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Estado Liberal e a Administração do Estado

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VI MOSTRA DE PESQUISA JURÍDICA: DIREITO UMA VISÃO � PAGE �1� 
 ECONÔMICA E SOCIOAMBIENTAL
UNIOESTE
Foz do Iguaçu – De 06 a 08 de outubro de 2010
Estado Liberal e a Administração da coisa pública
Elaine Cristina Francisco Volpato�
Resumo:
O trabalho tem por escopo reconstruir histórica e juridicamente o período de criação do Direito Administrativo, no auge do Estado Liberal. A partir de um olhar crítico sobre essa realidade e da reflexão de obras significativas de autores, quer se compreender melhor a consolidação do movimento revolucionário francês, como uma valiosa chave de compreensão o Direito Administrativo clássico. Direito esse que, na atualidade, não se sustenta sem uma base ética sólida: os direitos humanos fundamentais.
 
Palavras-chave: Liberalismo, Administração Pública, Direito Administrativo. 
Resumen:
El trabajo tiene como objetivo la reconstrucción de la época histórica y jurídica de la creación de Derecho Administrativo de la altura del estado liberal. Desde una mirada crítica a esta realidad y la reflexión de importantes obras de los autores, si entienden la consolidación del movimiento revolucionario francés como una clave valiosa para entender el clásico derecho administrativo. Derecho que, en realidad, no se sostiene sin una base ética sólida: los derechos humanos fundamentales.
 
Palabras clave: Liberalismo, Administración Pública, Derecho Administrativo.
1. Introdução:
O presente texto acadêmico tem por objeto tratar, de modo não exaustivo, da relação entre o liberalismo econômico clássico, qualificado como Estado mínimo, e a Administração Pública tradicional, que se ocupa dos serviços públicos mais elementares para a convivência humana.
É a partir de uma análise histórica, social, econômica e jurídica, que se pode ter um adequado panorama do período de formação do Direito Administrativo, que surge inicialmente para proteger o próprio Estado.
No final do séc. XVII com a publicação da obra “Riqueza das Nações”, de Adam Smith, em 1776, possibilitou aos adeptos do livre-mercado sagrar a correlação entre a propriedade privada e a liberdade individual. Neste contexto, cabendo ao Estado a função de “guarda noturno”, isto é, passiva diante das liberdades individuais, seu principal serviço público é a segurança pública, interna e externa. 
Outro momento, que nos parece decisivo, diz respeito aos desdobramentos do governo após a Revolução Francesa, com a criação de um tribunal especializado para tratar de causas ligadas ao Estado e sua Administração. 
O Contencioso Administrativo francês, portanto, inaugura uma nova fase da administração da coisa pública e, em potencial, é a semente que irá desenvolver o Direito Administrativo, tal qual hoje conhecemos.
Desta feita, a temática é tratada de modo a recuperar esses momentos fortes para o Direito no mundo, confrontando com nossas experiências contemporâneas de Administração. Acabamos por olhar o passado para entendermos melhor o presente.
	
2. Desenvolvimento:
A concepção liberal fez do Estado um ser imparcial. Uma ficção qualificada pelo posicionamento neutro, cujas ações não interfiram nas variadas escolhas individuais. 
Este Estado deve bem exercer sua liberdade negativa, ou seja, ao ente estatal não cabe o juízo de valor do mais apropriado no convívio social. A ele, com primazia, cabe a defesa e a garantia do livre exercício dos direitos fundamentais individuais.
Na verdade, a proposta fundamental do Estado Liberal é se configurar como resposta eficaz aos problemas gerados pelo próprio mercado, para melhorar a expansão e o poderio econômico capitalista, tendo muito pouco a ver com questões políticas e sociais.
Nele, portanto, o princípio maior é a liberdade atributo primordial da esfera privada, do qual emergem um complexo sistema de defesa de direitos individuais subjetivos, que legaram ao Estado um “papel” de agente garantidor. 
O Estado Liberal é, tal qual idealizado a partir do séc. XVIII, se vale ideologicamente dos princípios de eficiência e de liberdade de mercado, posto que, as questões econômicas próprias da atividade privada são objeto de restrita regulamentação, nunca de intervenção condutora direta.
Por isso, na concepção liberal “pura” o interesse coletivo e o bem-estar social global são absolutamente desconsiderados. Não existe espaço para a dimensão pública e, portanto, não se pode pautar a atuação estatal pelos interesses políticos e sociais coletivos. 
A cidadania é, neste contexto, uma prerrogativa pessoal e qualificadora da pessoa não homo sacer�. Desse modo, não se pôde chegar, no bojo dessa concepção, à cidadania verdadeiramente política. Assim, a contratualidade da organização social teoriza validamente a subordinação dos interesses e liberdades do indivíduo. 
(...) não devemos pensar no contrato original como um contrato que introduz uma sociedade particular ou que estabelece uma forma particular de governo. Pelo contrário, a idéia norteadora é que os princípios da justiça para a estrutura básica da sociedade são o objeto do consenso original. São esses princípios que pessoas livres e racionais, preocupadas em promover seus próprios interesses, aceitariam numa posição inicial de igualdade como definidores dos termos fundamentais de sua associação. (RAWLS, 2002, p. 12).
Contudo, o modelo liberal é insuficiente por desconsiderar a importância de valores comunitários e históricos, resultado da evolução, que fazem parte do convívio social. 
Exatamente por essa razão, a ideologia liberal, em sua práxis, não pôde efetuar a maximização de benefícios e minimização das diferenças sociais. 
(...) já não basta ao Estado garantir liberdades e direitos formalmente. Agora é necessário algo mais, isto é, proteger com semelhante decisão “o direito de ter o mínimo indispensável para viver”, enfim, o direito de “não morrer de fome” (BOBBIO, 2000b, p. 500), além daquele direito à vida já consagrado ao longo da construção dos direitos do homem (BUENO, 2006: p. 152)
A premissa da igualdade liberal, “todos são livres porque são iguais” (BOBBIO, 1990: p. 43) não pressupõe, como se defendeu, uma igualdade universal. 
Primeiro, porque a igualdade em si é um conceito capaz de ser preenchido por diversos conteúdos (BOBBIO, 1991: p.45). Em segundo lugar, ela, em um sentido universal, apresenta-se como um tipo ideal inalcançável inclusive para a esfera política. 
Desta feita, o liberalismo gera uma profunda desigualdade social, o excessivo acúmulo de capital nas mãos de poucos, e corrobora para o descarte progressivo de pessoas refugadas. Como diz BAUMAN: “o refugo é o segredo sombrio e vergonhoso de toda produção” (2005: p. 38).
Ademais, como esclarece BOBBIO: “todos os homens não são iguais em tudo, mas, isto sim, são iguais e desiguais, e nem todos são igualmente iguais ou igualmente desiguais” (1985: p. 15).
A neutralidade estatal, por sua vez, não passa de uma quimera, irrealizável no mundo prático, pois sem a interferência do Estado na atuação do indivíduo, os direitos destes ficariam destituídos de efetividade e/ou aplicabilidade. 
BUENO, em análise desse tema acrescenta:
Enfim, o que estava sendo questionado, ao mesmo tempo que se colocava em posição eqüidistante, era a necessidade de superar progressivamente as mais graves e intoleráveis desigualdades. Mas será mesmo possível que encontremos até mesmo algum neoliberal ou social-democrata simpático à causa liberal que não esteja de acordo com idéias próximas a estas? (BUENO, 2006: 152)
O planeta não possui recursos para suprir tamanhas necessidades igualmente usufruídas pela humanidade. As concepções de cunho liberal que vêem na justiça e na liberdade meio e fim socialmente valorosos, o fazem por os saberem irrealizáveis, na atualidade, produzindo uma sociedade tremendamente desigual, ainda que se tentasse cercear os abusos das liberdades garantidas (BOBBIO, 2001, p. 319 e 422).
De modo que: “a história é um entrelaçamento dramático de liberdadese de opressões, de novas liberdades de encontro às quais vêem novas opressões” (BOBBIO, 2001, p. 342).
O efeito colateral mais perverso dessa modalidade estatal é a exclusão de milhões de seres humanos do acesso aos bens mínimos para a sua existência digna (HABERMAS, 1980, p. 3-35).
De fato, a idéia de Smith sobre a natureza humana era positiva, ou otimista, pois ele parte da presunção de que o povo deseja a paz e a prosperidade. Para isso, é capaz de trabalhar e se empregar em atividades privadas produtivas.
Todavia, o convívio social nos mostrou na História humana o contrário. Há um número ainda considerável daqueles que preferem “pão e circo”; ou seja, promover a partir de suas atividades privadas que tenham por objeto o espetáculo da destruição da vida, das liberdades e da prosperidade, como bem sintetiza SZASZ:
A idéia de Smith sobre a natureza humana era sobretudo otimista. Ele presumia que o povo queria paz e prosperidade para perseguir suas atividades privadas e produtivas, trabalhar, construir famílias e melhorar seu bem-estar e dos familiares. Infelizmente, essa é apenas uma parte da história. As pessoas são também preguiçosas e entediadas, e desejam “pão e circo”.Uma vez é mais fácil destruir do que construir, elas acham muito mais divertido o espetáculo da destruição da vida, da liberdade e da prosperidade, um truísmo à luz da história das espécies e do uso atual da televisão. (SZASZ, 1994: 196)
 
SZASZ, de modo incisivo, considera que a crise ética ora instaurada na pós-modernidade, é fruto da ausência de generosidade de espírito e do refreamento da inveja, características atualmente pouco valorizadas pelos meios de comunicação de massa; os quais, por sua vez, têm cultivado na sociedade a disseminação do pensamento de Hobbes. 
Honrar o valor da competência e da firmeza requer uma generosidade de espírito e um refreamento da inveja, características que poucas pessoas valorizam e poucos cultivam e adquirem. Somente quando houver mais Smith e menos Hobbes no coração da humano é que a maioria das pessoas preferirá as relações de mercado pacíficas e vazias às violentas e excitantes relações entre o que coage e o coagido, o predador e a vítima.(SZASZ, 1994: 196)
Ainda não se vive em uma sociedade suficientemente evoluída na qual a maioria das pessoas prefere relações de mercado pacíficas e esvaziadas de violentas, que efetivamente abandonem as relações dicotômicas entre o que coage e o coagido, o predador e a vítima. 
Para Singer e Souza (2000), a livre e irrestrita competição é matéria ideologia, que não encontra fundamento na história humana:
A apologia irrestrita da competição é ideológica e não encontra fundamento na História. Ao contrário, é possível afirmar que a maior parte da evolução da espécie humana foi caracterizada por associações de cooperação comunitárias, tais como apresentam, ainda hoje, certas tribos indígenas do Brasil e de outros continentes. A desestruturação da vida comunitária em conseqüência da revolução industrial no final do século XVIII levou, como reação, à afirmação de idéias e práticas cooperativas, divulgadas por Proudhon e pelos chamados socialistas utópicos (Fourier, Saint Simon, Robert Owen, Michael Bakunin e Peter Kropotkin) bem como, na segunda metade do século XIX, ao socialismo de Marx e Engels. (Singer e Souza, 2000).
Sob este prisma, parece-nos muito oportuno identificar a estrutura e atividades administrativas, a partir do conceito de Estado liberal, a partir de seus conceitos mais elementares: a lei e o serviço público.
A primeira cátedra da disciplina de Direito Administrativo surge na França, a cargo do Barão De Gérando, em 1815. Os primeiros professores dessa disciplina – De Gérando, Macarel e Dufur – que lecionaram na Faculdade de Direito de Paris, adotaram por método de ensino a compilação de leis administrativas e depois, em aula, comentários e explicações sobre referidos textos legais. 
É por esta razão que eles receberam o nome de “exegetas”, que por fim iriam consolidar a Escola Francesa ou Legalista do Direito Administrativo. Pois para esses o Direito Administrativo é a disciplina que tem por objeto o estudo das leis. 
Em fins do século XIX, Lorenzo Meucci, conceituado autor clássico italiano, definiu o Direito Administrativo como a disciplina que tem por objetivo o conjunto de atos editados pelo Poder Executivo.
Na verdade, o objeto de estudo desse ramo do direito é mais amplo: é o estudo da Administração Pública. Possuindo dois critérios distintivos elementares:
A participação do Estado na relação jurídica, de modo necessário;
A natureza pública do interesse perseguido.
A conjugação desses critérios à legalidade acabou por historicamente se expressar na supremacia do interesse público sobre o interesse privado e na sua indisponibilidade. 
Os interesses privados não devem prevalecer sobre o interesse público, bem como, a indisponibilidade se refere à impossibilidade de sacrifício quanto ao interesse público. Esses princípios se vinculam diretamente ao princípio da República, possibilitando a dissociação entre titularidade e exercício do interesse público.
Como bem sintetiza MARÇAL (2010), são características marcantes desse período: a racionalidade e a sistematicidade do conhecimento, ordenados para o progresso.
(...) certas propostas filosóficas e científicas. Na sua essência, tais propostas envolviam a racionalidade e a sistematicidade do conhecimento e a capacidade de o ser humano dominar e controlar a natureza. Havia a crença no “progresso”, fundada especialmente na evolução do conhecimento tecnológico.
No âmbito do direito, o pensamento típico da “modernidade” propunha a organização piramidal da ordem jurídica e a sistematicidade, a completude e a ausência de contradições do direito. Imaginava-se possível produzir, por meio do direito, uma revolução social, que gerasse a integração e o bem-estar generalizados. (MARÇAL, 2010: p. 16).
Assim, a força estatal estava munida de meios coercitivos, ideológicos e jurídicos, aptos a fazer sua vontade, como manifestação do desejo geral, a vergar os direitos individuais que com ela estivessem em conflito. Este Direito Administrativo é, por conseguinte, um instrumento do Estado para impor sua soberania, sua vontade, suas políticas, submetendo seus súditos.
Há de se recordar, que para fins do presente texto, a Administração Pública é reconstruída partir dos caracteres mais elementares de direção, gestão, planejamento e execução de suas funções.
Nesta conjuntura, administrar é gerir interesses, segundo a lei, a moral e a finalidade dos bens entregues à guarda e conservação alheias. Pode ser individual, se cuida de bens particulares; ou, ainda, ser de ordem pública, que se ocupa de bens e interesses da comunidade. (MEIRELLES, 2001).
Entendemos por Administração Pública, subjetivamente, o conjunto de órgãos� governamentais e administrativos. Os primeiros são considerados supremos ou superiores, cuja competência é para traçar os planos de ação, direção e comando. Os últimos, por sua vez, são órgãos subordinados (dependentes), cuja competência é de execução dos planos governamentais.
Assim considerada, a Administração Pública é composta pelos entes que exercem a atividade administrativa, pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se divide a atividade administrativa estatal.
Para DI PIETRO, administrar abrange a atividade superior de planejar, dirigir e comandar, como também, aquela subordinada de executar.
Nesta outra concepção, peculiarmente objetiva a Administração Pública compreende as atividades exercidas pelas pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos de atender concretamente às necessidades coletivas. 
Em síntese, a Administração Pública é a própria função administrativa, como a incumbência primordial do Poder Executivo, dotada de critérios e princípios informativos próprios. 
A ligação entre a ideologia do Estado Liberal e a organização administrativatradicional, caracterizada pelo Direito Administrativo clássico, existe e é significativa. A razão de que a Administração Pública, objetivamente, executa as diretrizes traçadas pelo governo, no bojo de sua função política.
A Administração Pública tem por característica ser uma atividade concreta, afim à vontade do Estado contida na lei, cuja finalidade é a satisfação direta e imediata dos fins estatais, sendo seu regime jurídico público e organizado a partir do primado da especialização de funções.
Não se esquecendo das preciosas lições de HAURIOU, o agente administrativo é um ser humano dotado de capacidade de atuar, que deve distinguir o bem do mal, ou o honesto do desonesto. 
Por isso, ao atuar não pode desprezar o elemento ético de sua conduta, que transcende a questão da legalidade, de justiça, de conveniência, de oportunidade, para alcançar o honesto e repudiar o desonesto. 
Logo, os atos da Administração não podem obedecer somente à lei jurídica, mas precisam respeitar à lei ética da própria instituição, já que nem tudo que é legal é honesto. 
Sobremaneira, esses precisam respeitar os direitos humanos fundamentais, não se afastando do primado da dignidade da vida humana.
O problema é que o liberalismo tem como característica primeira o individualismo, de tal modo que, o Direito Administrativo, para se adequar aos seus primados acabou por se estruturar como disciplina autônoma, fez excessivo uso de conceitos abertos. 
A supremacia do interesse público, por exemplo, cujo núcleo significante é o “interesse público”. Ela é uma expressão vaga, um conceito jurídico indeterminado, sem uma exatidão de seu conteúdo. 
A expressão “bem comum”, de igual modo, corrente no Direito Administrativo, em sua origem se reporta ao conceito firmado pelo Papa João XXIII, como conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana.
De certo modo, a própria discricionariedade administrativa pode ser emoldurada nesse rol de expressões não enquadradas num conceito lógico formal preciso. Ela é, sobretudo, uma virtude da ordem normativa, para solucionar juridicamente as limitações e os defeitos do processo legislativo de geração de normas jurídicas.
Estes são conceitos chaves para o Direito Administrativo, que por terem uma abrangência indeterminada, possibilitaram durante séculos, que o administrador público deles se utilizasse para expressar de modo válido suas concepções pessoais.
 Por isso, dentre todas as facetas do liberalismo escolhemos a atividade estatal administrativa. Dado que a concepção de estado liberal fez-se traduzir na postura de mero guardião da ordem e não de um estado prestador e realizador do bem estar dos cidadãos.
É a partir da obra de Duguit�, dentro do Estado de bem estar social, que o serviço público, como conceito chave, passa a sintetizar toda atividade material que a lei atribui ao Estado o exercício direto (Administração Direta) ou por meio de seus delegados (Administração Indireta), com o objetivo maior de satisfazer concretamente necessidades coletivas, sob regime total ou parcialmente público (DI PIETRO, 2005: p. 99).
A nós particularmente interessam os serviços públicos exercidos diretamente pelo Estado, posto que no liberalismo sua estrutura tende a ser mínima, a este coube tão somente suprir necessidades públicas elementares para garantir o direito à vida, a liberdade e a segurança pública. 
Assim, os serviços públicos que desenvolvem, neste período em especial, são os denominados próprios�. Tais serviços são aqueles que se relacionam intimamente com as atribuições do Poder Público (segurança, polícia, higiene e saúde públicas) e para a execução dos quais a Administração usa de sua supremacia sobre os administrados. Por isso, devem ser prestados sem delegação a particulares (MEIRELLES, 2001).
Seu objeto é de cunho administrativo, executado pela Administração para atender suas necessidades internas ou preparar outros serviços que devem ser prestados ao público, tais como a imprensa oficial e outros dessa mesma natureza. 
A atividade administrativa voltou-se para satisfazer ao interesse geral consagrando a modalidade de serviços “uti universi”. Os serviços são de natureza originária, congênitos à atividade essencial do Estado e de prestação exclusiva, tal qual, o serviço postal e o correio aéreo nacional. 
Seus requisitos elementares, conforme Hely Lopes Meirelles (2001), são: a permanência, a generalidade, a eficiência, a modicidade e a cortesia.
O Estado Liberal priorizou atender, ainda que de modo formal, a permanência e a generalidade.
A obrigação primeira do Estado, para Duguit, era a de assegurar sem interrupções o cumprimento de uma certa atividade, de prestar certos serviços. Ocorre que esse elenco não é estático, a medida em que a civilização se torna mais complexa o rol de serviços públicos a serem criados tende a aumentar. 
A diferença é que em um Estado liberal, este conjunto tende a se referir aos direitos fundamentais de primeira geração, desdobrando-se entre os poderes estatais para se ver suprido pela Administração Direta. Isto é, o Estado buscou se ocupar da guerra, da polícia e da justiça.
A execução de tais serviços é centralizada, isto é, a Administração Pública que os presta por seus próprios órgãos em seu nome e sob sua exclusiva responsabilidade.
A execução direta do serviço implica na realização pelos próprios meios da pessoa responsável pela sua prestação ao público. O encarregado de seu fornecimento ao público sempre o realiza pessoalmente, ou por seus órgãos. Para ela não existem normas especiais, salvo a lei instituidora ou consubstanciadora da outorga, autorização de delegação a quem vai prestá-lo (MEIRELLES, 2001).
A responsabilidade estatal também evoluiu no tempo e no espaço, assim da irresponsabilidade do Estado, característica do período medieval, o liberalismo fez sagrar ora o sistema anglo-saxão, no qual prevalecem os princípios do direito privado, ora o sistema europeu-continental, que adotou o regime publicístico, chancelado pelo Conselho de Estado francês.
A teoria da irresponsabilidade, adotada na época do absolutismo, tende a desaparecer. A idéia de soberania, autoridade incontestável do Estado perante o súdito, bem como os princípios de que o “rei não pode errar” e de que “aquilo que agrada o príncipe tem força de lei”, são concepções que entram em crise. 
Os EUA e a Inglaterra abandonaram essa teoria por meio do Federal Tort Claim Act, de 1946, e Crown Proceeding Act, de 1947, respectivamente. Os EUA – o particular pode acionar diretamente o funcionário, admitindo-se em algumas hipóteses a responsabilidade direta do Estado, porém deve existir culpa a ser apurada, logo se trata de um sistema de responsabilidade subjetiva (DI PIETRO, 2009, p.640).
Na Inglaterra a Coroa passou a responder por danos causados por seus funcionários ou agentes�, desde que haja infração daqueles deveres que todo patrão tem em relação aos seus prepostos e também dos deveres que toda a pessoa comum tem em relação à propriedade. Mas a responsabilidade não é total, sofre limitações porque não se aplica aos entes locais nem as empresas estatais. 
Portanto, a teoria da culpa administrativa, a partir do século XIX superou a tese da irresponsabilidade do Estado. Adotam-se os princípios de direito civil, centralizados na culpa.
Surge, então, a classificação de atos de império� e atos de gestão�. 
Os primeiros são praticados com todas as prerrogativas e privilégios de autoridade e impostos unilateral e coercitivamente ao particular, independentemente de autorização judicial (regidos pelo Direito Administrativo, por isso, exorbitantes). 
Os segundos, praticados em situação de igualdade com os particulares, para a conservação e desenvolvimento do patrimônio público e para a gestão de seus serviços (regidos pelo Direito comum). 
Os atos de império, todavia, não implicavam em responsabilidade civil do Estado, enquanto osde gestão tinham, como regra, a modalidade civil de culpabilidade.
A jurisprudência francesa, no caso Blanco em 1873, inovou o tema e introduziu o Estado liberal em uma nova teoria de responsabilidade: a publicista.
O primeiro passo no sentido da elaboração de teorias de responsabilidade do Estado segundo princípios do direito público foi dado pela jurisprudência francesa com o famoso caso Blanco, ocorrido em 1873: a menina Agnès Blanco, ao atravessar uma rua da cidade de Bordeaux, foi colhida por uma vagonete da Cia. Nacional de Manufatura do Fumo; seu pai promoveu ação civil de indenização, com base no princípio de que o Estado é civilmente responsável por prejuízos causados a terceiros, em decorrência da ação dananosa de seus agentes. Suscitado conflito de atribuições entre a jurisdição comum e o contencioso administrativo, o Tribunal de Conflitos decidiu que a controvérsia deveria ser solucionada pelo tribunal administrativo, porque se tratava de apreciar a responsabilidade decorrente de funcionamento do serviço público. Entendeu-se que a responsabilidade do Estado não pode reger-se pelos princípios do Código Civil, porque se sujeita a regras especiais que variam conforme as necessidades do serviço e a imposição de conciliar os direitos do Estado com os direitos privados. (DI PIETRO, 2009: p. 641)
A partir da decisão deste caso, surgiram as teorias publicistas da responsabilidade do Estado, a teoria da culpa do serviço (culpa administrativa) e a teoria do risco. 
Ambas desenvolveram-se melhor no Estado de Bem estar social. 
Não é justo, como já bem dizia Rui Barbosa, tratar igualmente os desiguais. De modo que, não existe nada de justo em garantir apenas as mesmas oportunidades de responsabilização do Estado tal e qual é dado aos indivíduos, porque são materialmente diferentes.
O Estado é uma ficção jurídica, por excelência; enquanto, a pessoa, é uma realidade fática e fenomenológica independente, cuja existência é tutelada pelo direito e não criada por ele. 
Conclusões
Esperamos que a breve análise desse texto desvelasse o quanto que a Administração Pública tradicional, que se ocupa dos serviços públicos mais elementares para a convivência humana, é um produto do ideal liberal.
Nossa análise histórica, social, econômica e, sobretudo, jurídica, indica que é preciso superar o panorama dogmático do período de formação do Direito Administrativo, que tem por premissa maior proteger o próprio Estado.
O Estado de Direto somente é legitimado para agir se o faz como sujeito do interesse público, consoante ao princípio da República.
Neste contexto, cabendo ao Estado a função de defesa dos direitos humanos fundamentais, saindo de sua passiva diante das liberdades individuais. 
Referências
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� Professora da disciplina de Direito Administrativo no curso de Direito da UNIOESTE, campus de Foz do Iguaçu – PR, mestre em Teoria Geral do Estado e membro do grupo de estudo sobre Criminalidade. Pesquisadora que se ocupa em estudar a Governança Pública nos Estados nacionais Latino-Americanos, com projeto individual de pesquisa nesta área.
� Expressão que significa “vida nua”. É a partir do trabalho de Giorgio Agamben que a figura do homo sacer é analisada com maior propriedade, como vida não sujeita a proteção legal, pois excluída dos benefícios da cidadania. O autor confronta zoe e bios, ou seja, o excluído e o cidadão, objeto da proteção do Estado nacional. 
� Órgão é elemento despersonalizado incumbido da realização das atividades da entidade a que pertence, por trabalho de seus agentes. Cada órgão, como centro de competência governamental ou administrativa, tem necessariamente funções, cargos e agentes, mas é distinto desses elementos, por isso não lhe podem acarretar sua extinção.
� Duguit em sua obra As transformações do Direito Público e Privado, assim afirma: “Esta función social es, em fondo, el servicio público; y así M. Hauriou se halla muy cerca de reconocer que el servivio público es el único Y verdadero fundamento del sistema moderno”. (p. 30)
� Serviços próprios são aqueles que são assumidos e executados pelo Estado como seus de forma direta, apenas excepcionalmente, o Estado e fez-se representar por concessionários e permissionários.
� Agentes públicos são pessoas físicas incumbidas, definitiva ou transitoriamente, do exercício de alguma função estatal.
� Ato de império é todo aquele que contém uma ordem ou decisão coativa da Administração para o administrado. Ex. decreto expropriatório, despacho de interdição de atividade ou uma requisição de bens.
� Ato de gestão é todo aquele que ordena a conduta interna da Administração e de seus servidores, cria direitos e obrigações entre ela e os administrados. Ex. despachos para execução de serviços públicos, atos de provimento de cargo e movimentação de funcionários, autorizações e permissões, contratos em geral.
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