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CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS – FMU CURSO DE DIREITO “THE FRUITS OF THE POISONOUS TREE” ANÁLISE DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL, COM ÊNFASE NAS PROVAS ILÍCITAS E A TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. FÁBIO APARECIDO SILVA RA: 815379-6 TURMA: 3108A02 FONE: 011 9 4024-7515 E-MAIL: FABIOSILVA.TV@GMAIL.COM SÃO PAULO - SP 2017 CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS – FMU CURSO DE DIREITO FABIO APARECIDO SILVA – RA 815379-6 “THE FRUITS OF THE POISONOUS TREE” ANÁLISE DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL, COM ÊNFASE NAS PROVAS ILÍCITAS E A TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. Monografia a ser apresentada à Banca Examinadora do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas-FMU, como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob orientação do Prof. Fábio Gallinaro. SÃO PAULO – SP. 2017 FÁBIO APARECIDO SILVA “THE FRUITS OF THE POISONOUS TREE” ANÁLISE DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL, COM ÊNFASE NAS PROVAS ILÍCITAS E A TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. Monografia a ser apresentada à Banca Examinadora do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas-FMU, como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob orientação do Prof. Fábio Gallinaro. São Paulo, ___/___/___ Resultado da Avaliação: ____________ Nota: ____ (______________________) BANCA EXAMINADORA ________________________________________ Prof. Fábio Gallinaro ________________________________________ Professor Arguidor ________________________________________ Professor Arguidor FICHA CATÁLOGRÁFICA SILVA, Fábio Aparecido. “The fruits of the poisonous tree” - Análise das Provas no Processo Penal, com ênfase nas provas ilícitas e a Teoria dos frutos da árvore envenenada. DEDICATÓRIA Dedico meus anos de estudos e este trabalho a Bruno de Oliveira Gonçalves, que nos deixou em 22 de março de 2009. Foi meu melhor amigo, irmão, companheiro, e eterno grande primeiro amor. AGRADECIMENTOS Nenhuma nação será próspera e feliz sem os professores, meus verdadeiros heróis, pessoas estas que me inspiram, me orientam e ensinam com tanta dedicação. Em especial à Maria Silvia Aguiar, grande mestra e acolhedora, e ao meu orientador, Fabio Gallinaro. Aos familiares: minha mãe Selma, irmãs Flávia e Luciana, sobrinhos Gabrielle, Grazielle, Daniel e Gabriel; aos amigos e militância do Movimento de Juventude e Estudantil. Obrigado pelo apoio e por sempre acreditarem no meu potencial. Gratidão! SINOPSE O presente trabalho tem o objetivo de demonstrar, através de fatos substanciais, que a justiça moderna e a democracia são diretamente ameaçadas pelo uso de provas ilícitas em virtude da busca da verdade real do processo, e isto balança as instituições, tanto no seu fortalecimento ou enfraquecimento. As instituições são entes importantes para a sustentação do sistema, seja em um país em surgimento, renascimento ou em maturação. São elas, as instituições, os agentes responsáveis pela estabilização e progresso de um povo. O estratagema do tema colocado é o de pontuar de que forma o fortalecimento das instituições das provas no processo auxiliará a construção de um Estado Democrático de Direito na busca por um judiciário justo, e por isso, faremos os questionamentos pertinentes à matéria apreciada: quais ferramentas são imprescindíveis para se atingir tal objetivo? Tomando por inspiração a máxima “mais importante até que as próprias respostas, devemos observar quais são as perguntas a serem feitas”, é que vamos a campo analisar os elementos históricos que nos trouxeram até aqui, e buscar então a compreensão sobre como os dogmas jurídicos se tornaram essenciais ou não para a manutenção do Estado. É então indispensável um olhar sensível sobre o positivismo, não somente pela a forma como ele se estruturou para trazer a segurança jurídica às relações humanas, mas sobretudo no que tange a relação entre o Estado e o homem. Entretanto, esta janela será aberta com muito cuidado, pois a teoria pura do Direito não pode ofuscar o real objeto desta narrativa – os estudos doutrinários, que neste caso são usados como uma luminária para elucidar os ditames contemporâneos que cercam as provas no processo penal. ABSTRACT This work aims to demonstrate through both substantial facts and by virtue of the search for real truth in legal proceedings that modern justice and democracy are directly threatened by the use of illicit evidence and that this search creates balance in institutions, whether they be strengthening or weakening . Institutions are important entities when it comes to sustaining a system, be it of an emerging, resurging or mature nation. Institutions are the agents responsible for the stabilization and progress of a people. The idea for this theme is to point out how the strengthening of the institution of evidence in a legal process will help in the construction of a Democratic State of Law which seeks to build a fair judicial system. Therefore, we will pose the pertinent question related to the matter at hand: which tools are essential to achieve this goal? Using the maxim "more importantly than the answers themselves, we must observe the questions to be asked," as inspiration, we are heading to the field to analyze the historical elements that have brought us to our current point and then seek to understand how legal dogmas have become essential, or not, for the maintenance of the State. It is therefore indispensable to have a sensitive view of positivism, not only because of the way in which it was structured to bring legal security to human relations, but especially in regards to the relationship between the State and man. However, this window will be opened very carefully, since the pure theory of law cannot overshadow the real mission of this narrative - doctrinal study, which will, in this case, be used as a lamp to elucidate the current dictates surrounding evidence in criminal proceedings. Sumário 1. CONCEITO .............................................................................................................................. 3 2. OBJETO ................................................................................................................................... 4 3. FONTES E MEIOS DE PROVA ............................................................................................. 6 4. FINALIDADE DA PROVA .....................................................................................................10 5. CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS ........................................................................................116. APRECIAÇÃO DA PROVA E FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA .......................................14 6.1. Sistema da íntima convicção......................................................................................14 6.2. Sistema da prova tarifada. ..........................................................................................15 6.3. Sistema do livre convencimento motivado .............................................................17 7. ÔNUS DA PROVA .................................................................................................................20 8. PROVAS ILÍCITAS ................................................................................................................23 8.1. Provas ilícitas na Lei 11.690/2008 ..............................................................................26 8.2. Formas de produção prova ilícita. .............................................................................27 8.3. Prova emprestada .........................................................................................................28 8.4. Princípio da proporcionalidade..................................................................................28 9. “FRUITS OF THE POISONOUS TREE” – A TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA ..............................................................................................................................29 9.1. Fonte independente......................................................................................................31 9.2. Descoberta inevitável...................................................................................................33 9.3. Teoria do Nexo Causal Atenuado ..............................................................................34 CONCLUSÃO ................................................................................................................................37 1 INTRODUÇÃO As leis surgiram no intuito de estabelecer uma regulamentação entre as relações humanas, trazendo segurança ao vínculo entre as partes, aplicando então uma camada de legitimidade institucional advinda do Estado. Isto ocorreu após o período em que se imperavam as Leis Naturais, onde a busca por paz, produção e consumo de alimentos, eram matérias de suas preocupações primárias. Nesta época, o agente catalizador comum era o medo, levando em consideração que todos os homens eram, de fato iguais, e sua força bruta eram um fator de sobreposição de um sobre o outro, o que trazia um clima de insegurança generalizado. Por outro lado, isto fortaleceu o laço entre os homens. Este estreitamento deu surgimento a Sociedade Civil. O desdobramento desta ação foi a desigualdade entre os homens, já que na sua forma de se organizar, estabeleceu-se castas, o que deu início de conflitos entre os povos, que na busca pelo poder de dominar, distanciou o elo de ligações entre o princípio básico da razão daquele modelo de sociedade existir: trazer segurança e paz entre os homens. Para pacificar estes novos conflitos, criaram-se as Leis Civis, ocupando o espaço do Direito das Gentes, que prevê a relação entre os povos, o Direito Político, que prevê as leis em relação ao governante e governado, na sua forma o governo; e o Direito Civil, que prevê leis em relação aos próprios cidadãos entre eles, o que dá sustentação ao governo. Para Montesquieu, não é o povo que deve se enquadrar nas Leis, mas são as Leis que precisam respeitar a soberania do povo, sua história e suas tradições. E a instituição que dá poder ao povo, neste caso, é o legislativo. Para Montesquieu, existem três formas de governo: Despotismo, República e Monarquia. A concepção da República nasceu após a constatação da necessidade de regular o poder do Estado, que antes estava concentrado nas mãos de um único ente. A fragmentação deste poder através de três instituições, buscou trazer um maior equilíbrio na gestão da vida em sociedade, dando então o surgimento da teoria tripartide, onde o Executivo, Legislativo e Judiciário são poderes independentes e harmônicos entre si. 2 A natureza republicana está em governar para muitos. Este desafio exige uma completa dedicação do Estado na busca pela eficiência na prestação de serviços à população e sua autogestão. Trata-se de um modelo de Estado em que existe uma grande dificuldade para se governar, pois a burocracia é um dos instrumentos condutores da organização estatal. Entretanto, apesar deste enorme obstáculo, a república democrática é sem dúvida o melhor modelo político existente, porque dá poderes limitados e permite um maior controle social por parte da população as necessidades gerais interpostas. A fim de basilar estes princípios, é que busca-se a definição dos três pressupostos republicanos, que são: Liberdade, espírito que preza a participação política; Igualdade, espírito que busca a equidade garantida pelas leis; e a Fraternidade, espírito este que persegue o bem coletivo mais importante que o bem particular. Daí a necessidade de se analisar o espírito das leis, para compreender melhor de que forma é possível dar o fortalecimento das instituições para se atingir o objetivo da construção do Estado Democrático de Direito, que é um processo cíclico, que necessariamente não precisa ser progressista, mas depende quase que exclusivamente da virtude republicana, ideal este que preza principalmente pelo amor à pátria. É esta análise da conjuntura histórica e jurídica que nos traz ao cerne do debate: os preceitos debatidos até aqui são bases essenciais para valorar o contraditório na apresentação das provas, onde cabe a discricionariedade do magistrado, a função de avaliar os interpretes dispositivos capazes de assegurar, de forma inquestionável, a propositura exposta, que em toda sua concepção e finalidade teve um só objetivo: a busca pela verdade processual. 3 1. CONCEITO “Non quod est in actis non est in mundo” (O que não está nos autos, não está no mundo)1. A prova é o meio pelo qual é possível apresentar os fatos ou atos que irão posteriormente lhe dar um direito. É o instrumento inserido no processo por uma de suas partes, com o objetivo real de provar a culpa ou inocência do réu, mostrando a verdade sobre os fatos alegados. É substancial no direito das partes a apresentação da provas, e este direito é exercido no momento em que o meio comprobatório da ação é apresentada no processo. Para Renato Brasileiro, é importante firmarmos algumas premissas terminológicas: A palavra prova tem a mesma origem etimológica de probo (do latim, probatio e probus), e traduz as ideias de verificação, inspeção, exame, aprovação ou confirmação. Dela deriva o verbo provar, que significa verificar, examinar, reconhecer por experiência, estando relacionada com o vasto campo de operações do intelecto na busca e comunicação do conhecimento verdadeiro.2 Ao provocar o Estado a sair de sua inércia, parte-se do princípio que o agente tutor do direito violado tenha imputado ao réu a ação que resulte na violação do sistema jurídico. Portanto, o acusador precisa estar calçado sobre um ou mais de um fato concreto. A finalidade da prova é, destarte, dar base para o convencimento da autoridade judiciária, onde o Juiz precisa esgotar todas as perspectivas para se obter a verdade real dos fatos, para servir de fundamento na sentença. É importante esclarecer que não basta que o Estado garanta o direito de ação, sem observar que a outra parte venha a ter meios de utilizar provas imprescindíveis para que, diante do magistrado, consiga contestar as alegaçõeserigidas no curso do processo. 1 EXPRESSÕES EM LATIM, Dizer Direito. Disponível em: http://dizerdireito.blogspot.com.br/p/expressoes-em-latim-quod-non-est-in.html. Acesso em: 10. mar. 2017. 2 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal (Vol. Único). 2ª. ed. 3ª tiragem – São Paulo: Editora juspodvm, 2014. p 549. 4 2. OBJETO No momento em que o litígio é posto para apreciação do poder judiciário, a prova torna-se o instrumento de esclarecimento acerca o bem tutelado. Os fatos, primários ou secundários, tem o poder de incriminar o réu. É a prova, portanto, o objeto de apreciação sobre a alegação a respeito deste fato, onde será necessário apresenta-los ao juiz, afim de que ele dê um desfecho a história, pois será na busca pelo processo que se fará a reconstrução escatológica da lide. Mougenot define: "a prova tem como finalidade permitir que o julgador conheça o conjunto sobre os quais fará incidir o direito"3. Há fatos que não podem ser objetos de prova: - Irrelevante: embora possa até vir a ser considerado primordial na ótica subjetiva da parte que o apresenta, esta prova é impertinente, não tem a capacidade ou o peso suficiente para influenciar ou convencer a inocência ou culpa do réu perante ao magistrado. Simplesmente não contribuem para nada. - Notório: São fatos em que qualquer pessoa de intelecto mediano sabe, como dia 25 de dezembro ser Natal, porém, há situações em que embora o fato seja de conhecimento popular a nível regional ou nacional, há casos em que a notoriedade possa a ser relativa, cabendo então produzir provas, caso ela se esmaeça. - Axiomáticos: por ser algo tão óbvio, dispensa por completo a assistência pericial. É uma situação que indispõe a produção de provas, como por exemplo: chegar ao entendimento de que o álcool causa embriaguez, que um corpo em estado de decomposição significa a morte. Em casos de morte violenta, em caráter de exemplo, um caminhão atropela um motociclista e seu corpo é espalhado em pedaços pela via, dispensa-se exame cadavérico para atestar a morte da vítima. 3 BONFIN, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 7ª. ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. p 304. 5 - Impossíveis: são alegações que contrárias as leis da ciência ou leis naturais, como por exemplo, homem grávido, o réu fugir voando em uma bicicleta, etc. - Incontroversos: fato alegado não contestado é tido como verdadeiro. - O Direito não é objeto de prova: Presume-se que o juiz esteja sapiente acerca da lei, entretanto existem ressalvas: • As leis estaduais e municipais; • Os regulamentos e portarias; • Consuetudinário; • Legislação alienígena. - Presunção Legal: quando há expressa regulamentação legal sobre o fato, como no caso da inimputabilidade ao menor de dezoito anos. 6 3. FONTES E MEIOS DE PROVA O fato ilícito concebe um fenômeno processual – gera a fonte da prova. São indivíduos, coisas ou objetos que compõe o cenário no momento da atividade delituosa. Esta ação passa então a ser classificada de duas maneiras: - Fontes pessoais: ofendido, peritos, acusado e testemunhas; - Fontes reais: documentos, em concepção vasta. Segundo o doutrinador Renato Brasileiro o ato ilícito tem esta definição: Cometido o fato delituoso, tudo aquilo que possa servir para esclarecer alguém acerca da existência desse fato pode ser conceituada como fonte de prova. Derivam do fato delituoso em si, independentemente da existência do processo, ou seja, são anteriores ao processo, sendo que sua introdução no processo se dá através dos meios de prova.4 Para ilustrar a explicação, imagine o seguinte: o ladrão invade um banco a mão armada e rende a operadora do caixa. Funcionários e clientes que vivenciaram aquele momento, passam então a ser qualificadas como fontes de prova. Intimadas, seu depoimento será analisado pela autoridade judiciária, dando então início ao processo pelos meios de prova, o que será neste caso, através da prova como testemunha. Já os meios de prova, é o instrumento pelo qual as fontes de provas são inseridas no processo, tratando-se, portanto, de uma atividade endoprocesual (é tudo aquilo que está dentro do processo). Esta sequência de atividades acontece com o a ciência do magistrado e a participação e conhecimento das partes, onde a finalidade será a sujeição destes dados probatórios no processo. Existe uma diferença importante aos momentos em que tudo acontece: as fontes de prova são precedentes ao processo e extraprocessuais, já os meios da prova somente existem no processo. Logo, é importante registrar que o meio da prova abrange quaisquer coisas que venham a ser úteis a trazer 4 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal (Vol. Único). 2ª. ed. 3ª tiragem – São Paulo: Editora juspodvm, 2014. p 554. 7 a verdade ao processo, no objetivo de formar o conhecimento do juiz acerca do que foi alegado pelas partes, e isto pode acontecer de maneira direta ou indireta. Os meios de prova podem ser: • Nominados: é todo meio de prova previsto na legislação, podem ser documentos, interrogações, gravações de chamadas de telefone, acareações, reconhecimento de indivíduos, coisas ou objetos. • Inominados: é o meio de prova não previsto de forma clara na legislação, podem ser vídeos filmados com o celular, conversa de WhatsApp, printscreen de postagem no Facebook, ou qualquer meio similar em que a parte é identificada como agente causador de determinada ação. O artigo 332 do Código de Processo Civil dispõe que “todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa”. A perícia do local do crime (artigo 169 do Código de Processo Penal), a confissão (artigo 197 do Código de Processo Penal) e o depoimento do ofendido (artigo 201 do Código de Processo Penal) são exemplos de meios de prova. Os meios de prova, desse modo, podem ser os moralmente legítimos ou os tipificados em lei, sendo estes nomeados como provas inominadas. Por não haver limites para os meios de prova no processo penal pátrio devido a busca da verdade real, a fase de investigação poderá ser extensa, preservando o princípio pela procura da veracidade, afim de se lograr qualquer indício de autoria e circunstância do crime. Entretanto, este direito não é absoluto, pois o princípio da liberdade probatória pode sofrer algumas ressalvas, como por exemplo no uso de provas ilícitas. Esta fronteira visa manter saudável a mácula processual, e torna-se inadmissível no processo o uso delas, devendo o magistrado desentranhá-la do processo. Um estudo mais profundo sobre provas ilícitas será apresentado mais adiante, o qual é o tema central desta monografia. 8 Os meios de investigação ou obtenção da prova são conseguidos por meio de procedimentos regidos pela legislação, afim de se obter provas materiais. Pode ser feito por ofício (a pedido do Juiz), Ministério Público ou por uma das partes. A busca pessoal ou domiciliar deve ser entendida como meio de investigação, considerando que sua finalidade não é a obtenção de materiais comprobatórios, mas sim de fontes materiais de prova. Neste caso, os meios de investigação devem ser produzidos sem comunicaçãoà parte oposta, tendo o efeito surpresa como considerável trama peculiar, procurando manter imaculada as provas que foram concebidas no momento da ilicitude. É neste momento que há uma discrepância dos meios de prova, em contraponto que para estes, é necessária a primazia pelo contraditório, onde se implica a ciência sobre a produção de certa prova, tanto quanto pela sua concreta participação em sua concepção. Gustavo Badaró, nos ensina em seguida, a diferença entre meios de obtenção de prova e a fonte da prova: A testemunha de um fato é a fonte de prova, enquanto suas declarações em juízo são o meio de prova. O documento é uma fonte de prova, a sua incorporação ao processo é o meio de prova. O livro contábil é a fonte de prova, enquanto a perícia contábil é o meio de prova.5 A diferenciação sobre o que são os meios de prova e o que são os meios de obtenção destas, traz a luz fatores essenciais quando se faz uma análise acerca dos desdobramentos e possíveis irregularidades que podem acontecer na ocasião da produção das provas. Quando apontados, tais anomalias que maculam o processo, a ação prezada deve ser a de anular a prova produzida, devendo ela ser encarada como inadmissível no processo, por sua concepção ter violado os princípios relacionados a sua obtenção. Deve-se então solicitar ao Juiz, se este não agir por ofício, que desentranhe a prova do processo. 5 BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 166. 9 Seguindo a doutrina do professor Renato Brasileiro, em síntese, podemos trabalhar com o seguinte quadro6 comparativo entre os meios de obtenção de prova e os meios de prova: Meios de obtenção da prova Meios da prova Em regra, são executados na fase preliminar de investigações, o que não afasta a possibilidade de execução durante o curso do processo, de modo a permitir a descoberta de fontes de prova diversas das que serviram para a formação da opinio delicti; Em regra, são realizados na fase processual da persecução penal; excepcional mente, na fase investigatória, observado o contraditório, ainda que diferido (ex: provas antecipadas); São atividades extraprocessuais; São atividades endoprocessuais; São executados, em regra, por policiais aos quais seja outorgada a atribuição de investigação de infrações penais, geralmente com prévia autorização e concomitante fiscalização judiciais; Consistem em atividades desenvolvidas perante o juiz competente, valendo lembrar que o juiz que presidir a instrução deverá, pelo menos em regra, julgar o feito (inciso 2, do artigo 399 do Código de Processo Penal); São praticados com fundamento na surpresa, com desconhecimento do (s) investigado (s); São produzidos sob o crivo do contraditório, com prévio conhecimento e participação das partes; Se praticados em desconformidade com o modelo típico, há de ser reconhecida sua ilicitude, com o consequente desentranhamento dos autos do processo. Se praticados em desconformidade com o modelo típico, são sancionados, em regra, com a nulidade absoluta ou relativa. 6 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal (Vol. Único). 2ª. ed. 3ª tiragem – São Paulo: Editora juspodvm, 2014. p 556. 10 4. FINALIDADE DA PROVA A finalidade da prova é trazer ao processo elementos suficientes para formar o convencimento do magistrado, afim de que ele, no papel de destinatário, possa dar a sentença. É neste caso se aplica a máxima do brocardo: “dê-me os fatos que te darei o Direito”. O percurso para a formação da convicção do julgador, vem na missão de, perante o tribunal, reconstruir, de certa forma, os acontecimentos que levaram o êxodo da ação delituosa. O inquérito da fase extraprocessual tem o conciso objetivo de se aproximar ao máximo dos fatos reais, pois a busca incansável pela verdade processual é o instrumento que irá nortear a sentença. O princípio da legalidade e da anterioridade diz que: “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Para sancionar uma punição, é preciso que os fatos ilícitos tenham incidência sob as normas preestabelecidas, para que assim que tenha um resultado com implicações jurídicas. Quando há então um caso concreto, é preciso que o magistrado tenha ciência sob os fatos antijurídicos no qual a lei deverá ser aplicada. Para tanto, a prova também tem o objetivo de possibilitar que o juiz avalie os fatos sobre os quais irá incidir o direito. Mascardo define a prova como a “alma do processo” e a “sombra que acompanha o corpo”, o devido proposito real do processo de conhecimento é o da produção das provas, com o objetivo de dar compreensão ao tribunal sobre os fatos, dando a ele o poder de aplicar a sua jurisdição. 11 5. CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS Conforme o gráfico acima, as provas são classificadas quanto ao objeto, valor, sujeito e forma. Segundo Fernando Capez, são fatos cuja existência carece de ser demonstrada. Do objeto, pode ser direta ou indireta, do qual podemos afirmar: I - Direta. Trata-se de um fato imediato, refere-se diretamente ao tema probandu, como o flagrante, a confissão, prova testemunhal ou o corpo de delito. É a prova que por sí só, demonstra o fato controverso. Para Renato Brasileiro, a “Prova direta é aquela que permite conhecer o fato por meio de uma única operação inferencial” e cita um exemplo: Nessa linha, se a testemunha diz que presenciou o exato momento em que o acusado desferiu disparos de arma de fogo contra a vítima, é possível concluir, com um único raciocínio, que o acusado é o autor das lesões produzidas no ofendido.7 7 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal (Vol. Único). 2ª. ed. 3ª tiragem – São Paulo: Editora juspodvm, 2014. p 557. Classificações relevantes das provas QUANTO AO OBJETO Direta Ex.: flagrante, a confissão, corpo de delito. Indireta. Ex.: álibi; indícios QUANTO EFEITO OU VALOR Plena – juízo de certeza (exigida para a condenação) Não plena – juízo de probabilidade (oferecimento e recebimento da inicial acusatória; prisões provisórias) 12 II - Indireto. Refere-se indiretamente ao tema probandu. Para Mougenot, é “fato do qual se infira, por dedução ou indução, a existência do fato que se busque provar”8. Pode ser a apresentação de um álibi, suspeitas ou presunções. Considera-se indireta porque para se alcançar um desfecho do fato que se faça necessário comprovar, é preciso laborar, no mínimo, duas operações inferenciais: Em um primeiro momento, a partir da prova indireta produzida, chega à conclusão sobre a ocorrência de um fato, que ainda não é o fato a ser provado. Conhecido esse fato, por meio de um segundo procedimento inferencial, chega ao fato a ser provado.9 Do sujeito ou causa, podemos afirmar: I – Real: Trata-se de provas consistentes, capazes de corroborar a sucedida afirmação. É o que foi obtido dos vestígios deixados pelo crime, ex.: o local, o corpo, revólver, etc. II – Pessoal: É quando a origem da prova advém da emanação de uma pessoa, como o interrogatório ou a testemunha. “Consistente em afirmações pessoais e conscientes, como as realizadas por declaraçãoou narração do que se sabe (o interrogatório, os depoimentos, as conclusões periciais)10 ”. Do valor da prova, podemos afirmar: I – Plena: a prova plena é o que impele a um raciocínio de convicção, é a prova pertinente para a formação de um juízo na certeza do espírito do julgador, porquanto atinge o momento em que basta para cessar a controvérsia. II – Não plena: é imperfeita, incompleta, pois é quando se trata apenas de probabilidades, indícios, onde não há certeza dos fatos. Não é, por si só, o bastante para provar a existência de um fato, ao ponto que possa levar o magistrado a pronunciar a sentença. Damásio de Jesus, sintetiza da seguinte forma: 8 BONFIN, Edilson Mougenot. Curso de Processo Penal. 7ª. ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. p 458. 9 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal (Vol. Único). 2ª. ed. 3ª tiragem – São Paulo: Editora juspodvm, 2014., p 558. 10 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 19ª. ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. p 394. 13 • Prova Plena: é a prova que conduz a um juízo de certeza. • Prova Não Plena: é a prova que conduz a um juízo de probabilidade. Para a decisão de pronúncia, aceita-se a prova não plena, mas para a condenação é necessária a prova plena.11 11 JESUS, Damásio. Apostila do Curso de Processo Penal. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/159264864/Curso-Damasio-Direito-Processual-Penal-pdf. Acesso em: 26 mar. 2017. 14 6. APRECIAÇÃO DA PROVA E FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA Rege no sistema processual do Brasil o princípio do livre convencimento motivado, onde o juiz tem liberdade para imputar valor à prova produzida do processo, mas respeitando os parâmetros lógicos e racionais, e fundamente a razão que o convenceu de tomar a resolução. A dualidade deste sistema se apresenta na forma como o exame das provas vem em busca de mesclar a liberdade de quem julga com o princípio da ética e transparência do julgamento. A lógica sistêmica para avaliação de provas é composta por três regulamentos: 1 - Sistema da íntima convicção; 2 - Sistema da prova tarifada; 3 - Sistema do livre convencimento motivado. Esta metodologia tem a finalidade de investigar a vinculação (ou não) do juiz a alguma espécie de prova, pois a importância está no nexo existente entre a apreciação da causa pelo juiz natural e as provas que foram produzidas em juízo. Vejamos: 6.1. Sistema da íntima convicção Este sistema tem seu acolhimento nas decisões proclamadas pelo júri popular, onde o seu voto é fruto do seu convencimento íntimo, onde não há critérios que sirvam de parâmetro, como coerência racional ou fundamentação, em suma, a decisão do juiz leigo é soberana, e não precisa ser motivada, pois ele é detentor de ampla liberdade para avaliar as provas. Seu voto está resguardado sob o sigilo, conforme dita a lei: Artigo 5º, inciso XXXVIII da Constituição Federal de 1988 - É reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: -A plenitude de defesa; -O sigilo das votações; -A soberania dos veredictos; -A competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;12 12 BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DR: Senado, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 15 Artigo 487 do Código de Processo Penal - Para assegurar o sigilo do voto, o oficial de justiça recolherá em urnas separadas as cédulas correspondentes aos votos e as não utilizadas.13 Basta então que os jurados decidam pelas opções de SIM ou NÃO para cada pergunta realizada, como elucida o artigo 487 do Código de Processo Penal: Antes de proceder-se à votação de cada quesito, o juiz presidente mandará distribuir aos jurados pequenas cédulas, feitas de papel opaco e facilmente dobráveis, contendo 7 (sete) delas a palavra sim, 7 (sete) a palavra não. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)14. Portanto, não se faz necessária a fundamentação da decisão do corpo de jurados. Não há, necessariamente, uma sujeição do Conselho de Sentença as provas constantes dos autos. A subjetividade de cada indivíduo do júri, como explicado anteriormente, será o norteador do seu voto, ainda que ele esteja indo na contramão dos fatos probatórios reunidos. Contudo, no inciso III, do artigo 593 do Código de Processo Penal, é trazida a possibilidade de se anular, por completo, a decisão dos jurados, se for compreendida como claramente antagônica à prova dos autos: Inciso III do Código de Processo Penal: das decisões do Tribunal do Júri, quando: Alínea a) ocorrer nulidade posterior à pronúncia; Alínea b) for a sentença do juiz-presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados; Alínea c) houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança15. 6.2. Sistema da prova tarifada. A legislação brasileira não adotou o sistema de prova tarifada, ainda sim existem vestígios dele em sua aplicação. O legislador entendeu que determinados meios de prova tem seu valor probatório fixado de forma abstrata, onde o juiz fica condicionado a acatar as regras preestabelecidas, 13 BRASIL. Código de Processo Penal (1941) DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Brasília, DR: Casa Civil, 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 14 Idem 13. 15 Idem 13. 16 de acordo com seu valor fixado previamente pela lei. Essa dosimetria limita a atuação do magistrado, que, com nenhuma margem de discricionariedade, cabe-lhe somente apreciar o conjunto probatório. Este sistema apresenta falhas crônicas, como um caso onde o depoimento de uma única testemunha, por mais completo e verdadeiro que for, não possui valor, exceto como cita o seguinte dispositivo: Artigo 155 do Código de Processo Penal: O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.16 Um exemplo para elucidar o referido artigo 158, é quando se trata de um processo que envolva uma pessoa alegada como morta. O simples testemunho sobre o falecimento não basta, é preciso juntar a certidão de óbito ao processo, conforme o dispositivo: Artigo 62 do Código de Processo Penal: No caso de morte do acusado, o juiz somente à vista da certidão de óbito, e depois de ouvido o Ministério Público, declarará extinta a punibilidade.17 Outro exemplo de prova tarifada, vem também por outro artigo: Artigo 158 do Código de Processo Penal: Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.18 Aqui, há a demanda, regrada em lei, para que seja cumprida a realização do exame de corpo de delito, afim de provar a materialidade em crimes que deixam vestígios. Mas há uma ressalva no dispositivo do artigo 167 do Códigode Processo Penal: “Não sendo possível o exame de corpo de 16 BRASIL. Código de Processo Penal (1941) DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Brasília, DR: Casa Civil, 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 17 Idem 16. 18 Idem 16. 17 delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta”19. Neste ponto, Renato Brasileiro, arrebata: Desse sistema deriva o conceito da confissão como rainha das provas, sendo que nenhuma outra prova seria capaz de infirmá-la. Além disso, uma única testemunha jamais seria suficiente para a comprovação de uma afirmação acerca de fato que interessasse à solução da controvérsia posta em juízo (testis unus, testis nullus - uma só testemunha não tem valor). Tal regra autorizava uma conclusão absurda: a verdade dita por uma única testemunha não teria valor, na medida em que, de acordo com a lei, um depoimento isolado não tinha qualquer valor; pelo contrário, se uma mentira fosse contada por duas testemunhas acabaria prevalecendo.20 6.3. Sistema do livre convencimento motivado Neste sistema, o juiz tem liberdade na valoração das provas que fazem parte dos autos, sem estar restrito a valores e critérios legais para prefixação probatória, onde todas têm então o mesmo valor. Isto não é uma carta branca para que o juiz tome as decisões que quiser, agindo arbitrariamente, pois o objetivo é a busca da verdade real. É fundamental permitir a produção de provas contraditórias no processo. Assim, o magistrado formará livremente a sua convicção, avaliando a série de conjuntos probatórios, onde ele precisa fundamentar a sua sentença. Nesta fundamentação, deve-se deixar de maneira explicita quais os motivos racionais o levaram a tal convencimento, em que pese os objetos da prova, independentemente de qualquer tarifação legal. Não é autorizado que o juiz busque fora dos autos objetos estranhos ao processo, ao que nos remete ao clássico brocardo “quod neon est in actis non est in mundo” – o que não está nos autos não está no mundo. A fundamentação do juiz precisa estar construída com tal clareza e objetividade que, lida por qualquer pessoa que analisar os dados, chegue a mesma conclusão, por onde, é claro, seu papel não é apenas no sentido de 19 BRASIL. Código de Processo Penal (1941) DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Brasília, DR: Casa Civil, 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 20 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal (Vol. Único). 2ª. ed. 3ª tiragem – São Paulo: Editora juspodvm, 2014. p 581. 18 legitimar o diagnóstico ao qual o objeto da prova teve em si um estudo exaustivo, mas vem na busca do estreito caminho que conduziu o espírito do juiz a pacificar seu entendimento, levando-o a tal conclusão. Tal mecanismo tem um outro efeito positivo além de afiançar o exame criterioso dos autos: ele dá estruturação jurídica suficiente para que se possa, em eventual recurso, realizar uma nova análise frente a novos contextos expostos. Este é o sistema adotado pelo nosso código penal, e sua principal vantagem é a de instrumentalizar o magistrado com a discricionariedade no momento da valoração das provas, de forma isolada ou em sua totalidade, onde deve ser claro que sua conclusão advém de um raciocínio sedimentado na pura lógica, aguerrido por uma crítica perspicaz dos processos. Se a sentença não for bem fundamentada, sofre pena de nulidade, como aduz nossa Constituição Federal: Artigo 93 da Constituição Federal: Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)21. A fundamentação carrega esse objetivo intraprocessual, característica essa que dá poder as partes e aos colegiados uma oportunidade de observar e tirar conclusões acerca do processo. A sua vista não é feita através dos vidros sujos de uma janela, mas sim pela possibilidade de um minucioso exame dos fatos catalogados que conduziram o magistrado a sua sentença. É também extraprocessual, por possuir características que cristalizam sua essência republicana, onde há uma valoração pelo sagrado princípio da legalidade, além, é claro, da ausência de motivação pessoal do juiz, ou seja, é crucial sua impessoalidade no processo. Suas convicções particulares, fé, opinião política, tudo isso não pode fazer parte da formação do convencimento 21 BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DR: Senado, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 19 do magistrado. É preciso ainda destacar a suma importância da independência que o juiz precisa para julgar os casos. Nesta situação, fica prejudicada a finalidade da Justiça, que cerceada, não consegue conduzir o processo de maneira justa e transparente. O magistrado precisa ponderar os elementos de prova, para conseguir a busca pela verdade real acerca do que foi levado para aquele tribunal. Ele tem a sua disposição subsídios de provas, como também dados levantados pelo inquérito. Mas ele não poderá se servir unicamente de informações provenientes da investigação, pois isso vai contra o artigo 155 do Código de Processo Penal. Outro mecanismo que o juiz pode se servir é do uso das provas cautelares. Elas nascem sob o pretexto de urgência ou relevância, como por exemplo, a oitiva de testemunha: Artigo 225 do Código de Processo Penal: Se qualquer testemunha houver de ausentar-se, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que ao tempo da instrução criminal já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, tomar-lhe antecipadamente o depoimento22. Se ao perceber que uma testemunha chave corre o risco de morrer, ou é vítima de uma doença fatal, pode o juiz convoca-la para prestar esclarecimentos, o que visa preservar elementos necessários para sua fundamentação. Há ainda as chamadas provas irrepetíveis: são aquelas que não tem como serem reproduzidas perante o juiz, como as perícias que acontecem na fase do inquérito policial, no corpo de delito, por exemplo. As cautelares podem vir até mesmo antes do início da ação penal, respeitando, claro, os requisitos do disposto artigo 156 do Código de Processo Penal. 22 BRASIL. Código de Processo Penal (1941) DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Brasília, DR: Casa Civil, 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 20 7. ÔNUS DA PROVA A melhor forma de interpretar o ônus da prova, é permeá-lo através das regras que estabelecem seu uso no processo penal. Ele não deve ser visto como uma obrigação, já que se não lograr seu cumprimento, não existirá penalidade para tal. Deve-se tambémobservá-lo sob o prisma do princípio in dubio pro reo, por nossa legislação e constituição priorizar valores caros no sentido de preservar a liberdade daquele que pode ser inocente, já que se não houverem provas do delito, o réu deve ser absolvido. Claro que na ação penal existe a subjetividade das partes: elas apontam o dedo em riste, esbravejam e depositam no juiz a esperança de que ele reconheça seu lado, seus esforços em provar a sua verdade. Mas o que rege o processo penal são os fatos e provas – instrumentos estes que precisam ser cristalinos, e sujeito ao contraditório. Se assim não o fosse, imagine quão caótico seria nosso sistema jurídico, onde bastava-se acusar a outra parte e a ela que se coubesse sustentar o peso de mostrar-se inocente! O ônus acusatório é um salto evolutivo no sistema jurídico moderno, pois ao requerente cabe esta responsabilidade, de provar o que alegou, mas que seja tão bem estruturado e coeso que, se como um cubo, fosse virado por todos os ângulos, e ainda assim não deixaria qualquer sombra de dúvidas da culpa do réu. Cabe, portanto, ao autor das provas, levantar ao processo os subsídios materiais e o nexo causal, que transigem a atribuição de valores expostas ao juízo. Se não houver provas do que se provocou, não há sanções contra as alegações infundadas, e a única consequência será a desconsideração do fato arguido. Se a prova acusatória possuir força, ao acusado, destarte, cabe a ele, através de provas, contestar a outra parte, afim de eliminar a pretensão do requerente, demonstrando causas extintivas, modificativas ou excludentes, como de culpa ou ilicitude, por exemplo. Não é necessária a produção de prova plena, é suficiente o juízo de probabilidade. Ao juiz, resta depositar os votos de que tenha em seu espírito a tranquilidade e justo equilíbrio ao analisar as provas e proferir seu veredicto. 21 É possível que nesta lide o magistrado ainda enfrente dificuldades para formar o seu convencimento, já que dúvidas possam permear seu raciocínio, pois é preciso considerar que ele não pode aceitar a falta de elementos probatórios, nem formar seu convencimento através de meras presunções. Há, aqui então, a discricionariedade para que o juiz possa agir de ofício, na intenção pela busca da verdade processual, podendo ele, inclusive, ordenar quando urgente e relevante, a produção de provas, mesmo antes de aberta a fase da ação penal, de tal maneira que o material comprobatório, levado à sua apreciação, consiga sustentar as provas, de forma que eles elementos inseridos nos autos do processo, possam reconstituir o cenário mais verossímil como o que se ocasionou no momento dos fatos. A maneira como o juiz vir a agir deve ser ponderado, seu papel não é o de substituir as partes. Estes procedimentos precisam vincular-se com a legitimidade da ação, descrita no inciso I do artigo 156, que reza a importância da observação a adequação, a necessidade e a proporcionalidade da medida. Na sumula abaixo, o STJ julgou a inversão do ônus da prova, onde o entendimento do tribunal foi o de que não havia elementos suficientes para gerar requerido instituto: PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. INEXISTÊNCIA DE PROVAS A AMPARAR O DECRETO CONDENATÓRIO. REEXAME PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. ART. 156 DO CPP. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Não cabe, na via eleita, apreciar o argumento no sentido de que não houve a produção de prova para fundamentar o juízo condenatório quanto aos fatos narrados na inicial acusatória, uma vez que tal proceder implicaria revisão do conjunto fático-probatório dos autos, providência inadmissível, conforme o óbice contido na Súmula 7/STJ. 2. A valoração da prova realizada pelo acórdão recorrido, admitindo como comprovados os fatos imputados, não representa indevida inversão do ônus probatório. Agravo regimental improvido23. Em face de outra decisão, agora do STF, o jurista Pedro Canário comenta o voto do falecido Ministro Teori Zavascki, que estabeleceu que o 23 SUMULA 7-STJ, (STJ - AgRg no AREsp: 309711 SC 2013/0083189-0, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 06/11/2014, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/11/2014). 22 Ministério Público devesse provar os fatos alegados em processo contra o deputado Décio Lima: Imputar a alguém uma conduta penal tão somente pelo fato de ocupar determinado cargo significa, na prática, adotar a responsabilização objetiva na esfera penal”, diz o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal. A conclusão está em voto proferido na 2ª Turma em que o deputado federal Décio Lima (PT-SC) foi absolvido porque o Ministério Público não conseguiu comprovar a ligação entre os fatos e o réu24. 24 CANÁRIO, Pedro. Não se pode imputar crime a alguém só pelo cargo que ocupa, diz Teori Zavascki. Disponível em: https://consultor-juridico.jusbrasil.com.br/noticias/324300597/nao-se-pode- imputar-crime-a-alguem-so-pelo-cargo-que-ocupa-diz-teori-zavascki?ref=topic_feed. Acesso em 19 abr. 2017. 23 8. PROVAS ILÍCITAS Um dos elementos estruturais da democracia, é o respeito do Estado pelas regras estabelecidas em lei. Este princípio traz segurança jurídica, nos proporciona o fortalecimento das instituições, e, consequentemente, um sistema judiciário mais justo. Tal pensamento seria contraditório se o sistema permitisse que o processo fosse maculado por provas obtidas de maneira ilícita. O antigo pensamento de que tudo deve servir como prova, é barrado no dispositivo do inciso LVI, do artigo 5° da Constituição Federal: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Portanto, cabe ao Estado, não permitir que seus agentes públicos ou uma outra parte no processo viesse a inserir em seus autos provas provenientes de ato ilícito, já que a tutela da laboração jurisdicional pertence ao Estado. Há então um ponto que concentra divergências: senão haveria outra forma de apresentar a prova, e ela foi trazida ao processo de forma ilícita, mas ela é forte o suficiente para provar a culpa do réu, formar o convencimento do juiz e sanar quaisquer dúvidas, porque não usá-la? Utilizar o princípio de que “os fins justificam os meios” é um equívoco. É desta forma que se começa a exercer um estado totalitário, inquisitivo. Quebrar as regras para se conseguir a condenação do réu não é fazer justiça, é, na pior das hipóteses, igualar a sociedade a quem supostamente cometeu a infração. Desta forma não restará dúvidas sobre a credibilidade e legitimidade da justiça e sua aplicação. Observando estes reais princípios, haverá resguardo do direito da dignidade da pessoa humana, ainda que isso venha a postergar ou impedir que se chegue a verdade processual. A legitimidade da produção de provas estão estabelecidas no que alude Uadi Lammêgo Bulos: (..) provas obtidas por meios ilícitos são as contrárias aos requisitos de validade exigidos pelo ordenamento jurídico. Esses requisitos possuem a natureza formal e a material. A ilicitude formal ocorrerá quando a prova, no seu momento introdutório, for produzida à luz de um procedimento ilegítimo, mesmo se for lícita a sua origem. Já a ilicitude material delineia-se através da emissão de um ato antagônico ao direito e pelo qualse consegue um dado 24 probatório, como nas hipóteses de invasão domiciliar, violação do sigilo epistolar, constrangimento físico, psíquico ou moral a fim de obter confissão ou depoimento de testemunha etc. 25 Destarte, é preciso observar quais são os fatos que geram a ilicitude da prova, e eles são diversos, como retirar depoimento sem que a pessoa esteja assistida por um advogado, realizar buscas em uma residência sem possuir autorização judicial para tal ou respaldo de um dos moradores em caso de momento de flagrante; quebra e violação do sigilo fiscal ou bancário; tortura ou ameaça de violência física na intenção de ter uma confissão forçada; grampo em qualquer meio de comunicação, como internet, voz ou correspondência. Estas violações tornam ilícita a prova que for colhida de forma que quebre a regra de direito material (penal ou constitucional), que por fim poderão levar a consequência da nulidade da prova. A sentença que se der baseada em prova ilícita, será nula. Mas não é só a colheita de provas ilegais como apresentadas que as tornam ilícitas, há outros exemplos, como na violação a norma de direito processual, quando o juiz ouve a testemunha e não se lembra de compromissá-la. É ilícito também pedir que um psicólogo ou advogado deponha contra seu cliente. Se uma das partes levar ao tribunal do júri novas provas que não foram apresentadas com a antecedência mínima de três dias uteis com ciência da parte contrária, torna-se ilícito também este ato. Não está escrito de maneira explícita no Código de Processo Penal quais são as provas aceitas no processo, a não ser, por exemplo, aquelas mais recorrentes. Partindo deste ponto, existe a livre apresentação de provas acerca dos sujeitos nos processos, obedecendo então o que for proibido. Em resumo, tudo aquilo que não é negado pela lei, é permitido. Depois de observadas estas explanações, caso ainda uma prova ilícita venha a ser juntada ao processo, por mais importante que seja o fato trazido aos autos, nasce a obrigação do seu desentranhamento. Se a licitude da 25 BRASIL. Código de Processo Penal (1941) DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Brasília, DR: Casa Civil, 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 25 prova for comprovada em grau de recurso e por consequência venha a beneficiar o réu, a matéria só poderá ser apreciada em recurso de apelação da outra parte. Se a arguição for realizada após o período onde houve transito julgado da sentença condenatória ou ainda a absolutória imprópria que tenha por meio provas colhidas de forma ilícita, existem duas opções para resolver esta situação: ajuizar um pedido de revisão criminal ou encaminhar uma impetração de habeas corpus, considerando que exista o risco de o acusado ser preso. A nulidade da prova ilícita pode ser decretada no processo, observando quatro princípios básicos: • 1). Nenhuma nulidade será declarada quando não houver prejuízo - (Artigo 563 do Código de Processo Penal); • 2). Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse. (Artigo 565 do Código de Processo Penal); • 3). Não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade ou na decisão da causa (Artigo 566 do Código de Processo Penal). Havendo o reconhecimento da nulidade da prova ilícita, quando o caso for de nulidade absoluta, a mesma pode ser contestada em qualquer tempo, considerando que não houve transito em julgado da sentença. Existem instrumentos processuais para arguir a sentença condenatória ou absoluta imprópria, ainda que depois do transito em julgado, que conforme mencionado anteriormente, é a revisão criminal e o habeas corpus, que devem ser apresentadas em favor da defesa, salvo se a nulidade dor absoluta, pois aí ela é insanável. Nos casos onde existir a nulidade relativa, a sua contestação deve ser realizada dentro dos prazos estabelecidos, caso o contrário pode precluir. Se reconhecida sua nulidade relativa, nenhuma das partes poderá usá-la no processo. 26 Quando ocorrer a preclusão por seu não uso e a nulidade relativa foi pacificada, a prova ilegítima pode, nesta situação, ser usada por qualquer uma das partes. 8.1. Provas ilícitas na Lei 11.690/2008 A referida lei editou uma nova redação do artigo 157 do Código de Processo Penal, onde optou-se por igualar as provas ilícitas e ilegítimas, não existindo mais diferença entre elas, como era apontado anteriormente pelos doutrinadores. Entendeu-se agora que são ilícitas, as provas que violem as disposições, tanto materiais, como processuais. O caput exige seu desentranhamento, e os incisos seguintes regulamentam sua ação: Parágrafo 1º do Código de Processo Penal: São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. – Como exemplo elucidativo, se uma prova obtida de forma ilícita aponta para uma pessoa que testemunhou o fato, a autoridade policial ou judiciária pode pedir o depoimento desta testemunha. Seu depoimento deriva de uma prova ilícita, mas é legítima. Parágrafo 2º do Código de Processo Penal: Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova. – Ainda que o fato não tenha sido investigado de forma lícita, o fato é tão óbvio que sua descoberta é inevitável. Parágrafo 3º do Código de Processo Penal: Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente.26 Após o seu desentranhamento do processo, a prova ilícita fica inutilizada, desta forma nenhuma das partes terá poder para chama-la de volta ao processo. A renúncia das partes quanto a impugnação das provas, o transito em julgado da sentença penal condenatória ou absolutória é a fronteira da preclusão. 26 BRASIL. Código de Processo Penal (1941) DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Brasília, DR: Casa Civil, 1941. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del3689.htm. Acesso em: 11 abr. 2017. 27 8.2. Formas de produção prova ilícita. • Filmagem: É ilícita quando viola a privacidade ou intimidade da pessoa, salvo se forem imagens captadas por equipamentos do tipo usado em câmeras de segurança, em locais públicos ou feitas pela pessoa ofendida. • Gravação da conversa sem autorização: É lícita se for feita por uma das partes e ela for um dos interlocutores. Exemplos: conversa telefônica (Não confundir com interceptação telefônica) ou ambiental. • Escuta telefônica: quando uma das partes autoriza a gravação de terceiros, como no caso de sequestro, onde a família permite que a polícia grave a conversa. • Interceptação de comunicação: é lítica se feita através de ordem judicial. Exemplos: áudio ou texto de WhatsApp, ligação telefônica, e- mails, dados e afins. Para e-mails, parte dos doutrinadores acreditam que devem-se aplicar os mesmos princípios a violação de correspondência. • Correspondências: é expressamente proibido a violação de correspondências, conforme descrito na Constituição, art.5º, XII, salvo para a defesa de direito do seu destinatário. Mas os tribunais superiores têm dado entendimento de que em caso de interesse coletivo e manutenção da ordem pública, há exceções. • Quebra do sigilo bancário: é lícita se feita através de ordem judicial. • Quebra se sigilo fiscal: é lícita se feita através de ordem judicial. • Revista intima em presídio: o visitante fica sujeito a sofrer revista pessoal ao adentrar nas instalações penitenciárias e não há necessidade de cumprimento de mandato para realizar tal ação, pois o ato é uma prerrogativa do agente local. • Invasão de domicílio: só é permitido adentrar na residência de terceiro tendo em mãos um mandado de busca expedido por autoridade judicial. 28 8.3. Prova emprestada A prova emprestada é aquela que foi produzida em outro processo e depois acolhida na lide atual. Para que ela possa produzir efeito no processo ao qual foi invocada, é necessário se utilizar de certidão ou meio autenticatório para legitimar a sua eficácia e legalidade. O princípio do contraditório ilumina esta questão, observando que a prova emprestada de outro processo não tem poder de causar efeito processual para a pessoa que não tenha sido parte na lide em questão se não for permitido o mecanismo do contraditório a prova empresta. 8.4. Princípio da proporcionalidade O princípio da proporcionalidade, ou razoabilidade, nasce de um impasse advindo de um caso concreto, onde o magistrado defronta-se como uma prova ilícita e precisa então solucionar este disparate. O desenvolvimento deste processo de pacificação deve se estruturar nos preceitos constitucionais, pois são as balizas que conduzirão a interpretação que visa solucionar o conflito. Depois de ponderar sobre o peso dos valores em disputa, é preciso aplicar os subprincípios de adequação e necessidade, e então será possível concluir qual deles irá sobrepor-se. Um exemplo prático é um caso ilustrativo onde o réu, já tido como perigoso para o sistema, representa uma ameaça a toda a sociedade, e a prova produzida no processo é um grampo telefônico clandestino, onde o acusado discute os detalhes do crime que cometeu. O juiz tem o entendimento que se o réu for solto, poderá cometer novos crimes. Ali, o princípio da proporcionalidade se fará presente, onde o magistrado precisará se decidir sobre o uso ou não da prova ilícita no processo, considerando que a proteção a sociedade, neste caso, é o bem maior, em detrimento da liberdade do acusado. 29 9. “FRUITS OF THE POISONOUS TREE” – A TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA Nascida na Suprema Corte dos Estados Unidos, esta teoria aponta que as provas ilícitas através da derivação, são tão inaptas quanto as provas ilícitas primárias que lhe deram origem. Ela é aquela obtida em segundo ou maior grau de nexo através de fato praticado as margens da lei para se obter fins probatórios do cometimento de fato ilícito. Sua ligação oriunda de ato ilícito a torna imprestável no processo, pois a prova derivada não teria sido descoberta se as regras não tivessem sido quebradas no primeiro momento. Destarte, reconhecido este nexo, ordena-se seu desentranhamento devido sua ilicitude, e este entendimento já vinha sendo adotado pelo STF mesmo antes do advento da lei 11.690/08. No RHC 90.376, o ministro e relator Celso de Mello, concluiu: A QUESTÃO DA DOUTRINA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA (‘FRUITS OF THE POISONOUS TREE’): A QUESTÃO DA ILICITUDE POR DERIVAÇÃO. - Ninguém pode ser investigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em provas ilícitas, quer se trate de ilicitude originária, quer se cuide de ilicitude por derivação. Qualquer novo dado probatório, ainda que produzido, de modo válido, em momento subseqüente, não pode apoiar-se, não pode ter fundamento causal nem derivar de prova comprometida pela mácula da ilicitude originária. - A exclusão da prova originariamente ilícita - ou daquela afetada pelo vício da ilicitude por derivação - representa um dos meios mais expressivos destinados a conferir efetividade à garantia do ‘due process of law’ e a tornar mais intensa, pelo banimento da prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva os direitos e prerrogativas que assistem a qualquer acusado em sede processual penal. Doutrina. Precedentes. - A doutrina da ilicitude por derivação (teoria dos ‘frutos da árvore envenenada’) repudia, por constitucionalmente inadmissíveis, os meios probatórios, que, não obstante produzidos, validamente, em momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vício (gravíssimo) da ilicitude originária, que a eles se transmite, contaminando-os, por efeito de repercussão causal. Hipótese em que os novos dados probatórios somente foram conhecidos, pelo Poder Público, em razão de anterior transgressão praticada, originariamente, pelos agentes estatais, que desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar. - Revelam-se inadmissíveis, desse modo, em decorrência da ilicitude por derivação, os elementos probatórios a que os órgãos estatais somente tiveram acesso em razão da prova originariamente ilícita, obtida como resultado da transgressão, por agentes públicos, de direitos e garantias constitucionais e legais, cuja eficácia condicionante, no plano do ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa limitação de ordem jurídica ao poder do Estado em face dos cidadãos. 30 - Se, no entanto, o órgão da persecução penal demonstrar que obteve, legitimamente, novos elementos de informação a partir de uma fonte autônoma de prova - que não guarde qualquer relação de dependência nem decorra da prova originariamente ilícita, com esta não mantendo vinculação causal -, tais dados probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis, porque não contaminados pela mácula da ilicitude originária.27 Um exemplo de prova ilícita por derivação, é o testemunho colhido ilegalmente, e dele apontou-se uma testemunha do fato. O testemunho da pessoa apontada, ainda que lícito, é contaminada pela derivação de prova ilícita, portanto é um fruto da árvore envenenada e deve ser desprezado como prova no processo. Vale esclarecer que se a prova ilícita serviu como alavanca para dar início ao inquérito policial, a contaminação por derivação não incide sobre as provas colhidas no decorrer do processo. Mas a problemática geral está em conceituar o nexo causal e o momento em que ele tornou a classificação da prova derivada como ilícita. Existe um fluxo sistemático que abrange a incidência ou não da contaminação, e as observâncias precisam ser precisas em diagnosticar este momento, pois são critérios que em muitos momentos não podem se basear apenas na subjetividade dos atores que contracenaram o fato. Há elos que podem ter se decomposto ou se rompido em momentos onde se eram investigadas e produzidas as provas, o que não a põe, necessariamente, no rol de ilicitude. É preciso então dividir este sistema em blocos que permitam uma melhor visualização do litígio da produção da prova, verificando quais são as exceções para sua admissibilidade e em quais situações elas se aplicam. Existe uma cadeia lógica que permite as exceções ao uso das provas ilícitas por derivação, onde há a arguição da anulação do uso de provas derivadas que foram produzidas ilicitamente, aonde elas podem ser levadas ao processo e ainda venham a gerar resultado benéfico a favor do sujeito que não teve nexo com o ato ilícito realizado, sendo então não responsabilizado com a sentença de ineficácia da prova. 27 INFORMATIVOSTF. Juntada do Incidente de Inconstitucionalidade. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo583.htm Acesso em 12 de março de 2017. 31 9.1. Fonte independente É quando uma fonte autônoma da produção da prova foi obtida de forma legitima, trazendo novos fatos de informações advindas de uma fonte autônoma de provas, não tendo, portanto, qualquer relação de dependência ou por consequência venha de prova primariamente ilícita, excluindo, portanto, qualquer vínculo de causalidade, portanto não será preciso desentranhá-la dos autos. No caso O povo dos Estados Unidos contra Murray, o professor Thiago Pierobom explica a maneira como os policiais conseguiriam obter a prova de maneira lícita: Nesse caso, os policiais haviam percebido uma atividade suspeita de tráfico de drogas em uma residência, entraram ilegalmente na casa e confirmaram a suspeita; posteriormente requereram um mandado judicial para busca e apreensão indicando apenas as suspeitas e sem mencionar a anterior entrada e, de posse do mandado, entraram novamente na residência e apreenderam as drogas. A Corte entendeu que a prova era válida, pois ainda que os policiais não houvessem realizado a primeira violação, de qualquer forma seria obtido o mandado a justificar a segunda entrada legal, com base apenas nos indícios iniciais28. O tribunal reconheceu a ilicitude de uma das provas, mas realizou a distinção, por entender a independência que existe entre elas, permitindo a inserção nos autos daquela prova obtida mediante autorização judicial. O parágrafo 2º do artigo 157 do Código de Processo Penal diz que: Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova. Agora comparamos, em ordem inversa, com o parágrafo 1º: São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. O sentido estrito da lei, como foi concebida pelo legislador, se distancia em sua forma essencial do que foi proposto pela teoria 28 ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Provas Ilícitas e Proporcionalidade. Rio de Janeiro: Lúmen Júris Editora, 2007. 32 americana. Houve aqui a tentativa de se adotar os procedimentos estrangeiros, mas na prática a nossa legislação deixou em aberto, para as mais variadas interpretações, onde não é preciso, efetivamente, a apresentação de uma segunda prova lícita para afastar a ilicitude da primeira apresentada, pois a redação do artigo 157 do Código de Processo Penal usa palavras sem firmamento, abrindo então possibilidades hipotéticas. O artigo 157 do Código de Processo Penal veio então a confundir as teorias, pois em sua concepção, ele trata da teoria das fontes independentes, mas em seu espírito está sulcado com a teoria da exceção da descoberta inevitável. Mas foi no caso do “Mensalão” que o STF trouxe a luz sobre a teoria da fonte independente29, onde o presidente do STF entendeu que a prova era admissível devido à quebra do sigilo bancário já ter sido autorizado por uma CPI do congresso, o que descaracterizava a ilicitude da prova: SÉTIMA PRELIMINAR. DADOS DE EMPRÉSTIMO FORNECIDOS PELO BANCO CENTRAL. PEDIDO DIRETO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA. REQUISIÇÃO FEITA PELA CPMI DOS CORREIOS. POSTERIOR AUTORIZAÇÃO DE COMPARTILHAMENTO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO PARA INSTRUÇÃO DO INQUÉRITO. LEGALIDADE. Não procede a alegação feita pelo 5º acusado de que os dados relativos aos supostos empréstimos bancários contraídos com as duas instituições financeiras envolvidas teriam sido colhidos de modo ilegal, pois o Banco Central teria atendido diretamente a pedido do Procurador-Geral da República sem que houvesse autorização judicial. Tais dados constam de relatórios de fiscalização do Banco Central, que foram requisitados pela CPMI dos Correios. No âmbito deste Inquérito, o Presidente do Supremo Tribunal Federal determinou o “compartilhamento de todas as informações bancárias já obtidas pela CPMI dos Correios” para análise em conjunto com os dados constantes destes autos. Por último, o próprio Relator do Inquérito, em decisão datada de 30 de agosto de 2005, decretou o afastamento do sigilo bancário, desde janeiro de 1998, de todas as contas mantidas pelo 5º acusado e “demais pessoas físicas e jurídicas que com ele cooperam, ou por ele são controladas”. Preliminar rejeitada.30 29 (STF – Inq: 2245 MG, Relator: JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 27/08/2007, Tribunal Pleno, Data da Publicação: Dje- 139 DIVULG 08-11-2007 PUBLIC 09-11-2007 DJ 09-11-2007 PP- 00038 EMENT Vol-02298-01 PP-00001). Acesso em 16 de abril de 2017. 30BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. INQUÉRITO 2.245-4. Partes: JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA, JOSÉ GENOÍNO NETO, DELÚBIO SOARES DE CASTRO. Relator: MIN. JOAQUIM BARBOSA. CONJUR Disponível em http://www.conjur.com.br/2007-nov- 09/publica_acordao_mensalao_nesta_sexta?pagina=2 Acesso em 16 de abril de 2017. 33 Portanto, com base na decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o caso do mensalão, a interpretação correta do parágrafo 2º é que existe a exceção da descoberta inevitável, onde trata-se com legitimidade a fonte independente como lícita. 9.2. Descoberta inevitável A descoberta inevitável é aquela que poderia ter sido encontrada no decorrer do processo, independentemente de ter sido apontada ou não pela prova ilícita primária, de maneira que, fosse como fosse, chegar-se-ia a esta prova de forma fatal. Nesta situação não há o que se dizer em contaminação da prova derivada. Em 1984, a Suprema Corte dos Estados Unidos julgou o caso Nix v. Williams, caso em que a ilicitude da coleta de provas foi desconsiderada: Após o desaparecimento de uma menina de 10 anos em Des Moines, estado americano de Iowa, o suspeito foi preso e acusado em Davenport, Iowa. A polícia informou ao advogado do suspeito que o levaria de volta a Des Moines sem interroga-lo, mas durante a viagem, um dos agentes iniciou uma conversa com o entrevistado que acabou por fazer declarações incrimina tórias, fazendo-o direcionar os policiais ao corpo da criança. Uma busca sistemática da área estava sendo conduzida com a ajuda de 200 voluntários, e tinha sido iniciado antes que o suspeito fizesse as declarações incrimina tórias, mas as buscas foram terminadas quando o inquirido guiou a polícia ao corpo. Antes do julgamento em um tribunal estadual de Iowa por homicídio em primeiro grau, o tribunal negou a moção do réu de suprimir evidências do corpo e de todas as provas relacionadas, incluindo a condição do corpo como mostrada por uma autópsia, alegando que tal evidência era fruto de suas declarações obtidas ilegalmente durante o trajeto no automóvel com os policiais. A Suprema Corte de Iowa acatou, mas posteriormente um processo de habeas corpus do tribunal federal resultou na afirmação do Tribunal de que a polícia havia obtido as declarações incriminatórias do entrevistado por meio de interrogatório ilegal, em violação do seu direito de ter advogado, respaldado pela Sexta Emenda. No caso de Williams, no entanto, observou- se que, embora as declarações não pudessem ser admitidas em um segundo julgamento, a evidência da localização e condição do corpo poderia ser admissível com base na teoria de que o corpo teria sido descoberto mesmo se as declarações incriminatórias não tivessem sido obtidas do entrevistado31.
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