenção de se chegar a um objetivo, mas tendo em mente que devem ser seguidas simplesmente por serem boas, isto é, como fins em si mesmas; também chamadas de normas éticas. Têm como fórmula “Você deve X”, como no exemplo “Você deve falar a verdade”. Há, também, os imperativos hipotéticos, que seriam normas também boas, porém meios para outros fins, ou seja, devem ser seguidas em uma relação de condicionalidade. Dentre eles estãoas normas pragmáticas e as normas técnicas. As normas pragmáticas são aquelas que possuem um fim necessário por si só, incondicional, como, por exemplo, a felicidade; e contam, para isso, com um meio que deve ser seguido para determinado fim. Têm como fórmula “Visto que você deve Y, também deve X”, como no exemplo “Visto que você deve ser feliz, deve dominar as paixões”. As normas técnicas são, ao contrário das pragmáticas, aquelas que possuem um fim não necessário, ou seja, contingente. Um fim que, se eu quiser alcançar, devo agir por um meio. Têm como fórmula “Se você quiser Y, deve X”, como no exemplo “Se você quiser um diploma de Direito, tem que estudar como um condenado”. É interessante ressaltar que alguns pensadores consideram que as próprias normas jurídicas são imperativos hipotéticos, mais especificamente do tipo normas técnicas. Tomemos o exemplo “Se você quiser fumar, deve fazê-lo em lugares não proibidos”. Percebemos que ele segue a fórmula “Se você quiser Y, deve X”. O fim é contingente e condicional, você não é obrigado a fumar, pois não é um fim em si mesmo nem mesmo necessário ou uma norma ética, mas se quiser fazê-lo, deve agir como prevê a lei. 24. COMANDOS E CONSELHOS Os comandos e conselhos se diferenciam pelo seu grau de força vinculante, enquanto os conselhos possuem menor, os comandos possuem maior força vinculante por emanarem obrigatoriedade. Imaginemos, no campo das ideias, uma formulação esquemática (porque tô com preguiça de fazer): dentro das prescrições estão os imperativos (ou comandos) e os conselhos; eles têm em comum o fato que buscam mudar o comportamento do indivíduo. Thomas Hobbes formula 5 teses que diferenciam os comandos dos conselhos, que dessas Bobbio complementa, ou corrige, algumas. Tanto as teses quanto os comentários estão a seguir: 1. Em relação ao sujeito ativo: aquele que comanda se reveste de uma autoridade que lhe dá o poder de comandar; enquanto aquele que aconselha não (no direito, porém, é necessário ter autoridade para aconselhar, o chamado “poder consultivo”, mesmo que os dois sujeitos dessa relação possuam graus diferentes de autoridade) 2. Em relação ao conteúdo: enquanto o comando se impõe pela vontade de quem o emite, o conselho consegue mudar o comportamento de outrem a partir de seu conteúdo, isto é, é necessária a avaliação do receptor para determinar se o conselho é racional ou não, para então decidir se deverá ser seguido. 3. Em relação à pessoa do destinatário: o comando é obrigatório e o conselho é facultativo. 4. Em relação ao fim: o comando seria dado no interesse de quem o comanda, enquanto o conselho seria dado no interesse daquele que recebe. (Porém não parece verdade que o comando seria dado apenas no interesse de quem o comanda. Pensemos, pois, nas leis: seria ingênuo pensar que elas são pensadas somente no interesse dos cidadãos, e também seria malicioso pensar que são emanadas somente no interesse de quem detém o poder). 5. Em relação às consequências: já que não temos escolha em seguir ou não um comando, não temos responsabilidade sobre as consequências provenientes da execução de uma ordem, mas sim quem a emanou (tanto que em todo ordenamento jurídico existe um artigo excluindo a punibilidade de uma ação realizada por cumprimento do próprio dever ou resultante do acatamento da ordem de uma autoridade superior). Por outro lado, não temos obrigação de seguir um conselho, portanto detemos toda a responsabilidade das consequências provindas dele, e não quem aconselhou. “É apenas um conselho, tome-o por sua conta e risco”. 25. OS CONSELHOS NO DIREITO Em todo ordenamento jurídico, ao lado dos órgãos deliberativos, existem os órgãos consultivos, que não têm a tarefa de emanar ordens, mas sim de emanar conselhos; em outras palavras, não exercem função de vontade, mas “de apreciação técnica: são colocados ao lado dos órgãos ativos para iluminá-los com seus pareceres e conselhos” (Guido Zanobini). Como já falamos, os conselhos são prescrições e, no direito, diferenciam-se dos comandos por terem menor força vinculante do que eles, isto é, possuem uma menor autoridade do que os órgãos com função imperativa. Por isso, chamamos de “parecer obrigatório” não aquele que impõe a obrigação de seguí-lo (pois não seria um conselho, mas sim um comando), pareceres obrigatórios são aqueles que há a obrigação de requerê-los, portanto mantendo a liberdade por parte do aconselhado de o seguir ou não. Dentre esses órgãos que possuem função consultiva, há os órgãos internacionais, que emanam recomendações para os Estados nacionais do que deveria ser seguido, mas não têm a intenção de interferir diretamente, ou comandar, pois feririam a soberania desses Estados. É preciso tomar nota sobre a distinção entre conselho e exortação (pouparei-te a pesquisa ao Google: ato ou efeito de exortar; encorajamento, estímulo, incitação.). Para Bobbio, o que distingue esses dois é que o conselho tende a influenciar o comportamento por meio da exposição de fatos ou razões pelas quais um determinado caminho deveria ser seguido, fazendo uma combinação entre elementos prescritivos e descritivos; enquanto a exortação tende a ser uma tentativa de influência de comportamento que, diferentemente dos conselhos, utilizam-se dos sentimentos para tal, falando “ao coração”. Poderíamos tomar o exemplo de um médico que aconselha um menino a tomar um remédio, enquanto a mão o exorta para tal). Vale ressaltar que as exortações, diferentemente dos conselhos, não parecem ter, ou não deveriam ter, relevância direta em um ordenamento jurídico. 26. COMANDOS E INSTÂNCIAS As instâncias também entram no campo da prescrição, porém possuem uma menor força vinculante com relação aos comandos. Dentre essas proposições encontramos as rezas, as súplicas, as invocações, as implorações, os pedidos (no sentido técnico administrativo), as solicitações. Pensemos nos sujeitos ativos e passivos nos conselhos: os ativos são aqueles que dão conselhos, os passivos são os que recebem, em que o conselho é dado no interesse da pessoa que o recebe. Na instância, é ao contrário: o interesse é expresso pelo sujeito ativo, ou seja, por quem a requisita. Enquanto o poder de dar conselhos é geralmente atribuído aos órgãos públicos, as instâncias têm um carácter mais particular, o poder de mover instâncias é o chamado “poder de petição”.
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