Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A derivada de uma func¸a˜o Parte 7 Derivadas 1. A derivada de uma func¸a˜o Definic¸a˜o 1.1 Sejam X ⊂ R, a ∈ X ∩ X ′ e f : X −→ R. Dizemos que f e´ deriva´vel no ponto a quando existe o limite f ′(a) = lim x→a f(x) − f(a)x− a Neste caso, f ′(a) chama-se a derivada de f no ponto a Observac¸a˜o 1.1 Seja q : X− {a} −→ R definida por q(x) = f(x) − f(a) x− a . Geometricamente, q(x) e´ a inclinac¸a˜o, ou coeficiente angular, da reta se- cante ao gra´fico de f que passa pelos pontos (a, f(a)) e (x, f(x)). Definic¸a˜o 1.2 A reta r : y = f ′(a)(x − a) + f(a) que passa pelo ponto (a, f(a)) e tem inclinac¸a˜o f ′(a) e´ chamada de reta tangente ao gra´fico de f no ponto a. Observac¸a˜o 1.2 A inclinac¸a˜o da reta tangente e´, portanto, o limite, quando x −→ a, das inclinac¸o˜es das retas secantes que passam pelos pontos (a, f(a)) e (x, f(x)) Observac¸a˜o 1.3 Seja h = x− a, ou x = a+ h, h 6= 0. Enta˜o f ′(a) = lim h→0 f(a+ h) − f(a) h Instituto de Matema´tica - UFF 217 Ana´lise na Reta onde a func¸a˜o h 7−→ f(a+ h) − f(a) h esta´ definida no conjunto Y = {h ∈ R− {0} |a+ h ∈ X} , que tem o zero como ponto de acumulac¸a˜o. Definic¸a˜o 1.3 Sejam X ⊂ R, a ∈ X ∩ X ′+ e f : X −→ R. Dizemos que f e´ deriva´vel a` direita no ponto a quando existe o limite f ′(a+) = lim x→a+ f(x) − f(a) x− a = lim h→0+ f(a+ h) − f(a) h . No caso afirmativo, f ′(a+) e´ a derivada a` direita de f no ponto a. Seja a ∈ X∩X ′−. Dizemos que f e´ deriva´vel a` esquerda no ponto a quando existe o limite f ′(a−) = lim x→a− f(x) − f(a) x− a = lim h→0− f(a+ h) − f(a) h . Neste caso, f ′(a−) e´ a derivada a` esquerda de f no ponto a. Observac¸a˜o 1.4 Se a ∈ X ∩ X ′+ ∩ X ′−, f ′(a) existe se, e so´ se, existem e sa˜o iguais as derivadas laterais f ′(a+) e f ′(a−). Observac¸a˜o 1.5 Dizer que uma func¸a˜o f : [c, d] −→ R e´ deriva´vel no ponto a significa que: • f possui as duas derivadas laterais no ponto a e elas sa˜o iguais quando a ∈ (c, d). • f possui derivada lateral a` direita no ponto a quando a = c. • f possui derivada lateral a` esquerda no ponto a quando a = d. Observac¸a˜o 1.6 Pelas propriedades gerais do limite, temos que f e´ deriva´vel no ponto a ∈ X ∩ X ′ se, e so´ se, lim n→+∞ f(xn) − f(a)xn − a = f ′(a) para qualquer sequ¨eˆncia (xn) de pontos de X− {a} com lim n→∞ xn = a. Mais geralmente, f e´ deriva´vel no ponto a ∈ X∩X ′ se, e so´ se, dada uma func¸a˜o g : Y −→ R, com b ∈ Y ′, tal que lim y→bg(y) = a e g(y) 6= a para y 6= b, temos que f ′(a) = lim y→b f(g(y)) − f(a) g(y) − a . J. Delgado - K. Frensel218 A derivada de uma func¸a˜o Exemplo 1.1 Seja f : R −→ R constante, ou seja, existe c ∈ R tal que f(x) = c para todo x ∈ R. Enta˜o f ′(a) = 0 para todo a ∈ R.� Exemplo 1.2 Seja f : R −→ R dada por f(x) = cx + d e seja a ∈ R. Enta˜o f ′(a) = c, pois f(x) − f(a) x− a = c(x− a) x− a = c para todo x 6= a.� Exemplo 1.3 Seja f : R −→ R, f(x) = x2 e seja a ∈ R. Enta˜o, f(a+ h) − f(a) h = a2 + 2ah+ h2 − a2 h = 2a+ h −→ 2a quando h −→ 0. Assim, f ′(a) = 2a para todo a ∈ R.� Exemplo 1.4 Seja f : R −→ R, f(x) = xn, n ∈ N e seja a ∈ R. Enta˜o, pela fo´rmula do binoˆmio de Newton, temos que f(a+ h) − f(a) = (a+ h)n − an = n∑ j=0 ( n j ) ajhn−j − an = ( n−2∑ j=0 ( n j ) ajhn−j−1 ) h+ ( n n−1 ) an−1h . Logo, lim h→0 f(a+ h) − f(a) h = lim h→0 ( n−2∑ j=0 ( n j ) ajhn−j−1 ) + nan−1 = nan−1 , pois n− j− 1 ≥ 1 para 0 ≤ j ≤ n− 2 . Enta˜o, f ′(a) = nan−1 para todo a ∈ R. Se p(x) = anxn+ . . .+a1x+a0 e´ um polinoˆmio, enta˜o, usando as proprie- dades conhecidas do limite, temos p ′(x) = nanxn−1 + . . .+ 2a2x+ a1 , para todo x ∈ R.� Exemplo 1.5 Seja f : R −→ R a func¸a˜o definida por f(x) = |x|. Enta˜o, f(x) − f(0) x− 0 = |x| x . Logo, f ′(0+) = lim x→0+ |x| x = lim x→0+ 1 = 1 e f ′(0−) = limx→0− |x| x = lim x→0−(−1) = −1 . Como f ′(0+) 6= f ′(0−), f na˜o e´ deriva´vel no ponto 0, mas e´ deriva´vel nos demais pontos da reta, com f ′(a) = 1 se a > 0 e f ′(a) = −1 se a < 0.� Instituto de Matema´tica - UFF 219 Ana´lise na Reta Exemplo 1.6 Seja f : [0,+∞) −→ R definida por f(x) = √x. Enta˜o, para a ∈ [0,+∞), h 6= 0 e a+ h ≥ 0, temos √ a+ h− √ a h = h h (√ a+ h+ √ a ) = 1√ a+ h+ √ a . Logo, f e´ deriva´vel em todo ponto a > 0 e f ′(a) = 1 2 √ a , mas f na˜o e´ deriva´vel no ponto zero, pois o quociente √ 0+ h− √ 0 h = √ h h = 1√ h e´ ilimitado numa vizinhanc¸a de zero e, portanto, na˜o existe lim h→0+ 1√ h .� Exemplo 1.7 Seja f : R −→ R a func¸a˜o definida por f(x) = inf { |x− n| |n ∈ Z } , ou seja, f(x) e´ a distaˆncia de x ao inteiro mais pro´ximo. Temos que f(x) = x− n se x ∈ [ n,n+ 1 2 ] n+ 1− x se x ∈ [ n+ 1 2 , n+ 1 ] . Enta˜o, f(n) = 0 e f ( n+ 1 2 ) = 1 2 , para todo n ∈ Z, e o gra´fico de f e´ uma serra cujos dentes tem pontas nos pontos ( n+ 1 2 , 1 2 ) . A func¸a˜o f e´ deriva´vel em todo x ∈ R, x 6= n, x 6= n+ 1 2 , n ∈ Z, sendo f ′(x) = 1 se x ∈ ( n,n+ 1 2 ) −1 se x ∈ ( n+ 1 2 , n+ 1 ) . Mas f na˜o e´ deriva´vel nos pontos n e n + 1 2 , n ∈ N, porque f ′(n+) = 1 6= f ′(n−) = −1 e f ′ (( n+ 1 2 )+) = −1 6= f ′ (( n+ 1 2 )−) = 1 .� J. Delgado - K. Frensel220 A derivada de uma func¸a˜o Observac¸a˜o 1.7 A derivada, sendo um limite, satisfaz aos seguintes resultados, provados para limite de uma func¸a˜o: • Se f : X −→ R possui derivada no ponto a ∈ X ∩ X ′, enta˜o, dado Y ⊂ X com a ∈ Y ∩ Y ′, a func¸a˜o g = f|Y tambe´m e´ deriva´vel no ponto a e g ′(a) = f ′(a). • Se Y = I∩X, onde I e´ um intervalo aberto contendo o ponto a, e g = f|Y e´ deriva´vel no ponto a, enta˜o f e´ deriva´vel no ponto a e f ′(a) = g ′(a). Este resultado mostra o cara´ter local da derivada. Definic¸a˜o 1.4 Dizemos que uma func¸a˜o f : X −→ R e´ deriva´vel no conjunto X quando f e´ deriva´vel em todos os pontos a ∈ X ∩ X ′ . Observac¸a˜o 1.8 Seja f : X −→ R deriva´vel no ponto a ∈ X∩X ′. Seja r a func¸a˜o dada por r(h) = f(a+ h) − f(a) − f ′(a)h definida no conjunto Da = {h ∈ R |a+ h ∈ X}. Enta˜o, para todo h ∈ Da − {0}, temos f(a+ h) = f(a) + f ′(a)h+ r(h) , com lim h→0 r(h) h = 0 . (1) Sendo lim h→0 r(h) h = 0, dizemos que o resto r(h) tende para zero mais rapi- damente que h, ou que r(h) e´ um infinite´simo (=func¸a˜o com limite zero) de ordem superior a 1, relativamente a h. Reciprocamente, se existe L ∈ R tal que f(a+ h) = f(a) + Lh+ r(h) , com lim h→0 r(h) h = 0 , (2) enta˜o f e´ deriva´vel no ponto a ∈ X ∩ X ′ e f ′(a) = L, pois lim h→0 f(a+ h) − f(a) h = lim h→0 ( L+ r(h) h ) = L . • A condic¸a˜o (1) pode ser escrita sob a forma f(a+ h) = f(a) + (f ′(a) + ρ(h))h , com lim h→0 ρ(h) = 0 , (3) onde ρ(0) = 0 e ρ(h) = r(h) h = f(a+ h) − f(a) h − f ′(a) para todo h 6= 0 tal que a+ h ∈ X. Instituto de Matema´tica - UFF 221 Ana´lise na Reta Assim, a continuidade da func¸a˜o ρ no ponto 0 equivale a` existeˆncia da derivada f ′(a) de f no ponto a. Observac¸a˜o 1.9 As condic¸o˜es (1), (2) e (3) tambe´m sa˜o va´lidas para as derivadas laterais, supondo h > 0 para a derivada a` direita e h < 0 para a derivada a` esquerda. Exemplo 1.8 Seja f(x) = x2. Enta˜o, dados a ∈ R e h 6= 0, temos r(h) = (a+ h)2 − a2 − 2ah = h2.� Exemplo 1.9 Sabemos do Ca´lculo que a func¸a˜o f : R −→ R dada por f(x) = sen x e´ deriva´vel na reta e f ′(a) = cosa para todo a ∈ R. Enta˜o, sen(a+ h) = sena+ h cosa+ r(h) , com lim h→0 r(h) h = 0. Usando a fo´rmula da trigonometria sen(a+ h) = sena cosh+ senh cosa , obtemos que r(h) = senacosh+ senh cosa− sena− h cosa = sena(cosh− 1) + cosa(senh− h) . Isto confirma que lim h→0 r(h) h = 0, pois lim h→0 cosh− 1 h = cos ′(0) = − sen(0) = 0 , e lim h→0 senh− h h = lim h→0 senh− sen 0 h− 0 − 1 = cos 0− 1 = 0 . � Definic¸a˜o 1.5 Seja f : X −→ R uma func¸a˜o deriva´vel no ponto a. A diferencial de f no ponto a e´ a transformac¸a˜o linear df(a) : R −→ R definida por df(a)h = f ′(a)h. Se f e´ deriva´vel em todo X, definimos a diferencial de f como sendo a func¸a˜o df : X −→ L(R;R), a 7−→ df(a), onde L(R;R) e´ o espac¸o vetorial dos operadores lineares de R em R. Teorema 1.1 Sejam a ∈ X ∩ X ′ e f : X −→ R. Se f e´ deriva´vel no ponto a, enta˜o f e´ contı´nua no ponto a. J. Delgado - K. Frensel222 A derivada de uma func¸a˜o Prova. Como o limite lim x→a f(x) − f(a)x− a existe e limx→a(x− a) = 0, temos que lim x→a ( f(x) − f(a) ) = limx→a ( f(x) − f(a) x− a ) (x− a) = lim x→a f(x) − f(a)x− a · limx→a(x− a) = 0 , ou seja, lim x→a f(x) = f(a). Logo, f e´ contı´nua no ponto a.� Observac¸a˜o 1.10 • Se a ∈ X ∩ X ′+ e f : X −→ R e´ deriva´vel a` direita no ponto a, enta˜o f e´ contı´nua a` direita no ponto a, ou seja, lim x→a+ f(x) = f(a) . • E se a ∈ X∩X ′− e f e´ deriva´vel a` esquerda no ponto a, enta˜o f e´ contı´nua a` esquerda no ponto a, ou seja, lim x→a− f(x) = f(a) . Estes resultados demonstram-se de modo ana´logo quando f e´ deriva´vel no ponto a. • Enta˜o, f e´ contı´nua no ponto a, se f possui derivada a` direita e a` es- querda no ponto a, mesmo sendo diferentes. Exemplo 1.10 Seja f : R −→ R dada por f(x) = { 1 se x ≥ 0 −1 se x < 0 . Enta˜o f e´ contı´nua a` direita no ponto zero e f ′(0+) = 0, mas f na˜o e´ contı´nua a` esquerda no ponto 0 nem existe a derivada a` esquerda de f no ponto 0. Portanto, f na˜o e´ contı´nua no ponto 0.� Exemplo 1.11 Os exemplos 1.5, 1.6 e 1.7, mostram que uma func¸a˜o pode ser contı´nua em toda a reta e na˜o ser deriva´vel em alguns pontos. Na realidade, a maioria das func¸o˜es contı´nuas em R na˜o possuem de- rivada em ponto algum (ver E. Lima, Espac¸os Me´tricos, exemplo 33 do capı´tulo 7).� Teorema 1.2 Sejam f, g : X −→ R func¸o˜es deriva´veis no ponto a ∈ X ∩ X ′. Enta˜o, f ± g, f · g e f g (quando g(a) 6= 0) sa˜o deriva´veis no ponto a e valem as seguintes fo´rmulas: Instituto de Matema´tica - UFF 223 Ana´lise na Reta (f± g)(a) = f ′(a)± g ′(a) (f · g) ′(a) = f ′(a)g(a) + f(a)g ′(a)( f g ) ′ (a) = f ′(a)g(a) − f(a)g ′(a) (g(a) )2 Prova. Vamos demonstrar a fo´rmula de derivac¸a˜o do quociente, deixando as ou- tras como exercı´cio. Sendo g(x) 6= 0 para todo x ∈ (X− {a}) ∩ (a− δ, a+ δ), para algum δ > 0, a func¸a˜o f g esta´ definida nesta vizinhanc¸a de a. Como, para x ∈ (X− {a}) ∩ (a− δ, a+ δ), f(x) g(x) − f(a) g(a) x− a = f(x)g(a) − f(a)g(x) x− a · 1 g(x) · g(a) = (( f(x) − f(a) x− a ) g(a) − f(a) ( g(x) − g(a) x− a )) 1 g(x)g(a) , temos que lim x→a f(x) g(x) − f(a) g(a) x− a = ( g(a) lim x→a f(x) − f(a)x− a − f(a) limx→a g(x) − g(a)x− a ) · lim x→a 1g(x)g(a) = (g(a) f ′(a) − f(a)g ′(a) ) · 1 (g(a) )2 . pois g e´ contı´nua no ponto a, ja´ que g e´ deriva´vel no ponto a.� Corola´rio 1.1 • Se c ∈ R enta˜o (c · f) ′(a) = c · f ′(a) . • Se f(a) 6= 0 enta˜o ( 1 f ) ′ (a) = − f ′(a) f(a)2 . Teorema 1.3 (Regra da cadeia) Sejam f : X −→ R, g : Y −→ R, f(X) ⊂ Y, a ∈ X ∩ X ′, b = f(a) ∈ Y ∩ Y ′. Se f e´ deriva´vel no ponto a e g e´ deriva´vel no ponto b = f(a), enta˜o g ◦ f : X −→ R e´ deriva´vel no ponto a e tem-se a regra da cadeia: (g ◦ f ) ′(a) = g ′(b) · f ′(a) J. Delgado - K. Frensel224 A derivada de uma func¸a˜o Prova. Sejam ρ e σ func¸o˜es definidas numa vizinhanc¸a de 0, tais que f(a+ h) = f(a) + ( f ′(a) + ρ(h) )h , onde lim h→0 ρ(h) = 0 , g(b+ k) = g(b) + (g ′(b) + σ(k) )k , onde lim k→0σ(k) = 0 . Tomando k = f(a+ h) − f(a) = ( f ′(a) + ρ(h) )h, temos que f(a+ h) = f(a) + k = b+ k e (g ◦ f)(a+ h) = g(f(a+ h)) = g(b+ k) = g(b) + (g ′(b) + σ(k) )k = g(b) + (g ′(b) + σ(k) ) ( f ′(a) + ρ(h) )h = g ◦ f(a) + (g ′(b) f ′(a) + θ(h) )h , onde θ(h) = σ( f(a+ h) − f(a) ) ( f ′(a) + ρ(h) ) + g ′(b) ρ(h) . Como f e´ contı´nua no ponto a, σ e ρ sa˜o contı´nuas no ponto 0, com σ(0) = ρ(0) = 0, temos que lim h→0 θ(h) = 0 , pois lim h→0σ(f(a+ h) − f(a)) = σ(0) = 0 e limh→0 ρ(h) = ρ(0) = 0 . Logo, g ◦ f e´ deriva´vel no ponto a e (g ◦ f) ′(a) = g ′(b) f ′(a) .� Corola´rio 1.2 (Derivada da inversa de uma func¸a˜o) Seja f : X −→ Y uma func¸a˜o que possui inversa g = f−1 : Y −→ X. Se f e´ deriva´vel no ponto a ∈ X ∩ X ′ e g e´ contı´nua no ponto b = f(a), enta˜o g e´ deriva´vel no ponto b se, e so´ se, f ′(a) 6= 0. Neste caso, g ′(b) = 1 f ′(a) Prova. Como g e´ contı´nua no ponto b = f(a) e e´ injetiva, temos que lim y→bg(y) = g(b) = a , e g(y) 6= a quando y ∈ Y − {b}. Ale´m disso, b ∈ Y ∩ Y ′, pois f e´ contı´nua no ponto a, e´ injetiva em X e a ∈ X ∩ X ′. Logo, se f ′(a) 6= 0, enta˜o Instituto de Matema´tica - UFF 225 Ana´lise na Reta lim y→b g(y) − g(b) y− b = lim y→b g(y) − g(b) f(g(y)) − f(a) = lim y→b ( f(g(y)) − f(a) g(y) − a )−1 = 1 f ′(a) , ou seja, g e´ deriva´vel no ponto b e g ′(b) = 1 f ′(a) . Reciprocamente, se g e´ deriva´vel no ponto b, enta˜o, pela regra da cadeia, g ◦ f = idX e´ deriva´vel no ponto a e g ′(b) f ′(a) = 1, ou seja, f ′(a) 6= 0 e g ′(b) = 1 f ′(a) .� Exemplo 1.12 A func¸a˜o f : R −→ R, dada por f(x) = x3, e´ uma bijec¸a˜o contı´nua com inversa contı´nua g : R −→ R com g(y) = 3√y. Como f ′(a) = 3a2 6= 0 para todo a 6= 0 e f(0) = 0, temos que g e´ deriva´vel em todo ponto b ∈ R− {0} e g ′(b) = 1 f ′(g(b)) = 1 3(g(b))2 = 1 3 3 √ b2 .� Definic¸a˜o 1.6 Dizemos que uma func¸a˜o f : X −→ R possui um ma´ximo local no ponto a ∈ X, quando existe δ > 0 tal que f(x) ≤ f(a) para todo x ∈ X ∩ (a− δ, a+ δ). E quando existe δ > 0 tal que f(x) < f(a) para todo x ∈ (a − δ, a + δ) ∩ (X− {a}), dizemos que f possui um ma´ximo local estrito no ponto a ∈ X. Ha´ definic¸o˜es ana´logas para os conceitos de mı´nimo local e mı´nimo local estrito de uma func¸a˜o. Exemplo 1.13 A func¸a˜o f : R −→ R, dada por f(x) = x2, possui um mı´nimo local estrito no ponto 0, pois f(x) = x2 > f(0) = 0 para todo x ∈ R− {0}.� Exemplo 1.14 A func¸a˜o g : R −→ R, g(x) = sen x , possui ma´ximos locais estritos nos pontos (4k + 1)pi 2 , pois g ( (4k+ 1) pi 2 ) = 1 > g(x) para todo x ∈ ( 4k− pi 2 , 4k+ 3 pi 2 ) − { (4k+ 1) pi 2 } , e possui mı´nimos locais estritos nos pontos (4k−1)pi 2 , pois g ( (4k− 1) pi 2 ) = −1 < g(x) , para todo x ∈ ( 4k− 3pi 2 , 4k+ pi 2 ) − { (4k− 1) pi 2 } .� J. Delgado - K. Frensel226 A derivada de uma func¸a˜o Exemplo 1.15 Uma func¸a˜o constante possui ma´ximo local e mı´nimo local na˜o-estritos em cada ponto do seu domı´nio.� Exemplo 1.16 A func¸a˜o h : R −→ R, dada por h(x) = { 1 se x ≥ 0 −1 se x < 0 , possui um ma´ximo local na˜o-estrito no ponto 0.� Exemplo 1.17 A func¸a˜o ϕ : R −→ R, ϕ(x) = x2 (1+ sen 1 x ) se x 6= 0 e ϕ(0) = 0, e´ contı´nua em toda a reta e possui um mı´nimo local na˜o estrito no ponto 0, pois ϕ(x) ≥ 0 = ϕ(0) para todo x ∈ R e, em toda vizinhanc¸a de 0, ha´ pontos x tais que ϕ(x) = 0, ja´ que 1 (4k− 1) pi 2 −→ 0 e ϕ 1 (4k− 1) pi 2 = 0 para todo k ∈ Z.� Observac¸a˜o 1.11 Se f : X −→ R e´ na˜o-decrescente e deriva´vel no ponto a ∈ X∩X ′, enta˜o f ′(a) ≥ 0, pois f(x) − f(a) x− a ≥ 0 para todo x ∈ X−{a}. • Analogamente, se f : X −→ R e´ na˜o-crescente e deriva´vel no ponto a ∈ X ∩ X ′, enta˜o f ′(a) ≤ 0. • Se f : X −→ R e´ crescente (decrescente) e deriva´velno ponto a ∈ X∩X ′, na˜o temos necessariamente f ′(a) > 0 (< 0). Por exemplo, a func¸a˜o f(x) = x3 e´ crescente e f ′(0) = 0. • Se a ∈ X ∩ X ′ ∩ X ′− e existe δ > 0 tal que f(y) ≤ f(a) ≤ f(x) para a − δ < y < a < x < a + δ, enta˜o f ′(a) ≥ 0, mas na˜o implica que f seja na˜o-decrescente (ver exemplo 1.18). Teorema 1.4 Seja f : X −→ R uma func¸a˜o deriva´vel a` direita no ponto a ∈ X∩X ′+. Se f ′(a+) > 0, enta˜o existe δ > 0 tal que f(a) < f(x) para todo x ∈ X ∩ (a, a+ δ). Prova. Como lim x−→a+ f(x) − f(a) x− a = f ′(a+) > 0, existe δ > 0 tal que f(x) − f(a) x− a > 0 para todo x ∈ X ∩ (a, a+ δ), ou seja, f(x) > f(a) ∀ x ∈ X ∩ (a, a+ δ).� Instituto de Matema´tica - UFF 227 Ana´lise na Reta Observac¸a˜o 1.12 Valem tambe´m os seguintes resultados, que podem ser provados de modo ana´logo ao teorema anterior: • Se a ∈ X ∩ X ′+ e f ′(a+) < 0, enta˜o existe δ > 0 tal que f(x) < f(a) para todo X ∩ (a, a+ δ). • Se a ∈ X ∩ X ′− e f ′(a+) > 0, enta˜o existe δ > 0 tal que f(x) < f(a) para todo x ∈ X ∩ (a− δ, a). • Se a ∈ X ∩ X ′− e f ′(a−) < 0, enta˜o existe δ > 0 tal que f(x) > f(a) para todo x ∈ X ∩ (a− δ, a). Corola´rio 1.3 Seja a ∈ X ∩ X ′+ ∩ X ′−. Se f : X −→ R possui no ponto a derivada f ′(a) > 0 (f ′(a) < 0), enta˜o existe δ > 0 tal que x, y ∈ X, a− δ < x < a < y < a+ δ =⇒ f(x) < f(a) < f(y) (f(y) < f(a) < f(x)). Corola´rio 1.4 Seja a ∈ X∩X ′+∩X ′−. Se f : X −→ R e´ deriva´vel no ponto a e possui um ma´ximo ou um mı´nimo local nesse ponto, enta˜o f ′(a) = 0. Prova. Se f ′(a) > 0 ou f ′(a) < 0, temos, pelo corola´rio anterior, que a na˜o e´ ponto de ma´ximo nem de mı´nimo local.� Observac¸a˜o 1.13 O teorema 1.4 na˜o diz que existe um intervalo a` di- reita de a no qual f e´ crescente quando f ′(a+) > 0, nem o corola´rio 1.3 diz que f e´ crescente numa vizinhanc¸a de a quando f ′(a) > 0. Exemplo 1.18 • Antes de dar o exemplo de uma func¸a˜o que ilustre a observac¸a˜o acima, faremos o estudo de algumas func¸o˜es. • A func¸a˜o f : R −→ R, f(x) = x sen 1 x se x 6= 0 e f(0) = 0, e´ contı´nua em toda a reta e possui derivada f ′(x) = sen 1 x − 1 x cos 1 x em todo x 6= 0, mas na˜o e´ deriva´vel no ponto zero, pois na˜o existe o limite de f(x) − f(0) x− 0 = sen 1 x quando x −→ 0. • A func¸a˜o g : R −→ R, g(x) = x2 sen 1 x se x 6= 0 e g(0) = 0, e´ contı´nua J. Delgado - K. Frensel228 A derivada de uma func¸a˜o em toda a reta e possui derivada g ′(x) = 2x sen 1 x − cos 1 x em todo ponto x 6= 0. Ale´m disso, como lim x→0 g(x) − g(0) x− 0 = lim x→0 x sen 1 x = 0, temos que g e´ deriva´vel no ponto 0 e g ′(0) = 0. Assim, g : R −→ R possui derivadas em todos os pontos da reta, mas g ′ : R −→ R na˜o e´ contı´nua no ponto zero, pois na˜o existe lim x→0g ′(x) = lim x→0 ( 2x sen 1 x − cos 1 x ) . • Seja a func¸a˜o ϕ : R −→ R definida por ϕ(x) = x2 sen 1 x + x 2 se x 6= 0 e ϕ(0) = 0. Como ϕ e´ contı´nua e deriva´vel em toda a reta, e ϕ ′(0) = 1 2 > 0, temos, pelo corola´rio 1.3, que existe δ > 0 tal que 0 < x < δ =⇒ ϕ(x) > 0 e −δ < x < 0 =⇒ ϕ(x) < 0. Mas, ϕ na˜o e´ crescente em vizinhanc¸a alguma do ponto 0, pois, como ϕ ′(x) = 2x sen 1 x − cos 1 x + 1 2 , para x 6= 0, dado δ > 0 existe n0 ∈ N tal que 1 2n0pi < δ. Enta˜o, 1 2n0pi ∈ (0, δ) e ϕ ′ ( 1 2n0pi ) < 0, − 1 2n0pi ∈ (−δ, 0), e ϕ ′ ( − 1 2n0pi ) < 0, 1 4n0pi+ pi 2 ∈ (0, δ) e ϕ ′ ( 1 4n0pi+ pi 2 ) > 0, − 1 4n0pi+ pi 2 ∈ (−δ, 0) e ϕ ′ ( − 1 4n0pi+ pi 2 ) > 0 . Ou seja, dado δ > 0, existem pontos xδ, xδ ∈ (0, δ) e yδ, yδ ∈ (−δ, 0) tais que ϕ ′(xδ) > 0, ϕ ′(xδ) < 0 , ϕ ′(yδ) > 0 e ϕ ′(yδ) < 0. Logo, ϕ na˜o pode ser mono´tona em intervalo algum do tipo (0, δ) ou (−δ, 0), δ > 0, pelas observac¸o˜es feitas antes do teorema 1.4. Isto so´ foi possı´vel, porque ϕ ′ na˜o e´ contı´nua no ponto zero (por queˆ?). Ale´m disso, ϕ na˜o pode ser injetiva em intervalo algum do tipo (0, δ) ou (−δ, 0), δ > 0, pois, caso contra´rio, ϕ seria mono´tona, por ser contı´nua e injetiva num intervalo (ver teorema 3.2 da parte 6).� Observac¸a˜o 1.14 • A recı´proca do corola´rio 1.4 na˜o e´ verdadeira. Por exemplo, a func¸a˜o f : R −→ R, f(x) = x3, apesar de ter derivada zero Instituto de Matema´tica - UFF 229 Ana´lise na Reta no ponto 0, tal ponto na˜o e´ de ma´ximo nem de mı´nimo local, pois f e´ uma func¸a˜o crescente em toda a reta. • No corola´rio 1.4, na˜o basta que f possua derivadas laterais no ponto de ma´ximo ou de mı´nimo para podermos concluir que as derivadas laterais sa˜o nulas nesse ponto. Por exemplo, a func¸a˜o g : R −→ R, g(x) = |x|, possui um mı´nimo no ponto 0, mas as derivadas laterais neste ponto g ′(0+) = 1 e g ′(0−) = −1 na˜o sa˜o nulas. • E, tambe´m, a condic¸a˜o de a ∈ X ′+∩X ′− e´ necessa´ria para que o corola´rio 1.4 seja va´lido. Por exemplo, a func¸a˜o h : [0,+∞) −→ R, h(x) = x2 + x possui um mı´nimo local no ponto 0, mas h ′(0) = 1 6= 0. 2. Func¸o˜es deriva´veis num intervalo Seja X ⊂ R um conjunto compacto tal que todo x ∈ X e´ ponto de acumulac¸a˜o a` esquerda e a` direita de X, com excec¸a˜o de a = infX e b = supX, e, ale´m disso, X 6= {a, b}. Enta˜o, X = [a, b]. De fato, o aberto R − X e´ reunia˜o de intervalos abertos dois a dois disjuntos, sendo (−∞, a) e (b,+∞) dois deles. Se (c, d), c < d fosse outro intervalo componente de R−X, enta˜o c e d pertenceriam a X. Como c na˜o e´ ponto de acumulac¸a˜o a` direita de X, terı´amos c = a ou c = b, e, como d na˜o e´ ponto de acumulac¸a˜o a` esquerda de X, terı´amos d = a ou d = b. Sendo c < d e a < b, terı´amos (c, d) = (a, b) e, portanto, X = {a, b}, o que e´ absurdo. Definic¸a˜o 2.1 Quando a func¸a˜o f : I −→ R possui derivada em todos os pontos do intervalo I, podemos considerar a func¸a˜o derivada f ′ : I −→ R dada por x 7−→ f ′(x). E quando f ′ : I −→ R e´ uma func¸a˜o contı´nua, dizemos que f e´ uma func¸a˜o continuamente deriva´vel, ou uma func¸a˜o de classe C1. Observac¸a˜o 2.1 Mas nem sempre a func¸a˜o derivada e´ uma func¸a˜o contı´nua. Por exemplo, a func¸a˜o f : R −→ R, f(x) = x2 sen 1 x se x 6= 0 0 se x = 0 , J. Delgado - K. Frensel230 Func¸o˜es deriva´veis num intervalo e´ deriva´vel em todos os pontos da reta, com f ′(x) = 2x sen 1 x − cos 1 x se x 6= 0 e f ′(0) = 0. Mas f ′ : R −→ R na˜o e´ contı´nua no ponto zero e, portanto, f na˜o e´ de classe C1 em toda a reta. Observac¸a˜o 2.2 Seja f : I −→ R uma func¸a˜o de classe C1 no intervalo I e sejam a < b em I, tais que f ′(a) < d < f ′(c). Enta˜o, pelo teorema do valor intermedia´rio (TVI) para func¸o˜es contı´nuas aplicado a` derivada f ′, existe c ∈ (a, b) ⊂ I tal que f ′(c) = d. Jean Gaston Darboux (1842-1917) Franc¸a. Mas o teorema abaixo, devido a Darboux, nos diz que se f e´ deriva´vel em [a, b], enta˜o f ′ satisfaz o TVI, mesmo sendo descontı´nua. Teorema 2.1 (Valor intermedia´rio para a derivada) Se f : [a, b] −→ R e´ deriva´vel no intervalo [a, b] e f ′(a) < d < f ′(b), enta˜o existe c ∈ (a, b) tal que f ′(c) = d. Prova. Suponhamos, primeiro, que d = 0, ou seja, f ′(a) < 0 < f ′(b). Como f ′(a) < 0, existe δ > 0 tal que f(x) < f(a) para todo x ∈ (a, a+ δ), e como f ′(b) > 0, existe δ ′ > 0 tal que f(y) < f(b) para todo y ∈ (b− δ ′, b). Ale´m disso, como f e´ contı´nua no compacto [a, b], temos, pelo teorema de Weierstrass, que f possui um ponto de mı´nimo e um ponto de ma´ximo no intervalo [a, b]. Logo, o ponto de mı´nimo c pertence ao intervalo (a, b), pois, pelo visto acima, a e b na˜o sa˜o pontos de mı´nimo. Assim, pelo corola´rio 1.4, f ′(c) = 0, pois c ∈ (a, b) e´ ponto de acumulac¸a˜o a` direita e a` esquerda do conjunto [a, b]. No caso geral, basta considerar a func¸a˜o g(x) = f(x) − dx, x ∈ [a, b]. Enta˜o, g ′(x) = f ′(x) − d e f ′(a) < d < f ′(b) se,e so´ se, g ′(a) < 0 < g ′(b). Logo, se f ′(a) < d < f ′(b), existe c ∈ (a, b) tal que g ′(c) = 0, ou seja, f ′(c) = d.� Corola´rio 2.1 Se f : I −→ R e´ deriva´vel no intervalo I, enta˜o f ′ na˜o tem descontinuidade de primeira espe´cie em I. Instituto de Matema´tica - UFF 231 Ana´lise na Reta Prova. Seja c ∈ I um ponto de acumulac¸a˜o a` direita de I, isto e´, c na˜o e´ a extremidade superior de I. Afirmac¸a˜o: Se existe lim x→c+ f ′(x) = L, enta˜o L = f ′(c). Suponhamos, por absurdo, que f ′(c) < L. Seja d ∈ R tal que f ′(c) < d < L. Para ε = L − d > 0, existe δ > 0 tal que f ′(x) > L − ε = d para todo x ∈ (c, c+ δ). Em particular, f ′(c) < d < f ′ ( c+ δ 2 ) , mas na˜o existe x ∈ ( c, c+ δ 2 ) tal que f(x) = d, o que contradiz o teorema 2.1. De modo ana´logo, podemos provar que L na˜o pode ser menor que f ′(c). Logo, L = f ′(c). • Se c e´ um ponto de acumulac¸a˜o a` esquerda, podemos mostrar, tambe´m, que se existe lim x→c− f ′(x) = M enta˜o M = f ′(c). Logo, f na˜o possui descontinuidade de primeira espe´cie, pois se os li- mites laterais existem num ponto a, f e´ necessariamente contı´nua neste ponto.� Exemplo 2.1 A func¸a˜o f : R −→ R, f(x) = |x|, na˜o e´ um contra-exemplo para o corola´rio acima, pois, apesar de f ′ : R − {0} −→ R, ser dada por f ′(x) = −1 se x < 0 e f ′(x) = 1 se x > 0, 0 na˜o e´ uma descontinuidade de primeira espe´cie de f ′, ja´ que f ′(0) na˜o existe. Mas, o corola´rio 2.1 nos diz que na˜o existe uma func¸a˜o g : R −→ R deriva´vel em toda a reta tal que g ′ = f ′ em R − {0}, pois, nesse caso, g ′ teria uma descontinuidade de primeira espe´cie no ponto 0.� Exemplo 2.2 A func¸a˜o ϕ : R −→ R, dada por ϕ(x) = { 0 se x ∈ Q 1 se x ∈ R−Q , na˜o e´ a derivada de uma func¸a˜o ξ : R −→ R, pois, embora suas descon- tinuidades sejam todas de segunda espe´cie, ela na˜o satisfaz ao teorema do valor intermedia´rio para func¸o˜es deriva´veis.� J. Delgado - K. Frensel232 Func¸o˜es deriva´veis num intervalo Teorema 2.2 (Rolle) Seja f : [a, b] −→ R contı´nua em [a, b] e deriva´vel em (a, b). Se f(a) = f(b), enta˜o existe c ∈ (a, b) tal que f ′(c) = 0. Prova. Se f e´ constante em [a, b], enta˜o f ′(c) = 0 para todo c ∈ (a, b). Suponhamos, enta˜o, que f na˜o e´ constante em [a, b]. Como f e´ contı´nua no compacto [a, b], o ma´ximo e o mı´nimo de f sa˜o atingidos em pontos do intervalo [a, b]. Enta˜o, existe c ∈ (a, b) tal que f(c) = M ou f(c) = m, pois se o ma´ximo M e o mı´nimo m fossem ambos atingidos nas extremidades, terı´amos M = m, pois f(a) = f(b), e f seria, portanto, constante. Logo, pelo corola´rio 1.4, f ′(c) = 0, pois c e´ um ponto de acumulac¸a˜o a` direita e a` esquerda do intervalo [a, b] e f e´ deriva´vel no ponto c.� Exemplo 2.3 Seja f : [0, 1] −→ R definida por f(x) = x se x ∈ [0, 1) e f(1) = 0. Enta˜o f(0) = f(1) = 0 e f e´ deriva´vel em (0, 1), mas f ′(x) = 1 6= 0 para todo x ∈ (0, 1). Isto ocorre porque f na˜o e´ contı´nua em [0, 1].� Exemplo 2.4 Seja g : [−1, 1] −→ R dada por g(x) = |x|. Enta˜o g e´ contı´nua em [−1, 1] e g(−1) = g(1) = 1, mas na˜o existe c ∈ (−1, 1) tal que g ′(c) = 0. Isto ocorre porque g na˜o e´ deriva´vel no intervalo aberto (−1, 1), ja´ que na˜o e´ deriva´vel no ponto 0.� Exemplo 2.5 Seja h : [−1, 1] −→ R definida por h(x) = (1−x2) sen 1 1− x2 se x 6= ±1 e h(±1) = 0. Enta˜o, h e´ contı´nua em [−1, 1] e deriva´vel apenas no intervalo aberto (−1, 1). Neste exemplo, podemos aplicar o teorema de Rolle para garantir que existe c ∈ (−1, 1) tal que f ′(c) = 0. Na realidade, f ′(0) = 0, pois f ′(x) = −2x sen 1 1− x2 + 2x 1− x2 cos 1 1− x2 para x 6= ±1.� Exemplo 2.6 Apesar do teorema de Rolle na˜o se aplicar a` func¸a˜o ϕ : [−1, 1] −→ R definida por ϕ(x) = sen 1 1− x2 se x 6= ±1 e ϕ(±1) = 0, por ϕ na˜o ser contı´nua no intervalo fechado [−1, 1], existem infinitos pontos em (−1, 1) nos quais a derivada de ϕ se anula.� Instituto de Matema´tica - UFF 233 Ana´lise na Reta Teorema 2.3 (valor me´dio de Lagrange) Seja f : [a, b] −→ R contı´nua em [a, b] e deriva´vel em (a, b). Enta˜o existe c ∈ (a, b) tal que f ′(c) = f(b) − f(a) b− a . • Um enunciado equivalente ao teorema acima e´ o seguinte: Seja f : [a, a + h] −→ R contı´nua no intervalo [a, a + h] e deriva´vel em (a, a+ h). Enta˜o existe t ∈ (0, 1) tal que f(a+ h) = f(a) + f ′(a+ th)h . Prova. Seja g : [a, b] −→ R definida por g(x) = (f(b) − f(a) b− a ) (x− a) + f(a). Como g e´ contı´nua e deriva´vel em [a, b], g(a) = f(a) e g(b) = f(b), temos que a func¸a˜o ϕ : [a, b] −→ R, ϕ(x) = f(x) − g(x) satisfaz as hipo´teses do teorema de Rolle, pois ϕ e´ contı´nua em [a, b], deriva´vel em (a, b) e ϕ(a) = ϕ(b) = 0. Logo, existe c ∈ (a, b) tal que ϕ ′(c) = 0. Mas, como ϕ ′(x) = f ′(x) − g ′(x) e g ′(x) = f(b) − f(a) b− a para todo x ∈ (a, b), temos que f ′(c) = g ′(c) = f(b) − f(a) b− a . � Observac¸a˜o 2.3 Geometricamente, o teorema de valor me´dio de Lagrange nos diz que existe um ponto c ∈ (a, b) tal que a reta tangente ao gra´fico de f no ponto (c, f(c)) e´ paralela a` reta secante ao gra´fico que liga os pontos (a, f(a)) e (b, f(b)). Corola´rio 2.2 Se uma func¸a˜o contı´nua f : [a, b] −→ R possui derivada nula em todos os pontos x ∈ (a, b), enta˜o f e´ constante. Prova. Seja x ∈ (a, b). Enta˜o existe cx ∈ (a, b) tal que 0 = f ′(cx) = f(x) − f(a) x− a . Logo, f(x) = f(a) para todo x ∈ (a, b). J. Delgado - K. Frensel234 Func¸o˜es deriva´veis num intervalo Enta˜o, f(a) = lim x→b f(x) = f(b), pois f e´ contı´nua em [a, b]. Assim, f(x) = f(a) para todo x ∈ [a, b], ou seja, f e´ constante em [a, b].� Corola´rio 2.3 Se f, g : [a, b] −→ R sa˜o contı´nuas em [a, b], deriva´veis em (a, b) e f ′(x) = g ′(x) para todo x ∈ (a, b), enta˜o existe c ∈ R tal que g(x) = f(x) + c para todo x ∈ [a, b]. Prova. Como a func¸a˜o g − f : [a, b] −→ R e´ contı´nua em [a, b], deriva´vel em (a, b) e (g − f) ′(x) = g ′(x) − f ′(x) = 0 para todo x ∈ (a, b), temos, pelo corola´rio anterior, que g− f e´ constante em [a, b], ou seja, existe c ∈ R tal que g(x) − f(x) = c para todo x ∈ [a, b].� Observac¸a˜o 2.4 A func¸a˜o f : R− {0} −→ R, definida por f(x) = x |x| , na˜o e´ constante, apesar de f ′(x) = 0 para todo x ∈ R− {0}. Isto ocorre porque o domı´nio de f na˜o e´ um intervalo. Corola´rio 2.4 Seja f : I −→ R deriva´vel no intervalo aberto I. Se existe k ∈ R tal que |f ′(x)| ≤ k para todo I ∈ I, enta˜o |f(x) − f(y)| ≤ k|x− y| , quaisquer que sejam x, y ∈ I. Prova. Sejam x, y ∈ I, x < y. Como f e´ contı´nua em [x, y] e deriva´vel em (x, y), existe z ∈ (x, y) tal que f(x) − f(y) = f ′(z)(x− y) . Logo, |f(x) − f(y)| = |f ′(z)| |x− y| ≤ k|x− y| . O mesmo vale se y < x.� Observac¸a˜o 2.5 Podemos concluir que se f possui derivada limitada num intervalo aberto I, enta˜o f e´ lipschitziana e, portanto, uniformemente contı´nua em I. Em particular, se I = (a, b), enta˜o existem lim x→b− f(x) e lim x→a+ f(x). Por exemplo, a func¸a˜o f : (0,+∞) −→ R, definida por f(x) = sen 1 x , na˜o Instituto de Matema´tica - UFF 235 Ana´lise na Reta tem limite a` direita no ponto 0 e tem derivada ilimitada em qualquer inter- valo do tipo (0, δ], pois f ′(x) = − 1 x2 cos 1 x para x 6= 0. Observac¸a˜o 2.6 Se f e´ uma func¸a˜o contı´nua em [a, b], deriva´vel em (a, b) e |f ′(x)| ≤ k para todo x ∈ (a, b), enta˜o |f(x) − f(y)| ≤ k|x − y| quaisquer que sejam x, y ∈ [a, b]. De fato, sejam (xn) e (yn) sequ¨eˆncias de pontos do intervalo (a, b) tais que xn −→ a e yn −→ b. Como |f(x)− f(y)| ≤ k|x−y| para todos os pontos x, y ∈ (a, b), temos que |f(xn) − f(yn)| ≤ k|xn − yn| para todo n ∈ N. Logo, |f(a) − f(b)| = lim n→+∞ |f(xn) − f(yn)| ≤ k limn→+∞ |xn − yn| = k|a− b| . E, se x ∈ (a, b), enta˜o, • |f(a) − f(x)| = lim n→+∞ |f(xn) − f(x)| ≤ k limn→+∞ |xn − x| = k|a− x| , • |f(x) − f(b)|= lim n→+∞ |f(x) − f(yn)| ≤ k limn→+∞ |x− yn| = k|x− b| . Logo, |f(x) − f(y)| ≤ k|x− y| para todos x, y ∈ [a, b]. Corola´rio 2.5 Seja f contı´nua em [a, b] e deriva´vel em (a, b). Se existe lim x→a+ f ′(x) = L, enta˜o existe f ′(a+) e L = f ′(a+). Prova. Basta provar que lim n→+∞ f(xn) − f(a)xn − a = L , para toda sequ¨eˆncia (xn) de pon- tos de (a, b) com lim n→+∞ xn = a. Pelo teorema do valor me´dio, para todo n ∈ N, existe yn ∈ (a, xn) tal que f ′(yn) = f(xn) − f(a) xn − a . Como yn −→ a e lim n→+∞ f ′(yn) = limx→a+ f ′(x) = L, temos que lim n→+∞ f(xn) − f(a)xn − a = L . Logo, f e´ deriva´vel a` direita no ponto a e f ′(a+) = L.� J. Delgado - K. Frensel236 Func¸o˜es deriva´veis num intervalo Observac¸a˜o 2.7 De modo ana´logo, podemos provar que se f e´ contı´nua em [a, b], deriva´vel em (a, b) e existe lim x→b− f ′(x) = L, enta˜o existe f ′(b−) e L = f ′(b−). Corola´rio 2.6 Seja f : (a, b) −→ R deriva´vel, exceto, possivelmente, num ponto c ∈ (a, b), onde f e´ contı´nua. Se existe lim x→c f ′(x) = L, enta˜o f e´ deriva´vel no ponto c e f ′(c) = L. Prova. Seja δ > 0 tal que [c− δ, c+ δ] ⊂ (a, b). Como a func¸a˜o f e´ contı´nua em [c − δ, c], deriva´vel em (c − δ, c) e existe lim x→c− f ′(x) = L, enta˜o f e´ deriva´vel a` esquerda no ponto c e f ′(c−) = L. E, tambe´m, como f e´ contı´nua em [c, c+δ], deriva´vel em (c, c+δ) e existe lim x→c+ f(x) = L, enta˜o f e´ deriva´vel a` direita no ponto c e f ′(c+) = L. Logo, f e´ deriva´vel no ponto c e f ′(c) = L.� Corola´rio 2.7 Seja f : I −→ R deriva´vel no intervalo I. Enta˜o, f ′(x) ≥ 0 para todo x ∈ I se, e so´ se, f e´ na˜o-decrescente em I. E se f ′(x) > 0 para todo x ∈ I, enta˜o f e´ crescente. Neste caso, f possui uma inversa, definida no intervalo J = f(I), que e´ deriva´vel no intervalo J com (f−1) ′(y) = 1 f ′(f−1(y)) , para todo y ∈ J. Prova. (=⇒) Sejam x, y ∈ I, x < y. Pelo teorema do valor me´dio, existe z ∈ (x, y) tal que f(y) − f(x) y− x = f ′(z). Como f ′(z) ≥ 0 e y − x > 0, te- mos que f(y) ≥ f(x). (⇐=) Se f e´ na˜o-decrescente e deriva´vel em a ∈ I, enta˜o f ′(a) ≥ 0, pois f(a+ h) − f(a) h ≥ 0 , para todo h 6= 0 tal que a+ h ∈ I. • Se f ′(x) > 0 para todo x ∈ I, temos que se a < b, a, b ∈ I, enta˜o existe, pelo teorema do valor me´dio, c ∈ (a, b) tal que f(b) − f(a) = f ′(c)(b− a). Logo, f(b) > f(a), ja´ que f ′(c)(b− a) > 0. Note que: a recı´proca deste re- sultado na˜o e´ verdadeira, pois f(x) = x3 e´ crescente e deriva´vel em toda a reta, mas f ′(0) = 0. Instituto de Matema´tica - UFF 237 Ana´lise na Reta Como f e´ contı´nua e injetiva no intervalo I, enta˜o, pelo teorema 3.2 da parte 6, J = f(I) e´ um intervalo e f−1 : J −→ I e´ contı´nua. Ale´m disso, como f ′(x) 6= 0 para todo x ∈ I, temos, pelo corola´rio 1.2, que f−1 e´ deriva´vel em J e (f−1) ′(y) = 1 f ′(f−1(y)) para todo y ∈ J.� Observac¸a˜o 2.8 Vale um resultado ana´logo para func¸o˜es na˜o-crescentes e decrescentes com ≤ e <, respectivamente. Exemplo 2.7 Seja f : R −→ R definida por f(x) = ex. Sabemos do Ca´lculo que f e´ deriva´vel em toda a reta e f ′(x) = ex para todo x ∈ R. Dado x > 0, existe, pelo teorema do valor me´dio, c ∈ (0, x) tal que f(x) = f(0) + f ′(c)x = 1 + ecx. Como c > 0 temos que ec > 1. Logo, ex > 1 + x para todo x > 0. Aplicac¸a˜o: lim x→+∞ x n ex = 0 para todo n ∈ N. Com efeito, como e xn+1 > 1 + x n+ 1 > x n+ 1 para todo x > 0 e n ∈ N, temos que ex > x n+1 (n+ 1)n+1 . Enta˜o, e x xn > x A , ou seja, 0 < x n ex < A x para todo x > 0, onde A = (n+1)n+1. Logo, lim x→+∞ x n ex = 0. Mais geralmente: lim x→+∞ p(x)ex = 0 para todo polinoˆmio p(x) = anxn + an−1x n−1 + . . .+ a1x+ a0. De fato, como p(x) = anxnq(x), onde q(x) = 1+ an−1 anx + . . .+ a0 anxn , temos que lim n→+∞ p(x)xn = an e, portanto, lim x→+∞ p(x)ex = limx→+∞ p(x)xn · x n ex = lim x→+∞ p(x)xn · limx→+∞ x n ex = an · 0 = 0 . � Exemplo 2.8 Seja f : R −→ R definida por f(x) = e− 1x2 se x 6= 0 e f(0) = 0. Como lim x→0 e− 1 x2 = 0, f e´ contı´nua em R. Ale´m disso, f e´ deriva´vel J. Delgado - K. Frensel238 Func¸o˜es deriva´veis num intervalo em R− {0}, com f ′(x) = 2 x3 e − 1 x2 para x 6= 0. Pondo y = 1 x2 , temos, pelo exemplo acima, que lim x→0 |f ′(x)| = limy→+∞ 2y 3 2 ey = 0, ja´ que y ey < y 3 2 ey < y2 ey , para todo y > 1, e lim y→+∞ yey = limy→+∞ y 2 ey = 0. Logo, pelo corola´rio 2.6, f e´ deriva´vel no ponto 0 e f ′(0) = 0.� Exemplo 2.9 Seja f : R −→ R a func¸a˜o f(x) = e− 1 x se x 6= 0 0 se x = 0 . Como lim x→0+ e− 1 x = 0 = f(0) e lim x→0− e− 1 x = +∞, f na˜o e´ contı´nua no ponto zero, mas e´ contı´nua a` direita nesse ponto. Sendo f ′(x) = 1 x2 e− 1 x para todo x 6= 0 e lim x→0+ f ′(x) = limy→+∞ y2 ey = 0, onde y = 1 x , temos, pelo corola´rio 2.5, que f e´ deriva´vel a` direita no ponto 0 e f ′(0+) = 0. Observe que lim x→0− f ′(x) = limx→0− 1 x2e 1 x = +∞.� Observac¸a˜o 2.9 Ha´ duas situac¸o˜es nas quais vale o teorema do valor me´dio sem supor que a func¸a˜o f : [a, b] −→ R seja contı´nua nos pontos a e b: Primeira: Suponhamos que existem lim x→a+ f(x) = L e limx→b− f(x) = M. Enta˜o, a func¸a˜o g : [a, b] −→ R definida por g(x) = f(x) se x ∈ (a, b), g(a) = L e g(b) = M e´ contı´nua em [a, b] e deriva´vel em (a, b). Logo, pelo teorema do valor me´dio, existe c ∈ (a, b) tal que g(b) − g(a) = g ′(c)(b− a) , ou seja, existe c ∈ (a, b) tal que (M− L) = f ′(x)(b− a). Temos f(b) − f(a) = f ′(c)(b− a) se, e so´ se, M− L = f(b) − f(a). Segunda: Se f : [a, b] −→ R e´ limitada em [a, b], deriva´vel em (a, b) e pelo menos um dos limites nas extremidades, digamos lim x→a+ f(x), na˜o existe, enta˜o existe c ∈ (a, b) tal que f ′(c) = f(b) − f(a) b− a . Instituto de Matema´tica - UFF 239 Ana´lise na Reta De fato, como na˜o existe lim x→a+ f(x), temos, pela observac¸a˜o feita apo´s o corola´rio 2.4, que f ′ na˜o e´ limitada em (a, b). Afirmac¸a˜o: f ′ e´ ilimitada inferior e superiormente. De fato, suponhamos, por absurdo, que f ′(x) ≥ A para todo x ∈ (a, b). Enta˜o, a func¸a˜o g(x) = f(x) − Ax seria na˜o-decrescente em (a, b), pois g ′(x) ≥ 0 em (a, b), e limitada. Existiria, portanto, lim x→a+ g(x), o que e´ absurdo, pois isto implicaria na existeˆncia de lim x→a+ f(x). De modo ana´logo, podemos provar que f ′ na˜o e´ limitada superiormente em (a, b). Seja d = f(b) − f(a) b− a . Enta˜o existem pontos x1, x2 ∈ (a, b) tais que f ′(x1) < d < f ′(x2). Logo, pelo teorema do valor intermedia´rio para a derivada, existe c ∈ (a, b) tal que f ′(c) = d = f(b) − f(a) b− a . Definic¸a˜o 2.2 Dizemos que uma func¸a˜o f : I −→ R e´ uniformemente deriva´vel no intervalo I quando f e´ deriva´vel em I e para cada ε > 0 dado, existe δ > 0 tal que 0 < |h| < δ =⇒ ∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f ′(x) ∣∣∣∣ < ε , seja qual for x ∈ I, x+ h ∈ I. • Uma condic¸a˜o equivalente seria: ∀ ε > 0 ∃ δ > 0 ; 0 < |h| < δ =⇒ | (f(x+ h) − f(x) − f ′(x)h | < ε |h| ∀ x, x+ h ∈ I Teorema 2.4 Uma func¸a˜o f : [a, b] −→ R e´ uniformemente deriva´vel se, e so´ se, f e´ de classe C1. Prova. (=⇒) Suponhamos que f e´ de classe C1 em [a, b], ou seja, f e´ deriva´vel em [a, b] e f ′ e´ contı´nua em [a, b]. Enta˜o, f ′ e´ uniformemente contı´nua em [a, b], ja´ que [a, b] e´ compacto. ∀ ε > 0 , ∃ δ > 0 tal que x, y ∈ [a, b], |x− y| < δ =⇒ |f ′(x) − f ′(y)| < ε . J. Delgado - K. Frensel240 Func¸o˜es deriva´veis num intervalo Sejam x, x + h ∈ [a, b] com 0 < |h| < δ. Enta˜o, pelo teorema do valor me´dio, existe y entre x e x+ h tal que f(x+ h) − f(x) = f ′(y)h. Logo, |f(x+ h) − f(x) − f ′(x)h| = |f ′(y) − f ′(x)| |h| < ε|h|, pois |(x+ h) − x| = |h| < δ e, portanto, |y− x| < δ. Assim, f e´ uniformemente deriva´velem [a, b]. (⇐=) Suponhamos, agora, que f e´ uniformemente deriva´vel em [a, b]. Provaremos que a derivada f ′ e´ contı´nua em todos os pontos do intervalo compacto [a, b]. Seja x0 ∈ (a, b) e tome δ = min{b− x0, x0 − a} > 0. Dado ε > 0, existe 0 < δ ′ < δ 2 tal que se x ∈ [a, b], x + h ∈ [a, b] e 0 < |h| < δ ′, enta˜o ∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f ′(x) ∣∣∣∣ < ε3 . Sejam h > 0 fixo tal que h < δ ′. Enta˜o, ∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f ′(x) ∣∣∣∣ < ε3 para todo x ∈ [a, x0 + h], pois (x0 + h) + h < x0 + δ ≤ x0 + (b− x0) = b. • Mostraremos que f ′ e´ contı´nua em x0. Seja x tal que |x − x0| < h. Enta˜o, x ∈ (x0 − h, x0 + h) ⊂ (a, b) , pois, x0 − h > x0 − (x0 − a) = a e x0 + h < x0 + b− x0 = b , e |f ′(x) − f ′(x0)| ≤ ∣∣∣∣ f ′(x) − f(x+ h) − f(x)h ∣∣∣∣ + ∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f(x0 + h) − f(x0)h ∣∣∣∣ + ∣∣∣∣ f(x0 + h) − f(x0)h − f ′(x0) ∣∣∣∣ < ε 3 + ∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f(x0 + h) − f(x0)h ∣∣∣∣+ ε3 . Como a func¸a˜o g : [a, x0 + h] −→ R definida por g(x) = f(x+ h) − f(x) h e´ contı´nua em x0, existe 0 < δ ′′ < h tal que |x− x0| < δ ′′ =⇒ |g(x) − g(x0)| < ε 3 . Instituto de Matema´tica - UFF 241 Ana´lise na Reta Enta˜o, |f ′(x) − f ′(x0)| < ε 3 + ε 3 + ε 3 = ε para todo x ∈ (x0 − δ ′′, x0 + δ ′′). • Mostraremos, agora, que f ′ e´ contı´nua no ponto a. Dado ε > 0, existe 0 < δ < b− a 2 tal que x, x+ h ∈ [a, b] e 0 < |h| < δ =⇒ ∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f ′(x) ∣∣∣∣ < ε3. Seja h > 0 fixo tal que h < δ. Enta˜o,∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f ′(x) ∣∣∣∣ < ε3 , para todo x ∈ [ a, a+ b 2 ] , pois a < a+ b 2 + h < a+ b 2 + b− a 2 = b. Como a func¸a˜o g : [ a, a+ b 2 ] −→ R definida por g(x) = f(x+ h) − f(x) h e´ contı´nua no ponto a, existe 0 < δ ′′ < h tal que a ≤ x < a+ δ ′′ =⇒ |g(x) − g(a)| < ε 3 . Logo, |f ′(x) − f ′(a)| ≤ |f ′(x) − g(x)| + |g(x) − g(a)| + |g(a) − f ′(a)| < ε 3 + ε 3 + ε 3 = ε , para todo x ∈ [a, a+ δ ′′). Assim, f ′ e´ contı´nua no ponto a. • Finalmente, mostraremos que f ′ e´ contı´nua no ponto b. Seja 0 < δ < b− a 2 tal que x, x+ h ∈ [a, b] e 0 < |h| < δ =⇒ ∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f ′(x) ∣∣∣∣ < ε3 . Seja h < 0 fixo tal que h > −δ. Enta˜o,∣∣∣∣ f(x+ h) − f(x)h − f ′(x) ∣∣∣∣ < ε3 , para todo x ∈ [ a+ b 2 , b ] , pois b > a+ b 2 + h > a+ b 2 − b− a 2 = a. Como a func¸a˜o g : [ a+ b 2 , b ] −→ R , g(x) = f(x+ h) − f(x) h , e´ contı´nua no ponto b, existe 0 < δ ′′ < |h| tal que J. Delgado - K. Frensel242 Fo´rmula de Taylor |g(x) − g(b)| < ε 3 para todo x ∈ (b− δ ′′, b] ⊂ [ a+ b 2 , b ] . Logo, |f ′(x) − f ′(b)| ≤ |f ′(x) − g(x)| + |g(x) − g(b)| + |g(b) − f ′(b)| < ε 3 + ε 3 + ε 3 = ε , para todo x ∈ (b− δ ′′, b] . Assim, f ′ e´ contı´nua no ponto b.� Para uma demonstrac¸a˜o mais sinte´tica, veja Curso de Ana´lise, Vol. I de Elon Lima 3. Fo´rmula de Taylor Seja n ∈ N. A n−e´sima derivada, ou derivada de ordem n, da func¸a˜o f no ponto a e´ indicada por f(n)(a) e e´ definida por induc¸a˜o da seguinte maneira: f ′′(a) = f(2)(a) = [f ′] ′(a) , f ′′′(a) = f(3)(a) = [f ′′] ′(a) , · · · · · · f(n)(a) = [f(n−1)] ′(a) . • ´E conveniente considerar f como a sua pro´pria derivada de ordem zero e escrever f(0)(a) = f(a), para simplificar as fo´rmulas. • A derivada de ordem n, f(n)(a), de f no ponto a so´ faz sentido quando f(n−1)(x) existe para todo x num conjunto ao qual a pertence e do qual e´ ponto de acumulac¸a˜o. Em todos os casos que estudaremos, tal conjunto sera´ um intervalo contendo a. Definic¸a˜o 3.1 Dizemos que f : I −→ R e´ n−vezes deriva´vel no intervalo I quando existe f(n)(x) para todo x ∈ I. Quando x e´ uma das extremidades de I, f(n)(x) e´ uma derivada lateral. Definic¸a˜o 3.2 Dizemos que f : I −→ R e´ n−vezes deriva´vel no ponto a ∈ I, quando existe um intervalo aberto J contendo a tal que f e´ (n− 1)−vezes deriva´vel em I ∩ J e, ale´m disso, existe f(n)(a). Definic¸a˜o 3.3 Dizemos que f : I −→ R e´ de classe Cn, e escrevemos f ∈ Cn, ou f ∈ Cn(I;R), quando f e´ n−vezes deriva´vel em I e a derivada de ordem n, x 7−→ f(n)(x), e´ contı´nua em I. Instituto de Matema´tica - UFF 243 Ana´lise na Reta Observac¸a˜o 3.1 Em particular, dizer que f ∈ C0 significa que f e´ contı´- nua em I. Exemplo 3.1 Para cada n = 0, 1, 2, . . ., seja ϕn : R −→ R a func¸a˜o definida por ϕn(x) = |x|nx . Enta˜o, ϕn(x) = xn+1, se x ≥ 0 e ϕn(x) = −xn+1 se x ≤ 0. Afirmac¸a˜o: ϕ ′n(x) = (n+ 1)ϕn−1(x) para todo x ∈ R e n ∈ N. De fato, • Se x > 0, ϕ ′n(x) = (n+ 1)xn = (n+ 1)xn−1|x| = (n+ 1)ϕn−1(x) . • Se x < 0, ϕ ′n(x) = −(n+ 1)xn(n+ 1)xn−1|x| = (n+ 1)ϕn−1(x) . • ϕ ′n(0+) = ϕ ′n(0−) = 0 , pois lim x→0±ϕ ′n(x) = limx→0±(n+ 1)xn−1|x| = 0 . Logo ϕ ′n(0) = 0 = (n+ 1)ϕn−1(0) . Afirmac¸a˜o: ϕ(n)n (x) = (n+ 1)!ϕ0(x) para todo x ∈ R. • Se n = 1, ϕ ′1(x) = 2ϕ0(x) = 2!ϕ0(x) , ∀ x ∈ R. • Suponhamos, por induc¸a˜o, que ϕ(n)n (x) = (n+1)!ϕ0(x), para todo x ∈ R. Enta˜o, como ϕ ′n+1(x) = (n+ 2)ϕn(x), temos que ϕ (n+1) n+1 (x) = [ϕ ′ n+1] (n)(x) = (n+ 2)ϕ (n) n (x) = (n+ 2) (n+ 1)!ϕ0(x) = (n+ 2)!ϕ0(x) , para todo x ∈ R. Como ϕ0(x) = |x|, x ∈ R, e´ contı´nua, mas na˜o e´ deriva´vel no ponto zero, temos que ϕ ∈ Cn, mas na˜o e´ (n + 1)−vezes deriva´vel no ponto zero. Enta˜o, ϕ 6∈ Cn+1.� Exemplo 3.2 • Sejam as func¸o˜es fn, hn : R −→ R definidas por: fn(x) = x 2n sen 1 x , se x 6= 0 0 se x = 0 e hn(x) = x 2n cos 1 x , se x 6= 0 0 se x = 0 . Enta˜o fn e hn sa˜o n−vezes deriva´veis em R, mas f(n)n e h(n)n na˜o sa˜o contı´nuas no ponto zero. Logo, fn 6∈ Cn e hn 6∈ Cn. J. Delgado - K. Frensel244 Fo´rmula de Taylor Em particular, fn e hn na˜o sa˜o (n+ 1)−vezes deriva´veis. • Sejam as func¸o˜es gn, ϕn : R −→ R definidas por: gn(x) = x 2n+1 sen 1 x se x 6= 0 0 se x = 0 , e ϕn(x) = x 2n+1 cos 1 x se x 6= 0 0 se x = 0 . Enta˜o, gn ∈ Cn e ϕn ∈ Cn, mas na˜o sa˜o (n + 1)−vezes deriva´veis no ponto zero. Vamos provar as afirmac¸o˜es feitas acima por induc¸a˜o sobre n. Caso n = 1: Como f ′1(x) = 2x sen 1 x − cos 1 x se x 6= 0 e f ′1(0) = 0 , h ′1(x) = 2x cos 1 x + sen 1 x se x 6= 0 e h ′1(0) = 0 , temos que f1 e h1 sa˜o deriva´veis em R, mas f ′1 e h ′1 na˜o sa˜o contı´nuas no ponto zero. • Como g ′1(x) = 3x 2 sen 1 x − x cos 2 x , x 6= 0 e g ′1(0) = 0, g ′′1 (x) = 6x sen 1 x − 4 cos 1 x + 1 x sen 1 x , x 6= 0, ϕ ′1(x) = 3x 2 cos 1 x + x sen 1 x , x 6= 0 , e ϕ ′1(0) = 0, ϕ ′′1 (x) = 6x cos 1 x + 4 sen 1 x − 1 x cos 1 x , x 6= 0 , temos que g1 e ϕ1 sa˜o de classe C1, mas na˜o sa˜o 2−vezes deriva´veis no ponto zero, pois na˜o existem lim x→0 g ′1(x) − g ′ 1(0) x− 0 e lim x→0 ϕ ′1(x) −ϕ ′ 1(0) x− 0 . Caso geral: Suponhamos que as afirmac¸o˜es feitas sejam va´lidas para fn, hn, gn e ϕn. Sendo f ′n+1(x) = (2n+ 2)x 2n+1 sen 1 x − x2n cos 1 x , x 6= 0, e f ′n+1(0) = 0 , temos que f ′n+1(x) = (2n+ 2)gn(x) − hn(x) para todo x ∈ R . Como as func¸o˜es gn e hn sa˜o n−vezes deriva´veis na reta, mas a derivada de ordem n de hn na˜o e´ contı´nua na origem e a derivada da func¸a˜o gn e´ Instituto de Matema´tica - UFF 245 Ana´lise na Reta contı´nua em R, temos que fn+1 e´ (n+ 1)−vezes deriva´vel em R, mas sua derivada de ordem n+ 1 na˜o e´ contı´nua no ponto 0. De modo ana´logo, temos que: h ′n+1(x) = (2n+ 2)x 2n+1 cos 1 x + x2n sen 1 x , x 6= 0 , e h ′n+1(0) = 0 ou seja, h ′n+1(x) = (2n+ 2)ϕn(x) + fn(x) para todo x ∈ R . Logo, hn+1 e´ (n + 1)−vezes deriva´vel em R, pois ϕn e fn sa˜o n−vezes deriva´veis em R, mas h(n+1)n+1 na˜o e´ contı´nua no ponto zero, ja´ que f(n)n na˜o e´ contı´nua no ponto zero e ϕ(n)ne´ contı´nua em toda a reta. • Sendo g ′n+1(x) = (2n+ 3)x 2n+2 sen 1 x − x2n+1 cos 1 x , x 6= 0 , e g ′n+1(0) = 0 , temos que g ′n+1(x) = (2n+ 3)fn+1(x) −ϕn(x) para todo x ∈ R . Como ϕn ∈ Cn e fn+1 ∈ Cn, pois fn+1 e´ (n + 1)−vezes deriva´vel em R, temos que gn+1 ∈ Cn+1, mas gn+1 na˜o e´ (n + 2)−vezes deriva´vel no ponto zero, pois ϕn na˜o e´ (n+ 1)−vezes deriva´vel no ponto zero e fn+1 e´ (n+ 1)−vezes deriva´vel em R. De modo ana´logo, temos que ϕ ′n+1(x) = (2n+ 3)x 2n+2 cos 1 x + x2n+1 sen 1 x , x 6= 0 , e ϕ ′n+1(0) = 0 , ou seja, ϕ ′n+1(x) = (2n+ 3)hn+1(x) + gn(x) . Logo, ϕn+1 ∈ Cn+1, pois hn+1, gn ∈ Cn , mas na˜o e´ (n+2)−vezes deriva´vel no ponto zero, pois gn na˜o e´ (n+ 1)−vezes deriva´vel no ponto 0 e hn+1 e´ (n+ 1)−vezes deriva´vel em R.� Definic¸a˜o 3.4 Dizemos que f : I −→ R e´ de classe C∞ em I quando f ∈ Cn para todo n = 0, 1, 2, . . . ,ou seja, pode-se derivar f tantas vezes quantas se deseje, em todos os pontos do intervalo I. Exemplo 3.3 • Todo polinoˆmio e´ uma func¸a˜o C∞ em R. J. Delgado - K. Frensel246 Fo´rmula de Taylor • Uma func¸a˜o racional, quociente de dois polinoˆmios, e´ de classe C∞ em todo intervalo onde e´ definida. • As func¸o˜es trigonome´tricas, a func¸a˜o logaritmica e a func¸a˜o exponencial sa˜o de classe C∞ em cada intervalo onde sa˜o definidas.� Exemplo 3.4 A func¸a˜o f : R −→ R, f(x) = e − 1 x2 se x 6= 0 0 se x = 0 e´ de classe C∞. ´E claro que existem as derivadas de todas as ordens num ponto x 6= 0. Vamos provar que existe f(n)(0) para todo n ∈ N. Afirmac¸a˜o: Para cada n ∈ N, fn(x) = pn ( 1 x ) e − 1 x2 , x 6= 0, onde pn(x) e´ um polinoˆmio. • Para n = 1, f ′(x) = 2 x3 e − 1 x2 = p1 ( 1 x ) e − 1 x2 , x 6= 0, onde p1(y) = 2y3. • Suponha que f(n)(x) = pn ( 1 x ) e − 1 x2 , x 6= 0, onde pn(y) = aky k + . . .+ a1y+ a0 e´ um polinoˆmio, ou seja, f(n)(x) = ( ak xk + . . .+ a1 x + a0 ) e − 1 x2 , x 6= 0. Enta˜o, para x 6= 0, f(n+1)(x) = ( − kak xk+1 − . . .− a1 x2 ) e−1/x 2 + 2 x3 ( ak xk + . . .+ a1 x + a0 ) e−1/x 2 = pn+1 ( 1 x ) e−1/x 2 , onde pn+1(y) = −kakyk+1 − . . .− a1y2 + 2akyk+3 + . . .+ 2a1y4 + 2a0y3 , e´ um polinoˆmio de grau k+ 3. Afirmac¸a˜o: f(n)(0) existe e e´ igual a zero para todo n ∈ N. • Fazendo y = 1 x , temos que lim x→0± f(x) − f(0) x− 0 = lim x→0± 1/x e1/x 2 = lim x→±∞ yey2 . Logo, f ′(0) existe e e´ igual a zero, pois f ′(0+) = f ′(0−) = 0. Instituto de Matema´tica - UFF 247 Ana´lise na Reta • Suponhamos que f(n)(0) existe e e´ igual a zero. Como f(n)(x) = p ( 1 x ) e−1/x 2 , x 6= 0 , para algum polinoˆmio p, fazendo y = 1 x , obtemos que lim x→0± f(n)(x) − f(n)(0) x− 0 = lim x→0± 1 x p ( 1 x ) e−1/x 2 = lim y→±∞ yp(y)ey2 = 0 . Logo, f(n+1)(0+) = f(n+1)(0−) = 0. Enta˜o, f(n+1)(0) existe e e´ igual a zero.� • Quando f e´ deriva´vel num ponto a, f(a+ h) = f(a) + f ′(a)h+ r(h) , onde lim h→0 r(h) h = 0 , ou seja, o resto r(h) e´ um infinite´simo de ordem maior do que 1 em relac¸a˜o a` h. Mostraremos que quando f e´ n−vezes deriva´vel no ponto a, existe um polinoˆmio p de grau ≤ n, polinoˆmio de Taylor de f no ponto a, tal que f(a+ h) = p(h) + r(h) , onde lim h→0 r(h) hn = 0 , ou seja, o resto r(h) e´ um infinite´simo de ordem superior a n em relac¸a˜o a h. Isto e´, uma func¸a˜o n−vezes deriva´vel num ponto pode ser aproxi- mada por um polinoˆmio de grau ≤ n na vizinhanc¸a daquele ponto. No caso n = 1, a existeˆncia de um polinoˆmio p(h) = f(a) + Lh de grau ≤ 1 tal que lim h→0 r(h) h = 0, onde r(h) = f(a+h)−p(h), e´ uma condic¸a˜o necessa´ria e suficiente para que f seja deriva´vel no ponto a. Mas, quando n > 1, a existeˆncia de um polinoˆmio p(h) de grau ≤ n tal que lim h→0 r(h) hn = 0, onde r(h) = f(a + h) − p(h), decorre de f ser n−vezes deriva´vel no ponto a, mas na˜o e´ suficiente para garantir que f seja n−vezes deriva´vel no ponto a. Exemplo 3.5 Seja f : R −→ R definida por f(x) = 1+ x+ (x− a) 2 + (x− a)3 sen 1 x− a , se x 6= a 1+ a , se x = a . J. Delgado - K. Frensel248 Fo´rmula de Taylor Enta˜o, f(a+ h) = 1+ a+ h+ h2 + h3 sen 1 h , h 6= 0 , ou seja, f(a+ h) = p(h) + r(h) , onde p(h) = 1 + a + h + h2 e´ um polinoˆmio de grau 2 e o resto r(h) = h3 sen 1 h cumpre a condic¸a˜o lim h→0 r(h) h2 = 0. Temos que f e´ deriva´vel em toda a reta com • f ′(x) = 1+ 2(x− a) + 3(x− a)2 sen 1 x− a − (x− a) cos 1 x− a , para x 6= a e • f ′(a) = lim x→a f(x) − f(a)x− a = limx→a (x− a) + (x− a)2 + (x− a)3 sen 1 x− a x− a = lim x→a 1+ (x− a) + (x− a)2 sen 1x− a = 1 , mas f na˜o e´ duas vezes deriva´vel no ponto a, pois na˜o existe lim x→0 f ′(x) − f ′(a) x− a = lim x→a [ 2+ 3(x− a) sen 1 x− a − cos 1 x− a ] . � Observac¸a˜o 3.2 Um polinoˆmio de grau ≤ n p(x) = b0 + b1x+ . . .+ bnx n fica determinado quando se conhecem o seu valor e o de suas derivadas ate´ a ordem n no ponto 0, ou seja, o conhecimento de p(0), p ′(0),. . .,p(n)(0) determina os valores de b0, b1, . . . , bn. De fato, p(0) = b0, p ′(0) = b1, p ′′(0) = 2 !b2,. . .,p(n)(0) = n !bn, ou seja, bj = p(j) j ! , j = 0, 1, . . . , n. Definic¸a˜o 3.5 Se f : I −→ R e´ n−vezes deriva´vel no ponto a ∈ I, o polinoˆmio de grau ≤ n p(h) = f(a) + f ′(a)h+ f ′′(a) 2 ! h2 + . . .+ f(n)(a) n ! hn e´ o polinoˆmio de Taylor de ordem n de f no ponto a. Instituto de Matema´tica - UFF 249 Ana´lise na Reta Observac¸a˜o 3.3 O polinoˆmio de Taylor de ordem n de f no ponto a e´ o u´nico polinoˆmio p de grau ≤ n cujas derivadas p(0), p ′(0),. . .,p(n)(0) no ponto 0 coincidem com as derivadas correspondentes de f no ponto a, pois, nesse caso o coeficiente de ordem j de p e´ p (j)(0) j ! = f(j)(a) j ! , j = 0, 1, . . . , n. Lema 3.1 Seja r : I −→ R uma func¸a˜o n−vezes deriva´vel, n ≥ 1, no ponto 0 ∈ I. Enta˜o, r(0) = r ′(0) = . . . = r(n)(0) = 0⇐⇒ lim x→0 r(x) xn = 0 . Prova. (=⇒) Mostraremos, por induc¸a˜o sobre n, que se r e´ n−vezes deriva´vel, n ≥ 1, no ponto 0 ∈ I e r(0) = r ′(0) = . . . = r(n)(0) = 0, enta˜o lim x→0 r(x) xn = 0. Caso n = 1: Se r(0) = r ′(0) = 0, enta˜o lim x→0 r(x) x = lim x→0 r(x) − r(0) x− 0 = r ′(0) = 0 . Caso geral: Suponhamos o resultado va´lido para n− 1, n ≥ 2. Seja r : I −→ R n−vezes deriva´vel no ponto 0 ∈ I com r(0) = r ′(0) = . . . = r(n)(0) = 0. Enta˜o, a hipo´tese de induc¸a˜o, aplicada a r ′, nos da´ que lim x→0 r ′(x) xn−1 = 0. Logo, dado ε > 0, existe δ > 0, tal que x ∈ I , 0 < |x| < δ =⇒ ∣∣∣∣r ′(x)xn−1 ∣∣∣∣ < ε . Como r e´ pelo menos uma vez deriva´vel numa vizinhanc¸a do ponto zero, pois n ≥ 2, existe 0 < δ ′ < δ, tal que r e´ deriva´vel em I ∩ (−δ ′, δ ′). Enta˜o, pelo teorema do valor me´dio, para cada 0 < |x| < δ ′, x ∈ I, existe cx ∈ I, 0 < |cx| < |x|, tal que r(x) = r(x) − r(0) = r ′(cx)x . Logo, ∣∣∣∣r(x)xn ∣∣∣∣ = ∣∣∣∣r ′(cx)xn−1 ∣∣∣∣ = ∣∣∣∣r ′(cx)cn−1x ∣∣∣∣ · ∣∣∣cxx ∣∣∣n−1 < ε . J. Delgado - K. Frensel250 Fo´rmula de Taylor Provamos, assim, que dado ε > 0 existe δ ′ > 0 tal que x ∈ I, 0 < |x| < δ ′ =⇒ ∣∣∣∣r(x)xn ∣∣∣∣ < ε . Logo, lim x→0 r(x) xn = 0. (⇐=) Mostraremos, agora, por induc¸a˜o, que se r : I −→ R e´ n−vezes deriva´vel, n ≥ 1, no ponto 0 ∈ I e lim x→0 r(x) xn = 0, enta˜o r(0) = r ′(0) = r ′′(0) = . . . = r(n)(0) = 0 . Caso n = 1: Se lim x→0 r(x) x = 0, enta˜o r(0) = lim x→0 r(x) = limx→0 r(x) x x = lim x→0 r(x) x lim x→0 x = 0 , e r ′(0) = lim x→0 r(x) − r(0) x− 0 = lim x→0 r(x) x = 0 . Caso geral: Suponhamos o resultado va´lido paran− 1, n ≥ 2, e conside- remos uma func¸a˜o r : I −→ R n−vezes deriva´vel no ponto 0 ∈ I tal que lim x→0 r(x) xn = 0. Seja ϕ : I −→ R definida por ϕ(x) = r(x) − r(n)(0) n ! xn . Enta˜o, ϕ e´ n−vezes deriva´vel no ponto 0 ∈ I e lim x→0 ϕ(x) xn−1 = lim x→0 [ r(x) xn x− r(n)(0) n! x ] = 0 . Pela hipo´tese de induc¸a˜o, temos que ϕ(0) = ϕ ′(0) = . . . = ϕ(n−1)(0) = 0 . Enta˜o, r(0) = 0 e como ϕ(k)(x) = r(k)(x) − r(n)(0) n ! n (n− 1) . . . (n− (k− 1)) xn−k , para todo x ∈ I e k = 1, 2, . . . , n, temos r(j)(0) = 0, para todo j = 1, . . . , n− 1, e ϕ(n)(0) = r(n)(0) − r(n)(0)n ! n ! = 0 . Logo, pela parte do lema ja´ demonstrada, temos que lim x→0 ϕ(x) xn = 0, ja´ que ϕ(0) = ϕ ′(0) = . . . = ϕ(n−1)(0) = ϕ(n)(0) = 0 . Instituto de Matema´tica - UFF 251 Ana´lise na Reta Enta˜o, como lim x→0 r(x) xn = 0, temos que r(n)(0) n ! = lim x→0 r(n)(0) n ! xn xn = lim x→0 ( r(x) xn − ϕ(x) xn ) = lim x→0 r(x) xn − lim x→0 ϕ(x) xn = 0 , ou seja, r(n)(0) = 0, o que completa a demonstrac¸a˜o.� • Sejam f : I −→ R uma func¸a˜o definida no intervalo I, a ∈ I e p : R −→ R um polinoˆmio. Se fizermos f(a+ h) = p(h) + r(h) , obtemos uma func¸a˜o r : J −→ R definida no intervalo J = −a + I = {h ∈ R |a+ h ∈ I} que conte´m o ponto 0. Como p ∈ C∞, temos que f e´ n−vezes deriva´vel no ponto a se, e so´ se, r e´ n−vezes deriva´vel no ponto 0. Suponhamos que f e´ n−vezes deriva´vel no ponto a. Segue-se do lema anterior, que lim h→0 r(h) hn = 0 se, e so´ se, r(j)(0) = 0 , 0 ≤ j ≤ n, ou seja, lim h→0 r(h) hn = 0 se, e so´ se, f(j)(a) = p(j)(0), para todo j = 0, 1, . . . , n. Se, ale´m disso, impusermos que grau(p) ≤ n, temos que lim h→0 r(h) hn = 0 se, e so´ se, p e´ o polinoˆmio de Taylor de ordem n para f no ponto a. Com estas observac¸o˜es, provamos o seguinte: Teorema 3.1 (Fo´rmula de Taylor infinitesimal) Seja f : I −→ R uma func¸a˜o n−vezes deriva´vel no ponto a ∈ I. Enta˜o, para todo h tal que a+ h ∈ I, tem-se f(a+ h) = f(a) + f ′(a)h+ . . .+ f(n)(a) n ! hn + r(h) onde lim h→0 r(h) hn = 0 . Ale´m disso, p(h) = n∑ j=0 f(j)(a) j ! hj e´ o u´nico polinoˆmio de grau ≤ n tal que f(a+ h) = p(h) + r(h) , com lim h→0 r(h) hn = 0 J. Delgado - K. Frensel252 Aplicac¸o˜es da fo´rmula de Taylor • Este teorema nos diz que o polinoˆmio de Taylor de ordem n para f no ponto a aproxima f, numa vizinhanc¸a do ponto a, a menos de um infinite´simo de ordem superior a n. Exemplo 3.6 Seja p : R −→ R um polinoˆmio de grau ≤ n. Dados a, h ∈ R, a fo´rmula de Taylor infinitesimal nos diz que p(a+ h) = p(a) + p ′(a)h+ . . .+ p(n)(a) n ! hn + r(h) , onde lim h→0 r(h) hn = 0. Como r e´ um polinoˆmio de grau ≤ n e r(j)(0) = 0, 0 ≤ j ≤ n, temos que r = 0, ou seja, p(a+ h) = p(a) + p ′(a)h+ . . .+ p(n)(a) n ! hn , quaisquer que sejam a, h ∈ R. Poderı´amos, tambe´m, chegar ao mesmo resultado observando que q(h) = p(a + h) e´ um polinoˆmio de grau ≤ n tal que r(h) = p(a + h) − q(h) = 0 satisfaz, trivialmente, a condic¸a˜o lim h→0 r(h) hn = 0. Enta˜o, pela unicidade do polinoˆmio de Taylor, temos que p(a+ h) = q(h) = p(a) + p ′(a)h+ . . .+ p(n)(a) n ! hn . � 4. Aplicac¸o˜es da fo´rmula de Taylor 4.1 Ma´ximos e mı´nimos locais Seja f : I −→ R uma func¸a˜o n−vezes deriva´vel no ponto a perten- cente ao interior do intervalo I. Dizemos que a e´ um ponto crı´tico de f quando f ′(a) = 0. Suponhamos que f ′(a) = f ′′(a) = . . . = f(n−1)(a) = 0 , mas f(n)(a) 6= 0. Enta˜o: (1) Se n e´ par, enta˜o a e´ ponto de ma´ximo local quando f(n)(a) < 0, e´ um Instituto de Matema´tica - UFF 253 Ana´lise na Reta ponto de mı´nimo local quando f(n)(a) > 0. (2) Se n e´ ı´mpar, o ponto a na˜o e´ de ma´ximo nem de mı´nimo local. De fato, pela fo´rmula de Taylor infinitesimal, temos que f(a+ h) = f(a) + ( f(n)(a) n ! + ρ(h) ) hn , onde ρ(0) = 0 e ρ(h) = r(h) hn se h 6= 0, a+ h ∈ I. Como lim h→0 ρ(h) = 0 e f(n)(a) 6= 0, temos que, para h suficientemente peqeno, o sinal de f (n) n ! + ρ(h) e´ o mesmo de f (n)(a) n ! . Enta˜o, se n e´ par e f(n)(a) > 0, temos que f(a+ h) > f(a) para todo h 6= 0 pertencente a uma vizinhanc¸a do poto zero, pois hn 6= 0 para todo h 6= 0. Ou seja, a e´ um ponto de mı´nimo local estrito. E, se n e´ par e f(n)(a) < 0, temos que f(a + h) < f(a) para todo h 6= 0 suficientemente pequeno, ja´ que hn > 0 para todo h 6= 0. Ou seja, a e´ um ponto de ma´ximo local estrito. Agora, se n e´ ı´mpar e f(n)(a) > 0, como existe δ > 0 tal que (a − δ, a+ δ) ⊂ I e f (n)(a) n ! + ρ(h) > 0 para todo h ∈ (−δ, δ) − {0}, temos que f(a+ h) − f(a) = ( f(n)(a) n ! + ρ(h) ) hn < 0 , se −δ < h < 0 , e f(a+ h) − f(a) = ( f(n)(a) n ! + ρ(h) ) hn > 0 , se 0 < h < δ . Ou seja, a na˜o e´ ponto de ma´ximo nem de mı´nimo local de f. De modo ana´logo, podemos provar que se n e´ ı´mpar e f(n)(a) < 0, enta˜o a na˜o e´ ponto de ma´ximo nem de mı´nimo local de f. • Em particular, temos que se f : I −→ R e´ n−vezes deriva´vel no ponto a ∈ int I, f ′(a) = . . . = f(n−1)(a) = 0 e f(n)(a) 6= 0, enta˜o existe δ > 0 tal que f(a+ h) 6= f(a) para todo h ∈ (−δ, δ) , h 6= 0. Como consequ¨eˆncia, temos que se (xn) e´ uma sequ¨eˆncia de pontos de X − {a} tal que lim n→+∞ xn = a e f(xn) = f(a) para todo n ∈ N, enta˜o J. Delgado - K. Frensel254 Aplicac¸o˜es da fo´rmula de Taylor todas as derivadas de f que existam no ponto a sa˜o nulas. Exemplo 4.1 A func¸a˜o f : R −→ R, f(x) = xn, tem um ponto de mı´nimo no ponto zero se n e´ par, pois f ′(0) = . . . = f(n−1)(0) = 0 e f(n)(0) = n ! , e e´ crescente se n e´ ı´mpar, pois f ′(x) = nxn−1 > 0 para todo x 6= 0.� 4.2 Indeterminac¸a˜o do tipo 0 0 . Sejam f, g : I −→ R func¸o˜es n−vezes deriva´veis no ponto a ∈ I. Su- ponhamos que f(a) = f ′(a) = . . . = f(n−1)(a) = 0 e g(a) = g ′(a) = . . . = g(n−1)(a) = 0, mas f(n)(a) 6= 0 ou g(n)(a) 6= 0. Ale´m disso, suponhamos que g(x) 6= 0 para todo x 6= a suficientemente pro´ximo de a. Enta˜o, lim x→a f(x)g(x) = f (n)(a) g(n)(a) , se g(n)(a) 6= 0 , e lim x→a ∣∣∣∣ f(x)g(x) ∣∣∣∣ = +∞ , se g(n)(a) = 0 , Para provar este resultado, basta observar, fazendo h = (x−a), que f(x) g(x) = f(a+ h) g(a+ h) = ( f(n)(a) n ! + ρ(h) ) hn( g(n)(a) n ! + σ(h) ) hn = f(n)(a) + n ! ρ(h) g(n)(a) + n !σ(h) , onde lim h→0 ρ(h) = limh→0σ(h) = 0 . • Vejamos agora outra fo´rmula de Taylor, que nos da´ uma estimativa da diferenc¸a f(a+ h) − f(a) para um valor fixo de h, isto e´, sem supor h −→ 0. A fo´rmula de Taylor que iremos obter nos da´ uma generalizac¸a˜o do Teorema do Valor me´dio para func¸o˜es n−vezes deriva´veis. Teorema 4.1 (Fo´rmula de Taylor com resto de Lagrange) Seja f : [a, b] −→ R uma func¸a˜o de classe Cn−1, n−vezes deriva´vel no intervalo aberto (a, b). Enta˜o existe c ∈ (a, b) tal que f(b) = f(a) + f ′(a) (b− a) + . . .+ f(n−1)(a) (n− 1) ! (b− a)n−1 + f(n)(c) n ! (b− a)n Instituto de Matema´tica - UFF 255 Ana´lise na Reta Pondo b = a+ h, isto equivale a dizer que existe θ ∈ (0, 1) tal que f(a+ h) = f(a) + f ′(a)h+ . . .+ f(n−1)(a) n ! hn−1 + f(n)(a+ θh) n ! hn Prova. Seja ϕ : [a, b] −→ R definida por ϕ(x) = f(b) − f(x) − f ′(x) (b− x) − . . .− f(n−1)(x) (n− 1) ! (b− x)n−1 − k n ! (b− x)n , onde a constante k e´ escolhida de modo que ϕ(a) = 0. Enta˜o, ϕ e´ contı´nua em [a, b], deriva´vel em (a, b), ϕ(a) = ϕ(b) = 0. Ale´m disso, temos que ϕ ′(x) = −f ′(x) + n∑ j=2 ( − f(j)(x) (j− 1) ! (b− x)j−1 + f(j−1)(x) (j− 2) ! (b− x)j−2 ) + k (n− 1) ! (b− x)n−1 = −f ′(x) − n−1∑ j=1 f(j+1)(x) j ! (b− x)j + n−2∑ j=0 f(j+1)(x) j ! (b−x)j + k (b− x)n−1 (n− 1) ! = k− f(n)(x) (n− 1) ! (b− x)n−1 . Pelo teorema de Rolle, existe c ∈ (a, b) tal que ϕ ′(c) = 0, ou seja, k = f(n)(c) . Enta˜o, como ϕ(a) = 0, temos que f(b) = f(a) + f ′(a)(b− a) + . . .+ f(n−1)(a) (n− 1) ! (b− a)n−1 + f(n)(c) n ! (b− a)n . � 4.3 Func¸o˜es convexas Dizemos que uma func¸a˜o f : I −→ R, definida num intervalo I, e´ convexa, quando para a < x < b arbitra´rios em I, o ponto (x, f(x)) do gra´fico de f esta´ situado abaixo da secante que liga os pontos (a, f(a)) e (b, f(b)). Como a equac¸a˜o da reta secante e´ J. Delgado - K. Frensel256 Aplicac¸o˜es da fo´rmula de Taylor y = f(b) − f(a) b− a (x− a) + f(a) , ou y = f(b) − f(a) b− a (x− b) + f(b) , dizer que, para a < x < b o ponto (x, f(x)) do gra´fico de f esta´ abaixo da secante, significa que f(x) ≤ f(b) − f(a) b− a (x− a) + f(a) , e f(x) ≤ f(b) − f(a) b− a (x− b) + f(b) , ou seja, f(x) − f(a) x− a ≤ f(b) − f(a) b− a ≤ f(b) − f(x) b− x Na realidade, basta que uma dessas desigualdades ocorra para que a func¸a˜o seja convexa. Teorema 4.2 Seja f : I −→ R uma func¸a˜o duas vezes deriva´vel no intervalo aberto I. Enta˜o, f e´ convexa se, e so´ se, f ′′(x) ≥ 0 para todo x ∈ I. Prova. (⇐=) Suponhamos que f ′′(x) ≥ 0 para todo x ∈ I. Sejam a, a+ h ∈ I, h 6= 0. Enta˜o, pelo teorema anterior, existe c ∈ I entre a e a+ h tal que f(a+ h) = f(a) + f ′(a)h+ f ′′(c) 2 ! h2. Como f ′′(a) ≥ 0, temos que f(a+ h) − f(a) h ≥ f ′(a) se h > 0, e f(a+ h) − f(a) h ≤ f ′(a) se h < 0. Logo, se a < x < b, a, b, x ∈ I, temos que f(a) − f(x) a− x ≤ f ′(x) ≤ f(b) − f(x) b− x , isto e´, f(x) − f(a) x− a ≤ f(b) − f(x) b− x . Somando (f(x) − f(a))(x− a) a ambos os membros da desigualdade, (f(x) − f(a))(b− x) ≤ (f(b) − f(x))(x− a) , Instituto de Matema´tica - UFF 257 Ana´lise na Reta obtemos que (f(x) − f(a))(b− a) ≤ (f(b) − f(a))(x− a) , ou seja, f(x) − f(a) x− a ≤ f(b) − f(a) b− a , Logo, f e´ convexa no intervalo I. (=⇒) Suponhamos que f e´ convexa em I. Enta˜o, dados a < x < b em I, temos que f(x) − f(a) x− a ≤ f(b) − f(a) b− a ≤ f(x) − f(b) x− b . Fazendo x −→ a na primeira desigualdade e x −→ b na segunda, obte- mos que: f ′(a) ≤ f(b) − f(a) b− a ≤ f ′(b) , ou seja, f ′(a) ≤ f ′(b). Como f ′ e´ na˜o-decrescente e deriva´vel em I, temos que f ′′(x) ≥ 0 para todo x ∈ I.� Observac¸a˜o 4.1 Tomando a desigualdade estrita < em vez de ≤ 0 na definic¸a˜o de func¸a˜o convexa, obtemos o conceito de func¸a˜o estritamente convexa. Usando a mesma demonstrac¸a˜o que fizemos acima, podemos pro- var que se f : I −→ R e´ duas vezes deriva´vel no intervalo aberto I e f ′′(x) > 0 para todo x ∈ I, enta˜o f e´ estritamente convexa. Mas a recı´proca nem sempre e´ verdadeira. Exemplo 4.2 A func¸a˜o f : R −→ R, f(x) = x4, e´ estritamente convexa, pois se a < x < b, enta˜o x4 − a4 x− a = (x2 − a2)(x2 + a2) x− a = (x+ a)(x2 + a2) < (b+ a)(b2 + a2) = b4 − a4 b− a , mas f ′′(x) = 12x2 na˜o e´ positiva em todo x, pois f ′′(0) = 0.� J. Delgado - K. Frensel258 Aplicac¸o˜es da fo´rmula de Taylor 4.4 Se´rie de Taylor — func¸o˜es analı´ticas Seja f : I −→ R uma func¸a˜o de classe C∞ no intervalo I. Enta˜o, dados a ∈ int I e a+ h ∈ I, podemos escrever, para todo n ∈ N, f(a+ h) = f(a) + f ′(a)h+ . . .+ f(n+1)(a) (n− 1)! hn−1 + rn(h) , onde rn(h) = f(n)(a+ θnh) n ! hn, com 0 < θn < 1. A se´rie ∞∑ n=0 f(n)(a) n ! hn chama-se se´rie de Taylor da func¸a˜o f em torno do ponto a. Observac¸a˜o 4.2 Toda func¸a˜o C∞ definida num intervalo I possui uma se´rie de Taylor em torno de cada ponto a ∈ int I. Mas tal se´rie pode con- vergir ou divergir e, mesmo quando converge, sua soma pode ser diferente de f(a+ h). Definic¸a˜o 4.1 Dizemos que uma func¸a˜o f : I −→ R de classe C∞ no intervalo aberto I e´ analı´tica quando, para cada a ∈ I existe εa > 0 tal que a se´rie de Taylor ∞∑ n=0 f(n)(a) n ! hn converge para f(a + h) para todo h ∈ (−εa, εa). Observac¸a˜o 4.3 A se´rie de Taylor ∞∑ n=0 f(n)(a) n ! hn converge para f(a+h) se, e so´ se, lim n→+∞ rn(h) = 0. Exemplo 4.3 Todo polinoˆmio p : R −→ R e´ uma func¸a˜o analı´tica, pois, se p tem grau ≤ n, enta˜o p(a+ h) = p(a) + p ′(a)h+ . . .+ p(n)(a) n ! hn = ∞∑ j=0 p(j)(a) j ! hj , para todo a, h ∈ R.� Instituto de Matema´tica - UFF 259 Ana´lise na Reta Observac¸a˜o 4.4 Costuma-se usar a unicidade do polinoˆmio de Taylor para se obter as derivadas de ordem superior de uma func¸a˜o f. Exemplo 4.4 Seja a func¸a˜o racional f : R −→ R definida por f(x) = 1 1+ x2 . Enta˜o, f ∈ C∞ e, como 1− yn 1− y = 1+ y+ y2 + . . .+ yn−1 , ou seja, 1 1− y = 1+ y+ . . .+ yn−1 + yn 1− y , para todo y 6= 1, temos, fazendo 1+ x2 = 1− (−x2), que f(x) = f(x+ 0) = 1 1+ x2 = 1− x2 + x4 − x6 + . . .+ (−1)n−1x2n−2 + (−1)n x2n 1+ x2 , para todo x ∈ R e n ∈ N. Sejam p(x) = 1 − x2 + x4 − x6 + . . . + (−1)n−1x2n−2 e r(x) = (−1) n x2n 1+ x2 . Como p e´ um polinoˆmio de grau ≤ 2n − 1 e lim x→0 r(x) x2n−1 = lim x→0 (−1)n x 1+ x2 = 0, temos que p e´ o polinoˆmio de Taylor de ordem 2n− 1 de f no ponto zero. Logo, f(2n−1)(0) = 0 e f(2n−2)(0) = (−1)n−1(2n− 2) ! para todo n ∈ N. Ale´m disso, como r2n−1(x) = r2n(x) = (−1)n x2n 1+ x2 , temos que lim n→0 rn(x) = 0 se, e so´ se, lim n→+∞ rn(x) = 0 se, e so´ se, limn→+∞ r2n−1(x) = limn→+∞ r2n(x) = 0. Logo, lim n→+∞ rn(x) = 0 se, e so´ se, |x| < 1. Enta˜o a se´rie de Taylor de f em torno de zero, ∞∑ n=0 (−1)nx2n , converge para f(x) se |x| < 1 e diverge se |x| ≥ 1, pois, neste caso, o termo geral (−1)nx2n na˜o tende a zero quando n −→∞. Apesar disto, como veremos depois, f e´ analı´tica em toda a reta. O que acontece e´ que a se´rie de Taylor de f em torno de um ponto a 6= 0 e´ diferente da se´rie acima.� Exemplo 4.5 Seja f : R −→ R a func¸a˜o f(x) = e−1/x 2 se x 6= 0 0 se x = 0 . J. Delgado - K. Frensel260 Aplicac¸o˜es da fo´rmula de Taylor Ja´ vimos, no exemplo —, que f e´ de classe C∞ e que f(n)(0) = 0 para todo n ∈ N. Logo, a se´rie de Taylor ∞∑ n=0 f(n)(0) n ! xn de f em torno do ponto 0 e´ identi- camente nula e, portanto, converge para zero, para todo x ∈ R. Como f(x) 6= 0 para todo x 6= 0, temos que a se´rie de Taylor de f em torno do ponto 0 na˜o converge para f(x) para todo x 6= 0. Em particular, f na˜o e´ analı´tica em intervalo algum que conte´m o zero. Mas, como veremos depois, f e´ analı´tica em (0,∞) e em (−∞, 0).� Exemplo 4.6 Seja f : R −→ R dada por f(x) = sen x. Como f(2n+1)(x) = (−1)n cos x e f(2n)(x) = (−1)n sen x, para todo x ∈ R e n ∈ N, temos que a fo´rmula de Taylor de f com resto de Lagrange em torno do zero e´ sen x = x− x3 3 ! + x5 5 ! + . . .+ (−1)n x2n+1 (2n+ 1) ! + r2n+2(x) , onde rn(x) = sen(n)(c) n ! xn e |c| < |x|. Logo, |rn(x)| ≤ |x| n n ! para x ∈ R e n ∈ N. Enta˜o, como lim n→+∞ |x| n n ! = 0, temos que lim n→+∞ rn(x) = 0 para todo x ∈ R. Ou seja, a se´rie de Taylor da func¸a˜o seno em torno do ponto 0 converge para sen x, para todo x ∈ R. De modo ana´logo, podemos provar que a se´rie de Taylor sena+ h cosa− h2 2 ! sena− h3 3 ! cosa+ h4 4 ! sena+ . . . da func¸a˜o seno em torno de um ponto a ∈ R tambe´m converge para sen(a + h) para todo h ∈ R, pois o resto rn(h) = sen (n)(c) n ! hn, onde c esta´ entre a e a + h, da fo´rmula de Taylor com resto de Lagrange da func¸a˜o seno em torno do ponto a, tambe´m converge para zero quando n→ +∞ para todo h ∈ R. Assim, a func¸a˜o seno e´ analı´tica em toda a reta e sua se´rie de Taylor em torno de qualquer ponto a converge para sen(a+ h) para todo h ∈ R. Instituto de Matema´tica - UFF 261 Ana´lisena Reta De modo ana´logo, podemos provar que o mesmo vale para a func¸a˜o cos- seno.� Exemplo 4.7 Seja f : R −→ R a func¸a˜o exponencial f(x) = ex. Como f(n)(x) = ex para todo x ∈ R e n ∈ N, temos que a fo´rmula de Taylor com resto de Lagrange de f em torno de um ponto a ∈ R e´ dada por ea+h = ea + ea h+ ea h2 2 ! + . . .+ ea hn n ! + rn+1(h) , onde rn+1(h) = ecn hn+1 n ! , pra lgum cn entre a e a+ h. Como ecn < ea+|h| e lim n→+∞ h n+1 (n+ 1)! = 0, temos que lim n→+∞ rn+1(h) = 0. Logo, a se´rie de Taylor ∞∑ n=0 eahn n ! da func¸a˜o exponencial em torno do ponto a converge para ea+h para todo h ∈ R. Assim, a func¸a˜o exponencial e´ analı´tica em toda a reta e ex = ∞∑ n=0 ea n ! (x− a)n para todo x ∈ R e a ∈ R.� J. Delgado - K. Frensel262
Compartilhar