Buscar

AULA 03

Prévia do material em texto

AULA 03
O Popular, o Erudito e o Papel do Intelectual
Introdução
Nesta aula, abordaremos dois conceitos bastante controvertidos, que se ligam ao campo de estudos sobre Cultura. Trata-se da definição de “popular” e de “erudito”; das questões devem ser consideradas em suas conceitualizações. Em seguida, examinaremos algumas questões relacionadas ao conceito de “Intelectual”, este sujeito que demonstra interesse pronunciado pelas coisas da cultura, em toda sua amplitude e complexidade.
Concluiremos com observações acerca do papel do intelectual na sociedade e suas relações com o poder e da figura do intelectual nos dias de hoje.
Objetivos
Entender que o popular e o erudito são termos ideológicos e de complexa conceitualização.
Compreender que na prática há um diálogo, entre o conceito de popular e erudito, que dinamiza a cultura.
Conhecer a concepção do popular e do erudito no Modernismo, na Contracultura e na contemporaneidade.
Identificar o que é um intelectual por meio de algumas definições clássicas.
Compreender o papel do intelectual na sociedade e suas relações com o poder.
Entender a figura do intelectual hoje.
Os conceitos popular e erudito são tomados como opostos.
ERUDITO
O vocábulo erudito vem do latim erudítus, aquele “que obteve instrução, conhecedor, sábio”.
POPULAR
A palavra popular, também tem origem no latim populare, significa “de ou do próprio povo”.
Povo
A significação se estende a outros conceitos como: “feito para o povo, agradável ao povo, democrático”, até chegar em: “vulgar, trivial, ordinário, plebeu”.
Tradicionalmente, esses termos são carregados de ideologias.
Ideologias
Esses termos aparecem como categorias estáticas que carregam em si um julgamento, um juízo de valor.
Ao citar essas palavras em determinados contextos, já se revela a natureza do discurso. Trata-se de dois polos extremos de um pensamento dicotomizado, maniqueísta e tendencioso.
Entretanto, a expressão cultura popular e erudita/elite é criticada por certos estudiosos, como Roger Chartier e, dada a sua extensão e impressão homogeneizante que passa.
Roger Chartier
Roger Chartier opõe-se a toda tentativa de estabelecer um nexo entre nível social e nível cultural (popular ou erudito), com base em categorias sociológicas. Para ele, o que define erudito e popular são as práticas. Quanto à cultura popular, torna-se assim impossível identificá-la a partir de textos (artefatos culturais) consumidos por ela. Na verdade, filiando-se ao princípio de circularidade, Chartier mostra que a oposição entre popular e erudito não tem mais sentido, em razão dos empréstimos e intercâmbios. O que interessa é o estudo das práticas, porque elas permitem a apropriação diferente dos materiais culturais.
O autor mostra que há imbricações entre a cultura popular e a erudita e diferentes maneiras de apropriação dos objetos, não sendo, por vezes, possível estabelecer claramente a fronteira entre popular e erudito, encontrando formas originais de cultura do povo como queria alguns historiadores.
CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estudos Avançados. São Paulo, n° 11, 1991.
Roger Chartier
Chartier defende a ideia de que os sujeitos se apropriam e representam as práticas culturais de formas diversas.
Peter Burke
Já Burke, cunhou o termo “biculturalidade”, para expressar o quanto membros das elites conheciam e participavam da cultura popular, ao mesmo tempo em que preservam sua cultura.
Burke
Em outras palavras, práticas culturais eram compartilhadas entre membros do povo e das elites.
BURKE, Peter. Cultural popular na Idade Moderna.São Paulo: Cia das Letras, 1989, p.56.
O popular e o erudito no modernismo brasileiro
Na visão dos modernistas, somente a arte que integrasse a cultura erudita e a popular poderia representar o Brasil.
O que os modernistas pretendiam com isso?
Reformular a visão de cultura até então vigente, integrando as duas culturas, para unificá-las em uma só: a cultura brasileira. Essa visão de cultura popular modificou-se nos anos 60 do século XX, durante o regime militar, por aqueles que organizaram o movimento de contestação de caráter social e cultural chamado Contracultura.
Contracultura
A Contracultura, no Brasil, entendia cultura popular como sendo as representações do povo que deveriam ser usadas de forma a modificar, ou seja, a politizar este mesmo povo. Assim, eles faziam a distinção entre cultura erudita e popular. A primeira seria aquela que existiria como “instrumento de dominação”, “alienada e alienante”, visto que, segundo eles, não humanizava. Já a segunda seria a cultura que levaria o homem a assumir sua posição de sujeito da própria criação cultural e de operário consciente do processo histórico em que se acha inserido.
Assim, um movimento de cultura popular deveria ser fundamentalmente revolucionário e fazer arte com o povo, e não para o povo.
Entretanto, sabe-se hoje, que entre o popular e o erudito não há um abismo, mas uma passagem gradual.
Gradual
Esses conceitos estão imbricados, como polos de um mesmo fenômeno. Deste modo, deve-se pensa-los à luz de um sistema dialógico, em que se observa um constante processo de troca.
O Intelectual
Para tratarmos do intelectual vamos considerar três definições clássicas do termo:
O Intelectual Orgânico
Para Gramsci certo tipo de agente é capaz de fazer a ligação entre a “superestrutura” e a “infraestrutura”, independente de sua escolaridade específica, mas relacionada diretamente com o “lugar” que ocupa nas relações materiais/sociais de uma determinada produção social.
Superestrutura
A base ideológica de uma sociedade, isto é, as crenças, o direito, a política, a moral, as ideias, a religião, a arte.
Infraestrutura
As relações materiais de produção.
Como alguém sustentado por uma base material econômica e por uma ideologia emanada desta base que procura mantê-la, e aqueles que estão fora do poder, mas produzindo para este poder e afetados por sua ideologia.
A mediação se daria por meio da organização e formação de um senso crítico, junto a esse grupo, construído com a contribuição dos intelectuais.
O Intelectual Engajado
O intelectual é uma figura que intervém criticamente na esfera pública, transgredindo a ordem e criticando o existente, inclusive, a forma e o conteúdo da própria atividade das artes, ciências, técnicas, filosofia e direito.
Um “personagem” engajado que é contra todas as formas de exploração e dominação vigentes; é a favor da emancipação ou da autonomia em todas as esferas da vida econômica, social, política e cultural, o que o diferencia do ideólogo que fala a favor da ordem vigente, justificando-a e legitimando-a.
O Intelectual Universal
O intelectual apresentado por Michel Foucault pode ser qualquer um, já que segundo ele a estrutura de poder deve funcionar em uma sociedade por meio de um sistema disciplinar disperso, que funciona anonimamente, através de um controle incessante que se faz valer de práticas discursivas para aplicar-se sobre os sujeitos; sujeitos estes que aparecem sujeitando-se, como efeito de operações de poder.
Tal poder disciplinar está intrinsecamente ligado às ciências humanas, enquanto sistemas de conhecimento sobre seres humanos, dentre os quais a psicologia, a psiquiatria e a psicanálise assumem posição privilegiada.
Enquanto mediador simbólico, os intelectuais são os agentes que constroem, por exemplo, a identidade nacional; são os artífices desta identidade e da memória nacionais, desempenhando a tarefa de mediadores simbólicos. 
Todos se dedicam a interpretar o país cuja identidade será o resultado do jogo das relações apreendidas por cada autor, podendo ser chamados de mediadores simbólicos.
A construção da identidade nacional necessita desses mediadores, pois são eles que descolam as manifestações culturais de sua esfera particular e as articulam a uma totalidade que as transcendem.
Interpretar
Na verdade, esses intelectuais sãoagentes históricos que operam uma transformação simbólica da realidade sintetizando-a como única e compreensível – o processo de construção da identidade nacional se fundamenta sempre numa interpretação.
Mediadores
Confeccionam uma ligação entre o particular e o universal, entre o singular e o global.
Embora as concepções do intelectual engajado de Sartre e do intelectual orgânico de Gramsci estejam presentes até hoje, sobretudo entre os pensadores ditos de “esquerda”, a urgência hoje, passa por uma reformulação desta moral do engajamento, desta “vontade de servir” (ou dever).
Talvez hoje seja indispensável reavaliar a relação indivíduo/sociedade e consequentemente a relação entre intelectual e grupo social.
Para se entender melhor o papel dos intelectuais hoje, seria preciso definir novos tipos de relações que unem o indivíduo aos grupos.

Continue navegando