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9ª Aula - Psicopatologia Especial Abuso de Drogas: do ritual ao uso massificado – capítulo 13 Durval Mazzei Nogueira Filho Psiquiatria: da magia à evidência – Ramadam Perspectivas de Abordagem - as drogas são uma questão privada e não se admite discurso que infiram na liberdade individual - as drogas são substâncias tóxicas que prejudicam o funcionamento orgânico e causam dependência; estão relacionadas a uma disposição genética - perspectiva do autor: contemplar as anteriores sem repetí-las - humanidade conhece as drogas desde seu advento - Freud (1930 [1929]) – Mal-Estar na Civilização: “a intenção de que o homem seja feliz não se acha incluída no plano da Criação ... o mais prosaico, embora também o mais eficaz” dentre os meios de evitar o enfrentamento da condição humana “é o químico: a intoxicação”. - a drogadicção é um fenômeno ao mesmo tempo médico, psicanalítico, sociológico, político, ideológico e ético. - jornais: fatos dramáticos podem se tornar corriqueiros – o discurso médico não pode se resumir a explicações biológicas em torno dos efeitos das drogas e da intoxicação. - hoje a droga é usada pela busca do efeito, sem rito, cultura ou espiritualidade; atinge mais os grupos urbanos – mercado de consumo (globalização – Morin) A função cultural das drogas - uso de ópio na Idade da Pedra (Castro, 1996); uso de plantas com propriedades psicoativas: dos antigos iranianos (persas) às comunidades indígenas sul-americanas (Lévi-Strauss, 1976) - religiões xamanistas: Ásia às comunidades primitivas americanas – centrada no Xamã- uso de alguma planta sagrada alucinógena, na qual se crê conter um poder transformador sobrenatural (Furst, 1994) – utilizada em contexto de ritual de acordo com a cultura e a história ancestral daquela comunidade - as substâncias psicoativas nas comunidades primitivas desempenham um papel cultural fundamental: união do grupo, identificação à cultura que o gerou, confirmação dos mitos e lendas - uso de substancias psicoativas pelas comunidades indígenas não é um antecedente histórico ao uso de drogas ocidental. São parte integrante dos sacramentos e os devotos crêem nas mensagens de um outro mundo trazidas pelo vegetal. Peiote – cultos da Igreja Nativa Americana (México) Ouscaca (ahyuasca) – diversas ramificações do Santo Daime (Brasil); Conselho Federal de Entorpecentes foi favorável à manutenção da ouscaca (1992) – limitado aos cultos religiosos, vedando-se o uso profano (cultos derivados do Círculo de Regeneração e Fé, fundado por Raimundo Irineu Serra na década de 1920 no Acre) - uso em grupos na cultura ocidental da droga: - literatos, artistas e filósofos – benefício pessoal pelo prazer de viver uma experiência de gozo incomum que está relacionada a uma forma de revelação estética - médicos e cientistas – instrumento para a pesquisa dos mecanismos neuroquímicos cerebrais - até o início dos anos 60 (sec XX) – as drogas não constituíam um problema de saúde pública – interesse restringia-se a médicos, intelectuais e a grupos marginais 1º grupo a usar organizadamente drogas: Clube do Haxixe (1850-1860) – supridos e estudados pelo psiquiatra Moreau de Tours – Baudelaire e gautier e outros transformaram em obras artísticas suas experiências com haxixe e ópio. - drogas no uso ocidental: papel de responder ao mal-estar na civilização, à dor do existir – sedução em viver uma experiência solitária Aldous Huxley – Admirável mundo novo (1932) e As portas da percepção (1966) LSD – Hoffmann – Laboratório Sandoz (1947) – favorecer a revelação do material reprimido em pacientes ansiosos e neuróticos obsessivos e capacitar o psiquiatra a insights a respeito das idéias e sensações dos pacientes (má leitura de Freud) - 1950 o panorama começa a mudar: estabelecimento das culturas de massas, progressos na comunicação - surge outro grupo de intelectuais: a geração beat (Bokowsky, Corso, etc. – a droga como um meio de vida; presença da droga em toda e qualquer circunstância do cotidiano - T. Leary (psicólogo): possibilidades experimentais e terapêuticas dos alucinógenos (LSD) – primeiro passo para romper o acordo tácito que vigia na sociedade (que restringia as drogas aos marginais, artistas e cientistas) – passa a defender o uso da droga para melhorias na espécie humana – publicidade do produto e o meio para que a mensagem fosse difundida: rock’n roll (1960) – Beatles (Lucy in the Sky with Diamonds); Jimi Hendrix (Are you experienedci¿); bandas como “Sacred Mushroom” ou “Iron Butterfly” – incentivo ao uso dos psicodélicos - décadas de 60 e 70: as drogas alcançam o grande público – denotava inconformismo; defendia a contestação e superação dos valores ocidentais - rede do narcotráfico não se estendia sobre a malha social - narcotráfico: grande mudança na cultura em relação às drogas - Nações Unidas: Programa de Controle Internacional das Drogas - década de 80: governos intensificam a guerra às drogas - narcocapital: embrenha-se na economia legal - individualismo pelo sucesso da década de 90:semelhanças entre a farmacologia de Leary e a de Kramer (1994) – Ouvindo o Prozac (fluoxetina) – ambos especulam pelas transformações que as drogas podem trazer ao usuário – a droga (lícita ou ilícita) como ponte para obter a satisfação permanente A clínica da toxicomania - o fenômeno toxicomaníaco é regido pela lógica da complexidade (Morin, 2001) - a dependência pode envolver desde o sujeito que faz uso regular até o sujeito no qual ocorrem alterações induzidas por drogas que persistem além do período do efeito direto da substância - CID 10: Transtornos mentais de comportamento decorrentes do uso de substâncias psicoativas (F10-F19) pode ser divido em três partes: - intoxicação aguda: vai desde a não complicada até a ocorrência de desmaios, coma ou convulsões - síndrome de dependência e estados de abstinência - conseqüências transitórias ou permanentes do transtorno por uso de drogas (psicoses, síndromes amnéstica) - uso, abuso ou dependência: induz alterações mentais similares a outros quadros clínicos patológicos - fenômeno que unifica: a dependência – conjunto de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos que indica que o indivíduo mantém o consumo de drogas apesar de problemas relacionados ao uso. - Tolerância: necessidade de aumentar progressivamente a quantidade de droga consumida ou redução dos efeitos quando a dose é mantida. - Abstinência: alteração comportamental associada a sintomas fisiológicos e cognitivos quando há interrupção no consumo ou redução abrupta da dose. - Consumo compulsivo: “fissura” – desejo intenso de experimentar os efeitos prazerosos da droga ou aliviar sintomas não tão prazerosos da abstinência. - CID10: relaciona seis critérios para o diagnóstico de dependência: - forte desejo (fissura) ou senso de compulsão para o consumo de drogas - dificuldade de controlar a quantidade e tempo destinado ao consumo - presença de sintomas de abstinência e uso da droga para minorar o mal-estar - evidencia da tolerância - abandono progressivo de prazeres e alternativas em favor do uso da droga - persistência do uso da droga apesar da evidencia de conseqüências manifestamente nocivas, causando dano à saúde (física e mental) - DSM-IV: abuso de drogas – padrão de uso prejudicial por um ano, pelo menos. Os prejuízos incluem falhas nas obrigações laborais, escolares ou familiares, dificuldades relacionais devido à irritabilidade crescente (quando na abstinência), aumento da agressividade e indiferença em relação ao sofrimento que causa aos outros, e o uso em circunstâncias perigosas, tanto pessoais quanto legais. Vias de compreensão e explicação do fenômeno toxicomaníaco Neurobiológica - detecção das anormalidades biológicas que se produzem pelo uso repetido de drogas - neuroadaptação: substratos neurobiológicos que reforçam o uso de drogas - cocaína, anfetamina, nicotina e heroína:liberação de dopamina; álcool: ações do ácido gama-aminobutírico (GABA), no glutamato, dopamina, serotonina; THC – princípio ativo da maconha: liberação de dopamina - hipótese biológica: quando o sujeito ingere drogas repetidamente promove alterações no equilíbrio da liberação e recaptação de neurotransmissores. Essas mudanças afetam o sinal que o metabolismo manda para regular a atividade intracelular. Esta atividade é, então, subvertida no nível da expressão dos genes. - fatores hereditários representam um dado significativo no abuso ou dependência de drogas – gene DRD2 está envolvido no circuito cerebral e na psicopatologia do adicto Psicanalítica - Rosenfeld (1968): o ego do toxicômano é fraco e não dispõe de força para suportar o peso da depressão e só alcança estados maníacos (onipotentes e megalomaníacos) com o auxílio da droga; há uma associação do apaixonamento e escravidão à droga com o estado de satisfação infantil, em que a criança utiliza suas fantasias de satisfação alucinatórias de desejos para lidar com suas ansiedades - Autores atuais: o uso de drogas, mais que favorecer o reencontro com a felicidade perdida, com o imaginativo orgasmo alimentar, instaura uma balbúrdia na condição erógena do sujeito, restringindo suas possibilidades de prazer e a multiplicidade de objetos à disposição da obtenção do prazer. Cognitiva - Influenciados pela filosofia: - Epicteto (filósofo estóico): os homens não são perturbados pelos objetos e situações, mas pelo modo como os entende - Kant: o saber obtido pelas experiências subjetivas é resultado de interpretações baseadas em estruturas apriori de conhecimento - a cognição influencia e afeta o comportamento e a modificação do comportamento de uso da droga pode ser realizado por meio de mudanças cognitivas Tratamento Farmacoterapia - fármacos que visam minorar o desejo intenso de voltar ao encontro com a droga (dependência e fissura): Álcool: amandatina, dissulfiram; Cocaína: fluoxetina; Opiáceos: terapia de substituição (metadona) - fármacos que visam diminuir o efeito desagradável da abstinência: Álcool: carbamazepina e benzodiazepínicos; Cocaína: desipramina; Opiáceos: clonidina, naltrexona; Tabaco: bupropiona - fármacos com efeito anticompulsivo: Álcool: acamprosato, naltrexona, neurolépticos; Cocaína: carbamazepina; Opiáceos: levometadilacetato, buspirona Psicoterapia - psicodinâmico, fenomenológico-existencial, cognitivo-comportamental, construtivista e sistêmico Estratégias de redução de danos - encara a questão das drogas sem disfarces - visam à cascata de eventos conseqüentes ao uso de drogas: transmissão de doenças; associação com tráfico; ingestão de drogas impuras que podem levar aos acidentes mortais ou piora da condição clínica. - incluem desde o fornecimento de seringas até a prescrição controlada de drogas por médicos e psiquiatras - ambição é de aproximar o drogadito à instituição médica e torná-lo mais apto ao tratamento. � PAGE \* MERGEFORMAT �4�
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