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INSTRUMENTAIS TÉCNICO- OPERATIVOS DO SERVIÇO SOCIAL AULA 6 Prof.a Ana Carolina Vidigal 2 CONVERSA INICIAL O objetivo desta aula é apresentar o conceito e a aplicação dos instrumentais do Serviço Social, especialmente o plantão social e a perícia social. Ainda se pretende nesta aula expor, brevemente, algumas reflexões éticas sobre os instrumentais do Serviço Social. Portanto, a aula está organizada da seguinte forma, inicialmente será apresentado o conceito de plantão social, bem como seus limites e possibilidades. Em seguida, será elucidada a definição de perícia com seus referenciais jurídicos e legais. E, por fim, será exposta uma breve reflexão ética sobre os instrumentais do serviço social e algumas considerações finais. TEMA 1 – O QUE É UM PLANTÃO SOCIAL? O plantão social é um espaço de trabalho do assistente social que tem seu surgimento atrelado à origem do Serviço Social. Porém sua visão tem se modificado de acordo com as transformações históricas ocorridas na profissão. De acordo com Sousa (2004, p. 48), “os plantões sociais foram instrumentos utilizados pelos assistentes sociais pioneiros, implantados pelas entidades norte-americanas, quando perceberam a necessidade de sistematizar os atendimentos assistenciais, que foram divididos em casos imediatos e casos continuados”. Para o autor, os casos imediatos ocorriam em situações de vulnerabilidade, sendo estas rápidas, enquanto os casos continuados constituíam problemas mais graves, que necessitavam de um contato mais prolongado entre o assistente social e o usuário. Para Souza Brito (2005), “o plantão social é um meio pelo qual historicamente tem ocorrido a triagem e seleção de demandas para inclusão de atendimentos sociais, aplicado tanto pela organização estatal quanto em ações sociais privadas”. Logo, o plantão oferece respostas às múltiplas expressões da questão social. Atualmente, os plantões têm sido mais discutidos na área de saúde, porém, verifica-se uma diferença essencial entre o plantão social na política de assistência social e o plantão na saúde. na assistência há um limite inerente à natureza da política em que se insere, qual seja, a seleção de seu público, e, na saúde, destina-se a todos. A dificuldade de um consiste em eleger critérios para acesso de seu público aos serviços assistenciais e a do outro em garantir o 3 acesso de todos aos serviços de saúde. (Dias; Camatari, 2016, p. 184) Para as autoras, no plantão social na área de saúde são realizadas entrevistas com os pacientes, orientações e informações, dentre outras intervenções profissionais. Já no plantão da assistência social, o profissional, além de trabalhar com o usuário a perspectiva dos direitos de cidadania e a socialização de informações quanto ao acesso aos recursos institucionais, atuará também diretamente com a concessão de recursos materiais à população. Ainda sobre o plantão social, verifica-se, sobretudo nos dias atuais, poucos estudos e referências sobre o tema, mas, por meio de alguns estudos existentes e de algumas pesquisas, nota-se que o plantão social ainda é marcado por alguns paradigmas, sobretudo por alguns traços conservadores oriundos do seu processo histórico. Nesse sentido, Vasconcelos (2007, p. 249- 250) afirma que o plantão muitas vezes é visto pelos profissionais como não planejado, sistematizado nem avaliado nas suas consequências; assim, não conta com quantificação estatística dos atendimentos, objetivando conhecer a variação da demanda, as solicitações por serviços e recursos materiais e a própria utilização do Serviço Social e dos serviços da unidade, consequentemente, não conta com observação, análise e avaliação sistemática de seu processo. Essa visão, no entanto, reduz esse instrumental a práticas isoladas de alguns assistentes sociais que o utilizam de forma imediatista e sem planejamento. Para Dias e Camatari (2016), o plantão em Serviço Social não se esgota apenas como repassador de recursos de emergência para os usuários. Ele pode ser também um espaço estratégico de luta pela desmistificação de relações naturalizadas. Entretanto, para que o plantão social cumpra com esse objetivo, é necessário que os assistentes sociais sejam críticos, tenham conhecimento dos instrumentais e façam uso constante da reflexão em sua atuação. Portanto, a eficiência do Plantão Social depende do conhecimento profissional sobre as finalidades da instituição, dos recursos internos, da comunidade, do domínio do instrumental, e de o profissional ser um bom observador e ter capacidade crítica e reflexiva da realidade. 4 TEMA 2 – LIMITES E POSSIBILIDADES DO PLANTÃO SOCIAL Dias e Camatari (2016) elencam como principais limites do plantão social: espaço físico precário, que dificulta o atendimento e sigilo profissional; prática profissional pautada pelos interesses da instituição empregadora; ausência de retorno das demandas após o atendimento; estabelecimento de critérios de elegibilidade e atuação imediatista e acrítica. Tais limites, segundo os autores, dificultam uma atuação de qualidade e com enfoque nas necessidades e realidade dos usuários, com vistas à superação da situação de vulnerabilidade. Com relação às possibilidades, os autores afirmam que a prática do plantão social é um desafio para o assistente social, mas, se ela estiver pautada pela luta de efetivação dos direitos dos usuários, pode trazer ganhos para a profissão. O plantão é um espaço de criação de indicadores sociais, a partir de suas estatísticas de atendimento. Com esses dados, o assistente social pode traçar um perfil dos usuários e desenvolver planos e projetos que atinjam as demandas levantadas. Assim, o profissional pode superar o mero atendimento imediato da demanda e ainda traçar um planejamento a longo prazo com vistas às demandas reais dos usuários. Portanto, o plantão social é um instrumental que pode estar vinculado a uma prática assistencialista e imediatista ou uma atuação vinculada a garantia de direitos, mas isso depende do conhecimento do profissional e de sua atuação crítica e reflexiva da realidade. TEMA 3 – O QUE É UM PROCESSO DE PERÍCIA SOCIAL? Nesta seção, pretende-se apresentar a perícia social enquanto um processo, e não como um instrumento isolado e fragmentado, valorizando assim esse instrumental como um todo, e não apenas como um frágil elemento desconectado da realidade. O processo de perícia social não é apenas utilizado no âmbito jurídico, ele tem sido utilizado no âmbito das políticas públicas para reforçar decisões na concessão de benefícios, comprovar aspectos econômicos e sociais, realizar avaliação de diversas situações que envolvem os usuários, entre outros. De acordo com o CFESS (2004, p. 43), a perícia diz respeito “a avaliação, exame ou vistoria solicitada ou determinada sempre que a situação 5 exigir um parecer técnico ou científico de uma determinada área do conhecimento, que contribua para a tomada de decisão”. A fim de desvelar a perícia social enquanto um processo, faz-se necessário compreender ainda o estudo, o parecer e o laudo pericial. A perícia inicia-se com a busca de obter o conhecimento sobre aquilo que está sendo requisitado por profissionais ou autoridades das mais diversas áreas. Assim, busca-se a finalidade da perícia, o levantamento de documentos e dados já existentes acerca da situação que será analisada (Costa; Oliveira, 2016). Portanto, a perícia exige um planejamento de sua execução com o intuito de atingir os objetivos e finalidades desua requisição. Essa busca para obtenção de conhecimentos sobre a demanda inicia-se com o Estudo Social, que consiste em coletar dados, a partir de um instrumental específico e definido pelo Assistente Social, para cada caso particular, e interpretar estes dados a partir de um referencial teórico, elaborando- se uma opinião profissional sobre a situação. Dentro de uma visão de globalidade, visto ser a interpretação da situação. (Iamamoto, 1998, p. 42). Assim, o objetivo principal do estudo social para os autores é a possibilidade de apresentar diferentes aspectos de uma situação social, contextualizá-la e indicar possibilidades de ação. O CFESS (2004, p. 42) apresenta o estudo social com a “finalidade de conhecer com profundidade, e de forma crítica, uma determinada situação ou expressão da questão social”. Após a finalização do estudo social, é desenvolvido o parecer social, que constitui um “instrumento de realização do compromisso profissional com os usuários visando à equidade, à igualdade e à cidadania, indispensável ao novo fazer profissional em especial na área de benefícios sociais confirma-se como um significativo campo de atuação profissional (Silva, 2000, p. 35)”. Dessa forma, o parecer deve apresentar o posicionamento do profissional que teve contato com a realidade social, organizando dados e apontando aspectos para a viabilização de direitos. Portanto, o parecer deve ser conclusivo a respeito da opinião profissional sobre a situação demandada. Por fim, o laudo é um documento que retrata uma situação específica “num determinado momento, por meio do qual a perícia social foi realizada, sendo que a clareza, a objetividade, a responsabilidade ética, a consistência e a estrutura formal são imprescindíveis neste documento e espelham a 6 maturidade do perito nas suas competências e especialidades” (Costa; Oliveira, 2016, p. 213). Portanto, a perícia social enquanto processo envolve o processo de realização do estudo social, a emissão do parecer social e a confecção do laudo social. Sendo a perícia social uma atribuição privativa do assistente social, é de fundamental importância que os profissionais compreendam esse instrumental e saibam utilizá-lo com competência. TEMA 4 – REFERÊNCIAS JURÍDICAS E LEGAIS DA PERÍCIA SOCIAL A perícia social está prevista na Lei n. 8662 de 1993, que regulamenta a profissão de assistente social em seu artigo 5, que trata as atribuições privativas do assistente social: “IV - realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres sobre a matéria de Serviço Social” (CFESS, 1993, p. 1). Assim, tal atribuição exige do profissional competência teórico- metodológica, técnico-operativa e ético-política em sua área de atuação. Esse instrumental ainda é abordado pela Resolução CFESS n. 557 de 2009, que dispõe sobre a emissão de pareceres, laudos, opiniões técnicas realizadas em conjunto entre o assistente social e outros profissionais. Essa resolução considera inadmissível uma manifestação técnica em conjunto com profissionais de outras áreas, conforme aponta seu artigo 4º, parágrafo primeiro: “deve destacar a sua área de conhecimento separadamente, delimitar o âmbito de sua atuação, seu objeto, instrumentos utilizados, análise social e outros componentes que devem estar contemplados na opinião técnica” (CFESS, 2009, p. 1). Portanto, é de fundamental importância que o assistente social conheça e utilize essas referências legais e jurídicas para respaldar seu trabalho no desenvolvimento de perícias sociais com competência. TEMA 5 – REFLEXÕES ÉTICAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do debate realizado nessas seis aulas sobre os instrumentais técnico-operativos no Serviço Social, foi possível compreender que esses instrumentais são “o conjunto articulado de instrumentos e técnicas que permitem a operacionalização da ação profissional. Decorre que o instrumental não é nem o instrumento nem a técnica tomados isoladamente, mas ambos, 7 organicamente articulados em uma unidade dialética (...)” (Martinelli; Koumrouyan, 1994, p. 137). Portanto, estudar os instrumentais do Serviço Social exige que o profissional se utilize desse conceito dentro da unidade e da relação intrínseca das dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico- operativo da profissão. Outro elemento de fundamental importância sobre os instrumentais é sua relação com o projeto ético-político da profissão que reforça essa unidade das três dimensões profissionais. o instrumental utilizado pelo assistente social em seu trabalho não pode ser visto, analisado e aplicado isoladamente, mas organicamente articulado ao projeto ético-político da profissão, fazendo parte de um conjunto maior da profissão e de uma determinada concepção de Serviço Social. Para dar concretude ao projeto ético-político profissional com competência teórico-prática, é necessária a formulação de uma metodologia de trabalho que contemple as três dimensões: teórico-metodológica, ídeo-política e técnico-operativa. (Costa; Oliveira, 2016, p. 226) Portanto, o assistente social deve ter sempre como parâmetro para utilização de seus instrumentais o seu projeto ético-político, bem como as leis que regulamentam a profissão, o código de ética profissional e a teoria que subsidia a profissão, sempre tendo como base a unidade das três dimensões do Serviço Social. Assim, com a apreensão desses elementos, o assistente social poderá atuar crítica e refletidamente e com competência profissional. NA PRÁTICA Com a finalização desta aula, ressalta-se a importância da ação reflexiva, ética e planejada dos instrumentais do Serviço Social, como o plantão social e a perícia social. Um exemplo de utilização desses instrumentais pode ser identificado no cotidiano dos profissionais no atendimento de demandas e triagem, bem como para investigação de uma dada situação requisitada por outro profissional ou por uma autoridade de outras áreas. No entanto, o grande diferencial na utilização desses instrumentais na prática é que o assistente social deve ter clareza da finalidade da aplicação do instrumental; é necessário ainda ter conhecimento e competência para a utilização dele, ter um agir crítico com vistas à garantia de direitos dos usuários e às possibilidades de superação da situação apresentada. 8 Portanto, a realização do plantão social e da perícia social com qualidade e competência exige do profissional o conhecimento dos instrumentais e leis que os embasam, devendo buscar aprofundar o conhecimento da realidade para além da superficialidade dos dados, além de ter comprometimento com os direitos dos usuários e um agir crítico que busque a superação das demandas apresentadas. FINALIZANDO Esta aula buscou apresentar a conceituação e a utilização do plantão social e da perícia social pelo Serviço Social, bem como algumas reflexões éticas e breves considerações finais. Portanto, a partir da discussão trabalhada nesta última aula da disciplina, podemos compreender um pouco mais sobre o plantão social e a perícia social. Com a finalização da disciplina, foi possível identificar a importância dos instrumentais para o cotidiano profissional, bem como a necessidade de manter a unidade das dimensões teórico- metodológica, ético-política e técnico-operativo em sua utilização. Assim, com a conclusão da disciplina, ressalta-se a relevância da atuação profissional com os instrumentais, a partir de uma ação reflexiva, planejada, democrática e com vistas à transformação da realidade do usuário. REFERÊNCIAS CFESS. Conselho Federal de Serviço Social. Leique Regulamenta a Profissão de Serviço Social. Lei n. 8662/93. Brasília, 1993. ______. Resolução n. 273/93. Institui o Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais. Brasília, 2003. ______. (Org.). O estudo social em perícias, laudos e pareceres técnicos: contribuição ao debate no judiciário, penitenciário e na previdência social. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2004. ______. Resolução n. 557 de 15 de setembro de 2009. Dispõe sobre a emissão de pareceres, laudos, opiniões técnicas, conjuntos entre o assistente social e outros profissionais. 9 COSTA, D.; OLIVEIRA, M. T. de. Reflexões técnico-operativas sobre a perícia social. In: LAVORATTI, C.; COSTA, D. (Org.). Instrumentos técnico- operativos no Serviço Social: um debate necessário. Ponta Grossa: Estúdio Texto, 2016. DIAS, J. M. de M.; CAMATARI, M. A. M. Instrumentais técnico-operativos do Serviço Social utilizados no espaço do plantão social: limites e possibilidades a partir do Sistema único de Assistência Social – SUAS. In: LAVORATTI, C.; COSTA, D. (Org.). Instrumentos técnico-operativos no Serviço Social: um debate necessário. Ponta Grossa: Estúdio Texto, 2016. IAMAMOTO, M. V. 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