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1 Resumo: Atualmente v -se em uma crescente o n mero de adeptos da religi o Testemunhas de Jeov , baseada na doutrina da Sagrada Escritura eles n o aceitam a transfus o de sangue mesmo em casos de extrema necessidade. Foi analisada com este artigo a incapacidade civil da crian a e do adolescente e por consequ ncia a responsabilidade dos pais, que seguem esta religi o, se os mesmos podem tomar a decis o de realizar ou n o o tratamento espec fico de transfus o de sangue em crian as, al m da preponder ncia entre os princ pios de cren a religiosa e o direito a vida, ambos constantes na nossa Constitui o Federal. Atrav s de uma pesquisa qualitativa em doutrinas e jurisprud ncias levantamos dados e opini es acerca do referido assunto e neste sentido, conclu mos que obriga o do m dico e do Estado manter a sa de e vida da crian a e adolescente independente da opini o dos pais acerca da religi o. Palavras-chave: Crian a e Adolescente. Liberdade. Testemunhas de Jeov . Transfus o de sangue. 1 INTRODU O Com o aumento do n mero de adeptos da religi o intitulada Testemunhas de Jeov , precisamos discutir o limite entre a responsabilidade dos pais sobre a decis o de permitir ou n o a transfus o de sangue em crian as e adolescentes em situa o graves de sa de. Temos um contradit rio com os princ pios constitucionais que asseguram a sa de e vida dos mesmos, previsto na nossa Constitui o Federal de 1988 em seu artigo 5 caput, e, neste mesmo artigo no inciso VI temos preservado o direito liberdade de consci ncia e cren a. Costumeiramente, se faz necess rio a autoriza o dos pais em procedimentos realizados em menores, no entanto, para esta religi o n o permitida a transfus o de sangue por acreditarem que isso comprometeria a pureza do sangue. Haja vista o embate entre ci ncia e religi o, observaremos o papel do Estado e suas decis es em casos concretos, na qual envolvam a liberdade de cren a, a conduta do m dico e o direito fundamental a vida. Assim, identificaremos qual princ pio prevalece nas decis es do Tribunal de Justi a do RS e as opini es dos juristas. 3 superior, emprego p blico efetivo ou outro emprego que d independ ncia financeira a crian a e adolescente, tal qual dito no art. 5 do CC. Haja vista nosso c digo civil, constata-se que os pais, tutores ou curadores s o respons veis pela crian a e adolescente que esteja sob sua guarda. Desta forma, no pr ximo t pico explicaremos esta responsabilidade que os pais t m pelos seus filhos no mbito da assist ncia sa de. 3 RESPONSABILIDADE DOS PAIS PELA CRIAN A E ADOLESCENTE A responsabilidade dos pais pelas crian as e adolescentes est prevista na Constitui o Federal, onde costa que dever da fam lia, em primeiro lugar: Art. 227. dever da fam lia, da sociedade e do Estado assegurar crian a, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito vida, sa de, alimenta o, educa o, ao lazer, profissionaliza o, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e conviv ncia familiar e comunit ria, al m de coloc -los a salvo de toda forma de neglig ncia, discrimina o, explora o, viol ncia, crueldade e opress o. (Reda o dada Pela Emenda Constitucional n 65, de 2010). (BRASIL, Constitui o da Rep blica Federativa do Brasil de 1988, texto digital). Tamb m temos no ECA assegurado com prioridade direitos que adv m do dever da fam lia: Art. 4 dever da fam lia, da comunidade, da sociedade em geral e do poder p blico assegurar, com absoluta prioridade, a efetiva o dos direitos referentes vida, sa de, alimenta o, educa o, ao esporte, ao lazer, profissionaliza o, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e conviv ncia familiar e comunit ria. (BRASIL, ECA, texto digital). Desta forma, resta claro a obriga o dos pais pela vida e sa de da crian a e adolescente, devendo os mesmos zelar pelo bem maior destes e por isso questiona- se, at que ponto cabe ao respons vel decidir se permite ou n o a transfus o de sangue em crian as e adolescentes cujos pais s o adeptos a religi o Testemunhas de Jeov ? Nestes casos, nossa doutrina e legisla o asseguram que a responsabilidade pela decis o de ser feita ou n o a transfus o de sangue n o ser dos pais/respons veis, devendo ser suspenso o poder familiar por viola o de sa de. Ser obriga o do m dico realizar o procedimento ao paciente enfermo afim 4 de mant -lo vivo. Podemos constatar esta obriga o no Estatuto da Crian a e Adolescente, no Art. 129, inciso VI que diz: S o medidas aplic veis aos pais ou respons vel: VI - obriga o de encaminhar a crian a ou adolescente a tratamento especializado . 4 RELIGI O A religi o Testemunhas de Jeov se originou em 1869 por um grupo de estudo b blico liderado por Charles Taze Russel, nos Estados Unidos. Este grupo publicou em 1879 uma revista que hoje, em portugu s, denominada de A Sentinela . O grupo se propagou pela vizinhan a e em 1881, presidido pelo Russel formou-se a Sociedade de Tratados da Torre de Vigia de Si o, nos EUA, nome que foi modificado para Sociedade Torre de Vigia de B blias e Tratados. Posteriormente foi realizado um Congresso nos Estados Unidos, onde se apresentou o segundo presidente da sociedade, chamado Joseph Rutherford, que alterou o nome do grupo para Testemunhas de Jeov . Este presidente fundou a revista Despertai que utilizada pelos seus seguidores como meio de estudo at hoje. Passou-se com a morte de Rutherford a presid ncia para Nathan Knorr, ap s a Frederick Franz e Milton Geroge Henschel. No Brasil, o movimento chegou em 1922 ainda na presid ncia de Joseph, primeiramente no Rio de Janeiro e em seguida a S o Paulo. Segundo Leal (2017) apud (IBGE, 2014): O Brasil, um dos pa ses com o maior n mero de membros das TJs, at o ano de 2014, tinham-se 794.766 e os estados com o maior n mero de fi is, s o: S o Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul. As Testemunhas de Jeov se subdividem em Congrega es e objetivam ensinar os estudos b blicos, n o exigem d zimo e se mant m atrav s de donativos. Para eles, Jeov o criador de todas as coisas e por isso pregam a sua mensagem para transmitir conhecimento religioso. 5 Eles n o comemoram anivers rios e nem o Natal, contudo o fato mais intrigante a rejei o transfus o de sangue. Os adeptos da religi o acreditam que o sangue puro e sagrado e que se recebessem sangue de outra pessoa, este se tornaria impuro, inclusive, os mesmos s o castigados com o afastamento aos feitos religiosos, n o sendo mais considerado membro das Testemunhas de Jeov caso passem por este procedimento. 5 LIBERDADE RELIGIOSA DA CRIAN A E DO ADOLESCENTE A Constitui o Federal de 1988 emerge em um cen rio p s ditadura militar e preocupou-se assim em assegurar alguns direitos anteriormente reprimidos, como a liberdade. Esse direito pode ser exercido nas mais variadas dimens es, dentre elas, est a liberdade religiosa, garantida constitucionalmente no art. 5 , inciso VI que disp e: inviol vel a liberdade de consci ncia e de cren a, sendo assegurado o livre exerc cio dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, prote o aos locais de culto e a suas liturgias . percept vel que a Constitui o se preocupou que todos pudessem ter sua op o religiosa respeitada, uma vez que no inciso VIII do referido artigo prescrito: ningu m ser privado de direitos por motivo de cren a religiosa ou de convic o filos fica ou pol tica (...) . Conforme Moura KUO (Cartilha da OAB SP), o artigo: Veda justamente a discrimina o e preteri o do cidad o por motivos de convic o religiosa, impondo, de consequ ncia, a denominada escusa de consci ncia , medida que desonera da obriga o atodos imposta, mas para assegurar a todos o direito de tratamento igualit rio, imp e o cumprimento de presta o (obriga o) alternativa, tudo a harmonizar os diversos princ pios e garantias constitucionais em evid ncia. Desse modo, compreende-se que assegurado aos indiv duos o respeito a suas convic es, ou seja, ningu m poder ser for ado a realizar atos que n o estejam de acordo com suas orienta es religiosas, nem mesmo poder o ser submetidos a tratamento m dico sem seu consentimento, inclusive o recebimento de transfus o de sangue. Neste sentido Alexandre de Moraes leciona que o constrangimento pessoa humana de forma a renunciar sua f representa o desrespeito diversidade democr tica de ideias, filosofias e a pr pria diversidade espiritual . 6 No que tange crian a e ao adolescente, o Estatuto da Crian a e do Adolescente em seu art. 16, inciso III, prescreve: O direito liberdade compreende os seguintes aspectos: [...] III - cren a e culto religioso; Ou seja, o direito liberdade religiosa, garantido constitucionalmente no art. 5 , foi estendido tamb m crian a e ao adolescente. Por n o possu rem discernimento suficiente, normalmente a crian a profere a mesma cren a que seus pais, uma vez que crescem com essa pr tica no seio familiar. Por m, o art. 17 do ECA prev que o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade f sica, ps quica e moral da crian a e do adolescente, abrangendo a preserva o da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e cren as, dos espa os e objetos pessoais , afirmando portanto que devem ser respeitada a posi o da crian as, independentemente de serem ou n o iguais a dos seus pais, sendo um dever do Estado garantir que os interesses das crian as e adolescentes sejam respeitados. Apesar de ser um direito fundamental assegurado, quando estamos diante de um conflito de duas garantias, Freitas e Guimar es pondera: A liberdade de cren a religiosa pode ser restringida caso o seu exerc cio possa amea ar a coexist ncia de outros valores constitucionalmente protegidos, at porque a ci ncia do direito n o estanque ou imodific vel. No entanto, isto n o significa dizer que os direitos fundamentais possam ser constantemente suprimidos. Ao contr rio, qualquer limita o a direitos fundamentais deve ser impedida, cabendo ao judici rio demonstrar a justificativa da limita o em raz o de um interesse mais importante, que possua maior peso no ordenamento jur dico nacional. Desse modo, diante de uma crian a emitente perigo de morte, pode os pais se recusarem a transfus o de sangue? A vida ou a liberdade religiosa devem ser preservadas? 6 DIREITO VIDA DA CRIAN A E DO ADOLESCENTE O direito vida, consagrado constitucionalmente no caput do art. 5 , essencial, uma vez que sem ele, n o poss vel efetivar os demais direitos. Neves, ao escrever para a Revista da Universidade de Bras lia, defende o direito vida 7 opera, para al m de sua condi o de direito fundamental aut nomo, como pressuposto fundante de todos os demais direitos fundamentais, verdadeiro pr - requisito da exist ncia dos demais direitos consagrados constitucionalmente . Freitas e Guimar es definem a vida como um direito fundamental, garantido constitucionalmente, como um bem inviol vel, que est no pice do ordenamento jur dico, protegido prioritariamente pelo Estado, uma vez que um bem indispon vel . No que tange a vida da crian a e do adolescente, a Constitui o de 88 traz a previs o no art. 227, caput e no art. 7 , caput do Estatuto da Crian a e do Adolescente: Art. 227: dever da fam lia, da sociedade e do Estado assegurar crian a e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito vida, sa de, alimenta o, ao lazer, profissionaliza o, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e conviv ncia familiar e comunit ria, al m de coloc - los a salvo de toda forma de neglig ncia, discrimina o, explora o, viol ncia, crueldade e opress o. Art. 7 : A crian a e o adolescente t m direito a prote o vida e sa de, mediante a efetiva o de pol ticas sociais p blicas que permitem o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condi es dignas de exist ncia. Ao analisar os dispositivos, percept vel a prote o especial que a vida da crian a e do adolescente merece, tanto por parte dos pais como do Estado. Dessa forma, diante da recusa dos pais em permitir que seu filho se submeta ao tratamento de transfus o de sangue, deve se levar em considera o a situa o peculiar das crian as e adolescentes. 7 JURISPRUD NCIA Retirado do site digital tjrs.jus.br a jurisprud ncia que segue com n mero 70071994727, julgada na D cima C mara C vel, se tratando de uma indeniza o de dano moral, na comarca de Porto Alegre: Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL. TESTEMUNHA DE JEOV . DANO MORAL E MATERIAL. PROCEDIMENTO CIR RGICO. NEGATIVA DO M DICO EM PRESTAR SEUS SERVI OS FACE EVENTUAL NECESSIDADE DE TRANSFUS O DE SANGUE, RECUSADA PELO PACIENTE POR CONCEP O RELIGIOSA. CONFLITO ENTRE A LIBERDADE DO PROFISSIONAL DA MEDICINA E A RELIGI O DO PACIENTE. AGRAVO RETIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. Conforme 8 disposto no artigo 370 do C digo de Processo Civil, ao juiz cumpre determinar, de of cio, a realiza o das provas que entende necess rias instru o do processo e indeferir os pedidos que entender in teis ou meramente protelat rios. A realiza o de per cia m dica mostrou-se desnecess ria ao exame do m rito porquanto n o se discute nos autos erro m dico na realiza o do procedimento cir rgico, mas sim a licitude da recusa do m dico anestesista em participar. Ademais, a prova constante dos autos evidenciou suficientemente os riscos inerentes ao procedimento indicado ao autor no que tange eventual necessidade de transfus o de sangue. M RITO. Hip tese em que o autor teve indica o m dica para a realiza o de ato cir rgico RTU prost tico, cujo procedimento seria realizado atrav s do SUS. Contudo, por motivo de cren a religiosa, negou- se ao tratamento de transfus o de sangue, em caso de necessidade. Diante desta manifesta o, o m dico anestesista recusou-se a participar da cirurgia, invocando preceitos do C digo de tica da Medicina, optando o paciente pelo procedimento na via privada. Conforme o art. 5 , inciso VI, da CF, o aspecto individual da liberdade religiosa, um direito fundamental, assegura quele que professa a sua f escolhas e medidas que guardem e respeitem sua cren a, inclusive com rela o a atos ligados ao seu bem- estar e at mesmo sua condi o de sa de, circunst ncias estas que agasalham a decis o de recusa no tratamento por hemotransfus o. Ao m dico, assegura-se o direito/dever de exercer a profiss o com autonomia, n o sendo obrigado a prestar servi os que contrariem os ditames de sua consci ncia ou a quem n o deseje, excetuadas as situa es de aus ncia de outro m dico, em caso de urg ncia ou emerg ncia, ou quando sua recusa possa trazer danos sa de do paciente, bem como, ocorrendo fatos que, a seu crit rio, prejudiquem o bom relacionamento com o paciente ou o pleno desempenho profissional. O m dico tem o direito de renunciar ao atendimento, desde que o comunique previamente ou a seu representante legal, assegurando-se da continuidade dos cuidados e fornecendo todas as informa es necess rias ao profissional que lhe suceder. Exegese do inciso VII, Cap tulo I e do 1 do art. 36 do C digo de tica da Medicina. Diante do conflito entre as liberdades de consci ncia dos envolvidos, tem-se que a recusa do m dico n o evidencia ato il cito a ensejar repara o. Di logo entre ambas as condutas e manifesta es filos ficas. Aus ncia de risco de vida iminente, mostrando-se plenamente poss vel o encaminhamento a outro profissional moral e ideologicamente desimpedido. Interpretao conforme as regras do C digo de tica da Medicina. A ocorr ncia dos fatos no mbito do Sistema nico de Sa de n o afasta a prerrogativa que desobriga o m dico a prestar servi os que contrariem os ditames da sua consci ncia. O autor deliberadamente optou pela realiza o da cirurgia pelo sistema privado de sa de, sem que fosse oportunizado ao Poder P blico o encaminhamento a outro profissional da medicina. Constatada a licitude da conduta do preposto do Hospital-r u imp e-se invers o do julgamento com a improced ncia do pedido indenizat rio. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. APELA O C VEL PROVIDA. (RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justi a, 2017). Segue a jurisprud ncia de n mero 70058469362, julgada pela Vig sima Segunda C mara C vel na comarca de Erechim, sendo o assunto, tratamento m dico-hospitalar e/ou fornecimento de medicamentos, retirado do site digital tjrs.jus.br. Ementa: SA DE. CIRURGIA. TRANSFUS O DE SANGUE. LIBERDADE DE RELIGI O. TESTEMUNHA DE JEOV . Distin es, na presta o do servi o p blico de sa de, para atender s convic es religiosas ferem o direito igualdade na reparti o dos encargos p blicos. Da que a liberdade 9 de religi o garantida a todos pela Constitui o da Rep blica n o assegura o direito pessoa humana de exigir do Estado presta o diferenciada no servi o p blico para atender s regras e as praticas da f que professa. Recurso desprovido. (RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justi a, 2014). Retirado do site digital tjrs.jus.br, segue a jurisprud ncia de n mero 70050497692, da Quinta C mara C vel da comarca de Porto Alegre, sendo seguro o assunto: Ementa: APELA O C VEL. PLANO DE SA DE. COBERTURA. PROCEDIMENTO REALIZADO POR M DICO N O CREDENCIADO. NEGATIVA DE COBERTURA PARA CIRURGIA DE HISTERECTOMIA TOTAL, SEM A POSSIBILIDADE DA REALIZA O DE TRANSFUS O DE SANGUE, SE NECESS RIO, DURANTE O PROCEDIMENTO. CREN A RELIGIOSA. DEVER DE INDENIZAR N O EVIDENCIADO. Inexiste abusividade na negativa de cobertura para realiza o de procedimento "sem sangue", realizado por m dico particular, n o credenciado ao plano de sa de. Caso em que a paciente, por motivo de cren a religiosa (Testemunha de Jeov ), se nega a receber transfus o de sangue, mesmo caso necess rio, contrariando a t cnica tradicional. Os m dicos conveniados n o podem ser compelidos a atuar com t cnica diversa, que n o caracteriza especializa o e com significativo aumento de risco vida e integridade f sica do paciente. Ademais, n o verificada situa o de urg ncia ou emerg ncia. Senten a mantida. Precedentes. RECURSO DESPROVIDO. (RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justi a, 2012). Tamb m foram coletados dados do site do Tribunal de Justi a de S o Paulo (esaj.tjsp.jus.br), por motivo de n o existirem registros de casos envolvendo crian as e adolescentes no Tribunal de Justi a do Rio Grande do Sul. A jurisprud ncia que segue abaixo um Agravo Regimental sobre Plano de Sa de, que foi julgado na cidade de Sorocaba e teve como rg o julgador a 1 C mara de Direito Privado: Ementa: Agravo de instrumento. Sa de. Cobertura de procedimento cir rgico com t cnicas que evitem a transfus o de sangue. Equipe m dica especializada no procedimento que n o faz parte da rede credenciada. Convic es religiosas e pessoais dos autores que, em princ pio, n o podem impor maior nus seguradora. Por m, procedimento cir rgico pedi trico que parece ser de urg ncia, conforme relat rio m dico acostado. Aparente demora da operadora em indicar entidade hospitalar conveniada preparada para realiz -lo. Incid ncia do art. 12, VI, da Lei 9.656/98. Amplia o da tutela antecipada concedida na origem. Recurso provido, prejudicado o regimental. (S O PAULO. Tribunal de Justi a, 2016). Por fim, segue um Habeas Corpus de Crimes Contra a Vida, que foi julgada pela Quinta Comarca Criminal de F rias, retirado do site esaj.tjsp.jus.br: Ementa: Vistos, relatados e discutidos estes autos de HABEAS CORPUS n 257.721-3/1-00, da Comarca de S O VICENTE, em que impetrante o Bacharel WILSON RICARDO LIGIERA, sendo paciente H LIO VIT RIA DA SILVA: ACORDAM, em Quarta C mara Criminal de Julho/98 do Tribunal de Justi a do Estado de S o Paulo, por vota o un nime, denegar a ordem. A impetra o persegue o trancamento de a o penal instaurada contra o 10 paciente perante o E. Ju zo da 3a Vara Criminal da Comarca de S o Vicente, e na qual ele acusado de infra o do disposto no artigo 121, caput, c.c. o artigo 61, II, "e'\ ambos do C digo Penal; segundo a den ncia, teria ele dado causa morte de sua filha, ao n o permitir, em virtude de suas convic es religiosas, que a menor recebesse transfus o de sangue, provid ncia que lhe era indispens vel recupera o da sa de. Sustenta a peti o inicial que o paciente, ao ser interrogado, negou ter procurado impedir a transfus o e que a pr pria m dica que atendia a menor n o tinha certeza acerca dos efeitos daquela provid ncia; e, por outro lado, como H lio n o pertencia seita "Testemunhas de Jeov ", n o poderia ele ter buscado impedir a transfus o cuja realiza o, ali s, se presente o risco de vida, prescindia de autoriza o; a v tima, sim, pertencente referida seita, n o teria. (S O PAULO. Tribunal de Justi a, 1999). Fazendo uma an lise geral das jurisprud ncias retiradas do site do Tribunal de Justi a do Rio Grande do Sul (tjrs.jus.br), poss vel constatar que a maior parte dos casos onde h conflito dos princ pios constitucionais - religi o X vida, ocorrem em cidades com maior n mero de habitantes (Porto Alegre e Erechim, por ex.), em raz o de, nesses locais, a religi o ser mais difundida e possuir um maior n mero de adeptos. Tamb m se percebe que a maior parte dos pacientes que recorrem ao judici rio buscam um tratamento alternativo a transfus o de sangue para que seja efetivado e respeitado seu direito a liberdade de cren a. Nesses casos, se tratando de pessoas adultas e capazes, os magistrados t m entendido que deve ser respeitada a vontade do paciente, mesmo que isso implique em complica es na sua sa de, visto sua capacidade de decidir se quer ou n o, ou seja, h preval ncia do direito de liberdade de cren a. Por m, se tratando de incapazes crian as e adolescentes, com base nas jurisprud ncias, entendido que quando houver risco de vida para o paciente, os m dicos devem optar por fazer a transfus o de sangue, mesmo contra a vontade de seus respons veis, pois dever de todos zelar pela vida da crian a e do adolescente que ainda n o possui discernimento suficiente para decidir se quer ou n o se submeter ao tratamento. 11 8 PONDERA O DE DIREITOS NO CASO CONCRETO Quando nos deparamos com um caso envolvendo recusa na transfus o de sangue em crian as e adolescentes, surge o conflito de dois direitos que est o em um mesmo patamar constitucional - vida X liberdade religiosa. Diante disso, preciso fazer a chamada pondera o de valores , que consiste em atribuir, para o caso concreto, valor, import ncia a determinados princ pios que est o em conflito. Os referidos autores explicam que: Busca-se a atribui o real da import ncia de tal direito e seu peso no ordenamento, para que haja a escolha, no caso concreto, do direito fundamental que dever prevalecer, sendo que este direito perdurar naquela situa o concreta. No entanto, cabe ressaltar que a escolha sempre ser baseada em um ju zo de valor, fundamentada no princ pio da proporcionalidade, para que n o haja discrimina es e arbitrariedades. O ministro Alexandre de Moraes, ao discutir sobre o tema, pondera como o int rprete deve agir no caso concreto: Se houve conflito entre dois ou mais direitos ou garantias fundamentais, o int rprete deve utilizar-se do princ pio da concord ncia pr tica ou da harmoniza o, de forma a coordenar e combinar os bens jur dicos emconflito, evitando o sacrif cio total de uns em rela o aos outros. No que tange ao mbito jur dico, relevante o disposto no art. art. 146, 3 , I do C digo Penal, que em situa es com iminente risco de vida, se configura constrangimento ilegal a interven o m dica necess ria sem o consentimento do paciente ou representante legal. Assim, nota-se que se n o houver outro meio de salvar o paciente, a orienta o realizar o procedimento, independente da vontade dos pais, optando por priorizar, nesse caso, a vida. No mesmo sentido, Neves afirma: A pessoa no gozo de suas faculdades mentais pode decidir se ser ou n o submetida ao referido tratamento, sob pela de viola o do seu direito de cren a e, consequentemente, da sua dignidade humana. Aquelas pessoas, por m, que estejam inconscientes ou forem incapazes, n o podem atribuir a outrem o direito de deliberar sobre a sua vida, sob pena de a equipe m dica responder pelo crime de omiss o de socorro. Ademais, o referido autor explica a situa o do m dico nesses casos: O C digo de tica M dica estabelece em seu art. 1. o seguinte: A medicina uma profiss o que tem por fim cuidar da sa de do homem, sem preocupa es de ordem religiosa ( ) . Sobre o tema espec fico em an lise, 12 o Conselho Federal de Medicina j se manifestou em Res. 1.021/1980, nos seguintes termos: Em caso de haver recusa em permitir a transfus o de sangue, o m dico, obedecendo a seu C digo de tica M dica, dever observar a seguinte conduta: 1. - Se n o houver iminente perigo de vida, o m dico respeitar a vontade do paciente ou de seus respons veis. 2. - Se houver iminente perigo de vida, o m dico praticar a transfus o de sangue, independentemente de consentimento do paciente ou de seus respons veis . A Relatora Ju za V nia Hack de Almeida, ao analisar situa o em que uma crian a necessitava de transfus o de sangue para sobreviver (APELA O C VEL N 2003.71.02.000155-6/RS), considerou em seu voto que: Segundo o Estatuto da Crian a e do Adolescente, a crian a tem direito de prote o vida e sa de. Tamb m protege-se a liberdade da cria o da crian a, fornecendo o acesso cultura e s informa es, no intuito de que, com a idade suficiente, venham a decidir sobre sua conduta e assumir conscientemente os risco de suas op es. Enquanto isso n o ocorre, os pais podem ter sua vontade substitu da em prol de interesses maiores, principalmente em se tratando do pr prio direito vida. A restri o liberdade de cren a religiosa encontra amparo no princ pio da proporcionalidade, porquanto ela adequada a preservar a sa de da autora. necess ria porque em face do risco de vida a transfus o de sangue torna-se exig vel e, por fim ponderando-se entre vida e liberdade de cren a, pesa mais o direito vida, principalmente em se tratando da vida de filha menor imp bere. 9 CONCLUS O A colis o entre o direito vida e liberdade de cren a evidente quando o paciente seguidor da religi o Testemunha de Jeov se recusa a receber transfus o de sangue necess ria para salvar sua vida. Sabe-se que impor ao cidad o determinado procedimento que se contraponha a sua convic o religiosa um desrespeito a sua liberdade, assim, quando se tratar de indiv duo adulto e capaz, deve ser levada em considera o a escolha do paciente. Por m, no caso da crian a e do adolescente, cabe ressaltar que o poder familiar n o absoluto, pois na hip tese de recusa dos pais, se houver risco de vida, cabe ao m dico decidir o que deve ser feito, sempre priorizando a vida, que direito do paciente e n o dos seus respons veis. Tamb m, preciso considerar que o Estado deve procurar, sempre que poss vel, fornecer tratamentos alternativos transfus o, pois desse modo estaria 13 assegurando que os dois direitos fundamentais fossem efetivados, sem precisar suprimir um deles. 14 REFER NCIAS BRASIL. Constitui o da Rep blica Federativa do Brasil de 1988. Bras lia, 5 de outubro de 1988. PLANALTO. Dispon vel em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 29 out. 2017. BRASIL. Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940. C digo Penal. PLANALTO. Dispon vel em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto- lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 01 de novembro de 2017. BRASIL. 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