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O Erotismo na Mitologia Grega e sua Representação na Literatura

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61 
 
CAPÍTULO II - O EROTISMO 
 
 
 
 
Eros, invencível no combate, tu que consomes as 
riquezas (...) 
De ti nenhum dos imortais é capaz de fugir, 
Aquele que te possui, enlouquece. 
(Sófocles) 
 
 
 
Quantificar elementos de erotismo em relação às personagens femininas presentes no 
livro e na minissérie, procedendo o confronto e análise é o que faremos neste capítulo. 
Entretanto, algumas definições em torno desta categoria fazem-se necessárias previamente à 
consideração a respeito dos dados pesquisados. A começar pela origem do vocábulo, que 
remonta ao grego erotiko e ao latim eroticu, cujo significado repousa em “aquilo que se 
refere ao amor lúbrico, sensual, sexual” (FERREIRA, 1993, p.216). 
Segundo Bulfinch, (1999, p.110) a origem de Eros - que para os romanos era Cupido - 
remonta à mitologia grega, segundo a qual ele seria fruto da união entre Ares, deus da guerra 
e Afrodite, deusa da beleza e do amor. Nestas narrativas, ele é imaginado enquanto uma 
criança, um menino caprichoso e irreverente, dotado de asas, arco e flechas, que se diverte em 
atirar setas, com o fim de deixar os corações dos mortais e dos imortais completamente 
inflamados pelo amor. 
De acordo com o relato mitológico, Afrodite, com inveja da beleza de uma jovem, 
Psiquê (a Alma), que rivalizava com a sua, incumbe o filho de fazer a moça apaixonar-se 
pela criatura mais desprezível sobre a terra. Contudo, por acidente, Eros fere-se em suas 
próprias setas e acaba apaixonando-se por Psiquê. Descoberta a relação, Zeus, divindade 
suprema do Olimpo, considerado o pai dos deuses e dos homens, ordena que vivam separados 
e Psiquê passa a eternamente conviver com Tristeza e Inquietação, à espera de Eros. Ou seja: 
enquanto não encontra o amor, a alma vive incompleta, infeliz e inquieta. Em O que é o 
 62 
Erotismo, Lúcia Castello Branco afirma que “o mito grego em suma nos diz que Eros é o 
deus que aproxima, mescla, une multiplica e varia as espécies” ( 1984, p. 40). 
Uma outra versão do mito está presente em O Banquete, de Platão. No banquete dos 
deuses em festejo ao nascimento de Afrodite, Poros (Recurso) deitou-se com Pênia (Pobreza), 
assim concebendo Eros, que, para o filósofo, não era um deus, mas um semideus. “E por ser 
filho o amor (Eros) do Recurso e da Pobreza, foi esta a condição em que ele ficou” 
(PLATÃO, 1972, p.40). Como Pobreza, está sempre carente do objeto amado; como Recurso, 
sempre sabe imaginar um meio de chegar aos seus objetivos. Nesta obra, Platão também 
relata a história entre Eros e Psiquê, mas sob outro viés, completando esta relação com a 
entrada da figura de Ágape, o amor espiritual, desinteressado, de doação, sem espera de 
recompensa. 
 Platão defende que o verdadeiro amor consistiria na afeição elevada a um plano ideal, 
que transcenderia o contato físico, sem contudo excluí- lo. Este é o chamado “ideal platônico 
do amor”, comumente confundido com o amor inatingível e a afeição sem contato. Na 
mesma obra, Platão procura explicar a natureza da busca pelo amor, quando Aristófano 
discursa relatando que, no princípio dos tempos, todos os seres humanos eram dotados de 
dupla sexualidade1. Por castigo de Zeus, foram mutilados, separados e condenados a vagar 
pela terra, na ânsia do encontro com a metade perdida. Assim, a eterna missão de achar sua 
metade seria equivalente a encontrar a continuidade de si mesmo. 
 É a partir desta visão mitológica acerca da bipartição dos homens é que se explica a 
essência do erotismo para muitos autores, como Georges Bataille. Em O Erotismo (p.15), o 
autor defende que este se articula em torno de movimentos opostos: a busca de continuidade 
dos seres humanos, a tentativa de permanência além de um momento fugaz versus o caráter 
mortal dos indivíduos, sua impossibilidade de superar a morte. Para Bataille, os indivíduos se 
lançariam nesta busca de permanência porque eles carregam consigo uma espécie de 
sentimento de isolamento, permeada por uma eterna nostalgia da sua metade, da continuidade 
perdida. 
 
 
 
__________________________ 
1- Segundo o mito platônico, os seres humanos com dupla sexualidade eram divididos em três gêneros: totalmente femininos, totalmente 
masculinos e os andróginos. A partir da bipartição ordenada pelo Olimpo, cada metade procuraria o seu complemento, estando explicada 
para os gregos assim a ocorrência da homossexualidade, comum na Antigüidade. 
 
 63 
A idéia do erotismo enquanto simples evidência de desejo sexual é refutada por grande 
parte dos autores que se debruça sobre o tema. Para eles, embora haja correlação entre estas 
noções, o sexo constitui uma necessidade física, enquanto erotismo extrapola este conceito, 
consistindo em manifestação de desejos como um todo. Todos os animais possuiriam desejo 
sexual, entretanto erotismo seria exclusividade apenas da raça humana. Nas palavras de Rollo 
May: 
 
sexo pode ser definido de maneira adequada em termos 
fisiológicos. Eros, pelo contrário é a vivência das 
intenções e o significado do ato. Enquanto sexo é ritmo 
de estímulo e resposta, Eros é um estado do ser. A 
finalidade do sexo é gratificação e o alívio da tensão, 
enquanto Eros representa o desejo, a ânsia e a eterna 
procura de expansão. Sexo em suma é o tipo de 
relacionamento caracterizado pelo intumescimento dos 
órgãos (para o qual buscamos um alívio prazeroso) e o 
enchimento das gônadas (para o qual buscamos um 
alívio satisfatório). Mas Eros2 é o modo de 
relacionamento no qual não procuramos alívio e sim 
cultivo, procriação e formação de um mundo (MAY, 
1979 p. 80). 
 
O que talvez o autor tenha pretendido explicitar é que o erotismo não se limita aos 
mecanismos da genitalidade do sexo, mas vai além, extrapola estas fronteiras Não se trata de 
simples atração do cio, mas da “sede” dos corpos por outros corpos. Nabor Nunes Filho, em 
Eroticamente Humano, lembra que é inerente ao ser humano desejar e, em uma abordagem 
ousada, sustenta que esta característica faz com que todos os homens sejam essencialmente 
eróticos, pois o erotismo seria a mola fundamental de nossos atos: 
 
 
 
_________________________________ 
2- Aqui o autor refere-se ao deus do amor com letra maiúscula na verdade para referir-se ao erotismo 
 
 64 
Antes de ser um animal racional, o homem é um ser 
desejante, constantemente sedento e quase sempre 
insatisfeito. Nada há no universo o que o preencha ou o 
complete(...) o que é causado pela perda de algo, cuja 
natureza o próprio homem desconhece, o que evoca a 
nostalgia de uma conjugação completa (NUNES 
FILHO, 1994, p. 18). 
 
Se o erotismo é um fenômeno natural, o que dizer da sedução? Se a noção de erotismo 
parece ser inseparável da natureza humana, coerente é o pensamento de Jean Baudrillard, 
segundo o qual os seres humanos também vivem constantemente empenhados no cativante 
jogo da sedução. Para o autor, que dedicou um livro inteiro ao tema, seduzir consiste 
basicamente em convidar alguém a tomar parte do seu mundo. E este processo tem várias 
facetas. A sedução dar-se-ia em vários planos: político, religioso, ideológico...mas o que vai 
nos interessar neste trabalho é a sedução do ponto de vista da sexualidade. Assim sendo: 
 
 seduzir é fazer este convite para que alguém participe 
momentaneamente do seu corpo. Consiste em um jogo cujos 
elementos fundamentais são os signos: consistem eles em 
transformar os desejos em sinais perceptíveis que os 
denunciem. Estes sinais variam e vão desde palavras até os 
gestos mais sutis, passando pelos olhares, toques e atitudes. 
(BAUDRILLARD, 2001, p. 167). 
 
O autor lembra aindaque a sedução jamais é natural, da ordem da natureza. Consiste 
sempre em artifícios que parecem seguir a ordem do signo e do ritual. 
Outro conceito que permeia a noção de erotismo, sendo- lhe porém completamente 
diverso é o da pornografia. Parece-nos que pornografia consista na descrição pura e simples 
dos prazeres carnais. Já o erotismo constitui esta mesma descrição, mas revalorizada em 
função de uma idéia do amor ou da vida social, portanto, com outro foco. Uma das distinções 
mais corriqueiras que se faz entre os dois fenômenos consiste em enfatizar o teor “nobre” e 
“grandioso” do erotismo em oposição ao caráter “grosseiro”, “sujo” e “vulgar” da 
pornografia. Inevitáve l não citar novamente Baudrillard, para quem o erotismo não se vincula 
 65 
diretamente à sexualidade, enquanto a pornografia exibe e explora incansavelmente este 
aspecto: 
 
O pornô (...) acrescenta uma dimensão ao espaço do sexo. Ele 
o faz mais real que o real, o que causa sua ausência de 
sedução. Talvez o pornô não seja mais que uma alegoria, isto 
é, um forçamento de signos, um empreendimento barroco de 
sobre-significação beirando o grotesco (...) exagerando o 
pitoresco dos detalhes anatômicos, num plano onde reina a 
alucinação do detalhe (BAUDRILLARD, 2001, p. 37) 
 
Já Lúcia Castello Branco (1984, p.50) relaciona estes conceitos com a indústria 
cultural. Para ela “ao contrário do erotismo, que corresponde a uma modalidade não-
utilitária de prazer porque propõe a satisfação e o gozo como fins em si, a pornografia 
estaria sempre vinculada a outros objetivos. Nela o prazer depende do pacto com a ideologia 
que a mesma veicula”. 
Em História da Literatura Erótica, Alexandrian afirma que o erotismo é um 
fenômeno poderoso, subversivo, na medida em que caminha em direção à reunião dos seres, 
à sua imersão na origem e à sua reintegração na ordem natural do universo. A pornografia, ao 
contrário, insiste sempre na mutilação dos seres, no gozo parcial, superficial e solitário, além 
de veicular valores que ao invés de subverter a ordem, procuram preservá-la e até enobrecê- la. 
O autor estabelece também um comparativo com a noção de obscenidade, que ressaltamos, a 
título de curiosidade: 
 
considera-se que o erotismo é tudo o que torna a carne 
desejável, tudo o que a mostra em seu brilho ou em seu 
desabrochar, tudo o que desperta uma impressão de saúde, 
beleza, de jogo deleitável; enquanto a obscenidade rebaixa a 
carne, associa a ela à sujeira, às doenças, às brincadeiras 
escatológicas e às palavras imundas. (ALEXANDRIAN, 
1983, p. 08). 
 
Diante de todo o exposto, nesta análise considerar-se-ão passagens de erotismo em 
relação às personagens femininas as ocorrências no livro e na produção televisiva que 
 66 
contenham manifestações, seja de natureza explícita e/ou velada, que remetam à noção de 
desejo e sensualidade, ligadas direta ou indiretamente às quatro personagens, nas quais elas 
ajam diretamente ou não. Procuramos selecionar todos os sinais e signos perceptíveis de 
erotismo, que explicitem a intenção de sedução ou a sedução propriamente dita. 
 
2.1 O EROTISMO NO ROMANCE 
 
2.1.1 Maria Monforte 
Apesar de ter importância fundamental na narrativa, a personagem Maria Monforte é 
curta e aparece somente em 23 das 694 páginas do livro, seja de modo direto ou referido. 
Os primeiros contatos com Pedro da Maia, por exemplo, são contados pelo narrador em 
terceira pessoa. O autor também não entra em detalhes a respeito de seus encontros 
furtivos com o amante italiano, tampouco descreve como se deu o episódio da fuga para 
Viena. Procura detalhar sim, enquanto obra típica do Realismo, aspectos em torno de sua 
beleza, suas toillettes, seu gosto em exibir-se em eventos sociais, (dentro e fora de casa) e 
sua ânsia, a partir do casamento, de ser aceita e aprovada pela sociedade lisboeta, 
sobretudo pelo sogro fidalgo. Além disso, também relata seu destino após a morte de 
Pedro da Maia. 
 Notamos que apenas em uma passagem do livro encontram-se “pistas” de erotismo 
em relação à personagem, passagem específica que também foi aproveitada na TV, como 
veremos mais adiante. O fragmento não sugere uma cena “picante”, tampouco tem 
conotação explicitamente sensual. Apenas deixa “rastros” sutis da descrição de uma 
carícia, em um rápido episódio da vida íntima entre marido e mulher. 
 
Aparição Localização/Contexto do 
fragmento 
Conteúdo do fragmento classificado na 
categoria Erotismo 
 
 
 
1 
 
 
 
Em uma das muitas 
recepções da residência de 
Arroios, Pedro se irrita 
com os homens que dizem 
“Maria sabia perceber bem na face do marido 
‘estas nuvens’. Corria para ele, tomava-lhe ambas 
as mãos, com força, com domínio. 
- Que tens tu meu amor? Estás amuado! 
- Não, não estou amuado... 
- Olha então para mim! 
 Colava o seu belo seio contra o peito dele; as suas 
 67 
gracejos e dançam com 
sua mulher. 
mãos corriam-lhe os braços numa carícia lenta e 
quente, dos pulsos aos ombros; depois, com um 
lindo olhar, estendia -lhe os lábios. Pedro colhia 
neles um longo beijo e ficava consolado de tudo” 
(QUEIRÓS, 2000, p. 48) 
 
 
2.1.2 Maria Eduarda 
Podemos afirmar que, o erotismo em relação a mais importante personagem feminina 
da obra parece percorrer uma curva ascendente ao longo da trama: se no início a presença 
é latente, sutil, quase lírica, ao evoluir da narrativa, entretanto, torna-se mais explícito. A 
afeição entre Maria Eduarda e Carlos da Maia torna-se cada vez menos espiritual e mais 
carnal. É o que se depreende da evolução dos fragmentos abaixo. Em nossa análise da 
freqüência de menções ao erotismo em relação à Maria Eduarda, detectamos 5 (cinco) 
ocorrências. 
No início, o erotismo é subjacente. Para manifestá-lo, o autor lança mão de 
insinuações e simbolismos. No primeiro fragmento, por exemplo, Eça insinua um 
encontro sexual entre os dois amantes, contando que, após percorrerem os cômodos da 
casa que alugaram para mais reservadamente viverem, a alguns minutos do centro de 
Lisboa, a quinta dos Olivais, os dois entraram no quarto quente (o autor usa a palavra 
alcova, sinônimo de quarto de dormir, esconderijo) e dourado, e que a casa mergulhou no 
silêncio entre as árvores, pois não havia mais ninguém na quinta naquela tarde de verão. 
Para deixar subentendido que, após ficarem a sós, pela primeira vez os dois personagens 
dormiram juntos, o autor usa o conhecido artifício narrativo de encerrar um período com 
reticências, como forma de sugerir uma idéia, sem contudo pormenoriza-la. 
Já o simbolismo está na descrição dos personagens passando pelos cômodos da casa, 
encontrando, por exemplo, tapeçarias que retratavam Marte e Vênus no bosque, que 
conforme lembra Thomas Bulfinch, tratam-se de divindades da mitologia romana que 
eram amantes - uma provável alusão ao encontro amoroso que teriam os irmãos Carlos 
Eduardo e Maria Eduarda ali na casa, também em meio a um bosque. E ainda, está no 
quadro reproduzindo a morte de S. João Batista, decapitado a pedido de Salomé por 
Herodes, 
 
 68 
segundo o relato bíblico3, um episódio marcado por erotismo e ocorrência de sexo entre 
familiares, o que aliás, também estava por acontecer na trama queirosiana. Suely Fadul, 
em artigo sobre objetos-personagens em Os Maias, lembra que, ao encobrir o quadro, 
Carlos da Maia ali também, metaforicamente, tratava de ocultar os objetos anunciadores 
da tragédia. Aliás, para a autora, a tela de João Batista tem uma função específica: 
 
“funciona como elemento premonitório, pois tendo João Batista 
morrido por condenar a imoralidade a profanaçãodos amores 
incestuosos, novamente aparece para condenar e, simbolicamente, 
pressagiar a culpa trágica de Carlos Eduardo e Maria Eduarda, que 
se consumará pelo incesto involuntário entre irmãos” (FLORY, 2003, 
p. 290) 
 
O ápice da curva do erotismo acontece na última passagem, na descrição do 
sentimento de culpa de Carlos quando este, mesmo ciente da consangüinidade que o unia 
a Maria Eduarda, ainda assim continua a manter com ela encontros sexuais, por mais de 
uma vez. Há uma mescla de uma forte carga erótica com doses de reprovação moral dos 
fatos, quando Eça, diante da conduta reprovável do protagonista, descreve seu sentimento 
de culpa e seus dilemas de consciência. Os termos utilizados pelo autor neste momento 
remetem à animalidade do gesto: “bárbara”, “animal”, “fera”, “ciosa”, “juba”, “bestial”. 
A amada já não possuía mais seios, mas “peitos túmidos de seiva”. 
 Aliás, o caráter desta relação “selvagem” e fora dos padrões da sociedade já era 
prenunciado pelo “apelido” dado à casa onde davam-se os encontros: “toca”, que em 
nosso vernáculo designa “buraco na terra, na pedra, onde se abrigam animais, abrigo, 
refúgio” (FERREIRA, 1993, p.596). Para Suely Fadul, tal expressão conotava “uma 
realidade pressentida: a animalidade da relação incestuosa que ali se consumará” 
(FLORY, 2003, p.289). 
 
 
 
 _______________________________ 
3
- Segundo o relato da Bíblia, (Mateus, Capítulo 14, versículos 3-12), por ter condenado publicamente o fato de Herodes, então 
governante da Galiléia, ser amante da própria cunhada, Herodíades, João Batista foi preso. Salomé, sobrinha e enteada do governante, 
em uma festa de aniversário, dançou de forma tão sensual que Herodes lhe prometeu o presente que quisesse. A mãe, desejosa de 
vingança, influenciou a filha, que pediu a cabeça de João Batista em uma bandeja. 
 
 69 
 
Aparição 
Localização/Contexto do 
fragmento 
Conteúdo do fragmento classificado na 
categoria Erotismo 
 
 
 
1 
Alugada a quinta de Craft, Carlos 
leva Maria Eduarda a caminhar 
pelos cômodos da casa dos 
Olivais. Andam pelo salão, 
banheiros, de tapeçarias, quando 
vêem Marte e Vênus se amando 
nos bosques até chegarem ao 
quarto, onde vêm um quadro de 
João Batista decapitado. 
“Penetravam na alcova, quente e cor de ouro. Carlos ao 
passar desprendeu as cortinas do arco da capela, feitas 
de uma seda leve que coava para dentro de uma 
claridade loura (...) 
-Aquela horrível cabeça ! – murmurou ela. 
Carlos arrancou a cobertura do leito, escondeu a tela 
sinistra. E então todo o rumor se extinguiu, a solitária 
casa ficou adormecida entre as árvores, numa demorada 
sesta, sob a calma de julho...(QUEIRÓS, 2000, p. 426). 
 
 
 
2 
 
 
Maria Eduarda já mora nos 
Olivais com a filha, a 
preceptora inglesa e os demais 
criados. Carlos lhe visitava 
todas as manhãs. Na frente da 
criadagem, ela bordava e ele 
lia. 
“Mas bordado e livro caíam logo no chão – e os 
seus lábios, os seus braços uniam-se 
arrebatadamente. Ela escorregava sobre o divã; 
Carlos ajoelhava numa almofada, trêmulo, 
impaciente” (...) e ali ficava, abraçado à sua 
cintura, balbuciando mil cousas pueris e ardentes, 
por entre longos beijos que os deixavam frouxos, 
com os olhos cerrados, numa doçura de desmaio” 
(QUEIRÓS, 2000, p. 443). 
 
 
 
3 
 
 
Carlos aproveita a ausência do 
avô, em viagem à quinta de 
Santa Olávia, no Porto, para 
passar a primeira noite com 
Maria Eduarda nos Olivais. 
“Um trovão rolou lento e surdo. Mas Maria já não o 
ouviu, caída nos braços de Carlos. Nunca o desejara, 
nunca o adorara tanto! Os seus beijos ansiosos pareciam 
tender mais longe que a carne, trespassá-lo, querer 
sorver-lhe a vontade e a alma; e toda noite, entre esses 
brocados radiantes, com os cabelos soltos, divina em sua 
nudez, ela lhe apareceu realmente como a deusa que ele 
sempre imaginara, que o arrebatava enfim, apertado ao 
seu seio imortal, e com ele pairava numa celebração de 
amor muito alto, sobre nuvens de ouro” (QUEIRÓS, 
2000, p. 446) 
 
 
4 
 
 
 
Carlos descobre que Maria 
Eduarda é sua irmã. Apesar da 
revelação dos laços de 
consangüinidade e ele 
procurá-la para fazer-lhe a 
Ele tenteava, procurando na brancura da roupa; 
encontrou um joelho a que percebia a forma e o calor 
suave através da seda leve; e ali esqueceu a mão aberta e 
frouxa, num entorpecimento onde toda a vontade e 
consciência se lhe fundiam deixando-lhe apenas a 
sensação daquela pele quente e macia, onde a sua palma 
pousava. (...) sem resistência como um corpo morto ele 
 70 
revelação, o protagonista não 
consegue; se entrega à paixão 
e mantém relações sexuais 
com a irmã. 
caiu-lhe sobre o seio. Os seus lábios secos acharam-se 
colados num beijo aberto que os umedecia. E de repente, 
Carlos enlaçou-a furiosamente, esmagando-a e sugando-
a, numa paixão e num desespero que fez tremer todo o 
leito” (QUEIRÓS, 2000, p.638) 
 
 
5 
Ainda atormentado com a 
revelação, Carlos não tem 
coragem de revelar a verdade 
à Maria Eduarda. Pela segunda 
vez tem relações carnais com a 
irmã. Mas desta vez a culpa 
reflete-se na repugnância 
física. O fragmento refere-se 
ao drama de consciência que o 
aflige, minutos depois do ato. 
“Fora primeiramente aquele aroma que a envolvia, 
flutuava entre os cortinados, lhe ficava a ele na pele e no 
fato, o excitava tanto outrora, o impacientava tanto agora 
(...) Fora depois aquele corpo dela, adorado sempre 
como um mármore ideal, que de repente lhe aparecera, 
como era na sua realidade, forte demais, musculoso, de 
grossos membros de amazona bárbara, com todas as 
belezas copiosas do animal de prazer. Nos seus cabelos 
de um lustre tão macio, sentia agora inesperadamente 
uma rudeza de juba. Os seus movimentos na cama, ainda 
nessa noite, o tinham assustado como se fossem os de 
uma fera, lenta, ciosa, que se estirava para o 
devorar...Quando os seus braços o enlaçavam, o 
esmagavam contra os seus rijos peitos túmidos de seiva, 
ainda de certo lhe punham nas veias uma chama que era 
toda bestial” (QUEIRÓS, 2000, p. 645) 
 
2.1.3 Condessa de Gouvarinho 
 Em se tratando da personagem descrita como a amante balzaquiana, carente e 
inconveniente de Carlos da Maia, encontramos 3 (três) menções na categoria em 
questão. 
Notamos que a intenção do autor em ressaltar este aspecto da personagem fica 
patente quando utilizou determinadas palavras para descrever a impressão que tinha 
Carlos da Maia a respeito dela. São adjetivos e verbos que remetem à sensualidade, ao 
apelo sensorial em geral: “picante”, “cetim das formas”, “avermelhados”, “quentes”, “ 
aroma”, “ despia”, “ calor”, “seio arfando” etc. 
 Note-se que em todas as passagens não há diálogos, mas reflexões internas do 
protagonista acerca da personagem em questão. Assim, o leitor toma contato com o 
erotismo que cercava a Condessa apenas por meio das reflexões de Carlos da Maia. 
O último fragmento, por exemplo, relata um encontro furtivo entre os amantes, a 
bordo de uma carruagem, durante o percurso na estrada de Queluz. No livro, jamais se 
descreve o que se passa dentro dela. O narrador limitou-se a descrever os fatos após o 
 71 
término do passeio. Tudo é dito nas entrelinhas, dando ao leitor a capacidade de ver com 
os olhos da imaginação aquilo que ele mesmo não mostra. O interior é revelado pelo 
exterior, em conformidade com típico ditame da estética do Realismo. 
 Teria Eça inspirado-se em Flaubert ? É o que parece, pois passagem semelhante está 
presentetambém na obra do autor francês, Madame Bovary, publicado em 1857, no qual 
narra-se o encontro de Emma com o amante León, também a bordo de um fiacre. Emma, 
tal como a Condessa, era infeliz no casamento e buscava no adultério a válvula de escape 
para sua existência entediada de esposa de médico do interior. A exemplo do que fez o 
Cinema4 ao adaptar a obra de Gustave Flaubert, também a TV, na adaptação de Os Maias, 
aproveitou tal passagem, mas fazendo- lhe outra leitura, conforme se verá mais adiante. 
Fiquemos com os fragmentos do livro: 
 
Aparição Localização/Contexto do 
fragmento 
Conteúdo do fragmento classificado na 
categoria Erotismo 
 
 
 
1 
Depois de ser apresentada a 
Carlos na ópera, a Condessa, 
a pretexto de levar o filho 
para consultar o médico 
sobre suposta doença, 
resolver visitar o médico. 
Carlos reflete sobre a mulher 
que acabara de sair do 
consultório. 
“Havia ali uma pontinha de romantismo, muito 
irregular e picante...E devia ser deliciosamente 
bem feita. A sua imaginação despia-a, enrolava-
se-lhe no cetim das formas, onde sentia ao 
mesmo tempo alguma cousa de maduro e de 
virginal. E outra vez como nas primeiras noites 
que os vira em S. Carlos, aqueles cabelos 
tentavam-no, assim avermelhados, tão crespos e 
quentes” ... (QUEIRÓS, 2000, p.210) 
 
 
 
 
 
 
 
_____________ 
4- O livro Madame Bovary foi adaptada quatro vezes para o cinema: pelo diretor americano Vincent Minelli, pelo indiano Ketan 
Metha, e pelos franceses Claude Chabrol e Jean Renoir, estas últimas realizadas em 1934 e 1992, respectivamente. IN Muller Jr, 
Adalberto. Cinema, Tradução Infidelidade: os casos de Madame Bovary. Revista Sessões do Imaginário, n.º 11. Porto Alegre: 
EDIPUCRS, 1994, P. 52-57. 
 72 
 
 
 
 
 
 
 
2 
 
 
 
 
Carlos visita a casa dos conde 
de Gouvarinho. A Condessa 
encontra-se sozinha em casa. 
“...sentia o seu aroma de verbena, o calor que subia do 
seu seio arfando com força (...) Insensivelmente, 
irresistivelmente, Carlos achou-se com os lábios nos 
lábios dela. A seda do vestido roçava-lhe, com um fino 
ruge-ruge entre os braços- e ela pendia para trás a 
cabeça, branca como uma cera, com as pálpebras 
docemente cerradas. Ele deu um passo, tendo-a assim 
enlaçada, e como morta; o seu joelho encontrou um sofá 
baixo, que rolou e fugiu ainda, até que se esbarrou 
contra o pedestal onde o senhor conde erguia a fronte 
inspirada. E um longo suspiro morreu, num rumor de 
saias amarrotadas” (QUEIRÓS, 2000, p. 292) 
 
 
 
 
 
3 
 
 
 
Primeiro encontro 
clandestino entre Carlos e a 
Condessa, no qual acontece 
o adultério, a bordo de uma 
carruagem simples, um 
“calhambeque duro”, nas 
palavras do autor. 
“... por uma tarde quente, com um céu triste de 
trovoada e no momento em que estavam caindo 
algumas gotas grossas de chuva – Carlos apeava-se 
de um coupé de praça, que viera parar, devagar, à 
esquina da Patriarcal, com os estores vede 
misteriosamente corridos. Dous sujeitos que 
passavam, sorriram-se, como se o vissem escoar-se 
desajeitadamente de uma portinha suspeita. E com 
efeito a velha traquitana de rodas amarelas acabava 
de ser uma alcova de amor, perfumada de verbena, 
durante as duas horas que Carlos rolava dentro 
dela, pela estrada de Queluz, com a senhora 
Condessa de Gouvarinho. (QUEIRÓS, 2003, p.295) 
 
2.1.4 Raquel Cohen 
Conforme já se disse anteriormente, a mulher de banqueiro Raquel Cohen é a 
personagem silenciosa do romance, não tendo direito a falas nem a quaisquer expressões. 
Diante disso, é natural que as menções ao erotismo em relação a ela também sejam 
reduzidas. Em todo o livro, contabiliza-se apenas um fragmento no qual isso acontece, 
reproduzido abaixo. 
Nela o erotismo está presente na por meio das opiniões masculinas acerca da 
personagem. Sempre a ela se referem como se estivessem descrevendo um objeto, algo 
inanimado, cuja serventia é saciar o desejo, uma necessidade física, mais precisamente a 
 73 
fome. Literalmente lhe são atribuídas qualidades que dizem respeito à carne: “deliciosa”, 
“apetitosa”, “carnezinha faisandée”. 
 
Aparição Localização/Contexto do 
fragmento 
Conteúdo do fragmento classificado na categoria 
Erotismo 
 
1 
 
 
 
Primeira descrição de Raquel 
Cohen, mulher casada com o 
banqueiro Jacó Cohen e que 
era amante de João da Ega 
“Entre os amigos, no Ramalhete, sobretudo na frisa, 
discutia -se às vezes Raquel, e as opiniões 
discordavam. Taveira achava-a deliciosa! E dizia -o 
rilhando o dente; ao marquês não deixava de 
aparecer apetitosa, para uma vez, aquela 
carnezinha faisandée de mulher de trinta anos” 
(QUEIRÓS, 2000, p.135) 
 
 
2.2 - O EROTISMO NA MINISSÉRIE 
2.2.1 Maria Monforte 
Se na obra de partida ela tem participação quase fugaz na trama, na minissérie, ao 
contrário, seu destaque e ênfase foram quantitativamente maiores, especialmente na categoria 
aqui sob análise: na TV foram 9 (nove) menções a mais. Provavelmente, por tratar-se de uma 
personagem complexa, cujo caráter parece modificar-se conforme a trama desenvolve-se5, a 
roteirista optou por dar-lhe maior exposição, seja encenando trechos que no livro são 
rapidamente descritos ou sugeridos, seja criando livremente novas situações envolvendo-a. 
Um exemplo é sua primeira aparição, (inexistente no livro, aliás6) que já surge 
marcada pelo erotismo: a cena da tourada, na qual aparece associada à carne, à cor vermelha e 
ao sangue. Não por acaso quando perguntada por D. Diogo se gosta de touradas, sua resposta 
e primeira fala na minissérie é : “Em Portugal há pouco sangue. Prefiro as espanholas”. 
Note-se também que há erotismo na seqüência do piquenique em Sintra, no qual brinca com 
 
___________________________ 
5- Em nosso análise, no início da trama, Maria Monforte é uma jovem que acredita na força do amor e por ele luta. Uma vez casada, torna-
se uma esposa entediada e infiel. Depois de fugir com amante italiano e ficar arruinada, torna-se uma cortesã e uma mãe pouco zelosa. 
6- Em entrevista contida no DVD da minissérie, Maria Adelaide Amaral justificar a seqüência da Praça de Touros em Os Maias. Segundo a 
autora, é habitual estratégia dos autores de televisão elaborar o primeiro capítulo de uma novela ou minissérie de forma a causar impacto, 
captar a atenção dos telespectadores para o novo produto. Para isso, nada melhor que reproduzir um espetáculo tipicamente ibérico, 
grandioso, e plasticamente atrativo. A roteirista conta que, durante o processo de gestação da minissérie, empreendeu uma série de pesquisas 
em Portugal, e durante uma delas descobriu, em meio a vários escritos do autor português os planos de futuramente escrever um romance 
que tivesse uma tourada como pano de fundo inicial. 
 
 74 
as uvas na boca de Pedro da Maia, em uma espécie de convite para que, além da fruta, 
também “experimente-a”. Aqui a metáfora do pecado – a maçã- fora trocada pelas uvas. 
 
 
 Figura 1- Cena do Piquenique em Sintra 
 
Em outra seqüência, temos o devaneio do poeta Alencar, em uma das muitas recepções 
em Arroios. É compreensível a opção da roteirista em conceber a cena em questão, na qual 
Maria Monforte aparece ao poeta, que acabar de sorver uma taça de absinto, caracterizada a 
partir de vestimentas gregas, representando ora as deusas Ártemis, ora Afrodite. Embora esta 
passagem não exista na obra de partida, para caracterizar a beleza da personagem, a todo 
momento, no livro Eça lança mão das comparações com divindades mitológicas: “quediabo! 
Juno tinha sangue de assassino”; e ainda “ as suas formas de estátua davam-lhe o esplendor 
de uma Ceres” (QUEIRÓS, 2000, pp. 36-37). Apesar de ser uma seqüência inexistente no 
romance, não chega a constituir uma disjunção, visto que neste caso a TV parece comungar 
com um projeto ideológico do autor. 
Diante da beleza daquela aparição, o poeta Alencar ficara extasiado, como se estivesse 
diante de uma obra de arte, uma escultura, um quadro. E na verdade, era o que realmente 
apreciava. Ao transformar a personagem em Afrodite, a autora lançou mão da 
intertextualidade ao reproduzir a obra “O nascimento de Vênus”, de Boticelli7. Como se sabe, 
nesta tela retrata-se o nascimento da deusa grega do amor a partir da espuma do mar. 
________________________________ 
7- A obra data de 1485 e foi pintada em têmpera sobre tela pelo fiorentino Sandro Botticelli, retratando no mar o nascimento da deusa 
romana do amor 
 
 75 
Nela a deusa aparece desnuda, branca, com fartos cabelos cacheados e soltos, e em 
seu entorno, uma paisagem marinha, com abundância de conchas. Com exceção da nudez 
completa, Maria Monforte na TV também aparece assim caracterizada. As conchas estão por 
toda parte – desde as luzes no chão do palco até o papel da parede do palco onde se 
apresenta. Nada mais natural que invocar uma obra de arte da Renascença para ilustrar os 
sonhos de um poeta representante do Romantismo, estilo que louvava o retorno dos ideais 
clássicos e humanistas. 
 
 
 Figura 2- Cena do sonho de Alencar 
 
 A intertextualidade também encontra-se presente em outra seqüência, que retrata o 
primeiro e decisivo encontro adúltero com o italiano Tancredo. Depois de tê-lo primeiro como 
hóspede depois do episódio da caçada na Tojeira e em seguida como convidado, Maria 
apaixona-se e é correspondida. Depois de distribuir pães aos miseráveis nas ruas de Lisboa, 
Tancredo tira-lhe o véu e beija- lhe a boca. A câmera foca o véu negro caindo no chão – uma 
metáfora, já que com o véu caía também a máscara de fiel esposa da personagem. 
Tem início a seqüência em que os dois amantes fazem sexo à vista dos mendigos e 
cães sujos e doentes, sugerindo uma associação: assim como aqueles sobreviviam à margem 
da sociedade, também a paixão entre Maria Monforte e o italiano era marginal, adúltera, fora 
dos padrões sociais. Quando a câmera foca no cão, também insinua o desejo animal, que fica 
patente na falta de pudor em fazer sexo na rua, de pé, com testemunhas. 
 76 
 
 Figura 3 – Cena do encontro adúltero na rua com Tancredo 
 
É interessante observar ainda sobre esta cena que a mesma realiza um intertexto com o 
filme A Rainha Margot8, de Patrice Chéreau, (que aliás também é baseado em um romance de 
Alexandre Dumas,) no qual Marguerite de Valois, a futura rainha da França, casada com 
Henrique IV, mantém encontros sexuais com seu amante La Môlle, nas mesmas 
circunstâncias, porém em meio às então fétidas ruas de Paris do século XVI. 
 
Aparição Localização/Contexto da 
Cena 
Conteúdo da cena classificada na categoria 
Erotismo 
 
 
 
1 
 
 
Tourada em Lisboa. 
Primeira aparição da 
personagem. Primeira vez que 
Carlos da Maia sai de casa 
desde a morte da mãe, dois 
anos antes. 
Na Praça de Touros, troca olhares lânguidos com 
Pedro da Maia, que ficará fascinado por sua beleza. A 
câmera detém-se generosamente no decote, nos seios 
arfantes, na boca entreaberta, ao mesmo tempo em 
que mostra o touro –símbolo de virilidade- atingido 
por lanças, em uma possível alusão ao homem, no caso 
Pedro, sendo atingido pela lança da paixão. Presença 
maciça da cor vermelha na seqüência: o sangue do 
animal ferido, os rubis que adornam o colo da 
personagem, o manto do toureiro e a sombrinha 
escarlate da personagem. 
 
________________________________ 
8- O filme, uma co-produção alemã, francesa e italiana de 1994, retrata o jogo de influências nos bastidores da monarquia francesa em 1572. 
Conta a história do casamento da católica Margot e do protestante Henrique Bourbon de Navarre, como forma de minimizar as disputas 
religiosa no país, mas acaba servindo de estopim para um violento massacre de protestantes, conhecido como a “ noite de São Bartolomeu”, 
no qual morreram mais de seis mil protestantes, que teve a conivência do rei da França, Carlos IX, irmão de Margot. 
 77 
 
 
 
2 
Concerto no Teatro de S. 
Carlos. Embora Pedro da Maia 
já tivesse se comunicado com 
Maria por meio de flores e 
bilhetes, entregues em sua 
casa, será a primeira vez em 
que se encontraram 
pessoalmente. E que trocaram 
as primeiras palavras. 
A partir do parapeito de um dos camarotes, a câmera 
foca em close um ramo de camélias vermelhas; na 
seqüência, o decote generoso que mostra seios 
brancos, respiração ofegante, boca, sorriso e ombros 
nus da personagem. Boa dose de voyerismo, uma vez 
que ambos vêm um ao outro (por meio de uma 
luneta); o observador é observado e vice-versa. 
 
3 
 
Passeio em Sintra, no Castelo 
de S. Jorge. 
Personagem ora se esconde, ora se revela nas sombras 
das ruínas do antigo palácio, com vista para floresta e 
para o mar. Personagem foge e aparece, em jogo de 
sedução com Pedro da Maia. 
 
 
4 
 
 
Piquenique em Sintra. 
Primeiras informações sobre 
as origens da personagem e de 
seu pai. 
Na residência alugada pelos Monforte no verão, Maria 
provoca Pedro com um cacho de uvas, Convida-o 
prová-las, ressaltando-lhes o doce sabor: uma sugestão 
para que prove de seus beijos. Uma possível metáfora 
à maçã, fruto proibido usado por Eva para tentar Adão 
no paraíso. Trocam olhares de desejo, a respiração de 
ambos é ofegante. Pedro responde, colocando frutas na 
boca de Maria. Suas peles roçam uma na outra, a 
câmera dá close nas duas bocas próximas, mas o beijo 
não acontece. 
 
5 
Mesmo com a reprovação de 
Afonso, os dois se casam e, 
depois da lua de mel na Itália e 
França, voltam a Portugal. 
Maria está grávida. 
A câmera mostra o casal na cama. A imagem não é 
nítida; Por baixo dos lençóis, aparecem de longe os 
torsos masculino e feminino nus. 
 
6 
Durante uma das recepções na 
casa de Arroios, Maria 
apresenta-se como atriz em um 
palco especialmente preparado 
para ocasião. O fundo do palco 
é uma ilustração de uma 
floresta. 
Maria mostra-se, dançar, requebrando os quadris até o 
chão. O poeta Alencar, que é apaixonado por Maria, 
depois de beber uma dose de uma bebida verde 
(absinto?) vê sua apresentação de maneira diferente 
dos demais convidados. Primeiro, ela aparece a ele 
com outras roupas, vestida como a deusa grega 
Ártemis, a deusa da caça, munida de um arco. Depois, 
 78 
com flores nos cabelos soltos e véus brancos, aparece 
como a deusa do amor sensual, Afrodite. Tudo ao som 
de flautas. Alencar fica extasiado. 
 
7 
Em outra recepção em 
Arroios, Pedro se irrita com os 
homens que dizem gracejos e 
dançam com sua mulher; 
retira-se para o quarto. 
Ela seduz o marido. Enquanto ele chora, ela lambe-lhe 
as lágrimas. Pernas, quadris, nádegas femininas; os 
corpos rolam um por cima do outro na cama – mas a 
câmera nada mostra de perto. 
 
8 
Na festa de batizado do 
segundo filho, Maria conhece 
Tancredo, o italiano ferido por 
Pedro durante uma caçada. 
Depois de a ter tirado para dançar, o italiano, cuja 
beleza logo encanta-lhe, oferece-lhe um desenho e a 
encara. Abraça e beija as mãos da pequena filha, Maria 
Eduarda enquanto dirige olhares sedentos para a mãe. 
 
 
9 
 
 
Decidida a ser umamulher 
caridosa, Maria distribui pães 
aos pobres e moradores de rua 
de Lisboa. Tancredo aparece 
para ajudá-la na tarefa. 
Há um clima de sedução entre os dois. Tancredo se 
aproxima, beija -a com volúpia. A câmera mostra o 
véu negro que lhe cobria o rosto caindo sobre o chão; 
Tancredo levanta-lhe a saia, a câmera foca a face de 
um cão vira-lata. Fazem sexo de pé, encostados em 
uma parede, na rua, em plena luz do dia. A câmera 
mostra o olhar de um mendigo e a expressão de prazer 
da personagem. Agora de costas, Tancredo rasga-lhe 
as roupas, os seios aparecem nus. A música de fundo 
lembra que “ninguém larga a grande roda”, ou seja, é 
impossível fugir do destino. 
 
 
10 
Depois da morte de Tancredo 
e do pai, Maria se entrega à 
prostituição e aparece em um 
bordel na França 
Um homem nu deitado de costas em um divã 
vermelho. Uma mulher passa um leque feito de penas 
pelo corpo do rapaz, que se vira e agarra-a, beijando-a 
na boca. É Maria Monforte, de cabelos lisos soltos, 
extremamente maquiada e vestindo roupas de dormir. 
 
 
2.2.2 Maria Eduarda 
Na maior parte das 6 (seis) cenas detectadas na minissérie segundo esta categoria, o 
erotismo está presente de maneira mais explícita e tais menções são maiores na TV que no 
livro. Entretanto, é interessante notar-se que, embora esta personagem tenha papel de maior 
 79 
destaque ao longo da trama que Maria Monforte, quando a categoria é erotismo, 
quantitativamente esta protagoniza mais cenas na TV que Maria Eduarda. 
 
 
 
 
 Figuras 4 e 5, takes que retratam um dos encontros com Carlos Eduardo nos Olivais. 
 
Assim como no livro, conforme já observamos no sub-capítulo anterior, a figura de 
Maria Eduarda aos poucos vai abandonando o caráter de deusa intangível, para se corporificar 
em mulher real, começando a integrar mais intensamente a trama. Outro ponto é que Maria 
Eduarda é apresentada aos telespectadores (assim como aos leitores) enquanto esposa de 
Castro Gomes, antes de apaixonar-se por Carlos Eduardo durante uma viagem a Portugal. 
Dadas as peculiaridades do formato, a TV consegue evidenciar mais aspectos da vida íntima 
da personagem com o suposto marido que o romance. Entretanto, todas as cenas de 
intimidade entre ela e Carlos Gomes, quando sugerem sexo, não o fazem de maneira erótica, 
 80 
pois não explicitam desejo e sim submissão ao homem, (categoria que analisaremos mais à 
frente), já que Maria Eduarda era concubina do brasileiro, e a ele se unira 
apenas por motivos financeiros, a fim de manter sua sobrevivência, da filha e da mãe9. A 
falta de erotismo, neste caso, parece ser indicativa de uma convivência sem prazer, por 
obrigação, imposta pelas circunstâncias que envolviam a personagem. 
Todas as seqüências aqui selecionadas procuram evidenciar o desejo enquanto 
manifestação física, mas parecem sempre atreladas a um sentimento de amor puro, quase 
sublime em relação a Carlos Eduardo. Exceção fica por conta da última cena, na qual Carlos 
já ciente de sua condição de irmão de Maria Eduarda, ainda assim leva a cabo seu encontro 
sexual com Maria Eduarda. Nesta passagem, a paixão perde sua conotação de pureza e ganha 
dimensão de um sentimento puramente carnal e até animalesco, uma vez que agora o incesto é 
voluntário por parte do protagonista. Em background surgem sons de tambores, que parecem 
mesclados a gritos tribais, efeitos utilizados durante toda a sequência. Uma provável sugestão 
de que acontecia ali uma prática selvagem, pouco civilizada, quase tribal. 
 
 
 Figura 6: Mesmo já ciente do incesto, Carlos faz sexo com a irmã. E é assolado pela culpa. 
 
Também as cores utilizadas nas roupas de cama, (o vermelho da colcha e o negro dos 
lençóis), simbolicamente, dão a medida de como naquele momento a paixão mesclava-se à 
impureza, à podridão de uma relação condenável. O ritmo da cena é mais rápido, a 
intensidade é maior. E os corpos nus, embora mais evidentes que nas demais seqüências, 
aparecem envoltos em véu negro, rodeado por velas em candelabros, emprestando um ar 
sinistro à cena. 
___________________ 
9- Na minissérie, diferente do livro, Maria Monforte ainda é viva, mas está com os dias contados. Tuberculosa, seu tratamento na Suíça é 
pago por Castro Gomes, fato este que reiteradamente ele lembra à Maria Eduarda 
 81 
Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria 
Erotismo 
 
1 
Após a viagem de Castro Gomes 
ao Brasil, Carlos da Maia, a 
pretexto de saber da saúde da filha 
de Maria Eduarda, Roseclair, que 
havia curado dias antes, faz visita 
à mãe e declara-se a ela. 
Trata-se da primeira cena de beijo entre os 
personagens. Cena ardorosa, Carlos toca a nuca, 
única parte exposta do corpo da personagem. 
Agarra-a pela cintura. As respirações são ofegantes. 
 
 
2 
 
 
Carlos faz uma visita Maria 
Eduarda enquanto ela borda uma 
talagarça. 
É Maria Eduarda quem toma iniciativa de um longo 
toque na face de Carlos. Acontece um longo beijo na 
boca, cheio de desejo e ânsia, sem preocupação com 
convenções sociais, uma vez ambos que se 
encontram no corredor do prédio onde fora morar 
depois da viagem de Castro Gomes ao Brasil. O 
desejo do casal é crescente. 
 
 
 
 
3 
 
 
 
Carlos leva Maria Eduarda para 
conhecer a casa que alugou de 
Craft no campo, a Quinta dos 
Olivais 
Depois de entrar em vários cômodos da casa, Maria 
Eduarda declara-se, apaixonada. Ambos despem-se 
um ao outro. A luz é clara, há foco na pele branca da 
personagem. A câmera faz um suave travelling, 
passeia entre os dois, usa planos e contra-planos. De 
longe aparece o bico do seio da personagem, sua 
expressão de prazer na cama, respiração ofegante. 
Há insinuação do ato sexual, mostra-se Carlos por 
cima da personagem. Ambos aparecem nus somente 
de longe, sob véus transparentes. A música é suave. 
 
 
 
4 
Após Castro Gomes ter revelado a 
Carlos que não era casado com Maria 
Eduarda e que Rosiclair não era sua 
filha, Carlos vai até os Olivais. 
Encontra Maria e com ela discute por 
ela ter lhe escondido a verdade. Ela 
pede perdão por ter escondido seu 
passado, mas Carlos não se convence. 
Os amantes decidem romper. Carlos 
retira -se, deixando Maria Eduarda em 
cena sozinha, chorando. 
Desesperada, Maria chora pela perda. Corre para o 
espelho e acaricia -o. Na verdade, está tão abalada 
pelo rompimento que não consegue ver seu próprio 
reflexo, apenas a imagem do seu amado. Beija -lhe a 
boca, chama-o pelo nome. Cena de forte simbolismo 
– o que aparecia ali era seu desejo de manter sua 
“cara- metade” ao seu lado, o que parecia então 
impossível. 
 82 
 
 
 
5 
 
 
Perturbado por não esquecer Maria 
Eduarda e arrependido da briga, 
Carlos volta aos Olivais, disposto 
a fazer as pazes. E a pede a em 
casamento 
No quarto de Maria Eduarda os dois se reconciliam. 
A câmera mostra Carlos beijando joelhos e pernas 
nuas da personagem, deitada. Levanta-le a saia. Há 
um corte e um close para o rosto da mulher, com 
expressão de prazer. A seqüência, que conta com o 
narrador em off descrevendo a cena, “nunca a 
desejara tanto” termina com a personagem 
dormindo seminua, com os cabelos soltos, “divina 
em sua nudez”, seguindo exatamente o conteúdo do 
livro à página 446. 
 
 
 
6 
 
 
Carlos acaba de saber que é irmão 
de Maria Eduarda e dirige-se à 
casa da amante para fazer-lhe a 
revelação, que impede a 
continuação do romance. 
Encontra-a em seu quarto, deitada 
nacama. E mesmo ciente do 
parentesco, não consegue resistir à 
paixão 
Trata-se da seqüência de maior e mais explícita 
carga erótica em relação à personagem. Ao som de 
tambores, a câmera mostra um casal fazendo sexo 
na cama, de maneira mais próxima e desta vez mais 
nítida. Aparecem o contorno dos seios, nádegas e a 
púbis da personagem, que aparece completamente 
nua de costas. Ao contrário das outras cenas, a 
mulher aparece mais ativa no ato, dando prazer ao 
homem. Diferente das outras cenas, aqui não há 
suavidade mas certa animalidade no ato, em 
harmonia com a passagem equivalente do romance. 
A roupa de cama é em tons escuros, a luz utilizada é 
sombria. 
 
 
2.2.3 Condessa de Gouvarinho 
 Nota-se que em relação a esta personagem, o erotismo ressaltado na minissérie, com 5 
(cinco) menções, duas a mais que no romance. Entretanto, mesmo sendo personagem 
secundária, parece-nos que Eça de Queirós, já no século XIX, fazia pairar sobre Teresa 
Thompson uma nuvem de erotismo, embora naturalmente mais velada que a veiculada na 
minissérie. Como já dito anteriormente, é próprio da linguagem televisiva evidenciar por 
imagens aquilo que no suporte escrito é apenas insinuado. Exemplo deste caráter mais 
explícito das cenas são as passagens dos encontros furtivos com Carlos da Maia, que 
acontecem dentro do coupé e no consultório médico. 
 83 
 Ao que parece, na televisão foi ressaltado o caráter erótico da personagem, sempre 
associada à necessidade de “desafogo” sexual de Carlos da Maia. É interessante notar 
também que a iniciativa das abordagens e dos encontros com o personagem sempre partem da 
Condessa, seja nas seqüências nas quais o erotismo é velado quanto naquelas em que é 
explícito, uma atitude ousada e até mesmo condenável para uma mulher da alta sociedade da 
época. 
 
 
 Figura 7: A Condessa seduz Carlos em seu consultório médico 
 
Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria 
Erotismo 
 
2 
 
Recepção na casa dos Gouvarinho, 
à mesa, durante jantar, convidados 
discutem sobre o adultério de 
mulheres casadas 
 
A personagem, com vestido decotado no busto, provoca 
Carlos, roçando seus pés nas pernas do médico por baixo da 
mesa, ao lado do marido. 
 
 
3 
Encontro furtivo entre a condessa e 
o médico, dentro de uma 
carruagem, em frente ao consultório 
de Carlos, onde os amantes 
marcaram o encontro. 
Durante um passeio pela cidade, a condessa e o médico 
fazem sexo dentro de um coupé, sem se importar com o 
desconforto e sem tirar as roupas. Embora a condessa 
declare-se e apaixonada, o médico apenas dá vazão ao 
desejo físico, sem demonstrar envolvimento. 
 84 
 
 
4 
 
No consultório, condessa reclama 
da escassez de encontros com o 
amante. Carlos mescla irritação e 
uma certa carência, por conta da 
revelação da história de seus pais. 
 
O médico agarra a condessa por trás, aperta-lhe os seios, 
levanta-lhe a saia. E de roupa, faz sexo com a condessa, em 
cima de uma mesa, de maneira rude e sem carinho, como 
nítido desafogo de um mero desejo sexual. 
 
 
 
 
5 
Novamente no consultório, 
Carlos já apaixonado por Maria 
Eduarda, entretanto, continua 
encontrando-se com a Condessa. 
Rápida cena, novamente de roupa, de maneira rápida, 
a condessa faz sexo com o amante; ele de olhos 
fechados; o ato parecia ser um desafogo que o médico 
mal podia esperar que chegasse ao fim. 
 
 
2.2.3 Raquel Cohen 
Ao contrário do que acontece no romance, no produto televisivo a personagem em 
questão, embora seja secundária, tem maior participação na trama. Um exemplo são as 3 (três) 
menções relativas ao erotismo referentes à judia mulher do diretor do Banco Nacional. Nelas 
a personagem tem voz ativa, protagoniza diálogos e situações, ao contrário da passagem única 
do livro, na qual o erotismo em torno da personagem fica patente por meio dos relatos 
masculinos dos freqüentadores do Ramalhete. 
Parece então que, à primeira vista , em relação a esta personagem, há uma aparente 
disjunção entre romance e minissérie. De todas as personagens femininas, é Raquel Cohen a 
única que, nas passagens com maior carga erótica, jamais está envolvida realmente com seu 
amante, João da Ega. 
Ao final de todas as seqüências, ela parece arrepender-se do adultério, afirmando 
sempre que pretende preservar seu casamento, tratando-se então o romance com o jovem Ega 
de um mero passatempo, um divertimento para uma esposa entediada. Mas, se refletirmos 
que, ao ressaltar este aspecto a minissérie acaba reforçando o propósito do livro de Eça de 
desnudar a sociedade portuguesa do século XIX – e hipocrisia nos casamento é apenas uma 
de suas faces , então os conteúdos da televisão e livro guardam coerência entre si, estando 
em conjunção. 
Para dar a medida da relação proibida com João da Ega, os encontros dos amantes são 
sempre são rápidos, fugidios e em locais ermos, como em um cemitério, local escolhido pela 
própria personagem para tal. O adultério se dá entre cruzes, velas e túmulos da primeira vez, 
dentro de uma cova em um mausoléu na segunda. Note-se que nesta última há um ar teatral, 
 85 
quando os amantes parecem divertir-se ao encenar supostamente o encontro entre D. Pedro e 
de Inês de Castro10 , já morta. Uma fantasia para tirar da mesmice a enfadonha vida de uma 
mulher da alta sociedade lisboeta... 
 
 
Figura 8: Raquel encontra-se com João da Ega dentro de uma tumba no cemitério, 
simulando a história de D. Pedro e Inês de Castro. 
 
 
 
Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria 
Erotismo 
 
1 
No teatro S. Carlos, durante 
concerto de ópera, enquanto 
Jacó Cohen sai para tomar ar, 
Raquel e João da Ega ficam 
sozinhos no camarote. 
Os amantes aproveitam a ausência do marido para 
agarrarem-se, beijarem-se, atrás das cadeiras do 
camarote. Há dose de voyerismo, já que a cena é 
observada do outro lado do teatro, por meio de uma 
luneta, por Taveira, amigo de João da Ega. A câmera 
mostra tudo de longe. O telespectador vê a cena a 
partir dos olhos do personagem. 
 
 
 
 
 
 
 
 
_______________________________ 
10- No século XIV, o então príncipe de Portugal, D. Pedro, apaixonou-se pela dama de companhia de sua mulher, a espanhola Inês de 
Castro, que foi sua amante e mãe de quatro filhos seus. A nobreza, com medo de que Inês se tornasse rainha de Portugal quando D. Pedro 
assumisse o trono de seu pai, D. Afonso IV, matou-a em 1355, enquanto o rei encontrava-se fora de Lisboa. Dois anos depois, ao ser 
coroado rei de Portugal, D. Pedro vingou-se , matando os assassinos de Inês e mandando exumar a ossada de sua amada, coroando -a morta e 
obrigando toda corte - sobretudo a nobreza e o clero, que haviam condenado seu romance - a ajoelharem-se diante do cadáver e a beijar-lhe 
os ossos da mão. 
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2 
 
 
Encontro furtivo entre Raquel e 
João da Ega no cemitério, 
durante o dia. O lugar é sugerido 
pela personagem. 
Simulando levar flores para um túmulo, vestida de 
preto, com uma capa da mesma cor, como se estivesse 
de luto, Raquel caminha entre os jazigos. É agarrada 
por João da Ega, que a leva para dentro de um 
mausoléu. Lá, à luz de velas nos candelabros, Ega tira 
a roupa da personagem, que fica apenas de espartilho, 
embora o espectador veja - a apenas da cintura para 
cima. A câmera afasta -se e volta apenas para marcar a 
o fim do encontro entre os amantes, quando a 
personagem se diz arrependida do encontro.3 
 
 
Novo encontro entre a 
personagem e seu amante, no 
cemitério, desta vez à noite. A 
escolha foi novamente da 
personagem, que sugere encenar 
a história de Inês de Castro. 
No meio do cemitério, a câmera mostra de longe Ega 
carregando um corpo aparentemente inerte, como se 
estivesse morto. Há um corte e mostra-se o interior de 
um mausoléu, preparado de tal forma que se tem a 
sensação de estar acontecendo um velório – há velas, 
cruzes e coroas de flores. A câmera nos mostra um 
suposto cadáver de mulher em uma cova. João da Ega 
entra em cena, se aproxima da cova: “Ah, minha Inês, 
estás tão fria....e tão apetitosa!”. Há aí uma sugestão 
de uma perversão sexual, a necrofilia. Pouco depois a 
câmera nos mostra os amantes aos beijos dentro da 
tumba. 
 
 
 
CATEGORIA: EROTISMO 
Personagens Menções no livro Menções na TV 
Maria Monforte 01 10 
Maria Eduarda 05 06 
Condessa de Gouvarinho 03 05 
Raquel Cohen 01 03 
Total 10 24 
 
 
 87 
EVOLUÇÃO DAS MENÇÕES À CATEGORIA EROTISMO NA 
TRANSMUTAÇÃO DO LIVRO PARA A TV 
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Menções no livro Menções na minissérie
Maria Monforte Maria Eduarda
Condessa de Gouvarinho Raquel Cohen
 
 
 Ao levarmos em consideração que seja possível mensurar numericamente as menções 
ao tema Erotismo no livro e na minissérie, constataremos que houve uma considerável 
elevação de freqüência de repetição da categoria em relação às quatro personagens na 
transmutação para a TV. No meio eletrônico ela foi 140% maior que no meio impresso. 
 Flagrante foi o incremento do caráter erótico da personagem Maria Monforte: a 
repetição de seqüências com esta especificidade cresceu 900% na minissérie em comparação 
com o livro. Pode-se dizer que a trajetória da personagem é marcada em um primeiro 
momento pelo erotismo velado e referido até o casamento com Pedro da Maia; é a partir do 
adultério que o erotismo fica mais explícito. 
 Raquel Cohen, mesmo tratando-se de uma personagem secundária, aparece como 
segunda personagem mais erotizada na trama televisiva, experimentando acréscimo de 200% 
das menções em relação ao romance. Já a Condessa de Gouvarinho teve incremento de 
66,6%. O erotismo na minissérie em relação à Maria Eduarda, por sua vez, foi 20% superior 
ao romance. Em princípio os números podem apontar para uma interpretação errônea, 
segundo a qual a personagem teria então uma discreta carga de erotismo na TV, a menor 
entre todas as personagens femininas. É importante lembrarmos que Maria Eduarda já no 
romance é a personagem com maior carga quantitativamente erótica. O que a televisão fez foi 
manter este caráter, focando a intensificação não do número de vezes em que o tema é citado, 
mas cuidando para explicitar ao máximo o conteúdo destas seqüências. 
Em relação às demais personagens, percebe-se que o incremento em relação à 
categoria em questão esteve agregado ao aumento da própria frequência de aparição das 
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mesmas. A nuance erótica delas acompanhou sua participação na narrativa televisiva. Ou seja: 
quanto maior a participação das personagens em questão na minissérie em relação ao livro, 
mais freqüente também serão as suas respectivas referências ao erotismo.

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