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Formação Econômica Brasileira - UVB
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Aula 4 - O papel da escravidão 
na estrutura e dinâmica do 
antigo sistema colonial
Objetivos da Aula
Apresentar e discutir o papel da escravidão na estrutura e 
dinâmica do antigo sistema colonial.
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de compreender e 
interpretar os modelos de exploração colonial implantados 
durante a colonização do continente americano, além de 
identificar suas características diferenciais e seus objetivos 
mercantilistas. 
 
Até o momento, duas questões foram colocadas a você a partir dos textos 
oferecidos para leitura. Agora, vamos sintetizar as principais conclusões 
que podemos obter a partir de uma leitura de caráter reflexivo?
A frase de Celso Furtado, então citada, resume, com efeito, o ciclo 
econômico da cultura da cana-de-açúcar. Em primeiro lugar, tratava-
se de uma produção monocultora, isto é, uma economia que privilegia 
um só produto. Tudo nessa economia tinha como base a produção 
do açúcar; e todo o restante era acessório, quando não dispensável, 
mesmo que fosse essencial para a reprodução da vida das pessoas, 
como no caso das chamadas lavouras de subsistência – a mandioca 
-, por exemplo. Lembre-se do texto de Antonio Mendes Jr, em que 
ele relembra o fato de que a própria coroa portuguesa ter obrigado 
os senhores de engenho a produzirem esta raiz como base da 
alimentação da sua colônia.
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Depois, estava-se diante de um produto que exigia um empreendimento 
de vulto para a época: recursos materiais, financeiros e humanos. Em 
relação à terra, a solução encontrada foram as doações em troca do 
investimento. Daí, por exemplo, o sistema das sesmarias¹, doadas 
pelos próprios capitães hereditários. Os recursos de mão-de-obra 
foram solucionados com o surgimento da escravidão negra. Como já 
foi referido, Portugal dominava os mercados de tráfico de escravos. 
Houve tentativas anteriores de escravidão dos índios, sem muito êxito. 
Quanto aos investimentos financeiros, comerciantes portugueses 
financiavam ou entravam no próprio negócio com os chamados 
senhores de engenho. A coroa portuguesa, por sua vez, concedia 
incentivos como isenção de impostos, por determinado período, para 
que os colonos se interessassem pelo empreendimento açucareiro.
Em terceiro lugar, tratava-se de uma economia voltada para o mercado 
externo, e estava inserida no pacto colonial-mercantilista² europeu 
dos séculos XVI e XVII.
1
 “SESMARIAS. Grandes extensões de terras devolutas à Coroa portuguesa e que eram doadas pelo 
monarca, ficando os beneficiados na obrigação de cultivá-las dentro de um prazo de três anos, sob pena de 
revogação da doação. A instituição das sesmarias veio por uma lei promulgada em 1375 por D. Fernando 
I e serviu para beneficiar a burguesia não proprietária de terras. A instituição das sesmarias foi transferida 
ao Brasil, onde assumiu forma mais abrangente com o estabelecimento das Capitanias Hereditárias: as 
doações das sesmarias eram feitas aos colonos pelos donatários e pelos governadores-gerais. O sistema, 
extinto em 1822, deu origem à grande propriedade rural, beneficiando apenas uma minoria dos habitantes 
da colônia.”
2 
SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda, 1987, p. 398)
“MERCANTILISMO. Doutrina econômica que caracteriza o período histórico da Revolução Comercial 
(séculos XVI-XVIII), marcado pela desintegração do feudalismo e pela formação dos Estados Nacionais. 
Defende o acúmulo de divisas em metais preciosos pelo Estado por meio de um comércio exterior de caráter 
protecionista. Alguns princípios básicos do Mercantilismo são: 1) o Estado deve incrementar o bem-estar 
nacional, ainda que em detrimento de seus vizinhos e colônias; 2) a riqueza da economia nacional depende 
do aumento da população e do aumento do volume de metais preciosos no país; 3) o comércio exterior 
deve ser estimulado, pois é por meio de uma balança comercial favorável que se aumenta o estoque 
de metais preciosos; 4) o comércio e a indústria são mais importantes para a economia nacional que a 
agricultura. Essa concepção levava a um intenso protecionismo estatal e a uma ampla intervenção do 
Estado na economia. Uma forte autoridade central era tida como essencial para a expansão de mercados 
e a proteção dos interesses comerciais.
O Mercantilismo era constituído por um conjunto de concepções desenvolvidas, na prática, por ministros, 
administradores e comerciantes, com objetivos não só econômicos como também político-estratégicos. Sua 
aplicação variava conforme a situação do país, seus recursos e o modelo do governo vigente. Na Holanda, 
o poder do Estado era mais subordinado às necessidades do comércio, enquanto na Inglaterra e na França 
a iniciativa econômica estatal constituía o outro braço das intenções militares do Estado, geralmente, 
agressivas em relação a seus vizinhos. O Mercantilismo inglês foi reforçado pelo Ato de Navegação de 1651. 
Os mercantilistas, limitando sua análise ao âmbito da circulação de bens, aprofundaram o conhecimento 
de questões como as da balança comercial, das taxas de câmbio e dos movimentos de dinheiro. Entre os 
principais representantes da doutrina estão os ingleses Thomas Mun e Josiah Child, os franceses Barthélemy 
de Laffemas e Antoine de Monchretien (ambos seguidores de Colbert na época de Henrique IV) e o italiano 
Antonio Serra.”
SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda, 1987, p. 272)
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Portanto, faz sentido a frase de Furtado, sobre implantação de uma 
monocultura - a cana-de-açúcar -, a qual era baseada no trabalho 
escravo, e produzida em grandes extensões de terra – nos chamados 
latifúndio³ -. Pois, a base de sua economia era toda centralizada no 
engenho produtor do açúcar e da cachaça, e visava exclusivamente o 
mercado exportador, direcionado aos interesses da metrópole. Neste 
sentido, pode-se dizer que o verdadeiro significado do termo colônia 
de exploração deve ser entendido dentro da sua própria acepção, 
ou seja, tirar o máximo proveito da terra para satisfação do sistema 
colonial. Duas eram, pois, as classes sociais primordiais provenientes 
deste sistema: os senhores de engenho (originários da oligarquia 
agrária brasileira – os chamados homens bons), e os escravos negros. 
Evidentemente, outras frações sociais também conviviam no espectro 
deste sistema social.
Deve-se salientar que, a grande diferença das colônias de 
exploração em relação às colônias de povoamento oriundas do 
norte dos Estados Unidos, é que nestas prevaleceu sobretudo 
a pequena propriedade, ocupada por imigrantes europeus 
(notadamente ingleses, franceses ou holandeses), que fugiam 
de perseguições religiosas nos seus países de origem, e do 
empobrecimento crescente destas camadas sociais no século XVII. 
Houve ainda outras espécies de colônias de povoamento também 
nas Antilhas, principalmente antes da penetração posterior da 
economia canavieira nessas regiões.
A bem dizer, da economia canavieira, participavam, também, outras 
atividades, chamadas de complementares, embora em muito menor 
escala, tais como:
I As Culturas de Subsistência, especialmente a mandioca e 
seu processamento em farinha; 
³ LATIFÚNDIO. Tipo de grande propriedade rural caracterizada pela existência de vasta área inculta ou 
cultivada com tecnologia primitiva e baixo investimento de capital. Já existia na Roma Antiga, onde as 
terras confiscadas aos povos vencidos nas guerras eram entregues a aristocratas e a oficiais do exército que, 
não podendo explorá-las plenamente, mantinham-nas como sinal de nobreza.
SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia.São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda, 1987, p. 230)
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II A Pecuária: importante para o fornecimento de tração 
animal e carne para o consumo. Segundo Caio Prado Junior4 
, o panorama da pecuária nordestina, dos séculos XVI e XVII, 
caracterizado pelo predomínio da economia canavieira, era 
desolador, pois a densidade animal não passava de duas 
cabeças por quilômetro quadrado;
III O Tabaco: não era cultura de subsistência, mas sim produto 
de exportação, e em menor escala do que o açúcar. Era 
utilizado, como a aguardente, e moeda de troca no tráfico de 
escravos; 
IV E, finalmente, o Algodão, que tem grande relevância para 
exportação na segunda metade do século XVIII, impulsionada 
pela Revolução Industrial que, naquele momento, se operava 
fortemente na Inglaterra. 
Como você bem pode ter percebido, a colonização européia das 
terras americanas não foi um fenômeno linear, isto quer dizer, que, em 
outras palavras, o processo de colonização realizado pelas metrópoles 
européias não foi um processo inteiramente homogêneo, mas sim 
muito mais complexo, multifacetado, dotado de inúmeras variáveis 
econômicas e culturais. É possível, de acordo com os autores citados, 
dizer que houve basicamente dois tipos de colônias:
I colônia de exploração;
II colônia de povoamento.
Em primeiro lugar, é necessário dizer que, no caso da empresa 
açucareira brasileira, a metrópole portuguesa encontrou em seu 
produto a forma adequada de ocupar as terras descobertas, mesmo 
NOTA 04:” PRADO JR, CAIO. Historiador da economia brasileira, pioneiro na aplicação do marxismo 
à análise da realidade nacional. Escreveu também obras teóricas sobre Economia Política e Filosofia. 
Participou da fundação do Partido Democrático de São Paulo (1926) e da criação da Aliança Liberal 
(1929). Foi presidente da seção paulista da Aliança Nacional Liberal, e deputado estadual em São 
Paulo na legenda do Partido Comunista (1947). Durante vários anos editou a Revista Brasiliense, 
voltada para os estudos de economia, sociologia, filosofia e política. Publicou: Evolução Política do 
Brasil (1933), Formação do Brasil Contemporâneo (1942), História Econômica do Brasil (1943), Dialética 
do Conhecimento (1952), Notas Introdutórias à Lógica Dialética (1959), A Revolução Brasileira (1966), 
Estruturalismo e Marxismo (1971) e História e Desenvolvimento (1972), além dos opúsculos O que é 
Filosofia (1981) e O que é Liberdade (1983)”.
SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda, 1987, p. 342).
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que o principal objetivo fosse meramente a procura dos famosos 
metais preciosos. E, em segundo lugar, como vamos perceber em 
estudos subseqüentes, esta atividade produtiva foi uma empresa 
altamente lucrativa. Povoar as terras americanas, tanto para Portugal 
como para a Espanha, era, praticamente, impossível, dada a escassez 
de mão-de-obra nesses países no século XVI.
Já no século XVII, a situação econômico-política européia começa 
a se transformar significativamente, com o surgimento de outras 
potências competitivas: França, Inglaterra e Holanda. Em todos os 
casos, a idéia essencial sempre foi a mesma: a busca do Eldorado, 
isto é, do lugar imaginário e abundante da riqueza tão sonhada 
naquela época: o ouro. Por isso, certas potências como a França e 
a Inglaterra resolvem ocupar militarmente algumas ilhas do Caribe. 
A ocupação militar por parte desses países tinha como objetivo 
estratégico o seu fortalecimento militar nas Antilhas, para que, 
posteriormente, eles pudessem invadir terras próximas pertencentes 
a outras potências, muito abundantes em metais preciosos. Bem, e, 
quais eram as condições sociais, encontradas nestes países naquele 
momento histórico? Especialmente, na Inglaterra, as transformações 
do setor agrícola desde o século anterior, havia levado à expulsão 
de enorme contingente de servos da gleba5, que agora, estavam 
disponíveis para a emigração em massa para as colônias fundadas 
militarmente, nas Antilhas. Há, ainda, um outro fator importante a ser 
considerado, o das perseguições religiosas no continente europeu, as 
quais impulsionaram a expulsão de grandes massas de protestantes, 
especialmente, para as colônias do Norte (a chamada Nova Inglaterra, 
berço dos Estados Unidos).
Vejamos, agora, uma distinção entre colônia de povoamento, e colônia 
de exploração, proposta por Celso Furtado (op.cit., p. 32):
5
 SERVIDÃO DA GLEBA. “Vinculação perpétua e hereditária dos camponeses à terra senhorial, uma 
modalidade de relação de produção que predominou nos primeiros séculos do feudalismo europeu. Os 
camponeses tinham a obrigação de não abandonar as terras e o direito de não serem delas despejados. 
Podiam cultivar uma pequena porção de terra em seu proveito e em troca viam-se obrigados a trabalhar 
gratuitamente a terra do senhor feudal.”
SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda, 1987, p. 397)
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“A colonização de povoamento que se inicia na América no século XVIII 
constitui, portanto, seja uma operação com objetivos políticos, seja uma 
forma de exploração de mão-de-obra européia que um conjunto de 
circunstâncias tornara relativamente barata nas ilhas britânicas.”
Observe que, segundo o que o autor menciona, o transporte do 
contingente humano com destino às colônias americanas era feito 
por companhias estimuladas pelo próprio governo, as quais obtinham 
privilégios sobre as colônias que viessem a fundar. Muitas vezes, a 
população das colônias era submetida a condições extremamente 
deprimentes, e em muitos casos, excediam até mesmo o péssimo 
tratamento desumano dado aos escravos negros. Conforme, o próprio 
Furtado salienta em sua obra:
“A pessoa interessada assinava um contrato na Inglaterra, pelo qual se 
comprometia a trabalhar para outra por um prazo de cinco a sete anos, 
recebendo em compensação o pagamento da passagem, manutenção 
e, ao final do contrato, um pedaço de terra ou uma indenização em 
dinheiro. Tudo indica que essa gente recebia um tratamento igual ou pior 
ao dado aos escravos africanos”. (FURTADO, op.cit., 33)
Em suma, pode-se compreender que o objetivo político era o 
povoamento da colônia, realizado da seguinte maneira: distribuía-se 
pedaços de terra que deveriam ser cultivados, e pagos com o próprio 
trabalho.
A organização dessas colônias de povoamento – tanto as do Caribe 
como as da América do Norte – tinha como característica essencial: a 
estrutura da pequena propriedade. Nestas circunstâncias, colocava-
se a questão de qual produto se tirar da terra. Como se tratava de 
pequena propriedade, não se poderia pensar jamais na monocultura 
de exportação, uma vez que esta exigia um outro tipo de relação de 
produção. Mas, especialmente, no caso das colônias da América do 
Norte, dado o clima semelhante ao europeu, não se poderia cogitar 
jamais na produção de mercadorias já propiciadas pelo próprio 
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solo metropolitano. Estas economias, portanto, ao contrário das 
colônias de exportação (açucareira, no caso brasileiro), voltaram-se 
exclusivamente para o mercado interno. 
Mais tarde, quando a produção do açúcar penetrou nas Antilhas, levada 
pelos holandeses após sua expulsão do Brasil pelos portugueses, houve 
o desenvolvimento de um intercâmbio comercial com as colônias do 
Norte, as quais iniciaram a exportação de seus excedentes. Mas esta é 
uma história que veremos mais adiante.
O resumo das duas questões que fiz acima serve como subsídio para 
quevocê rememore, e até compare-as com as manifestações que 
você me enviou na semana passada a respeito das considerações que 
fiz das suas leituras.
Nesta aula, temos mais dois textos para serem lidos. Peço-lhe uma 
leitura atenta, e que procure entender que estamos caminhando no 
estudo de um processo histórico que vai se desenrolando a olhos 
vistos. São grandes as linhas que servem para traçar o processo da 
formação econômica de nosso país. Como nossa economia nasceu 
atrelada ao mercado internacional, é necessário sempre se reportar 
ao cenário mais amplo do jogo encenado entre as potências coloniais 
da época.
Referência Bibliográfica
REGO, José Márcio & MARQUES, Rosa Maria. Formação Econômica do 
Brasil. Escravismo e Tráfico Negreiro. São Paulo: Saraiva, 2003. pp. 65-
68.
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Capítulo IX, Fluxo de 
Renda e Crescimento. Brasil/Portugal: Editora Fundo de Cultura, 1959. 
(bibliografia básica).

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