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MAPA DOS impressos no interior de Mato Grosso do Sul JORNAIS MAPA DOS impressos no interior de Mato Grosso do Sul Hélder Rafael e Tatiane Guimarães Universidade Católica Dom Bosco - UCDB JORNAIS localização perfil completo análise do setor Reitor Pe. JOSÉ MARINONI Chanceler Pe. LAURO TAKAKI SHINOHARA Pró-Reitor Administratiivo Ir. RAFFAELE LOCHI Pró-Reitor Acadêmico Pe. Dr. GILDÁSIO MENDES Coordenação de Jornalismo JACIR ALFONSO ZANATTA ® 2008, Hélder Rafael e Tatiane Guimarães Revisão gramatical Prof. JOSUÉ ALVES CONCEIÇÃO Arte da capa e diagramação HÉLDER RAFAEL Orientação Profª. CRISTINA RAMOS RIBEIRO PRODUZIDO EM CAMPO GRANDE, PRIMAVERA DE 2008. UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCO (UCDB) Aos meus pais, Maria Ercília e Josué, à minha futura esposa, Fernanda, e ao bebê que chegará em breve. -- Hélder Rafael À professora Beatriz Dornelles, cujo trabalho serviu de inspiração a esta pesquisa; A Álvaro e Sandra Pereira, proprietários do jornal Tribuna Popular, onde dei os primeiros passos na carreira de jornalista, em Jardim/MS; A todos os professores dos cursos de Jornalismo na PUCRS e UFRGS, faculdades em que estudei por quatro anos em Porto Alegre/RS; A todos os colegas de classe que me acolheram na UCDB, onde ingressei com o curso já em andamento, em 2007; Aos professores do curso de Jornalismo da UCDB: Cristina Ramos, Oswaldo Ribei- ro, Inara Silva, Jacir Zanatta e Cláudia Zwarg, que me acompanharam até o fim dessa jornada acadêmica; Aos amigos David Reél, Fábio, Luiz, Thiago, Roberto, Ademilson, Leandro, Janaína e Rafael, pelos momentos de alegria e aprendizado; Aos primos Jonas e Marcelo, e aos tios João Cleófas e Marlene Lizete, pelo compa- nheirismo e apoio em momentos de incerteza; E à amiga de todas as horas Tatiane Guimarães, sem a qual a existência deste livro não seria possível. -- Hélder Rafael AGRADECIMENTOS À minha mãe Ivanir Mascarenhas Robaldo. -- Tatiane Guimarães A meu pai, Roldão Correia Guimarães que ao longo dos meus 27 anos de vida tem me dado bons exemplos de conduta e excelentes conselhos, os quais procuro seguir. Para se seguir um caminho correto na vida é necessário ter alguns orientadores, e eu agradeço a Daisaku Ikeda por ter trazido a filosofia do budismo de Nitiren Daishonin para o Brasil e ser meu estimado mestre. À minha prima Neiva Guedes, que considero como irmã, que acreditou em mim mesmo nos momentos em que eu mesma duvidei de minha capacidade, e acima de tudo por ser um exemplo de vida. Às minha tias, que me apoiaram de diversas formas, com conselhos, momentos de risadas, de conversar sério e até mesmo no fornecimento de alimentação. Reconheço o importante elo de amizade que algumas pessoas formaram comigo ao decorrer dos três anos e meio do curso de Jornalismo que fizemos juntos, são elas: Hélder Rafael, Fernanda Yafusso, Jairo Gonçalves, Talita Oliveira e João Carlos Costa Aos meus professores: Cláudia Zwarg, Cristina Ramos, Inara Silva, Oswaldo Ribei- ro e Jacir Zanatta, pelos desafios que me proporcionaram e que me fizeram desen- volver-me como acadêmica e também como ser humano. Aos meus psiquiatras Florivaldo Leal Neto e Luis Carlos Valim, dedico minha sin- cera estima, por terem me diagnosticado e medicado corretamente. Sem o trabalho deles minha participação nessa obra teria sido impossível. Ao trabalho que Lílian Carla, minha psicóloga, vem realizando comigo, que está possibilitando minha auto-descoberta e o fortalecimento de minha personalidade. Aos meus irmãos, por serem companheiros nessa jornada chamada vida, a qual atra- vessamos cada um com seus objetivos, mas sempre buscando a verdadeira felicidade. À Patrícia dos Santos, por sua inestimável amizade, que espero que se estenda por toda a eternidade ou mais. Aos meus queridos companheiros de Brasil Soka Gakai Inernacional, os quais têm sido meus parceiros na busca do desenvolvimento pessoal e humano. -- Tatiane Guimarães AGRADECIMENTOS O nde trabalhar? As outras perguntas do lide da vida profissional já fo- ram respondidas, mas o ONDE teima em cutucar muitos jornalistas, que observam o mercado de trabalho inchar cada vez mais de comunicado- res egressos das Universidades. Na Capital de Mato Grosso do Sul, por exemplo, conforme pesquisa realizada por formandas de Jornalismo da Universida- de Católica Dom Bosco (UCDB) em 2006, mais de 800 jornalistas foram graduados nas quatro Instituições de Ensino Superior que oferecem o Curso de Jornalismo na Capital, desde 1993, quando se formou a primeira turma da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). No estudo, foram entrevistados 106 jornalistas que atuam na cidade. Constatou-se que nos veículos de comunicação 64,8% dos entrevistados eram de diplomados nas universidades de Campo Grande. Somam-se a estes os jornalistas que não passaram por formação universitária e os que vieram de outros Estados para trabalhar aqui. A pesquisa mostrou que as redações da Capital são compostas, em sua maior parte, por jovens entre 20 e 25 anos, que ganham entre 3 a 6 salários mínimos, renda que obriga 25% dos profissionais a trabalhar em mais de um emprego, e 44,8% a extra- polar as cinco horas diárias de trabalho previstas por lei como carga horária em cada estabelecimento jornalístico. Se o “Plano A”, de trabalhar com jornalismo na Capital de MS está concorrido demais e cheio de números desanimadores, o “Plano B” de migrar para o interior do Estado passa pela cabeça dos jornalistas. Mas será que existe vida saudável para estes profissionais nos outros 77 municípios do estado? Este livro ajuda na opção pessoal dos jornalistas quanto em que local atuar no interior, e faz também alguns apontamentos das práticas profissionais nos veículos de comunicação impressos en- contrados pelos pesquisadores no além-capital. O leitor vai descobrir que o mercado de trabalho jornalístico impresso nos mu- nicípios interioranos é uma realidade, por meio da catalogação dos veículos de co- municação impressos publicada nas próximas páginas. Mas a análise realizada pelos pesquisadores com base nos dados colhidos, entrevistas e artigos, mostra que os problemas enfrentados na Capital de Mato Grosso do Sul pelos jornalistas são mui- PREFÁCIO to parecidos com os vivenciados pelos colegas do interior. Salário baixo, horas de trabalho excessivas, concorrência com mão-de-obra não especializada e a instabili- dade das empresas de comunicação - que podem fechar a qualquer momento - são algumas dificuldades que têm conotação diferenciada no interior, e algumas vezes ampliada em relação a Campo Grande. Dentre as agruras mais assustadoras que acometem os jornalistas interioranos está a ligação perigosa e próxima com o poder daquelas localidades, principalmente o executivo dos municípios, principal fonte de renda dos veículos de comunicação impressos, também no interior de Mato Grosso do Sul. -- Profª. Cristina Ramos Ribeiro - Orientadora SUMÁRIO INTRODUÇÃO Pesquisa ORIGENS DA IMPRENSA EM MATO GROSSO DO SUL 1838 a 1889 1889 a 1949 Atentados a jornais e crimes de imprensa Morte do prefeito Ary Coelho Jornais mais antigos em circulação PERFIL DA IMPRENSA INTERIORANA DE MATO GROSSO DO SUL POR QUE JORNAIS SÃO IMPRESSOS FORA DO ESTADO? POR QUE POUCOS PROFISSIONAIS ATUAM NA IMPRENSA INTERIORANA? Vantagens no interior Exército de um homem só POR QUE JORNAIS SÃO DISTRIBUÍDOS DE GRAÇA? Distribuição dirigida Apatia das empresas privadas POR QUE DESAPARECEM OS JORNAIS? Terreno fértil para novos jornais 13 14 17 17 19 20 21 22 25 29 31 34 35 37 39 40 43 44 RELAÇÕES ENTRE IMPRENSA E PODER Explicando a licitação Interesses exclusivos ou escusos? Quando a relaçãose torna corrompida Quando o bolo fica abatumado A socos e pontapés DONOS DE JORNAIS CRIAM SINDICATO Modernização dos jornais Composição da diretoria do sindijopre/ms IMPRENSA INTERIORANA DO RIO GRANDE DO SUL: UMA COMPARAÇÃO Boom de jornais Papel da faculdade Em busca de aperfeiçoamento Jornal interiorano: características Informações adicionais CONCLUSÃO REFERÊNCIAS GLOSSÁRIO ANEXO 1 - JORNAIS INTERIORANOS DE MATO GROSSO DO SUL ANEXO 2 - COMO ABRIR UMA EMPRESA JORNALÍSTICA ANEXO 3 - LISTA DE TABELAS 47 47 48 50 53 54 57 58 60 61 63 64 65 66 68 69 71 79 81 115 117 13 Este livro é resultado do trabalho de conclusão do curso de Jornalismo, sobre o mapeamento dos jornais impressos no interior de Mato Grosso do Sul. A partir dos dados coletados nas redações, os pesquisadores fizeram análise crítica da situação da imprensa e formularam o perfil do setor, válido para o final da década de 2000. O levantamento detalhado de informações resultou em um anuário inédito nos meios acadêmico e profissional do Estado. O tema recebe pouca atenção nas salas de aula das faculdades de Jornalismo. As raras opiniões existentes sobre essa fatia de mercado sofrem distorção por pre- conceito – originado em grande parte no desconhecimento das especificidades do mercado de trabalho no interior. São poucos os estudos que retratam o setor, visto que as atenções de acadêmicos e pesquisadores em Jornalismo se voltam, em especial, para a compreensão da reali- dade mercadológica da capital, Campo Grande. Jornais semanários do Estado foram tema de monografia defendida em 2005 na Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (Uniderp); outro trabalho de conclusão de curso ocupou-se do levantamento histórico da imprensa de Corumbá, em 2002, na Univer- sidade Católica Dom Bosco (UCDB). Embora haja número reduzido de pesquisas sobre o assunto, a imprensa interio- rana constitui-se em amplo terreno para atuação dos novos jornalistas e, também, um ambiente favorável a empreendimentos. Para a própria sobrevivência do profis- sional em um mercado de trabalho cada vez mais competitivo, é necessário que o acadêmico seja capaz de perceber a existência de tais oportunidades o mais cedo possível. Não existe entidade regional que se dedique exclusivamente a catalogar jornais em Mato Grosso do Sul. Apesar de um sindicato estadual de jornais e periódicos ter sido fundado em 2007, o órgão abrange apenas uma parcela da imprensa interiora- na. As secretarias de comunicação do Governo do Estado e da Assembléia Legislativa contam com informações incompletas dos jornais, e que demandaram atualização para serem usadas na pesquisa. Introdução 14 Em nível nacional, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) dispõe somente de estimativas sobre o setor. O mesmo ocorre na Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). A secretaria de comunicação da Presidência da República (Secom) dispõe de um banco de jornais, mas muitos periódicos que constavam da lista já tinham deixado de circular. Para agravar o quadro de dificuldades, três jornais fecharam suas portas durante a pesquisa: Aquidaban (Bonito); Bonito em Foco (Bonito); e O Alvorada (Nova Alvo- rada do Sul). O assunto será tratado com mais detalhes ao longo do trabalho. PESQUISA Obteve-se levantamento estatístico e administrativo dos jornais em circulação no interior de Mato Grosso do Sul. Esse banco oferece informações detalhadas dos pe- riódicos em 2008. Na primeira abordagem, foram encontrados 103 jornais no interior do Estado, com base em consultas à lista telefônica e a páginas na Internet de órgãos ligados à comunicação (ANJ, Fenaj, Secom, Assembléia Legislativa, Governo do Estado). Em seguida, os pesquisadores apuraram por telefone todos os dados coletados, e identificaram 86 impressos. A apuração se deu em redações, prefeituras, câmaras municipais, entidades de classe e imprensa local. A coleta de exemplares serviu de apoio nessa etapa. Dos 86 jornais, cinco foram desconsiderados do objeto de pesquisa, por não aten- derem aos requisitos exigidos. Outros seis proprietários não colaboraram com os pesquisadores, ao deixar de repassar dados relevantes ao estudo. Por fim, três im- pressos fecharam durante a apuração. Como resultado, chegou-se ao universo de 72 jornais impressos no interior de Mato Grosso do Sul. Os pesquisadores aplicaram um questionário a todos os jornais encontrados, para obter as seguintes informações: endereço, telefone, e-mail, página na Internet, perio- dicidade, dias de circulação, formato, cores, número de páginas e cadernos, tiragem, parque gráfico, preço de capa, preço de assinatura, número de assinantes, valor do anúncio, área de circulação, diretor responsável, número de funcionários, jornalistas práticos e formados. Junto ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram obtidos dados básicos dos 77 municípios do interior do Estado. 15 A partir disto, foi possível classificar os jornais segundo suas principais carac- terísticas. Posteriormente, os pesquisadores analisaram a realidade do setor. Para tanto, fizeram entrevistas por telefone com proprietários e jornalistas que atuam na imprensa interiorana. A análise crítica contou com extensa revisão bibliográfica de especialistas no assunto, como José Marques de Melo, Beatriz Dornelles e Alberto Dines. A esses, somaram-se teses de especialização e monografias de pesquisadores regionais. Completam a relação: entrevistas presenciais e por telefone com pessoas ligadas à atividade jornalística regional; artigos científicos e jornalísticos; matérias jornalísticas veiculadas na imprensa escrita estadual; e outros textos disponíveis em páginas sobre jornalismo na Internet. Para compreender o grau de desenvolvimento da imprensa interiorana, partiu-se das definições formuladas pela professora Beatriz Dornelles. Em sua tese de douto- rado, ela fez levantamento dos jornais existentes no interior do Rio Grande do Sul. O trabalho foi publicado em livro no ano de 2004. Dornelles formou amostra de 14 jornais, em 14 municípios, e que contempla diferentes critérios, como periodicidade, porte das cidades, tiragem, número de profissionais envolvidos, entre outros. Por meio de questionários, foi possível traçar um perfil estatístico do setor. A pesquisa- dora define jornal interiorano como: O produto impresso de uma empresa ou micro jornalística, constitu- ída juridicamente na Junta Comercial do município, regida pelo ativo e pelo passivo, objetiva lucro através da comercialização publicitária, venda de assinaturas e avulsa. O jornal deve, obrigatoriamente, ser re- gistrado no cartório de registro especial e manter uma estrutura admi- nistrativa mínima, que inclui um diretor, um contador, um responsável pela distribuição, um vendedor de anúncios e um jornalista. Periodici- dade constante, desde que diária, trissemanária, bissemanária ou se- manária. Filosofia editorial deve ser comunitária, ou seja, as matérias produzidas para jornal devem atender aos anseios e reivindicações da comunidade que, dentro do possível, determinará quais as notícias que devem ser divulgadas pelo jornal, desde que não atendam a nenhum interesse partidário. O diretor e/ou o jornalista devem, também, parti- cipar ativamente de todas as atividades promovidas pela comunidade, ajudando a buscar soluções. (p.153) 17 A fim de facilitar a compreensão histórica do desenvolvimento da imprensa em Mato Grosso do Sul, buscou-se resgatar os principais acontecimentos da época de seu surgimento, ainda no século XIX - quando o Estado era uno. O livro do historiador Rubens de Mendonça cumpre satisfatoriamente esse papel, ao explorar mais de 100 anos de casos e relatos da imprensa regional. Intitulada “História do jornalismo em Mato Grosso“,a obra data de 1951. Entretanto, a edição consultada é de 1963. 1838 A 1889 De acordo com Rubens de Mendonça, a primeira oficina tipográfica de Mato Gros- so foi introduzida em 1838 pelo presidente da província, Dr. José Antônio Pimenta Bueno. Os equipamentos destinavam-se à publicação de um jornal, e os recursos foram arrecadados entre pessoas interessadas na aquisição. A província também apli- cou recursos para a compra das máquinas, que passariam a pertencer à Assembléia Legislativa. Como o primeiro jornal de Mato Grosso teria caráter oficial, a Assembléia Legis- lativa autorizou o custeio público da tipografia, bem como o pagamento de seus empregados. Nessa primeira fase, a imprensa voltava-se exclusivamente aos interes- ses do poder público, mediante circulação de “todos os atos oficiais, que não exi- gem segredo dos Governos, da Assembléia Provincial, das Repartições Fiscais, das Câmaras Municipais, dos jurados - as participações das Autoridades Policiais, as decisões das Juntas de Paz, finalmente mesmo as leis e atos do Governo Central, que disseram respeito a esta Província”. (p. 7-8) Em relatório enviado à Assembléia em 1º de março de 1837, o presidente da pro- víncia justificava a necessidade de instalar uma tipografia em Mato Grosso: As instituições políticas, assim como as demais coisas, têm atributos e dependências que são essenciais à sua natureza. O sistema administra- Origens da imprensa em Mato Grosso do Sul 18 tivo que nos rege, exige a publicidade dos atos das autoridades, que também dela depende muitas vezes, para que bem possa corresponder a seus fins. Tal é uma das condições que as leis demandam, é justo, é mesmo indispensável fazê-las conhecidas, quanto possível, aliás, a pena imposta pela sua inobservância será repetidas vezes verdadeira tirania. (p. 5) Em 1839, chega à província o primeiro tipógrafo, e tem início a circulação do primeiro jornal, “Themis Mato-grossense”, em 14 de agosto daquele ano. Essa data é considerada o marco da imprensa mato-grossense. Segundo Rubens de Mendonça, o periódico circulava às quartas-feiras e destinava-se à publicação de atos oficiais. (p.8) No ano seguinte, o “Themis Mato-grossense” é fechado por causa das divergên- cias políticas entre a Assembléia Legislativa e o presidente da província. Em 1840, o presidente Pimenta Bueno cortou do orçamento a verba destinada à manutenção da oficina tipográfica. Em 30 de julho de 1842, já sob a presidência do Cônego José da Silva Guimarães, a província voltou a contar com órgão oficial de imprensa: “O Cuiabano Official”, que posteriormente mudou o título para “O Cuiabano”. Circulou até julho de 1845. Com o fechamento de “O Cuiabano”, o poder da província desistiu de manter tipografias próprias, e passou a contratar oficinas particulares para fazer circular leis e atos oficiais. Nesses moldes, a parceria foi firmada com o “Eco Cuiabano”, e iniciou- se em 12 de junho de 1847. A situação perdurou até 09 de dezembro de 1889, com “A Província de Mato Grosso”. A notícia da proclamação da República chegou a Cuiabá em 09 de dezembro de 1889, trazida pelo navio a vapor “Coxipó”. Governava a província o Coronel Ernesto Augusto da Cunha Matos. O quadro da imprensa cuiabana à época foi assim descrito por Rubens de Mendonça: Circulavam em Cuiabá, naquela época, apenas três jornais: “A Provín- cia de Mato Grosso”, órgão do partido liberal; “A Situação”, órgão do partido conservador; e “A Gazeta”, de propriedade e redação de Vital de Araújo, que fazia propaganda republicana. (p. 21) 19 Na região que atualmente compreende o Estado de Mato Grosso do Sul, o primei- ro jornal existente foi “O Indicador”, fundado em Corumbá. A edição inicial data de 18 de janeiro de 1877. (Ver tabela 1) 1889 A 1949 O primeiro jornal a surgir após a queda da monarquia foi o “15 de Novembro”, de Cuiabá, em 1890. Tinha como redator Antônio Augusto Rarimo de Carvalho. No mesmo ano, surge a “Gazeta Oficial”, criada pelo governador geral Antônio Maria Coelho. Durante décadas a imprensa mato-grossense desenvolveu-se na Capital e nas principais cidades, como Corumbá, Campo Grande, Três Lagoas, Ponta Porã, Cáceres e Poconé. Transcorreram-se a República Velha e a Era Vargas (1930-1937), até que Cuiabá viu surgir o primeiro jornal diário - embora no Sul de Mato Grosso já existissem diários em circulação desde as primeiras décadas do século XX. Em 27 de agosto de 1939, surge “O Estado de Mato Grosso”, sob direção do jornalista Arquimedes Lima, poste- riormente dirigido pelo Dr. Alcy Pereira Lima. O governo de Getúlio Vargas criou o Departamento de Imprensa e Propaganda (Dip), com repartições nos Estados. Em Mato Grosso, Arquimedes Lima foi nomea- do chefe da repartição. Segundo Rubens de Mendonça, a imprensa mato-grossense experimentou relativa tranqüilidade para o exercício do jornalismo nessa época. O deip. em Mato Grosso, em virtude do espírito liberal do seu diretor, que é jornalista profissional, nunca exerceu a censura, e até auxiliava a imprensa local, dando-lhe a mais completa liberdade. Aliás, durante todo o tempo da Ditadura, pelo menos em Mato Grosso, nunca houve falta de garantia à imprensa. O próprio Interventor Julio Muller dava à imprensa todo apôio. Não sabemos de um só atentado contra a liberda- de de imprensa, durante todo esse período que vai de 10 de novembro de 1937 a 29 de outubro de 1945, data da queda da Ditadura no Brasil. (p 63) 20 ATENTADOS A JORNAIS E CRIMES DE IMPRENSA Rubens de Mendonça dedica um capítulo aos relatos de atentados cometidos con- tra a imprensa mato-grossense: “feita a história cronológica da imprensa em Mato Grosso, seria ela incompleta se faltasse esse Capítulo. A violência e a opressão foi sempre o característico dos maus Govêrnos”. (p. 104) Entre os casos documentados por Mendonça, estão empastelamentos (inutilizações de oficinas) e agressões a reda- tores, diretores ou colaboradores dos jornais. Em Cuiabá, o historiador afirma que o primeiro atentado contra a imprensa foi re- gistrado em 03 de outubro de 1919. Foi empastelada a tipografia de “O Republicano”. Êste atentado, diz o historiador Estêvão de Mendonça, nas “Datas Mato- grossenses”: foi o primeiro dessa natureza praticado em Cuiabá, onde a liberdade de imprensa tem atingido por vezes à licença. Do inquérito nada resultou para a descoberta do criminoso, ou criminosos, como aliás era geralmente previsto. (p 105) Já em 1ºde fevereiro de 1929, relata Rubens de Mendonça, o jornal oposicionista “A Reação” foi fechado por determinação do presidente do Estado, Dr. Mário Corrêa da Costa. Em 21 de abril de 1932, o jornal “O Momento” registrou em suas páginas o atentado à oficina. O autor relata casos de atentados em Corumbá, Campo Grande e Nioaque. Nesta cidade, no ano de 1896, foi empastelado “o jornal ‘A Voz do Sul’, e o material tipo- gráfico todo atirado no rio Nioaque. O autor deste feito selvagem recebeu cognome de Onça Preta”. (p. 115) De acordo com Rubens de Mendonça, os primeiros registros conhecidos de injú- rias veiculadas pela imprensa datam de 20 de março de 1874. António Joaquim Pires, sob pseudônimo “O morador do Limoeiro”, cometeu o crime de injúrias impressas contra o Fiscal da Câmara Mu- nicipal, publicada no periódico “O Liberal”, número 83, dessa data, um artigo sob a epígrafe “Para o Fiscal da Câmara ler”, no qual fazia-lhe imputações de defeitos, em razão do seu ofício. O ofendido logo apre- sentou no dia seguinte a sua petição de queixa, e seguindo o processo 21 seus termos, foi anulado pelo Juiz de Direito, em gráu de apelação, por irregularidade encontradas, salvo direito do autor para repetir a ação. (p. 108) Um inquérito contra o editor de “A Situação”, Estevão Pereira Leite, foi aberto em 09 de março de 1881. Firmino Rodrigues Ramos, Coletor da 1ª Recebedoria Provin- cial, exigiaa comprovação da autoria de um artigo publicado naquele jornal, mas o editor negou-se a fazê-lo. Ainda naquele ano, em 15 de setembro, o Tenente-Coronel Antonio da Silveira e Souza também pediu às autoridades que o editor de “A Situ- ação” comprovasse autoria de artigo que continha injúrias. Perante o juiz, Estevão Pereira Leite atribuiu o texto a Francisco Galdino Duarte. O historiador relata assim o desfecho dessa guerra de acusações: 1881, a 1º de dezembro, indo Estevão Pereira Leite banhar-se no rio Cuiabá - Porto da Conceição - foi vencido pela correnteza d’água e afo- gou-se. Depois do procedido ao respectivo exame, deu-se sepultura ao cadáver’. Ora, é por certo um caso para chamar a atenção. O homem a 15 de setembro era processado por haver caluniado o Coletor da 1a Re- cebedoria e logo no mesmo ano apareceu, no mesmo relatório, como morto por afogamento? É muita coincidência. (p. 111) MORTE DO PREFEITO ARY COELHO Um dos episódios mais trágicos já registrados na imprensa mato-grossense foi o assassinato do prefeito de Campo Grande, Dr. Ary Coelho de Oliveira, em 21 de novembro de 1952. O autor do atentado teria sido Alcy Pereira Lima, então diretor do jornal “O Combate”. De acordo com Rubens de Mendonça, o motivo que levou ao crime foi a troca de acusações entre o prefeito e Alcy Pereira Lima, por meio de artigos publicados na imprensa escrita. Ary Coelho era proprietário de “O Matogrossense”, e o jornal lançou série de textos criticando uma concessão de terras feita à Fundação Brasil Central - dirigida, à época, por Arquimedes Pereira Lima, irmão de Alcy. O jornal “O Combate” reagiu com a publicação, em 20 de novembro de 1952, de artigo intitulado “Carta Aberta ao Caluniador Ary Coelho”. 22 JORNAIS MAIS ANTIGOS EM CIRCULAÇÃO O periódico mais antigo em circulação no Estado é o Jornal do Povo (Três Lago- as), fundado em 1949 pelo senador Filinto Muller. A primeira edição circulou no dia 15 de junho daquele ano. Em 1962, o advogado Stênio Congro assumiu a direção do jornal, se responsa- bilizando também pela parte financeira da empresa. Em 1978, o advogado Rosário Congro Neto associou-se à empresa, que mudou sua razão social para Jornal do Povo S/C Ltda. Ainda sob direção de Stênio Congro, o periódico sofreu mudança em seu perfil: passou de político a empresarial, com linha editorial voltada a retratar os problemas locais. Em Dourados circula até hoje o segundo jornal mais antigo de Mato Grosso do Sul. O Progresso foi fundado em 21 de abril de 1951 pelo advogado Weimar Gonçal- ves Torres. Nos primeiros anos, o proprietário firmou parceria com uma gráfica da cidade. A empresa jornalística cresceu e conseguiu adquirir equipamentos próprios de impressão. Em 1969, com a morte do então deputado federal Weimar Torres, o projeto foi as- sumido pela viúva Adiles do Amaral Torres. A linha editorial de O Progresso procura identificar-se com as causas da região da Grande Dourados. 23 Jornais do Sul de Mato Grosso - 1877 a 1949 Corumbá Ano O Indicador A Opinião O Corumbaense Gazeta Liberal O Embrião Éco do Povo A Federação O Sertanejo A Pátria O Operário O Vinte de Agosto O Brasil Autonomista O Correio do Estado Comércio O Argonauta A Tribuna Jornal de Corumbá Correio do Povo Ordem Diário de Corumbá A Cidade Corumbá-Jornal Diário Corumbaense Município O Bajulador O Nacionalista 1877 1880 1880 1884 1891 1893 1896 1897 1899 1900 1901 1902 1904 1909 1910 1910 1912 1913 1913 1913 1914 1918 1928 1932 1934 1935 1937 Fonte: Rubens de Mendonça. História do Jornalismo de Mato Grosso. Tabela 1 Campo Grande Ano O Estado de Mato Grosso Correio do Sul Ruy Barbosa Jornal do Comércio O Diário do Sul O Imparcial O Correio de Campo Grande Diário Oficial O Imparcial Estado O Campograndense 1913 1917 1919 1921 1926 1930 1931 1932 1933 1934 1935 Três Lagoas Ano Três Lagoas Jornal Gazeta de Três Lagoas Gazeta do Comércio A Notícia O Municipal A Epocha O Noroestino A Notícia A Tesoura O Raio-X Tribuna do Comércio O Liberal O Três Lagoas O Concórdia Flit O Clarim A Evolução O Picolé O Democrata O 2 de Julho O Dois de Julho Jornal do Povo* 1912 1915 1919 1919 1919 1920 1923 1924 1925 1925 1929 1930 1931 1932 1933 1934 1934 1937 1937 1945 1947 1949 Ponta Porã Ano Ponta Porã O Progresso Folha do Povo O Independente 1914 1921 1933 1936 Aquidauana Ano A Razão Jornal do Povo 1917 1935 Nioaque Ano A Voz do Sul 1894 Bela Vista Ano O Apa A Ordem 1914 1930 25 Com base no levantamento dos jornais impressos (ver Anexo 1), chegou-se a um perfil da imprensa interiorana de Mato Grosso do Sul. As principais características dos periódicos são: A maioria dos jornais é de periodicidade semanal (36,1%) ou quinzenal (33,3%). Os demais são diários (12,5%), mensal (8,3%), bissemanal (6,9%), trissemanário (1,4%) e dezenário (1,4%). (Ver tabela 6) O formato mais comum é o standard (73,6%), se- guido do tablóide (13,9%). Outros formatos encontra- dos: germânico (4,2%), berliner (2,8%), tablete (2,8%), francês (1,4%) e 44 x 29 cm (1,4%). (Ver tabela 2) Praticamente todos os jornais são impressos em cores, à exceção do Diário da Manhã (Corumbá), que é composto em tipografia. Jornais com cores nas capas representam 79,2% das amostras. Outros 11,1% rodam com quatro páginas coloridas; e 8,3% contam com seis páginas coloridas. (Ver tabela 3) A tiragem média dos impressos está na faixa entre 1001 e 2000 exemplares (38%), seguido por: 2001 a 3000 (32,4%), 4001 a 5000 (18,3%), 3001 a 4000 (4,2%), 5001 a 6000 (4,2%), até 1000 (1,4%), e acima de 6000 (1,4%). Um periódico (Diário Corum- baense) não informou a tiragem. (Ver tabela 12) A maioria das empresas que editam jornais não possui meios próprios de impres- são (75%). Destes, pelo menos 37% informaram que contratam serviço terceirizado de impressão fora de Mato Grosso do Sul. Entre as principais cidades, estão Fernan- dópolis, Jales, Presidente Prudente (SP) e Londrina (PR). (Ver tabelas 7 e 8) A distribuição gratuita de exemplares é verificada em 59,7% dos jornais pesquisa- dos. Embora nenhum diário seja distribuído gratuitamente, isso ocorre em quase todos os quinzenários (91,7%). Entre os jornais vendidos, os preços de capa variam: R$ 1,00 (27,8%), R$ 1,50 (8,3%), R$ 0,70 (1,4%), R$ 1,25 (1,4%) e R$ 2,00 (1,4%). (Ver tabela 11) Perfil da imprensa interiorana de Mato Grosso do Sul Tabela 2 Formato Formato Jornais Standard Tablóide 44 x 29 cm Berliner Francês Germânico Tablete 53 10 1 2 1 3 2 26 A maioria dos jornais (37) não vende assinaturas, e 35 contam com esse serviço. Mas dez empresas não informaram o número de assinantes. Os demais são assim distribuídos: até 1000 (72%), 1001 a 2000 (16%), 4001 a 5000 (8%) e 5001 a 6000 (4%). (Ver tabela 13) Apenas 11,1% das empresas possuem mais de 10 funcionários. A maioria conta com dois a quatro profissionais (51,4%). Jornais com cinco a dez funcionários repre- sentam 23,6%. Empresas com um trabalhador somam 12,5%. Jornalistas formados estão presentes em 50 redações (69,4%). Entretanto, 29 jornais possuem apenas um profissional formado. Outras 22 redações (30,6%) não contam com nenhum jornalista com diploma. (Ver tabela9) Jornalistas práticos atuam em 47 redações (65,3%). Os demais 34,7% não pos- suem esse tipo de profissional. A maioria dos periódicos (31) conta com um jorna- lista prático. Do universo de 72 jornais pesquisados, 11 são edita- dos por empresas não-jornalísticas. Atuam no ramo agências de publicidade, organizadores de feiras e eventos, gráficas, provedor de acesso à Internet e até leiloeiros. Como essa parcela de periódicos é significa- tiva, optou-se por não excluí-la do objeto de pesquisa. A maioria dos jornais impressos (61) estende sua cir- culação a cidades vizinhas ou a regiões inteiras. Isso faz com que todos os 77 municípios do interior do Estado contem com ao menos um periódico. Mas a presença de empresas jornalísticas se verifica em apenas 39 mu- nicípios. A partir das informações obtidas no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), constatou-se que 38 municípios não possuem esse tipo de empreendimento. (Ver tabela 4) Os pesquisadores compararam a presença de empresas jornalísticas nas cidades com seus respectivos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH). A classificação foi criada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), para aferir o avanço de uma população não apenas em sua dimensão econômica, mas também em características sociais, culturais e políticas que influenciam a qualidade da vida. (Ver tabela 5) A equipe do PNUD utiliza vários indicadores sócio-econômicos para compor o Atlas Brasileiro de Desenvolvimento Humano. Esses critérios se referem a saúde, educação, renda, moradia e população das cidades pesquisadas. No caso do índice Cores Cores Jornais Nas capas 4 páginas coloridas 6 páginas coloridas Preto-e-branco 57 8 6 1 Tabela 3 27 voltado para os municípios brasileiros (IDH-M), este é obtido pela média de três subíndices - referentes à longevidade, educação e renda. O índice varia de zero (nehum desenvolvimento humano) até 1 (desenvolvimento humano pleno). As faixas de divisão do IDH são: 0 a 0,499 (baixo), 0,500 a 0,799 (médio), e 0,800 a 1 (alto). Com base no último relatório do IDH-M, publicado em 2000, constatou-se que municípios com os mais altos índices concentram a maioria dos jornais. Entre as 30 cidades do interior com maior IDH-M, 26 dispõem de empresas que editam jornais. Já no grupo das 30 cidades com menor IDH-M, a situação é exatamente oposta: ape- nas quatro possuem esse tipo de serviço. Densidade média de jornais por microrregião Tabela 4 28 Índice de Desenvolvimento Humano dos municípios (2000) Município IDH-M Jornal Chapadão do Sul São Gabriel do Oeste Costa Rica Dourados Nova Andradina Três Lagoas Maracaju Coxim Ponta Porã Cassilândia Ladário Jardim Inocência Paranaíba Corumbá Sonora Bonito Aparecida do Taboado Camapuã Mundo Novo Amambai Sidrolândia Água Clara Aquidauana Brasilândia Bela Vista Guia Lopes da Laguna Laguna Carapã Rio Verde Fátima do Sul Naviraí Rio Brilhante Alcinópolis Glória de Dourados Nova Alvorada do Sul Deodápolis Bataguassu Ivinhema 0,826 0,808 0,798 0,788 0,786 0,784 0,781 0,780 0,780 0,775 0,775 0,773 0,772 0,772 0,771 0,769 0,767 0,763 0,761 0,761 0,759 0,759 0,758 0,757 0,757 0,755 0,755 0,752 0,752 0,751 0,751 0,747 0,745 0,745 0,745 0,739 0,738 0,738 Fonte: PNUD. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Tabela 5 Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Não Sim Sim Sim Não Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Não Não Sim Sim Sim Sim Sim Sim Não Sim Não Município IDH-M Jornal Selvíria Jaraguari Ribas do Rio Pardo Bandeirantes Iguatemi Rochedo Terenos Angélica Vicentina Anastácio Caracol Miranda Aral Moreira Corguinho Pedro Gomes Rio Negro Santa Rita do Pardo Anaurilândia Sete Quedas Caarapó Jateí Nioaque Coronel Sapucaí Douradina Itaporã Itaquiraí Juti Novo Horizonte do Sul Bodoquena Eldorado Taquarussu Batayporã Antônio João Porto Murtinho Dois Irmãos do Buriti Paranhos Tacuru Japorã 0,736 0,734 0,734 0,733 0,731 0,731 0,731 0,729 0,727 0,725 0,725 0,724 0,723 0,723 0,723 0,723 0,722 0,720 0,719 0,715 0,715 0,715 0,713 0,713 0,712 0,710 0,710 0,710 0,708 0,708 0,705 0,704 0,702 0,698 0,686 0,676 0,662 0,636 Sim Não Sim Sim Não Não Não Não Não Sim Não Sim Não Não Não Não Não Sim Não Não Não Não Não Não Não Não Não Não Sim Não Não Não Não Não Não Não Não Não 29 Do universo de 72 jornais pesquisados, constata-se que a maioria é compos-ta de semanários (26) e quinzenários (24). Juntos, representam 69,4% das amostras. A maior parte dessas empresas jornalísticas não conta com parque gráfico. Dos semanários, apenas 23,1% imprimem os periódicos em gráfica própria, e entre os quinzenários a proporção é ainda menor: 8,3%. (Ver tabela 7) Dentre todos os jornais interioranos, apenas 18 (25%) contam com estrutura própria para impressão. Os periódicos que não possuem parque gráfico aca- bam sendo rodados em outras localidades de Mato Grosso do Sul ou até em Estados vizinhos. No Estado, ao menos cinco empresas prestam serviço terceirizado de impressão, sendo quatro em Campo Grande (jornais Correio do Estado, O Estado, A Crítica e Folha do Povo), e uma em Dourados (jor- nal Diário MS). Durante a pesquisa, 20 proprietários informaram que imprimem periódicos em cidades como Fernandópolis, Jales, Presidente Prudente (SP) e Londrina (PR). O motivo é a economia: sai mais barato trabalhar com gráficas de outros Estados - e com preços competitivos - do que im- primir em Campo Grande ou Dourados, com custos mais altos. Averaldo Fernandes, presidente do Sindicato dos Jornais Periódicos e Revis- tas do Estado de Mato Grosso do Sul (Sindijopre/MS), descreve a peculiaridade da imprensa interiorana: Por que jornais são impressos fora do Estado? Periodicidade Periodicidade Jornais Bissemanal Dezenário Diário Mensal Quinzenal Semanal Trissemanário 5 1 9 6 24 26 1 Tabela 6 Periodicidade x Parque gráfico Bissemanal Dezenário Diário Mensal Quinzenal Semanal Trissemanário Periodicidade Sim Não 3 - 7 - 2 6 - 2 1 2 6 22 20 1 Tabela 7 30 Fomos cotar em todos os principais jornais. O Estado, Folha do Povo, A Crítica, Correio do Estado. Tentamos fazer um pacote de jornais para ver se diminuía o preço, mas ainda estava muito caro. Atualmente an- damos gastando no interior de São Paulo ou do Paraná (1). Apesar da queixa dos donos de jornais, a diferença de preço entre gráficas de Mato Grosso do Sul e São Paulo é mínima - conforme orçamento obtido em empresas de Campo Grande, Dourados e Fer- nandópolis (SP), em 09 de setem- bro de 2008 (Ver tabela 8). Orçamento de impressão Empresa 1.000 un. 5.000 un. Diário MS (Dourados) A Crítica (Campo Grande) O Estado (Campo Grande) Ferjal (Fernandópolis/SP) Jornal formato standard, 8 páginas (2 coloridas e 6 P&B) R$ 800 R$ 1.000 R$ 830 R$ 780 R$ 2.100 R$ 1.800 R$ 1.450 R$ 1.530 Orçamento obtido em 09 de setembro de 2008.Tabela 8 (1) Entrevista concedida aos autores em 19 de março de 2008. 31 Um dos motivos que determina a periodicidade da maioria dos jornais in-terioranos é a baixa quantidade de profissionais que atuam nas redações. A pesquisa apurou que 163 jornalistas, entre formados em faculdade (86) e práticos (77), atuam nos 72 jornais interioranos. Este é um número pequeno, se comparado à realidade da imprensa de Campo Grande. Os três jornais diários (Cor- reio do Estado, O Estado e Folha do Povo) somam 60 jornalistas - entre editores, repórteres e correspondentes no interior. Embora haja diferença mínima entre o número de práticos (1) e formados no inte- rior, comprova-se que a maioria das reda- ções ainda conta com jornalistas práticos. Ao todo, 47 impressos (65,3%) possuem es- ses profissionais em seus quadros. Ainda, 22 jornais (30,6%) não contam com qual- quer jornalista formado. (Ver tabela 9) A falta de jornalistas formados na im- prensa interiorana é acarretada por três fatores: a) muitas empresas jornalísticas não têm condições financeiras para contratar jornalistas formados; b) a facilidade de usar releases e matérias publicadas na Internet faz com que as empresas dispensem a contratação de repórteres; c) os salários menores - em comparação aos praticados na Capital - não atraem os profissionais para atuar no interior. a) Sem dinheiro para contratar - A ausência de profissionais formados nas redações do interior pode ser justificada pela dificuldade financeira das empresas. Por que poucos profissionais atuam na imprensa interiorana? Redações x Jornalistas Redações com jornalistas formados Nenhum 1 jornalista 2 jornalistas 22 29 13 3 jornalistas 4 jornalista 5 ou mais 5 2 1 Redações com jornalistas práticos Nenhum 1 jornalista 2 jornalistas 25 31 9 3 jornalistas 4 jornalistas 5 ou mais 4 2 1 Tabela 9 (1) Ver Glossário 32 Etevaldo Vieira de Oliveira, proprietário do jornal Princesa do Vale, diz que faz as vezes de jornalista para cortar gastos: “100% das matérias do Princesa do Vale sou eu que faço, para reduzir custos” (2). Para o empresário, jornalista formado gera despesas que o jornal não consegue arcar. Compartilha da mesma opinião Márcio Romanini, diretor do Jornal Visão (Bata- guassu). Embora o periódico seja assinado por uma jornalista responsável, ela não dá expediente na redação. “Não estou tendo grana para pagar o salário-base da categoria. Faço free-lance com outra jornalista da cidade, mas sei da necessidade de contar com um profissional aqui” (3), afirma Romanini. O diretor reconhece que a qualidade do jornal poderia ser melhor, se contasse com um jornalista em tempo integral. b) Uso indiscriminado do release Apesar de a dificuldade financeira de algumas empresas tornar inviável a contrata- ção de profissionais, está mais fácil produzir jornal com matérias de fontes externas. Com a velocidade de transmissão da Internet, aliada a computadores modernos e programas eficientes, é possível fechar edições inteiras com textos e fotos enviadas por assessorias de imprensa, ou com material coletado em portais noticiosos. Surge então o pretexto ideal para dispensar a presença do jornalista na busca e apuração de fatos. O diretor do jornal Dia Dia (Três Lagoas), Daniel dos Santos, diz que muitas ve- zes a cópia de notícias da Internet substitui a apuração de matérias: “ultimamente tenho dado muito ‘Ctrl-C-Ctrl-V’. Mudo muita coisa no texto e coloco o nome da fonte” (4). No levantamento feito em quatro jornais interioranos, buscou-se veri- ficar a proporção de textos assina- dos por assessorias, em relação a ou- tras unidades noticiosas. (Ver tabela 10). Foram selecionados: Tribuna Popular (Jardim), Jornal da Cidade (Brasilândia), O Estado do Pantanal (Guia Lopes da Laguna) e Diário Notícias do Estado (Aquidauana). A amostra foi ob- (2) (3) Entrevista concedida aos autores em setembro de 2008. (4) Entrevista concedida aos autores em outubro de 2008. Jornais e releases Jornal Pág. Unid. Releases Tribuna Popular Diário Notícias do Estado O Estado do Pantanal Jornal da Cidade 16 12 16 4 31 35 45 10 20 24 19 7 Tabela 10 33 tida aleatoriamente, e corresponde a um exemplar publicado entre 2007 e 2008. Constatou-se que, de todas as unidades noticiosas presentes nas edições, a por- centagem de releases variou entre 42,2% e 70%. As principais fontes emissoras são: prefeituras e câmaras municipais, Governo Estadual, Assembléia Legislativa, Câmara dos Deputados, Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul (Fiems), Associação dos Municípios de Mato Grosso do Sul (Assomasul) e Polícia Civil. O pesquisador José Marques de Melo avalia que o release desestimula e até supri- me a reportagem nas redações: Antecipando-se à iniciativa dos repórteres e, sem dúvida, desestimu- lando-a, os assessores de imprensa oferecem o prato feito da notícia. Contando com informações detalhadas, que lhes são entregues a domi- cílio, as empresas jornalísticas podem até mesmo suprimir a reporta- gem. E não são raras as que sobrevivem e se alimentam exclusivamente dessa fonte. (apud Lima, 1985: p.14) Em artigo sobre a imprensa regional, o professor Pedro Celso Campos alerta para o comodismo dos empresários: Por isso, por comodidade e para reduzir custos, o jornal acaba dando vazão a todos os releases disponíveis no computador, em vez de pagar repórteres para irem atrás de fatos novos. Gerson Moreira Lima, que já em 1985 chamava a atenção para a febre dos releases que tomavam conta das redações, também reforça a afirmativa: (...) alguns empresários donos de jornal valem-se do press-release para encher páginas de jornal e assim economizar mão-de-obra. Para que contratar mais um repórter se há quem forneça notícia pronta? (p. 47) No livro “O papel do jornal”, Alberto Dines descreve as conseqüências ao jornalis- mo do uso indiscriminado do release: 34 O repórter e todo o processo jornalístico acomodaram-se e deixaram de investigar. O jornalismo brasileiro como alternativa passou a viver de eventos e levantamentos. A única abertura que nos permitimos fo- ram as novas frentes de notícias, logo corrompidas pelo sistema de releases. (p. 91) c) Salários mais baixos que na Capital De acordo com o Sindicato dos Jornalistas da Grande Dourados (Sindjorgran), a classe precisa fechar acordos com as empresas jornalísticas para definir o piso sala- rial da categoria. Isso se deve ao fato de não existir um sindicato patronal. Em Dourados, os jornalistas firmaram acordos coletivos com duas emissoras de tele- visão e um jornal. O Diário MS paga piso salarial de R$ 880, sendo que editores recebem adicional que varia de 20 a 50%. O jornal O Progresso ainda não aderiu à negociação. Já em Campo Grande, a média salarial para jornalistas com jornada de cinco ho- ras diárias é de R$ 1.200, sendo que a classe também precisa negociar com cada empresa jornalística. Não há sindicato patronal, assim como em Dourados. VANTAGENS NO INTERIOR Embora no interior sejam pagos salários menores se comparados aos da Capital, muitos jornalistas levam em conta o ritmo tranqüilo e o baixo custo de vida para atuar no mercado de trabalho nas pequenas cidades. Adejair Moraes, do Correio News (Chapadão do Sul), formou-se na Universidade Federal do Espírito Santo em 1979. Ele conta os motivos que fizeram-no escolher o interior: “são melhores condições de vida. Tinha muita concorrência, na época, nas capitais. Não existe desvantagem nenhuma” (5). Dalmo Cursio, de O Cassilândia Jornal, teve uma trajetória diferente. “Fundei o jornal em 1980, depois fiquei 14 anos em Campo Grande. Quando foi a 90 dias atrás [junho de 2008], a pessoa que estava administrando o jornal ia paraVitória (ES), e me procu- rou. Aí fizemos um entendimento e estou administrando o jornal” (6). Para o jornalista, o principal problema enfrentado é a crise financeira, porque “pouca gente gosta de ler”. As vantagens, segundo Cursio, são a tranqüilidade e a independência para atuar. (5) (6) Entrevistas concedidas aos autores em setembro de 2008. 35 A jornalista Laura Massunari, formada em 2006 pela Universidade Estadual Pau- lista (Unesp) em Bauru, trabalha atualmente no Jornal Hoje (Três Lagoas). Ela diz que escolheu a cidade por razões pessoais: “meus pais moram no interior, e aqui o custo de vida é mais baixo” (7). Para Laura, a desvantagem é a pouca oferta de serviços, não apenas no mercado de trabalho para jornalistas, mas em opções de en- tretenimento e compras. “Há poucas fontes autorizadas a falar sobre determinado assunto”, completa a jornalista. EXÉRCITO DE UM HOMEM SÓ Chama a atenção o fato de que 14 jornais (19,4%) são produzidos por apenas um jornalista prático. Um deles é Denílson Medeiros Severino, que está à frente do jor- nal Gazeta do Norte (Camapuã). Fundado em 1996, o periódico compete com outros dois impressos na cidade: a Folha Regional (1980) e a Folha de Camapuã (1988). O tablóide mensal de 8 páginas circula gratuitamente em Camapuã, Figueirão e Bandeirantes, com 1.000 exemplares a cada tiragem. Sobre a atividade jornalística, o diretor conta que ele mesmo faz cobertura de eventos importantes na cidade. Quando não é possível cobrir o assunto, como em matérias de repercussão estadual, o jornalista afirma que faz pesquisa na Internet para publicar em seu jornal. A estrutura da Gazeta do Norte é modesta. Além do telefone fixo e do celular, a redação dispõe do mínimo para a sobrevivência do jornal: “o escritório eu montei em casa, e tenho computador, acesso à internet e máquina digital para traba- lhar” (8), diz Severino. A impressão é terceirizada. O jornalista afirma que utiliza com freqüência material de assessorias de imprensa da câmara e da prefeitura: “eles já fazem e mandam a matéria para divulgar como eles querem”, afirma. A ativida- de gera lucros tão modestos como o próprio jornal. “Tem lucro, sim. Não é ‘nossa, como você ganha’, é até razoável”, explica Severino. (7) (8) Entrevista concedida aos autores em setembro de 2008. 37 Do universo pesquisado, 43 jornais (59,7%) distribuem exemplares gratuita-mente. Entre semanários, a proporção é de 53,8%; para os quinzenários, 91,7%. Nenhum jornal diário oferece exemplares grátis (ver tabela 11). Afi- nal, por que a maioria dos proprietários oferece de graça um produto que gera altas despesas com pessoal, insumos e estrutura? É fato assumido por proprietários que grande parte dos jornais interioranos re- cebe verba pública como receita de publicidade. O empresário Ivaldo Pereira, que edita a Tribuna da Fronteira (Bela Vista), relata em seu livro como aconteciam as negociações de contratos com o poder público em meados dos anos de 1970. Todos os meses os proprietários de jornais do interior, alguns jorna- listas, viajavam para a capital, Cuiabá, lá se encontravam com os com- panheiros de imprensa, deputados, prefeitos e negociavam contratos de publicidade. A maioria ia mesmo era para receber. Às vezes, com a promessa do dinheiro sair “amanhã”, ficavam três, quatro dias, até uma semana. (p. 4) Logo, as prefeituras, câmaras, governo estadual, deputados estaduais e federais ou senadores, utilizam os impressos como meio de propaganda, isto é, para divulgar imagens positivas de seu trabalho ou atuação. Essa divulgação se dá através de anún- cios regulares, mas também em matérias redigidas pelas assessorias de imprensa dos interessados. Se os jornais fossem vendidos, uma parcela menor de leitores teria acesso a essa publicidade. Por isso, a venda de exemplares ou de assinaturas prejudica a divulga- ção eficiente da propaganda política. A análise é reforçada pelo pesquisador José Marques de Melo, no prefácio ao livro de Beatriz Dornelles: “(...) a imprensa do interior, em nosso país, distancia-se editorialmente das aspirações comunitária, funcionando organicamente como correia de transmissão dos projetos políticos ungidos pelos donos do poder local”. Por que jornais são distribuídos de graça? 38 Averaldo Fernandes, do Sindijopre-MS, confirma a situação de dependência eco- nômica do poder público, e diz que isso gera imagem negativa para a imprensa in- teriorana: “Todo mundo montava jornal para receber do governo ou da Assem- bléia, se tornou uma coisa imoral. Ca- mapuã, uma cidade de 16 mil habitan- tes, chegou a ter oito jornais, a maioria de ‘devezenquandários’(1)”. A submissão dos jornais a forças políticas e econômicas chega a tal ponto que alguns nem se preocupam em circular nas cidades de origem. Apenas rodam o mí- nimo de exemplares para comprovação de notas fiscais, em contratos com o poder público. Eduardo Carvalho, em artigo no jornal Última Hora (Campo Grande), cha- ma a atenção para o fato: Alguns desses veículos se tornam ‘devezenquanzendários’ [sic] e pou- co ou nunca circulam até mesmo nos municípios de origem. Muitas das vezes ‘nem de vez em quando’. Muitos recebem a pecha de ‘órgão ofi- cial’ fazendo as vezes de diário oficial. Esses veículos que sequer pagam impostos e tributos ‘brigam’ por fatias de mídia em órgãos públicos. O professor da Universidade Federal de Mato Gros- so do Sul (UFMS), Éser Cáceres, que já foi empresário da comunicação em Campo Grande, relata uma pecu- liaridade sobre a tiragem de jornais semanários. Para ele, alguns veículos mascaram o número real de exem- plares impressos, a fim de obter dinheiro público com maior facilidade. “A gente tem a ‘mentiragem’ (2) dos jornais. A maioria deles joga 5 mil, 10 mil, para jus- tificar a nota fiscal que ele vai emitir para o governo. Dificilmente algum deles tira mais do que 3 mil.” (3) (1) (2) Ver Glossário (3) Entrevista concedida aos autores em 19 de setembro de 2008 Gratuidade x Periodicidade Bissemanal Dezenário Diário Mensal Quinzenal Semanal Trissemanário Periodicidade Grátis Vendido 1 1 - 6 22 14 - 4 - 9 - 2 12 1 Tabela 11 Tiragem Exemplares Jornais Até 1000 De 1001 a 2000 De 2001 a 3000 De 3001 a 4000 De 4001 a 5000 De 5001 a 6000 Acima de 6001 Não informou 1 27 23 3 13 3 1 1 Tabela 12 39 DISTRIBUIÇÃO DIRIGIDA Em relação à distribuição gratuita, muitos proprie- tários entregam exemplares apenas aos anunciantes. A isso chama-se “distribuição dirigida”. Ocorre uma mistura de conceitos entre “anunciante” e “assinante”, na medida em que os empresários contabilizam jornal dado de graça como jornal recebido por assinante. A pesquisa apurou que 35 jornais (48,6%) comercializam assinaturas. Costuma-se dividir a tiragem em parcelas para pre- feituras e câmaras das cidades onde o jornal circula, além do comércio local. Ainda, uma parte dos jornais é entregue nos gabinetes dos deputados estaduais em Campo Grande. Poucos exemplares são vendidos de forma direta, em bancas de revista ou pontos de distribuição. Ainda segundo Éser Cáceres, a distribuição gratuita é uma alternativa encontrada pelos empresários para despachar exemplares excedentes: “Já fiz essa experiência, imprimir 10 mil exemplares de um jornal. É simplesmente insano. Não tem aonde jogar tanto jornal. Aí surgem soluções esdrúxulas, ‘vou jogar de carro lá na Afonso Pena’”. De acordo com o diretor José Pedro Frazão(4), o jornal O Porta-Voz (Anastácio) distribui gratuitamente 2.000 jornais a cada 15 dias. Enquanto 1.000 exemplares cir- culam em Anastácio, outros 700 são enviados à vizinha Aquidauana e a Dois Irmãos do Buriti. Os 300 jornais restantes são entregues em Campo Grande - na Assembléia Legislativa e naPrefeitura Municipal. Em Anastácio, escolas, órgãos públicos e co- mércio local recebem exemplares do O Porta-Voz. A prática da distribuição dirigida não é exclusividade dos jornais gratuitos. Peri- ódicos pagos também fazem questão de enviar exemplares a órgãos públicos nas cidades onde circulam e na Capital. O fato demonstra que, mesmo comercializados e com certa autonomia financeira, esses jornais dependem de uma boa relação com o poder público - seja esta econômica ou política. Este é o caso do jornal Maracaju Hoje, que distribui semanalmente 3.000 exem- plares em cinco cidades. Destes, 2.000 são destinados a bancas de revista e órgãos públicos da cidade. O restante é dividido entre Dourados, Itaporã, Sidrolândia e Assinantes Assinantes Jornais Até 1000 De 1001 a 2000 De 2001 a 3000 De 3001 a 4000 De 4001 a 5000 De 5001 a 6000 Não informou 18 4 - - 2 1 - Tabela 13 (4) Entrevista concedida aos autores em setembro de 2008 40 Campo Grande - sendo que na Capital, os jornais são entregues na Assembléia Le- gislativa e na Prefeitura Municipal. No caso do jornal A Gazeta (Amam- bai), em torno de 90% da distribuição é feita entre assinantes residenciais e anunciantes. A empresa faz venda direta dos 10% restantes. A tiragem diária de 2.000 exemplares divide-se em: 900 para Amambai e 1.100 para Ponta Porã, Aral Moreira, Coronel Sapucaia, Paranhos, Sete Quedas, Tacuru, Iguatemi, Eldorado, Ca- arapó e Campo Grande. Os principais destinos dos exemplares na Capital são: sede do governo, Assembléia Legislativa, agências de publicidade, Sebrae e Assomasul. Nas demais cidades, órgãos públicos e empresas parceiras recebem cortesia. APATIA DAS EMPRESAS PRIVADAS Para alguns proprietários e jornalistas, a distribuição gratuita de jornais é ocasio- nada pelo desinteresse de comerciantes e empresas do setor privado em anunciar na mídia impressa. Vale notar que o poder público atua no mercado publicitário como anunciante e cliente dos jornais, simultaneamente. No livro lançado em 2003, sobre os 10 anos do Diário MS (Dourados), o jornalista Luís Carlos Luciano escreve a respeito da lamentação dos donos de jornais. O segmento empresarial local e regional oferece pouca publicidade. O Banco do Brasil e a Caixa, dois exemplos clássicos, têm mídia em rede nacional, assim como o Bradesco e a Seara Alimentos. O paradoxo bate às portas do Sebrae, criado para fortalecer e incentivar a micro e a pequena empresas. Suas peças também só são veiculadas, em sua maioria, em rede nacional. No interior, essas grandes empresas não investem quase nada em publicidade. Os comerciantes de porte médio, salvo exceções, seguem o mesmo caminho e, por exclusão, nem é pre- ciso esperar alguma coisa dos pequenos. O Poder Público, por sua vez, é um forte parceiro comercial. (p. 25) Periodicidade x Assinatura Bissemanal Dezenário Diário Mensal Quinzenal Semanal Trissemanário Periodicidade Sim Não 5 1 9 1 5 14 - - - - 5 19 12 1 Tabela 14 41 Um trabalho de conclusão do curso de jornalismo, produzido em 2002 sobre a história da imprensa de Corumbá, também registra essa reclamação: Por meio dos depoimentos de jornalistas e funcionários desses peri- ódicos, observou-se que existe uma dificuldade em manter os jornais em circulação. Isso ocorre não só pela falta de apoio dos comerciantes, que não aceitam pagar o espaço para propaganda, como também pelo desinteresse dos leitores em pagar por esses exemplares e ainda prefe- rem aos jornais da capital aos locais. O sucesso de qualquer produto é diretamente proporcional à sua qualidade, ou seja, o público só passa a consumir determinado jornal se este possuir valor agre- gado. Para o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Gerson Luiz Martins, uma empresa jornalística só consegue obter mais leitores se seu produto reunir credibilidade editorial e independência econômica: (...) como aumentar o número de leitores habituais com essa qualidade de jornalismo? É muito importante aumentar o número de leitores. Significa lucro quanto à confiança e credibilidade do produto. Somente com credibilidade há aumento do consumo e de leitores. É um círcu- lo vicioso. O crescimento de leitores é inversamente proporcional à dependência de receita dos anunciantes e daqueles que influenciam politicamente as edições por meio de subsídios. Martins afirma ainda que o leitor reconhece clara- mente quando a empresa jornalística veicula informa- ções tendenciosas, e isso gera descrédito para o jornal. “Quando há um exagero, uma opinião, ou como diriam os jovens, um ‘forçar a barra’, o leitor percebe e desacre- dita do ‘seu’ jornal. Passa a se desinteressar. Não com- pra todos os dias. O jornal perde. Perde receita.” Apesar do quadro de subordinação da imprensa in- teriorana em relação ao poder público, alguns proprie- tários buscam alternativas para viabilizar seus jornais. Averaldo Fernandes conta uma dessas experiências: Preço de capa Valor Jornais R$ 0,70 R$ 1,00 R$ 1,25 R$ 1,50 R$ 2,00 Gratuito 1 20 1 6 1 43 Tabela 15 42 Uma vez fui a um congresso de jornais com a participação de um pa- lestrante de Canela (RS). Ele falava pra gente que “jornal de graça não pode”. Deve ser vendido. Ele contou a experiência que implantou lá no Rio Grande do Sul, um sistema de assinar o jornal e debitar na conta te- lefônica. Eu tentei com a Sanesul [concessionária de serviços de água e esgoto em Mato Grosso do Sul]. Esse seria o passo para fazer o grande jornal. Sem depender do poder público. Mas não deu certo por causa da burocracia. 43 Em várias cidades pesquisadas, constatou-se que certos jornais eram desconhe-cidos das assessorias de imprensa nas câmaras e prefeituras. Mesmo jornais concorrentes ou emissoras de rádio informavam que determinado periódico tinha circulação incerta, ou que havia desaparecido. Verdadeiros “fantasmões” (1). Dos 103 periódicos encontrados no primeiro levantamento, 17 (16,5%) não pude- ram ser localizados. Motivos: ou deixaram de existir há tempos, ou o cadastro das fontes estava desatualizado. Já durante a pesquisa, três jornais simplesmente desapareceram. Um desses, o Aquidaban, fechou as portas tempos depois da publicação de um editorial que ata- cava a prefeitura de Bonito. O texto intitulado “Escândalo da Imprensa: Você paga e a Prefeitura desperdiça”, critica a prefeitura por ter contratado a empresa MV Co- municações, com sede em Campo Grande, para “criar, publicar, divulgar, veicular e pesquisar matérias de interesse da Prefeitura nos órgãos da imprensa escrita, falada e televisionada”. O valor do contrato era de R$ 288 mil, com duração de oito meses, entre maio e dezembro de 2007. O extrato foi publicado na edição de 02 de maio de 2007 no jornal Diário MS (Dourados). A impressão que se tem é que em Bonito o que é público não tem dono, pode ser gasto de qualquer maneira. (...) Fazendo uma compara- ção; o repasse que a Prefeitura faz ao Hospital Darci João Bigaton (...) é de pouco mais de 30 mil reais. Numa outra comparação, esse mesmo valor pago em propaganda pela Prefeitura apenas esse ano, (...) seria suficiente para construir 24 casas como as que estão sendo financiadas através da Agência Estadual de Habitação, Agehab (...). A primeira abordagem dos pesquisadores ao jornal ocorreu em 22 de janeiro de 2008. Em Bonito, o Aquidaban mantinha edições impressa e online - sendo que nesta, era possível entrar em contato com a redação por e-mail. O telefone do res- Por que desaparecem os jornais? (1) Ver Glossário 44 ponsável também ficava disponível na página do Aquidaban na Internet. O editorial que critica a prefeiturade Bonito foi encontrado no acervo da edição on-line. O segundo jornal, Bonito Em Foco, pertencia à MV Comunicações - empresa cri- ticada pelo Aquidaban por ter recebido verba pública da prefeitura de Bonito para veiculação de material do interesse do executivo. Outro jornal que também desapareceu durante a pesquisa foi O Alvorada, de Nova Alvorada do Sul. Mas antes, o periódico se envolveu em um problema judicial. A Promotoria de Rio Brilhante instaurou inquérito civil para “apurar irregularida- des ocorridas na contratação e distribuição do Jornal ‘O Alvorada’ pelo município de Nova Alvorada do Sul, com a utilização de veículos oficiais para transporte e distribuição das tiragens”. Até outubro de 2008, o inquérito civil nº 22/2006 tramitava no Fórum de Nova Alvorada do Sul. Em dezembro de 2007, o prefeito Arlei Silva Barbosa foi notificado a prestar esclarecimentos à Justiça, mas não compareceu. TERRENO FÉRTIL PARA NOVOS JORNAIS A pesquisa aponta que o período entre 2000 e 2008 foi o mais fecundo para a imprensa interiorana. Ao todo, 32 jornais surgiram nos últimos nove anos. A década anterior registrou a criação de 20 novos perió- dicos. Ressalva-se que foram contabilizados apenas os jornais ainda em circulação. Os que já encerraram as atividades não fizeram parte desta análise, em virtude da dificuldade em levantar informações. O professor Éser Cáceres relaciona o período elei- toral e a alternâcia de grupos políticos no poder como fatores preponderantes ao surgimento de novos veícu- los impressos. Há um boom de novas empresas jornalísticas a cada eleição. Então os “devezenquandários” são jornais criados específicamente para receber a verba pública, após um candidato que foi apoiado pelo jornalista ou em- presário ter sido eleito. Esse boom reflete só a troca do grupo no poder. Surgimento de jornais Década Jornais 1940 a 1949 1950 a 1959 1960 a 1969 1970 a 1979 1980 a 1989 1990 a 1999 2000 a 2008 1 1 2 4 12 20 32 Levaram-se em conta somente jornais que ainda circulam. Tabela 16 45 Como exemplo, Éser Cáceres cita o período de transição dos governos de Zeca do PT e André Puccinelli, em 2006: Você vinha numa constante, com um grupo no poder e acomodados já os mamadores (2). Então as tetas já estavam todas reservadas. Você troca as pessoas. Então você vê que há o surgimento de 30 jornais, mas muitos jornais deixam de ser feitos nesse mesmo período, porque o “meu parceiro” não está no poder, então você fecha o jornal. Destaca-se que muitos periódicos subsistem exclusivamente por meio de propa- gandas pagas pelo Governo Estadual, Assembléia Legislativa, prefeituras e câmaras municipais. Nestes casos, o poder público procura distribuir a verba publicitária com base em critérios técnicos, tais como periodicidade, tiragem e área de circulação dos jornais. Entretanto, o bom relacionamento dos órgãos de imprensa com os políticos no poder é fator condicionante para a divisão desses recursos. Isto significa dizer que jornais com postura crítica aos governos têm poucas chances de incrementar suas receitas com publicidade governamental. Logo, o compromisso social do Jornalismo dá lugar a acordos tácitos, assumidos em nome da sobrevivência das empresas e da predominância político-partidária dos agentes públicos em determinada localidade. (2) Ver Glossário 47 Para entender a estreita relação entre donos de jornais e políticos, devemos resgatar sua fundamentação legal. Está no Artigo 15 da Constituição do Esta-do de Mato Grosso do Sul, parágrafos 3 e 4: O Município publicará, na imprensa local, da região ou da capital, as suas leis, balancetes mensais e ainda o balanço anual de suas contas e o orçamento municipal. Os Municípios poderão, direta ou indiretamen- te, instituir órgão oficial para a publicação dos atos administrativos e dos legislativos. Ou seja, todo município deve tornar públicos seus atos administrativos. Mas caso a prefeitura ou a câmara não disponham de órgão oficial ou estrutura para tal, deve- se contratar o periódico da cidade ou microrregião onde estão inseridas. Por excelência, o jornal impresso é o veículo que reúne as principais característi- cas necessárias à publicação de matérias de interesse dos poderes executivo e legisla- tivo. São algumas: periodicidade regular, grande tiragem, estrutura de distribuição, formato adequado e baixo custo de impressão. A publicação no diário oficial da cidade - seja ele próprio ou contratado - não é a única maneira de divulgar atos oficiais. Alguns precisam ser veiculados no Diário Oficial da União, no Diário Oficial do Estado ou mesmo em jornal diário de grande circulação no Estado. Outros ainda podem sair em diários oficiais eletrônicos, ou seja, apenas na Internet. EXPLICANDO A LICITAÇÃO O instrumento legal para a contratação de um jornal como órgão oficial do mu- nicípio é a licitação. Esta é regida por uma lei específica (8.666/93), que determina critérios para as empresas jornalísticas concorrerem em iguais condições. Relações entre imprensa e poder 48 Ao promover uma licitação, o administrador deve buscar a proposta que melhor atenda ao interesse público. Leva-se em consideração itens como menor preço, pe- riodicidade, distribuição e tiragem de exemplares. Os recursos para pagamento dos jornais já são previstos no orçamento da prefeitura. Já as empresas devem estar em dia com as obrigações jurídicas e fiscais. Para par- ticipar da licitação modalidade “menor preço”, cada participante precisa encaminhar proposta de preços. Vence aquele que praticar o menor preço e atender melhor às exigências do contratante. Não há na legislação artigo que exija comprovação de tempo de atuação da empresa jornalística na cidade onde disputará licitação. O jornal escolhido como órgão oficial torna-se conhecido através do resultado de licitação. Um exemplo: no dia 25 de janeiro de 2008, a prefeitura de Iguatemi con- tratou três empresas jornalísticas para “publicação em imprensa escrita dos atos ofi- ciais (...), informes publicitários (...) e publicação de matérias de interesse público”. As vencedoras da licitação foram Diário MS, de Dourados (R$ 29.700,00); O Liberal, de Mundo Novo (R$ 24.750,00); e A Gazeta, de Amambai (R$ 28.490,00). Período de vigência: 11 meses contados da assinatura do contrato. O pagamento deve ser feito em 11 parcelas iguais e mensais. Nota-se que, como Iguatemi não conta com nenhum jornal que atenda aos crité- rios exigidos pelo edital de licitação, apenas veículos de médio porte e situados em cidades próximas participaram do pregão. Em fevereiro de 2007, no município de Coxim, a Câmara contratou o jornal Correio do Pantanal para publicar, a cada 15 dias, “materiais de interesse exclusivo do Legislativo Municipal”. O valor do contra- to é de R$ 16.500,00, e o pagamento devia ser feito em 11 parcelas mensais de R$ 1.500,00. A despesa já estava prevista no orçamento da Câmara. INTERESSES EXCLUSIVOS OU ESCUSOS? Mas afinal, o que são esses “materiais de interesse exclusivo” do poder público? Além de balancetes, leis e documentos oficiais, os jornais publicam textos das asses- sorias de imprensa das câmaras e prefeituras. São matérias geralmente escritas pelos assessores, e que promovem ou exaltam as benfeitorias e ações dos agentes públicos. Na comparação a seguir, a mesma matéria veiculada no portal da prefeitura de Iguatemi é encontrada no site do jornal O Liberal. Com o título “Iguatemi ganhará mais de trinta mil metros de asfalto”, o texto é assinado pela assessoria de imprensa na página da prefeitura, e foi publicado com fotografia em 18 de agosto de 2008. 49 No dia seguinte, o jornal O Liberal reproduziu a matéria na íntegra em sua edição virtual. A palavra trinta foi substituída pelo numeral no título. Foraisso, nenhuma palavra ou vírgula sofreu alteração, mas apenas a fonte foi omitida - tanto do redator como do fotógrafo. O município de Iguatemi terá, até o final do ano, mais 36.400 m2 de pavi- mentação asfáltica. O novo investimento faz parte do segundo pacote de obras lançado pelo prefeito Lídio Ledesma, anunciado semana passada na câmara municipal. A maior parte do investimento será com recursos da receita própria do município. Nesta nova etapa serão beneficiados com pavimentação os bairros Jardim Quedas d’Água, Vila Nova, Jardim Aeroporto, Vila Operária e Vila Esperança. O exemplo é apenas um entre centenas que ocorrem diariamente - tanto na im- prensa interiorana como nos jornais de Campo Grande. O professor Pedro Celso Campos afirma que essa proximidade prejudica o bom exercício do jornalismo: Ficar preso à prefeitura é o pior mundo possível para um jornal que quer ter atuação comunitária, porque ao fazer acordo para publicação de atos oficiais e notícias prontas da prefeitura acaba vendendo a pró- pria alma e perdendo a independência para tratar da vasta gama de assuntos que interessam à comunidade. Em artigo sobre o jornalismo como instrumento de resgate e construção da histó- ria regional, três pesquisadoras do interior paulista reforçam que essa prática só traz prejuízos à qualidade do produto final. O resultado imediato é a prática de um jornalismo oficialesco, pregui- çoso, acostumado a ouvir o prefeito ou o secretário, mas que poucas vezes ouviu alguma reclamação de um popular. E que jamais se daria ao trabalho de fazer uma reportagem investigativa. Com o tempo, o repórter se embrutece intelectualmente, porque perde o entusiasmo pela profissão e porque, quase sempre, ganha muito mal. 50 Em artigo publicado no portal Observatório da Imprensa, o professor Éser Cáceres relata o uso indiscriminado de textos de assessoria nos semanários de Campo Grande: No conteúdo das publicações “gratuitas”, material publicitário e ma- terial jornalístico se misturam sem qualquer diferenciação, e acabam confundindo os leitores. (...) Os reflexos desse peculiar jeito que o mer- cado arrumou para financiamento de projetos editoriais numa região etimologicamente pobre, carente de recursos a serem aplicados no aprimoramento das relações midiáticas das maneiras tradicionais, são catastróficos para o exercício do jornalismo. Quem sai prejudicado é o leitor que, ao comprar ou receber um exemplar, consome informação sem conhecer as intimidades da relação entre jornais e poder público. QUANDO A RELAÇÃO SE TORNA CORROMPIDA A relação entre imprensa e poder público se corrompe quando o interesse político ou econômico das partes envolvidas prevalece sobre o interesse jornalístico, o que provoca interferência na linha editorial do veículo com prejuízo ao leitor. Alguns proprietários de jornais, mais interessados em lucrar do que fazer circular informação jornalística em suas comunidades, transformam edições inteiras em es- paços publicitários à disposição de quem queira pagar por elas. O jornalismo, nesses casos, cede espaço a algo semelhante, mas totalmente distinto: a mera publicação de releases e informativos de parceiros comerciais. A variação entre os gêneros é muito sutil. Ambos tratam a informação de forma parecida, mas o que os difere é a finalidade: a notícia visa informar, e a publicidade, convencer. Sobre essa questão, o pesquisador Ciro Marcondes Filho afirma que imprensa e capitalismo são pares gêmeos. Dificilmente pode-se imaginar a atividade jornalística, nascida no nú- cleo e dentro da lógica do modo de produção capitalista, como algo muito distinto dele. Ela só existe - pelo menos nos termos que conhe- cemos hoje - transformando informações em mercadorias e colocando- as, transformadas, alteradas, às vezes mutiladas segundo as orientações 51 ideológico-políticas de seus artífices, à venda. (p. 22) O jornalista Paulo Rocaro, que atua na imprensa da região Sul do Estado, escreveu em 10 de julho de 2006 um artigo em que expõe as complicadas relações entre a mídia impressa e os políticos. Intitulado “Políticos, uma ameaça para a imprensa?”, o autor contextualiza a situação política daqueles tempos de pré-campanha eleitoral para governador, e relaciona três nomes como supostos “inimigos” da imprensa in- teriorana: o atual governador André Puccinelli, o deputado federal Waldemir Moka e o deputado estadual Reinaldo Azambuja. O jornalista defende a imprensa local e atribui ao deputado federal Waldemir Moka (PMDB) um ataque aos proprietários de jornais interioranos. Num comentário a um pequeno empresário da comunicação, ele teria confessado que quando era primeiro secretário da Assembléia Legis- lativa, todos os meses assinava cheques no valor total de aproxima- damente R$ 300 mil, destinados aos órgãos de imprensa do Estado. “É um dinheiro jogado fora; poderia bem ser usado em benefício da população”, teria se posicionado Moka. Ainda de acordo com o jornalista: (...) o deputado Moka teria assegurado taxativamente que André Pucci- nelli, caso se eleja governador, vai “fechar todos esses jornalecos”. Em tom sarcástico, Moka teria afirmado ao dono do pequeno jornal que “a partir de 2007 vocês vão ter de arrumar outra atividade para sobreviver”. Nenhum “jornaleco” foi “fechado” pelo governador André Puccinelli. Mas, ao con- trário, muitos continuam a se desenvolver e - naturalmente - a receber anúncios publicitários de órgãos públicos. A única condição que pode ser capaz de mover a ira de um governador é a falta de ética e profissionalismo de muitos empresários do ramo jornalístico - algo que Alberto Dines chama de “picaretagem” (1): “Jamais se deve misturar o jornalismo com o faturamento, o que resulta naquilo que, em gíria (1) Ver Glossário 52 de jornal, convencionou-se chamar de ‘picaretagem’”. (p. 114) Além de desagradar a alguns políticos, a picaretagem cria um estigma entre as empresas jornalísticas que afugenta profissionais recém-formados. Relata o profes- sor Pedro Celso Campos: (...) é preciso conhecer de perto esse mercado ainda dominado por muito aventureirismo empresarial, o que leva alguns meios acadêmi- cos a se distanciarem dele ao confundirem tal atividade com pura e simples “picaretagem”, isto é, um jornalismo voltado apenas para o fa- turamento, sem distinção entre notícia e matéria paga, resultando em baixa credibilidade diante do público, principalmente por causa das influências políticas, partidárias, econômicas, religiosas etc. O professor Éser Cáceres explica as principais diferenças entre um jornal considera- do “picareta”, em relação a publicações de empresas jornalísticas tidas como “sérias”. O jornal é picareta do ponto de vista técnico. É produzido com uma estrutura muito aquém daquilo que a gente considera o mínimo. Ele é picareta no sentido comercial da palavra. Não tem um plano de negó- cios, não tem um projeto de divulgação publicitária. É um jornal que sobrevive na maior parte das vezes por permuta (...), troca de favores e manutenção da verba pública, a grande fonte pagadora disso. O jornalista Luís Carlos Luciano afirma que, em 2003, a maior fatia da receita do Diário MS (Dourados) provinha de contratos com o poder público e firmados nos vários municípios do Estado onde o jornal circula. 15% da receita são mantidos pela carteira de assinantes; 5% com a ven- da avulsa em bancas; 6% com serviços gráficos prestados a terceiros (...), mas a maior fatia, em torno de 40%, provém de serviços prestados a órgãos públicos, incluindo Governo do Estado, Assembléia Legislativa, Prefeituras e Câmaras. O Caderno de Classificados contribui com 1%. (p. 23) 53 QUANDO O BOLO FICA ABATUMADO Às vezes, a ligação entre políticos e donos de jornal pode configurar em infração eleitoral. Em 1º de setembro de 2008, o juiz eleitoral
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