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GEOLOGIADA REGIÃODAS MINAS DO CAMAQUÃ Paulo Sérgio Gomes Paim Ricardo Cunha Lopes RESUMO As minas do Camaquã, um clássico distrito mineiro do RS, inserem-se no contexto evolutivo da bacia do Camaquã, bacia essa que registra, no Rio Grande do Sul, os episódios vulcano-sedimentares do Estágio de Transição da Plataforma Sul-americana e está geneticamente relacionada aos processos tectono-magmáticos tardios do Cinturão Dom Feliciano (evento Brasiliano no sul do Brasil). A bacia do Camaquã representa um lócus deposicional onde foi preservado o registro da su- perposição de diversos tipos de bacias, com características geológicas próprias e meca- nismos de subsidência distintos. A sucessão vulcano-sedimentar aflorante na região das minas do Camaquã engloba três unidades aloestratigráficas relativamente mais deformadas (alogrupos Bom Jar- dim, Cerro do Bugio e Santa Bárbara) sobrepostas por uma unidade dominante- mente horizontal (Alogrupo Guaritas). De modo similar ao que ocorre no interior de toda a Bacia do Camaquã, o contato entre essas unidades na região é também de- lineado por discordâncias angulares. Essas unidades registram a porção preservada de sucessões sedimentares vinculáveis a quatro distintas bacias que se formaram, fo- ram preenchidas e tiveram seus depósitos deformados no decorrer das fases finais da orogênese Brasiliana. Nesse sentido incluem o registro parcial das bacias transcor- rentes de retroarco Bom Jardim (Alogrupo Bom Jardim) e Acampamento Velho (Alogrupo Cerro do Bugio), da bacia transcorrente Santa Bárbara (Alogrupo San- ta Bárbara) e do hemi-graben Guaritas (Alogrupo Guaritas). Sistemas fluviais e deltaicos, caracterizados por canais entrelaçados (porções subaéreas) e turbiditos (porções subaquáticas), transportando sua carga sedimentar para NE, domi- naram o cenário geológico na região das minas do Camaquã no decorrer do preenchimen- to das bacias transcorrentes Bom Jardim, Acampamento Velho e Santa Bárbara. Durante a evolução do hemi-graben Guaritas, por outro lado, tem-se o registro de uma importante atividade vulcânica básica, associada a um contexto desértico dominado por depósitos eólicos. Sobre essa sucessão vulcano-sedimentar, sobrepõem-se, na área das mi- nas do Camaquã, depósitos de leques aluviais gerados a partir do bordo leste da bacia. As minas do Camaquã, ativas até 1996, incluemmineralizações disseminadas e fi- loneanas de Cu, Pb, Zn (Au e Ag) que ocorrem em rochas hospedeiras pertencentes aos alogrupos Bom Jardim (Arenito Inferior) e Cerro do Bugio (Conglomerados Inferior e Superior e Arenito Intermediário). A origem e época de formação desses depósitos metálicos, bem como a fonte dos metais, constituem temas científicos de im- portância econômica, amplamente estudados mas ainda sujeitos a controvérsia, os quais são abordados em outros capítulos deste livro. 111 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ INTRODUÇÃO Este capítulo tem como principal objetivo apresentar as principais características relacionadas à sucessão estratigráfica aflorante na região das minas do Camaquã, situada na porção sul da sub-bacia Guaritas (Figura 1). Apesar de res- trita, a área é caracterizada por uma geologia relativamente complexa, namedida em que inclui diversas unidades geradas em contextos tectônicos e paleogeográficos distintos. Por outro lado, este capítulo serve também como um apoio geológico para situar as mineralizações de Cu, Pb e Zn (Au e Ag) ocorrentes na região. Deve-se ressaltar que as características litológicas da sucessão estra- tigráfica, somadas à atuação de processos endógenos (deformação tectônica) e exógenos (intemperismo e erosão), acabampor produzir óbvias e importantes im- plicações em termos geomorfológicos, drenagem, vegetação e uso do solo. Nesse sentido, este capítulo constitui também um subsídio relevante para a caracteriza- ção domeio físico sobre o qual a região das minas do Camaquã encontra-se assen- tada e, dessemodo, como um apoio à proposição de políticas de gestão ambiental, uso do solo e organização de roteiros eco e geoturísticos. Neste capítulo procurar-se-á situar as rochas aflorantes na região das minas do Camaquã dentro de um contexto geológicomais amplo, apresentar os trabalhos anteriores que versaram sobre a estratigrafia local, fácies sedimentares e sistemas deposicionais, mostrar a concepção dos autores acerca desses mesmos te- mas, e finalizar apresentando uma síntese evolutiva para a área fundamentada nos aspectos tectônicos, estratigráficos e sedimentares previamente discutidos. Por fim, considera-se adequado tecer algumas considerações concei- tuais relativas ao uso de alguns termos definidos em trabalhos anteriores (Paim et al., 1999). Nesse sentido, Bacia do Camaquã é utilizado de forma a englobar todas as áreas do Escudo Sul-rio-grandense onde se encontram preservadas as suces- sões vulcano-sedimentares representativas doEstágio de Transição da Plataforma Sul-americana (Almeida, 1969). Por outro lado, cada uma dessas áreas representa, de forma individual, uma sub-bacia namedida em que essas possuemuma história deposicional, erosional e tectônica diferenciada mas correlacionável. Nesse senti- do, os termos Bacia do Camaquã e sub-bacia possuem uma forte conotação fisio- gráfica. Já os termos bacias transcorrentes de retroarco, bacia transcorrente e hemi-graben referem-se ao contexto tectônico e geológico sob o qual as distintas sub-bacias, de forma individual ou não, foram geradas e evol uíram. Nesse senti- do, esses últimos termos agregam um caráter genético mais do que fisiográfico. O termo aloestratigrafia e seus derivados (alogrupo, aloformação, etc.) referem-se a uma abordagem formal que procura delimitar os distintos pacotes sedimentares (unidades aloestratigráficas) que compõem uma sucessão sedimentar qualquer a partir da ocorrência de discordâncias para, com isto, facilitar a discussão acerca da evolução geológica de uma bacia, tanto em termos de episódios deposicionais 112 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES 113 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ C A Ç A P A V A D O S U L S Ã O S E P É C A C H O E IR A D O S U L S A N T A N A D A B O A V IS T A S Ã O G A B R IE L D O M P E D R IT O B A G É LA V R A S D O S U L B R 29 0 BR 153 BR 15 3 B R 29 0 B R 2 90 BR 39 2 B R 29 3 BR153RS 11 R S 11 2 1b 1a 3 4a 4b 52 o 30 ' 54 o 00 ' 30 o 0 0' 31 o 4 0' 0 5 0K m E sc al a R IO G R A N D E D O S U L P or to A le g re OC EA NO AT LÂ NT IC O 40 0 0 0 B R A S IL OC EA NO AT LÂ NT IC O 70 0 30 0 L O C A L IZ A Ç Ã O C O N V E N Ç Õ E S C o be rt u ra s S e d im e nt a re s F a n er o zó ic a s B a ci a d o C am aq u ã (4 7 0 - 6 2 0 M a .) G ra n ito s a ss o ci ad o s a B a ci a d o C a m aq u ã (5 4 0 -6 1 0 M a .) C in tu rã o G ra n íti co -G ná is si co D om F e lic ia n o (5 9 0 -6 5 0 M a .) C o m p le xo G ra n ul íti co S a n ta M ar ia C h ic o (~ 2 ,1 B a .) e g n a is se s d e fá ci e s a nf ib o lit o C in tu rã o T iju ca s (7 70 - 8 0 0 M a ) C in tu rã o Vila N o va (7 0 0 - 85 0 M a .) 1 a - P iq ui ri 4 a - R am ad a 3 - S a nt a B á rb a ra 2 - G u a rit as 1 b - A rr oi o B oi ci BaciadoCamaquã 4 b - T aq u a re m b ó S ub -B ac ia s M in a s d o C a m aq u ã F ig ur a 1 - C om pa rt im en ta çã o ge ol óg ic a si m pl ifi ca da do E sc ud o Su l-r io -g ra nd en se (P ai m e t a l ., 19 99 ). como daqueles de caráter erosional ou não deposicional que pontuaram seu regis- tro geológico. CONTEXTOGEOLÓGICOREGIONAL A Bacia do Camaquã repousa por sobre os terrenos ígneos e meta- mórficos do Escudo Sul-rio-grandense, o qual engloba os cinturões (1) Graníti- co-Gnáissico Dom Feliciano, (2) Tijucas e (3) Vila Nova, bem como o (4) ComplexoGranulítico SantaMaria Chico e rochas granito-gnáissicas de fácies an- fibolito associadas (Chemale Jr., 1997). As rochas dos cinturões Tijucas e Vila Nova e do ComplexoGranulítico SantaMaria Chico formamo embasamento das associações plutono-vulcano-sedimentares que constituem o registro geológico da bacia do Camaquã (Figura 1). O Cinturão Tijucas, sobre o qual a sub-bacia Guaritas encontra-se assentada, inclui as rochas metavulcano-sedimentares do Grupo Porongos, com vulcanismo entre 800 e 770 Ma e protólito de idade transamazônica, e o Gnaisse Encantadas e rochas correlatas, geradas no Paleoproterozóico (2.3-2.1Ga) e retra- balhadas em torno de 800 Ma (Chemale Jr., 1997). As concepções propostas acerca do regime tectônico responsável pela geração e evolução da Bacia do Camaquã são bastante variadas e incluem (a) hipóteses desvinculadas da teoria da tectônica de placas (Loss & Roisen- berg,1972); (b) modelos relacionando a gênese da bacia a uma tectônica colisional das unidades litotectônicas brasilianas, e conseqüente subsidência flexural (Issler, 1982, 1983, 1985; Jost, 1984; Gresse et al., 1996); (c) hipóteses vinculadas a um episódio final do ciclo brasiliano caracterizado por reativações transcorrentes de escala regional e/ou continental e conseqüente formação de bacias do tipo stri- ke-slip (Almeida et al., 1976; Wernick et al., 1978; Almeida et al., 1981; Machado & Fragoso-César, 1987; Brito Neves & Cordani, 1991; Oliveira & Fernandes, 1991, 1992; Fernandes et al., 1992, eMachado& Sayeg, 1992); e (d) modelos compostos, partindo de uma tectônica colisional seguido por uma fase de deformação trans- tracional e/ou extensional (Fragoso-Cesar et al., 1982, 1984, 1992; Beckel, 1990, 1992; Sayeg et al., 1992; Sayeg, 1993; Chemale Jr., 1993; Paim et al., 1999). A Bacia do Camaquã, geneticamente relacionada aos processos tec- tono-magmáticos tardios do Cinturão Dom Feliciano, é aqui entendida como um lócus deposicional onde foi preservado o registro da superposição de diversos ti- pos de bacias sedimentares, com características geológicas próprias e mecanismos de subsidência distintos (Paim et al., 1999). Segundo esses autores, as unidades aflorantes na região das minas do Camaquã incluem o registro geológico parcial das bacias transcorrentes de retroarcoBom Jardim (590-573Ma) e Acampamento Velho (573- 559Ma), da Bacia Transcorrente Santa Bárbara (559-540Ma) e do he- mi-graben Guaritas (470-450? Ma). 114 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES TRABALHOSANTERIORES Estratigrafia Neste item serão abordados apenas os trabalhos desenvolvidos ex- clusivamente na região das minas do Camaquã e aqueles outros que, mesmo ten- do tratado de uma área mais ampla, abordaram, de forma explícita, a sucessão estratigráfica aflorante na área em questão. Coube a Carvalho (1932) a proposição da Série Camaquan, incluin- do toda a sucessão aflorante na região da minas do Camaquã. Essa unidade englo- baria os depósitos contidos entre as Erupções de Andesitos e Tufos Vulcânicos (definidos na região de Lavras do Sul, mas identificados também nas costas do rio Camaquã, na jazida de cobre desse mesmo nome, no município de Caçapava) e a sucessão permiana da Bacia do Paraná. Leinz et al. (1941) subdividiram a Série Camaquã de Carvalho (1932) em duas unidades, uma caracterizada por camadas fortemente mergulhantes e a outra por camadas horizontais. Na região das minas do Camaquã, esses autores concluíram por uma gradativa diminuição da inclinação enquanto em outras áreas essa passagem seria brusca (p. ex., Cerro dos Martins). Coube, no entanto, a Ro- bertson (1966) a primazia na caracterização da importante discordância angular que delineia o contato entre as formações Santa Bárbara (camadas inclinadas) e Guaritas (depósitos horizontais), registrada a norte das minas do Camaquã. Em um trabalho demapeamento daQuadrícula de Caçapava do Sul, Ribeiro et al. (1966) individualizaram, na região das minas do Camaquã, os grupos Bom Jardim e Camaquã, separados entre si por uma discordância. Segundo esses autores, a unidade mais antiga (Grupo Bom Jardim) seria representada na área pela Formação Arroio dos Nobres (membros Mangueirão e Vargas), enquanto o Grupo Camaquã seria constituído pelas formações Santa Bárbara (incluindo o membro Rodeio Velho na sua base) e Guaritas, essas últimas limitadas por uma discordância angular. Proposta similar foi posteriormente apresentada por Ribei- ro & Lichteberg (1978) e Ribeiro & Fantinel (1978), com a diferença de que esses últimos autores situaram a Formação Acampamento Velho (exposta no Cerro da Cruz) entre as formações Arroio dos Nobres e Santa Bárbara e em discordância angular com ambas. As excelentes exposições encontradas na área, somadas aos mapea- mentos de detalhe executados na região por geólogos da Companhia Brasileira do Cobre (CBC), permitiram a Teixeira et al. (1978) e Gonzalez & Teixeira (1980) a proposição de uma coluna estratigráfica de maior detalhe, principalmente no que concerne às unidades mineralizadas. Para esses autores, a sucessão aflorante na área inclui, da base para o topo, os membros Mangueirão e Vargas (transicionais entre si) da FormaçãoArroio dos Nobres de Ribeiro et al. (1966), a qual é recober- 115 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ ta, através de uma discordância angular, pelas rochas doGrupoCamaquã (Forma- ção Guaritas). Para esses autores, o membro Vargas pode ser subdividido nos seguintes níveis estratigráficos informais que se sucedem verticalmente: (1) Areni- to Inferior (350-400 m); (2) Conglomerado Inferior (80-100m); (c) Arenito Inter- mediário (20-25 m); Conglomerado Superior (200-300m); e Arenito Superior. Em trabalhomais recente, Fambrini (1998) utilizou-se de uma nova proposta estratigráfica para a sucessão aflorante na região das minas do Camaquã. Segundo esses autores, as exposições sedimentares na região incluem uma unida- de estratigráfica basal Grupo Camaquã, constituído da base para o topo, pelas formações Mangueirão, Vargas e João Dias discordantemente sobreposta pelo Grupo Guaritas, esse subdividido, da base para o topo, pelas formações Guarda Velha, Pedra Pintada e Varzinha. Segundo a proposta adotada neste capítulo, baseada em trabalho de cunho mais abrangente (Paim et al., 1999), as exposições registradas na região das minas do Camaquã incluem uma série de unidades limitadas entre si por discor- dâncias (unidades aloestratigráficas) assim dispostas, da base para o topo: Alogru- po Bom Jardim; Alogrupo Cerro do Bugio (representado na área apenas pela Aloformação Santa Fé); Alogrupo Santa Bárbara (constituído localmente pela Aloformação Serra dos Lanceiros); e Alogrupo Guaritas, composto na região pe- las aloformações Pedra Pintada e Varzinha. As várias proposiçõesestratigráficas utilizadas para compartimentar a sucessão aflorante na região das minas do Camaquã são apresentadas e correla- cionadas na Figura 2. Fácies sedimentares e sistemas deposicionais Os conceitos relativos a fácies sedimentares e sistemas deposicionais foram pioneiramente introduzidos na região das minas do Camaquã por geólogos da Companhia Brasileira do Cobre - CBC (Teixeira et al., 1978; Gonzalez & Teixei- ra, 1980; Ribeiro et al., 1980). A estratigrafia local proposta por esses autores (arenito inferior/conglomerado inferior/arenito intermediário/conglomerado superi- or/arenito superior - Figura 6a) foi interpretada como representando fácies mais proximais (conglomerados) ou mais distais (arenitos) de sistemas de leques deltai- cos desenvolvidos na área. Essa nova abordagem influenciou a interpretação acer- ca da gênese e zonação dos minérios de Cu - Pb - Zn, na medida em que foram propostos modelos associados diretamente a um controle sedimentar (Teixeira et al., 1978) ou à percolação de fluidos diagenéticos direcionados pela disposição es- pacial das fácies sedimentares (Gonzalez & Teixeira, 1980). Uma detalhada descrição das fácies sedimentares e a proposição de ummodelo de evolução paleogeográfica para toda a sucessão sedimentar exposta na região das minas do Camaquã foram temas tratados por Facinni et al. (1987). 116 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES Na concepção desses autores, a região foi inicialmente caracterizada por pulsos de progradação deltaica, os quais teriam evoluído, pelo menos em suas fases finais, de forma simultânea com sistemas praiais e eólicos instalados em regiões de me- nor aporte fluvial. O último episódio deposicional na região seria caracterizado por depósitos aluviais que se interdigitariam com os depósitos eólicos no bordo leste da bacia e recobririam, de forma discordante, as fácies deltaicas no bordo oeste da mesma. Fambrini (1998) concentrou-se na sucessão sedimentar basal (Gru- po Camaquã, segundo o autor) discordantemente sobreposta pela Aloformação Guaritas. Para o autor, o Grupo Camaquã seria composto por três unidades estra- tigráficas transicionais entre si (formaçõesMangueirão, Vargas e João Dias). Esse autor discrimina cinco associações de fácies na FormaçãoMangueirão, relaciona- das a turbiditos, tempestitos, inunditos e depósitos de frente deltaica. Propôs ain- da três associações de fácies na Formação Vargas, representando porções subaquáticas de leques deltaicos e porções subaéreas de leques aluviais (depósitos canalizados e depósitos proximais), e, por fim, três outras associações de fácies na Formação João Dias, incluindo tempestitos e depósitos de planície deltaica e flú- vio-deltaicos. ASUCESSÃOESTRATIGRÁFICA Genericamente pode-se dizer que a Bacia do Camaquã caracteri- zou-se pela alternância entre episódios de subsidência e sedimentação e de soer- guimento e erosão. Quanto ao tipo de preenchimento, este também foi alternado, pois, ora a atividade vulcânica dominava o contexto geológico, sendo representa- da por lavas e depósitos piroclásticos e epiclásticos, ora a deposição era dominan- temente siliciclástica. Tais eventos ígneos, sedimentares e tectônicos geraram um preenchimento complexo, onde unidades mais deformadas são sobrepostas por unidades cada vez menos deformadas, comumente separadas entre si por discor- dâncias angulares de maior ou menor magnitude. Desse modo, a abordagem alo- estratigráfica, que focaliza com maior atenção a presença de quebras no registro geológico via identificação de discordâncias, torna-se fundamental na comparti- mentação da sucessão estratigráfica ora abordada. A sucessão vulcano-sedimentar aflorante na área objeto deste traba- lho engloba três unidades aloestratigráficas relativamente mais deformadas (alo- grupos Bom Jardim, Cerro do Bugio e Santa Bárbara), com dobras abertas e falhas normais, inversas e transcorrentes, sobrepostas por uma unidade dominantemen- te horizontal (Alogrupo Guaritas), afetada principalmente por uma deformação rúptil que produziu falhas transcorrentes e normais (Figura 3). De modo similar ao que ocorre no interior de toda a Bacia do Camaquã, o contato entre essas uni- 117 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ 118 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES D is c o rd a n c ia e ro s iv a C o n ta to in tr u s iv o D is c o rd â n c ia a n g u la r C o n ta to tr a n s ic io n a l C o n ta to d is c o rd a n te n ã o d is c ri m in a d o N ã o in d ic a d o L e g e n d a s R ib e iro & F an tin el (1 97 8) R ib e iro e t a l. (1 9 66 ) R o be rt so n (1 96 6 ) CamaquãGroup G u ar ita s F o rm a tio n F o rm a çã o G u ar ita s GrupoCamaquã S an ta B ár b ar a F o rm a tio n F o rm a çã o S an ta B á rb a ra F o rm a çã o S an ta B á rb a ra F o rm a çã o G u ar ita s C o lu na a do ta d a ne ss e tr ab a lh o AlossupergrupoCamaquã A lo fo rm a çã o V ar zi n ha A lo gr u po G ua rit a s A lo fo rm aç ão P e dr a P in ta d a GrupoBomJardimGrupoCamaquã FmCrespos FmArroiodosNobres A lo gr u po S an ta B á rb a ra A lo fo rm aç ão S an ta F é A lo fo rm aç ão S er ra do s L an ce iro s A lo gr u po B o m Ja rd im GrupoBomJardim A lo gr u po C e rr o d o B ug io F m H ilá rio F m V ar g as F a m br in i ( 1 99 8 ) GrupoCamaquãGrupoGuaritas SérieCamaquã C am a qu ã H or iz o nt al C am a qu ã In cl in ad o F o rm aç ão M an gu e irã o F o rm a çã o V ar g as F o rm a çã o Jo ã o D ia s F o rm a çã o V a rz in h a F or m a çã o P e dr a P in ta d a F or m a çã o G ua rd a V e lh a Le in z e t a l. (1 9 41 ) C a rv al ho (1 9 32 ) S ér ie C am aq ua n E ru pç õ es de A nd es ito s e T uf os V ul câ ni co s T e ix ei ra e t a l. (1 9 78 ) G o n za le z & T e ix e ira (1 9 8 0 ) A r. In fe rio r A r. S up er io r A r. In te rm ed iá ri o C g In fe rio r C g. S up er io r M em br o M an gu e irã o MembroVargasF o rm a çã o G u ar ita s GrupoBomJardimGrupoCamaquã FmCrespos FmArroiodosNobres E fu si va s A n de sí tic a s M em br o R od ei o ve lh o F m A ca m pa m en to V el ho M em br o R od ei o ve lh o F ig ur a 2 -C om pa ra çã o en tr e di ve rs as di vi sõ es es tr at ig rá fic as pr op os ta sp ar a a su ce ss ão da ba ci a do C am aq uã ex po st a na re gi ão da sm in as e co m pa ra çã o co m a co lu na ad ot ad a ne st e tr ab al ho (b as ea da em P ai m e t a l ., 19 99 ). dadesaloestratigráficas na região das minas do Camaquã é também delineado por discordâncias angulares (Figura 4). Alogrupo Bom Jardim OAlogrupo Bom Jardim (592 ± 5 a 573 ± 18Ma), a unidade estrati- gráfica mais antiga da área, possui uma espessura mínima de 1.200m na área (son- dagem CQP-03) e é sobreposto discordantemente pelo Alogrupo Cerro do Bugio. Tanto o truncamento erosional dos estratos do Alogrupo Bom Jardim pe- las unidades inferiores do AlogrupoCerro do Bugio como a relação de discordân- cia angular entre essas unidades são evidentes (Figura 4). O Alogrupo Bom Jardim é composto por uma sucessão grano- e es- trato-crescente, representada em sua base por ritmitos pelíticos e areno-pelíticos que gradam verticalmente para ritmitos arenosos (Figura 6b), esparsos corpos are- nosos sigmoidais e níveis pelíticos com gretas de contração.Essas fácies represen- tam turbiditos distais (ritmitos pelíticos e areno-pelíticos) e proximais (ritmitos arenosos) associados a depósitos de frente deltaica (arenitos sigmoidais), sujeitos esporadicamente a exposição subaérea. Medidas de paleocorrentes efetuadas nos turbiditos indicam um padrão de dispersão sedimentar dominante para NNE (Figura 5), sugerindo a progradação de um sistema deltaico longitudinal em rela- ção ao eixo da bacia na área em questão. A porção superior do Alogrupo Bom Jar- dim, representada por ritmitos arenosos e esparsos corpos sigmoidais, corresponde ao Arenito Inferior da nomenclatura estratigráfica local (Figura 6A). Alogrupo Cerro do Bugio OAlogrupo Cerro do Bugio (573 ± 18 a 559 ± 7 Ma), representado na área apenas por sua unidade superior (Aloformação Santa Fé), possui uma es- pessura mínima de 300 metros (sondagem CQP-02) e é limitada no seu topo por uma superfície de downlap com o Alogrupo Santa Bárbara (Figura 4). Essa unidade estratigráfica é composta por duas seqüências deposi- cionais caracterizadas internamente por dois conjuntos de parasseqüências retro- gradacionais, limitados por uma discordância erosiva (Figura 6A). Cada seqüência é constituída por conglomerados (Conglomerado Inferior e Superior na no- menclatura estratigráfica local), ricos em clastos de rochas vulcânicas e plutônicas de composição ácida, que gradam para arenitos com estratificação cruzada tangencial de médio porte e ritmitos areno-pelíticos (Arenito Intermediário e Superior na no- menclatura estratigráfica local - Figura 4). Tanto os arenitos como os conglomera- dos caracterizam-se estratos tabulares com gradação normal (Figuras 6C e 7A). A 119 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ geometria tabular e a gradação normal dos estratos são indícios de fluxos efême- ros e espraiados (sheet-floods), marcados pelo desenvolvimento apenas incipiente de barras longitudinais. Dados de paleocorrentes (Figura 5) e informações faciológicas suge- rem que na região das minas do Camaquã o cenário paleogeográfico, no decorrer da deposição dessa unidade, teria sido caracterizado pelo desenvolvimento de sis- temas fluviais e flúvio-deltaicos entrelaçados longitudinais, segundo o alonga- mento da bacia, os quais dispersavam os sedimentos para NE. Alogrupo Santa Bárbara OAlogrupo Santa Bárbara (559± 7 a 540 ± 11Ma) compreende cer- ca de 2.000metros de espessura de depósitos siliciclásticos. Esses se encontram li- mitados, no topo, por uma discordância angular que demarca o contato com o Alogrupo Guaritas e, na base, por uma superfície de downlap com os depósitos do AlogrupoCerro do Bugio (Figura 4). Na área estudada, apenas as porçõesmédia e inferior da unidade basal do alogrupo (AloformaçãoLanceiros) encontram-se ex- postas. A Aloformação Serra dos Lanceiros é representada por um conjun- to de parasseqüências progradacionais (sucessão grano e estrato-crescente) do qual apenas as parasseqüênciasmais basais encontram-se expostas. Essas parasse- qüências são compostas por ritmitos pelíticos e areno-pelíticos, secundariamente arenitos, representando turbiditos de águas rasas das porções distais de sistemas deltaicos. Medidas de paleocorrentes (Figura 5) indicam que a Aloformação Serra dos Lanceiros foi gerada através da progradação de um sistema deltaico en- trelaçado arenoso longitudinal em relação ao eixo da bacia, o qual descarregava sua carga sedimentar para NNE em um sistema lacustre raso. Alogrupo Guaritas O Alogrupo Guaritas, com cerca de 800 metros de espessura e dis- posto horizontalmente por sobre as demais sucessões, representa o último grande episódio deposicional da bacia do Camaquã (Figura 4). Essa unidade pode ser subdividida em duas aloformações (Pedra Pintada e Varzinha) que se encontram separadas por uma discordância erosiva angular. A Aloformação Pedra Pintada é dominantemente caracterizada por arenitos finos-médios, bem selecionados, com estratificação cruzada acanalada de grande emuito grande porte (Figura 7B), comumente interpretados como depósi- tos residuais de pequenas dunas eólicas crescentes simples (dunas barcanas e cris- 120 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES tas barcanóides). Secundariamente, ocorrem arenitos grossos, pelitos e arenitos finos/médios, com laminação cruzada por corrente e por onda, interpretados como depósitos de interdunas e de planícies de nível de base (Paim, 1994; 1996). Na região das minas do Camaquã encontra-se exposta principalmente a porção inferior da Aloformação Pedra Pintada, para a qual as paleocorrentes eólicas indi- cam paleoventos dominantemente para NE (Paim, 1994). A Aloformação Varzinha é representada na área por arenitos (finos a muito grossos) com estratificação cruzada acanalada de médio e grande porte e estratificação plano-paralela. Os aspectos faciológicos e petrológicos que caracte- rizam essas litologias sugerem depósitos de sistemas aluviais efêmeros (Figura 7c), sujeitos a longos períodos de inatividade, e conseqüente exposição subaérea, re- trabalhamento eólico, dissecação de lama e precipitação de silcretes e calcretes (De Ros et al., 1994; Paim, 1993). Regionalmente, os dados de paleocorrentes (Paim, 1995) provenien- tes das fácies aluviais indicamuma associação lateral de dois distintos sistemas alu- viais: (1) sistema fluvial entrelaçado, no lado oeste da sub-bacia Guaritas; (2) sistema de leques aluviais, representado por pelo menos dois lobos, no lado leste desta mesma sub-bacia (Paim, 1995). Na região analisada, os dados de paleocor- rente disponíveis (Figura 5) são compatíveis com fluxos provenientes de ESE, ou seja, do sistema de leques aluviais que dominava o cenário geológico do bordo les- te da sub-bacia Guaritas durante a deposição dessa unidade aloestratigráfica. 121 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ 122 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES V ar zi n h a (f ác ie s fl u v ia is ) P e d ra P in ta d a (f ác ie s d es ér ti ca s) P e d ra P in ta d a (f ác ie s v u lc ân ic as - "A n d es it o R o d ei o V el h o ") S e rr a d o s L an ce ir o s (f ác ie s d el ta ic as ) S a n ta F é (f ác ie s fl u v ia is ) F á ci es tu rb id ít ic as e d e fr e n te d el ta ic a A lo g ru p o s G u ar it as S an ta B ár b ar a C er ro d o B u g io B o m Ja rd im A lo fo rm aç ão e fá ci es F al h a do C em it ér io F al h a T re s F ig u ei ra s R io C am aq u ã R io C am aq u ã P as so d o C aç ão R o d ei o Vel h o P ed ra P in ta d a G u ar it as P ed ra s d as G u ar it as Ce rro do Ca sc av el Zona deF alhas Tape raEm ilian o Serr ado Ape rtad o 5 30 3 5 ' 0 0 '' 5 30 3 0 ' 0 0 '' 5 30 2 5 ' 0 0 '' 3 00 5 0 ' 0 0 '' 10 km F ig s. 4 e 5 (a ) (b ) F ig ur a 3 -( a) Im ag em de sa té lit e L an ds at T M co m a lo ca liz aç ão da re gi ão de ta lh ad a na s F ig ur as 4 e 5; e (b )m ap a ge ol óg ic o da ár ea ab ra ng id a pe la im ag em ,a qu al en gl ob a a re gi ão da s m in as do C am aq uã (m od ifi ca do a pa rt ir de F am br in i, 19 98 ). 123 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ Alogrupo Santa Bárbara (Aloformação Serra dos Lanceiros) 12 22 35 23 28 28 17 2930 49 46 35 50 30 30 15 20 20 30 25 15 20 20 15 20 25 10 Afloramento descrito Legenda 20 Acamamento horizontal Direção e mergulho Discordância angular Estrato ("refletor") Afloramento descritoContato transicional A lo gr up o B om Ja rd im Al og ru po Bo m Ja rd im (" Ar en ito In fe rio r" ) A lo g ru p o B o m J a rd im (" A re n it o In fe ri o r" ) Al og ru po C er ro do Bu gi o Co ng . I nf er io r e Su pe rio r e Ar . I nt er m ed iá rio ) Alogrupo Guaritas (Aloformação Varzinha) A lo g ru p o G u a ri ta s (A lo fo rm a ç ã o P e d ra P in ta d a ) Al og ru po C er ro do Bu gi o (A r. Su pe rio r) Figura 4 - Fotomontagem (escala original 1:25000) da região das minas do Camaquã, salientando as discordâncias (estratos em discordância angular) e as atitudes das camadas (medições de campo). VerlocalizaçãodaáreaabrangidapelasfotosaéreasnaFigura3). 124 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES Figura 5 - Mapa geológico da região das minas do Camaquã, elaborado a partir da interpretação da fotomontagem(Figura4)edadosdecampo. 5 1 1 3 2 1 1 5 2 5 2 1 3 2 5 1 1 1 Alogrupo Guaritas - Aloformação Varzinha Alogrupo Guaritas - Aloformação Pedra Pintada Alogrupo Santa Bárbara - Aloformação Serra dos Lanceiros Alogrupo Cerro do Bugio - Aloformação Santa Fé Alogrupo Bom Jardim ("Arenito Inferior") Alogrupo Bom Jardim 5 3 Paleocorrente aluvial (vetor médio e número de medidas) Paleocorrente turbiditos (vetor médio e número de medidas) Afloramento descrito Falhas e fraturas Contato discordante Caminho Estrada não pavimentada Mina a céu aberto Anticlinal Contato transicional 125 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ Figura 6 - Vista geral para ESE (a) de parte da sucessão estratigráfica, salientando a terminologia es- tratigráfica de uso local; (b) dos turbiditos arenosos e areno-pelíticos, que compõem grande parte do “Arenito Inferior”; e (c) dos conglomerados e arenitos conglomeráticos tabulares que constituem o “Conglomerado Superior”. (b) Arenito Superior Conglomerado Superior Arenito Intermediário Conglomerado Inferior Arenito Inferior(a) Conglomerado Superior Arenito Intermediário (c) 126 PAULO SÉRGIO GOMES PAIM RICARDO CUNHA LOPES Figura 7 - (a) Vista de detalhe do “Conglomerado Superior”, salientando a tabularidade dos estratos e a lenticularidade das camadas que compõem cada estrato; (b) vista geral para sul dos depósitos eólicos que constituem a maior parte da Aloformação Pedra Pintada (foto do cerro homônimo); e (c) vista de detalhe de fácies fluviais conglomeráticas e arenosas que caracterizam a Aloformação Varzinha, real- çando a bimodalidade granulométrica que ocorre localmente (retrabalhamento de depósitos eólicos (a) (C) 1 m (c) (b) SÍNTESEEVOLUTIVA Como afirmado anteriormente, a Bacia do Camaquã teve sua evolu- ção vinculada aos processos tectono-magmáticos tardios do Cinturão Dom Feli- ciano e representa um lócus deposicional onde ficou preservado o registro da superposição de diversos tipos de bacias. Especificamente na região das minas do Camaquã tem-se preservado o registro geológico parcial de quatro dessas bacias (Figura 8) cuja evolução tectono-sedimentar é sumariamente descrita a seguir (os nomes em itálico referem-se àqueles comumente utilizados na nomenclatura es- tratigráfica local): (1) Bacia transcorrente de retroarco Bom Jardim (Figura 8a): os depósitos vinculáveis a essa bacia estão representados por turbiditos are- no-pelíticos e pelíticos (Membro Mangueirão) e turbiditos arenosos (Are- nito Inferior) que representam os depósitos distais e proximais, respectivamente, das porções subaquáticas do sistema deltaico que, na área, progradava para NE, ao longo do eixo da bacia. Esporádica expo- sição subaérea dos depósitos proximais ficou registrada pela ocorrên- cia comum de níveis argilosos ressecados. As atuais sub-bacias Guaritas e Santa Bárbara, separadas entre si pelo Alto de Caçapava, guardavam sua individualidade durante este episódio deposicional en- quanto que a contribuição vulcânica, expressiva, e mesmo dominante, nasub-baciaSantaBárbara,foimínimanaregiãodasminas; (2) Evento de deformação transcorrente (aprox. 580 Ma), erosão parcial do registro sedimentar prévio e geração da discordância que limita o Alo- grupoBomJardimdoAlogrupoCerrodoBugio; (3) Bacia transcorrente de retroarco Acampamento Velho (Figura 8b): nas minas, essa bacia é representada fundamentalmente por depósitos flu- viais associados a um sistema fluvial entrelaçado conglomerático (Con- glomerados Inferior e Superior) e, secundariamente, arenoso (Arenito Intermediário) que também fluía para NE. Aparentemente, o alto topo- gráfico que atualmente separa as sub-bacias Guaritas e Santa Bárbara não afetou o padrão deposicional durante este episódio deposicional. A importante atividade vulcânica ocorrida no lado oeste da Bacia do Ca- maquã (Aloformação Acampamento Velho) não foi registrada na área abordada; (4) Novo evento de deformação transcorrente (aprox. 570 Ma) e erosão parcial do registro sedimentar prévio (discordância entre os alogrupos CerrodoBugioeSantaBárbara); (5) Bacia transcorrente Santa Bárbara (Figura 8c): esta bacia é registrada na área por depósitos deltaicos subaquáticos, principalmente na forma de turbiditos arenosos e, secundariamente areno-pelíticos, ambos infor- malmente designados como Arenito Superior. Como nos casos anterio- res, o padrão de dispersão de sedimentos foi dominantemente influenciado por correntes dirigidas para NE e uma bacia na qual o AltodeCaçapavaaparentementeestavarecoberto. 127 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ (6) Evento de deformação transcorrente (aprox. 470 Ma) com erosão par- cial do registro sedimentar prévio e formação da discordância que limi- taabasedoAlogrupoGuaritas;e (7) Hemi-graben Guaritas (Figura 8d): representado inicialmente por de- pósitos desérticos e rochas vulcânicas básicas sobrepostos por depósi- tos aluviais. Na região das minas, as fácies eólicas aflorantes representam a base da Aloformação Pedra Pintada e foram depositadas por paleoventos dirigidos dominantemente para NE enquanto as fáci- es fluviais que se sobrepõem em discordância erosiva (Aloformação Varzinha) representam fundamentalmente as porções distais de um le- quealuvialdesenvolvidojuntoaobordolestedasub-baciaGuaritas. 128 PAULO SÉRGIO GOMESPAIM RICARDO CUNHA LOPES 129 GEOLOGIA DA REGIÃO DAS MINAS DO CAMAQUÃ Legenda Aluviais Turbiditos Paleocorrentes Sistemas aluvias e deltaicos entrelaçados conglomeráticos Sistemas aluvias e deltaicos entrelaçados arenosos facies subaquosas rasas (tonalidades mais claras) gradando para mais profundas (tonalidades mais escuras) Alogrupo Santa Bárbara (570-560 Ma) Aloformação Serra dos Lanceiros Alogrupo Bom Jardim (590 - 580 Ma) Alogrupo Guaritas (470-450? Ma) Aloformação Varzinha Alogrupo Cerro do Bugio (580-570 Ma) Aloformação Santa Fé (a) (b) (c) (d) Localização aproximada da região das minas do Camaquã Figura 8 - Esboço de evolução paleogeográfica situando regionalmente a região das minas do Cama- quã com a indicação das variações faciológicas, depocentros e dispersão de sedimentos associados aosepisódiosdeposicionaispreservadosnaáreadeestudo(adaptadodePaim et al.,1999). REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, F. F. M. 1969. Diferenciação tectônica da Plataforma Brasileira. Congr. Bras. Geol.,23,v.1,29-46. ALMEIDA, F. F. M.; HASUI, Y. & BRITO NEVES, B. B. 1976. The Upper Precambri- anofSouthAmerica. Boletim IG/USP,7,45-80. ALMEIDA, F. F. M.; HASUI, Y., BRITO NEVES, B. B. & FUCK, R. A. 1981. Brazilian structuralprovinces:anintroduction. Earth Sciences Reviews,17,1-29. BECKEL, J. 1990. Metalogenía del Cu, Pb y Zn en la Cuenca de Camaquã durante el ciclo orogénico Brasiliano, RS (Brasil). 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