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0 FACULDADE SÃO LUIZ FELIPE OLIVEIRA VARELA A COMPAIXÃO COMO SUPRESSÃO DO PRINCIPIUM INDIVIDUATIONIS EM ARTHUR SCHOPENHAUER BRUSQUE 2015 1 FACULDADE SÃO LUIZ FELIPE OLIVEIRA VARELA A COMPAIXÃO COMO SUPRESSÃO DO PRINCIPIUM INDIVIDUATIONIS EM ARTHUR SCHOPENHAUER Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do grau de Bacharel em Filosofia pela Faculdade São Luiz. Orientador: Prof. Ms. Silvano João da Costa BRUSQUE 2015 2 3 Àqueles que imersos numa realidade egoísta, agem compassivamente para propiciar o alívio do sofrimento alheio. 4 Agradecimentos Agradeço a Deus pelo meu existir. À minha família. Meus pais, Laerte e Terezinha, e à minha irmã Maria Talita, por todo incentivo e apoio. Ao Seminário Filosófico de Santa Catarina. Ao Pe. Wanderlei e Pe. Alírio Leandro, pelos ensinamentos a mim conferidos. À diocese de Lages, na pessoa de Dom Irineu Andreassa, que enormemente me possibilitou descobrir a beleza da vocação sacerdotal. Ao professor Ms. Pe. Silvano João da Costa, que com paciência tão bem me auxiliou na construção deste trabalho, bem como suas palavras otimistas em relação às dificuldades desta trajetória. 5 Sobre o palco, um desempenha o papel de príncipe, outro, o de conselheiro, um terceiro, o de servo, ou de soldado, ou de general e assim por diante. Mas tais diferenças existem só na exterioridade. Na interioridade, como núcleo de tal fenômeno, o mesmo encontra-se igual em todos. (Arthur Schopenhauer). 6 RESUMO O presente trabalho buscou, através do método bibliográfico, apresentar a articulação entre o egoísmo humano e a ética da compaixão em Arthur Schopenhauer (1788-1860). Em meio à vivência egoísta de muitas pessoas, que propiciam inúmeras atrocidades, existem ações compassivas, que designam ajuda e preocupação àqueles que necessitam. Neste sentido, ambas as ações são pertinentes à reflexão, pois evidenciam o campo ético filosófico. Destarte, Schopenhauer propõe-se a teorizar o conteúdo destas ações. Para ele, a essência do mundo é uma força cega e irracional, a Vontade. Ela objetiva-se em toda a realidade, para que esta última afirme-a. O homem, por ser objetidade imediata da Vontade, afirma-a com intensidade, tendo em vista que imerso no principium individuationis sempre assegurará a sua vida, o seu bem estar; assim evidenciando a natureza essencial do egoísmo em sua existência. Porém, Schopenhauer sustenta a compaixão como o fundamento da moral. A compaixão é alheia ao principium individuationis, e permite a proximidade, bem como a identificação de si no outro. Neste sentido, cabe evidenciar no pensamento schopenhaueriano a existência da compaixão, em meio à natureza essencial do egoísmo na vida do homem. Para a realização de tal intento, foram usadas as principais obras do autor, O mundo como vontade e como representação (1819), Dores do mundo (1836) e Sobre o fundamento da moral (1840); bem como alguns comentadores. Enfim, não se pode evidenciar na teoria schopenhaueriana uma observância absoluta à Vontade, mas a possibilidade de seguir outro itinerário. PALAVRAS - CHAVE: 1: SCHOPENHAUER 2: VONTADE 3: PRINCIPIUM INDIVIDUATIONIS 4:COMPAIXÃO 7 ABSTRACT This work has shown, through the bibliographic method, presents the human selfishness and Arthur Schopenhauer (1788 to 1860) ethics of compassion articulation. In the throes of selfish experiences from much people, that several atrocities, there are compassionates actions, and provides help and worry to someone that needs. In this sense, both actions are relevant to reflection because they evidence the philosophical ethical field. Thus, Schopenhauer proposes to theorize the content of these actions. For him, the essence of the world is a blind and irrational force, to Will. It aims in all reality for this last asserts it. The humen, to be immediate objecthood of Will, firms it with intensity, and have in view that immersed in the principium individuationis they always ensure their life, their welfare; thus demonstrating the essential nature of selfishness in its existence. However Schopenhauer maintains compassion as the moral foundation. The compassions is impartial to principium individuationis, and allows the proximity, and the identification of himself in the other. In this sense, it is evident the existence of compassion in schopenhaueriano thought, amid the essential nature of selfishness in human life. For the realization of such intent, it was used greatest author `s publications, The world as will and representation (1819), The world's pain (1836) and On the basis of morality (1840); and some commentators. Lastly, we cannot show Schopenhauer's theory on absolute compliance with the Will, but the possibility to follow another route. KEY WORDS: 1: SCHOPENHAUER 2: WILL 3: PRINCIPIUM INDIVIDUATIONIS 4:COMPASSION 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10 1 O MUNDO COMO VONTADE E REPRESENTAÇÃO NA FILOSOFIA SCHOPENHAUERIANA ........................................................................................... 14 1. 1 O mundo como representação .................................................................... 15 1.1.1 O conhecimento do mundo fenomênico ............................................... 17 1.1.1.1 O Princípio de Razão Suficiente .......................................................... 18 1.1.2 A capacidade de abstração e reflexão ................................................... 19 1.2 O mundo como Vontade ................................................................................ 20 1.2.1 A Vontade como coisa-em-si .................................................................. 22 1.2.2 O corpo como objetidade da Vontade ................................................... 23 1.2.2.1 A conclusão analógica sobre a essência de todos os fenômenos ....... 24 1.2.3 A irracionalidade da Vontade.................................................................. 25 1.2.4 Os graus de objetivação da Vontade ..................................................... 26 2 O SOFRIMENTO INERENTE À VIDA E O EGOÍSMO HUMANO ......................... 29 2.1 O conflito entre os graus de objetivação da Vontade ................................. 29 2.2 O principium individuationis como gerador da pluralidade ....................... 31 2.3 A afirmação da Vontade de vida ................................................................... 31 2.3.1 A vida humana enquanto sofrimento .....................................................33 2.3.2 A ilusão da felicidade .............................................................................. 35 2.3.2.1 A refutação à visão otimista de mundo ................................................ 36 2.4 O egoísmo ...................................................................................................... 38 9 2.4.1 A malevolência ......................................................................................... 40 3 A ÉTICA SCHOPENHAUERIANA A PARTIR DA NOÇÃO DE COMPAIXÃO ...... 43 3.1 A imutabilidade do caráter ............................................................................ 44 3.2 A liberdade humana enquanto contradição fenomênica ............................ 47 3.3 As principais motivações do agir humano .................................................. 48 3.4 A compaixão enquanto fundamento da moral ............................................ 49 3.4.1 A virtude da justiça proveniente da compaixão .................................... 52 3.4.2 A virtude da caridade proveniente da compaixão ................................ 53 3.4.3 A ascese enquanto derivação da compaixão ........................................ 54 3.5 A proximidade entre a ética cristã e a ética schopenhaueriana da compaixão ............................................................................................................ 56 3.6 A proximidade e as influências do Budismo e do Hinduísmo para a ética schopenhaueriana da compaixão....................................................................... 57 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 60 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 63 10 INTRODUÇÃO A história dos homens relata inúmeras ações, mas nem sempre consegue decifrar o fundamento das mesmas. Neste sentido, cabe à filosofia debruçar-se não só nas ações do homem, mas nos seus próprios fundamentos. Tal atitude filosófica, porém, acima de tudo, pode também possibilitar a compreensão do próprio fundamento do existir. Neste sentido, vários foram os homens que se dispuseram à reflexão do fundamento das ações do homem, bem como do próprio fundamento do mesmo. Entre eles, encontra-se Arthur Schopenhauer, filósofo alemão, que em pleno século XIX, estabeleceu uma teoria que sustenta o irracional como mantenedor da existência. Schopenhauer inicialmente serve-se da teoria kantiana sobre a distinção do fenômeno e a coisa-em-si, mas diverge de Immanuel Kant no que se refere à incognoscibilidade da coisa-em-si, pois sustenta a possibilidade de conhecê-la e lhe atribui um significado, a Vontade. Neste sentido, evidencia-se em sua teoria, o mundo que é representação de um sujeito. Porém, além desta consideração, Schopenhauer evidencia o mundo enquanto Vontade. Para ele, a Vontade é um impulso cego e irracional que objetiva- se em todo o mundo fenomênico. Esta sendo una apresenta-se através dos graus de objetivação que permitem o aparecimento de todas as representações. Mas, para que haja a exteriorização dos graus de objetivação, é necessária a matéria. Neste sentido, há um contínuo conflito entre os graus na busca pela matéria, e este conflito intensifica-se no homem, este que é o grau mais perfeito da Vontade. Por isso, o homem impelido à permanência de sua exteriorização agirá de tal forma que não hesitará se necessitar prejudicar outro homem, na verdade agirá de 11 forma egoísta, isto porque devido o principium individuationis, que confere a individuação do mundo, sempre verá que o outro é absolutamente diferente de si, além disso, o outro sempre se apresenta de forma mediata em sua consciência. Assim, o homem naturalmente é egoísta porque naturalmente deve agir de tal maneira que assegure a sua existência. No entanto, Schopenhauer evidencia um conteúdo ético que sustenta a compaixão como fundamento da moral. A compaixão apresenta-se como pressuposto da moralidade, esta é composta pela justiça e pela caridade, e desdobra-se até chegar à ascese. Sendo assim, esta pesquisa questiona: Se para Arthur Schopenhauer, o egoísmo por natureza não tem limites, e o homem quer conservar a sua existência, sendo um ser essencialmente egoísta, de que forma ele pensa uma ética baseada na compaixão? Desta forma, o objetivo geral desta pesquisa é apresentar a articulação entre o egoísmo humano e a ética da compaixão em Arthur Schopenhauer. Isto porque, devido a existência natural do egoísmo na vida humana, parece impossível pensar uma ação compassiva. Ademais, utilizando o método bibliográfico, esta pesquisa está dividida em três capítulos. No primeiro se propõe apresentar a teoria geral sobre o mundo enquanto Vontade e representação na filosofia schopenhaueriana. A obra base é O mundo como vontade e como representação (1819). É de suma importância este capítulo tendo em vista que é base de todo o pensamento schopenhaueriano. Verifica-se o mundo enquanto representação, que refere-se à epistemologia schopenhaueriana, à construção da representação e sua dependência do princípio de razão suficiente. Depois, evidencia-se o lado metafísico do mundo, entendido como Vontade, e o homem enquanto objetidade imediata da mesma. Além disso, se percebe a irracionalidade da Vontade e sua implicação na realidade através dos graus de objetivações, semelhantes às Ideias platônicas, protótipos inalterados, dos quais as representações derivam. Posteriormente, no segundo capítulo será exposto o sofrimento inerente à vida e o egoísmo humano. A base deste capítulo, além da obra já mencionada para o primeiro, será Dores do mundo (1836). Há um contínuo conflito ente os graus de 12 objetivação da Vontade para conseguirem a matéria. Este conflito permitirá perceber todo o sofrimento e discórdia, sobretudo no homem. Percebe-se que devido o principium individuationis, o homem é impelido a afirmar severamente a sua vida, pois não encontra qualquer semelhança em relação aos demais homens, assim vive tendo em mente uma barreira absoluta em relação a qualquer outro ser. Todas essas implicações corroboram para uma discórdia e um sofrimento intenso na vida do homem, onde o otimismo pode ser logo refutado. Por fim, no último capítulo será compreendida a partir da noção de compaixão, a ética schopenhaueriana. É necessário entender as implicações do caráter bem como das motivações do homem. Uma destas motivações é a compaixão, e faz-se também importante verificar sua composição, assim como suas desmembrações, além de algumas doutrinas consideradas por Schopenhauer próximas à sua ética. Tem-se como base teórica para este capítulo a obra Sobre o fundamento da moral (1840). Além destas obras, são mencionadas outras obras de Schopenhauer que auxiliaram para uma maior compreensão dos assuntos. Usa-se também posicionamentos de alguns comentadores que, às vezes, divergem ou convergem entre si, tais como Jair Barboza, Christopher Janaway e Thomas Mann, além de outros. Ademais, esta pesquisa não tem o intuito de esgotar a teoria schopenhaueriana, quer tão só se propor à problemática já evidenciada, com a finalidade de instigar ainda mais o estudo na filosofia de Schopenhauer, tendo em vista que seu pensamento é amplo e mantenedor de muitas riquezas filosóficas. Diantede um mundo contemporâneo egoísta, que apresenta atrocidades em demasia referentes à falta de respeito à vida do homem, bem como à destruição da mesma; pode-se evidenciar, à luz da teoria schopenhaueriana, não só uma explicação do egoísmo, mas um desenrolar teórico que versa sobre a supressão do fundamento de todas as atrocidades. Desta forma, o pensamento schopenhaueriano não se restringe ao século XIX, mas pode ser um apoio à reflexão deste atual período, onde parece ser necessário o reconhecimento do outro como semelhante a si. A compaixão da ética schopenhaueriana evidencia a bondade do homem, o amor enquanto doação total, enfim, a possibilidade de uma profunda proximidade com os demais homens. 13 Portanto, em dissonância com a comumente ideia de que a filosofia schopenhaueriana está fadada ao pessimismo, se quer evidenciar um pensamento às vezes velado de uma teoria ética que garante e propõe uma profunda reflexão sobre o amor enquanto compaixão. 14 1 O MUNDO COMO VONTADE E REPRESENTAÇÃO NA FILOSOFIA SCHOPENHAUERIANA No decorrer da filosofia, vários filósofos a partir de suas teorias se propuseram responder distintas problemáticas. No período moderno, intensificou-se o problema do conhecimento em relação às teorias do empirismo e racionalismo, sendo que estas se opunham. Neste mesmo período este problema foi tratado pelo filósofo alemão Immanuel Kant1. Kant procurou sustentar um harmônico entendimento entre o empirismo e o racionalismo, tendo em vista que para ele, ambas as teorias seriam fontes do conhecimento. Porém, ele afirmou que só é possível conhecer o objeto, ou seja, aquilo que através da experiência se mostra ao sujeito, e, a coisa-em-si permanecerá sempre incognoscível. A partir desta solução kantiana do conhecimento, há aproximadamente quatro décadas posteriores, o filósofo também alemão Arthur Schopenhauer, 2 1 Immanuel Kant nasceu em Königsberg, na Alemanha, em 1724. Era um filósofo cuja vida foi marcada pela sistematicidade. Destacou-se em várias áreas da filosofia, sobretudo na teoria do conhecimento, ao propor uma epistemologia sintetizando o empirismo e o racionalismo. Sua doutrina recebeu influência principalmente de Hume, Leibniz, Wolff e Rousseau. Suas principais obras são Crítica da razão pura (CRP) (1781), Metafísica dos costumes (1785), Crítica da razão prática (1788) e Crítica da faculdade de julgar (1790). Morreu em 1804. [Cf. PASCAL, Georges. Compreender Kant. 2. ed. Tradução de Raimundo Vier. Petrópolis: Vozes, 2005, p. 13-20]. 2 Arthur Schopenhauer nasceu na Alemanha, na cidade de Dantzing, em 1788. Veio de uma família rica de comerciantes. Quando jovem, Schopenhauer foi motivado por seu pai a seguir a carreira de comerciante, por isso, viajou para alguns países o que lhe possibilitou o domínio de línguas como o espanhol, inglês, latim e grego. Posteriormente, pode ler os clássicos gregos e latinos, escolásticos, a filosofia oriental e Shakespeare. Sua mãe agia de forma incorreta, devido ter uma vida desregrada e sem compromisso. Logo mais, vivencia o suicídio de seu pai, possibilitando deixar a vida de comerciante e ingressar na filosofia. Doutorou-se, em 1813, em Berlim com a tese Sobre a quádrupla raiz do princípio de razão suficiente, mas foi sua mãe a primeira a criticá-lo e logo cortam todas as relações. Sua teoria foi influenciada por Platão e Kant. Escreveu O mundo como vontade e representação (MVR), em 1819, que foi um fracasso. Lecionou na Universidade de Berlim a partir de 1820, e teve como principal rival Hegel. Porém, as aulas de Schopenhauer foram quase irrepletas de alunos e seu pensamento foi ignorado. Em 1833 vai para Frankfurt, onde morou até a morte, tendo como amigo apenas seu cachorro chamado Atma (alma do mundo). Mas, foi no ano de 15 encontrará o centro de sua problemática teórica, na sustentação kantiana da incognoscibilidade da coisa-em-si. Para Schopenhauer, em contiguidade à teoria kantiana, o conhecimento também acontece através da experiência, porém, ele introduz uma nova perspectiva, uma força cega e irracional que está acima da própria razão. Desta forma, Schopenhauer inicialmente segue a distinção kantiana entre fenômeno e coisa-em-si, mas, refere-se ao fenômeno enquanto representação, e a coisa-em-si receberá uma nova consideração, será chamada de Vontade. Neste sentido, faz-se necessário apresentar a base da teoria schopenhaueriana para uma melhor compreensão de todo o seu pensamento. 1. 1 O mundo como representação A teoria do conhecimento de Schopenhauer sustenta-se inicialmente no pensamento kantiano; neste sistema só é possível conhecer o fenômeno3, ou seja, os objetos que aparecem ao sujeito do conhecimento. Os fenômenos são condicionados pela faculdade do conhecimento do homem4 , que corresponde à faculdade da sensibilidade (as intuições puras de espaço e tempo), e à faculdade do entendimento (as doze categorias a priori).5 Segundo Salloum, no sistema kantiano o conhecimento inicia-se por meio da intuição. Ao se receber sensações, a sensibilidade transforma-as em percepções que posteriormente são organizadas em conceitos pelo entendimento. Desta forma, a estrutura da sensibilidade e do entendimento é a priori, e determinante para tornar possível o conhecimento.6 1851 que Schopenhauer adquire fama através de sua obra Parerga e Paralipomena (P&P) (1851) [Ornatos e suplementos], junto com a decadência de Hegel. Faleceu em 1860, vítima de pneumonia. [Cf. MONTEIRO, Fernando. 10 lições sobre Schopenhauer. Petrópolis: Vozes, 2011, p. 19-24]. 3 Como já exposto, Schopenhauer usará a expressão “representação” para designar o fenômeno kantiano, porém, algumas vezes ele usa a expressão “fenômeno”. Portanto, todas as vezes que nesta pesquisa forem usadas ambas as palavras no sistema schopenhaueriano do conhecimento, designarão o mesmo sentido. [NOTA DO PESQUISADOR] 4 Schopenhauer não usa a designação “ser humano”, mas homem. Por isso, para que exista maior harmonia com as citações de Schopenhauer, procurou-se usar a palavra homem, subentendendo ser humano. [NOTA DO PESQUISADOR] 5 Cf. MORAIS, Alexander Almeida; OLIVEIRA, Luizir de. Kant e Schopenhauer: uma análise das noções de Espaço e Tempo kantianos na epistemologia schopenhaueriana. Cadernos do PET Filosofia. Teresina: Universidade Federal do Piauí, v. 1, n. 1, p. 01-19, 2010, p. 2. 6 Cf. SALLOUM, Jamil. A ética ascética de Arthur Schopenhauer e o Hinduísmo: Um estudo bibliográfico-comparativo: assonâncias e dissonâncias. 2007. 117 p. Dissertação [Mestrado em Filosofia] Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2007, p. 12. 16 Porém, no sistema schopenhaueriano do conhecimento ocorre modificações em relação ao sistema kantiano. Enquanto para Kant as formas de espaço e tempo pertencem à sensibilidade, e a causalidade é uma das doze categorias do entendimento; para Schopenhauer o tempo e o espaço são também formas do entendimento. Mas, quanto às categorias do entendimento, estas são reduzidas à causalidade, logo, o entendimento passa a ser composto pelas categorias de tempo, espaço e causalidade. Schopenhauer dessa forma une a sensibilidade eo entendimento, separadas por Kant.7 A partir desta mudança há também a rejeição de Schopenhauer em relação à hipótese do realismo empírico, onde os objetos independem da capacidade cognitiva. Para ele, a própria efetividade empírica é produto de atividades fisiológicas e transcendentais operadas pelos órgãos sensíveis e pelo intelecto.8 Os objetos dependem necessariamente daqueles que os percebem. Por isso, os objetos não são oferecidos à percepção do homem, mas são criados por ele. Toda a realidade empírica é antes criada e não percebida.9 Por isso as palavras de Schopenhauer ao iniciar sua obra magna: “O mundo é minha representação.” Esta é uma verdade que vale em relação a cada ser que vive e conhece, embora apenas o homem possa trazê-la à consciência refletida e abstrata. [...] Torna-se-lhe claro e certo que não conhece sol algum e terra alguma, mas apenas um olho que vê um sol e uma mão que toca a terra. (SCHOPENHAUER, MRV, I, § 1) 10 Segundo Monteiro, a representação é entendida enquanto união dos dados sensíveis e a capacidade cognitiva. A existência da realidade empírica depende do sujeito, por isso não é possível separar o objeto e o sujeito, pois sem o sujeito cognoscente o mundo desapareceria.11 O mundo enquanto representação é composto por duas metades necessárias, sujeito e objeto. Nesta posição, verifica-se a refutação à consideração 7 Cf. SALLOUM, 2007, p. 12. 8 Cf. GARCIA, André Luiz Muniz. “(...) O mundo como representação (...) é antes de tudo apenas um fenômeno fisiológico”: Intuição intelectual e percepção empírica em Arthur Schopenhauer. Revista Voluntas: estudos sobre Schopenhauer. Curitiba: Sociedade Schopenhauer do Brasil: USP; UFRJ; PUCPR, v. 2, n. 2, p. 93-112, 2011, p. 99. 9 Cf. SALLOUM, op. cit., p. 11. 10 SCHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e como representação. Tradução de Jair Barboza. São Paulo: UNESP, 2005, p. 43. 11 Cf. MONTEIRO, 2011, p. 25. 17 dos dogmáticos idealistas de que o sujeito é que cria o objeto, e à consideração dos realistas que consideram o objeto anterior ao sujeito.12 Schopenhauer, neste sentido, afirma que o sustentador de toda a realidade empírica é o sujeito, este que é aquele que conhece, mas que não pode ser conhecido. Tudo o que existe, existe para o sujeito e se este deixa de existir toda a realidade empírica também desaparece. (Cf. SCHOPENHAUER, MRV, I, § 2) 13 1.1.1 O conhecimento do mundo fenomênico Ademais, quanto à construção da representação, o espaço, tempo e causalidade não são aplicados à representação de um objeto percebido de fora, como propôs Kant, mas são aplicados de forma imediata a estados da matéria. Só há determinação de uma causa no espaço e no tempo se houver matéria, pois o entendimento só determina estados que possuam materialidade sensível capaz de fazer-efeito.14 A matéria é para Schopenhauer apenas causalidade: [...] a matéria [...] é por completo apenas causalidade. [...] O ser da matéria é o seu fazer-efeito. [...] Tempo e espaço, entretanto, cada um por si, são também representáveis intuitivamente sem a matéria. Esta, contudo, não o é sem eles: a forma, que lhe é inseparável, pressupõe o ESPAÇO. O fazer-efeito da matéria, no qual consiste toda a sua existência, concerne sempre a uma mudança, portanto a uma determinação do TEMPO. Contudo, tempo e espaço não são apenas, cada um por si, pressupostos por ela, mas a essência dela é construída pela união de ambos [...] (SCHOPENHAUER, MRV, 4, § 1)15 Neste sentido, a partir dos estímulos dos estados da matéria que fazem efeito sobre os sentidos é que o entendimento aplica uma causa no tempo e no espaço, proporcionando então que toda a realidade empírica torne-se representação.16 Mas a representação é também construída pelos animais, pois todos possuem entendimento, mesmo aqueles que são mais imperfeitos, haja vista que 12 Cf. MOREIRA, Jacqueline de Oliveira. O problema do conhecimento em Schopenhauer. Revista de Ciências Humanas. Florianópolis: EDUFSC, v. 1, n. 36, p. 263-287, 2004, p. 265. 13 Cf. SCHOPENHAUER, 2005, p. 45. 14 Cf. GARCIA, 2011, p. 104. 15 SCHOPENHAUER, op. cit., p. 49-50. [GRIFO DO AUTOR] 16 Cf. GARCIA, op. cit., p. 104. 18 todos conhecem objetos. O entendimento é o mesmo em todos os animais e homens, e possui sempre a mesma tarefa, o conhecimento da causalidade. Além disso, o entendimento não necessita da razão, esta é secundária. Por isso, o entendimento é irracional. (Cf. SCHOPENHAUER, MRV, I, § 6) 17 Entretanto, segundo Rodrigues, mesmo havendo tais distinções da teoria schopenhaueriana do conhecimento em relação à teoria kantiana, Schopenhauer considera-se continuador do idealismo transcendental de Kant, e ainda atribui grande mérito a este, por sua brilhante teoria sobre a separação entre fenômeno e a coisa-em-si.18 Porém, Schopenhauer deixa claro que a afirmação do mundo enquanto representação, já foi tratada por Berkeley19. E, já há muito tempo foi reconhecida pelos sábios da Índia, pois para a escola védica 20 , o dogma fundamental não consiste em negar a matéria, mas sustentar que esta não possui essência alguma senão contígua à percepção mental. (Cf. SCHOPENHAUER, MRV, I, § 1) 21 1.1.1.1 O Princípio de Razão Suficiente Todas as representações que necessariamente são criadas pelo entendimento estão submetidas ao princípio de razão suficiente. Este é composto por quatro raízes que possibilitam as quatro classes de objetos possíveis ao conhecimento.22 Barboza apresenta as quatro raízes deste princípio: [...] 1) “princípio de razão de devir”: a ele estão submetidos as representações da realidade, isto é, da experiência possível; 2) “princípio de razão de conhecer”: a ele estão submetidas as representações de representações, isto é, os conceitos; 3) “princípio de razão de ser” [...] a ele estão submetidos a parte formal das representações, isto é, as intuições das formas do sentido externo e 17 Cf. SCHOPENHUAER, op. cit., p. 64-69. 18 Cf. RODRIGUES, Ruy de Carvalho. Matéria e representação na obra de A. Schopenhauer. Kairós. Revista Acadêmica da Prainha. v. 1, p. 92-125, janeiro-junho, 2008, p. 95. 19 Berkeley é quem fundará o idealismo propriamente dito, expresso na frase: o mundo é minha representação. Mas, seu idealismo ainda encontra-se incompleto e ligado ao teísmo. [Cf. LEFRANC, Jean. Compreender Schopenhauer. 5. ed. Tradução de Ephraim Ferreira Alves. Petrópolis: Vozes, 2011, p. 69]. [GRIFO DO AUTOR] 20 “Arthur Schopenhauer [...] foi um dos primeiros filósofos ocidentais a perceber a profundidade do pensamento oriental e a propor uma leitura de seus principais aspectos, realizando assim uma contínua ligação entre filosofia oriental e filosofia ocidental. [REDYSON, Deyve. Schopenhauer e o pensamento oriental entre o hinduísmo e o budismo”. Religare. Universidade Federal da Paraíba. v. 7, n. 1, p. 3-16, março, 2010, p. 3.] 21 Cf. SCHOPENHAUER, 2005, p. 44. 22 Cf. RODRIGUES, 2008, p. 98. 19 interno dadas a priori, o espaço e o tempo; 4) “princípio de razão de agir”23: a ele está submetido o sujeito do querer, isto é, o seu agir conforme a lei de motivação.24 Segundo Rodrigues, a intenção de Schopenhauer ao sustentar tal princípio é estabelecer o fundamento de todas as ciências, tendo em vista que este princípio sustenta que nada existe sem haveruma razão para existir. Porém, tal princípio não pode ser concebido como causa do mundo, mas apenas como a forma em que o objeto está condicionado pelo sujeito.25 1.1.2 A capacidade de abstração e reflexão Schopenhauer considera a razão como faculdade dependente da intuição. “[...] o mundo inteiro da reflexão repousa e se enraíza no mundo intuitivo. Toda a evidência última, isto é, originária, é INTUITIVA [...]” (SCHOPENHAUER, MRV, I, § 14) 26 por isso, “A intuição se basta a si mesma. [...] pois lá não há opinião alguma, mas a coisa mesma. No entanto, junto com o conhecimento abstrato, com a razão, dúvida e erro entram em cena [...]”. (SCHOPENHAUER, MRV, I, § 8) 27 Conforme Mann, Schopenhauer evidencia a primazia do entendimento sobre qualquer objeto antes que este possa chegar pela razão, à consciência refletida. Cabe à razão apenas fixar e organizar o que o entendimento já apanhou.28 “Da mesma maneira que o entendimento possui apenas UMA função, o conhecimento imediato da relação de causa e efeito; [...] também a razão possui apenas UMA função, a formação de conceitos”. (SCHOPENHAUER, MRV, I, § 8) 29 Para Silva, o conceito sempre necessita de dados da intuição, pois ele se desvincula do mundo real, ao se afastar da intuitividade.30 23 É necessário perceber que aquilo que está submetido a este princípio não é o sujeito enquanto tal, pois se assim fosse este poderia ser conhecido e se tornaria objeto, o que propiciaria a refutação imediata à teoria schopenhaueriana de que o mundo enquanto representação é composto por sujeito e o objeto. Portanto, que fique claro que aquilo que está submetido a este princípio são apenas os motivos que levam o sujeito a agir. [NOTA DO PESQUISADOR] 24 BARBOZA, Jair apud SCHOPENHAUER, 2005, p. 48 [COMENTÁRIO DO TRADUTOR] 25 Cf. RODRIGUES, 2008, p. 98. 26 SCHOPENHAUER, op. cit., p. 117. [GRIFO DO AUTOR] 27 Ibid., p. 81. 28 Cf. MANN, Thomas. O pensamento vivo de Schopenhauer. Tradução de Pedro Ferraz do Amaral. São Paulo: Martins Editora, 1951, p. 65. 29 SCHOPENHAUER, op. cit., p. 85. [GRIFO DO AUTOR] 30 Cf. SILVA, Paulo Marcos da. O princípio de razão suficiente (1813) e a questão da verdade em Schopenhauer. 2010. 158 p. Dissertação [Mestrado em Filosofia]. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 53. 20 Os conceitos formam uma classe particular de representações, encontradas apenas no espírito do homem [...] Os conceitos permitem apenas pensar, não intuir [...] Os conceitos podem ser denominados de maneira bastante apropriada representações de representações. (SCHOPENHAUER, MVR, I, § 9) 31 Desta forma, a razão enquanto faculdade cognitiva do homem, é que cria conceitos e permite existir a reflexão. Só assim é possível existir ciência, que por meio dos conceitos abstratos pode sistematizar e transmitir os conhecimentos que são obtidos a partir da experiência.32 Em relação à reflexão, Schopenhauer afirma: [a reflexão] Essa nova consciência, extremamente poderosa, [...] é a única coisa que confere ao homem aquela clareza de consciência que tão decisivamente diferencia a sua da consciência do animal e faz o seu modo de vida tão diferente do de seus irmãos irracionais. (SCHOPENHAUER, MVR, I, § 8) 33 Segundo Barboza, Schopenhauer apresenta a razão como um simples mecanismo de sobrevivência humana, semelhante às garras de um leão. Portanto, a razão e a própria reflexão encontram-se secundárias em relação a algo mais essencial que habita em todos os animais.34 1.2 O mundo como Vontade Conforme Barboza, para Schopenhauer a humanidade sempre foi movida por uma necessidade metafísica, por isso, há sempre uma busca pelo conteúdo primeiro do mundo e da vida.35 Porém, antes de apresentar a consideração acerca da Vontade, faz-se necessário perceber que Schopenhauer evidencia duas formas de metafísicas. Inicialmente a metafísica transcendente que é entendida como um dogmatismo errado, pois formula um sistema de pensamentos que explica o mundo a partir de elementos externos ao próprio mundo. Este dogmatismo é entendido como uma 31 SCHOPENHAUER. op. cit., p. 86-87. [GRIFO NOSSO] 32 Cf. MORAIS; OLIVEIRA, 2010, p. 16. 33 SCHOPENHAUER. op. cit., p. 83. 34 Cf. BARBOZA, Jair. Schopenhauer. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003, p. 28. 35 Cf. BARBOZA, 2003, p. 28. 21 tentativa acrítica e inválida de fundamentar o mundo acima dos limites da própria experiência.36 A outra metafísica é chamada imanente e estabelece um dogmatismo positivo. Tal metafísica é crítica, e justifica dentro dos limites e possibilidades da experiência suas formulações acerca do conhecimento do mundo. Tal dogmatismo não se opõe à filosofia crítica, e tem como intuito afirmar aquilo que é cognoscível.37 Barboza entende a metafísica schopenhaueriana não enquanto transcendente, mas imanente. Porém, sustenta que é necessário evidenciar um dogmatismo em seu sistema, tendo em vista que o próprio pressuposto do conhecimento é a pura intuição. Por isso, o “meta” de sua metafísica, antes de evidenciar algo exterior ao mundo, sustenta aquilo que é sentido intuitivamente, e que vai além daquilo que se pode ver.38 A partir disso, Schopenhauer dentro dos limites da experiência procurará formular sua metafísica. Mas, o caminho para identificar a essência do mundo não encontra-se nas leis dos objetos, pois a causalidade aplica-se apenas ao fenômeno. Por isso, a força que se exterioriza nos fenômenos ainda se apresenta como desconhecida. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 17) 39 Esta força desconhecida pode ser procurada no simples repelir entre dois corpos, ou naquilo que possibilita os movimentos e o próprio crescimento de um animal. Porém, a mais perfeita explanação da etiologia de toda a natureza nada mais propiciaria que um catálogo de forças inexplicáveis, pois suas leis restringem- se às representações. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 17) 40 Segundo Barboza, as ciências se limitam à finitude, à representação. A coisa-em-si permanece-lhe estranha. Verifica-se a própria efemeridade da razão, pois não cabe a ela ou aos seus conceitos serem a via de acesso à coisa-em-si.41 Por isso, não é a partir do exterior que se chega à essência das coisas. Por mais que se investigue, obtêm-se apenas imagens e nomes. Schopenhauer metaforicamente diz que todos os filósofos que o antecederam, são como homens 36 Cf. MOREIRA, Fernando de Sá. Ethos e Pathos em Schopenhauer e Nietzsche: vida, vontade e ascetismo. 2011. 169 p. Dissertação [Mestrado em Filosofia] Universidade do Oeste do Paraná, Toledo, 2011. p. 74. 37 Cf. MOREIRA, 2011. p. 74. 38 Cf. BARBOZA, Jair. A metafísica do belo de Arthur Schopenhauer. São Paulo: Humanitas, 2001, p. 44. 39 Cf. SCHOPENHAUER, 2005, p. 154-155. 40 Cf. SCHOPENHAUER, loc. cit. 41 Cf. BARBOZA, 2003, p. 29-30. 22 que procurando entrar num castelo, apenas desenharam fachadas, mas nunca puderam entrar. E segundo ele, o único que descobriu a devida porta do castelo e pode entrar, ao decifrar o enigma da coisa-em-si foi ele, ao evidenciá-la como Vontade. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 18) 42 1.2.1 A Vontade como coisa-em-si Para Barboza, quando Schopenhauer evidencia o fracasso das ciências na busca da essência do mundo, ele propõe que tal busca inicie não pelo exterior, mas pelo próprio interiordo homem. Ele apresenta o corpo como via de acesso à coisa- em-si.43 Mas, afirma Schopenhauer que o corpo do sujeito é objeto, ou seja, representação. Dessa forma, haverá certa dificuldade caso o sujeito nomeie sua essência, pois devido às exteriorizações de seu corpo poderia simplesmente afirmá- la como uma força. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 18).44 Por isso, Lefranc sustenta a necessidade de perceber que não é a partir da esfera da representação que é possível conhecê-la, pois o homem não só é ser cognoscente, mas também um querer constante.45 É nesta perspectiva que Schopenhauer considera a essência do mundo como “[...] Vontade46. Esta, e tão somente esta, fornece-lhe a chave para seu próprio fenômeno, manifesta-lhe a significação, mostra-lhe a engrenagem interior de seu ser, de seu agir, de seus movimentos”. (SCHOPENHAUER, MVR, II, § 18) 47 Schopenhauer afirma que comumente substituiu-se o conceito de Vontade pelo conceito de força. Ele afirma que se deve pensar de forma contrária, cada força na natureza enquanto Vontade, isto porque o conceito de Vontade é o único que provém da interioridade, da consciência imediata do próprio indivíduo, destituído de 42 Cf. SCHOPENHAUER. op. cit., p. 156. [GRIFO DO AUTOR]. 43 Cf. BARBOZA. op. cit., p. 30. 44 Cf. SCHOPENHAUER. op. cit., p. 156. 45 Cf. LEFRANC, 2002, p. 89. 46 Há certa dificuldade entre os comentadores para referir-se ao termo “Vontade”, tendo em vista que às vezes usa-se esta palavra com letra maiúscula e às vezes com letra minúscula. O próprio Schopenhauer nem sempre é claro ao usá-la. Por isso, a sustentação mais pertinente entre os comentadores é a de Jair Barboza, tradutor de o Mundo como Vontade e como representação (1819), para o português. Para ele, a palavra “Vontade” com letra maiúscula quer designar a coisa-em-si, já a palavra “vontade”, com letra minúscula refere-se à vontade individual. Portanto, faz-se pertinente que esta mesma diferenciação de Barboza seja seguida nesta pesquisa. [NOTA DO PESQUISADOR] 47 SCHOPENHAUER, 2005, p, 156-157. 23 todas as formas, pois neste momento o sujeito que conhece coincide com o que é conhecido, a Vontade. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 22) 48 1.2.2 O corpo como objetidade da Vontade Na consideração sobre o mundo enquanto representação, o corpo é chamado objeto imediato; agora, enquanto Vontade, ele é chamado de objetidade da Vontade.49 (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 18) 50 A essência do homem é um querer infinito, em meio a sua finitude corporificada. Sua essência volitiva proporciona-lhe querer infinitamente. Todo ato da Vontade é ação do corpo, ambos são uma única coisa, apenas dados de maneiras distintas, uma enquanto intuição do entendimento, e outra enquanto Vontade.51 Segundo Damasceno, Schopenhauer afirma a possibilidade de conhecer a essência do próprio corpo; tal conhecimento, porém, não significa a cognoscibilidade absoluta da mesma, apenas um conhecimento aproximado, livre da maior parte das formas da representação.52 Acerca do conhecimento da vontade, diz Schopenhauer: [...] o conhecimento que tenho da minha vontade, embora imediato, não se separa do conhecimento do meu corpo. Conheço minha vontade não no todo, como unidade, não perfeitamente conforme sua essência, mas só em seus atos isolados, portanto no tempo, que é a forma do fenômeno de meu corpo e de qualquer objeto. (SCHOPENHAUER, MVR, II, § 18) 53 Neste sentido, a Vontade não afeta o homem de fora. Ela afeta-o pelo seu interior. Porém, a Vontade não deve ser entendida como um misterioso sopro divino 48 Cf. Ibid., p. 170-171. 49 O termo objektitat, neologismo de Schopenhauer, costuma provocar confusão entre os tradutores, que às vezes traduzem por “objetividade”, termo inadequado, pois faz perder o caráter inconsciente de imediatez do ato da Vontade, anterior ao seu tornar-se fenômeno consciente na intuição do entendimento. [Cf. BARBOZA, Jair apud SCHOPENHAUER, 2005, p. 157] [COMENTÁRIO DO TRADUTOR] 50 Cf. SCHOPENHAUER, loc. cit. 51 Cf. BARBOZA, 2003, p. 31. 52 Cf. DAMASCENO, Francisco William Mendes. Ética e metafísica em Schopenhauer: a coexistência da vontade livre com a necessidade das ações. 2012. 116 p. Dissertação [Mestrado em Filosofia] Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2012. p. 31. 53 SCHOPENHAUER. 2005, p. 159. 24 que habita o mais profundo interior humano, mas a partir da consideração física do homem, pois este é um objeto da mesma.54 Todos os atos da Vontade implicam no movimento do corpo, todo o querer para se tornar efetivo necessita do corpo. É a partir deste que se manifesta o anseio de viver, ou seja, o impulso à conservação; é ainda por ele que se sente a dor e o prazer. Desta forma, o corpo é a via pela qual se sente não só o mundo enquanto representação, mas o que propicia perceber sentimentos que não se enquadram em representações, mas surgem do mais profundo interior humano, momento em que é possível identificar a Vontade.55 Portanto, acima da própria percepção da realidade fenomênica, é possível evidenciar uma propulsão que não é identificada enquanto representação, mas que brota da imediatez da consciência, onde encontra-se a própria Vontade. 1.2.2.1 A conclusão analógica sobre a essência de todos os fenômenos A partir do que foi acima citado que a Vontade é a essência íntima do corpo, e que o próprio corpo e o querer são unos, cabe perceber de que forma Schopenhauer atribui aos demais fenômenos a Vontade como sua respectiva essência. [...] todos os objetos que não são nosso corpo, portanto não são dados de modo duplo, mas apenas como representações na consciência, serão julgados exatamente conforme analogia com aquele corpo. [...] serão tomados, precisamente como ele, de um lado como representação e, portanto, nesse aspecto, iguais a ele; mas de outro, caso se ponha de lado a sua existência como representação do sujeito, o que resta, conforme sua essência íntima tem de ser o mesmo que aquilo a denominarmos em nós a VONTADE. (SCHOPENHAUER, MVR, II, § 19) 56 Segundo Barboza, Schopenhauer quer dizer que, enquanto representação o corpo está sujeito ao princípio de razão e sua lei de causalidade. A causalidade encontra-se em sentido estrito no reino inorgânico, por excitação no reino vegetal e 54 Cf. TEODORO, Jefferson Silveira. A origem da santidade segundo a metafísica de Schopenhauer. 2009. 122 p. Dissertação [Mestrado em Ciência da Religião] Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2009. p. 42-43. 55 Cf. SANTANA, Bruno Wagner. Akrasia e errância da vontade em Schopenhauer. Revista Voluntas: estudos sobre Schopenhauer. Curitiba: Sociedade Schopenhauer do Brasil: USP; UFRJ; PUCPR, v. 4. n. 2. p. 92-102, 2013, p. 97-98. 56 SCHOPENHAUER, 2005, p. 163. [GRIFO DO AUTOR] 25 no homem assume a forma de motivação. Mas, mesmo de formas diferentes a causalidade é a mesma. Por isso, se esta é a mesma em todos os corpos e, se o íntimo da causalidade humana é a própria Vontade, deve-se considerá-la como a essência dos demais corpos.57 Logo, se nada existe além da representação e da Vontade, aqui se esgota toda a realidade. Ademais, se tais afirmações tornaram-se evidentes, então será possível reconhecer que a mesma Vontade que está no corpo dos homens e dos animais, também,através da reflexão levará a conhecê-la na força que vegeta na planta, na força que forma o cristal e que gira a agulha magnética para o pólo norte. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 21) 58 1.2.3 A irracionalidade da Vontade Uma representação que de forma consciente faz o corpo agir é denominada motivo. Quando o homem vê-se prestes a ser atacado, age através de um motivo. Mas, não só age instintivamente como também racionalmente, por isso, quando for alimentar-se, racionalmente perceberá que o melhor a fazer é suprir sua fome.59 Porém, a Vontade não se restringe aos motivos, pois age também sem necessitar de representações. A Vontade enquanto princípio do mundo é entendida como sem-fundamento, exterior ao tempo e ao espaço. Ela não está submetida ao princípio de razão, é livre das formas fenomênicas, possui liberdade. É ainda entendida como um ímpeto cego e irracional, um esforço que é constante, porém destituído de alvo.60 A Vontade encontra-se no instinto e nos impulsos dos animais61, onde não há qualquer conhecimento. 57 Cf. BARBOZA, 2003, p. 32-33. 58 Cf. SCHOPENHAUER, op. cit., p. 168. 59 Cf. JANAWAY, Christopher. Schopenhauer. Tradução de Adail Ubirajara Sobral. São Paulo: LOYOLA, 2003, p. 59. 60 Cf. BARBOZA, Jair. Metafísica do irracional-mal radical em Schelling e Schopenhauer. Veritas. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS, Porto Alegre, v. 54, n. 2, maio/agosto, p. 187-196, 2009, p. 192-193. 61 Para Schopenhauer a própria voz dos animais expressa a Vontade: “A voz dos animais serve unicamente para expressar a vontade, em suas excitações e movimentos, mas a voz humana também serve para expressar o conhecimento. É por isso que os sons feitos pelos animais quase sempre nos causam uma impressão desagradável, com exceção de algumas vozes de pássaros. Na origem da linguagem humana se encontram certamente, em primeiro lugar, as interjeições, com as quais não se expressam conceitos, mas sentimentos, movimentos da vontade, assim como nos sons dos animais. Logo depois apareceram diversas espécies de interjeições e, a partir dessa diversidade, ocorreu a passagem para os substantivos, verbos, pronomes pessoais, e assim por diante”. 26 O pássaro de um ano não tem representação alguma dos ovos para o qual constrói um ninho; nem a jovem aranha tem da presa para a qual tece uma teia; nem a formiga-leão da formiga para a qual cava um buraco pela primeira vez. A larva do escaravelho abre na madeira o buraco onde sofrerá sua metamorfose e de tal modo que o buraco será duas vezes maior no caso de ele se tornar um besouro macho, em vez de fêmea, pois no primeiro caso deve haver lugar suficiente para as suas antenas, da qual ainda não possui representação alguma. (SCHOPENHAUER, MVR, II, § 23) 62 No homem, a Vontade encontra em determinados lugares do corpo a manifestação visível de sua expressão; os dentes, o esôfago, o canal intestinal onde se objetiva a fome, os órgãos genitais onde se objetiva o instinto sexual.63 Neste sentido, a Vontade atua em todos os lugares. Por isso, a construção da casa de um caracol não deve ser atribuída a uma vontade, e a construção da casa de um homem atribuída a outra vontade, mas à mesma Vontade que objetiva-se nos dois fenômenos, contudo, de formas diferentes, no homem conforme motivos, e no caracol atuando cegamente como um impulso. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 23) 64 1.2.4 Os graus de objetivação da Vontade Como já exposto, a Vontade é alheia à pluralidade, ou seja, ao principium individuationis65, logo é una. Mas, pode-se questionar que esta, por estar em todos os fenômenos deve então estar dividida entre eles, tornando duvidosa sua unidade. Contudo, a relação entre parte e todo cabe apenas ao espaço, logo não pode haver a sustentação da divisão da Vontade entre todos os fenômenos. Por isso Schopenhauer sustenta que a Vontade sendo una, objetiva-se nos fenômenos através de graus, e sua maior objetivação ocorre no homem. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 25) 66 Segundo Janaway, Schopenhauer acredita que as espécies e coisas animadas e inanimadas do mundo são eternas. Não há a identificação de uma [SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de escrever. Tradução de Pedro Süssekind. Porto Alegre: L & PM, 2009, p. 145.] 62 SCHOPENHAUER, 2005, p. 173-174. 63 Cf. MANN, 1951, p. 98. 64 Cf. SCHOPENHAUER, op. cit., p. 174. 65 Princípio de individuação. [TRADUÇÃO NOSSA] 66 Cf. SCHOPENHAUER, op. cit., p. 189. 27 formiga por ela vir a existir como indivíduo, e sim porque esta, mesmo perecendo no tempo corresponde a uma espécie permanente na realidade empírica.67 Schopenhauer assim fundamenta os graus de objetivação da Vontade: [...] os diferentes graus de objetivação da Vontade expressos em inumeráveis indivíduos e que existem como seus protótipos inalcançáveis, ou formas eternas das coisas, que nunca aparecem no tempo e no espaço, médium do indivíduo, mas existem fixamente, não submetidos a mudança alguma, são e nunca vindo-a-ser, enquanto as coisas nascem e perecem, sempre vêm-a-ser e nunca são; os GRAUS DE OBJETIVAÇÃO DA VONTADE, [...] não são outra coisa senão as IDEÍAS [sic] DE PLATÃO. (SCHOPENHAUER, MVR, II, § 25) 68 Tais Ideias 69 diferentes de seus fenômenos são representações, porém anteriores ao princípio de razão; são semelhantes à Vontade, atemporais, alheias à causalidade. A intermediação entre a Vontade como coisa-em-si e seus fenômenos acontece através dessas Ideias.70 O que diferencia as Ideias da Vontade, é que elas, mesmo anteriores às formas do princípio de razão, são objetivações perfeitas71 da Vontade. Portanto, mesmo sendo os pressupostos das objetivações fenomênicas, ainda assim devem ser consideradas objetos em relação ao sujeito.72 Ademais, as forças mais universais da natureza são os menores graus de objetivação, tais como a gravidade, eletricidade, magnetismo, propriedades químicas. Já, os maiores graus de objetidade da Vontade, referem-se ao homem, este é acentuado por uma considerável individualidade, uma personalidade completa. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 26) 73 67 Cf. JANAWAY, 2003, p. 62-63. 68 SCHOPENHAUER, op. cit., p. 191. [GRIFO DO AUTOR] 69 Todas as vezes que for citada a palavra Ideia com a letra maiúscula, subentendam-se as Ideias platônicas, como anteriormente exposto. [NOTA DO PESQUISADOR] 70 Cf. BARBOZA, 2003, p. 35. 71 O que Schopenhauer quer evidenciar, é que, se as Ideias não forem consideradas objetos, então equivaleriam à Vontade. Por isso ele as considera enquanto objetivações perfeitas. Portanto, são também objetos, porém diferentes dos fenomênicos. Mas, cabe saber que o homem é também considerado objetivação perfeita da Vontade, mas o que o distingue da Ideia é que ele encontra-se enquanto fenômeno, e derivou de uma Ideia, por isso, no mundo fenomênico o homem é a objetivação mais perfeita, tendo em vista que as Ideias enquanto tais não estão no mundo fenomênico, mas tão só suas representações. [NOTA DO PESQUISADOR] 72 Cf. GERMER, Guilherme Marconi. O conhecimento do belo em Schopenhauer. Revista Voluntas: estudos sobre Schopenhauer. Curitiba: Sociedade Schopenhauer do Brasil: USP; UFRJ; PUCPR, v. 1. n. 2. p. 89-97, 2010,p. 92. 73 Cf. SCHOPENHAUER, 2005, p. 192. 28 Nenhum animal possui essa individualidade no mesmo grau; os animais identificados como superiores ainda assim possuem considerável semelhança do caráter de sua espécie, bem como de sua fisionomia. E, quanto mais se desce na escala, mais os traços individuais desaparecem no caráter geral da espécie. Por isso, devido a generalidade do caráter é possível em determinadas espécies conhecer seu caráter psicológico, ou seja, saber o que esperar do indivíduo.74 Mas, em relação à espécie humana, dificulta-se o estudo do homem, pois devido sua individualidade, ele pode ser entendido enquanto uma Ideia própria, e devido sua racionalidade, pode facilmente ser um ser enganoso. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 26) 75 Deve-se, portanto, ter em mente que acima de todos esses fenômenos e das Ideias, há a Vontade que sedenta por existência, sai gradativamente de sua cegueira, tornado-se natureza visível. Por isso, surge o reino inorgânico, vegetal e animal, isso porque o querer tende à vida, e tal querer sendo irracional fará qualquer coisa para afirmar-se.76 Portanto, o mundo é entendido enquanto representação e Vontade. No que se refere ao mundo enquanto representação evidencia-se os inumeráveis fenômenos que existem em decorrência dos graus de objetivação da Vontade. Entretanto, todas as representações imersas na lei causal, tão só existem para afirmar a própria Vontade, que é a essência comum a todas. Mas, para que haja tal afirmação é necessária a matéria, por isso, encontra-se um contínuo conflito entre as Ideias, e este conflito, sobretudo no homem, possibilitará o sofrimento e todas as manifestações de egoísmo. 74 Cf. MANN, 1951, p. 114. 75 Cf. SCHOPENHAUER, op. cit., p, 193. 76 Cf. BARBOZA, 2003, p. 34. 29 2 O SOFRIMENTO INERENTE À VIDA E O EGOÍSMO HUMANO A Vontade por ser irracional é ateleológica, não possui finalidade, mas suas objetivações fenomênicas possuem um fim, afirmá-la. Neste sentido, todas as Ideias se esforçam para conseguir matéria, que é pressuposto para qualquer afirmação, e nesta busca por matéria, entram em conflito. Contudo, toda afirmação, sobretudo a do homem, resultam do principium individuationis que confere a individualidade dos seres. Neste sentido, o homem por ser o grau mais perfeito, estará continuamente em conflito e por isso vivenciará um contínuo sofrimento. Além do mais, para a sua afirmação não hesitará em prejudicar o outro, pois devido o principium individuationis, sempre se perceberá absolutamente diferente de qualquer outro homem. 2.1 O conflito entre os graus de objetivação da Vontade Segundo Mann, verifica-se em toda a natureza um contínuo conflito, pois todos os graus de objetivação disputam a matéria. Devido à causalidade, a matéria necessariamente deve mudar de forma, possibilitando que determinados fenômenos apareçam.77 Schopenhauer afirma que no conflito entre as Ideias o que ocorre é a dominação de alguns fenômenos mais baixos por outro fenômeno que se torna mais elevado. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 27) 78 Ademais, esses conflitos veem-se de forma mais nítida no reino vegetal e animal, mas, sobretudo, quando este se alimenta do reino vegetal, ou quando 77 Cf. MANN, 1951, p. 117-118. 78 Cf. SCHOPENHAUER, 2005, p. 208-209. 30 determinado animal é presa ou predador de outro; neste sentido, sempre um deve ceder matéria para que o outro possa manifestar sua determinada Ideia.79 A Vontade renuncia os graus mais baixos para objetivar-se nos mais elevados. Porém, quando algumas Ideias são dominadas por uma mais elevada, ocorre a resistência das mais baixas, pois mesmo em debilidade, sempre se esforçam para serem independentes e poderem exteriorizar sua essência. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 27) 80 Segundo Mann, na filosofia schopenhaueriana vários são os exemplos para expressar tal conflito. Entre eles, insetos que põem seus ovos na casca ou no corpo de larvas ou insetos, cuja lenta destruição será a primeira tarefa da ninhada que viverá.81 Schopenhauer evidencia que a matéria é o pressuposto para qualquer objetivação da Vontade. [...] cada fenômeno da Vontade, inclusive os que se expõem no organismo humano, travam uma luta duradoura contra as diversas forças físicas e químicas que, como Idéias [sic] mais elementares, têm direito prévio à matéria. Por isso o braço levantado após um instante de dominação da gravidade, volta a cair. [...] Daí em geral o fardo da vida física, a necessidade do sono e, por fim, a morte; pois, finalmente, por circunstâncias favoráveis, as forças naturais subjugadas reconquistam a matéria que lhes foi arrebatada pelo organismo, agora cansado até mesmo pelas constantes vitórias, e alcançam sem obstáculos a exposição da natureza. (SCHOPENHAUER, MVR, II, § 27) 82 Todos esses conflitos resultam da manifestação visível da discórdia da Vontade consigo mesma. Esta crava os dentes na própria carne, ela é seu próprio alimento. Porém, no homem esta autodiscórdia intensifica-se, e torna-se terrível quando este se transforma no lobo do homem. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 27) 83 79 Cf. MANN, op. cit., p. 118. 80 Cf. SCHOPENHAUER, op. cit., p. 210. 81 Cf. MANN, op. cit., p. 119. 82 SCHOPENHAUER, op. cit., p. 210. 83 Cf. Ibid., p. 211-212. 31 2.2 O principium individuationis como gerador da pluralidade A Vontade como coisa-em-si é completamente diferente de seus fenômenos, ela é livre e alheia ao princípio de razão suficiente, por isso, desconhece também o tempo e espaço que são geradores da pluralidade. Esta pluralidade que é também representada pela expressão principium individuationis. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, II, § 23) 84 Neste sentido, este principium será o propulsor de todo conflito entre os homens, pois fará com que todos se percebam de maneira completamente distinta em relação aos outros, logo, nenhum hesitará em agir egoisticamente, pois o outro sempre lhe parecerá absolutamente diferente de si.85 Por isso, Alves afirma: “O egoísmo essencial, que atravessa a existência de todos os seres, tem sua origem na vontade que se objetiva na pluralidade dos indivíduos. [...] O princípio de individuação é a base de todo egoísmo [...]”.86 Como comenta Barboza, é o principium individuationis que propicia toda injustiça e maldade, pois não permite ao homem perceber sua essência, comum a todos os outros homens. Destarte, esta permanência no principium individuationis designa uma contínua imersão na ilusão, e garante um contínuo sofrimento para si e para os demais.87 Por isso as palavras de Schopenhauer: “[...] TODA VIDA É SOFRIMENTO.” (SCHOPENHAUER, MVR, IV, §56) 88 Portanto, a afirmação da existência que propicia o sofrimento é antes gerada pela imersão no principium individuationis. 2.3 A afirmação da Vontade de vida A manifestação da Vontade não resume-se apenas à conservação do instinto pessoal, tendo em vista que a duração natural de um indivíduo é curta. Logo, a Vontade deseja a vida de forma absoluta e constante, por isso se manifesta através do impulso sexual, permitindo que haja uma série infinita de gerações.8984 Cf. Ibid., p. 171. 85 Cf. MOREIRA, 2011, p. 125. 86 ALVES, José Clerison Santos. Schopenhauer e a recusa da fundamentação racional da moral. 2011. 85 p. Dissertação [Mestrado em Filosofia], Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2011, p. 76. 87 Cf. BARBOZA, 2003, p. 36-37. 88 SCHOPENHAUER, 2005, p. 400. [GRIFO DO AUTOR] 89 Cf. LIMA; SOUZA, 2013, p. 150. 32 A satisfação do impulso sexual é a mais intensa afirmação da Vontade no homem e nos animais. Este impulso vai além do próprio indivíduo, pois resulta na existência de outro. O ato da procriação permite à natureza a sua conservação, pois ela necessita constantemente dos indivíduos para a contínua afirmação da Vontade. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, IV, § 60) 90 Diante do procriador aparece o procriado, o qual é diferente do primeiro apenas no fenômeno, mas em si mesmo, conforme a Idéia [sic], é idêntico a ele. Por conseguinte, esse é o ato mediante o qual as espécies dos viventes se ligam a um todo e, dessa forma, perpetuam-se. A procriação em relação ao procriador, é apenas a expressão, o sintoma de sua decidida afirmação da Vontade de Vida: em relação ao procriado a procriação não é o fundamento da Vontade que nele aparece, visto que a Vontade em si não conhece fundamento nem conseqüência [sic], mas, como toda causa, é tão- somente causa ocasional do fenômeno da Vontade neste tempo e neste lugar. (SCHOPENHAUER, MVR, IV, § 60) 91 Esta nova vida, produto da Vontade, estará condenada a uma vida semelhante a de seu procriador, pois a vida não passa de uma luta incessante contra a miséria. Desta forma, o procriador quando consciente de seu procriado se sacrificará por ele, pois entenderá que sua criatura está condenada ao sofrimento e à dor, e todos os seus sacrifícios terão o intuito de reparar o erro de tê-lo permitido vir à luz sombria da existência.92 Segundo Mann, Schopenhauer serve-se do pecado de Adão93 para designar a condenação que todo homem está sujeito ao vivenciar o ato da procriação. Adão devido à desobediência propiciou a toda humanidade a condenação. Da mesma forma, todo homem devido à procriação estará sujeito à dor e sofrimento.94 Janaway sustenta que o foco primeiro da Vontade sempre será os órgãos genitais, pois neles ela encontra-se de forma veemente, guiando-os irracionalmente. Por isso, o que permite a procriação não é um sentimento de carinho ou afeto entre dois indivíduos, mas antes tão só a força impulsiva da Vontade que conduz esse 90 Cf. SCHOPENHAUER, op. cit., p. 421-422. 91 Ibid., p. 422. 92 Cf. LIMA; SOUZA, 2013, p. 150-151. 93 Para Schopenhauer, a doutrina cristã sabiamente entendeu a figura mitológica de Adão como uma Ideia, no mesmo sentido das Ideias de Platão. Ou seja, todos os homens são semelhantes a Adão, e por isso condenados. Da mesma forma, Schopenhauer em sua teoria entende que todos os homens recebem por herança uma vida incerta mergulhada no sofrimento e dor. [NOTA DO PESQUISADOR] 94 Cf. MANN, 1951, p. 187. 33 encontro. Por isso, nunca haverá uma intenção particular entre indivíduos para a procriação, mas antes a motivação irracional da Vontade impelindo-os a tal ato.95 Neste sentido, a Vontade impulsiona com todas as forças o homem e o animal à propagação. Mas, depois que a natureza alcança seu objetivo através dos indivíduos, coloca-se por inteira indiferente a eles, pois o que interessa é tão somente a conservação da espécie, o indivíduo é nulo. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, IV, § 60) 96 Entretanto, por ser a Vontade a essência do homem, este mesmo sofrendo, acredita que sua vida é um bem supremo, pois sempre é impelido a conservar sua existência. Mas, Schopenhauer evidencia que a vida do homem termina tão logo que jamais se poderá esperar uma vida eterna, tendo em vista que todos estão fadados à morte. Esta corresponde ao cessar cerebral, a perda definitiva da consciência, deixando a matéria de seu fenômeno a qualquer outra Ideia. O que permanece é apenas sua essência, a própria Vontade.97 Entretanto, esta correspondência à Vontade, ao afirmá-la a partir da satisfação dos desejos bem como da procriação, propiciará ao homem uma vida repleta de dor e sofrimento, pois estará imerso numa contínua insatisfação. 2.3.1 A vida humana enquanto sofrimento Para Schopenhauer, a vida do homem é um morrer constante, uma queda do presente no passado que não existe mais. Aquilo que garante a existência é o presente, pois o passado não mais existe, e o futuro é incerto; mas devido à racionalidade, o homem apega-se mais ao passado e ao futuro, do que no próprio presente, resultando um maior sofrimento. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, IV, § 57) 98 Segundo Barboza, a afirmação da Vontade é que propicia todos os sofrimentos. Todos os desejos são contínuos, logo, não existem para serem satisfeitos apenas uma vez. Além disso, para cada desejo satisfeito existem pelo menos dez que ainda não foram, ou seja, a vida é uma contínua carência, sempre uma constante necessidade.99 95 Cf. JANAWAY, 2003, p. 78-79. 96 Cf. SCHOPENHUAER, 2005, p. 424. 97 Cf. SCHOPENHUAER, Arthur. Metafísica do amor, Metafísica da morte. Tradução de Jair Barboza. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 69. 98 Cf. Id., 2005, p. 401. 99 Cf. BARBOZA, 2003, p. 37. 34 Desta maneira, Santos sustenta que para Schopenhauer, a Vontade é a precursora de todo sofrimento da vida, pois corresponde a um desejo cego, irresistível, o que ela quer é sempre a vida, isto é, a sua manifestação visível.100 Mas o homem nesta busca do prazer não pode escapar de seu inevitável destino, a morte. E esta já dá sinais à vida através dos mais diversos sofrimentos. A vida é frágil, e geralmente é cuidada o mais longamente possível, assemelhando-se a alguém que sopra uma bolha de sabão, mesmo tendo a absoluta certeza que ela estourará. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, IV, § 57) 101 Porém, Mann afirma que é possível num determinado momento não haver objeto a ser desejado, quando uma satisfação apoderou-se rapidamente de determinado homem, desta forma, o homem é imediatamente dominado por um grande vazio, sua vida está à mercê do tédio.102 Sua vida, portanto, oscila como um pêndulo, para aqui e para acolá, entre dor e o tédio, os quais em realidade são seus componentes básicos. [...] O homem como objetivação perfeita da Vontade, é [...] o mais necessitado de todos os seres. Ele é querer concreto e necessidade absoluta, é uma concretização de milhares de necessidades. [...] A vida da maioria das pessoas é tão-somente uma luta constante por essa existência mesma, com a certeza de ao fim serem derrotadas. (SCHOPENHAUER, MVR, IV, § 57) 103 Estas palavras de Schopenhauer segundo Dambros apresentam a vida enquanto ilusão que acaba em desilusão, um estado de maravilhamento que termina em decepção. No início, a vida mostra-se enquanto detentora de toda felicidade, mas em seu fim vê-se sua crueldade e a ilusão de qualquer felicidade real ou duradoura.104 100 Cf. SANTOS, Élcio José dos. Algumas considerações sobre a questão do suicídio na filosofia de Arthur Schopenhauer. Voluntas: estudos sobre Schopenhauer. Curitiba: Sociedade Schopenhauer do Brasil: USP; UFRJ; PUCPR, v. 1, n. 2, p. 23-32, 2010, p. 24. 101 Cf. SCHOPENHAUER, 2005, p. 401. 102 Cf. MANN, 1951, p. 180-181. 103 SCHOPENHUAER, op. cit., p. 402-403. 104Cf. DAMBROS, Eli Berto. Schopenhauer e a sabedoria “para a vida no mundo”. Revista Voluntas: estudos sobre Schopenhauer. Curitiba: Sociedade Schopenhauer do Brasil: USP; UFRJ; PUCPR, v. 5, n. 1, p. 143-153, 2014, p. 146. 35 Como comenta Zampieri, a vida é constituída de dor e sofrimento, e se os homens tivessem consciência de seu existir, não saudariam os outros com elogios, mas apenas os considerariam como infelizes companheiros de miséria.105 Sobre o palco, um desempenha o papel de príncipe, outro, o de conselheiro, um terceiro, o de servo, ou de soldado, ou de general e assim por diante. Mas tais diferenças existem só na exterioridade. Na interioridade, como núcleo de tal fenômeno, o mesmo encontra-se igual em todos: um pobre comediante, com seus flagelos e suas necessidades. 106 Ademais, Schopenhauer afirma que aquilo que garante a sobrevivência do homem não é tanto amor à vida, mas temor à morte. Porém, é em vão crer no afastamento da morte, pois a vida é um mar cheio de empecilhos, e mesmo que o homem procure vencê-los, ainda assim aproxima-se o inevitável naufrágio, que é a morte. (Cf. SCHOPENHAUER, MVR, IV, § 57) 107 2.3.2 A ilusão da felicidade Schopenhauer entende que a crença na felicidade é ilusão. Há somente um erro inato: é aquele que consiste em crer que nós existimos para sermos felizes. [...] Enquanto persistirmos neste erro inato, que ainda nos é confirmado pelos dogmas otimistas, o mundo parecerá cheio de contradições. Porque em cada etapa, tanto no conjunto como no detalhe, nós devemos sentir pela experiência que o mundo e a vida de forma alguma se dispõem a comportar uma existência feliz. 108 Schopenhauer ainda afirma em sua obra Dores do mundo (1836) que “Se a nossa existência não tem por fim imediato a dor, poderia dizer-se que não tem razão 105 Cf. ZAMPIERI, Gilmar. Metafísica e sofrimento, da Morte e do Amor em Schopenhauer. Publicações da ESTEF. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana, v. 1, n. 1, p. 01-15, abr. 2011, p. 9. 106 SCHOPENHAUER, Arthur. Aforismos para a sabedoria de vida. Tradução de Jair Barboza. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 6. 107 Cf. Id., 2005, p. 403. 108 LIMA, Felipe Cardoso Martins; SOUZA, Marcelo Prates de. Tradução do capítulo 49 do tomo II (Suplementos) de o mundo como vontade e representação. A ordem da salvação. Revista Voluntas: estudos sobre Schopenhauer. Curitiba: Sociedade Schopenhauer do Brasil: USP; UFRJ; PUCPR, v. 4. n. 1. p. 182-188, 2013, p. 182. 36 alguma de ser no mundo. Porque é absurdo admitir que a dor sem fim que nasce da miséria inerente à vida e enche o mundo, seja apenas um puro acidente [...]”.109 A vida do homem é uma contínua luta, e a própria história não pode esconder seus principais acontecimentos, inúmeras guerras, mortes e atrocidades geralmente movidas por sentimentos egoístas. Quanto à paz, resume-se em pequenas interrupções entre tais atrocidades; de forma geral, todos estão sujeitos à guerra e morrerão sem poder defender-se. (Cf. SCHOPENHAUER, P&P, XII, § 150)110 Desta forma, Schopenhauer procura evidenciar a situação do homem: Semelhantes aos carneiros que saltam no prado, enquanto, com o olhar, o carneiro faz a sua escolha no meio do rebanho, não sabemos, nos nossos dias felizes, que desastre o destino nos prepara precisamente a essa hora, - doença, perseguição, ruína, mutilação, cegueira, loucura [...] Ao tormento da existência vem ainda juntar-se a rapidez do tempo, que nos inquieta, não nos deixa respirar, e se conserva atrás de cada um de nós como um vigia dos forçados de chicote em punho.111 Portanto, Schopenhauer evidencia que a vida como habitualmente é sustentada, não é constituída de alegria, mas por carências, esforços e aflições, e sempre coberta pelo sentimento de insegurança. Tal constituição é tão forte que parece impensável um mundo cheio de felicidades; e se fosse possível conduzir qualquer homem a este mundo utópico, provavelmente o tédio lhe tomaria levando-o à morte. (Cf. SCHOPENHAUER, P&P, XII, § 152) 112 2.3.2.1 A refutação à visão otimista de mundo Segundo Zampieri, quando o homem idealizou o inferno, encheu-o de todas as dores e tormentos possíveis, pois devido suas inúmeras experiências facilmente poderia imaginar um lugar atemporal fadado ao sofrimento, mas quando idealizou o céu não encontrou mais que aborrecimento para lhe proporcionar conteúdo.113 109 SCHOPENHAUER, Arthur. Dores do mundo. 4. ed. Trad. José Souza de Oliveira. São Paulo: S. A, 1960, p. 5. 110 Cf. SCHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e representação III; Crítica da filosofia kantiana; Parerga e Paralipomena, V, VIII, XII, XIV. Tradução de Wolfgang Leo Maar, Maria Lúcia Melo Oliveira Cacciola. São Paulo: Abril Cultural, 1980. (Os Pensadores), p. 278. 111 SCHOPENHAUER, 1960, p. 6-7. 112 Cf. SCHOPENHAUER, 1980, p. 279. 113 Cf. ZAMPIERI, 2011, p. 8. 37 Schopenhauer entende o mundo semelhante à ideia de inferno, realidade imaginária que não passa de uma reprodução deste mundo, e mesmo que não haja um criador para tal mundo, mais facilmente se poderia acreditar que este é habitado por um demônio. E, para que se entenda mais facilmente a vida, é necessário que ela seja entendida como um local de expiação, uma espécie de instituição penal. Por isso, na prática vê-se certa dificuldade em afirmar este mundo como o melhor dos mundos possíveis.114 Segundo Lefranc, ao afirmar este mundo como o pior dos mundos possíveis, Schopenhauer tem como intenção contrariar a afirmação de Leibniz115 de que o mundo é o melhor dos mundos possíveis. Por isso, o filósofo de Dantzig faz um convite para aqueles que comungam deste otimismo leibniziano em demasia, identificando que a miséria mesmo que por vezes ignorada encontra-se continuamente neste mundo.116 [...] se se quisesse conduzir o otimista mais endurecido aos hospitais, aos lazaretos e aposentos de torturas cirúrgicas, às prisões, aos lugares de suplícios, às pocilgas dos escravos, aos campos de batalha e aos tribunais criminais, se se lhe abrissem todos os antros sombrios onde a miséria se acolhe para fugir aos olhares de uma curiosidade fria, e se por fim o deixassem ver a tôrre [sic] de Ugolino117, então, com certeza, também acabaria por reconhecer de que espécie é êste [sic] melhor dos mundos possíveis.118 114 Cf. SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de insultar. Organização de Franco Volpi. São Paulo: Martins Fontes, 2003, [s. p.] 115 Leibniz nasceu na Alemanha, em 1646 e morreu em 1716. Foi um grande filósofo, matemático e historiador. Sua filosofia está centrada em Deus, que é a Mônada suprema, origem de todas as outras mônadas. Em relação ao mundo, Leibniz afirma que, por ele ter sido criado por Deus, é o melhor dos mundos possíveis. [LOGOS Enciclopédia Luso-Brasileira de Filosofia. São Paulo: Verbo. 1991. 3 v., p. 295-296.] 116 Cf. LEFRANC, 2011, p. 38. 117 “Conde Ugolino da Gherardesca, originalmente de família gibelina era, junto com o seu neto Nino dei Visconti, um dos líderes guelfos que exerciam a sua autoridade sobre a cidade de Pisa. Ugolino estava insatisfeito em ter que dividir o poder com Nino, então, traiu seu partido e aliou-se ao arcebispo Gibelino Ruggieri dos Ubaldini. Juntos, eles tramaram a expulsão ou prisão de todos os seguidores de Visconti e Ugolino
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