Buscar

Árvore Filogenética Hominida e a Origem da Humanidade

Prévia do material em texto

A Árvore Filogenética Hominida
As reflexões de Darwin em A Descendência do Homem (1871) centram-se em três pontos: 
Nossa espécie tem origem africana, pois é nesse continente que se encontram nossos “parentes evolutivos” mais próximos (gorilas e chimpanzés);
Este processo teria sido de longa duração, remontando milhões de anos;
A origem da humanidade teria se dado na forma de um “pacote evolutivo”, com a evolução conjunta de três aspectos que nos distinguem dos demais primatas: o bipedismo, a cerebralização e a tecnologia.
A maior divergência contra as hipóteses de Darwin referiam-se à origem africana da humanidade. Em 1912, o “Homem de Piltdown” foi encontrado por Charles Dawson, arqueólogo amador, e Arthur Smith Woodward, geólogo do Museu Britânico. O Eoanthropus dawsoni foi considerado o “elo pedido” entre o homem e o macaco até 1949, quando Keneth Oakley (Oxford Univ.) provou tratar-se de uma falsificação (crânio humano e mandíbula de orangotango). Mistério sem solução, até Conan Doyle está entre os suspeitos…
Ao longo do século XX, as pesquisas paleoantropológicas demonstraram que a origem africana e a antiguidade do homem estavam corretas, porém passou-se a questionar a ideia de “pacote evolutivo” em função das amostras paleontológicas disponíveis e das possibilidades de datação. 
As controvérsias sobre quais aspectos definem nossa “condição humana” variaram de acordo com a época: o grande cérebro (1920), a habilidade tecnológica (1930), a violência inata (1940), a sociabilidade (1950). Porém, “a hominização não poderia ser concebida somente como uma evolução biológica, (...) nem somente como uma evolução sociológica, mas sim como uma morfogênese complexa, resultante das interferências genéticas, ecológicas, cerebrais, sociais e culturais” (Morin, 1979: 61).
A paleoantropologia ou antropologia biológica tem um enfoque multidisciplinar, cruzando informações da osteologia, da genética e da análise química dos ossos e dentes. Os principais temas estudados são: evolução dos Hominidas, atributos físicos das populações (reconstrução facial, paleodemográfica, paleopatológicas) e hábitos de vida. 
Alguns tipos de indicadores: 
Sexo: Estimado pelo ângulo de abertura da pélvis, pela implantação muscular e por características discretas do crânio. 
Idade: Estimada pelo padrão de erupção e desgaste dos dentes, pela fusão das epífises e fechamento das suturas cranianas.
Altura e Peso: A altura é proporcional ao comprimento do fêmur e o peso pode ser calculado pela relação entre altura, sexo e idade.
Dentes: Tipo de abrasão varia de acordo com a dieta (carne = estrias verticais/curtas; vegetais = estrias verticais/horizontais longas).
Qual o modelo de nossa árvore filogenética?
Ausência de Consensos
Entre 7 e 4 milhões de anos:
Ausência de fósseis de indivíduos inteiros (fragmentos isolados de dentes, crânios e extremidades) – Problema tafonômico.
Indefinições quanto ao conceito de espécie (ampla variação morfológica) - Problema taxonômico.
O único consenso é que a partir de 2,5 milhões de anos coexistiram dois gêneros: 
Australopithecus: Bípedes, com volume cerebral pequeno (350-400 cm3), molares grandes e achatados, alto dimorfismo sexual (machos em torno de 1,5 m de altura, fêmeas em torno de 1 m de altura) e divididos em dois subgrupos, Robustos e Gráceis, com várias espécies.
Homo: Bípedes, com cérebros maiores que os do australopithecus (650-1300 cm3) e estrutura semelhante à moderna, dentes menores.
O bipedismo gerou alterações na estrutura óssea e muscular e no sistema de sustentação e movimentação dos membros:
A pélvis tornou-se mais curta e larga, com implantação do fêmur em ângulo. 
Membros inferiores alongados, com superfície das juntas ampliadas (incluindo a do joelho que pode ser estendida).
Pé em forma de plataforma, com dedão alinhado aos demais.
Base da coluna vertebral curva e deslocamento do forame magno para o centro do basicrânio.
Quais fatores foram favoráveis à seleção natural da bipedia?
A formação do vale da Grande Fenda (Rift), há 35 milhões de anos (Oligoceno), causou grandes modificações no cenário ambiental africano. O “Rift Valley” consiste em um complexo de falhas tectônicas que se estende no sentido norte-sul por 5.000 km, desde a Síria até Moçambique, com uma largura entre 30 e 100 km.
Suas bordas são formadas por cordilheiras, onde estão os pontos mais elevados do continente, muitos com atividade vulcânica. Sua formação gerou barreiras de ventos e chuvas entre o oeste e leste da África, predominando na África Ocidental as formações florestais tropicais; e na África Oriental, os mosaicos de paisagens, com florestas úmidas nos platôs e paisagens abertas nas planícies. A partir de 7 milhões de anos atrás, estas condições ambientais teriam favorecido a bipedia no leste da África (hipótese do “East Side Story”, de Yves Copans).
Várias são as hipóteses que justificam a sua seleção natural:
Maior capacidade de transporte de alimentos a grandes distâncias em função da liberação das mãos, ampliando a possibilidade de sobrevivência da prole (hipótese do “macho provedor”, de Owen Lovejoy).
Forma de locomoção mais eficiente, permitindo percorrer maiores distâncias com menor gasto de energia (hipótese de Peter Rodney e Henry McHenry), maior refrigeração e menor exposição ao sol (hipótese de Peter Wheeler).
Capacidade de visualização a longa distância em paisagem aberta.
Nossa Árvore Filogenética
Sahelanthropus tchadensis: Crânio incompleto descoberto em 2002, no deserto de Djurab, norte do Chade, por Michel Brunet da Universidade de Poitiers, França. (Sahel = zona de transição entre deserto e savana; também chamado de Toumai). Corresponde atualmente à evidência fóssil mais antiga de possível Hominida, com datações entre 6 e 7 milhões de anos. A ausência da basicrânio impede a identificação plena da bipedia, porém dentes assemelham-se morfologicamente aos australopitecos.
Orrorin tugenensis: Espécie definida em 2001, a partir de 19 fragmentos isolados de mandíbula, tíbia e fêmur encontrados em Tugen Hills, Quênia, por Martin Pickford e Bigitte Senut, do Museu de História Natural de Paris. (= Homem original; também chamado “Homem do Milênio”). Com datações de 6,2 e 5,6 milhões de anos, o gênero também é chamado de Praeanthropus. Características do fêmur apontam para possível Hominida, com bipedia ocasional, que passava a maior parte do tempo nas árvores.
Ardiopithecus ramidus: Descoberto em 1994, a partir de fragmentos isolados de mandíbula e crânio, encontrados por Tim White (US), no sítio Aramis (Etiópia), com datações de 4,4 milhões de anos (Ramidus = raiz). Em 2001, foi identificada por Yohanes Haize-Selassie uma falange do pé, com datações entre 5,2 e 5,8 milhões de anos, indicando possibilidade de bipedia, justificando uma “crono-espécie” (Ardiopithecus ramidus kabada).
Australopithecus anamensis: Definido a partir de 22 fragmentos localizados em 1995, no norte do Quênia (sítios de Kanapoio e Baia de Allia), por Meave Leakey (Museu Nacional do Quênia). (Anam = lago). Datados entre 4,2 e 3,9 milhões de anos, a evidência de bipedia plena é defendida pela morfologia da tíbia. Seu peso é estimado entre 46 e 55 kg. Evidências polínicas indicam a presença de mosaicos entre florestas e paisagens abertas.
 
Australopithecus afarensis: Entre 1974 e 1979, a equipe de Donald Johanson (US) identificou, no deserto de Hadar (em Afar, Etiópia), um esqueleto parcialmente completo de uma fêmea, com datações de 3,8 milhões de anos, batizada de Lucy em homenagem à música dos Beatles “Lucy in the sky with diamonds”. Até a década de 1990 foram identificados, na Etiópia e Tanzânia (Hadar e Laetoli), 53 indivíduos desta espécie, com datações entre 2,9 e 3,9 milhões de anos. A espécie de Lucy apresenta grande dimorfismo sexual (1,05 m de altura e 30 kg para as fêmeas e 1,51 m de altura e 45 kg para os machos). Seu crânio é similar ao chimpanzé, com volume que varia entre 380-450 cm3 e caninos pronunciados.
Crânio de Australopithecusafarensis mais completo até agora conhecido foi descoberto em 2000 e datado de 3,3 milhões de anos (apelidado de “Selan, o filho de Lucy”, tinha três anos). 
Estudos anatômicos do A. Afarensis indicam semelhanças com o pé e a pélvis humana, porém possui grande mobilidade nos pulsos e tornozelos, a articulação do ombro é aberta e os membros inferiores são curtos. Isto indica bipedia associada ao uso das árvores para dormir e se alimentar.
Australopithecus bahrelghazali: Foi definido a partir de uma mandibula encontrada no Chade (sitio de Bahar el Ghazal), em 1995, por Michel Brunet (FR) e David Pilbeam (US). Com antiguidade estimada de 3 a 3,5 milhões de anos, a arcada é similar à do Australopithecus afarensis, mas encontra-se a 2500 km a oeste do Rift africano, em área de floresta no Plioceno. Embora seja um achado parcial, os autores sugerem tratar-se do ancestral do Homo habilis.
Australopithecus africanus: O primeiro fóssil Hominida foi identificado em 1924, na África do Sul, por Raymond Dart, no sítio de Taung. Correspondia a um crânio de uma criança de três anos que apresentava um posicionamento basal do forame magno, caninos pequenos e molares grandes e planos. A partir do “bebê de Taung” foi definida a espécie Australopithecus africanus (= “macaco do sul da África”), só aceita pela comunidade científica em 1947, quando mais de 30 indivíduos já haviam sido encontrados nas cavernas calcárias de Sterkfontein, Kromdraai e Swartkrans. Suas datações vão de 3,5 a 2,5 milhões de anos.
Australopithecus Sediba: Definido por Lee Berger, Universidade de Witwatersrand, em 2010, a partir de 220 ossos identificados na caverna calcária de Malapa, na África do Sul (sediba = manancial inesgotável). Situada a 8 km dos sítios estudos por Broom e Dart entre os anos 1920 e 1940, tem datações de 1,97 milhões de anos. 
Fazem parte do conjunto de evidências encontradas em Malapa os esqueletos parcialmente completos de uma fêmea adulta e um jovem macho, além de outros quatro indivíduos, incluindo um bebê. Trata-se de uma espécie grácil, com cérebro de 430 cm3. Posssui, porém, pélvis e mãos semelhantes ao Homo, e estrutura craniana com a região frontal mais expandida. Estas características embasam a hipótese de que seria o ancestral direto do Homo erectus ergaster. Para Berger, o Homo habilis da África Oriental seria um “beco sem saída” evolutivo.
Australopithecus robustus: As pesquisas realizadas por Raymond Dart e Robert Broom na África do Sul também identificaram o Australopithecus robustus, com datações entre 2 e 1 milhão de anos. Possuía grandes molares e uma crista sagital no topo do crânio para dar suporte muscular à mandíbula mais pesada.
Australopithecus boisei: Na década de 1930, Louis e Mary Leakey iniciaram pesquisas na Garganta de Olduvai, no Quênia, e em Laetoli, na Tanzânia. Em 1959, identificaram, em Olduvai, uma variante regional de Australopithecus robustus, com datações de 1,7 milhões de anos. Foi classificado como Zijanthropus (= homem da África Oriental) Boisei (= nome do financiador das pesquisas), sendo posteriormente agregado ao gênero Australopithecus.
Australopithecus aethiopicus: Chamado de o “crânio negro”, trata-se de outra variante robusta do leste africano, encontrado por Richard Leakey, em 1967, no baixo rio Omo (Etiópia), e por Alan Walker, em 1984, no Lago Turkana (Quênia). Tem datações de 2,6 milhões de anos.
Australopithecus garhi: Evidências fósseis de uma australopiteco grácil no leste da África foram encontradas em 1996, pela equipe de Tim White e Yohannes Haile-Salessie, no vale do médio rio Awash, Etiópia (= surpresa). Datado de 2,5 milhões de anos, seu volume cerebral seria de 450 cm³.
As diferenças entre Australopithecus gráceis e robustos centram-se nas adaptações dentárias e faciais à mastigação (trituração de alimentos duros), sendo os esqueletos muito similares entre si. O tamanho do cérebro varia entre 380 e 500 cm3 em proporção ao volume corporal. O maior australopiteco foi o Boisei, com 49 kg e 1,37 m para os machos e 34 kg e 1,24 m para as fêmeas. 
Qual o modelo de nossa Árvore Filogenética?
Existem distintas propostas quanto à relação evolutiva entre os membros de nossa árvore filogenética. As opiniões dividem-se entre aqueles que são partidários “da reunião”, sugerindo agregar espécies e defendendo ritmos de mudança graduais, e aqueles que são partidários “da divisão”, que defendem que descendemos de uma grande família com múltiplas ramificações, cujos ritmos de transformação foram marcados pela mudança rápida (classificação por comparação craniana).
Algumas Propostas para a Árvore Filogenética Hominida (Décadas 1990-2000):
Modelo 1 - Meave Leackey e Alan Walker (1995):
Homo sapiens sapiens
	Homo sapiens neandertalensis
 Homo erectus heidelbergensis
 
 Homo erectus
			Australopitecus robustus Australopithecus boisei
			 Australopitecus africanus 
						
 Australopitecus afarensis
				
	Homo habilis
 			 Australopitecus anamensis
	 
 ?						 Ardiopithecus ramidus 
							 
 ?		
							
Modelo 2 - Donald Johanson e Tim White (1995):
 			 							
 
		Homo sapiens neandertalensis Homo sapiens sapiens
 
 	Australopithecus boisei	 Homo erectus Australopitecus garhi
 
 Australopitecus robustus Homo habilis Australopitecus africanus
						Australopitecus afarensis
						Australopithecus anamensis
							
 Ardiopithecus ramidus
Modelo 3 – Randall Skelton e Henry McHenry (1998):
	
 
 Homo sapiens neandertalense Homo sapiens sapiens
			 									 Homo erectus
 
 Australopithecus boisei Homo habilis
					 
 Australopitecus robustus Australopitecus africanus
 Australopithecus aetipithecus
						Australopitecus afarensis
						Australopithecus anamensis
							
 
 Ardiopithecus ramidus
Modelo 4 – Ian Tattersell (2003)
Homo sapiens sapiens Homo sapiens neanderthalense 
 Homo sapiens arcaico
			
		 Homo erectus Australopithecus robustus Australopithecus boisei 
 
			Homo habilis Australopithecus aethiopithecus
				 
			
 Australopithecus africanus Australopithecus garhei Australopithecus baherelghazali
 		
				 Australopithecus afarensis 
 			
 
 Australopithecus anamensis
					 
	
	Orrorin tugnensisArdiopithecus ramidus
			 
					 		
			 Sahelanthropus tchadensis Pan troglodites (chimpanzé) 
					 ?
Homo habilis: Em 1960, Richard Leakey identificou em Koobi Fora, Lago Turkana (Antigo Lago Rudolf), no Norte do Quênia, a primeira evidência fóssil conhecida de Homo habilis (= habilidoso), com datações de 2,5 a 1 milhão de anos. Evolutivamente relacionado aos australopitecos gráceis, diferencia-se pelo volume cerebral (640 cm3), redução dos maxilares e dentes molares, pela produção de artefatos e pela inclusão de proteína animal na dieta.
Sugere-se que haveria duas variantes cronológicas (crono-espécies) do Homo habilis: 
Homo habilis rudolfensis, com crânio maior e datações de 2,4-1,9 milhão; maior proximidade com Homo erectus?
Homo habilis, com crânio menor e datações de 1,9-1,6 milhão. Maior proximidade com Australopithecus?
Comparação do volume cerebral: a) Chimpanzé: 300-500 cm3, b) Australopithecus: 400-500 cm3; c) Homo habilis: 500-750 cm3; d) Homo erectus: 900 cm3; e) Homo sapiens sapiens: 1.350 cm3.
O que favoreceu a cerebralização?
A encefalização é uma tendência evolutiva dos primatas. No entanto, a maior diferença do cérebro do Homo habilis encontra-se em sua estrutura organizacional. Nos primatas, o lóbulo occipital, relacionado aos centros de visão, é mais desenvolvido. No gênero Homo, há um maior desenvolvimento dos lóbulos parietal (área de integração de informações sensoriais), frontal (área dos centros de linguagem, emoção e coordenação motora) e temporal (área dos centros de audição e memória). O cérebro do Homo também é assimétrico: o lado esquerdo é maior e é associado a habilidades motoras (destria) e fala (área de Broca e área de Wernicke). 
Um cérebro grande acarreta gestações longas e filhotes imaturos (neotenia). Este padrão só se sustenta em interação com ambientes ricos em recursos e com baixa predação/competição (onivoria). Por outro lado, a encefalização humana pode ser resultado da pressão “seletiva” de padrões de interação social mais complexos. Indivíduos que são hábeis no estabelecimento e manutenção de alianças têm maior sucesso reprodutivo, pois isto aumenta o potencial de cruzamento e a rede de suporte para criação da prole neonata.
Os instrumentos líticos produzidos pelo Homo habilis são seixos lascados para extração de lascas cortantes e produção de cutelos usados para extrair tutano e esquartejar carcaças de animais abatidos por outros predadores. Os sítios arqueológicos mais antigos localizam-se no vale do rio Omo e em Hadar (Etiópia), com datações de 2,6 milhões de anos, e na Garganta de Olduvai (Quênia), com datações de 1,8 milhões de anos.
Homo erectus: Em 1891, foram encontrados pelo holandês Eugene Dubois fósseis de humanos arcaicos na ilha de Java (Pitecanthropus erectus). Estes achados foram questionados até a década de 1920, quando o canadense Davidson Black encontrou crânios similares na caverna de Zoukoutien, na China (Sinanthropus pekinensis). Na década de 1950, somaram-nos aos achados africanos, sendo todos reunidos na espécie única Homo erectus.
No sítio de Koobi Fora, Lago Turkana (Quênia), foi encontrado, em 1984, um esqueleto quase completo de um Homo erectus com idade estimada em nove anos pelo crescimento dentário, e datação entre 1,8 e 1,6 milhão de anos. O “garoto de Turkana” tinha 1,50 m, e sua altura em adulto é estimada em 1,80 m. Seu volume cerebral é de 880 cm³. Suas proporções corporais, com ombros e quadris estreitos, são adaptadas a climas quentes, sugerindo também uma redução de pelos no corpo pela capacidade de corrida. Seu grau de preservação permitiu estudar aspectos de modo de vida, incluindo subsistência e linguagem.
A origem do Homo erectus é africana e estimada entre 2 e 1,8 milhão de anos (sítio Koobi Fora, Quênia). Na glaciação de Donau (1,75-1,1 milhão de anos), há evidências da colonização inicial do Cáucaso (sítio Dmanisi, Georgia), da Península Ibérica (sítios de Atapuerca, Espanha) e do sul da Ásia (ilha de Java), com datações entre 1,8-1,2 milhão de anos. A sua presença inicial no leste da Ásia (Zhoukoudian, China) está datada entre 750.000-400.000 anos.
Os níveis oceânicos mais baixos, durante as glaciações, facilitaram a colonização inicial do Oriente Próximo e da Europa através da exposição de plataformas continentais, com três vias de acesso possíveis. As datações de 1,5 milhão de anos para Israel (sítio Ubeidiya) e de 1,6 milhão de anos para a Geórgia (sítio Dmanisi) reforçam a hipótese da rota principal por via terrestre através do Levante (Turquia).
A colonização dos humanos arcaicos do Sudoeste da Ásia deu-se a partir de 1,8 milhão de anos atrás através do Continente de Sunda, que, durante os eventos glaciais, conectava as ilhas de Sumatra, Java e Bornéu ao Sudoeste Asiático. 
Wallacea congregava as ilhas entre os continentes. Os achados de uma versão anã do Homo erectus na Ilha de Flores (Homo florensis), com 800,000 AP, ainda é controversa. Austrália foi colonizada por humanos modernos há 40.000 anos.
As migrações do Homo erectus teriam gerado três variantes regionais por isolamento geográfico: ergaster (África), mais antiga (2 milhões de anos-300.000 anos); erectus (Asiática), intermediária e que teria dado origem aos humanos modernos africanos; e heidelbergensis (Europa), mais recente (600.000 AP-150.000 anos) que originaria os neandertais.
O Homo erectus apresenta um maior volume corporal (1,60- 1,80 m) e cerebral (850-1100 cm3) em comparação ao Homo habilis. Apresenta face curta e abertura nasal projetada (nariz externo). Teria possível ausência de pilosidade e estrutura termorreguladora semelhante à moderna. As inovações tecnológicas relacionam-se ao fogo, a caça e a produção de artefatos bifaciais. 
O aumento do volume encefálico do Homo erectus reflete-se em distintos fatores, como maior volume corporal, maior longevidade (50 anos), maturidade sexual tardia, necessidade de dieta rica em proteína em função do alto custo energético de manutenção de um cérebro grande (caça), gestação mais longa e padrão de prole neonata imatura.
Em função dos limites estruturais da pélvis, o bebê humano só atinge o mesmo nível de maturidade de um chimpanzé ao nascer aos 12 meses de idade (50% da capacidade craniana adulta). Para uma equivalência, nossa gestação teria que ter 21 meses. Esta infância prolongada gera uma maior dependência em relação à mãe, mas permite que o desenvolvimento do cérebro acompanhe o aprendizado da cultura, bem como estimula a cooperação social. Já a maturidade sexual tardia está associada a um surto de crescimento, marcando o início da competição reprodutiva.
O Homo erectus heidelbergensis foi definido a partir de fósseis encontrados na Alemanha em 1921. Sugere-se que tenha surgido na África, por volta de 600.000 anos atrás, e substituído populações de H. ergaster (= “que trabalha”) na Europa (Homo Antecestor) (reconstrução facial de crânio de Homo Heidelbergensis, Atapuerca, Espanha, 500.000 anos).
Ao que tudo indica, a família extensa, organizada pela noção de reciprocidade, é a forma de relação social dos Humanos Arcaicos.
Homo sapiens neanderthalensis: Em termos evolutivos, o Homo sapiens possui duas variantes geradas por isolamento geográfico: Homo sapiens neanderthalensis (Europa e Oriente Próximo) e Homo sapiens sapiens (África). As evidências mais antigas datam de 150.000 anos, extinguindo-se os Neandertais por volta de 27.000 anos atrás. As diferenças dizem respeito ao crânio e à robustez esqueletal.
Os Neandertais são mais bem conhecidos anatomicamente. Por sepultarem seus mortos nas cavernas que habitavam, ocorreu boa preservação de seus esqueletos e hoje se dispõe de uma coleção de 500 indivíduos, sendo 20 esqueletos completos. Também ocupavam regiões pesquisadas pela arqueologia desde 1856 (vale do Neander, Alemanha). 
Os Neandertais se diferenciam dos humanos modernos por apresentarem um crânio mais alongado, com abertura nasal larga, arco supra-orbitalpronunciado, testa baixa e ausência de queixo. O cérebro tem, em média, 1.450 cm3. O esqueleto sugere um físico mais baixo que o Homo erectus (1,70-1,60 m), com forte implantação muscular, ombros e quadris mais largos, e juntas ósseas mais reforçadas. Seu corpo foi “selecionado” para conservar o calor, minimizando as áreas expostas ao frio glacial. O nariz grande poderia servir para aquecer e umedecer o ar inalado.
As opiniões sobre a relação evolutiva entre Neandertais e modernos dividem-se desde o século XIX entre o paralelismo e a ancestralidade. A partir dos anos 1960, os defensores da ancestralidade passam a defender a ideia de uma separação racial antiga (hipótese “multirregional”), marcando uma relação anatômica com os brancos (caucasianos). No final da década de 1990, os primeiros estudos de DNA mitocondrial de Neandertais, indicaram uma distância genética de pelo menos 600.000 anos com o ancestral comum aos modernos (hipótese de “origem africana”).
Homo sapiens sapiens: Os achados arqueológicos mais antigos possuem datações de 160.000 anos AP e correspondem a uma amostra de 20 indivíduos, encontrados na África do Sul, Quênia e Israel. Os defensores das pautas curtas de evolução interpretam as diferenças como representando saltos evolutivos. Os defensores de pautas longas de evolução defendem a existência de elementos transicionais entre o Homo erectus e o Homo sapiens, em função do isolamento geográfico (sapiens arcaicos).
Os chamados sapiens arcaicos correspondem a achados isolados e geograficamente dispersos, com cronologia variada, como o crânio de Broken Hill (Zâmbia), chamado Homo rodhesiense, de 250.000 anos (alguns autores o classificam como heidelbergensis). Com datações de 160.000 anos, crânios de humanos idênticos aos modernos foram identificados na África do Sul (sítios Blombos Cave e Klasies River Mouth/KRM) e, com 100.000 anos, na Etiópia (sítios Herto e Omo) e em Israel (sítios Skhul e Qafzeh). 
A partir de 40.000 anos, iniciam-se os movimentos de colonização do Homo sapiens sapiens a partir da África e Oriente Próximo em direção à Europa, à Ásia e à Austrália, chegando à América entre 20.000 e 13.000 anos e, à Polinésia (Havaí), no século XII d.C.
O que nos diferencia dos demais Hominidas em termos evolutivos?
Sugere-se que a capacidade plena da linguagem articulada seja o principal “capital” cultural dos Homo sapiens sapiens, pois quanto mais complexa a organização social, maior a necessidade de estruturas de transmissão das regras sociais entre as gerações e de manutenção dos laços sociais a longas distâncias. A capacidade de fonação plena teria sido a responsável pela “revolução cultural” do Paleolítico Superior.
A seleção natural favoreceu a vocalização entre os primatas (12 fonemas), mas esta é maior entre os humanos (50 fonemas). O processo de evolução deste aparelho vocal inicia-se com o Homo erectus, mas somente entre os humanos modernos a base do crânio é arredondada, fazendo com que a laringe situe-se na parte baixa da garganta, e a faringe, acima das cordas vocais, criando uma caixa de ressonância. Entre os demais primatas e Hominidas, a base do crânio é chata, situando-se a laringe na parte alta da garganta, o que limita a emissão de sons.
Os bebês humanos nascem com o padrão de fonação primata, e a laringe desloca-se para baixo progressivamente, atingindo a posição que permite a fala articulada entre os 18 e 24 meses de idade. A posição definitiva da laringe só é atingida entre os 12 e 14 anos de idade. A fala seria uma relação com o mundo mental interno e o mundo social: precisamos dela para contar e lembrar histórias.
Principais Modelos Teóricos sobre a Origem dos Humanos Modernos:
MODELO MULTI-REGIONAL (Alan Thorne e Milford Wolpuff): partindo do registro fóssil e de uma perspectiva gradualista, sugere que os sapiens modernos teriam se originado simultaneamente em diferentes regiões geográficas povoadas por arcaicos, através de evolução paralela e gradual (fósseis transicionais). As raças modernas guardariam traços destas diferenças de origem que, por cruzamento, teriam se unificado.
MODELO DA ORIGEM ÚNICA OU “A PARTIR DA ÁFRICA” OU “ARCA DE NOÉ” (Chris Stringer): Parte de estudos genéticos e defende que os humanos modernos originam-se de uma única população africana que teria substituído às populações arcaicas e Neandertais. Estas teriam surgido a partir do isolamento geográfico de Homo erectus (ergaster?), representando um salto evolutivo.
As evidências que corroboram o modelo de origem única africana são genéticas. A Hipótese da Eva Mitocondrial (Douglas Wallace e Allan Wilson) indica que o DNA mitocondrial, doado pela linhagem materna, estaria associado a uma ancestralidade africana comum para toda a espécie, com origem entre 150.000-200.000 anos. O mesmo padrão é encontrado para o cromossomo Y, indicando uma origem comum e africana. Também os primeiros resultados do Projeto de Genoma Neandertal indicam 26 diferenças como o genoma moderno, sugerindo uma encruzilhada evolutiva entre 400.000-250.000 anos (heidelbergensis). 
A variação fenotípica dos humanos modernos deu-se por microevolução decorrente do isolamento geográfico a partir de 100.000 anos (população politípica). Estudos genéticos indicam que o processo de diferenciação que originou os grupos raciais modernos está associado aos ritmos desta colonização. O padrão africano ou negroide (100.000 anos) é o original, seguido dos padrões australo-melanésio (60.000-55.000 anos), caucasiano (40.000-35.000 anos) e mongol-ameríndio (35.000-15.000 anos). A tendência à despigmentação seria recente (40.000 anos) e uma adaptação ao clima glacial.

Continue navegando