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A bruxa nos contos de fadas TRINDADE, Nancy R. de B.

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Universidade Presbiteriana Mackenzie 
 
 
 
 
 
Nancy Rabello de Barros Trindade 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
. 
 A BRUXA NOS CONTOS DE FADAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
São Paulo 
2008 
id28819590 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com 
 
 
 
NANCY RABELLO DE BARROS TRINDADE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
. 
 A BRUXA NOS CONTOS DE FADAS 
 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada à Universidade 
Presbiteriana Mackenzie como requisito para 
obtenção do título de mestre em Educação 
Arte e História da Cultura. 
 
Orientador – Prof.Dr. Arnaldo Daraya Contier 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
São Paulo 
2008 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Trindade, Nancy R.B. 
A bruxa nos contos de fadas / Nancy Rabello de Barros Trindade. 2008 
204f. ; 30 cm. 
Dissertação (Mestrado em Educação, Arte e História da Cultura) -
Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2008. Bibliografia: f. 
197-204 
l. Contos de fadas 2. Bruxa 3. Arquétipos 4. Psicologia analítica 
5. Símbolos 6. Imagens arquetípicas. I. Título. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
NANCY RABELLO DE BARROS TRINDADE 
 
 
 
 
. 
 A BRUXA NOS CONTOS DE FADAS 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada à Universidade 
Presbiteriana Mackenzie como requisito 
para obtenção do título de mestre em 
Educação Arte e História da Cultura. 
 
 
Aprovado em de de 2008. 
 
 
 
 
 
 
COMISSÃO EXAMINADORA 
 
 
Prof. Dr. Arnaldo Daraya Contier________________________________________ 
(orientador) 
 
Prof. Dra.Patrícia Pinna Bernardo_________________________________________ 
(USP) 
 
Prof. Dra. Maria Aparecida de Aquino _____________________________________ 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
O mestrado, para mim, foi motivo de satisfação. Um sonho que acalentei por muitos 
anos e que, enfim, se tornou uma realidade. Poder estudar, me aprofundar e 
apropriar dos contos de fadas foi muito gratificante. Ir, aos poucos, percebendo o 
quanto eles são importantes em nossas vidas, conhecer mais a fundo os autores 
que os estudam, fazer as relações, perceber o quanto a personagem por mim 
escolhida A bruxa nos contos de fadas traz consigo uma sabedoria muito grande, é 
a Grande Mãe conhecedora da vida, de seus encantamentos e mistérios, me 
acrescentou muito em todos os sentidos e, principalmente, enquanto mulher. Pois, 
o estudo da bruxa na história da humanidade é, por certo, o estudo da mulher. É por 
tudo isso que conquistei ao longo deste mestrado que faço aqui os meus 
agradecimentos. 
Em primeiríssimo lugar ao meu filho Alessandro, que me fez perceber que os 
desafios estão aí para serem vencidos. Seu incentivo fez com que eu ingressasse 
no mestrado, sabendo que tinha junto a mim um dos meus maiores incentivadores. 
Ao Rodrigo, que acompanhou todos os passos e soube compreender as noites de 
estudos e leituras, os passeios não feitos, acreditando sempre que este esforço era 
importante para o meu desempenho acadêmico. 
À minha mãe e minhas irmãs, que me incentivaram a prosseguir sempre, apesar das 
possíveis dificuldades encontradas. 
Ao apoio recebido do Fundo Mackenzie de Pesquisa, o MACKPESQUISA, que me 
ajudou com o reembolso de parte da verba destinada à conclusão deste projeto. 
Os meus agradecimentos especiais aos professores do curso de mestrado, que 
abriram meus horizontes, que me ofereceram as possibilidades de atingir o grande 
momento que é a defesa do mestrado. Em especial ao Prof. Dr. Feijó, que ao longo 
do curso me possibilitou aprofundar meus conhecimentos sobre as bruxas, 
indicando-me bibliografias, textos e emprestando livros. 
 
 
 
À amiga e Prof. Dra. Patrícia Pinna, que através de seus cursos me propiciou um 
maior e amplo conhecimento sobre os contos de fadas e as bruxas neles contidos, e 
que me dá a honra de tê-la em minha banca. 
À Clara Custódio, que com o seu jeito meigo me orientou em relação à arte de 
escrever, o que muito me ajudou durante todo o processo da escrita da minha 
dissertação e nesta etapa final. 
E um agradecimento especialíssimo ao meu querido orientador Prof. Dr. Contier, 
que com seu jeito carinhoso e seguro soube fazer com que as minhas idéias fossem 
transcritas com o rigor acadêmico necessário, mas que, em nenhum momento, 
tolheu meu caminho, deixando que eu realmente fosse autora desta dissertação. 
Como acontece nos contos de fadas, esta dissertação teve seu começo algumas 
provas à serem vencidas, a ajuda dos seres sobrenaturais e, em diferentes 
momentos houve a necessidade de recorrer a sabedoria e às poções mágicas das 
bruxas. Mas, como quase todo conto de fadas, existe um final feliz. E este final é o 
que estou vivendo agora, fazendo a minha defesa com a colaboração e o carinho de 
todos vocês que estiveram comigo durante este percurso. 
 
 
 
RESUMO 
 
Esta dissertação visa analisar e estudar a bruxa nos contos de fadas. Busca, no 
teórico e no prático, a resposta para uma questão principal: como as crianças e 
adultos da atualidade vêem a bruxa nos contos de fadas? Para melhor entender e 
desenvolver este tema, busca-se respaldo em Jung e autores como Paz, von Franz, 
Coelho e Byington, que seguem a linha da Psicologia Analítica de Jung para seus 
estudos sobre os contos de fadas. A construção da personagem também é vista 
ainda sob o olhar de historiadores como Darnton, Clark e Nogueira, que analisam a 
figura da bruxa e da mulher no contexto histórico. 
Em relação à parte teórica, buscou-se observar a estrutura dos contos sob o olhar 
de Propp e de outros tantos que fazem análises através das ações e das 
personagens neles inseridos. Analisaram-se os principais conceitos relacionados 
aos contos de fadas e suas personagens, como arquétipo, Grande Mãe e imagens 
arquetípicas, além da contribuição da bruxa na formação da personalidade das 
crianças. Os símbolos e as imagens são privilegiados ao longo do trabalho, pois é 
através da linguagem simbólica que os contos transmitem seus conteúdos à 
humanidade. Os autores usados para entender os símbolos são Byington, 
Neumann, Bussato e Kast, entre outros. 
Este estudo está dividido em dois grandes momentos: os dados teóricos e as 
pesquisas realizadas com crianças e adultos. Para a parte prática foram escolhidos 
três contos: João e Maria, Branca de Neve e Rapunzel, que apresentam a bruxa de 
diferentes maneiras. Após ouvirem os contos, as crianças foram convidadas a 
desenhar a bruxa e, posteriormente, buscou-se analisar estes desenhos a partir das 
teorias da Arteterapia, com aporte teórico de autores como Futh, Derdyk, Cox e 
Mèredieu. 
A partir das atividades conduzidas, chegou-se à conclusão de que as bruxas dos 
contos de fadas não são percebidas como puramente más, uma vez que a 
personagem é importante para que os contos de fadas cumpram seu potencial para 
ajudar as crianças a atravessarem a infância. 
 
Palavras-chave: contos de fadas – bruxa – arquétipos – psicologia analítica – 
símbolos – imagens arquetípicas 
 
 
 
ABSTRACT 
 
This paper´s objective is to focus on the witch of the fairy tales – more specifically on 
they way witches are perceived by adults and children. In order to better understand 
and develop this theme, it seeks background on Jung himself and authors as Paz, 
von Franz, Coelho, Byington – who follow the Analytical Psychology of Jungon their 
studies about fairy tales. The research is enriched by the perspectives of authors as 
Darnton, Clark and Nogueira, who analyze the construction of the images of the 
witch and the woman within the historical context 
The structure of the fairy tale was based on Propp’ s view among other authors who 
analyze the fairytale through the actions of the characters within it. It was also 
analyzed the contribution of this character to the development of the children’s 
personality. The main concepts related to fairy tales (archetypes, Great Mother and 
other archetypical images) were also identified on several chapters. The symbols 
and images are the focus of the following chapter, as it is through the symbolic 
language that the fairy tales bring out their meanings to the mankind. The authors 
used to understand the symbols are Byington, Neumann, Bussato and Kast among 
others. 
This study is divided in 2 great moments: theoretic data and interviews conduct 
among children and adults. For interviews work, 3 stories were chosen: Hänsel and 
Grethel, Snow white and Rapunzel, which represent the witch in 3 different 
perspectives. After listening to the stories, the children were invited to draw the 
witch. Those drawings were analyzed using as a starting point the theories of Art-
therapy, supported by authors as Futh, Derdyk, Cox and Mèredieu. 
The conclusion achieved from the conducted study is that the witches are not 
perceived by children as being totally mean, and that this character has a 
fundamental part in order to allow the fairy tales to accomplish its potential of helping 
children across their childhood. 
 
 
Key words: fairy tales – witch – archetypes – Analytical Psychology – symbols – 
archetypical images 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
INTRODUÇÃO........................................................................................................... 10 
 A – Justificativa........................................................................................ 10 
 B- Objetivos principais............................................................................. 12 
 C - Critérios teórico-metodológicos......................................................... 15 
 D - Corpus - Estudo de caso - A representação da bruxa........................ 21 
 
CAPÍTULO I - CONTOS NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE.................................... 24 
 1.1. As primeiras coletâneas e as origens dos contos de fadas..................... 31 
 
CAPÍTULO II - OS CONTOS DE FADAS................................................................. 38 
 2.1. João e Maria...................................................................................... 40 
 2.2. Branca de Neve................................................................................. 46 
 2.3. Rapunzel........................................................................................... 51 
 
CAPÍTULO III............................................................................................................. 56 
 3.1. A estrutura dos contos............................................................................. 56 
 
CAPÍTULO IV - CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CONTOS, ARQUÉTIPOS 
E A CONTRIBUIÇÃO DA PSICOLOGIA JUNGUIANA............................................ 62 
 4.1. Jung e os arquétipos contidos nos contos de fadas.......................... 62 
 4.2. Símbolos e imagens nos contos de fadas......................................... 68 
 
CAPÍTULO V - A BRUXA NOS CONTOS DE FADAS............................................. 79 
 5.1. A bruxa: o arquétipo da Grande Mãe................................................ 82 
 5.2. A relação mãe/criança e as bruxas................................................... 87 
 
CAPÍTULO VI - DARNTON E A VISÃO HISTÓRICA DOS CONTOS DE FADAS.. 91 
 6.1. A construção histórica da figura da bruxa e a relação mulher/bruxa. 96 
 
CAPÍTULOVII - A CRIANÇA E A CONCEPÇÃO DA BRUXA 
NA CONTEMPORANEIDADE: UM ESTUDO DE CASO......................................... 100 
 7.1. Aporte teórico para a interpretação dos desenhos............................ 100 
 7.2. Comparação dos desenhos de cada criança nos diferentes 
 contos – descrição e análise................................................................... 106 
 7.3. Os desenhos dos adultos/professoras.............................................. 151 
 7.4. Considerações finais sobre os desenhos e depoimentos................. 154 
 
 
 
 
 
COSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................... 
 
158 
 
APÊNDICE I - JOÃO E MARIA................................................................................. 161 
 
APÊNDICE II - BRANCA DE NEVE.......................................................................... 174 
 
APÊNDICE III – RAPUNZEL..................................................................................... 190 
 
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 197 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
A – Justificativa 
 
 No estudo sobre contos de fadas, é possível observá-los como portadores 
de mensagens. Os temas neles tratados revelam as dificuldades encontradas na 
vida de toda a humanidade. Apresentam, em seu bojo, conteúdos da sabedoria 
universal. Cada época reflete mudanças quanto à interpretação de seus possíveis 
significados. 
 Von Franz (1990) assegura que alguns contos de fadas são tradições 
religiosas e folclóricas. Desta forma, ao estudá-los, reinterpretam-se as tradições e 
os ritos. Os contos apresentam aos leitores diferentes conflitos, semelhantes às 
suas vivências reais, e também lhes sugerem as possíveis soluções para resolvê-
los. Dentre os estudiosos dos contos de fadas, encontra-se Bettelheim (1979), que 
discute sobre os contos e sua importância, e reporta-se às crianças que se 
maravilham e se encantam com as histórias. E que, ao mesmo tempo, sentem-se 
compreendidas, pois os contos segundo este autor lidam com as angústias infantis. 
 Os contos contêm uma estrutura básica, permanecendo ao imaginário 
popular durante séculos. Suas personagens, reis, príncipes, princesas, fadas e 
bruxas estão sempre presentes, independentemente da cultura na qual estes 
contos estão inseridos. No entanto, cada cultura apresenta diferentes contextos 
sociais. Desta forma, para melhor compreensão dos contos, torna-se importante o 
conhecimento da cultura da qual este conto é originário. 
 Entre as personagens que compõe o conto de fadas, uma das mais 
marcantes é a bruxa. Ela conhece a natureza, as ervas, e diferentes maneiras de 
produzir encantamentos. 
 
 
 
 Nesta pesquisa, a bruxa é a personagem central, pois procurar-se-á 
discutir a construção de discursos nas mais diferentes conjunturas históricas e 
psicológicas que caracterizam seu comportamento conforme realidades diversas. 
 A bruxa será estudada, portanto, de acordo com comportamentos 
femininos específicos e variáveis e, conforme momentos sócio-culturais no decorrer 
da história. 
 Entre as personagens dos contos de fadas, encontram-se os aliados do 
bem e os antagonistas do mal. Estas personagens fazem parte de um mundo 
diferente, onde fatos inimagináveis podem acontecer, onde existem heróis e 
heroínas que passam por provas até alcançarem seus objetivos. Lá existem fadas e 
bruxas. É o mundo do Era uma vez.... 
 O estudo da bruxa nos contos de fada justifica-se por ser, esta 
personagem, uma mulher que, por transgredir os valores sócio-culturais de uma 
determinada comunidade, é excluída do convívio social, vivendo de maneira 
independente. Ela sabe cuidar da alma e do corpo das pessoas de sua comunidade,ela conhece as ervas que curam e as poções para os encantamentos. Por este 
motivo, ela é valorizada e temida ao mesmo tempo. 
 Para a realização desta pesquisa, faz-se necessário elucidar e considerar 
inúmeros conceitos como os contos de fadas, arquétipo, imagens arquetípicas, 
Grande Mãe e símbolo, entre outros. 
 Analisando-se esta personagem, portanto, do ponto de vista psicológico, 
Jung esclarece “os contos de fadas são em si mesmo a sua melhor explicação. Seu 
significado está contido nos temas que compõe a história da humanidade” (apud 
VON FRANZ, 1990, p. 9) 
 Do ponto de vista histórico, buscar-se-á ponderar seu percurso em 
diferentes momentos culturais, tendo como base bibliográfica historiadores que 
discursam sobre a bruxa enquanto personagem de uma cultura inserida em uma 
comunidade. Analisando-se desta maneira, também será ponderado como constrói-
se a figura da bruxa levando em conta a comunidade na qual ela vive. 
 
 
 
 Os contos de fadas fazem parte de um momento mágico da vida das 
crianças. Através deles, elas vivenciam fantasias, medos, conquistas e sonhos. Os 
contos são, acima de tudo, obras de arte literária que possibilitam transcender o 
cotidiano e viajar com a imaginação. Suas mensagens são entendidas de diferentes 
maneiras pelas pessoas que os lêem, independentemente da faixa etária na qual se 
encontram. 
 Através da imaginação criam-se castelos, florestas, fadas, bruxas 
princesas, príncipes, reis e rainhas. Sendo que, para cada leitor ou ouvinte, existe 
uma imagem diferente, pois esta depende de suas vivências. 
 Nos contos de fadas, as figuras da fada e da bruxa são uma 
constante. Desta forma, Robles (2006) afirma que fadas são personagens que têm o 
poder de reger os destinos humanos muito antes de seu nascimento. São jovens, 
belas e sempre dispostas a resolver problemas. Já as bruxas desviam a ordem e o 
bem estar, pois se entregam aos mistérios da feitiçaria. A bruxa é representada, na 
maioria dos contos, através do esteriótipo da mulher feia e velha. 
 
 
B - Objetivos principais 
 
 A figura da bruxa faz parte do imaginário popular. Sendo assim, esta 
dissertação tem por objetivo analisar como as crianças da atualidade vêem esta 
figura, fazendo comparações entre visões antigas e atuais. 
 A bruxa, como personagem significativa nos contos de fadas, é nesta 
pesquisa o foco principal. Cabe, neste estudo, considerar quais os riscos que esta 
figura pode representar para a personalidade em formação destas crianças, assim 
como, quais as oportunidades que esta personagem trás para o crescimento 
psicológico destas mesmas crianças. Desta feita, é objetivo básico analisar o 
aspecto psicológico dessa figura e a sua influência para as crianças entre a faixa 
 
 
 
etária de 4 a 6 anos. Além de analisar também como essa figura permanece no 
imaginário dos adultos. 
 Para entender como é vista a bruxa pelas crianças dos dias de hoje e 
pelos adultos, valer-me-ei de três contos escolhidos: João e Maria, Branca de Neve 
e Rapunzel, nos quais a bruxa aparece de maneiras diferentes. Estes contos serão 
narrados aos grupos de alunos de acordo com cada faixa etária, juntamente com os 
adultos (professoras). 
 A representação das bruxas dar-se-á através do desenho. Segundo 
Mèredieu (1974), o desenho constitui-se numa linguagem própria e específica que 
se dá a conhecer através das possíveis metáforas e simbologias nele inseridas. 
Sabe-se que a criança, ao desenhar, utiliza-se de uma série de signos gráficos, os 
quais se assemelham em crianças de uma mesma faixa etária. Isso facilita as 
pesquisa em relação ao desenvolvimento do desenho infantil. 
 A criança convive com o imaginário desde muito cedo. Esta coexistência 
entre seres reais e imaginários faz com que os contos de fadas encontrem 
facilmente lugar em sua vida. Eles proporcionam crescimento e amadurecimento 
emocional, gerando compreensão das situações vividas no dia-a-dia. 
 A imagem traz em si mensagens subjetivas, sendo que a subjetividade é 
menor quando se lida com a palavra. As imagens carregam consigo um cabedal 
imenso de simbologias. 
 A representação da figura da bruxa também será feita pelas professoras 
da escola da mesma maneira como será realizada pelas crianças, visto que os 
contos, segundo Dieckmann (1986), conseguem atingir o interesse de diferentes 
pessoas, em diferentes fases de suas vidas, e com diferentes graus de 
amadurecimento. Isso porque, os contos trazem os problemas fundamentais da 
humanidade, os quais transitam não só durante vários momentos de nossa vida, 
assim como na vida da humanidade. Desta forma, torna-se importante neste estudo 
analisar como a bruxa permanece no imaginário dos adultos. 
As entrevistas ou depoimentos serão baseados nas leituras da história 
oral, que asseguram que as informações colhidas oralmente e os estudos 
 
 
 
acadêmicos podem ter divergências, pois se estruturam de maneiras diferentes. Os 
trabalhos acadêmicos devem ser entendidos como uma narrativa que é estruturada 
pela linguagem do discurso acadêmico. Não podemos nivelar os depoimentos orais 
a estes escritos. Os depoimentos orais devem ser ouvidos e entendidos no seu 
contexto, isso porque recebem sempre a influência cultural. 
 Estudar a simbologia que a bruxa carrega é um dos objetivos pretendidos 
nesta dissertação. Para tanto, a interpretação dos contos tendo como base a 
Psicologia Junguiana será a responsável para atingir este objetivo. 
 Bernardo (2006) coloca que os contos de fadas apontam e mostram-
nos como se dá a construção de diferentes formas de relação destes com a 
realidade. Os contos, porém, não pertencem somente ao passado, pois são 
processos criativos referentes a um momento histórico no qual foi produzido através 
da relação entre a percepção do real agregado do imaginário, trazendo em si 
diferentes significados. Desta forma, ao representarem a bruxa, as crianças e os 
adultos dialogarão com aspectos do seu mundo interno. Pode-se observar que 
através destas representações, o imaginário, tanto das crianças quanto dos adultos, 
estará sendo revelado. 
 Conhecer a bruxa do ponto de vista histórico e entender sua passagem 
para os contos de fadas incide num dos pontos nodais desta pesquisa. 
 Darnton (1986) afirma que no século XVIII a população de camponeses 
vivia na pobreza, com muitas dificuldades, com falta de alimentos, moravam em 
casebres longe da comunidade. Os homens enviuvavam cedo, necessitando casar-
se novamente, pois eram muitos os filhos e precisava-se de uma mulher e/ou de 
uma madrasta para cuidá-los. Este era o cenário da vida real. Portanto, segundo a 
visão histórica deste autor, é este cenário real que foi transposto para os contos de 
fadas, os quais chegaram até os dias de hoje pela tradição oral, a princípio e, 
posteriormente, recolhidos por folcloristas e transformados em coletâneas. 
 As duas visões, tanto a psicológica quanto a histórica fazem parte desta 
pesquisa. Cada um dos aspectos estudados ampliará a visão sobre a bruxa que, 
acrescido dos desenhos e depoimentos das crianças e adultos, formará a visão da 
 
 
 
bruxa no imaginário destas pessoas, dando subsídios para que os objetivos traçados 
possam ser atingidos. 
 Desta maneira, não cabe aqui procurar debater se foram os contos de 
fadas se espelharam na realidade ou se esta é que foi acrescida de fantasias, isso 
porque, a fantasia faz parte da vida de todos os indivíduos em diferentes momentos, 
pois ela não existe somente nos livros e nos contos. Assim como, também não é 
vivida somente na infância, pois em diferentes fases de nossas vidas há a 
possibilidade de se viver a fantasia. É importante ressaltar que nem sempre a arte 
imita a realidade, sendo que muitas vezes é a realidade que imita a arte. 
 
 
C - Critériosteórico-metodológicos 
 
 Os autores arrolados nesta dissertação compõem-se daqueles que, de 
diferentes maneiras, colaboram para a discussão do tema da bruxa nos contos de 
fadas, tanto na sua análise sob o olhar da Psicologia Junguiana, como sob olhar 
histórico. 
 Definir contos de fadas e ampliar os conceitos a eles relacionados é o 
ponto de partida desta pesquisa. Estudiosos e teóricos que vêem o conto sob o 
enfoque da Psicologia Analítica postulada por Jung mostram-no como portador de 
mensagens e carregado de conteúdos arquetípicos. As mensagens inseridas nos 
contos de fadas vão ao encontro dos anseios das diferentes faixas etárias, pois 
estes conteúdos mostram os dilemas da humanidade. Desta forma, 
independentemente da idade em que se encontre o leitor, os contos de fadas podem 
trazer mensagens muito importantes, além de possibilitar vislumbrar novos 
caminhos. 
 Sendo assim, por meio de diferentes leituras ampliam-se os conceitos, 
agregam-se valores, alargam-se os pontos de vista. E pode-se, desta maneira, 
construir o tema com raízes sólidas. 
 
 
 
Dos autores lidos, Jung é o que dá a base para a dissertação. Ampliando 
os conceitos apresentados por Jung, encontram-se Marie Louise von Franz, Nelly 
Coelho, Noemi Paz, Dieckmann e Neumann, que conceituam contos de fadas, 
arquétipos, símbolos , imagem arquetípica e o arquétipo da Grande Mãe . 
 Em relação ao aspecto histórico desta dissertação, os principais 
autores arrolados foram Clark, Nogueira, e Darnton. 
Os conceitos inicialmente trabalhados nesta pesquisa são as definições 
de contos de fadas dados por diferentes autores, os quais, em linhas gerais, afirmam 
que os contos são produtos originários da uma determinada cultura e da fantasia. 
Estes contos fazem parte da literatura infantil. Coelho (2003) e Abramovich (1997) 
enfatizam a importância da literatura infantil, ilustram o percurso histórico dos contos 
e as primeiras coletâneas. Apresentam os primeiros e mais importantes autores de 
contos de fadas, como Perrault, Irmãos Grimm e Andersen, que elucidam as 
diferentes versões dos contos. 
 Von Franz (1990) conceitua contos de fadas sob diferentes aspectos. 
Esta autora coloca que os contos se apresentam por meio de um sistema 
relativamente fechado e que neles vamos encontrar uma linguagem simbólica. Von 
Franz (1990) faz referência à linguagem dos contos, afirmando que esta é comum a 
toda uma espécie humana independentemente de idade, raças e culturas. 
 Dieckmann (1986) complementa a conceituação de contos de fadas 
afirmando que estes são produções culturais, com os quais muitas pessoas 
colaboraram e foram trazidos pela oralidade até o momento em que foram 
coletados, transformado - se em coletâneas com os contos que conhecemos na 
atualidade. 
 Coelho (2000) assegura que os contos de fadas são histórias originárias 
dos Celtas, entre os personagens que fazem parte de seus enredos encontram-se 
os mediadores vividos por fadas, que recebem a ajuda de talismãs e varinhas 
mágicas para realizar suas ações. E os opositores são representados por gigantes, 
bruxas e bruxos, feiticeiros, que interferem na vida e nas ações dos heróis e 
heroínas, dificultando seu caminho. Todos fazem parte das aventuras nas quais os 
heróis e heroínas são os personagens principais 
 
 
 
 Paz (1996) amplia a visão sobre os contos de fadas quando afirma que 
estes podem ser entendidos como parte de passagens iniciáticas. 
 Jung (2006) traz conceitos relevantes para o estudo dos contos de fadas. 
Este autor desenvolve o conceito de arquétipo, que é fundamental para o estudo dos 
contos de fadas, Jung afirma que os arquétipos que são conteúdos inconscientes 
que estão inseridos nos contos de fadas. 
 Jung (2006, p. 87) esclarece que “o arquétipo nada mais é do que uma 
expressão já existente na Antiguidade, sinônimo de ‘idéia’ no sentido platônico”. 
 Entende-se arquétipo como conteúdos que habitam no nosso inconsciente 
e que são como matrizes que geram nossos comportamentos. Herdamos as formas 
e não a idéia propriamente dita. Sendo assim, são as formas que compõe as idéias. 
Cada arquétipo apresenta vários aspectos distintos, o positivo e o negativo, 
respectivamente. 
 Giordano (2007) e Coelho (2003) escrevem sobre a trajetória dos contos, 
dando ênfase aos contadores de histórias e aos contos trazidos da cultura oral. 
Descrevem os conceitos de arquétipo, inconsciente coletivo, símbolos e mundo 
simbólico dos contos. Giordano conceitua o arquétipo enquanto Potencialidades 
Psíquicas que habitam no inconsciente coletivo. Esta autora ainda afirma que os 
arquétipos são universais, todos os humanos herdam as mesmas imagens sendo 
que, de acordo com nossas vivências, ampliamos estas imagens arquetípicas que 
recebemos. 
 Giordano (2007) assegura ainda que há uma predisposição arquetípica 
para desempenhar papéis como mães e filhos, entre tantos outros papéis que 
desempenhamos nas nossas vidas, e que impulsionados pelos arquétipos, é que 
agimos de diferentes maneiras frente as mais diversas situações, pois, herdamos o 
potencial para a experimentação dos diferentes papéis sociais. 
Neumann (1974) permite analisar a bruxa como a Grande Mãe, vista sob 
sua face negativa, a mãe perversa, destrutiva. Discursa sobre o arquétipo da Grande 
Mãe, enfocando os diferentes aspectos do seu pólo positivo e negativo. Acrescenta 
novos conceitos sobre o arquétipo aos já existentes. Este autor assegura que o 
 
 
 
arquétipo da Grande Mãe, pode ser observado ao longo do percurso da 
humanidade, estando presente em ritos e mitos. 
 Este autor exemplifica os dois pólos da personagem. Coloca que no conto 
de João e Maria, a casinha de pão-de-ló, decorada com chocolate, esconde uma 
devoradora de crianças, a bruxa, o pólo negativo da Grande Mãe. 
 Neumann (1974) faz relação entre os conceitos de Grande Mãe e Grande 
Feminino, definindo o Feminino como “princípio criativo”, representando a totalidade 
de onde a vida surge. Esclarece que a Grande Mãe não é somente a mãe 
provedora, mas também aquela que traz a morte. Esta morte não é, 
necessariamente, a morte física, podendo significar a morte de uma etapa da vida, 
para o nascimento ou surgimento de uma nova fase. Portanto, momentos de 
transformações. 
 A Grande Mãe é representada como aquela que nutre, no seu aspecto 
positivo, e vista como a que abandona, a mulher perversa e má, em seu aspecto 
negativo. E é este aspecto da Grande Mãe que é geralmente associado ao símbolo 
da bruxa. 
 O símbolo da Mãe, segundo Chevalier e Gheerbrant (2006), adquire valor 
arquetípico, apresentando dois aspectos distintos. Um construtivo e outro destrutivo. 
Ao considerar os aspectos positivos, essenciais para a existência humana, encontra-
se o nutrir, a proteção, o alimentar, dar segurança, aquecer, que estão intimamente 
ligados ao Grande Feminino e a Grande Mãe, assegurando à criança os conteúdos 
positivos do relacionamento. As rupturas e cisões também pertencem ao símbolo 
Grande Mãe, no seu aspecto de mãe terrível e má, representado pela bruxa, a mãe 
diabólica, a velha sábia. A bruxa, sendo mulher, relaciona-se à imagem arquetípica 
da Grande Mãe vivenciada desta maneira nos contos de fadas. 
 Chevalier e Gheerbrant (2006, p. XXV) esclarecem que “o símbolo é 
sempre pluridimensional, sendo susceptível de um número infinito de dimensões”. 
Os símbolos só existem para uma pessoa, uma comunidade ou mesmo para um 
grupo, na medida em que possam ser identificados de alguma maneira. 
 
 
 
 A bruxa, nesta pesquisa, também é vista sob olhar dos historiadores, 
que tem pontos de vista divergentes dos autores que a enfocam sob o prisma da 
Psicologia Analítica. 
 Darnton (1986) acredita que contos são documentos históricos, os 
quais sofreram as transformações das diferentes tradiçõesculturais. Considera, 
portanto, que os contos retratam fatos reais. Desta forma, o autor vê os contos como 
documentos que possibilitam conhecer melhor os camponeses e como viviam no 
século XVIII. 
 Nogueira (2004) afirma que os poderes mágicos e a magia, 
existentes nos contos, fazem parte do imaginário popular e visam satisfazer a psique 
coletiva, em seus desejos, anseios, e necessidades. Seus estudos são baseados em 
fatos históricos, buscam analisar a bruxa e a caça às bruxas. Esta conceituação é 
valiosa, favorecendo desta maneira, relacionar e analisar a figura “bruxa” pelo viés 
da história cultural. Ainda coloca a importância que teve a Igreja em relação ao 
movimento da caça às bruxas. 
 Clark (2006) apresenta a bruxa como “modelo” antifeminino, juntamente 
com o símbolo de mãe má. Não obstante, a bruxa é segregada por sua comunidade. 
Afinal, expressam o ponto negro social no suposto quadro branco da comunidade. 
Esta dicotomia preserva as relações de poder então estabelecidas para manter a 
ordem vigente. Este autor é da opinião de que a caça às bruxas refletiu também uma 
caça às mulheres. O uso do conceito de bruxaria como foco permitiu que se 
alcançassem outros objetivos, como a opressão desta mulher e seu controle social. 
 A Arteterapia, que dará base para a interpretação dos contos e à sua real 
contribuição para a formação da personalidade das crianças, é neste trabalho 
representada por Ostrower (2004), que conceitua criatividade e processo criativo, e 
Byington, que esclarece sobre o desenvolvimento da personalidade das crianças 
sob o enfoque da Psicologia Junguiana. O autor afirma que o desenvolvimento da 
personalidade percorre ciclos, iniciando com o matriarcal, patriarcal, alteridade e 
cósmico, sendo que, em cada um deles, existem dinamismos diferentes que os 
diferenciam. Nesta pesquisa, porém, nos deteremos somente nos dois primeiros 
ciclos. 
 
 
 
 Ostrower (2004) acredita que a criatividade na criança é vivida na sua 
totalidade Faz parte integrante de sua vida, surge em diferentes situações, nas 
brincadeiras, no faz-de-conta, nos sonhos, para que a criança aprenda e controle as 
diferentes situações da vida. Assegura que, para criar, há necessidade de se 
integrar os novos conhecimentos significativos às nossas vivências e poder, de 
alguma, maneira transmiti-los aos outros. 
 A interpretação dos contos será embasada nos conceitos trabalhados por 
Bonaventure (1992), e Chevalier e Gheerbrant (2006), que apresentam os 
simbolismos que podem-se relacionar a diferentes elementos encontrados nos 
enredos dos contos de fadas, como por exemplo, os diferentes significados da torre , 
da madrasta e das florestas. 
 Pain e Jureau (2001) acreditam que a imagem pode ser definida como 
representação mental e esta é construída na sua totalidade. Sua criação não 
acontece em partes separadas, portanto, é um todo que se transforma em resultado. 
É frágil, surge como objeto ou a figura, sendo construída a partir de algum 
conhecimento. Continuamente, são feitas análises e sínteses. Criar imagens é, 
portanto, um processo. 
 As entrevistas e os depoimentos desta pesquisa baseiam-se nas leituras 
da história oral, que asseguram que as informações colhidas oralmente e os estudos 
acadêmicos podem ter divergências, pois se estruturam de maneiras diferentes. Os 
trabalhos acadêmicos devem ser entendidos como uma narrativa que é estruturada 
pela linguagem do discurso acadêmico. Não podemos nivelar os depoimentos orais 
a estes escritos. Os depoimentos orais devem ser ouvidos e entendidos no seu 
contexto, isso porque recebem sempre a influência cultural. 
 Ao final desta dissertação ter- se -a material suficiente para, então, 
analisar e concluir a construção de um novo discurso sobre a bruxa, pois, a 
personagem terá sido vista de maneira ampla e abrangente nos seus diferentes 
aspectos e sob o ponto de vista de diversos autores. 
 
 
 
 
 
D - Corpus 
Estudo de caso - A representação da bruxa 
 
 O estudo de caso será realizado em uma pré-escola situada no bairro de 
Higienópolis, em São Paulo. A escola é pequena e possui, no máximo, dez crianças 
por sala, sob a orientação de uma professora. A escola atende crianças desde a 
faixa etária referente ao berçário, com bebês a partir de 4 meses, até crianças com 6 
anos completos. 
 As crianças são separadas em salas, tendo como critério a faixa etária e o 
desenvolvimento cognitivo. Esta escola atende uma população de classe média, 
cujos pais trabalham fora durante o dia e, desta forma, muitas crianças permanecem 
na escola em período integral. 
 A intervenção consta da representação da bruxa através de desenhos 
realizados pelas crianças e adultos da escola, a partir da narração dos contos e dos 
depoimentos gravados sobre a visão que fazem da bruxa. 
 As crianças do Jardim I, que estão com 4 anos, as do Jardim II, com 5 
anos, e as do Pré, com 6 anos, perfazem um total de 16 crianças. Todas suas 
professoras apresentam formação acadêmica. 
 As professoras farão parte desta pesquisa para que, ao final, possamos 
ter a visão da criança e do adulto em relação à bruxa nos contos de fadas 
 As crianças do Jardim I, ainda não alfabetizadas somente escutarão o 
conto e, posteriormente, farão uma representação através do desenho. As crianças 
do Jardim II, que já escrevem um pouco, poderão escrever uma palavra que defina a 
bruxa e também farão o desenho. As crianças do Pré, por já estarem alfabetizadas, 
escreverão uma frase sobre a bruxa, além de fazerem o desenho. 
 Para a realização do desenho, as crianças terão à disposição folhas de 
Papel Canson A4 e giz de cera ou lápis de cor. Todos os desenhos serão 
 
 
 
identificados com o nome da criança ou adulto e com o nome do conto ouvido, para 
que se possa, posteriormente, relacioná-los aos depoimentos sobre a bruxa. 
 No depoimento individual sobre a bruxa constará perguntas que serão 
gravadas. Este depoimento terá o objetivo de analisar o que as crianças e os adultos 
verbalizam sobre a bruxa, como a descrevem, seus sentimentos em relação à 
personagem e se esta fala difere do desenho realizado. 
 A cada encontro serão tiradas fotos das etapas do trabalho. Elas serão 
anexadas à dissertação. 
Foram escolhidos os contos da coletânea Contos e Lendas, dos Irmãos 
Grimm (1962). Estes contos são João e Maria, Branca de Neve e Rapunzel. As 
versões utilizadas serão as antigas, e não as atualizadas. 
 Estes contos foram escolhidos por apresentarem a personagem da bruxa 
através de diferentes formas de ações. Em João e Maria, pode-se observar a bruxa 
que mora na casa de chocolate, mas também a postura da madrasta pode ser 
entendida como a de uma bruxa. Em Branca de Neve, pode-se observar a 
transformação da rainha invejosa em bruxa, que busca retirar a vida da jovem para 
continuar sendo a mais bela. Já em Rapunzel, a bruxa age contra os pais da 
menina, contra a própria Rapunzel e contra o príncipe. 
 Sendo assim, os contos escolhidos mostram a figura da bruxa nos seus 
diferentes aspectos, o que possibilita aos ouvintes percebê-la também de várias 
maneiras, Outro motivo que levou a escolha destes contos para integrarem a 
pesquisa é que são contos de uma coletânea que apresenta uma versão dos anos 
60, sem muitas mudanças. 
 Os três contos escolhidos serão narrados às crianças na faixa etária de 4 
a 6 anos e, para os adultos, objetivando verificar a pertinência ou não de certas 
características da figura bruxa nos desenhos representados pelas crianças e pelos 
adultos na contemporaneidade. Observando-se, portanto, nos adultos, o que ainda 
permanece no seu imaginário e, nas crianças, como elas constroem a figura da 
bruxa. 
 
 
 
Ao finalizar esta intervenção, pode-se analisar como os integrantes desta 
pesquisa idealizam esta personagem,quais suas características, como se constrói 
esta figura no imaginário tanto de crianças quanto de adultos. 
Desta forma, teremos ao todo três desenhos de cada participante da 
pesquisa, podendo, portanto, analisar como esta personagem é vista na atualidade, 
visto que uma das questões levantadas é que antigamente esta personagem 
causava medo, era temida e assustadora. Já nos nossos dias, parece-nos que esta 
personagem é vista pelas crianças não mais como portadora do mal, que assusta e 
amedronta, mas sim como portadora de conhecimentos que podem ajudar. 
 
 
 
CAPÍTULO I 
 
CONTOS NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE 
 
 Von Franz comenta que Platão faz referências sobre o contar histórias, 
afirma “... que as mulheres mais velhas contavam às suas crianças histórias 
simbólicas denominadas – mythoi” (1990, p. 11). Isso demonstra que, desde muito 
tempo, os contos de fadas são vinculados à educação das crianças. 
 Ainda cita que, na Antiguidade, Apuleio1, escritor e filósofo do século II 
d.C. escreveu uma novela famosa : O asno de ouro. Uma narrativa em prosa com 11 
livros, denominada inicialmente Metamorfoses. Essa obra narra as aventuras do 
jovem Lúcio que, para se transformar em pássaro, unta-se de um unguento mágico. 
Mas, em função do uso equivocado do unguento, vê-se transformado em asno. 
Depois de uma série de aventuras extraordinárias, ele recupera a forma humana 
graças à intervenção de Ísis. 
 Desta coletânea, o único romance da Antigüidade a chegar intacto aos 
nossos dias é Amor e Psique. Esta história pode ser interpretada como uma alegoria 
da união mística, relacionando cenas grotescas e obscenas. 
 Interaja com este mito: 
 
1Apuléio - Lucius Apuleius (125 - 164) - nasceu em Madaura, na Numídia (hoje Argélia) no ano de 
125. Educado em Cartago e Atenas, viajou pelo Mediterrâneo, estudando ritos de iniciação e cultos. 
Profundo conhecedor de autores gregos e latinos, ensinou retórica em Roma antes de regressar à 
África para casar-se com uma rica viúva. Em virtude da oposição da família da noiva ao casamento, 
escreveu a obra Apologia (173), uma espécie de autobiografia, em que se defende da acusação da 
prática de magia. Escreveu ainda diversos poemas e tratados, entre os quais Florida, Coletânea de 
trabalhos de eloqüência. A sua obra mais conhecida é O asno de ouro. 
<http:// www.mundocultural.com.br/literatura1/latina/apuleio.htm - 4> 
 
 
 
 
 
Psique era a mais nova de três filhas de um rei de Mileto e era 
extremamente bela. Sua beleza era tanta que pessoas de várias regiões 
iam admirá-la, assombrados, rendendo-lhe homenagens que só eram 
devidas à própria Afrodite. Afrodite enviou seu filho, Eros, para fazê-la 
apaixonar-se pelo homem mais feio e vil de toda a terra. Porém, ao ver sua 
beleza, Eros apaixonou-se profundamente Psique continuava só. Seus pais 
procuram um oráculo que disse que deviam levar Psique ao cume de uma 
montanha e lá surgiria seu marido, uma terrível serpente, e assim ocorreu. 
Ao chegar a montanha Psique sentou e sentiu muito sono adormecendo, ao 
acordar se viu num lindo lugar onde foi levada a um castelo escuro lá , na 
escuridão encontrou seu marido. Sendo alertada que nunca o poderia ver. 
Ao amanhecer o marido não se encontrava lá, sendo assim por muito 
tempo. Com saudades de suas irmãs, pediu permissão para visitá-las, 
recebendo a permissão do marido, mas ao contar às irmãs que era muito 
feliz mas, que nunca vira seu marido foi instigada por elas para vê- lo. 
Voltando ao castelo, com uma lamparina tentou vê-lo, viu ao seu lado um 
lindo jovem, mas Eros acorda com um pingo de óleo que caiu da lamparina. 
Afirmou que o amor não sobrevive às suspeitas e a abandona. Para 
recuperar o amor de Eros que realizar três provas e somente depois disto 
foi realmente feliz.2 
 
 Esta história assemelha-se à conhecida A Bela e a fera. O enredo relata 
a história de uma jovem que é obrigada a viver em um castelo, convivendo com um 
príncipe transformado em fera. Ela aprende a amá-lo, valorizando sua beleza 
interior. Quando o feitiço é quebrado através do beijo entre ambos, “Fera” 
transforma-se em príncipe novamente. 
 É possível observar a similaridade entre estes contos e outros, ainda da 
atualidade, encontrados na Rússia, Suécia e Noruega. Este tipo de conto, pontuado 
por transformações, se refere à figura feminina enquanto personagem que através 
do seu amor redime seu amado. Existe, aproximadamente, há mais de 2.000 anos, 
mantendo-se praticamente inalterado em seu conteúdo até os dias de hoje. 
 Von Franz (1990), a respeito da trajetória dos contos de fadas, cita 
documentos como as colunas de papiros egípcios que os descrevem. Um dos mais 
célebres, por exemplo, é o conto sobre a história de dois irmãos Anúbis e Bata, que 
relata as desavenças entre dois irmãos, projetadas na dupla de deuses. Eles 
constantemente brigam entre si, mas dependem um do outro. 
 Observa-se, então, que os temas básicos dos contos permanecem muito 
semelhantes entre si. Outra informação que von Franz fornece é sobre a teoria do 
 
2
 Disponível em: <http://www.angelfire.com/la/psique/mito.html> 
 
 
 
padre W. Schimidt, segundo a qual os temas dos principais contos permanecem 
inalterados desde aproximadamente 25.000 anos a.C. 
 Nos séculos XVII e XVIII, os contos eram dirigidos para crianças e 
adultos, sendo a narração de histórias uma prática permanente nos centros de 
civilização primitiva. 
 Vale elucidar que “[...] o contar histórias era tido como uma espécie de 
ocupação espiritual essencial sendo até chamado de: ‘filosofia da roda de fiar’ - 
Rocken Philosophie.” (VON FRANZ, 1990, p. 12) 
 Herder, um estudioso do século XVIII, afirmava que estes contos 
continham lembranças de crenças já enterradas e que eram expressas através de 
seus símbolos. Eram reminiscências de uma sabedoria ou fé, isto é, a busca de algo 
que melhor satisfizesse os ensinamentos dados às crianças pelo Cristianismo, uma 
nova aspiração vital. (id., ibid) 
 Os irmãos Grimm (apud VON FRANZ, 1990), integrantes da escola 
romântica alemã, investigaram os contos folclóricos. Segundo Giordano (2007), 
Folclore é a palavra que designa “conjunto de tradições” e de conhecimentos que 
pertencem a uma sociedade. É, portanto, uma herança social transmitida pelos 
diferentes participantes das comunidades, independentemente de onde habitem. 
 Giordano esclarece que a palavra Folclore surgiu pela primeira vez em 
Londres, na revista Ateneu, em 22 de Agosto de 1846, tendo sido criada pelo 
arqueólogo inglês Willian John Thomas. Esta palavra se compõe da junção de dois 
vocábulos folk, que significa povo, e lori cujo significado é sabedoria. 
 Os irmãos Grimm escreveram contos sem mudar as histórias contadas 
pelos camponeses e pessoas dos arredores. Porém, não resistiram à tentação de 
misturar elementos fantasiosos em algumas versões. Cautelosos, mediante alguma 
modificação no original do conto, explicavam-na nas notas de rodapé de página. 
Eles “não conseguiam deixar coisas ou fatos desconexos, vazios, como os 
paradoxos aparecerem” afirma von Franz (1990, p. 14). A coletânea dos Irmãos 
Grimm nasce com muito sucesso, sendo que existiram várias edições. 
 
 
 
 Surge Perrault na França, ressaltando que em todos os países as 
pessoas começaram a colecionar os contos de fadas locais. Os estudiosos 
identificavam, admirados, a quantidade de temas que se assemelhavam e que se 
repetiam. Um tema presente na França era também encontrado, com algumas 
variações, na Rússia ou na Itália. (VON FRANZ, 1990) 
 Para explicar este fenômeno, os irmãos Grimm usaram a seguinte 
metáfora: “Contos são como cristais, que quando quebrados, espalham seus 
fragmentos pelagrama”. (apud VON FRANZ, 1990, p. 14) 
 Paralelamente aos irmãos Grimm, surgiu uma linha de pensamento que 
considerava que os mitos expressavam, simbolicamente, as realizações e os 
pensamentos filosóficos mais profundos. Nesse sentido, pode-se ver como um 
“ensinamento místico de algumas das verdades mais profundas da relação de Deus 
e o mundo”. (id., ibid.) 
 O interesse em verificar o que causava a repetição e a semelhança entre 
os temas conquistou expressão histórica e enfoque científico. A pesquisa foi 
direcionada para a descoberta dos originais e de suas migrações, pois não havia, 
até então, estudos sobre o inconsciente coletivo e a psique. Alguns acreditavam 
que os contos eram, em sua maioria, originários da Índia ou até da Babilônia. De lá, 
migravam para toda a Europa. Outros acreditavam que esses fossem oriundos da 
Ásia Menor, centro de origem dos contos, e assim algumas teorias se 
desenvolveram sobre as possíveis migrações. (VON FRANZ, 1990) 
A autora enfatiza que o Centro Folclórico buscava analisar a teoria das 
migrações. Vários estudiosos chegaram à conclusão que os contos não poderiam ter 
sua origem em um só país. Eles acreditavam que diferentes contos surgiam em 
diversos locais. A partir desta teoria, surgiram coletâneas agregando contos do 
mesmo tipo, acreditando-se que a melhor das versões, a mais rica, ou a mais 
poética, seria a geradora dos demais. 
 Von Franz (1990) declara sua posição sobre o pensar em relação aos 
contos: alguns migram e se desintegram e outros recebem valor agregado. No 
percurso da história dos contos, a autora assegura que no século XVIII outras 
pesquisas foram feitas. Surge Ludwig Laistner que escreveu em Berlim Das Ratsel 
 
 
 
der Sphinx, em 1889. Este autor defendia a hipótese que os temas básicos, tanto 
dos contos de fadas, como dos folclóricos, derivam de sonhos. Faz a relação entre 
os temas repetidos de sonhos típicos, aqueles que são comuns às pessoas em 
diferentes fases da vida, como sonhos de se casar, ter filhos, e os temas folclóricos. 
 Para Bastain3, os temas mitológicos são denominados de “pensamentos 
elementares” (apud VON FRANZ, 1990, p. 17) da espécie humana. Esta, possui um 
estoque de Elementargedanken, os quais não migram, são congênitos a cada 
indivíduo. Estes “pensamentos elementares” aparecem com variações geográficas 
na Índia, Babilônia, por exemplo, o que denominou como “Histórias Especificas”. 
Tais idéias se aproximam muito das de Jung sobre o arquétipo e imagem 
arquetípica, conforme explica von Franz. 
 Segundo Jung, 
 
[...] o arquétipo é a disposição estrutural básica para produzir certa narração 
mítica e a imagem específica sob a qual os arquétipos acabam de uma 
forma recebendo então o nome de Imagens arquetípicas. ( id., ibid.) 
 
 Bastian acreditava que “os pensamentos elementares” refletiam um fator 
hipotético, o que significa que não poderiam ser vistos. Mas, ao deparar com 
“pensamentos nacionais” semelhantes, tem-se indício da existência de um 
pensamento básico que está subjacente a estes. (id, ibid.) 
 A Escola Literária visava investigar os contos sob o ponto de vista 
estritamente formal. “Faz a distinção entre os vários contos: mitos, lendas, histórias 
cômicas, histórias com animais e histórias jocosas, e o que se denomina de contos 
de fadas clássicas” (id., p. 18). Estes contos são os de autoria de Perrault, Grimm e 
Andersen, que transcrevem os contos da tradição oral de suas comunidades, 
 
3
 Antropólogo alemão, Adolf Bastian (1826-1905), abria o campo da experiência da datação dos mitos 
para distinguir duas importantes concepções da esfera mitológica. Obsessivo historiador dos 
costumes de cada povo, experimentado e curioso explorador, Bastian, dentro das longas viagens que 
fez, desenvolveu a teoria das "idéais elementares" (Elementargedanke), em contrapartida as "idéias 
étnicas ou culturais" (Volkergedanke). 
Disponível em: <http://www.symbolon.com.br/artigos/papainoel.htm> 
 
 
 
 
mantendo suas singularidades. Estes estudos foram importantes e denotaram as 
diferenças existentes entre os heróis dos contos de fadas, que podem ser definidos 
como aqueles que salvam, matam e não têm medos. Agem sem demonstrar seus 
sentimentos, são reações que seguem os mesmos padrões em diferentes contos. 
Nas lendas e sagas, o herói já demonstra seus sentimentos. (VON FRANZ, 1990) 
 Os contos de fadas foram estudados por etnólogos, antropólogos e 
especialistas em mitologia e histórias das religiões, o que permitiu ampliação poética 
e cientifica sobre o assunto em pauta. 
 A trajetória realizada sobre os contos de fadas permite observar os 
diferentes enfoques sobre seus significados. Von Franz conclui que os estudiosos, 
aos poucos, começaram a notar as semelhanças entre os temas, os motivos 
simbólicos contidos nos contos e a semelhança nas ações dos personagens. Com o 
avanço da Psicologia, percebeu - se o quanto os contos possibilitam o conhecimento 
das estruturas mentais, emocionais e sociais dos indivíduos. 
 Jung, ao estudar os mitos, percebeu que os contos de fadas também 
continham ensinamentos vindos da sabedoria popular. Em suas pesquisas sobre os 
arquétipos, constatou-os presentes em mitos e em contos de fadas. 
 Uma definição interessante sobre os contos coloca que “os contos de 
fadas são as expressões mais pura e mais simples dos processos psíquicos do 
inconsciente coletivo”. (VON FRANZ, 1990, p. 9) 
 A autora comenta o motivo que Jung e a Psicologia Junguiana têm para 
estudar os contos. Deve-se ao fato de ser “nos contos onde melhor se pode estudar 
a anatomia comparada da psique” (JUNG apud VON FRANZ, 1990, p. 25), pois nos 
contos existe um material cultural que tem suas raízes no imaginário da psique 
coletiva, possibilitando a criação de imagens diferenciadas. Conseqüentemente, eles 
oferecem uma imagem mais clara das estruturas psíquicas. Já nos mitos e lendas, 
ou outro material mais elaborado, temos as estruturas básicas da psique através de 
uma grande quantidade de material cultural. 
 Silveira (2000) sugere tratar-se uma maneira de lidar com vários dramas 
que temos durante as diferentes etapas de nossas vidas. Ela ressalta que estes 
 
 
 
elementos trazidos nos contos são comuns a todos os homens, tendo sua origem 
nas profundas camadas do inconsciente, comuns a pisque de todos os seres 
humanos e pertencentes ao mundo dos arquétipos. Por este motivo é que os 
mesmos temas aparecem em contos de países distantes, em diferentes épocas e 
com muito pouca variação. 
 Von Franz (1985) afirma que as tendências inatas, os arquétipos que 
encontram-se nos contos, podem ser influenciados pelas civilizações nas quais se 
originaram. O conto se origina de uma história, tendo um núcleo que é formado a 
partir de um sonho. Este revela um ou mais arquétipos da sociedade em que se 
encontra. Observa-se, assim, a permanência dos arquétipos. 
 Apesar das ramificações de contos europeus e africanos, percebe-se a 
inter-relação entre eles, isso porque, os contos de fadas podem migrar de um lugar 
ao outro com maior facilidade. Apresentam uma estrutura simples e básica, o que 
lhe permite fazer sentido para qualquer pessoa. (VON FRANZ, 1985) 
 Segundo Silveira, para Jung: 
 
Mitos e contos de fadas dão expressão aos processos inconscientes e sua 
narração provoca revitalização destes processos, restabelecendo a conexão 
do consciente ao inconsciente (JUNG apud SILVEIRA, 2006 p.105) 
 
 Isso acontece quando se escuta ou se lê um conto. É este o motivo pelo 
qual as crianças solicitam para que lhes contem várias vezes os mesmos contos. 
Enquanto não vêem soluções para suas dificuldades, buscam no conto a resposta 
para seus conflitos. 
 Jung define arquétipo: 
 
[...] o arquétipo representa essencialmenteum conteúdo inconsciente, o 
qual se modifica através de sua conscientização e percepção, assumindo 
matizes que variam de acordo com a consciência individual na qual se 
manifesta (JUNG, 2006, p. 17 ) 
 O autor expõe que, além do arquétipo ser um pensamento padrão e estar 
interligado a outros, é também uma experiência emocional que pertence a um 
 
 
 
indivíduo. Quando adquire valor emocional e afetivo, pode ter vida. Jung defende 
que não há significado em copilarmos os temas, as Grandes Mães, os santos. Só 
há significado em algo quando existe, junto a ele, uma experiência afetiva. (apud 
VON FRANZ, 1990). 
 Os arquétipos são contaminados uns pelos outros no inconsciente. São 
representações simultâneas que lá estão, e quando o consciente dá atenção a um 
deles é como se um foco de luz fosse projetado nele, realçando-o neste momento 
(id., ibid.). Este conceito é muito importante ao estudar-se os contos. 
 Pode-se verificar quando o arquétipo foi focalizado por um ou outro 
indivíduo. Isso acontece de acordo com o momento de vida e com a percepção 
deste momento específico. 
 É importante perceber que cada indivíduo, a seu modo, irá contribuir para 
a interpretação do conto. Selecionará um ou outro aspecto para validá-la. 
Observará a maneira com que os contos se conectam. Frente a uma visão racional, 
talvez se encontrem explicações baseadas na hierarquia de valores expressos no 
conteúdo do texto. Outros leitores observarão os símbolos neles contidos e suas 
possíveis ampliações. Outros ainda tenderão a ver os elementos em sua totalidade, 
ao invés de mensagens fragmentadas, cujo conjunto representa uma interpretação 
de casualidade entre as ações e os resultados obtidos. 
 
 
1.1. As primeiras coletâneas e as origens dos contos de fadas 
 
 A primeira coletânea de contos infantis surgiu na França, no reinado de 
Luís XVI, Contos para Mãe Gansa. Esta coletânea tem autoria de Perrault 
apresentando o total de oito contos recolhidos dos relatos da população. São eles: A 
Bela Adormecida no Bosque, Chapeuzinho Vermelho, O Barba Azul, O Gato de 
Botas, As Fadas, Cinderela ou A Gata Borralheira, Henrique do Topete, e O 
 
 
 
Pequeno Polegar. Numa próxima edição foram acrescentados os contos Pele de 
Asno, Griselidis, e Desejos Ridículos. (COELHO, 2003) 
 Coelho (2003) assegura que Perrault foi o primeiro escritor a fazer uma 
coletânea. Pode-se dizer que a literatura infantil surgiu na Alemanha, século XVIII, 
tendo como objetivo a pesquisa da língua alemã. No país também surgiram os 
Irmãos Grimm. A partir do trabalho deles, a literatura infantil começou a se expandir 
pela Europa e Américas. 
 Os irmãos Grimm tentavam buscar as raízes de sua língua. Os objetos de 
estudo preferenciais destes autores eram os mitos, lendas e sagas que 
permaneceram vivos na tradição popular, por serem transmitidos de geração a 
geração. Nos textos que usavam para seus estudos lingüísticos, encontravam-se os 
contos, trazidos pela cultura popular: Os Contos de Grimm, nesta coleção 
receberam o nome de “Contos de Fadas para Crianças e Adultos”. (id., ibid.) 
 As histórias mais conhecidas, tais como A Bela Adormecida, Branca de 
Neve e os Sete Anões, Chapeuzinho Vermelho, A Gata Borralheira, O Ganso de 
Ouro, Os Sete Corvos, Os Músicos de Bremen, A Guardadora de Gansos, 
Joãozinho e Maria, O Pequeno Polegar, As Três Fiandeiras, O Príncipe Sapo, entre 
outros, foram publicadas como contos avulsos, entre os anos de 1812 a 1822. Na 
segunda edição, os Irmãos Grimm retiraram alguns episódios que continham fatos 
cruéis e aqueles que envolviam as crianças. (id., p. 23) 
 Décadas depois dos Irmãos Grimm, surgiu, no início do romantismo, 
Andersen, dinamarquês que publicou seus 187 contos de 1835 até 1877, 
denominado Eventyr. Andersen era um homem ligado aos valores cristãos e tinha os 
mesmos ideais românticos, acreditando nos valores populares. Sensível, torna-se o 
primeiro escritor a escrever para o público infantil. Sua linguagem é singela e toca o 
coração das crianças. Seus contos transmitem sua visão do mundo, veiculando 
valores como bondade, lealdade e honestidade. Seus contos, em geral, são tristes e 
retratam um final nem sempre feliz, diante do egoísmo e da injustiça social. 
 Desta maneira, os contos de Andersen refletem, em seus conteúdos, os 
problemas religiosos de seu país. Estes não apresentam estrutura folclórica, mas 
 
 
 
são impregnados de problemas pessoais, a maioria deles vivenciados pelo autor. 
(VON FRANZ, 1985) 
 Andersen busca resgatar o folclore da Dinamarca. Ao mesmo tempo em 
que mostra as injustiças da sociedade, apresenta o caminho da religião como 
solução. Assim, procura passar às crianças padrões que acreditava serem os ideais 
para se alcançar o céu. Seus principais contos são O soldadinho de Chumbo, A 
pequena vendedora de fósforos, O rouxinol e o imperador, A roupa nova do 
imperador, João e Maria e A rainha da neve. (COELHO, 2003) 
 Andersen trazia em seus contos os valores ideológicos que prezava. 
Temos como exemplo os contos A pastora e Limpador de Chaminés, que mostram a 
defesa dos direitos iguais para todos, propondo a anulação das classes sociais. O 
patinho Feio e A pequena vendedora de fósforos demonstram a necessidade da 
valorização individual, através das qualidades de cada um. A aceitação é explicitada 
nos contos A Sereiazinha, O sapo e O pinheirinho. O Soldadinho de Chumbo e O 
homem da Neve apresentam os valores que envolvem a incerteza da vida. O 
Rouxinol e o Imperador discorre sobre os valores naturais em relação aos artificiais. 
E, finalmente, os contos Os Cisnes Selvagens e Os Sapatinhos Vermelhos mostram 
a necessidade de se incentivar a fraternidade, a caridade, a resignação e a 
paciência diante dos infortúnios da vida. (id., ibid.) 
 Coelho (2003) investiga algumas origens dos contos de fadas. Vale a 
pena relembrar Chapeuzinho Vermelho: 
 
Uma menina conhecida pelo apelido de Chapeuzinho Vermelho, que a 
pedido de sua mãe deve levar uns doces e sua avó. No caminho, 
desobedece a sua mãe e conversa com estranhos. Um lobo fica sabendo 
então que irá à casa da avó, a antecede, (em algumas versões come e avó 
e depois a menina). Ambas são salvas pelo caçador que passava. o 
caçador mata o lobo (em algumas versões são colocadas pedras na barriga 
do lobo que morre)4 
 
 Este conto existe em vários folclores pesquisados, mas não tem origem 
certa. Acredita-se que tenha sido originário do mito grego de Cronos. 
 
 
4
 *Nota da autora 
 
 
 
O mito nos fala sobre que a esposa de Urano era Gaia (a Terra) e que cada 
vez que Gaia tinha um filho, Urano o devolvia ao ventre de Gaia. Cansada 
disto, Gaia tramou com seu filho Cronos. Ela fez de seu próprio seio uma 
pedra em forma de âmina e a deu para Cronos. Cronos esperou que 
Urano, seu pai, dormisse e o castrou. Atirou a genitália de Urano no mar, de 
onde brotou Afrodite, a deusa do amor. Depois, Cronos reinou entre os 
deuses durante um período de prosperidade conhecido como Idade 
Dourada. Mas uma profecia dizia que ele seria enfim vencido por um filho 
seu. Assim, temendo uma revolta tal qual a sua, ele passou a devorar seus 
próprios filhos assim que nasciam. Até que a profecia se cumpriu, e Zeus, 
auxiliado por sua mãe, Réia, o destronou na guerra que ficaria conhecida 
como titanomaquia. Zeus libertou definitivamente seus irmãos e baniu os 
titãs paraTártaro.5 
 
 Esta mesma história é encontrada numa fábula latina do século XI, 
Fecunda Ratis. Ela conta sobre uma menina que usava um capuz vermelho, é 
devorada por lobos, e consegue escapar, enchendo a barriga do lobo com pedras. 
 A Bela Adormecida é conhecida numa coletânea que circulou pela Europa 
com um tema semelhante, cujo originalé datado do século XIII: O cavaleiro Troylus 
e a bela Zellandine. (COELHO, 2003) 
 Outro conto, cuja célula original vem de uma lenda da mitologia grega, é 
O Barba Azul. Sua origem seria a lenda do “Tesouro de Ixion”. (id., ibid.) 
 O conto Henrique do Topete, segundo o autor, é uma variante de A Bela e 
a Fera. Ambos teriam suas origens no conto oriental O príncipe porco e as três 
irmãs, no qual uma das irmãs é desencantada, se transformando numa bela jovem. 
Este mesmo tema aparece em Pantscahtantra. O príncipe serpente também sofre o 
processo de desencantamento. Esta lenda procede de Portugal e tem o nome de 
Nobitário do conde D. Pedro. Este é um bom exemplo de migração. Sua possível 
origem, o mito Psique e Cupido, de Apuléio. 
 Cinderela ou a Gata Borralheira tem sua origem em La Gata Ceneréntola, 
registrada por Basile, na qual existe uma moça feia que se transforma em bela. 
Ainda no folclore italiano, outra história apresenta o tema da transformação: O rei e 
seus três filhos. Neste conto, há uma princesa que aparece transformada em rã. (id. 
Ibid.) 
 
5
 Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cronos> 
 
 
 
 Coelho (2003) revela que as origens do Pequeno Polegar, conto que 
relata a história de uma família, já não são descritas com tamanha exatidão. Porém, 
o tema é visto em quase todos os folclores do mundo. A história conta a tradição 
milenar do nascimento de uma criança muito pequena que ajuda seus pais. 
Segundo Coelho (2003), há uma fusão de contos entre este, Joãozinho e Maria e 
ainda com a história que tem o nome de Crianças e feiticeira. 
 Em todos estes contos o cenário é muito semelhante: a floresta, onde 
crianças são abandonadas, um ogre que se alimenta de crianças, a troca de gorros 
e a bota de sete léguas. Este é um bom exemplo de como os contos se fundem e 
trazem temas semelhantes com sua migração de um local para outro. (COELHO, 
2003) 
 E, finalmente, o autor menciona o Gato de Botas, que tem origem incerta, 
embora conhecido nos folclores de diferentes localidades. Anteriormente a Perrault, 
Basile, em sua coletânea Conto dos Contos, datada do século XVI, na Itália, relata 
um conto cujo nome é Cogluso. Trata-se de um gato astuto, audacioso e sagaz, que 
consegue transformar um amo pobre em rico senhor da corte, casando-se com a 
princesa, da mesma maneira que acontece no conto Gato de Botas. O conto relata 
as experiências arriscadas de um gato astuto que, para agradar seu amo, busca 
soluções diferentes e audaciosas para os problemas existentes. Tais atitudes 
causam espanto entre os moradores da sua comunidade. Pode-se afirmar que os 
recursos por ele encontrados são criativos. 
 Por meio desses exemplos de contos conhecidos de geração em 
geração, pode-se constatar o quão antigos são e que se originam de mitos ou 
lendas vindas da Europa. Cabem, então, alguns questionamentos: Qual o motivo 
que faz com que sejam contados até a atualidade? Como, e porque, se perpetuam 
no tempo? 
 Em geral, os contos apresentam características comuns. Sua composição 
é mais simples e básica que seus elementos estruturais. Por isso, podem fazer 
sentido para qualquer pessoa. Apresentam uma linguagem que é compreendida por 
adultos e crianças. Entre as principais características pode-se observar: 
 
 
 
1. A presença do elemento fada, ser fantástico imaginário, embora alguns 
contos não revelem a sua presença. Pode-se dizer que é a presença do 
mediador entre o herói (ou heroína) e o objetivo a ser alcançado; 
2. A oposição bem e mal. É uma visão maniqueísta. Aquele que pratica o bem 
é bondoso na sua totalidade. Não existem dúvidas sobre a sua bondade. 
Aquele que pratica o mal é perverso em suas atitudes e incapaz de 
qualquer ação ponderada entre bem e mal. Frente a esta dualidade em 
constante guerra, o bem deverá ser o vencedor. 
3. A ambigüidade entre as personagens: bom e o mau; ou o personagem é 
muito bom ou ao contrário. São lindos ou muito feios. Os valores são 
absolutos, em essência, e seus opostos não coabitam uma mesma 
personagem. As personagens são divididas de acordo com o esteriótipo 
produzido pelos valores que carregam em suas ações. 
4. As provas ou desafios, que normalmente acontecem ao herói do conto, 
dificultam sua trajetória ao tentar atingir seus objetivos. 
5. Estereótipos: Em sua maioria as personagens do conto são dotadas de 
beleza, mesmo que pobres. Os opositores são feios. As princesas são 
lindas e meigas. As bruxas são feias, velhas e com verruga no nariz. 
6. Os elementos mágicos são aqueles que ajudam o herói. Como a varinha de 
condão ou poções mágicas, o caldeirão ou a vassoura, que ajudam a fazer 
o mal. 
7. O Final feliz, que corresponde à conquista do objetivo. (VON FRANZ, 1990) 
 Paz (1995) esclarece que os contos podem ser classificados de acordo 
com os temas que desenvolvem no seu enredo. Sendo assim, temos: 
 Ciclo arcaico – nele, encontram-se crianças abandonadas, que ficam a 
mercê de poderes do mal (da bruxa), crianças na casa do Ogro, espíritos que são 
aprisionados em garrafas, o rei e seus filhos, o animal que recupera forma humana. 
 
 
 
 Ciclo dos adormecidos – neste ciclo, encontram-se contos nos quais o 
príncipe é adormecido por magia e as princesas adormecem por feitiços. 
 Ciclo heróico – abrange contos onde existem lutas. A luta contra o 
dragão, a busca e o resgate, e as provas que levam ao casamento. 
 Bettelheim (1979) acrescenta que nos contos de fadas o mal é tão 
presente quanto o bem, sendo comum estarem inseridos sob forma de personagens 
e suas ações, pois estes também são onipresentes em nossas vidas. É a dualidade 
que possibilita à criança observar o problema existente e também a necessidade de 
resolvê-lo. 
 O mal está presente nos contos, sendo simbolizado pela poderosa bruxa, 
pelos gigantes maus ou, por exemplo, pela astuta rainha de Branca de Neve. As 
ações exercidas pelos detentores do mal prevalecem por um determinado período 
em destaque. Porém, no final da história, o mal será punido, mostrando à criança 
que a pessoa má quase sempre é perdedora. Fica claro que o conto sugere às 
crianças uma maneira de agir. Como podem lidar com seus sentimentos. Mostra-
lhes que existem, ao mesmo tempo, uma mãe boa, e uma madrasta má, que 
coabitam a mesma personagem. 
 
 
 
CAPÍTULO II 
 
OS CONTOS DE FADAS 
 
 Os contos de fadas trazem-nos de volta ao mundo maravilhoso da 
imaginação e da fantasia, onde vivem os reis, as rainhas, os príncipes, as princesas, 
as bruxas e as fadas. Além disso, os contos destacam em seus conteúdos o 
conhecimento sobre o comportamento humano, pois têm uma estrutura que reflete 
as diferentes formas atitudinais e traços que personificam o homem. Através deles, 
pode-se estudar as estruturas básicas do comportamento humano. Sua maior 
importância, como afirma von Franz (1990), está no fato de que os contos de fadas 
trazem em seus conteúdos mensagens, as quais são importantes tanto para as 
crianças que os lêem ou escutam, como para os adultos. 
 Os conteúdos dos contos de fadas vão se conectar com o nosso 
inconsciente, ao mostrarem, em seus enredos, situações comuns ao nosso 
cotidiano. Por vezes, falam de problemas e também das situações agradáveis que 
podem se assemelhar ao nosso dia-a-dia. As soluções destes problemas ou 
dificuldades nos são mostradas através das ações dos seus heróis. 
 Von Franz (1985) contextualiza que antigamente os contos de fadas não 
eram destinados às crianças, e sim aos adultos das classes inferiores da população, 
como lenhadores e camponeses. Conta-se que enquanto as mulheres fiavam, 
ouviam contos. A autora relata ainda que, em alguns locais, existiam profissionais 
contadores de contos, que eram convidados a contá-los e a repeti-los,se 
necessário. Essas atividades eram herdadas ou aprendidas, caracterizando-se como 
uma tradição cultural. 
 Os contos conquistavam valor. Havia uma tradição oral que os mantinham 
sempre no imaginário das crianças e dos adultos. Ao mesmo tempo em que revelam 
uma forma de entreterem adultos e crianças, trazem ensinamentos através de seus 
conteúdos simbólicos, o que aumenta sua importância. Portanto, expressam 
 
 
 
aspectos da sabedoria popular, passados de geração a geração. (VON FRANZ, 
1990) 
Von Franz afirma que, para Jung, “o conto de fadas é, em si mesmo, a 
sua melhor explicação. Seu significado está contido na totalidade dos temas que 
ligam o fio da história”. (apud VON FRANZ, 1990, p. 9). 
 Os temas encontrados nos contos de fadas são temas comuns a toda 
humanidade. Contam histórias de famílias, de pais e mães, relacionadas aos medos, 
às madrastas, aos ricos e pobres. 
 Bettelheim (1979) afirma que nos contos de fadas, os personagens são 
muito parecidos com os homens, mas se diferem destes pois não têm um nome 
próprio. As citações se apresentam como: “um certo rei...”, “uma moça que...” ou 
então “o rei tinha três filhos”, “seu filho mais velho...” E quando, porventura, estes 
personagens têm nomes próprios, eles são os mais comuns, como Maria ou João. 
Da mesma forma, fadas e bruxas também não têm nomes próprios. Isso acontece 
para que a identificação com as personagens flua com maior facilidade. 
 Os personagens têm vida e características próprias. Cabe refletir que os 
indivíduos que os habitam nos contos atravessam o tempo da história, que são 
finitos. O indivíduo morre. O personagem se mantém vivo. Logo, a personagem tem 
prioridade ao individuo, em se tratando de contos de fadas. O indivíduo não constrói 
um diferencial com relação à personagem. Esta possui vida e lugar próprios. É 
diferenciada por si só. Cada personagem é eterna no conto de fadas, pois nos 
contos sempre encontramos rainhas, reis, príncipes e princesas, além de bruxas e 
fadas. Assim, podemos pensar que esta possibilidade, de ser eterno e com 
características próprias, é um elemento essencial para que os contos existam até os 
dias atuais. 
 Assim, as personagens ganham vitalidade para atravessar a linha do 
tempo em que transita a humanidade. Por exemplo, o rei quando falece deixa o 
trono para que outro indivíduo possa ocupá-lo. Quem morre não é o rei, mas sim o 
humano que exercia o reinado. A função rei permanece viva no imaginário histórico. 
Surge a indagação: quem será o próximo rei? 
 
 
 
 Observa-se que a identificação entre personagem e indivíduo encontra-se 
facilitada. Trata-se de representações arquetípicas de pais, mães e filhos. 
 Para Bettelheim (1979), os contos, ao lidarem com o imaginário, não 
iludem as crianças. Estes apenas colocam-nas em contato com diferentes emoções 
e dificuldades comuns à humanidade. 
 
 
2.1. João e Maria 
 
 Este conto encontra-se na Coleção Contos e Lendas, dos Irmãos Grimm, 
de junho 1962, volume I. Recebe, nesta edição, o nome de Joãozinho e Margarida. 
 Este conto relata a vida de um casal com dois filhos, vivendo numa 
época em que a fome era comum nas diferentes comunidades européias. Por este 
motivo, a madrasta e o pai das crianças decidem deixá-los abandonados na floresta. 
Esta foi a solução encontrada para sanar a falta de alimentos para a família. 
Joãozinho, por ter ouvido a conversa dos adultos, que decidiram abandoná-los na 
floresta, leva em seu bolso ao sair de casa, pedrinhas com as quais pretende marcar 
o caminho para retornar a casa. Com esta atitude, as crianças conseguem retornar 
para casa. 
 Mas a situação de falta de alimento persiste, e mais uma vez, são levados 
à floresta e, desta vez, João não encontra as pedrinhas e, por isso, leva pedaços de 
pão. As migalhas são comidas pelos pássaros, impedindo a volta das crianças para 
casa. 
Na floresta, buscam abrigo e, depois de algum tempo, encontram uma 
casinha de chocolate. Como estavam famintos, resolvem comer partes da casinha, 
que era de uma bruxa. Esta, logo vem ao encontro das crianças. A princípio, os 
cativa com boa alimentação e cama gostosa para dormirem. Mas, logo depois, 
prende Joãozinho em uma gaiola e faz Maria trabalhar para ela. A bruxa tem a 
 
 
 
intenção de comer as crianças e é enganada por elas no final da história. Maria 
empurra a bruxa no fogão e solta João. Depois, as crianças encontram um tesouro e 
voltam para casa com a ajuda de um pássaro. Encontram o pai sozinho e podem, 
então, viver tranqüilos e felizes. 
 No conto João e Maria, a madrasta e a bruxa apresentam características 
do pólo negativo da Grande Mãe. 
 Neumann (1974) afirma que muitas imagens simbólicas representam o 
arquétipo da Grande Mãe. Os arquétipos transitam entre os dois pólos: um negativo 
e outro positivo. Sendo um complementar ao outro. 
 Segundo Grinberg (2003), o arquétipo da Grande Mãe, no seu pólo 
positivo, apresenta a mãe como aquela que provém, alimenta e acolhe a criança. E 
o pólo negativo da Grande Mãe, manifesta-se através da mãe devoradora e terrível, 
que seduz, asfixia, abandona e aprisiona, quase sempre representada nas histórias 
como a personagem da bruxa ou da madrasta. 
 Grinberg (2003) esclarece que estas estruturas arquetípicas são sempre 
bipolares e, desta forma, apresentam aspectos que são criativos e estruturantes, ao 
lado dos aspectos negativos e destruidores. Mas estas polaridades não estão 
relacionadas às noções de bem e mal. 
 No conto João e Maria, a figura da mulher assume posturas também 
vividas pelas mulheres atuais. Uma delas é a função da mãe que, neste conto, é 
vivida pela madrasta. A outra função é a de filha, vivenciada pela Mariazinha. Toda 
mulher vive o arquétipo da Grande Mãe em fases distintas de sua vida. 
Primeiramente, vive este arquétipo como filha, quando é ainda bebê e é acolhida no 
colo e, posteriormente, o vive em outra fase, quando é já mãe que dá o colo aos 
seus filhos. Estes, em alguns momentos de suas vidas, podem sentir-se 
abandonados assim como João e Mariazinha. (BONAVENTURE, 1992). 
 Neste conto a madrasta (bruxa) pode ser entendida pelas crianças como 
modelo de mãe. Isso significa que as crianças, durante suas vidas, podem sentir sua 
mãe como a personificação da bruxa, por exemplo, quando a mãe não lhes faz 
 
 
 
todas as vontades. Sendo assim pode-se dizer que toda mãe tem uma bruxa dentro 
de si. 
 A mãe normalmente é vista como provedora de amor e de acolhimento, 
mas ela deve também afastar-se um pouco para que as crianças possam agir de 
maneira independente, pois é importante que ela mostre aos filhos que eles devem e 
podem caminhar sozinhos. Uma mãe zelosa e cuidadosa, que alimenta seus filhos 
na boca quando estas crianças já têm condições de se alimentarem por conta 
própria, estarão atuando como bruxas que não permitem o crescimento das 
crianças, por mais que estejam agindo com amor e carinho. Pode-se, então, 
perceber que as atitudes das mães podem ser entendidas como a Grande Mãe no 
seu aspecto negativo ou positivo, nas diferentes situações da vida. 
 A floresta é um local onde não há segurança. É escuro, o que causa 
medo. É um lugar desconhecido, obscuro, inatingível. Segundo Chevalier e 
Gheerbrant (2006), a floresta simboliza o inconsciente, sendo o local onde vivem os 
animais selvagens, que correspondem aos nossos instintos, e onde deparamo-nos 
com o desconhecido. Na vida, precisamos também passar pela floresta para que 
possamos crescer. 
 As situações pelas quais as crianças passam desde pequenas, como o 
primeiro dia na escola, ou tendo que fazer sozinhas algumas atividades, podem 
gerar uma sensação de abando. Essas situações podem ser relacionadas à entrada 
na floresta, levando à novas conquistas. Isso

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