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Brasília, 31 de agosto a 4 de setembro de 2015 Nº 797
Data de divulgação: 10 de setembro de 2015
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a publicação do acórdão no Diário da Justiça.
Sumário
Plenário
Agravo regimental e interesse recursal
Litisconsórcio e prazo em dobro para a resposta à acusação 
Sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental - 4
Sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental - 5
Repercussão Geral
	Greve de servidor público e desconto de dias não trabalhados - 1
Greve de servidor público e desconto de dias não trabalhados - 2
Greve de servidor público e desconto de dias não trabalhados - 3
1ª Turma
Ação Penal e “habeas corpus” de ofício - 1
Ação Penal e “habeas corpus” de ofício - 2
RE e análise dos requisitos de admissibilidade de REsp - 3
ECT e prescrição
2ª Turma
Recurso exclusivo da defesa e “reformatio in pejus” - 2
Denúncia e prazo em dobro para resposta à acusação
Repercussão Geral
Clipping do DJe
Transcrições
Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes (RE 592.581/RS)
Inovações Legislativas
Outras Informações
Plenário
Agravo regimental e interesse recursal
O Plenário, por maioria, não conheceu de agravo regimental interposto pelo Presidente da Câmara dos Deputados em face de decisão monocrática que indeferira pedido de medida liminar formulado em mandado de segurança em que se pleiteava a suspensão da análise isolada, pela Câmara dos Deputados, dos Projetos de Decreto Legislativo 384/1997, 1.376/2009, 40/2011 e 42/2011, mas que sinalizara ao Congresso Nacional que as votações futuras de contas presidenciais anuais deveriam ocorrer em sessão conjunta. A Corte afirmou que estaria configurada, na espécie, a falta de interesse recursal, na medida em que não haveria, na decisão monocrática objeto de impugnação, ato com conteúdo decisório desfavorável ao agravante. Naquela decisão, quando da apreciação do pedido de liminar, fora assentada a existência do “fumus boni iuris”. Isso porque decorreria da Constituição que a competência para julgar as contas do Presidente da República seria das duas casas do Congresso Nacional e não de cada uma delas individualmente. Essa interpretação seria extraída do seguinte conjunto de argumentos constitucionais, então demonstrados: a) caráter exemplificativo do rol de hipóteses de sessões conjuntas (CF, art. 57, § 3º); b) natureza mista da comissão incumbida do parecer sobre as contas (CF, art. 161, § 1º); c) reserva da matéria ao regimento comum, que disciplina as sessões conjuntas (CF, art. 161, “caput” e § 2º), nas quais ambas as Casas se manifestam de maneira simultânea; d) previsão expressa, pois quando a Constituição desejara a atuação separada de uma das Casas em matéria de contas presidenciais assim o fizera (CF, art. 51, II); e e) simetria entre a forma de deliberação das leis orçamentárias e a de verificação do respectivo cumprimento. Portanto, fora destacada, naquele ato, a existência de plausibilidade do direito alegado. No entanto, constatado que, na ocasião, as contas presidenciais em questão já haviam sido julgadas, não se verificaria o “periculum in mora”, devendo ser denegada a liminar. Assim, não teria sido praticado nenhum ato desfavorável à Câmara dos Deputados. Em última análise, o agravo em questão se insurgiria contra a fundamentação da decisão monocrática proferida, na parte do “fumus boni iuris”. Vencido o Ministro Gilmar Mendes, que negava provimento ao agravo regimental por entender presente o interesse recursal. 
MS 33729/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 3.9.2015. (MS-33729)
Litisconsórcio e prazo em dobro para a resposta à acusação 
É cabível a aplicação analógica do art. 191 do CPC (“Quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos”), ao prazo previsto no art. 4º da Lei 8.038/1990 (“Apresentada a denúncia ou a queixa ao Tribunal, far-se-á a notificação do acusado para oferecer resposta no prazo de quinze dias”). Com base nesse entendimento, o Plenário resolveu questão de ordem suscitada pelo Ministro Teori Zavascki (relator) e, em consequência, deferiu, por maioria, o pedido formulado por denunciado no sentido de que lhe fosse duplicado o prazo de oferecimento de resposta à acusação. A Corte reiterou, desse modo, o que decidido na AP 470 AgR-vigésimo segundo e vigésimo quinto/MG (DJe de 24.9.2013 e de 17.2.2014, respectivamente). Vencidos os Ministros Teori Zavascki, Edson Fachin, Roberto Barroso e Rosa Weber, que indeferiam o pleito por considerarem incabível a aplicação analógica do art. 191 do CPC ao prazo previsto no art. 4º da Lei 8.038/1990. 
Inq 3983/DF, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 3.9.2015. (Inq-3983)
Sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental - 4
O Plenário retomou julgamento de medida cautelar em arguição de descumprimento de preceito fundamental em que se discute a configuração do chamado “estado de coisas inconstitucional” relativamente ao sistema penitenciário brasileiro. Nessa mesma ação também se debate a adoção de providências estruturais com objetivo de sanar as lesões a preceitos fundamentais sofridas pelos presos em decorrência de ações e omissões dos Poderes da União, dos Estados-Membros e do Distrito Federal. No caso, alega-se estar configurado o denominado, pela Corte Constitucional da Colômbia, “estado de coisas inconstitucional”, diante da seguinte situação: violação generalizada e sistêmica de direitos fundamentais; inércia ou incapacidade reiterada e persistente das autoridades públicas em modificar a conjuntura; transgressões a exigir a atuação não apenas de um órgão, mas sim de uma pluralidade de autoridades. Postula-se o deferimento de liminar para que seja determinado aos juízes e tribunais: a) que lancem, em casos de determinação ou manutenção de prisão provisória, a motivação expressa pela qual não se aplicam medidas cautelares alternativas à privação de liberdade, estabelecidas no art. 319 do CPP; b) que, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos, realizem, em até 90 dias, audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contadas do momento da prisão; c) que considerem, fundamentadamente, o quadro dramático do sistema penitenciário brasileiro no momento de implemento de cautelares penais, na aplicação da pena e durante o processo de execução penal; d) que estabeleçam, quando possível, penas alternativas à prisão, ante a circunstância de a reclusão ser sistematicamente cumprida em condições muito mais severas do que as admitidas pelo arcabouço normativo; e) que venham a abrandar os requisitos temporais para a fruição de benefícios e direitos dos presos, como a progressão de regime, o livramento condicional e a suspensão condicional da pena, quando reveladas as condições de cumprimento da pena mais severas do que as previstas na ordem jurídica em razão do quadro do sistema carcerário, preservando-se, assim, a proporcionalidade da sanção; e f) que se abata da pena o tempo de prisão, se constatado que as condições de efetivo cumprimento são significativamente mais severas do que as previstas na ordem jurídica, de forma a compensar o ilícito estatal. Postula-se, finalmente, que seja determinado: g) ao CNJ que coordene mutirão carcerário a fim de revisar todos os processos de execução penal, em curso no País, que envolvam a aplicação de pena privativa de liberdade, visando a adequá-los às medidas pleiteadas nas letras“e” e “f”; e h) à União que libere as verbas do Fundo Penitenciário Nacional – Funpen, abstendo-se de realizar novos contingenciamentos — v. Informativo 796. 
ADPF 347 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 3.9.2015. (ADPF-347)
Sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental - 5
O Ministro Edson Fachin concedeu a cautelar requerida nas letras: “b”; “g”, em parte, para determinar ao CNJ que coordenasse mutirões carcerários, de modo a viabilizar a pronta revisão de todos os processos de execução penal em curso no País que envolvessem a aplicação de pena privativa, mas afastada a necessidade de adequação aos pedidos contidos nos itens “e” e “f”; e “h”, em parte, para acolher a determinação do descontingenciamento das verbas existentes no Funpen, devendo a União providenciar a devida adequação para o cumprimento desta decisão, fixando o prazo de até 60 dias a contar da sua publicação. Deixou, porém, de conceder a cautelar em relação aos pleitos contidos nas letras “a”, “c”, “d”, “e” e “f”, que propôs fossem analisadas por ocasião do julgamento do mérito da ação. Já o Ministro Roberto Barroso concedeu a medida cautelar requerida nas letras: “b”; “g”, estendendo, contudo, a condução dos mutirões carcerários aos tribunais de justiça estaduais; “h”; e, por fim, concedeu cautelar de ofício para determinar ao Governo Federal que encaminhasse ao STF, no prazo de um ano, diagnóstico da situação do sistema penitenciário e propostas de solução dos problemas, em harmonia com os Estados-Membros. Quanto à medida acauteladora de ofício, foi acompanhado pelo Ministro Marco Aurélio (relator). Ressaltou que as medidas cautelares que não deferiu — sobretudo, as mencionadas nas letras “a”, “d” e “e” — não significaria propriamente a negativa do fundamento que elas trariam em si, e sim uma concordância com os pedidos, porém na firme convicção que eles já decorreriam do sistema jurídico. O Ministro Teori Zavascki concedeu a medida cautelar requerida nas letras: “b”, determinando que o prazo para a realização das audiências de custódia fosse regulamentado pelo CNJ, e “h”. Indeferiu-a relativamente às letras “a”, “c”, “d”, “e” e “f”, porquanto se trataria de medidas que já comporiam o sistema normativo e haveria mecanismos próprios de correção, quais sejam, os recursos ordinários. Julgou prejudicada a cautelar requerida na letra “g”. Em seguida, o julgamento foi suspenso. 
ADPF 347 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 3.9.2015. (ADPF-347)
Repercussão Geral
Greve de servidor público e desconto de dias não trabalhados - 1
O Plenário iniciou o julgamento de recurso extraordinário em que se discute a possibilidade de desconto, nos vencimentos dos servidores públicos, dos dias não trabalhados em razão do exercício do direito de greve. Preliminarmente, o Colegiado, ao resolver questão de ordem suscitada pelo Ministro Dias Toffoli (relator), deliberou, por decisão majoritária, que uma vez reconhecida a repercussão geral da questão constitucional discutida no caso, não seria possível às partes a desistência do processo. Na situação dos autos, pouco tempo antes de instaurar-se a sessão de julgamento, a parte recorrida peticionara no sentido da desistência do mandado de segurança que ensejara o recurso extraordinário. O relator destacou que o precedente firmado no RE 669.367/RJ (DJe de 29.10.2014) — segundo o qual a parte impetrante poderia desistir de mandado de segurança, independentemente da aquiescência da autoridade apontada como coatora, da parte contrária, da entidade estatal interessada ou dos litisconsortes passivos necessários — não seria aplicável à espécie, uma vez tratar-se de processo revestido de objetividade, à luz da repercussão geral reconhecida. Frisou, ainda, o art. 998 do novo CPC, no sentido de que eventual desistência de recurso não impediria a análise de repercussão geral já reconhecida. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que admitia a desistência. 
RE 693456/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.9.2015. (RE-693456)
Greve de servidor público e desconto de dias não trabalhados - 2
No mérito, o relator conheceu em parte do recurso e a ele deu provimento, para assentar que: a) a deflagração de greve por servidor público civil corresponde à suspensão do trabalho e, ainda que a greve não seja abusiva, como regra geral, a remuneração dos dias de paralisação não deve ser paga; e b) o desconto somente não se realizará se a greve tiver sido provocada por atraso no pagamento aos servidores públicos civis ou se houver outras circunstâncias excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão da relação funcional ou de trabalho, como aquelas em que o ente da Administração ou o empregador tenha contribuído, mediante conduta recriminável, para que a greve ocorra ou em que haja negociação sobre a compensação dos dias parados ou mesmo o parcelamento dos descontos. Assinalou, de início, que o apelo extremo não deveria ser conhecido relativamente à suposta ofensa ao art. 100 da CF. Sucede que, no caso de provimento do recurso, não caberia falar em pagamento dos valores em discussão por meio de precatório, de acordo com precedentes da Corte. Quanto à parte conhecida, rememorou entendimento jurisprudencial pela da legalidade dos descontos remuneratórios alusivos aos dias de paralisação, a exemplo do que fixado no MI 708/DF (DJe de 30.10.2008). Frisou inexistir legislação específica acerca do direito de greve no setor público, razão pela qual, quando o tema alcança o STF, tem-se decidido pela aplicação da regra atinente ao setor privado. Destacou a existência, em outros países democráticos, dos fundos de greve, geridos pelos sindicatos, cujos recursos seriam usados para remunerar os servidores públicos grevistas, de forma a não onerar o Estado. Além disso, haveria países, também democráticos, em que inexistiria o direito de greve a servidores públicos. Não seria a situação brasileira, em que esse direito estaria constitucionalmente assegurado. Sublinhou a importância da negociação coletiva para resolver questões remuneratórias, muito embora os avanços no sentido da aplicação desse instituto no setor público ainda fossem pouco expressivos. Eventual compensação de dias e horas não trabalhados deveria ser sempre analisada na esfera da discricionariedade administrativa, não havendo norma a impor sua obrigatoriedade. Anotou que alguns entes federados teriam editado atos normativos impeditivos de abono ou compensação na hipótese de greve. Sem prejuízo da eventual constitucionalidade dessas normas, seria possível inferir que a opção da Administração deveria ser respeitada, inclusive ao estabelecer premissas normativas impeditivas de negociações sobre determinados pontos, desde que razoáveis e proporcionais, até o advento de lei de regência nacional sobre o tema. Enquanto isso não ocorresse, o instrumento da negociação seria o melhor caminho para solucionar conflitos em cada caso, observados os limites acima traçados. Salientou que, na espécie, não haveria dados sobre imposição de sanção administrativa , ou sobre a existência de processos disciplinares contra os grevistas. Pelo contrário, a autoridade impetrada apenas cumprira a lei e reconhecera a legitimidade dos descontos. Não haveria, por outro lado, certeza quanto à alegação de que os dias não trabalhados seriam devidamente compensados, o que seria impassível de exame no recurso. Não existiria, portanto, violação a direito líquido e certo dos impetrantes, ora recorridos. 
RE 693456/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.9.2015. (RE-693456)
Greve de servidor público e desconto de dias não trabalhados - 3
O Ministro Edson Fachin acompanhou o relator quanto ao conhecimento parcial do recurso, mas, na parte conhecida, em divergência, negou-lhe provimento. Considerou que a greve dos servidores públicos seria direito fundamental, ligado ao Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, deveria existir separação entre política e Administração como condição de efetividade dos princípios constitucionais da Administração Pública. Deveria haver um aparelhoburocrático com capacidade de decidir por mecanismos próprios, alheios a fatores externos de pressão. A respeito, a jurisprudência da Corte seria pacífica acerca da possibilidade da realização de greve no setor público, apesar da mora legislativa na matéria (MI 670/ES, DJe de 30.10.2008, e MI 780/DF, DJe de 18.8.2015). Como a greve seria o principal instrumento de reivindicações civilizatórias da classe funcional pública diante do Estado, a suspensão do pagamento da remuneração dos servidores tocaria a essencialidade do direito em debate. A adesão de servidor a movimento grevista não poderia representar uma opção economicamente intolerável ao próprio servidor e ao respectivo núcleo familiar. Ademais, consoante os citados precedentes, dever-se-ia aplicar, no que coubesse, a legislação incidente à classe trabalhadora privada, uma vez ainda inexistente regulamentação específica no tocante ao setor público. Contudo, não seria simétrica a lógica da greve nas relações trabalhistas privadas com o ambiente do serviço público. Seria necessário evitar transposições que não atendessem a essa diferenciação. No âmbito privado, a greve implicaria prejuízo ao empregador e ao trabalhador. Imposto esse ônus a ambas as partes, seria natural a busca por uma solução célere ao impasse. Isso não ocorreria no serviço público, entretanto. Por vezes, a opção do administrador seria postergar ao máximo o início das negociações. Assim, permitir o desconto imediato na remuneração dos servidores significaria que os prejuízos do movimento paredista seriam suportados por apenas uma das partes em litígio. Portanto, a interpretação da legislação aplicável (Lei 7.783/1989) conforme à Constituição significaria que as relações obrigacionais entre agente público e Administração deveriam ser regidas e sindicalizadas por decisão judicial, dada a impossibilidade de acordo, convenção ou laudo arbitral. Isso não significaria falta de consequências aos grevistas, que deveriam compensar as horas não trabalhadas ao fim da greve. Dessa forma, a suspensão do pagamento de servidores grevistas exigiria ordem judicial, que reconhecesse a ilegalidade ou abusividade da greve em concreto. Do mesmo modo, a decisão judicial deveria fixar condições para o exercício desse direito, nos termos da lei mencionada, e com o menor prejuízo possível aos beneficiários do serviço público afetado. Em seguida, pediu vista o Ministro Roberto Barroso. 
RE 693456/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 2.9.2015. (RE-693456)
Primeira Turma
Ação Penal e “habeas corpus” de ofício - 1
A Primeira Turma iniciou julgamento de questão de ordem na qual se discute a possibilidade de concessão de “habeas corpus” de ofício para trancar ação penal. No caso, delegado de polícia, hoje parlamentar, teria autorizado o pagamento de diárias, a policial, para viagens oficiais não realizadas. O juízo recebera a denúncia referente ao crime de peculato apenas em relação à policial. O tribunal, então, provera recurso do “parquet” para dar prosseguimento à ação penal relativamente ao então delegado. Em seguida, diplomado deputado, os autos vieram ao STF. Instado a se pronunciar, o Procurador-Geral da República deixara de ratificar a denúncia e requerera o arquivamento por entender ausente o dolo do acusado, o que afastaria a justa causa da ação penal. O Ministro Roberto Barroso (relator) resolveu a questão de ordem para conceder “habeas corpus” de ofício e trancar a presente ação penal por ausência de justa causa, no que foi acompanhado pelo Ministro Edson Fachin. Observou que a alteração da competência inicial em face de posterior diplomação do réu não invalidaria os atos regularmente praticados e o feito deveria prosseguir da fase em que se encontrasse, em homenagem, ao princípio “tempus regit actum”. Ressaltou que a denúncia teria sido regularmente recebida pelo então juízo natural. Não caberia, portanto, a ratificação da peça, o novo oferecimento e consequentemente a renovação do ato de recebimento. Por outro lado, o pedido de arquivamento também não seria possível neste momento processual, na medida em que o titular da ação penal na origem exercera regularmente o recebimento da denúncia. Entretanto, não se poderia extirpar o direito de o Procurador-Geral da República não querer encampar a acusação. Além disso, o STF não estaria vinculado ao recebimento da denúncia pelo juízo de 1º grau. Todavia, seria processualmente adequado o exame de eventual concessão de “habeas corpus” de ofício com base na manifestação do Procurador-Geral da República. O relator frisou que a orientação jurisprudencial do Tribunal seria no sentido de que o trancamento de ação penal pela via do “habeas corpus” só seria cabível quando estivessem comprovadas, desde logo, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a evidente ausência de justa causa. 
AP 905 QO/MG, rel. Roberto Barroso, 1º.9.2015. (AP-905)
Ação Penal e “habeas corpus” de ofício - 2
O relator assinalou que o Procurador-Geral da República concluíra pela ausência de justa causa. Constatou não haver nos autos prova do dolo efetivo do acusado. Haveria, na denúncia, um conjunto relevante de depoimentos, no sentido de que o réu, como delegado chefe, cumpriria função puramente burocrática. A atribuição de autorização do pagamento das diárias seria, efetivamente, do chefe imediato da policial. Assim, o parlamentar estaria sendo submetido a processo penal apenas pela sua posição hierárquica, sem nenhum tipo de envolvimento direto com os fatos. Em divergência, o Ministro Marco Aurélio resolveu a questão de ordem pela impossibilidade da concessão de “habeas corpus” de ofício e pelo prosseguimento da ação penal. Pontuou que, segundo precedentes do STF, o elemento subjetivo do tipo deveria ser elucidado no correr do processo-crime. Destacou que passaria pelo acuado o deferimento, a autorização ou não da concessão das diárias. Ponderou que se deveria aguardar a instrução do processo-crime e o julgamento final para definir-se o alcance da culpabilidade. Em seguida, pediu vista a Ministra Rosa Weber. 
AP 905 QO/MG, rel. Roberto Barroso, 1º.9.2015. (AP-905)
RE e análise dos requisitos de admissibilidade de REsp - 3
O recurso extraordinário é instrumento processual idôneo para questionar o cabimento de recurso especial manejado em face de decisão proferida em sede de suspensão de liminar deferida ao Poder Público com base no art. 4º da Lei 8.437/1992 (“Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas”). Essa a orientação da Primeira Turma, que, em conclusão de julgamento e por maioria, proveu agravo regimental para assegurar o trânsito do recurso extraordinário. Na espécie, o STJ não conhecera de recurso especial sob o fundamento de que não poderia ser utilizado para impugnar decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão de segurança. Segundo o STJ, o recurso especial se destinaria a combater argumentos que dissessem respeito a exame de legalidade, ao passo que o pedido de suspensão ostentaria juízo político — v. Informativos 750 e 778. A Turma entendeu que a decisão em sede de suspensão de segurança não seria estritamente política, mas teria conteúdo jurisdicional, o que, de início, desafiaria recurso especial. O Ministro Edson Fachin, ao desempatar a questão, ressaltou que o cabimento de recurso especial na hipótese de concessão de suspensão de liminar nas instâncias judiciárias respectivas seria matéria de índole constitucional e, portanto, deveria ser analisada pelo STF. Registrou, por fim, que a jurisprudência da Turma seria no sentido da admissibilidade do recurso extraordinário interposto contra decisão do STJ que contrariasse, em tese, o art. 105, III,da CF. Vencidos a Ministra Rosa Weber (relatora) e o Ministro Roberto Barroso, que negavam provimento ao agravo regimental. 
RE 798740 AgR/DF, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 1º.9.2015. (RE-798740)
ECT e prescrição
A Primeira Turma iniciou julgamento de controvérsia relativa à aplicação da prescrição quinquenal prevista no Decreto 20.910/1932 à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT. A Ministra Rosa Weber (relatora) manteve a decisão agravada, no que foi acompanhada pelo Ministro Roberto Barroso. Entendeu que o conceito de fazenda pública se estenderia à ECT, empresa pública federal prestadora de serviço público. Em divergência, os Ministros Marco Aurélio e Edson Fachin deram provimento ao agravo regimental para assegurar o trânsito do recurso extraordinário. Pontuaram que o Tribunal deveria examinar o tema a respeito da sujeição de empresas públicas ao regime de direito privado. Em seguida, a Turma suspendeu o exame do processo para aguardar o voto de desempate do Ministro Luiz Fux. 
RE 790059 AgR-AgR/DF, rel. Min. Rosa Weber, 1º.9.2015. (RE-790059)
Segunda Turma
Recurso exclusivo da defesa e “reformatio in pejus” - 2 
Ante o empate na votação, a Segunda Turma, em conclusão de julgamento, deu provimento a recurso ordinário em “habeas corpus” a fim de que seja refeita a dosimetria da pena em relação ao recorrente. Na espécie, afirmava-se a existência de “reformatio in pejus” em acórdão que, ao apreciar recurso exclusivo da defesa, mantivera a condenação do ora recorrente pela prática do crime de furto tentado (CP, art. 155 c/c art. 14, II), afastada a qualificadora da escalada (CP, art. 155, § 4º, II), porém acrescida da causa de aumento do repouso noturno (CP, art. 155, § 1º) — v. Informativo 781. Tratava-se de controvérsia relativa ao alcance da parte final do art. 617 do CPP (“O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença”), acerca do agravamento de pena quando somente o réu houvesse apelado da sentença. Prevaleceu a tese de que a melhor interpretação a ser dada à parte final do art. 617 do CPP seria a sistemática, a levar em conta que a norma estaria inserida em um conjunto organizado de ideias e, por isso, a vedação da “reformatio in pejus” não se restringiria à quantidade final de pena, porquanto não se trataria de mero cálculo aritmético, mas sim de efetiva valoração da conduta levada a efeito pelo sentenciado. Ao fixar a pena-base, o magistrado se ateria às vetoriais do art. 59 do CP. No caso, ao se comparar a pena final do recorrente (1 ano, 5 meses e 23 dias de reclusão) com aquela imposta em 1ª instância (2 anos, 7 meses e 15 dias de reclusão), o apelante parecia ter sido beneficiado pela decisão de 2ª instância. Observou-se que após o trânsito em julgado para o Ministério Público, o tribunal de apelação reconhecera a existência de uma circunstância qualificadora (delito praticado durante o repouso noturno), que em momento algum fora aventada. Contudo, ainda que presentes todos os requisitos fáticos para a aplicação dessa qualificadora, a ausência de recurso da acusação vedaria esse proceder, visto se tratar de elemento desfavorável à defesa. Assim, a decisão de 2ª instância aumentara a pena atribuída a cada vetorial negativa reconhecida e agregara à decisão uma qualificadora inexistente, a gerar prejuízo e constrangimento ilegal. Por outro lado, os Ministros Dias Toffoli (relator) e Teori Zavascki negavam provimento ao recurso. Admitiam a devolução, ao tribunal “ad quem”, de todo o conjunto da matéria na sua requalificação dos fatos aos tipos penais. Concluíam que, por não ter havido agravamento, fosse da pena, fosse do regime de cumprimento dela, não estaria configurada a “reformatio in pejus”.
RHC 126763/MS, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 1º.9.2015. (RHC-126763)
Denúncia e prazo em dobro para resposta à acusação
Em face da importância da fase pré-processual da denúncia, a Segunda Turma, por maioria, deu provimento, em parte, a agravo regimental em inquérito para deferir o prazo em dobro para que o denunciado apresente sua resposta. Na espécie, o requerente fizera dois pedidos: a) que tivesse acesso à integralidade da prova disponível à acusação, com a reabertura de prazo para a resposta preliminar; e b) que o prazo de 15 dias do art. 4º da Lei 8.038/1990 (“Art. 4º - Apresentada a denúncia ou a queixa ao Tribunal, far-se-á a notificação do acusado para oferecer resposta no prazo de quinze dias”) fosse contado em dobro, por aplicação analógica do art. 191 do CPC (“Art. 191 - Quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos”). Quanto ao termo “a quo” do prazo, a Turma denegou o pedido, porque toda a documentação que teria relação direta com a denúncia estaria disponível na secretaria do STF para que a defesa procedesse à devida resposta. Por outro lado, em nome do princípio da ampla defesa, deferiu a concessão do prazo em dobro. Destacou que o art. 4º da Lei 8.038/1990 permitiria, nessa fase processual, que o denunciado oferecesse resposta às imputações penais que contra ele tivessem sido deduzidas pelo Ministério Público. A amplitude material da defesa alcançaria não apenas preliminares ou questões formais, mas também o próprio mérito da imputação penal. Abarcaria, ainda, a possibilidade de o Tribunal, após o oferecimento da denúncia, exercer o controle de admissibilidade da acusação penal, ao acolher, receber ou rejeitar a denúncia e mesmo julgar improcedente o pedido e, em consequência, proferir juízo de absolvição penal, nos termos da Lei 8.038/1990 (“Art. 6º - A seguir, o relator pedirá dia para que o Tribunal delibere sobre o recebimento, a rejeição da denúncia ou da queixa, ou a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas”). Vencido o Ministro Teori Zavascki (relator), que negava provimento ao agravo regimental. Apontava tratar-se de um prazo em que a ação penal sequer fora instaurada e, por isso, não se poderia aferir a existência de litisconsórcio, justamente porque as partes na ação penal ainda não estariam definidas. Afirmava que esse tipo de manifestação não teria relação com as situações previstas no CPC que pudessem estabelecer uma analogia, como seria o caso dos recursos.
Inq 4112/DF, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 1º.9.2015. (Inq-4112)
Sessões	Ordinárias	Extraordinárias	Julgamentos
Pleno	2.9.2015	3.9.2015	7
1ª Turma	1º.9.2015	—	96
2ª Turma	1º.9.2015	—	222
R e p e r c u s s ã o G e r a l
DJe de 31 de agosto a 4 de setembro de 2015
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 851.421-DF
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
IMPOSTO SOBRE A CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS – GUERRA FISCAL – BENEFÍCIOS FISCAIS DECLARADOS INCONSTITUCIONAIS – CONVALIDAÇÃO SUPERVENIENTE MEDIANTE NOVA DESONERAÇÃO – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia relativa à constitucionalidade da prática mediante a qual os estados e o Distrito Federal, respaldados em consenso alcançado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, perdoam dívidas tributárias surgidas em decorrência do gozo de benefícios fiscais assentados inconstitucionais pelo Supremo, porque implementados em meio à chamada guerra fiscal do ICMS.
REPERCUSSÃO GERAL EM ARE N. 884.325-DF
RED. P/ O ACÓRDÃO: MIN. EDSON FACHIN
Ementa: CONSTITUCIONAL. ECONÔMICO. INTERVENÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA. NORMAS DE INTERVENÇÃO. LIBERDADE DE INICIATIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SETOR SUCROALCOOLEIRO. QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO DANO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. Tem repercussão geral a questão relativa à responsabilidade objetiva da União e à qualificação jurídica do dano causado ao setor sucroalcooleiro, em virtude da fixação dos preços dos produtos do setorem valores inferiores ao levantamento de custos realizados pela Fundação Getúlio Vargas, levando-se em conta o valor constitucional da livre iniciativa e a intervenção do Estado no domínio econômico. 
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 662.055-SP
RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DIREITOS DOS ANIMAIS E RELEVANTE PREJUÍZO COMERCIAL A EVENTO CULTURAL TRADICIONAL. RESTRIÇÕES A PUBLICAÇÕES E DANOS MORAIS. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL. 
1. A decisão recorrida impôs restrições a publicações em sítio eletrônico de entidade de proteção aos animais, que denunciava a crueldade da utilização de animais em rodeios, condenando-a ao pagamento de danos morais e proibindo-a de contactar patrocinadores de um evento específico, tradicional e culturalmente importante. 
2. Constitui questão constitucional da maior importância definir os limites da liberdade de expressão em contraposição a outros direitos de igual hierarquia jurídica, como os da inviolabilidade da honra e da imagem, bem como fixar parâmetros para identificar hipóteses em que a publicação deve ser proibida e/ou o declarante condenado ao pagamento de danos morais, ou ainda a outras consequências jurídicas. 
3. Repercussão geral reconhecida. 
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 848.826-DF
RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. JULGAMENTO DAS CONTAS DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO COMO ORDENADOR DE DESPESAS. COMPETÊNCIA: PODER LEGISLATIVO OU TRIBUNAL DE CONTAS. REPERCUSSÃO GERAL. 
1. Inadmissão do recurso no que diz respeito às alegações de violação ao direito de petição, inafastabilidade do controle judicial, devido processo legal, contraditório, ampla defesa e fundamentação das decisões judiciais (arts. 5º, XXXIV, a, XXXV, LIV e LV, e 93, IX, da CF/1988). Precedentes: AI 791.292 QO-RG e ARE 748.371 RG, Rel. Min. Gilmar Mendes. 
2. Constitui questão constitucional com repercussão geral a definição do órgão competente – Poder Legislativo ou Tribunal de Contas – para julgar as contas de Chefe do Poder Executivo que age na qualidade de ordenador de despesas, à luz dos arts. 31, § 2º; 71, I; e 75, todos da Constituição. 
3. Repercussão geral reconhecida. 
Decisões Publicadas: 4
C l i p p i n g d o D Je
31 de agosto a 4 de setembro de 2015
AG. REG. NO ARE N. 669.072-MG
RELATORA: MIN. ROSA WEBER
EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. COFINS E CSLL. COMPENSAÇÃO. REVOGAÇÃO MEDIANTE MEDIDA PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DE HIERARQUIA ENTRE LEI COMPLEMENTAR E LEI ORDINÁRIA. CONSONÂNCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.  ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, II, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEGALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL DA CONTROVÉRSIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ARTIGO 93, IX, DA CARTA MAGNA. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE NÃO MERECE TRÂNSITO. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 16.3.2011.
1. O entendimento adotado pela Corte de origem, nos moldes do assinalado na decisão agravada, não diverge da jurisprudência firmada no âmbito deste Supremo Tribunal Federal, no sentido da inexistência de reserva de lei complementar para dispor sobre isenção pertinente à Cofins, bem como ausente relação hierárquica entre lei complementar e lei ordinária (art. 59 da Constituição) porquanto, em matéria tributária, a reserva de lei complementar é definida em razão da matéria.
2. Obstada a análise da suposta afronta aos incisos II e LV do artigo 5º da Carta Magna, porquanto dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, procedimento que refoge à competência jurisdicional extraordinária desta Corte Suprema, a teor do art. 102 da Magna Carta. 
3. Inexiste violação do artigo 93, IX, da Constituição Federal. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, dispensando o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes.
4. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada.
5. Agravo regimental conhecido e não provido.
AG. REG. NO HC N. 128.617-RN
RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
Ementa: Processual Penal. Habeas corpus substitutivo de Recurso Ordinário. Condenação transitada em julgado. Crimes de roubo majorado e receptação. Alegações de inépcia da denúncia e  cerceamento do direito de defesa.
1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento no sentido da inadmissibilidade do uso da ação de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário previsto na Constituição Federal (v.g HC 109.956, Rel. Min. Marco Aurélio; e HC 104.045, Rel.ª Min.ª Rosa Weber). Da mesma forma, o Supremo Tribunal Federal não admite a utilização do habeas corpus em substituição à ação de revisão criminal (v.g, RHC119.605-AgR, Rel. Min. Luís Roberto Barroso; HC 111.412-AgR, Rel. Min. Luiz Fux; RHC 114.890, Rel. Min. Dias Toffoli; HC 116.827-MC, Rel. Min. Teori Zavascki; RHC 116.204, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia; e RHC 115.983, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). 
2. A alegação de inépcia da denúncia não foi apreciada pela autoridade impetrada, o que impede o imediato exame da matéria, sob pena de indevida supressão de instância (v.g HC 116.350-AgR, Relª Minª Rosa Weber, e HC 114.166, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). Não bastasse, a orientação jurisprudencial desta Corte é no sentido de que a “A alegação de inépcia da denúncia está preclusa quando suscitada após a sentença penal condenatória” (RHC 105.730, Rel. Min. Teori Zavascki). No mesmo sentido: RHC 120.473, Rel.ª Min.ª Rosa Weber; RHC 122.465-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes; RHC 120.751, Rel.ª Min.ª Rosa Weber; HC 111.363, Rel. Min. Luiz Fux; RHC 116.619, Rel. Min. Ricardo Lewandowski).
3. Quanto à alegação de cerceamento do direito de defesa, o acolhimento da pretensão defensiva quanto à análise do exaurimento, ou não, dos meios necessários para a localização do paciente demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório da causa, inviável na via processualmente restrita do habeas corpus, notadamente após o trânsito em julgado da condenação.
4. Agravo regimental desprovido.
AG. REG. NO HC N. 128.693-SP
RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
Ementa: Penal. Habeas corpus contra ato de Ministro do Superior Tribunal de Justiça. Casa de prostituição. Condenação transitada em julgado. Dosimetria da pena. Regime inicial. Substituição da pena privativa de liberdade. 
1. Inexistindo pronunciamento colegiado do Superior Tribunal de Justiça, não compete ao Supremo Tribunal Federal examinar a questão de direito implicada na impetração. Nesse sentido foram julgados os seguintes precedentes: HC 113.468, Rel. Min. Luiz Fux; HC 117.502, Relator para o acórdão o Min. Luís Roberto Barroso; HC 108.141-AgR, Rel. Min. Teori Zavascki; e o HC 122.166-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski.
2. O Supremo Tribunal Federal não admite a utilização do habeas corpus em substituição à ação de revisão criminal (v.g, RHC119.605-AgR, Rel. Min. Luís Roberto Barroso; HC 111.412-AgR, Rel. Min. Luiz Fux; RHC 114.890, Rel. Min. Dias Toffoli; HC 116.827-MC, Rel. Min. Teori Zavascki; RHC 116.204, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia; e RHC 115.983, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). 
3. A dosimetria da pena é questão relativa ao mérito da ação penal, estando necessariamente vinculada ao conjunto fático probatório, não sendo possível às instâncias extraordinárias a análise de dados fáticos da causa para redimensionar a pena finalmente aplicada. De modo que a discussão a respeito da dosimetria da pena se cinge ao controle da legalidade dos critérios utilizados, restringindo-se, portanto, ao exame da “motivação [formalmente idônea] de mérito e à congruência lógico-jurídica entre os motivos declarados e a conclusão” (HC 69.419, Rel.Min. Sepúlveda pertence).
4. A orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que “A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea” (Súmula 719/STF). 
5. As instâncias de origem, ao concluírem que a conversão da reprimenda não se mostra recomendável diante da presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis, também não divergiram da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal (vg. RHC 122.132-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes; HC 117.719, Rel. Min. Teori Zavasacki; HC 119.811, Rel. Min. Teori Zavascki; ARE 774.815-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes; RHC 118.658, Rel. Min. Luiz Fux).
6. Agravo regimental desprovido.
AG. REG. NO RHC N. 118.621-ES
RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
Ementa: Agravo regimental no recurso ordinário em habeas corpus. Formação de quadrilha, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Interceptações telefônicas.
1. As instâncias precedentes afirmaram que a interceptação telefônica foi precedida de diligências preliminares que demonstraram a “necessidade e indispensabilidade da medida”. Para dissentir-se desse entendimento seria necessário o revolvimento de fatos e provas, inviável na via do habeas corpus.
2. “O Supremo Tribunal Federal afasta a necessidade de transcrição integral dos diálogos gravados durante quebra de sigilo telefônico, rejeitando alegação de cerceamento de defesa pela não transcrição de partes da interceptação irrelevantes para o embasamento da denúncia” (Inq. 3693, Rel.ª  Min.ª Cármen Lúcia). No mesmo sentido, o AI 685878-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
AG. REG. NO RE N. 869.633-SC
RELATORA: MIN. ROSA WEBER
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ADICIONAL DE RISCO DE VIDA. DISCUSSÃO ACERCA DA NATUREZA JURÍDICA DA VERBA. DEBATE DE ÂMBITO INFRACONSTITUCIONAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, II, XXXVI, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEGALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. EVENTUAL OFENSA REFLEXA NÃO VIABILIZA O MANEJO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ART. 102 DA LEI MAIOR. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ARTIGO 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL.  ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 02.6.2014.
1. A controvérsia, a teor do já asseverado na decisão guerreada, não alcança estatura constitucional. Não há falar em afronta aos arts. 150, I, 154, I, e 195, I, “a”, da Constituição Federal. Compreender de modo diverso exigiria a análise da legislação infraconstitucional encampada na decisão da Corte de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa, insuscetível, como tal, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. 
2. Inexiste violação do artigo 93, IX, da Lei Maior. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, dispensando o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes.
3. O exame da alegada ofensa ao art. 5º, II, XXXVI, LIV e LV, da Constituição Federal, observada a estreita moldura com que devolvida a matéria à apreciação desta Suprema Corte, dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, o que refoge à competência jurisdicional extraordinária, prevista no art. 102 da Magna Carta.
4. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada.
5. Agravo regimental conhecido e não provido.
EMB.DECL. NO AG. REG. NO RE N. 632.343-RJ
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário. Matéria criminal. Omissão no acórdão questionado não caracterizada. Caráter manifestamente protelatório do recurso. Pretensão de alcançar a prescrição da pretensão punitiva. Risco iminente da prescrição. Possibilidade de baixa imediata dos autos independentemente da publicação da decisão. Entendimento consolidado na jurisprudência da Corte. Precedentes. Rejeição dos embargos. Baixa imediata dos autos ao juízo de origem. 
1. Nenhuma das hipóteses autorizadoras da oposição do recurso declaratório (RISTF, art. 337) está configurada no caso dos autos, já que o acórdão embargado abordou, de forma fundamentada, todos os pontos colocados em debate, nos limites necessários ao deslinde da controvérsia. 
2. Intenção de se procrastinar a prestação jurisdicional da Corte e, assim, obstar a persecução penal, uma vez a prescrição da pretensão punitiva, pela pena em abstrato, se avizinha (29/8/15).
3. Hipótese absolutamente repelida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a qual consigna que a utilização de recurso manifestamente protelatório autoriza o imediato cumprimento da decisão proferida pela Suprema Corte, independentemente da publicação do acórdão (RE nº 839.163/DF-QO, Tribunal Pleno, de minha relatoria, DJe de 9/2/15). 
4. Embargos de declaração rejeitados. 
5. Baixa imediata dos autos ao juízo de origem, independentemente da publicação do acórdão, tendo em vista o caráter manifestamente protelatório do recurso. 
AG. REG. NO ARE N. 851.864-ES
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Constitucional. Terreno de marinha. Ilha costeira. Sede de Município. EC nº 46/2005. Propriedade. Titularidade. Discussão. Repercussão geral. Decisão que determina o retorno dos autos à origem. Precedentes. 
1. O Supremo Tribunal Federal, no exame do RE nº 636.199/ES, Relatora a Ministra Rosa Weber, reconheceu a repercussão geral da matéria relativa à “situação dos terrenos de marinha localizados em ilhas costeiras com sede em município, após advento da Emenda Constitucional 46/2005”.
2. Manutenção da decisão que, com base no art. 328, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, determinou a devolução dos autos ao Tribunal de origem para a observância do disposto no art. 543-B do Código de Processo Civil. 
3. Agravo regimental não provido.
AG. REG. NO ARE N. 880.159-SC
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA: Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Princípio da legalidade. Ofensa reflexa. Servidor público. Gratificação. Direito à percepção. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade.  Valores recebidos de boa-fé. Restituição. Discussão.   Ausência de repercussão geral. Precedentes.
1. A afronta aos princípios da legalidade, do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, dos limites da coisa julgada ou da prestação jurisdicional, quando depende, para ser reconhecida como tal, da análise de normas infraconstitucionais, configura apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição Federal. 
2. Não se presta o recurso extraordinário para o exame do conjunto fático-probatório da causa. Incidência da Súmula nº 279/STF.
3. O Supremo Tribunal Federal no exame  do AI nº 841.473/RS, Relator o Ministro Cezar Peluso, assentou a ausência de repercussão geral do tema relativo à “restituição de valores pagos indevidamente pela Administração Pública à beneficiário de boa-fé” em razão da  inexistência de questão constitucional a ser examinada.
4. Agravo regimental não provido.
Acórdãos Publicados: 363
Transcrições
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes (Transcrições)
(v. Informativo 796)
RE 592.581-RS*
RELATOR: Ministro Ricardo Lewandowski
VOTO DO MINISTRO EDSON FACHIN:
Trata-se de Recurso Extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, cuja ementa se transcreve:
“Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DETERMINAÇÃO AO PODER EXECUTIVO DE REALIZAÇÃO DE OBRAS EM PRESÍDIO.DECABIMENTO. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO.
Preliminar:
O pedido não é juridicamente impossível, porquanto não lhe veda expressamente a ordem jurídica.
Mérito:
O texto constitucional dispõe sobre os direitos fundamentais do preso, sendo certo que as precárias condições dos estabelecimentos prisionais importam ofensa à sua integridade física e moral. A dificuldade está na técnica da efetivação desses direitos fundamentais.
É que diversa a carga de eficácia quanto se trata de direito fundamental prestacional proclamado em norma de natureza eminentemente programática, ou quando sob forma que permita, de logo, com ou sem interposição legislativa, o reconhecimento de direito subjetivo do particular (no caso do preso), como titular do direito fundamental.
Aqui o ponto: saber se a obrigação imposta ao Estado atende norma constitucional programática, ou norma de natureza imposivita (sic).
Vê-se às claras, que mesmo não tivesse ficado no texto constitucional senão que também na Lei das Execuções Criminais, cuida-se de norma de cunho programático. Não se trata de disposição auto-executável, apenas traça linha geral de ação ditada ao poder público.
Para além (sic) disso, sua efetiva realização apresenta dimensão econômica que faz depender da conjuntura; em outras palavras, das condições que o Poder Público, como destinatário da norma, tenha de prestar. Daí que a limitação de recursos constitui, na opinião de muitos, no limite fático à efetivação das normas de natureza programática. É a denominada ‘reserva do possível’.
Pois a ‘reserva do possível’, no que respeita aos direitos de natureza programática, tem a ver não apenas com a possibilidade material para sua efetivação (econômica, financeira, orçamentária), mas também, e por conseqüência, com o poder de disposição de parte do Administrador, o que imbrica na discricionariedade, tanto mais que não se trata de atividade vinculada.
Ao Judiciário não sabe determinar ao Poder Executivo a realização de obras, como pretende o Autor Civil, mesmo pleiteadas a título de direito constitucional do preso, pena de fazer às vezes de administrador, imiscuindo-se indevidamente em seara reservada à Administração.
Falta aos Juízos, porque situados fora do processo político-administrativo, capacidade funcional de garantir a efetivação de direitos sociais prestacionais, sempre dependentes de condições de natureza econômica ou financeira que longe estão dos fundamentos jurídicos.”
No Recurso Extraordinário, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, preliminarmente, alega a repercussão geral da matéria, tendo em vista a violação dos direitos fundamentais do preso e do princípio da dignidade humana. Também afirma o prequestionamento do disposto no artigo 5º, XLIX e art. 1º, III, ambos da Constituição Federal.
No tocante ao mérito, requer a reforma da decisão colegiada, pois teria sido desconsiderada a aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais. Acrescenta que impossibilidade de ordem orçamentária não pode servir de justificativa para a não efetivação desses direitos, assim como deve ser observada a vinculação do Poder Público quanto à implementação de políticas públicas nesta seara.
Pondera que não há ofensa ao princípio da separação de poderes na apreciação da questão pelo Poder Judiciário, pois esse Poder também seria “Estado” e o texto constitucional garante o acesso à prestação jurisdicional como direito fundamental (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal). Disto decorre que a atuação do Judiciário - como Estado na espécie - apenas tornaria efetivo o dever constitucional de garantir a integridade física e moral dos presos.
Pede, por fim, a reforma integral do acórdão, provendo o recurso extraordinário a fim de compelir o Estado do Rio Grande do Sul a realizar, no prazo de seis meses, obras de reforma geral no Albergue Estadual de Uruguaiana.
Não foram apresentadas contrarrazões (doc. 4).
Foram admitidos como amici curiae os Estados do Acre, Amazonas, Espírito Santo, Minas Gerais, Piauí, Rondônia, Bahia, Roraima, Amapá, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal (doc. 05), Rio de Janeiro (doc. 06), São Paulo (doc. 12), Pará (doc. 14).
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil apresentou memorial (doc. 20) a fim de contribuir para o deslinde do feito. Alega que o quadro verificado no sistema prisional brasileiro deve-se à ausência de vontade/conveniência política e pelo senso coletivo de “justiça” que “coloca ao sopé das listas de prioridades a implementação de condições minimamente dignas para o cumprimento de penas privativas de liberdade”. (pág. 5, doc. 20). Afirma, ainda, a existência de recursos financeiros dos fundos penitenciários para implementação das obras necessárias. Conclui que a falta de opção política para tanto abre a possibilidade de atuação do Poder Judiciário “em suplementação ao Executivo quando esse não age em atenção a postulados de observância obrigatória derivados da Carta Magna por razões injustificada”. (pág. 6, doc. 20)
Em parecer (doc. 18), o Procurador-Geral da República opina pelo provimento do recurso extraordinário. Por didática e elucidativa, transcrevo a ementa da mencionada peça:
“CONSTITUCIONAL. REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TEMA 220. SISTEMA PRISIONAL. RESPEITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DOS PRESOS. DIREITO FUNDAMENTAL. APLICABILIDADE IMEDIATA. RESERVA DO POSSÍVEL. DEVER DE O ESTADO GARANTIR O MÍNIMO EXISTENCIAL. INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM POLÍTICAS PÚBLICAS. OMISSÃO ESTATAL. DETERMINAÇÃO AO EXECUTIVO DE OBRAS EM ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS.
1. A designação do problema como ‘controle judicial de políticas públicas’ pode levar à conclusão da ilicitude de intervenção judicial no caso, sem se demonstrar antes a premissa de que o tema não é jurídico, mas político, e, portanto, entregue apenas aos órgãos de representação popular. Existência de direito fundamental eventualmente desrespeitado por ação ou omissão estatal torna jurídica a questão.
2. É impossível adotar soluções absolutas em todas as questões atinentes a direitos fundamentais. A diferença de densidade dos programas e dos domínios normativos dos direitos fundamentais brasileiros é obstáculo à generalização de conclusões para sua concretização, por meio da transposição de precedentes. É necessário construir casuística graduada e adequada à espécie de direito fundamental em causa.
3. Há equívoco em subsumir o direito à integridade física e moral dos presos, previsto no art. 5º, XLIX, da Constituição da República, à categoria dos direitos sociais, a cuja realização se opõem restrições discricionariedade política e de reserva do possível. Esse direito fundamental é direito de defesa, malgrado eventualmente uma de suas consequências jurídicas- secundárias- seja o deferimento de prestação estatal. Deve preponderar o critério material, em detrimento do formal, na classificação dos direitos fundamentais brasileiros: direito de defesa visam à garantia jurídica da liberdade, mediante omissões do Estado, ao passo que direitos sociais promovem igualdade de fato entre pessoas, para que as menos aquinhoadas possam desfrutar de liberdade jurídica, por meio de prestações jurídicas ou materiais do Estado.
4. Uma vez que os presos não possuem, por definição, liberdade de fato, mas apenas limitado raio de liberdade jurídica, sua integridade recai no âmbito dos direitos de defesa.
5. Ao contrário dos direitos a prestações, cuja implementação estatal se satisfaz por qualquer das opções adequadas adotadas pelo legislador ou pelo administrador, direitos de defesa somente são respeitados caso o Estado se abstenha de todos comportamentos capazes de suprimi-los ou de lesá-los. Não cabe falar, aí, de discricionariedade legislativa ou executiva no fornecimento de condições materiais que atendam ao art. 5º, XLIX, da CR.
6. Possui aplicabilidade imediata o direito fundamental ao respeito à integridade física e moral dos cidadãos presos (art. 5º, XLIX e § 1º). O estado do sistema carceráriobrasileiro fere a ordem constitucional e deveres convencionais e legais do Brasil.
7. Não cabe aplicação da cláusula da reserva do possível que resulte em negativa de vigência de núcleo essencial de direito fundamental. O Estado deve garantir proteção do mínimo existencial do direito fundamental de respeito à integridade física e moral dos presos. Núcleo essencial intangível a ser assegurado, independentemente de condições adversas, limites financeiros ou colisão com outros direito fundamentais.
8. Tem legitimidade o Poder Judiciário para determinar adoção de políticas públicas que garantam intangibilidade do mínimo existencial do direito fundamental ao respeito à integridade física e moral dos presos, como reforma, ampliação e construção de estabelecimentos prisionais, em caso de omissão dos entes estatais. Precedentes.
9. Parecer pelo provimento do recurso extraordinário.”
É, em suma, o relatório/Voto.
- Premissa: o que é uma Constituição? / o que uma Constituição constitui?
A promulgação da Constituição da República de 1988 inaugurou uma nova ordem político-jurídica no Brasil. A partir de 05 de outubro de 1988, a Constituição deixou de ser compreendida apenas como mero documento político organizador do estado e repartidor de competências, passou a ser compreendida como um projeto de construção nacional, com princípios (art. 3) e objetivos (art. 4) expressos, prevendo um rol de direitos e garantias fundamentais (art. 5 ao art. 17), redefinindo a organização e separação entre os Poderes. Dessa forma, a questão central a partir de 1988 deixou de ser “o que é uma constituição”, e passou a ser “o que uma constituição constitui”. E a Constituição de 1988 não mais um mero documento organizador do poder do Estado, mas sim o compromisso fundamental de uma comunidade de pessoas que se reconhecem reciprocamente como livres e iguais. (NETO, Menelick de Carvalho; SCOTTI, Guilherme. Os Direitos Fundamentais e a (In)Certeza do Direito – A produtividade das Tensões Principiológicas e a Superação do Sistema de Regras. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 19-20) Uma comunidade que deve, portanto, se preocupar inclusive com seus concidadãos presos, encarcerados, mas não por isso menos dignos de igual respeito e consideração.
- O direito fundamental de proteção à integridade física e moral dos presos (art. 5º, XLIX)
Partindo dessa premissa e cotejando-a com o presente caso, a questão central a ser analisada no presente Recurso Extraordinário diz respeito ao conteúdo normativo do direito à integridade física e moral do preso, consoante o disposto no art. 5º, XLIX, da Constituição da República, bem como aos limites e possibilidades de atuação do Poder Judiciário, em conformidade com o princípio da separação de poderes insculpido no art. 2º do Texto Constitucional.
O conteúdo normativo do artigo 5º, XLIX, consiste na proteção e garantia da saúde física e moral do preso. Vale dizer, é dever do Estado garantir que as condições de encarceramento sejam dignas, de tal forma que suas condições de saúde física e moral sejam bem protegidas. Tal previsão é densificada e pormenorizada em normas infraconstitucionais que não são novas e de há muito conhecidas pelos Estados.
Nesse sentido, é de se destacar que as condições em que a execução penal deve transcorrer encontram-se expressas na Lei 7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execução Penal, cujos art. 1º e 3º bem sintetizam seu conteúdo:
“Art. 1º. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”
“Art. 3º. Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.
Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.”
Ao dispor sobre o alojamento do preso em cela individual em penitenciária, diz o art. 88, da LEP:
“Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório.
Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).”
Esses parâmetros devem ser observados ainda na penitenciária feminina (art.89), na Colônia Agrícola, Industrial ou Similar (art. 92), em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (art. 99, parágrafo único), bem como na hipótese de isolamento como sanção disciplinar (art. 53, IV) e cadeia pública (art. 104). 
A Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal assim explica sua essência:
“19. O princípio da legalidade domina o corpo e o espírito do Projeto, de forma a impedir que o excesso ou o desvio da execução comprometam a dignidade e a humanidade do Direito Penal.
20. É comum, no cumprimento das penas privativas da liberdade, a privação ou a limitação de direitos inerentes ao patrimônio jurídico do homem e não alcançados pela sentença condenatória. Essa hipertrofia da punição não só viola a medida da proporcionalidade como se transforma em poderoso fator de reincidência, pela formação de focos criminógenos que propicia.
(...)
65. Tornar-se-á inútil, contudo, a luta contra os efeitos nocivos da prisionalização, sem que se estabeleça a garantia jurídica dos direitos do condenado.
67. A norma do art. 39, que impõe a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e presos provisórios, reedita a garantia constitucional que integra a Constituição do Brasil desde 1967.
68. No estágio atual de revisão dos métodos e meios de execução penal, o reconhecimento dos direitos da pessoa presa configura exigência fundamental.
(...)
74. A declaração desses direitos não pode conservar-se, porém, como corpo de regras meramente programáticas. O problema central está na conversão das regras em direitos do prisioneiro, positivados através de preceitos e sanções.
75. O Projeto indica com clareza e precisão o repertório dos direitos do condenado, a fim de evitar a fluidez e as incertezas resultantes de textos vagos ou omissos: alimentação suficiente e vestuária; atribuição de trabalho e sua remuneração; previdência social; constituição de pecúlio; proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, quando compatíveis com a execução da pena; assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; entrevista pessoal reservada com o advogado; visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos; chamamento nominal; igualdade de tratamento; audiência com o diretor do estabelecimento; representação e petição a qualquer autoridade em defesa de direito; contato com o mundo exterior através de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação (art. 40).
76. Esse repertório, de notável importância para o habitante do sistema prisional, seja ele condenado ou preso provisório, imputável, semi-imputável ou inimputável, se harmoniza não somente com as declarações internacionais de direitos mas também com os princípios subjacentes ou expressos de nosso sistema jurídico e ainda com o pensamento e idéias dos penitenciaristas (Jason Soares de ALBERGARIA. Os direitos do homem no Processo Penal e na execução da pena. Belo Horizonte, 1975).” (portal.mj.gov.br. Acesso em 13.08.2015)
Paralelamente, por meio da Resolução 09, de 18 de novembro de 2011, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária/Ministério da Justiça estabeleceu diretrizes básicas para arquitetura penal, das quais se destacam as seguintes recomendações gerais:
“3.1. Capacidade dos Estabelecimentos Penais
O Conjunto Penal tem capacidade ilimitada, desde que os diversos estabelecimentos que o compõem respeitem as capacidades para ele fixadas anteriormente e sejam independentes entre si ouestanques.
Em nenhuma hipótese um módulo de celas poderá ultrapassar a capacidade de 200 pessoas presas.
Em todas as penitenciárias e cadeias públicas que possuam celas coletivas, deverá ser previsto um mínimo de celas individuais (2% da capacidade total), para o caso de necessidade de separação da pessoa presa que apresente problemas de convívio com os demais por período determinado (Portaria Ministério da Justiça/DEPEN nº 01, de 27.01.2004, anexo) e pelo menos uma cela com instalação sanitária, por módulo, obedecendo aos parâmetros de acessibilidade (NBR 9050/2004).
3.2. Parâmetros Arquitetônicos para a Acomodação de Pessoas Presas
A cela individual é a menor célula possível de um estabelecimento penal. Neste cômodo devem ser previstos cama e área de higienização pessoal com pelo menos lavatório e aparelho sanitário, além da circulação. O chuveiro pode ser configurado fora da cela em local determinado. Podem ainda ser projetados: mesa com banco, prateleiras, divisórias, entre outros elementos de apoio. Caso se opte também pode ser incluído o chuveiro dentro da cela. A área mínima deverá ser de 6 metros quadrados, incluindo os elementos básicos – cama e aparelho sanitário – independentemete de o chuveiro localizar-se fora da cela ou não. A cubagem mínima é de 15 metros cúbicos. O diâmetro mínimo é de 2 metros.
No caso da cela acessível, as dimensões do mobiliário dos dormitórios acessíveis devem atender às condições de alcance manual e visual previstos na NBR 9050/2004 e serem dispostos de forma a não obstruírem uma faixa livre mínima de circulação interna de 0,90 m de largura, prevendo área de manobras para o acesso ao sanitário, camas e armários. Os armários devem atender ao item 7.4.2. da NBR 9050/2004. Deve haver pelo menos uma área com diâmetro de no mínimo 1,50 m que possibilite um giro de 360°. A altura das camas deve ser de 0,46 m.
Os parâmetros da cela acima descritos devem ser aplicados para salas e celas de saúde.
A cela coletiva é qualquer cômodo com a mesma função de uma cela individual, porém com capacidade para abrigar mais de uma pessoa presa simultaneamente.
(...)
No caso do uso de três camas superpostas (beliches de três camas) deverá ser previsto um pé-direito mínimo de três metros e meio, independentemente de exigir-se uma cubagem menor.
No caso de o chuveiro localizar-se fora da cela coletiva, poderão ser subtraídos 0,96 m2 da área em relação ao valor mínimo fixado no quadro acima, sem prejuízo do parâmetro de diâmetro equivalente.
3.10. Conforto ambiental (ventilação e iluminação naturais)
Para paredes e coberturas deverá ser usado material adequado de acordo com as peculiaridades de cada região, prevendo-se a conveniente ventilação, e proteção, com a adoção de esquemas técnicos especiais que atendam às condições climáticas regionais (...)
As aberturas dos compartimentos deverão obedecer a um mínimo de 1/8 a 1/6 da área de seu piso, dependendo da zona Bioclimática em que o estabelecimento está inserido, por questões de aeração dos ambientes, atendendo ainda as normas da NBR 15220/2003 para as condições de ventilação natural por região bioclimática. Excluem-se dessa obrigatoriedade os compartimentos que servem de corredores e passagens com área igual ou inferior a 10m2 . Quando a iluminação/ventilação for zenital deverá atender também ao mínimo de 1/6 da área do piso.
Os ambientes deverão possuir ventilação cruzada. Para isso, a relação entre aberturas de entrada e de saída deverá corresponder ao mínimo de 0,5 para a circulação de ar.
3.12. Iluminação artificial
A iluminação artificial externa deverá ser executada da periferia para o interior ou da parte superior para a inferior. Neste caso, os postes de iluminação deverão ter altura mínima equivalente ao dobro da cumeeira da cobertura dos telhados e permitir total iluminação das fachadas, pátios e coberturas.
Todos os serviços das celas, como iluminação artificial, descarga dos vasos sanitários, água nos chuveiros, poderão contar com comando externo centralizado (de acordo com as peculiaridades de cada estabelecimento), devem contar com dispositivos de aquecimento de água quando a unidade estiver em região de baixas temperaturas e devem ser oferecidos de forma que atendam às necessidades humanas com conforto e higiene.
As luminárias das celas e dos corredores podem ficar embutidas no forro e protegidas por materiais que lhes vedem o acesso por parte do usuário, sendo sua manutenção feita através de alçapão situado sobre a carceragem ou por outra solução arquitetônica.
3.13. Recomendações técnicas
(...)
As edificações devem ser projetadas de modo a atender aos quesitos necessários quanto ao custo da construção, considerando-se também o material a empregar, objetivando a redução das despesas que venham a demandar com a manutenção e o funcionamento, sem, contudo, acarretar prejuízo das condições mínimas de comodidade, indispensáveis para a segurança e a preservação dos direitos fundamentais da pessoa humana.
As edificações devem ser projetadas, preferencialmente, considerando as características necessárias ao sistema de distribuição, reservação e utilização de água potável do prédio, assim como as condições necessárias para aparelhos sanitários, tubulações de água e de esgotos, sistema de drenagem, reuso de águas e aproveitamento de águas pluviais.
(...)
As partes externas deverão ser convenientemente drenadas, permitindo o perfeito escoamento das águas pluviais, protegendo, assim, as construções; recomenda-se que as tubulações devem ter no máximo 200 mm de diâmetro por linha.
(...)
As edificações devem ser projetadas de modo a atender aos quesitos necessários para obtenção da Etiqueta Nacional de Conservação de Energia “A”, emitida pelo Ministério de Minas e Energias através do Programa Pracional de Eficiência Energética em Edificações, o PROCEL EDIFICA.
A fiação elétrica, os quadros e caixas de passagem enterradas, caixas de incêndio e reservatórios d’água devem ser especialmente protegidos com trancas de segurança e cadeados, e situados em locais de difícil acesso às pessoas presas.
Deve-se primar por aspectos de harmonização do ambiente com a vida humana, de forma a favorecer o equilíbrio, a saúde e a tranquilidade, considerando itens como a pintura (cores), acabamento, configuração espacial que minimize a sensação de opressão, respeito ao espaço pessoal, layout dos ambientes obedecendo aos princípios da ergonomia etc. Tais cuidados são necessários para minimizar os efeitos da prisionalização, nocivos à saúde mental, não só dos presos, mas também dos funcionários que vivenciam os espaços prisionais.”
Revisitando a jurisprudência da Corte, verifica-se que em inúmeros julgados, entendeu-se, também com fulcro na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), rechaçar ofensas à integridade do preso, bem como conceder indenização diante de ofensa, consoante se extrai das ementas colacionadas:
“EMENTA: HABEAS CORPUS. AMEAÇA DE VIOLÊNCIA FÍSICA, MORAL E SEXUAL EM PRESÍDIO. PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA. NEGATIVA DE SEGUIMENTO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, COM ADOÇÃO DAS PROVIDÊNCIAS CABÍVEIS. ALEGADO CERCEAMENTO DO DIREITO DE ACESSO À JUSTIÇA. INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.
1. Embora tenha negado seguimento ao habeas corpus, o Superior Tribunal de Justiça determinou ao juízo das execuções penais que garantisse a segurança e integridade física do paciente no presídio em que se encontra recolhido.
2. Constrangimento ilegal não configurado.
3. Ordem denegada.” (HC 102.309, rel. min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe de 30.09.2010)
“EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Morte de detendo por colegas de carceragem. Indenização por danos morais e materiais. 3. Teoria do Risco Administrativo. Configuração do nexo de causalidade em função do dever constitucional de guarda (art. 5º, XLX). Responsabilidade de reparar o dano que prevalece ainda que demonstrada a ausência de culpa dos agentes públicos. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 272.839, rel. min. Gilmar Mendes,Segunda Turma, DJ de 08.04.2005)
Nesse ponto, é mister levar em consideração a finalidade da pena. Não obstante inúmeras teorias tentem explicá-la, há certo consenso quanto ao seu fim ressocializador. Nesse sentido, é de grande valia resgatar a marcante decisão no HC 71.179, de relatoria do Min. Marco Aurélio:
“PENA- CUMPRIMENTO- TRANSFERÊNCIA DE PRESO- NATUREZA. Tanto quanto possível, incumbe ao Estado adotar medidas preparatórias ao retorno do condenado ao convívio social. Os valores humanos fulminam os enfoques segregacionistas. A ordem jurídica em vigor consagra o direito do preso de ser transferido para local em que possua raízes, visando à indispensável assistência pelos familiares. Os óbices ao acolhimento do pleito devem ser inafastaveis (sic) e exsurgir ao primeiro exame, consideradas as precárias condições do sistema carcerário pátrio. Eficácia do disposto nos artigos 1º e 86 da Lei de Execução Penal- Lei 7.210, de 11 de julho de 1984- Precedente: habeas corpus nº 62.411-DF, julgado na Segunda Turma, relatado pelo Ministro Aldir Passarinho, tendo sido o acórdão publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência nº 113, à página 1.049.” (Segunda Turma, DJ de 03.06.1994)
Isso demonstra que, além do direito fundamental do preso previsto no art. 5, XLIX, há também sólida legislação infraconstitucional e entendimento consolidado desta Corte que esmiúçam e detalham o conteúdo normativo, bem como o âmbito de proteção do direito à integridade física e moral do preso. O direito previsto no art. 5º, XLIX impõe uma conduta ao Estado. Conduta essa que possui parâmetros legais infraconstitucionais nítidos, precisos e não são novos. Não há razão, portanto, para que o Estado se escuse de protegê-lo.
- O papel do Poder Judiciário
É de se destacar que ao Poder Judiciário não cabe se substituir ao legislador ou ao gestor. Mas, contra uma inação jurisdicional, geralmente fundada em uma antiquada compreensão sobre a separação dos Poderes, é possível, sim, conceber um papel de relevo ao Poder Judiciário na efetivação de direitos fundamentais, pois a adoção de medidas tomadas por juízes para efetivar esses direitos ajuda a promover a deliberação democrática ao dirigir a atenção pública a interesses que, de outra forma, seriam ignorados na vida pública diária (GODOY, Miguel Gualano de. Constitucionalismo e Democracia: uma leitura a partir de Carlos Santiago Nino e Roberto Gargarella. São Paulo: Saraiva, 2012). É possível, assim, uma atuação que não seja cegamente omissa e nem irresponsavelmente ativista, mas que garanta o direito fundamental do preso à sua integridade física e moral durante sua custódia pelo Estado. Uma compreensão sobre a separação de poderes que se atenha ao tradicional entendimento de que ao Poder Judiciário cabe apenas ser deferente às escolhas do Executivo e do Legislativo demonstra uma limitada concepção de democracia, segundo a qual as escolhas majoritárias dos representantes do povo (gestores e legisladores) são inquestionáveis. E essa compreensão rasa de democracia acaba por permitir que direitos fundamentais de minorias, pouco vistas, sejam sistematicamente violados. Uma compreensão robusta de democracia deve, ao contrário, possibilitar que esses grupos minoritários – como o são os encarcerados em geral – tenham suas situações de privação expostas e que diante da violação de seus direitos o Poder Judiciário os garanta. 
Nesse sentido, o jurista português Jorge Miranda aduz o seguinte no tocante aos dois sentidos de funções do Estado:
“I- São dois os sentidos possíveis de função do Estado: como fim, tarefa ou imperativo ou opção para agir, correspondente a certa necessidade coletiva ou a certa zona da vida social; e como atividade com características próprias, passagem a ação, modelo ou comportamento.
No primeiro sentido, a função traduz um determinado enlace entre a sociedade e o Estado, assim, como um princípio (ou uma tentativa) de legitimação do exercício do poder. A crescente complexidade das funções assumidas pelo Estado- da garantia da segurança perante o exterior, da justiça e da paz civil à promoção do bem-estar, da cultura e da defesa do ambiente- decorre do alargamento das necessidades humanas, das pretensões de intervenção dos governantes e dos meios de que se podem dotar; e é ainda uma maneira de o Estado ou os governantes em concreto justificarem a sua existência ou a sua permanência no poder.
No segundo sentido, a função - agora não tanto algo de pensado quanto algo de realizado - entronca nos atos e atividades que o Estado constantemente, repetida e repetivelmente, vai desenvolvendo de harmonia com as regras que o condicionam e conformam; define-se através das estruturas e das formas desses atos e atividades; e revela-se indissociável da pluralidade de processos e procedimentos, de sujeitos e de resultados de toda a dinâmica jurídico-pública.
No primeiro sentido, a função não tem apenas que ver com o Estado enquanto poder; tem também que ver com o Estado enquanto comunidade. Tanto pode ser prosseguida só pelos seus órgãos e serviços através das chamadas políticas públicas como ser realizada por grupos e entidades da sociedade civil, em formas variáveis de complementariedade e subsidiariedade (tudo dependendo das concepções dominantes e da intenção global do ordenamento).
No segundo sentido, a função não é outra coisa senão uma manifestação qualificada do poder político, um modo tipicizado de exercício do poder, e carece de ser apreendida numa tríplice perspectiva-material, formal e orgânica. 
No primeiro sentido, a função traduz-se depois em incumbências quer para a proteção e a promoção de direitos fundamentais, quer para conformação de setores da vida coletiva (cfr., por exemplo, na Constituição portuguesa, os arts. 38º, nº 4, 59º e segs. ou 80º e segs.; e na Constituição brasileira, os arts. 5º- LXXIV, 21 ou 134 e segs.).
No segundo sentido, a função é o modo específico como o Estado procura atingir os fins prescritos na Constituição e na lei, o modo como se desincumbe das imposições que delas recebe.” (Teoria do Estado e da Constituição. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. P.355-356)
Em assento contínuo na doutrina portuguesa, é possível concluir que a diversidade de funções não é algo a ser visto de forma estanque, mas deve-se considerar o momento de sua concretização. Confira-se:
“A separação e interdependência não é um esquema constitucional rígido mas apenas um princípio organizatório fundamental. Como tal, não há que perguntar pela sua realização estrita nem há que considera-lo como um dogma de valor intemporal. Devemos perspectiva-lo como princípio histórico (K. Hesse) ‘em contacto’ com uma ordem constitucional concreta. Como princípio constitucional concreto, o princípio da separação articula-se e combina-se com outros princípios constitucionais positivos (princípio de governo semipresidencialista ou de regime misto parlamentar-presidencial, princípio da conformidade dos actos estaduais com a Constituição, princípio da participação).
(...)
As várias funções devem ser separadas e atribuídas a um órgão ou grupo de órgãos também separados entre si. Isto significa não uma equivalência total entre atividade orgânica e função, mas sim que a um órgão deve ser atribuída principal ou prevalentemente uma determinada função.” (CANOTILHO, J.J Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. 2. Reimp. Coimbra:Almedina. p. 556-558)
No estágio atual de democracia em que o Brasil se posiciona, não há espaço para a negativa de direitos fundamentais positivados no Texto Constitucional. A Constituição é fruto de uma opção política que adota a proteção desses direitos como única escolha possível na construção de uma sociedade justa e democrática. 
- Constituição Dirigente e Vinculação dos direitos fundamentais
A Constituição dirigente, que não esgota em si mesma o seu conteúdo direcional, é também política. Ela só se realiza plenamente através da atuação do Poder Legislativo (produção de leis) e do Poder Executivo (criação e execução de políticas

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