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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ EVELYN SAUNITE DE SOUZA REFLEXÕES A RESPEITO DO TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) E SUAS IMPLICAÇÕES NO CONTEXTO ESCOLAR MARINGÁ 2012 4 EVELYN SAUNITE DE SOUZA REFLEXÕES A RESPEITO DO TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) E SUAS IMPLICAÇÕES NO CONTEXTO ESCOLAR Trabalho de Conclusão de Curso – TCC, apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Maringá, como requisito parcial para obtenção do grau de pedagogo. Orientação: Profa. Dra. Maria de Jesus Cano Miranda Coordenação: Profa. Dra. Renata Marcelle Lara Pimentel MARINGÁ 2012 5 REFLEXÕES A RESPEITO DO TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) E SUAS IMPLICAÇÕES NO CONTEXTO ESCOLAR Monografia apresentada à disciplina Trabalho de Conclusão de Curso como requisito parcial para a obtenção do título de Pedagogo pela Universidade Estadual de Maringá, sob orientação do Profa. Dra. Maria de Jesus Cano Miranda. Trabalho defendido e aprovado em: 14/11/2012 Banca Examinadora __________________________________________________ Profa. Dra. Maria de Jesus Cano Miranda– Orientadora Universidade Estadual de Maringá __________________________________________________ Profa. Dra. Ercilia Maria Angeli Teixeira de Paula Universidade Estadual de Maringá __________________________________________________ Profa. Dra. Érica Piovam de Ulhôa Cintra Universidade Estadual de Maringá 6 Dedico aos meus pais, Marli e Nilson, os quais não mediram esforços para me ajudar a chegar até aqui e todos que estiveram ao meu lado nesta etapa da minha vida. 7 AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus pela fé, força e esperança que tem me dado a cada dia da minha vida e pela oportunidade de concluir este sonho, pois sem Ele nada seria possível; Aos meus pais, Marli e Nilson, que estiveram me apoiando em todas as etapas da minha vida, me ensinando a ser cada dia melhor, fazendo o que estava ao alcance e o que não estava também para que esse sonho se realizasse. Amo vocês! Obrigado por me proporcionar tudo isso e fazerem com eu me tornasse a pessoa que sou hoje; A minha querida orientadora, Professora Dra. Maria de Jesus Cano Miranda, primeiramente por ter aceitado me orientar, pela atenção, paciência, exigência, sabedoria, pela exemplar orientação e por caminhar junto comigo durante todo o processo de elaboração deste trabalho; Ao meu amado e companheiro de todos os dias Flávio, pelo seu carinho, apoio e compreensão nos momentos em que foi preciso priorizar meus estudos, pelas noites em que ficou ao meu lado me fazendo companhia enquanto eu realizava este trabalho e pelo mais importante em acreditar e me motivar nos momentos em que eu mais precisava. Te amo! Saiba que você também possui uma parcela importante nesta conquista; As minhas amigas do curso, em especial as minhas companheiras de todas as manhãs, Ana Elisa, Daiane e Karen, por alegrarem meus dias e caminharmos juntas, com quem passei parte de minha vida dividindo experiências, tristezas e alegrias, sentirei saudades; Obrigada! 8 “O maior valor não é aquilo que sei, tampouco o que faço, nem o que tenho. Nem mesmo o que sou. É o que sou capaz de compartilhar. Cada relação nos faz ser algo, que nunca teríamos sido sem ela.” (Eva Bach e Pere Darder) 9 REFLEXÕES A RESPEITO DO TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) E SUAS IMPLICAÇÕES NO CONTEXTO ESCOLAR Evelyn Saunite de Souza1 Profa. Dra. Maria de Jesus Cano Miranda2 RESUMO Este é um estudo na área da educação sobre o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), que tem por objetivos refletir sobre este transtorno na abordagem organicista e interacionista; caracterizar e discutir as causas, os sintomas, as características na criança em fase escolar; compreender como as ferramentas da interação e mediação podem auxiliar as práticas docentes com crianças que apresentam TDAH. Trata-se de uma pesquisa de cunho bibliográfico, a qual fundamenta-se na concepção histórico-cultural defendida por Vigotski e seus colaboradores que entendem o desenvolvimento humano em uma dimensão sócio histórica. Como resultados apresentam-se as idéias de alguns autores com visão organicista do problema como Benczik (2000) e Belli (2008), entre outros e em autores com visão interacionista como Tuleski (2007; 2008); Meira (2009); Leite (2010) e outros, os quais valorizam a prática pedagógica intencional, organizada e desafiadora. Incentivam o pensar educacional e a prática docente, por meio da mediação dos professores qualificados, que consigam garantir o desenvolvimento escolar do indivíduo. Conclui-se que o papel dos profissionais da educação é fundamental para o bom andamento da vida escolar desse aluno, pois, estes indivíduos necessitam da devida atenção educacional e pedagógica para que haja a superação do problema. Palavras-Chave: TDAH, abordagem organicista, abordagem histórico-cultural. 1 Acadêmica do Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Maringá 2 Profª Drª do DTP/UEM e Orientadora do Trabalho de Conclusão de Curso 10 THOUGHTS ABOUT THE ATTENTION DEFICIT DISORDER HYPERACTIVITYDISORDER (ADHD) AND ITS IMPLICATIONS IN THE SCHOOL CONTEXT ABSTRACT The following project is a research in the area of education about the disorder and Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD), which aims to reflect about this disorder in both organicist and interacionist approaches;characterize and discuss its causes, its symptoms, its characteristics in children at school age; understand how the tools of interaction and mediation can assist the teaching practices with children who have ADHD.This is a survey with a bibliographic finality, which is based on a cultural-historical conception advocated by Vygotsky and his collaborators who understand human development in a socio-historical dimension.As results presents the ideas of some authors with an organicist view of the problem like Benczik (2000) and Belli (2008), among others, and authors with an interacionist visionlike Tuleski (2007, 2008);Meira (2009) Milk (2010) and others who value the intentional pedagogical practice, organized and challenging.Encourage educational thinking and practice teaching, through the mediation of qualified teachers, who can ensure the individual school development. In conclusion, the role of education professionals is essential to the development of the school life of students, because these individuals need specialeducational and pedagogical attention to overcome the problem. Key words: ADHD, organicist approach, historical-cultural approach. 11 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................. 12 2. BASES TEÓRICAS DO ESTUDO ................................................................ 17 2.1. Contexto Histórico ...................................................................................... 18 2.2. Aprendizagem, desenvolvimento e linguagem ......................................... 20 2.3. Mediação, interação e internalização na perspectiva vigotskiana ............ 25 3. A COMPREENSÃO NATURALIZANTE SOBRE O TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) .................................... 29 3.1. Breve Histórico sobre TDAH ..................................................................... 29 3.2. Conceito de TDAH .................................................................................... 31 3.3. As causas do TDAH ................................................................................. 35 3.4. O diagnóstico ............................................................................................ 36 3.5. A escola e a atuação do professor ........................................................... 37 3.6. O tratamento ............................................................................................. 39 4. TDAH E SUAS IMPLICAÇÕES NA ESCOLA ............................................... 42 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................... 51 REFERÊNCIAS ................................................................................................. 54 12 1. INTRODUÇÃO Este Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado ao curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Maringá (UEM) atende às exigências parciais para a conclusão do mesmo. Trata-se de uma pesquisa na área da educação sobre o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), cuja situação causa inquietações no âmbito familiar, escolar, e social do indivíduo que possui o problema. O interesse para desenvolver este tema surgiu a partir de observações em sala de aula na disciplina de Estágio Curricular Supervisionado de Ensino Fundamental I, do curso de graduação em Pedagogia. Durante as observações chamou a atenção os comportamentos das crianças, como: agitados, impulsivos, hiperativos, estas características me motivaram a pesquisar, investigar e estudar mais aprofundadamente, a respeito deste tema que se constitui uma situação problema para os profissionais que atuam diretamente com a criança em sala de aula. Porém, o que mais se destaca no momento da pesquisa é o número de medicamentos destinados às crianças “diagnosticadas” com TDAH, apenas em uma turma de observação constavam seis crianças diagnosticadas com este transtorno um número grande levando em consideração a sala com 25 alunos, do segundo ano do Ensino Fundamental. Desta forma, esta pesquisa tem como objetivo principal refletir sobre o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) na abordagem organicista e interacionista; caracterizar e discutir o transtorno, suas causas, seus sintomas, suas características na criança em fase escolar; compreender como as ferramentas da interação e mediação podem auxiliar as práticas docentes com as crianças que apresentam TDAH e, por fim, refletir a respeito dos possíveis encaminhamentos metodológicos no atendimento de uma criança que apresenta TDAH em sala de aula à luz desta concepção que fundamenta a pesquisa. De acordo com autores organicistas e de visão naturalizantes o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade “é um problema de saúde mental que tem três 13 características básicas: a desatenção, a agitação (ou hiperatividade) e a impulsividade” (Rohde; Benczik, 1999, p. 37). Belli (2008, p. 100) afirma que o TDAH pode trazer prejuízos na vida social, no relacionamento familiar, na aquisição de uma vida independente e no desempenho escolar. Mesmo nessa concepção o profissional da educação torna-se peça fundamental na vida da criança, pois o conhecimento do professor sobre o TDAH é importante para o exercício de sua profissão, por que muitas das vezes, o professor se depara com alunos na sala de aula com TDAH, acaba rotulando-o, concluindo que seja falta de limites, mas talvez, seja um transtorno em que a criança necessite de um atendimento diferenciado, para que ela possa obter um bom desempenho escolar. [...] o conhecimento sobre TDAH, é o passo inicial para ajudar a criança em seu processo educacional. Quanto mais informado o professor estiver a respeito do TDAH, suas implicações e formas de manejo, maior a chance de a criança conseguir um bom desempenho. (BENCZIK, 2000, p. 49) No período do Estágio Curricular Supervisionado de Ensino Fundamental I, foi observado que existem crianças já diagnosticadas com TDAH e que estão sendo medicadas. Durante as observações em distintas salas de aula, foi possível perceber que estes alunos não acompanham os demais colegas em todas as atividades propostas, estão sempre conversando, levantando do seu devido lugar. No que diz respeito à atuação do professor foi possível observar dificuldades de mediação desse profissional com estas crianças, não se percebeu também responsabilidade e compromisso com a aprendizagem da criança. Partindo desta experiência esta pesquisa volta-se para a necessidade de investigar as possibilidades de se trabalhar com a criança TDAH em sala de aula, estudar sobre este transtorno e refletir sobre a atuação desse profissional da educação. O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é um tema curioso e merece a atenção por parte dos profissionais da educação, pois Neto (2004, p.5) 14 informa que “pesquisas têm demonstrado que no Brasil de 3% a 6% da população com idade entre 7 e 14 anos apresentam TDAH”. O estudo sobre o tema é importante, pois, segundo Neto (2004, p. 5) “a capacidade de direcionar e manter a atenção focalizada, [...] de concentrar-se, é fundamental para o direcionamento de nossas ações conscientes [...] em que se busca compreender e aprender com o que está aonosso redor”. Neste sentido Mattos (2005) relata que como ocorre muitas vezes, o professor pode se deparar com alunos que parecem ser “movidos por um motor” tendo uma energia maior que as crianças da mesma idade, na qual essas crianças acabam sendo rotuladas como, sem limites, mal-educados, preguiçosos, os que vivem no “mundo da lua”, loucos, problemáticos e outros. Sabe-se que as crianças geralmente são bem ativas, mas, é a falta de conhecimento dos professores sobre o TDAH que desencadeia as rotulações. Durante o curso de pedagogia não há uma disciplina específica que acrescente estes conhecimentos ao futuro educador, assim este tema é um assunto importante para o profissional da educação. Dessa forma, este estudo pretende contribuir para a reflexão do papel dos profissionais da educação que atuam em sala de aula com a criança TDAH, proporcionando ao sujeito uma melhor oportunidade de convivência com outras pessoas e de aproveitamento escolar. Outro aspecto no qual esta pesquisa justifica-se é o pessoal, de estimado valor, acrescentando-me conhecimentos válidos como futura educadora para serem aplicados em sala de aula. Vale ressaltar que as concepções expostas acima se tornam naturalizantes de forma que, seja um meio de se camuflar o fracasso escolar, jogar as responsabilidades desse sobre o indivíduo, rotulá-los de acordo com as características presentes no decorrer deste trabalho, de forma que a medicalização do indivíduo diagnosticado com o referido transtorno apenas seja o método mais eficaz para sanar estes problemas. Diante deste panorama, emerge à seguinte inquietação, em que medida a formação adequada dos professores para atender essas crianças facilitaria o trabalho pedagógico em sala de aula? E conseqüentemente promoveria a aprendizagem dessas crianças? 15 Os profissionais da educação possuem um papel importante na vida da criança com TDAH, pois se tornam peças fundamentais no tratamento e nos cuidados deste transtorno, o qual se exige um processo tanto do pensar educacional como da prática pedagógica. Entende-se que pela educação, a criança que apresenta TDAH pode ter a oportunidade de desenvolver-se na medida em que diferentes situações pedagógicas acabariam por oportunizar uma melhora na qualidade do ensino para todos, por meio de um plano educativo que atendesse a demanda escolar necessária. Portanto, o apoio individualizado e o afeto dos professores, pais e psicopedagogos a essas crianças podem amenizar o sofrimento delas ante o processo de aprendizagem e os relacionamentos interpessoais que se estabelecem no ambiente escolar. (BELLI, 2008, p.65) Com base no que foi descrito, o estudo possui uma metodologia de cunho bibliográfico, realizado por meio de leituras e fichamentos de autores. Esta metodologia de pesquisa “busca informações e dados disponíveis em publicações – livros, teses e artigos de origem nacional ou internacional [...] realizado por outros pesquisadores” (RODRIGUES, 2007, p. 15). O trabalho também apresenta o enfoque qualitativo, que André (1983, p.66) ressalta que esta abordagem qualitativa recebeu uma atenção na literatura educacional, ganhando assim um número significativo de interesses por parte de educadores, pois “as vantagens do uso de pesquisas qualitativas na pesquisa educacional são muitas”. O presente estudo está estruturado em cinco seções. A primeira seção denominada como introdução, discute-se a temática de uma maneira geral, bem como apresenta os objetivos de pesquisa, a justificativa, a metodologia e questionamentos, assim a segunda seção trata de uma breve apresentação da Psicologia Histórico-Cultural com intuito de resgatar o contexto histórico da respectiva teoria, a fim de compreender os processos de desenvolvimento da criança como, a aprendizagem, o desenvolvimento e a linguagem, de acordo com os autores contribuintes à teoria abordada, para assim subsidiar o atendimento e o estudo da criança que apresenta o TDAH. 16 A terceira expõe as visões organicistas, naturalizantes, de autores que retrataram o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), a fim de apresentar as concepções naturalizantes entendidas e rotuladas da mesma. A quarta seção trata de uma retomada a temática da seção anterior o TDAH, a fim de desmistificar, à luz da concepção da Psicologia Histórico-Cultural, a visão naturalizante identificada no material de estudo. Por fim, as considerações finais da pesquisa. 17 2. BASES TEÓRICAS DO ESTUDO Nesta seção são abordados os principais tópicos da Psicologia Histórico- Cultural. No início, procura-se esclarecer esta concepção por meio de seu contexto histórico, destacam-se autores de grande contribuição da teoria abordada, como, Alexis N. Leontiev, que foi um dos importantes psicólogos soviéticos a trabalhar com Vigotski; o Alexander Romanovich Luria, seguidor das grandes linhas e hipóteses formuladas e desenvolvidas por Lev Semyonovich Vigotski3 e seus colaboradores, cujo foco principal de suas pesquisas se deu em compreender o desenvolvimento humano, sob a perspectiva histórico social. Vigotski em seus estudos sobre o desenvolvimento humano sempre considerou o homem inserido na sociedade, dessa forma, “sua abordagem sempre foi orientada para os processos de desenvolvimento do ser humano com ênfase na dimensão sócio-histórica e na interação do homem com o outro no espaço social” (RABELLO; PASSOS, s/d, p. 3). Segundo Rabello e Passos (s/d) o desenvolvimento humano está ligado a um caminho contínuo do ciclo vital e da evolução do indivíduo, cujo caminho não deve se limitar apenas nos processos de maturação biológicos ou genéticos, pois o meio no que se refere a sociedade, a cultura, principalmente as interações, tomam uma maior importância para o desenvolvimento humano, portanto, o homem só se constitui como ser a partir de suas relações com os outros. Neste sentido, Martins (1997) complementa, 3 O nome deste autor é escrito de diferentes formas dependendo do idioma em que sua obra foi publicada. Neste trabalho, será respeitada a grafia do idioma da obra em referência. 18 Ao nascer, as situações vividas vão permitindo, no universo da vida humana, interações sociais com parceiros mais experientes - adultos ou companheiros de mesma idade - que orientam o desenvolvimento do pensamento e o próprio comportamento da criança. Nesse processo de intermediação onde a linguagem, principal instrumento simbólico de representação da realidade, desempenha papel fundamental, postula-se a transformação das funções psicológicas elementares em superiores. (MARTINS, 1997, p. 114) Como se vê, o pensamento e a linguagem estão fortemente ligados as funções psicológicas superiores, a partir de tudoisso, o homem constitui-se em um ser biológico, histórico e social. 2.1 Contexto Histórico Foi no começo do século XX que se iniciaram estudos científicos da criança e do comportamento infantil e a partir disso surgiram várias pesquisas a respeito dos aspectos da vida psíquica da criança, com isso importantes sistemas teóricos foram desenvolvidos, dentre eles destaca-se a teoria Histórico-Cultural, que proporciona reflexões ricas sobre o desenvolvimento humano (FONTANA, 1997, p. 08). Ao se tratar de Lev Semyonovich Vygotski (1896-1934), a autora Leite (2010, p. 112) afirma que “sua finalidade era explicar a origem da atenção, da memória, da ação voluntária e do pensamento abstrato”. Porém esta teoria não foi elaborada apenas por ele, houve também a contribuição de Alexis Leontiev, e Alexander Romanovich Luria, segundo afirma Tuleski (2008, p. 29). De acordo com a mesma autora Vigotski procurou superar a “velha psicologia”, psicologia esta que transformava o aluno em esponja, na qual o sujeito absorvia conhecimentos alheios. Referente a isso Vigotski (2004, p. 64) afirma que, a psicologia deve exigir do aluno não apenas o aprender a perceber, mas que aprenda também a reagir. Tuleski (2008, p. 81) ainda descreve que Vigostki revê as principais teorias a respeito da velha psicologia e expõe seus pontos positivos e negativos, seus avanços e retrocessos, opõe-se aos estudiosos de sua época e ainda critica as 19 teorias existentes, com o objetivo de construir uma nova psicologia “capaz de eliminar a dicotomia entre corpo e mente e realizar a síntese”. Esta dicotomia foi um tema de tamanha discórdia e discussão naquele período entre os materialistas e idealistas, pois além de representar na sociedade burguesa a divisão entre classes sociais, expressaram também a divisão no processo do trabalho, entre o pensar e o fazer, o interesse individual e a realização social (TULESKI, 2008, p. 83). Vale ressaltar que, embora esses importantes autores da psicologia Histórico- Cultural não tenham desenvolvido um estudo sobre o tema aqui abordado, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, estes trataram do estudo do desenvolvimento da criança, no que se pode dizer que é de extrema importância para a temática abordada nesta pesquisa e também na área da educação. Isso ocorre, pois, “a educação é um processo que não se pode ser eliminado do desenvolvimento humano e uma das condições pelas quais o ser humano adquire seus atributos fundamentais ao longo do processo histórico social” (DUARTE, 2004, p. 55). Para iniciar a discussão não se pode deixar de mencionar parte do desenvolvimento humano, o importante processo de hominização, que se refere ao aparecimento do trabalho, cujo “aparecimento e o desenvolvimento é condição primeira e fundamental da existência do homem, acarretaram a transformação e a hominização do cérebro, dos órgãos de atividade externa e dos órgãos dos sentidos” (LEONTIEV, 2004, p. 76). Trata-se de um processo de ação do homem sobre a natureza, este trabalho ocorre quando o indivíduo antecipa mentalmente a finalidade para uma determinada ação, o que ocorreu exatamente com o homem na criação de seus instrumentos como meio de subsistência. Como ilustra o pensamento de Saviani (2003). Consequentemente, o trabalho não é qualquer tipo de atividade, mas uma ação adequada a finalidades. É, pois, uma ação intencional. Para sobreviver, o homem necessita extrair da natureza, ativa e intencionalmente, os meios de sua subsistência. Ao fazer isso ele inicia o processo de transformação da natureza, criando um mundo humano (o mundo da cultura)” (SAVIANI, 2003, p. 11). 20 Com base na citação acima de Saviani (2003) sobre o trabalho, vale descatar o pensamento de Leontiev (2004) na qual ele afirma que o trabalho não se limita apenas na atividade do homem sobre a natureza, abrange também condições de atividade comum coletiva, em que o homem se relaciona com outros homens. A partir disso, pode-se dizer que o trabalho possibilita o homem criar relações com a natureza e tornar-se social, pois Leite (2010, p. 114) complementa ainda que “o homem só se torna um ser social, quando inserido em algum grupo a personalidade, o caráter e o comportamento do indivíduo estão ligados intimamente com a evolução social e com os aspectos do grupo”. Dessa forma, pode-se observar que: A utilização de instrumentos tornou possível o domínio do mundo material externo. Já a utilização de signos possibilitou ao homem o controle de seus próprios processos psicológicos. O homem realiza mudanças no meio externo e ele próprio se submete a essas mudanças, reconstruindo, dessa forma, sua atividade consciente. (LEITE, 2010, p. 116) As funções psicológicas superiores, como, a memória, a atenção, a abstração, a aquisição de instrumentos, a fala e o pensamento, são desenvolvidos por meio da aquisição de conhecimentos que é transmitida pelas interações sociais com indivíduos mais desenvolvidos, “o desenvolvimento das funções psicológicas superiores se dá na interação social e por intermédio do uso de signos” (TULESKI e EIDT, 2007, p. 532). A linguagem é considerada um dos signos mais importantes, pois Leontiev (2004, p. 93) admite que ela “não desempenha apenas o papel de meio de comunicação entre os homens, ela é também um meio, uma forma da consciência e do pensamento humano”. E por meio deste pensamento pode-se pensar que a interação seja a grande responsável e importante ao desenvolvimento da criança, em que isso apenas ocorre por meio da linguagem, peça esta fundamental e indispensável para a educação, para a vida social da criança e principalmente a criança que apresenta TDAH. 21 2.2 Aprendizagem, desenvolvimento e linguagem Para Vigotski (2006, p.103) a aprendizagem é um processo exterior paralelo ao processo de desenvolvimento da criança, esta não parte do zero, antes da criança ser inserida na escola ocorre todo um processo pré-histórico, ou seja, “a aprendizagem escolar nunca começa no vácuo, mas é precedida sempre de uma etapa perfeitamente definida de desenvolvimento, alcançado pela criança antes de entrar para a escola” (VIGOTSKI, 2006, p.110). Em continuidade ao pensamento do autor, a aprendizagem e o desenvolvimento estão interligados desde o primeiro dia de vida da criança, os meios exteriores como, as vivências do indivíduo, as experiências, suas relações sociais e o meio em que ele está inserido, refletem em todo este processo acima citado. Duarte (2004) complementa: [...] a aprendizagem resulta das ações dos alunos a partir e sobre a realidade por ele vivida, pelas quais constroem o conhecimento. Este, por sua vez, é produto das elaborações cognitivas resultantes das percepções e representações dos alunos, construídas na base de suas próprias experiências e de seu cotidiano. (DUARTE, 2004, p. 64) Por isso, o professor deve levar em consideração o processo anterior à escola da criança, para que seja possível compreender suas atitudes, características, comportamentos, visto que todas estas questões citadas são reflexos dos fatoresexternos. A aprendizagem de forma organizada leva o indivíduo ao desenvolvimento, e, caso este processo não seja natural, mas sim histórico, este acarreta uma série de processos do homem que sem a aprendizagem, de modo algum poderiam surgir (VIGOTSKI, 2004, p. 484), dessa forma pode-se perceber a importância da educação, segundo o pensamento de Tuleski e Eidt (2007): [...] ao professor cabe a função de mediação entre o conhecimento já existente e os alunos, sendo que os conteúdos trabalhados por ele no processo educativo criam, individualmente, nos aprendizes, novas estruturas mentais, decorrentes dos avanços qualitativos no desenvolvimento de cada criança. (TULESKI; EIDT, 2007, p. 532) 22 Para abordar esta concepção de desenvolver diferentes capacidades de concentração da atenção, assunto indispensável para a temática, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, vale acrescentar definições de Vigotski sobre o ensinar: A tarefa de ensinar não é tarefa de desenvolver uma capacidade de reflexão. É tarefa de desenvolver muitas capacidades especiais de pensar sobre uma variedade de objetos. Ela consiste em desenvolver diferentes capacidades de concentração da atenção em uma variedade de objetivos e não de modificar a nossa faculdade geral da atenção. (VIGOTSKI, 2004, p. 474) A princípio, a criança no início da escolarização mantém-se dentro da capacidade de atenção involuntária, na qual está vinculada aos seus interesses, aos ensinamentos mais demonstrativos e aos fatores emocionais, sendo seu período de atenção pequeno, pois ao estar prestando atenção em uma determinada atividade não presta atenção nas demais, como a professora falando. A criança nesta fase suporta apenas de dois a três objetos de estudo, já o adulto de quatro a seis objetos (LEITE, 2010, p. 155). Outra capacidade existente na criança em idade escolar é a atenção voluntária, manifestada durante uma atividade intelectual do aluno em que ele determina o objetivo de alcançar algo conscientemente, ou seja, a característica desta ação é “o fato do sujeito estabelecer determinadas tarefas com determinados fins que deve cumprir” (LEITE, 2010, p. 153). Contudo, esta ação não ocorre rapidamente, portanto, se o indivíduo não dirige a atenção ao objeto de estudo que é considerado por ele como mais atrativo que os demais que ele vê, daí surge a necessidade dele se concentrar, com muita força de vontade ignorar os outros estímulos presentes no ambiente em que ele está inserido. Com isso, Leite (2010) complementa que esta não é uma ação imediata, que a partir do momento em que a criança é inserida no meio escolar seja desenvolvido imediatamente, uma dessas razões está em não esperar e compreender que não será possível a criança manter-se atenta nas atividades escolares. 23 Destacam-se a importância da organização familiar e os recursos para regular a atenção da criança nesta esfera. As figuras cuidadoras da criança são de extrema importância, enquanto elementos mediadores, no desenvolvimento da atenção desta. É no convívio social com estas pessoas que a criança terá as primeiras experiências de direcionamento da sua atenção, logo, esta será sua base para o desenvolvimento da atenção voluntária, que será completado mais tarde com a inserção da criança na escola. (LEITE, 2010, p. 155) Este desenvolvimento como já mencionado não é natural, faz parte de todo um processo histórico e social da aprendizagem do indivíduo. Leite (2010, p. 159) destaca que a atenção voluntária é regulada pela linguagem, pois é por meio de comandos e diálogos que a criança passa a ter um ato pré-determinado e com isso ela se submete a esse fim. Ainda seguindo o pensamento da autora, a atenção voluntária se desenvolve a partir do momento em que a criança domina a linguagem e é capaz de dar nomes aos objetos e indicá-los sem o auxílio de nenhum adulto. Leontiev (2004) ainda menciona que a linguagem é produto do trabalho, da coletividade e da atividade humana. A partir disso então, compreende-se que a linguagem é uma ferramenta importantíssima para a interação e a mediação, na qual essa prática docente pode ser de extrema importância para o desenvolvimento da criança com TDAH resultando positivamente ao trabalho empreendido. Ainda mais, Leite (2010) salienta que a compreensão sobre o desenvolvimento da atenção voluntária, à luz da Psicologia Histórico-Cultural, possibilita um válido entendimento a respeito do fenômeno da desatenção, que tem em vista considerar a cultura para a constituição das funções psicológicas superiores. É exatamente isso que fortalece o pensamento naturalizante da medicalização e de rótulos em que se aumenta cada vez mais no cenário educacional, pois a criança passa pelo seu processo de desenvolvimento com o acompanhamento de seus fatores biológicos e externos. Por fim, a aprendizagem da criança conduz à apropriação dos conhecimentos científicos, pois esta ativa uma série de processos de desenvolvimento. Esta ativação não poderia ocorrer sem a aprendizagem, por isso Vigotski (2006, p. 115) fala que “a aprendizagem é um momento intrinsecamente necessário e universal”, 24 para que seja apropriada pela criança esta série de processos de desenvolvimento, lembrando que estes referidos processos não são naturais e sim construídos historicamente. Como já mencionado anteriormente, a linguagem é considerada um dos signos mais importantes, pois Leontiev (2004, p.93) admite que ela “não desempenha apenas o papel de meio de comunicação entre os homens, ela é também um meio, uma forma da consciência e do pensamento humano”. O pensamento a seguir ilustra essa ideia, A linguagem é, antes de tudo, social. Portanto, sua função inicial é a comunicação, expressão e compreensão. Essa função comunicativa está estreitamente combinada com o pensamento. A comunicação é uma espécie de função básica porque permite a interação social e, ao mesmo tempo, organiza o pensamento. (RABELLO; PASSOS, s/d, p. 8) Inicialmente a linguagem tem como função discriminar a atenção para determinado objeto e memorizá-lo, e é o que a acontece nos primeiros anos de vida da criança. Ainda no início da infância a criança conta apenas com a atenção involuntária, descrita logo acima, e é por meio das relações sociais, vivências na educação, fatores culturais, que ela vai evoluindo para o processo psicológico superior, que são funções psicológicas superiores (ASSUMPÇÃO, et al, 2011). O processo de formação do indivíduo é construído a partir das condições de vida que lhe são proporcionada, os conteúdos culturais aos quais com seu devido convívio ele acaba se apropriando, todos estes fatores são anteriores ao desenvolvimento dos processos psicológicos superiores, como, a linguagem, a atenção e memória voluntárias, a imaginação, o pensamento e outras capacidades, ou seja, a partir da construção social que a criança desenvolve as funções psicológicas superiores. Dessa forma, “o ser humano é resultado da atividade social que estabelece com os objetos, em condições materiais e não materiais, e de educação” (ASSUMPÇÃO, et al, 2011,p. 5). As palavras a seguir ampliam este conceito. O comportamento do homem moderno, cultural não é só produto da evolução biológica, ou resultado do desenvolvimento infantil, mas 25 também produto de desenvolvimento histórico. No processo do desenvolvimento histórico da humanidade, ocorreram mudança e desenvolvimento não só nas relações externas entre as pessoas e no relacionamento do homem com a natureza; o próprio homem, sua natureza mesma, mudou e se desenvolveu (VYGOTSKY; LURIA, 1996, p. 95). De modo geral, tudo é produto histórico, fruto de um processo no qual as mudanças históricas na sociedade e na vida material que modificam a natureza humana em sua consciência e comportamento, pois o comportamento do homem deve ser entendido pelo desenvolvimento biológico e histórico (LEITE, 2010, p. 112). A partir dessa premissa, então, se pode dizer que não é apenas o biológico que se deve considerar na criança, também é importante ressaltar o processo histórico pelo qual o indivíduo tenha percorrido, ou seja, considera-se um fator um tanto quanto importante para o desenvolvimento da criança seus meios externos, como, o ambiente em que ela está inserida. 2.3 Mediação, interação e internalização na perspectiva vigotskiana O modelo de aprendizado descrito por Vigotski representou um salto para a pedagogia, pois Tuleski (2008, p. 172) afirma que a educação proposta por esse autor, “tinha como objetivo eliminar a necessidade de coerção externa, formando indivíduos capazes de postergar suas satisfações e controlar seus impulsos em prol de um projeto coletivo a ser alcançado, a longo prazo, pelo conjunto em sociedade”. O desenvolvimento das funções psicológicas superiores não se dá apenas por meio da inserção da criança na sociedade, mas por meio da aquisição de conhecimentos. Ou seja, não são apenas os meios externos, mas também a sociedade que garante o desenvolvimento, o que o indivíduo aprendeu ou está aprendendo possui tamanha importância. A partir disso, há um salto qualitativo interno, em que se elevam as funções a um patamar superior, de forma que o indivíduo deixa de ser controlado por elas e passa a controlá-las conscientemente. Dessa forma, entra a escola, que é a responsável por gerar os níveis superiores de desenvolvimento, com tarefas mais complexas para a criança oferecendo, recursos 26 culturais para a resolução da mesma (TULESKI, 2008). Assim complementam os autores: Uma criança pequena não consegue resolver problemas complexos da vida real por meio da adaptação natural direta: só começa a utilizar caminhos indiretos para resolver esses problemas depois que a escola e a experiência tiverem refinado o processo de adaptação, depois que a criança tiver adquirido técnicas culturais. Em ativo confronto com o meio ambiente, desenvolve a capacidade de utilizar coisas do mundo exterior, como ferramentas, ou como signos. De início, o uso funcional dessas coisas possui um caráter ingênuo, inadequado; subseqüentemente, a criança passa aos poucos a dominá-las e, finalmente, as supera ao desenvolver seus próprios processos neuropsicológicos como técnicas para alcançar determinados fins. (VYGOTSKY; LURIA, 1996, p. 219) Desta forma, há que se destacarem os principais pensamentos de Vigotski a respeito do desenvolvimento humano e da aprendizagem que são a interação, a mediação e a internalização. O ambiente escolar é o local em que se deve proporcionar a criança, ricas e profundas interações, pois dentro deste cenário é possível se construir relações válidas e importantes. As relações estabelecidas no ambiente escolar passam pelos aspectos emocionais, intelectuais e sociais e encontram na escola um local provocador destas interações nas vivências interpessoais. A escola caracteriza-se como um dos primeiros locais que deveriam garantir a reflexão sobre a realidade e a iniciação da sistematização do conhecimento socialmente construído (MARTINS, 1997, p. 120). A partir dessa ideia cabe atribuir ao papel do professor sua grande importância, pois tem responsabilidade de instruir e corrigir os alunos, de acordo com a seguinte ideia de Martins (1997): Cabe a ele promover a articulação dos conceitos espontâneos da criança com os científicos veiculados na escola, de tal forma que, de um lado, os conceitos espontâneos possam inserir-se em uma visão mais abrangente do real, própria do conceito científico, e, de outro lado, os conceitos científicos tornem-se mais concretos, apoiando-se nos conceitos espontâneos gerados na própria vivência da criança. Criam-se, assim, novas condições para que os alunos compreendam de forma mais ampla a realidade. O professor em sala de aula instrui, 27 explica, informa, questiona e corrige o aluno, fazendo-o explicitar seus conceitos espontâneos. A ajuda do adulto permite à criança resolver mais cedo os problemas complexos que não poderia enfrentar se fosse deixada à mercê da vida cotidiana (MARTINS, 1997, p. 120). Nesta perspectiva, para melhorar o nível de aprendizagem mais do que o indivíduo agir sobre o meio é necessário interagir sobre ele, todo sujeito só adquire seus conhecimentos por meio das relações interpessoais, de troca com o meio. A interação é realizada por meio da linguagem, um dos signos mais importantes já citado, por mais que a criança tenha um potencial a ser desenvolvido, se não houver a interação não será possível este se desenvolver como poderia. Por isso, este fator ganha tanta importância para o desenvolvimento e a educação, pois, com isso se vê que é necessário estimular e desenvolver cada vez mais as potencialidades do indivíduo. É fundamental destacarmos que importante no processo interativo não é a figura do professor ou do aluno, mas é o campo interativo criado. A interação está entre as pessoas e é neste espaço hipotético que acontecem as transformações e se estabelece o que consideramos fundamental neste processo: as ações partilhadas, onde a construção do conhecimento se dá de forma conjunta. O importante é perceber que tanto o papel do professor como o do aluno são olhados não como momentos de ações isoladas, mas como momentos convergentes entre si, e que todo o desencadear de discussões e de trocas colabora para que se alcancem os objetivos traçados nos planejamentos de cada série ou curso (MARTINS, 1997, p. 121). O professor é o grande mediador entre a criança e o mundo, ele é quem a ajuda a interagir com os outros e atingir o que lhe é de direito, ou seja, desenvolver todas as habilidades/capacidades humanas, pois é por meio das interações e relações sociais que a criança terá capacidade de construir suas habilidades parciais, cuja criança assim com o auxílio de mais habilitados, tais como, professor ou até mesmo pessoas mais experientes ela passa a não mais ter habilidades parciais, mas sim totais (RABELLO e PASSOS, s/d) um exemplo disso é a apropriação ou internalização do saber por parte da criança, como Martins (1997) demonstra. 28A apropriação da cultura pelo indivíduo não acontece de forma passiva: este, ao receber do meio social o significado convencional de um determinado conceito, interioriza-o e promove, nele, uma síntese pessoal. Esta, por sua vez, ocasiona transformações na própria forma de pensar. É, portanto, com outros sujeitos humanos que maneiras diversificadas de pensar são construídas, via apropriação/internalização do saber e do fazer da comunidade em que o sujeito se insere (MARTINS, 1997, p. 119). Em suma, a internalização é o momento em que realmente a aprendizagem se completa, não se limita apenas nisso, a criança aprende conhecimentos, papeis sociais e até mesmo valores. Porém, para que isso ocorra não basta apenas o indivíduo possuir todo o aparato biológico de sua espécie, é necessário que ele participe de ambientes que lhe proporcionem a aprendizagem. O meio escolar é este, pois a criança não se desenvolve com o tempo, muito menos passa pelo processo de desenvolvimento sozinha, esta “é reconhecida como ser pensante, capaz de vincular sua ação à representação de mundo que constitui sua cultura, sendo a escola um espaço e um tempo onde este processo é vivenciado” (RABELLO e PASSOS, s/d, p. 5). Dessa forma, o processo de ensino aprendizagem está ligado às interações entre os sujeitos, assim, o desenvolvimento da criança depende da aprendizagem por intermédio a estas experiências expostas, a interação, a mediação e a internalização. Assim a educação da criança que apresenta TDAH necessita voltar- se para tais aspectos. A próxima seção tratará dos pressupostos que deverão embasar especificamente este processo. 29 3. A COMPREENSÃO NATURALIZANTE DO TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) Nesta seção estão expostas algumas das principais ideias, concepções e discursos naturalizantes a respeito do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), com base em autores que abordam a referida temática. Para tal empreitada, esta seção está organizada em seis subitens, primeiramente há um breve histórico do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), pois antes desta nomeação este transtorno passou por denominações ao longo de sua história. No seguinte subitem são abordadas a visão e concepção dos autores selecionados sobre o que é o TDAH e suas características, em terceiro estão as possíveis causas para o determinado transtorno. Em seguida relata-se como o diagnóstico é realizado, em quinto subitem há uma discussão sobre a escola, sem deixar de mencionar o profissional da educação que é de suma importância dentro deste cenário. Por último apresenta-se algumas visões a de distintas de autores a respeito de possíveis tratamentos para o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. Portanto, trata-se de uma discussão sobre as explicações naturalizantes que sustentam o conceito de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e o posicionamento de autores que defendem uma abordagem mais crítica do problema, principalmente aqueles que estudam a concepção histórico cultural.. 3.1 Breve histórico sobre o TDAH O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade recebeu vários nomes ao longo dos anos, segundo Phelan (2005, p. 13), uma das primeiras nomeações foi Doença de Still e Distúrbio de Impulso, com a finalidade de descrever as crianças impulsivas e muito ativas. Logo depois foram utilizados os termos, Lesão Mínima do Cérebro, Disfunção Cerebral Mínima, Reação Hipercinética da Infância. De acordo com Phelan, (2005, p. 13), em 1980, surge pela primeira vez o nome Transtorno de Déficit de Atenção, no chamado DSM-III (sigla em inglês para o 30 Manual Diagnóstico e Estatístico dos Distúrbios Mentais, Terceira Edição) cuja definição já expõe o ponto central do problema, que é a dificuldade de concentração e de atenção, “segundo o DSM-III, havia dois tipos de TDA: o TDA com hiperatividade e o TDA sem hiperatividade, ambos envolviam a dificuldade de atenção”, mas as crianças que tinham TDA com hiperatividade eram extremamente impulsivas, ativas e agiam de forma inadequada. Segundo Phelan (2005, p. 14) complementa que o DSM-III observou que algumas crianças com TDA em sua vida adulta ainda continuavam com TDA, dessa forma foi utilizado o termo, “TDA, Tipo Residual”. Em 1987 houve uma revisão no DSM-III, assim surgiu uma nova edição a DSM-III-R, na qual o nome do Distúrbio passou para “Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade”, dessa forma, “reconhecia-se o fato de que tanto a desatenção quanto a inquietação estavam freqüentemente envolvidas no distúrbio”. Vale ressaltar que para a determinação do TDAH a criança deve passar por um diagnóstico, porém antes de passar por este procedimento ela deve ser observada em diferentes ambientes em distintas situações, pois seus comportamentos podem modificar-se conforme o ambiente que ela está inserida, os sintomas devem permanecer por um período um pouco prolongado, pois muitas vezes a criança age de determinada forma devido a alguns problemas que ela possa estar passando, pode ser em casa com os pais e irmãos ou até mesmo na escola com seus amigos. Anos mais tarde com a revisão do manual, então como o nome de DSM III-R, publicou-se que a grafia passaria a ser TDAH. Dentre os critérios diagnósticos estabelecidos nessa publicação do DSM III-R, consta que os sintomas deveriam: ocorrer em pelo menos dois ou três ambientes freqüentados pela criança (por exemplo, casa, escola e clínica); ocorrer antes dos seis anos de idade; ser objetivamente, e não por pais e professores; durar pelo menos seis meses e não se encaixar em outros transtornos. (LEITE, 2010, p. 28-29) A partir de então, foram surgindo cada vez mais pesquisas nesta área para aprofundamento do conhecimento sobre o mesmo, para entender, quais as possibilidades do indivíduo com este transtorno, quais os sintomas que ele apresenta, como é realizado o diagnóstico e o tratamento para o indivíduo. 31 Phelan (2005, p. 17) ainda afirma que o Manual Estatístico e Diagnóstico de Transtornos Mentais DSM-IV (1994) representa um aperfeiçoamento em relação ao pensar sobre o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, com uma visão mais precisa e estudos mais aprofundados sobre o mesmo, ou seja, “propicia uma visão precisa, mais ainda clínica do TDA”. Embora estes instrumentos tenham contribuído incontestavelmente à criança na medida do possível, ainda deixam a desejar, pois ao longo desta seção pode-se perceber que não há exames específicos para a detecção deste transtorno e em determinadas circunstancias há certa rotulação do indivíduo e naturalização do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. 3.2 Conceito de TDAH De acordo com a visão organicista Rohde e Benczik (1999, p. 36), afirmam que o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH), é um problema mental que possui três características: a desatenção, a agitação e a impulsividade. Este transtorno pode interferir na vida, social, familiar e sentimental do indivíduo, em algumas das vezesaté acarretando um baixo desempenho escolar. [...] os sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade destas crianças e adolescentes colocam-na em desvantagem em ambientes onde a focalização da atenção e o controle motor e dos impulsos são necessários para o adequado funcionamento. (ROHDE; BENCZIK, 1999, p.53) O momento de desatenção é aquele em que a criança não consegue manter sua atenção em determinada tarefa, ocorrendo assim uma distração, na qual a criança facilmente desvia sua atenção por causa de outros estímulos. Porém, o indivíduo com TDAH possui a capacidade de prestar atenção em determinada situação quando se depara com, novidades, alto valor de interesse, intimidação estando com um adulto. Distrações visuais são coisas dentro do campo de visão da criança que atraem sua atenção. [...] Distrações auditivas são os sons que a 32 criança que a incomodam. [...] Distrações somáticas são sensações corporais que desviam a atenção da criança. [...] Distrações de fantasia são pensamentos ou imagens que passam pela mente da criança e que atraem mais do que as tarefas escolares. (PHELAN, 2005, p.19-20) A agitação pode ser nomeada como hiperatividade, que é “uma quantidade excessiva de atividade motora ou verbal com relação ao esperado para a idade e situação concreta na qual se encontra o sujeito”. (BONET CAMAÑES, et al, 2008, p. 35) Para Phelan (2005, p. 20) no que diz respeito à impulsividade a criança “age sem pensar ou faz o que venha à cabeça, sem se preocupar com as conseqüências”. Esta característica também pode interferir na área de socialização do indivíduo com TDAH. Aquelas crianças que para muitos professores são consideradas como inconvenientes, em certos casos estas atitudes são confundidas como mal educadas, ou seja, acabam sendo mal vistas pelos seus comportamentos impulsivos. Segundo Kajihara (2008, p. 208) o TDAH é dividido em três subtipos: 1) tipo predominante desatento; 2) tipo predominante hiperativo/impulsivo e 3) tipo combinado. 1)Tipo predominante desatento: Não presta atenção em detalhes Comete erros por pequenos descuidos Tem dificuldades na questão de organização de tarefas ou atividades Tem grande dificuldade em seguir regras e em fazer os deveres escolares Perde objetos facilmente Distrai-se facilmente com estímulos alheios Apresenta esquecimento de tarefas diárias 2)Tipo predominante do hiperativo/impulsivo: Tem dificuldades em brincar ou realizar atividades em silêncio Mexe-se muito na carteira (agitação dos pés e das mãos) 33 Fica levantando-se direto da carteira/ andando pela sala Tem dificuldade de esperar sua vez Dá respostas precipitadas Interrompe conversas Muita agitação Fala excessiva 3)Tipo combinado: É o indivíduo que se caracteriza em inúmeros dos itens de ambos os tipos anteriormente citados. Para Rohde e Benczik (1999), vale ressaltar que a criança deve apresentar os sintomas por um período mínimo de seis meses e não basta apresentar os sintomas apenas em um determinado ambiente, ou seja, é importante observar no ambiente escolar mas também no âmbito familiar. Assim, [...] diminuímos a chance de considerar que uma criança que apresente desatenção e hiperatividade apenas na escola devido à inadequação dos métodos de ensino, ou que apresente tais sintomas apenas em casa devido às dificuldades no relacionamento familiar seja erradamente diagnosticada como portadora de TDAH. (ROHDE; BENCZIK, 1999, p.42) Segundo Andrade e Aragão (2007) estudos revelam diferentes índices de crianças com TDAH em diferentes países, nos Estados Unidos são 3 a 6%, na Alemanha 8,7%, no Japão 7,7%, no caso do Brasil o índice varia de 3 a 6% das crianças em idade escolar que apresentam TDAH. Segundo Rohde e Benczik (1999, p. 45) estudos também afirmam cerca de 3 a 6% da população infantil com idade de 7 a 14 anos que apresentam o transtorno, sendo mais freqüente em meninos que em meninas. Devemos atentar os olhares para estes índices, pois alguns fatores propiciam a ascensão destes, como, a naturalização do TDAH, como justificativa do fracasso escolar, as dificuldades de aprendizagem e o baixo desempenho do aluno, para que este índice aumente. No Brasil não se têm profissionais da educação capacitados para atender as exigências e as especificidades necessárias dos indivíduos e, em 34 muitas situações o professor não pode contar com outro profissional em sala de aula para que o auxilie com um atendimento prioritário a estes alunos. É impossível realizar um trabalho de qualidade com estes alunos com salas lotadas sem nenhum apoio auxiliar e recursos necessários, estes fatores fazem com que estes dados cresçam cada vez mais. Visões organicistas e naturalizantes, acabam por direcionar o problema do TDAH aos sujeitos individualmente, sem o devido questionamento das condições sociais de produção do fenômeno, enfatizando somente os elementos relacionados à doença, a patologia, inabilidades e incapacidades do indivíduo, eximindo, assim, a sociedade de responsabilidade nesse processo. (ASSUMPÇÃO; et al, 2011, p. 2) Com base nas pesquisas de Belli (2008) algumas características e habilidades a seguir estão presentes na maioria dos indivíduos com TDAH: criam situações inusitadas e inesperadas; muitas vezes não ouvem o que está sendo dito; não reconhecem expressões verbais e não verbais; são desorganizados com seus materiais; realizam suas atividades sempre na última hora; com o impulso acabam mentindo. Por exemplo, quando a mãe pergunta se tem tarefa ou se ele já terminou de fazê-la; são mais lentos na cópia e realização de tarefas; persistentes quando determinam algo lutam até alcançá-lo; resistentes quando há a necessidade de realizar tarefas que exigem um esforço mental por muito tempo; quando estão brincando não conseguem parar para fazerem suas necessidades biológicas; precisam de estimulação, pois elas não se estimulam sozinhas; não filtram as coisas que não as interessam; não gostam de perder em jogos, não são toleráveis às frustrações; perdem o estímulo de determinada atividade que envolva muito tempo; não pensam antes de responder; possuem ansiedade de separação, sentem dificuldades em se distanciar dos pais; sentem dificuldades em seguir regras; gostam de brincar com crianças mais novas, para que se sintam líderes por serem mais velhos; se divertem facilmente; precisam praticar a releitura para que se lembrem do que já foi lido; não gostam de ler muito, chegam a saltar partes do texto quando ele é longo; possuem dificuldades com a leitura e a escrita; são sonolentos mesmo com boas noites de sono; possuem dificuldades em levantar de manhã para 35 começar a executar as tarefas do dia a dia; a todo tempo mudam seu foco de interesse; possuem memória a curto prazo; são muito frequentes as variações de humor e possuem dificuldades em manter amizadese relacionamentos afetivos. (BELLI, 2008, p.33-36) 3.3 As causas do TDAH Segundo Mattos (2005, p. 41) “não existe uma causa única perfeitamente estabelecida”, porém há pesquisas que apontam a participação genética neste diagnóstico do TDAH, 90% do TDAH é por causas genéticas, um forte determinante do aparecimento deste transtorno. No caso da criança com pais diagnosticados com este transtorno, suas chances são duas vezes maiores de obter o mesmo. Houve muitos fatores e teorias secundárias que apontavam o que poderia afetar o sistema nervoso da criança, como, “aditivos alimentares (corantes e conservantes), aspartame, excesso de açúcar no sangue, luz florescente, deficiência de vitaminas e problemas na tireóide” (MATTOS, 2005, p. 43), embora estes fatores estejam abandonados devido ao fato de não serem confirmados, há ainda fatores considerados importantes, como, “problemas durante o parto, uso de cigarro e álcool durante a gravidez”. (MATTOS, 2005, p. 43) Phelan (2005) aponta que cada vez mais pessoas se referem ao TDAH como um distúrbio neurobiológico, decorrente das pesquisas realizadas a respeito do problema de atenção, impulsos, hiperatividade, auto-regulação, o que enfatiza o inadequado papel de desenvolvimento de determinadas áreas do cérebro, como, o córtex pré-frontal, umas das áreas mais envolvidas no TDAH. Pelas razões expostas, o modelo mais aceito no momento para explicar as causa do TDAH é o de uma vulnerabilidade herdada ao transtorno que vai manifestar-se de acordo com a presença de desencadeadores ambientais. Quanto mais forte a carga genética, menor a importância dos desencadeadores ambientais. (ROHDE; BENCZIK, 1999, p. 62) Pode-se perceber neste momento a naturalização do TDAH, como se responsabilidade fosse “jogada” ao indivíduo, sem sequer observar outros fatores 36 importantes como o ambiente em que ele está inserido, sua vida social, familiar e escolar. 3.4 O diagnóstico O diagnóstico do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é um assunto um tanto quanto delicado, pois segundo Phelan (2005, p. 79) “não há um teste específico para a detecção do distúrbio, não há nenhum teste físico, neurológico ou psicológico que possa provar ou refutar a existência do TDAH”. Infelizmente, o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade tem- se tornado um rótulo de quase toda a criança que exibe algum tipo de comportamento disruptivo ou conduta não complacente. Tem-se percebido uma alta taxa de problemas educacionais e psicológicos, todos indicados com o rótulo de TDAH. (BENCZIK, 2000, p. 53) Ressalta-se que não cabe ao professor diagnosticar se a criança possui TDAH, porém cabe ao profissional da educação observar as atitudes da criança, para que este venha a contribuir na vida de seu aluno e interagir positivamente no que for preciso. Segundo Phelan (2005) o processo de diagnóstico ocorre da seguinte maneira, um profissional da psicologia, primeiramente, realiza uma entrevista com os pais para que se obtenha um histórico de desenvolvimento da criança, conheça a história familiar e colete as informações para servirem de base ao processo de avaliação (anamnese). A segunda etapa deste processo é uma entrevista com a criança, obtendo informações de sua visão em relação à escola, sua família e sua vida social, criando sempre um bom relacionamento com a criança para que, se necessário, um trabalho posterior, os vínculos estejam estabelecidos e para finalizar uma entrevista com o professor, na qual estas informações são importantíssimas para ser avaliado o comportamento da criança na sua vida escolar. Phelan (2005) aponta que há escalas de classificação para detectar o TDAH, e que estas permitem uma série de perguntas em um pequeno período e a 37 pontuação da criança é avaliada de acordo com seu grupo de faixa etária. Estas escalas de classificação são; banda larga- “cobrem uma grande variedade de possíveis problemas e, portanto, proporcionam uma visão global do funcionamento da criança” (PHELAN, 2005, p. 87) e a banda estreita- “são usadas quando o avaliador quer examinar mais de perto uma potencial área de problemas, como, o próprio TODA ou possíveis estados de co-morbidade. Como se vê, para o resultado do processo de diagnóstico necessita a coleta de inúmeras informações detalhadas dos indivíduos no que diz respeito a sua vida escolar, social e familiar. “A determinação final de que uma criança se enquadra ou não neste diagnóstico precisa estar baseada na integração de todos os dados coletados”. (PHELAN, 2005, p. 97) Dessa forma, o diagnóstico do respectivo transtorno não é considerado como algo impreciso, inseguro, fazendo assim com que este fator seja algo propulsor para o avanço de número de casos de crianças com TDAH confirmados. Mas ao se mencionar, casos “confirmados”, pode-se presumir que seja confirmado por meio deste processo de diagnóstico, ou até mesmo em certos diagnósticos em que a autora Leite (2010) critica, como, para parte do diagnóstico deste transtorno a criança deve apresentar pelo menos seis dos sintomas anteriormente citados, por um tempo aproximado de seis meses em distintos ambientes que ela freqüente, por exemplo, na escola, na família e etc. A partir da crítica acima, destaco a importante concepção da Psicologia Histórico-Cultural que leva em consideração os fatores dos meios externos da criança e não apenas o biológico, pois não se pode observar atitudes de forma isolada, em um determinado momento que seja, assim fica claro que apenas o posicionamento organicista torna-se errôneo, ao se diagnosticar e até mesmo rotular uma determinada criança sem ao menos considerar tais fatores considerados importantes, que influenciam a vida do indivíduo. 3.5 A escola e a atuação do professor 38 Pode-se pensar em inúmeros fatores que contribuem ao baixo rendimento escolar, como, as salas de aula superlotadas, os objetivos educacionais do processo de ensino-aprendizagem são visados em um modelo ideal de aluno, ou seja, em um aluno padrão, o despreparo dos professores, entre outros. Em muitas práticas escolares, o que se observa na atualidade é que todos devem produzir o mesmo ao mesmo tempo, acaba-se esquecendo das diferenças individuais, o ritmo de aprendizagem dos alunos, fatores este que dificultam o processo de ensino-aprendizagem. Há algum tempo a educação e a escola brasileira procura nos indivíduos a justificativa para as suas deficiências educacionais [...] Atualmente o fenômeno do fracasso escolar tem sido camuflado pelas escolas, pois a ideologia posta nos índices estatísticos encobre a verdadeira realidade e, para justificar seu descompromisso, mais uma vez o sistema educacional coloca sobre os indivíduos o problema, agora travestido por um transtorno, ou transtornos, os quais colocam sobre os indivíduos a culpa pelo seu fracasso escolar. (ASSUMPÇÃO, 2011, p. 2) Segundo Mattos (2005, p. 95) para o professor lidar com uma criança TDAH, ele precisa ter conhecimento sobre o transtorno para que seja diferenciado de “mal- educado”, “preguiçoso” e outrasmais rotulações. Neste mesmo sentido Benczik (2000, p. 81) enfatiza a importância do “saber diferenciar incapacidade de desobediência é fundamental”, pois o indivíduo com TDAH em sala de aula chama a atenção dos professores devido às suas atitudes, como, impulsividade, agitação e até mesmo agindo de forma inadequada. A atuação do professor é de extrema importância com relação ao desempenho do aluno com TDAH na escola, devido à dificuldade de se concentrar a aprendizagem do aluno acaba sendo comprometida. A profissão “educador” é, antes de tudo, uma missão, uma doação... Precisamos praticar o olhar e o escutar... A reconhecer no outro o ser pensante que é. A dar atenção ao outro, afinal atenção vem do verbo atender que significa cuidar. (BELLI, 2008, p. 49, aspas do autor) O professor deve ter criatividade e variar sempre as alternativas de ensino e nesta tentativa avaliar qual delas a criança consegue aprender melhor, em cada 39 situação. Ou seja, o professor “tem que ser capaz de modificar as estratégias de ensino, de modo a adequá-las ao estilo de aprendizagem e às necessidades da criança”. (MATTOS, 2005, p.96) É necessário entender que a criança com TDAH irá prestar atenção e dedicar- se apenas no que lhe interessa ou motiva, muito acontece de a criança ficar horas na frente da televisão, computador e videogame, mas sente grande dificuldade em ficar poucos minutos lendo um livro, em sala de aula, pois isso ocorre devido sua incapacidade de controlar seus sintomas com esforço voluntário. Por isso é importante o profissional da educação saber explorar os recursos visuais, que são os que mais chamam a atenção dos alunos e melhor organizam suas idéias, pois “a criança com TDAH necessita de um nível um pouco mais alto de estimulação para funcionar melhor”. (MATTOS, 2005, p. 105) Belli (2008, p.51-52) cita alguns dos recursos para serem utilizados em sala de aula, como, retroprojetor, PowerPoint, filmes (curta duração), computadores, figuras e desenhos, histórias e contos, músicas, jogos, aula ao ar livre e outros mais recursos que pode partir da criatividade do professor, em benefício à aprendizagem de seu aluno, que desperte a atenção dele e que seja uma das alternativas para melhor aprender. Como se vê, uma das grandes dificuldades das crianças com TDAH é a questão do autocontrole de seus comportamentos, diante disso, torna-se indispensável estabelecer regras e limites de comportamento e principalmente as manter. “Não se propõe que o TDAH se torne uma desculpa para permitir qualquer tipo de comportamento do aluno. Quanto mais próximo o tratamento com os demais alunos estiver do tratamento com ele, melhor”. (MATTOS, 2005, p. 112) 2.6 Tratamento Para Mattos (2005, p. 145) “o tratamento do TDAH envolve vários aspectos que são complementares”, como, confirmação do diagnóstico; explicações detalhadas sobre o transtorno; uso de medicamentos; orientação aos pais e orientação à escola. 40 De acordo com a visão hegemônica aqui discutida, o uso de medicação é um dos assuntos mais debatidos quando se fala em tratamento do TDAH. As pesquisas de Rohde e Benczik (1999) relatam que mais de 70% das crianças com TDAH apresentam uma melhora significativa em relação aos sintomas deste transtorno como, a desatenção, a impulsividade e a hiperatividade, com o uso correto de medicamentos. Porém Mattos (2005) mesmo declara que não há cura para o TDAH, estes medicamentos apenas auxiliam o indivíduo e que a partir do momento em que é interrompido o medicamento, todos os sintomas voltam. Na área de tratamento farmacológico os medicamentos indicados são os estimulantes, como, metilfenidato também conhecido como, Concerta, Focalin e Ritalina- estes possuem a capacidade de aumentar o nível de atividade do cérebro; já a segunda recomendação é o uso de antidepressivos tricíclicos quando os estimulantes não são eficazes ou acabam apresentando efeitos colaterais. Leite (2010, p. 13) fala que alguns autores alertam aos efeitos colaterais que o Metilfenidato provoca, há casos que podem ocorrer efeitos mais brandos, como, “perda do apetite, perda de sono e irritabilidade e efeitos mais severos como, “convulsões, alucinações e tiques”, entre outras contra-indicações que Leite (2010) complementa. Destaca-se que, dentre os efeitos colaterais provocados por antidepressivos tricíclicos, os principais são: boca seca; constipação; visão diminuída; retenção urinária; mania; aumento sutil no risco de morte súbita por parada cardíaca, além de dificuldades na concentração e problemas de aprendizagem”. (LEITE, 2010, p. 29, nota de roda pé) Segundo Leite (2010, p.12) “estima-se que o medicamento mais usado atualmente é o Metilfenidato, comercialmente conhecido como Ritalina”, de acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa de Medicamentos (IDUM) segundo pesquisas de Leite (2010) cresceram 1.616%, no Brasil apenas em 2008 foram vendidas 1.147.000 caixas desse medicamento. “Diante de tais dados, é possível inferir que o mercado de consumo, na atualidade abrange a indústria farmacêutica, que a cada dia são descobertas novas 41 drogas para novas doenças, ou novas doenças para as novas drogas” (LEITE, 2010, p. 13). Conforme o exposto pode-se notar que é explicitada apenas uma porcentagem de casos que obtiveram resultados positivos, não havendo uma discussão e exposição do restante da porcentual que não obtiveram os resultados negativos, que foram diagnosticados com TDAH e medicados, ou seja, a visão naturalizante sobre este assunto só aponta o lado “positivo”, sabe-se que esses medicamentos não “curam”, dessa forma o indivíduo diagnosticado acaba sendo ser medicalizado por tempo indeterminado. Vale ressaltar que, é necessário o esforço em conjunto de várias áreas, como, da escola, pois, “a escola se relaciona com todos os aspectos da vida” (STERN, 2007, p. 55), assim, cabe a ela desenvolver todos os processos de desenvolvimento do ser humano. Outro fator a se destacar, é a família, pois o envolvimento dos familiares no processo educacional, não deixa de ser primordial, de acordo com Stern (2007, p. 113) “o desenvolvimento eficaz dos pais no processo escolar pode ajudar os alunos a aprenderem melhor”. Dessa forma, entende-se que o acompanhamento da criança com TDAH por parte de todos que estão inseridos no seu ambiente, pois a escola, a família e o professor possuem um papel muito importante na vida desta criança. A próxima seção tratará do TDAH e suas implicações na escola embasando-se na concepção da Psicologia Histórico-Cultural. 42 4. TDAH E SUAS IMPLICAÇÕES NA ESCOLA Com base nas seções anteriores, esta, tem como proposta discutir as concepções naturalizantes que sustentam o conceito de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, à luz da Psicologia Histórico-Cultural. Torna-se importante esta discussão, pois,
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