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3a SÉRIE ENSINO MÉDIO Caderno do Professor Volume 1 FILOSOFIA Ciências Humanas MATERIAL DE APOIO AO CURRÍCULO DO ESTADO DE SÃO PAULO CADERNO DO PROFESSOR FILOSOFIA ENSINO MÉDIO 3a SÉRIE VOLUME 1 Nova edição 2014-2017 GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO SECRETARIA DA EDUCAÇÃO São Paulo Governo do Estado de São Paulo Governador Geraldo Alckmin Vice-Governador Guilherme Afif Domingos Secretário da Educação Herman Voorwald Secretário-Adjunto João Cardoso Palma Filho Chefe de Gabinete Fernando Padula Novaes Subsecretária de Articulação Regional Rosania Morales Morroni Coordenadora da Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores – EFAP Silvia Andrade da Cunha Galletta Coordenadora de Gestão da Educação Básica Maria Elizabete da Costa Coordenadora de Gestão de Recursos Humanos Cleide Bauab Eid Bochixio Coordenadora de Informação, Monitoramento e Avaliação Educacional Ione Cristina Ribeiro de Assunção Coordenadora de Infraestrutura e Serviços Escolares Ana Leonor Sala Alonso Coordenadora de Orçamento e Finanças Claudia Chiaroni Afuso Presidente da Fundação para o Desenvolvimento da Educação – FDE Barjas Negri Senhoras e senhores docentes, A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo sente-se honrada em tê-los como colabo- radores nesta nova edição do Caderno do Professor, realizada a partir dos estudos e análises que permitiram consolidar a articulação do currículo proposto com aquele em ação nas salas de aula de todo o Estado de São Paulo. Para isso, o trabalho realizado em parceria com os PCNP e com os professores da rede de ensino tem sido basal para o aprofundamento analítico e crítico da abor- dagem dos materiais de apoio ao currículo. Essa ação, efetivada por meio do programa Educação — Compromisso de São Paulo, é de fundamental importância para a Pasta, que despende, neste programa, seus maiores esforços ao intensificar ações de avaliação e monitoramento da utilização dos diferentes materiais de apoio à implementação do currículo e ao empregar o Caderno nas ações de formação de professores e gestores da rede de ensino. Além disso, firma seu dever com a busca por uma educação paulista de qualidade ao promover estudos sobre os impactos gerados pelo uso do material do São Paulo Faz Escola nos resultados da rede, por meio do Saresp e do Ideb. Enfim, o Caderno do Professor, criado pelo programa São Paulo Faz Escola, apresenta orien- tações didático-pedagógicas e traz como base o conteúdo do Currículo Oficial do Estado de São Paulo, que pode ser utilizado como complemento à Matriz Curricular. Observem que as atividades ora propostas podem ser complementadas por outras que julgarem pertinentes ou necessárias, dependendo do seu planejamento e da adequação da proposta de ensino deste material à realidade da sua escola e de seus alunos. O Caderno tem a proposição de apoiá-los no planejamento de suas aulas para que explorem em seus alunos as competências e habilidades necessárias que comportam a construção do saber e a apropriação dos conteúdos das disciplinas, além de permitir uma avalia- ção constante, por parte dos docentes, das práticas metodológicas em sala de aula, objetivando a diversificação do ensino e a melhoria da qualidade do fazer pedagógico. Revigoram-se assim os esforços desta Secretaria no sentido de apoiá-los e mobilizá-los em seu trabalho e esperamos que o Caderno, ora apresentado, contribua para valorizar o ofício de ensinar e elevar nossos discentes à categoria de protagonistas de sua história. Contamos com nosso Magistério para a efetiva, contínua e renovada implementação do currículo. Bom trabalho! Herman Voorwald Secretário da Educação do Estado de São Paulo Orientação sobre os conteúdos do volume 5 Situações de Aprendizagem 9 Situação de Aprendizagem 1 – O preconceito em relação à Filosofia 9 Situação de Aprendizagem 2 – Filosofia como atividade reflexiva e sua importância para o exercício da cidadania 22 Situação de Aprendizagem 3 – A condição animal como ponto inicial no processo de compreensão sobre o homem 34 Situação de Aprendizagem 4 – A linguagem e a língua como características que identificam a espécie humana 40 Situação de Aprendizagem 5 – Filosofia e Religião 45 Situação de Aprendizagem 6 – O homem como ser político 53 Situação de Aprendizagem 7 – Platão e a justa desigualdade 59 Situação de Aprendizagem 8 – A desigualdade segundo Rousseau 70 Recursos para ampliar a perspectiva do professor e do aluno para a compreensão dos temas 84 Quadro de conteúdos do Ensino Médio 88 Gabarito 89 SUMÁRIO 5 Filosofia – 3a série – Volume 1 ORIENTAÇÃO SOBRE OS CONTEÚDOS DO VOLUME Prezado Professor, O presente volume sofreu algumas altera- ções em relação às edições anteriores. As mu- danças foram modestas e tiveram o sentido de melhorar o diálogo entre o Caderno do Pro- fessor e o Caderno do Aluno. De maneira geral, procuramos preser- var as Situações de Aprendizagem no seu formato original, pois não se trata de uma nova publicação, mas de nova edição. Des- sa forma, fizemos alguns acréscimos e algu- mas exclusões, sempre no sentido de melhor atender as orientações gerais para o ensino de Filosofia. Enfatizamos que o encaminhamento pro- posto nas Situações de Aprendizagem disponí- veis no Caderno do Professor e no Caderno do Aluno tem o sentido de apresentar uma pos- sibilidade para percorrer as diretrizes dadas pelo Currículo Oficial do Estado de São Paulo. Contudo, entendemos que, para seguir o Cur- rículo, você não precisa nem deve ficar restrito apenas aos Cadernos, podendo complementar as Situações de Aprendizagem propostas com outros recursos. Você pode, ainda, adotar como referência um livro didático de sua preferência. Mas, mesmo que faça essa opção, lembre-se sempre que, ainda assim, deverá complemen- tar a proposta do livro com outros recursos e planejamento a fim de atender o Currículo. Advertimos que nenhum material é perfeito e jamais poderá ser utilizado sem planejamento e sem as indispensáveis contribuições teóricas e práticas do docente. Professor, você tem auto- nomia para planejar e preparar as suas aulas, selecionar os textos e os pensadores que me- lhor se adéquam aos temas curriculares e ao desenvolvimento das competências e habilida- des referidas no Currículo. Entendemos que nunca é demais lembrar que o atendimento ao Currículo Oficial é in- dispensável, pois trata-se de uma política de Estado que visa a melhoria da educação pú- blica e a unificação dos processos de ensino e aprendizagem. Essa unificação pretende garantir a igualdade na formação e, assim, oportunizar aos nossos alunos trajetos mais equânimes. Ainda, o Currículo proporciona oportunidade para uma educação comprome- tida com a formação crítica, solidária e inclu- siva na medida em que também tem o senti- do de preparar os nossos alunos para a vida social e para adentrar e melhor se adaptar às demandas da esfera do mundo do trabalho, com base no desenvolvimento de habilidades e competências. Conhecimentos priorizados Neste volume você encontrará nas Situa- ções de Aprendizagem temas, conteúdos e propostas de reflexão que abordam a temáti- ca relativa ao mundo da prática no contexto das contribuições da Filosofia para o entendi- mento do homem como um ser de linguagem e um ser político. Nesse contexto, abordamos temas relativos à Filosofia quanto à sua uti- lidade e ao seu valor. Pensar sobre “o que é Filosofia e para que ela serve?”, com base no preconceito em relação à atividade filosófica, tem o sentido de retomar uma reflexão e uma discussão iniciada na 1a série. Isso permiteao aluno um contato mais efetivo com todas as aquisições em relação à tradição filosófica e, além disso, fornece condições para que ele verifique o quanto aprendeu e o quanto se familiarizou com a atividade filosófica. No sentido de ampliar e revelar outros aspectos da Filosofia presentes no nosso cotidiano, procuramos trazer algumas considerações sobre a sua importância para a esfera da 6 cidadania. Abordamos a natureza da lingua- gem e as características do discurso filosófico em relação ao discurso religioso e em rela- ção à narrativa mitológica. Consideramos, ainda, a importância de refletir sobre o ho- mem como ser político e sobre os desafios postos para a política. A partir das Situações de Aprendizagem que compõem o presente volume, pretendemos proporcionar aos alu- nos ocasiões para que eles possam identificar situações de preconceito em relação à ativi- dade filosófica, identificar a presença da Fi- losofia no cotidiano, reconhecer aspectos do discurso filosófico, relacionar pensamento e linguagem, reconhecer a importância da de- mocracia e que vivemos em uma sociedade desigual. A prioridade foi dada, nesse senti- do, a temas e pensadores que proporcionam a reflexão e o entendimento sobre a relação entre Filosofia, linguagem e política com a finalidade de que os alunos possam se situar conscientemente como indivíduos, histórica e socialmente construídos, dentro de uma so- ciedade democrática. Competências e habilidades As competências e habilidades prioriza- das são aquelas referentes à atividade filo- sófica e às suas relações com a linguagem e com a política visando estimular a reflexão e a tomada de posição no tocante a questões próprias da vida democrática. Destacamos que a reflexão e a manifestação exigem o exercício da leitura, da escrita e da prática dialógica. Essas três práticas elementares são indispensáveis para a compreensão dos fenô- menos históricos, sociais, culturais, políticos, artísticos e científicos. A compreensão desses fenômenos permite a organização, a inter- pretação e a reflexão filosófica. Metodologia e estratégias A Filosofia no Ensino Médio tem o sentido de responder à necessidade de uma educação integral. Ela compõe, junto com a arte e a ciên- cia, uma forma de abordar o mundo. Dessa forma, entendemos que um ensino que ignore a perspectiva filosófica de abordar o mundo não pode almejar ser integral. Se a presen- ça da Filosofia no Ensino Médio é justifica- da por uma demanda instrumental que seria a de munir os jovens de certos conhecimentos considerados necessários para o exercício da cidadania, essa demanda não lhe é exclusiva e é compartilhada por todas as disciplinas do Currículo. A demanda exclusiva da Filosofia é apresentar aos nossos jovens a reflexão do tipo filosófica e por ela ofertar aos nossos alu- nos uma formação mais abrangente, que vise a formação integral. O Currículo e, como não poderia deixar de ser, os Cadernos de Filosofia procuram atender não apenas a demanda instrumental dada pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB) mas também promover e valorizar a reflexão do tipo filo- sófica. Dessa forma, a organização dos temas curriculares e das Situações de Aprendizagem procura, com base em temas e conceitos rele- vantes no contexto da história da Filosofia, favorecer a reflexão filosófica para os alunos do Ensino Médio. Assim, ao trazermos para a re- flexão filosófica a atividade filosófica e as suas relações com a linguagem e com a política, pro- curamos acentuar a necessidade de se atentar para as condutas cotidianas. Ao centrar as Situações de Aprendizagem nas questões que perpassam a recepção da atividade filosófica, a relação entre Filosofia e linguagem e entre Filosofia e política, não dis- pensamos a história da Filosofia, a retomada dos conceitos filosóficos e o exercício de orali- dade, leitura e escrita que permitem explorar o potencial filosófico de cada aluno e não cair em um ensino enciclopédico. Consideramos, na abordagem do tema, que o aporte da tra- dição filosófica só terá sentido se incentivar a elaboração de uma reflexão filosófica, se os alunos puderem experimentar o percurso do 7 Filosofia – 3a série – Volume 1 pensamento organizado por meio do encontro com diferentes possibilidades de vocabulário, raciocínio, hipóteses, escolhas de premissas e consequências. Nesse sentido, incentivamos nas Situações de Aprendizagem a leitura e análise para a compreensão do texto, com base em pesquisas que visam ampliar o voca- bulário e, em especial, permitir que os alunos tenham acesso aos termos filosóficos. Há, ain- da, a indicação de questões que orientam o aluno a se remeter ao texto preferencialmen- te ou à explicação do professor. E, em menor frequência, mas não em menor importância, destacamos o papel da redação, que não es- pecificamos como dissertação, pois esta deve ser uma opção do professor, baseando-se na condição da turma de alunos que tem diante de si. Contudo, lembramos que a dissertação é ocasião privilegiada para o exercício da re- flexão filosófica. É por ela que o aluno expe- rimenta, que assume as hipóteses que deve levá-lo a certas conclusões. Neste volume, você, professor, poderá desafiar os alunos a argumentar acerca da Filosofia, da atividade filosófica, da importância da linguagem, so- bre as condições da democracia, os desafios da política e as consequências das concepções e escolhas. Avaliação da aprendizagem Estamos acostumados com a perspectiva de avaliação como uma régua, uma medida que permite classificar os alunos. Para reali- zar essa medição, nós, professores, geralmente, aplicamos provas, cujos resultados nos permi- tem dar notas e, assim, classificar os nossos alunos. Muitas vezes a classificação, ao final de um ano, nos permite identificar os alunos que apresentam ou não as condições para avançar no processo de escolarização. Ou seja, no processo ela nos permite decidir pela apro- vação ou reprovação dos alunos. Entendemos que essa perspectiva é apenas parcialmente vá- lida se considerarmos a atual função da esco- la. Dessa forma, procure estar sempre atento aos processos de aprendizagens dos alunos, às necessidades, aos avanços e às dificuldades e não apenas ao que o aluno apresenta na prova bimestral. Considerando que a avaliação deve fazer parte do cotidiano escolar e não pode se reduzir a uma prova, ela deve contemplar todas as tarefas propostas, não apenas para o professor classificar, mas também para que o aluno reconheça as suas dificuldades e suas po- tencialidades. Assim, entendendo a avaliação da aprendizagem como parte de um processo formativo, o professor deve considerar todas as atividades propostas (e isso inclui as pes- quisas, a lição de casa e, sempre que possível, a redação). Não esqueça que cada atividade proposta e realizada deve receber da sua parte um retorno individualizado, preferencialmen- te, e/ou geral (nesse caso, deve-se especificar o que foi considerado um acerto da turma e no que eles precisam melhorar). No contexto deste volume, considere se os alunos, com base no tema proposto, foram capazes de identifi- car palavras centrais e seus significados dian- te do tema apresentado; se foram capazes de identificar os problemas apresentados em cada Situação de Aprendizagem; se ao ler um texto filosófico, conseguiram identificar os conceitos e a linha argumentativa do filósofo; se foram capazes de, por meio desse contato, reconhecer a relevância do problema e da contribuição da tradição filosófica; se foram capazes de identi- ficar o problema proposto como um problema atual, da sua realidade; e finalmente, até que ponto eles conseguiram avançar para uma re- flexão e argumentação do tipo filosófica. Professor, optamos, nesta edição, por não trabalharcom a perspectiva de gabarito no sentido de stricto sensu, pois, no contex- to do ensino de Filosofia, devemos atentar, mais do que para a precisão das respostas, para o quanto o aluno reconhece os conteúdos transmitidos e, com base neles, apresenta con- dições de se aproximar da experiência filosófi- ca. Assim, reforçamos a perspectiva de que as sugestões de questões, presentes nas Situações 8 de Aprendizagem, não se configuram em um receituário de perguntas em que as respostas já foram definidas. Com isso não queremos dizer que vale qualquer resposta. Lembramos que as Situações de Aprendizagem apresen- tam como referência textos e questionamentos que abordam o pensamento de determinados filósofos. Dessa forma, as respostas dos alu- nos devem se remeter ao que foi proposto e aos pensadores citados, sempre que assim for requerido. Por fim, sugerimos que você realize o exercício de responder às questões propostas em cada Situação de Aprendizagem antes de indicá-las para os alunos e verifique se elas são pertinentes para a sua turma, se elas atendem à expectativa de aprendizagem e formação com base no tema trabalhado. Esse procedimento deve ser considerado sempre que utilizar ques- tões que não foram elaboradas por você, tais como as que estão propostas em livros didáti- cos, e as que foram formuladas para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), provas de vestibulares e outras. Afinal, ninguém conhece melhor as turmas do que você! Bom trabalho! 9 Filosofia – 3a série – Volume 1 Esta Situação de Aprendizagem tem por ob- jetivo retomar e aprofundar a discussão, iniciada na 1a série do Ensino Médio, sobre o que é a Fi- losofia, enfatizando, neste momento, a necessida- de de combater e superar as diversas formas de preconceito em relação a ela, a exemplo dos que se expressam em ideias como: a Filosofia é uma atividade intelectual muito difícil e, por isso, restri- ta a poucas pessoas de inteligência privilegiada; a Filosofia é coisa de gente esquisita, diferente, meio excêntrica, desligada da vida concreta; a Filosofia, por não ter uma aplicação prática imediata (ga- nhar dinheiro, por exemplo), é absolutamente inú- til. Trata-se, portanto, de demonstrar que, ao con- trário do que dizem essas imagens preconcebidas e distorcidas da Filosofia, ela é uma atividade intelectual da maior importância, especialmente para o exercício crítico e consciente da cidadania, e acessível a todas as pessoas, sem distinção. O principal referencial teórico para essas dis- cussões será a obra Cadernos do cárcere, de An- tonio Gramsci, embora neste primeiro momento ainda não apareçam citações explícitas desse au- tor. Para o encaminhamento do trabalho com os alunos serão empregados, basicamente, o texto Apologia de Sócrates, de Platão, e alguns excer- tos de Aristóteles (A política). Começaremos com um rápido levantamento das ideias que as pessoas têm da Filosofia, a fim de explicitar a existência do preconceito já mencionado, possivelmente mesmo entre os alunos, apesar de terem estudado Filosofia nas séries anteriores. Em seguida, pas- saremos ao exame da situação específica de dois filósofos antigos, Tales de Mileto e Sócrates, com o objetivo de mostrar que esse preconceito, na re- alidade, não é recente, não é exclusivo dos tempos modernos, mas, ao contrário, remonta às origens da Filosofia. Por fim, retomaremos o caso de Só- crates, retratando particularmente o contexto de seu julgamento e condenação à morte para refle- tir sobre o caráter político que esse tipo de pre- conceito pode adquirir. A proposta é que os alunos reflitam critica- mente sobre esses temas, de modo individual e também coletivo, e se expressem oralmente e por escrito a respeito deles de forma rigorosa, com a mediação do professor e a leitura dos textos contidos no Caderno do Aluno. SITUAÇÃO DE APRENDIZAGEM 1 O PRECONCEITO EM RELAÇÃO À FILOSOFIA Conteúdos e temas: o preconceito em relação à Filosofia e a necessidade de combatê-lo e superá-lo; o caráter histórico desse preconceito: os exemplos de Tales de Mileto e Sócrates; a dimensão política da intolerância com a Filosofia e os filósofos. Competências e habilidades: relacionar informações, representadas de diferentes formas, e conhecimen- tos disponíveis em diferentes situações, para construir argumentação consistente; identificar situações de preconceito, particularmente em relação à Filosofia e aos filósofos; reconhecer a dimensão política desse preconceito e posicionar-se diante dele; ler, compreender e interpretar textos teóricos e filosóficos; expressar-se por escrito e oralmente de forma sistemática; elaborar hipóteses e questões com base nas leituras e nos debates realizados. Sugestão de estratégias: levantamento das opiniões contidas no senso comum sobre a Filosofia e os filósofos por meio de dinâmicas de grupo; pesquisa de campo e debates; leitura sistemática e proble- matizadora de textos; elaboração escrita do próprio pensamento; pesquisa bibliográfica e na internet. Sugestão de recursos: figuras de filósofos e filósofas; internet; bibliografia complementar. SITUAÇÕES DE APRENDIZAGEM 10 Sondagem e sensibilização Propomos que, inicialmente, você convide os alunos a participar de uma atividade de nature- za lúdica. Com o auxílio do Caderno do Aluno, apresente-lhes as figuras de filósofos e filósofa, Figura 1 – Antonio Gramsci. © T op fo to /K ey st on e Figura 4 – Rosa Luxemburgo. © U ni ve rs al I m ag es G ro up /K ey st on e Figura 3 – DAVID, Jacques-Louis. A morte de Sócrates. 1787. Oléo sobre tela, 129,5 x 196,2 cm. Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque. © I m ag e A ss et M an ag em et /a ge fo to st oc k/ K ey st on e Figura 2 – Renato Janine Ribeiro. © R en at o Ja ni ne R ib ei ro Sugestão de avaliação: domínio do conteúdo (conceitos, ideias, raciocínios etc.) estudado; capacidade de expressão clara, fluente, coerente, bem articulada e consistente (bem fundamentada, buscando superar o senso comum); envolvimento nas atividades propostas. Como instrumentos de avaliação, recomen- damos redações individuais; provas dissertativas e reflexivas; outros trabalhos que o professor julgar adequados e pertinentes. sem revelar a identidade deles. Peça aos alunos que tentem descobrir a profissão dessas pes- soas, anotando as opções no Caderno do Aluno e respondendo às questões nele apresentadas. 11 Filosofia – 3a série – Volume 1 1. Observe as imagens e atribua, no quadro, uma profissão a cada uma das pessoas representadas, apresentando pelo menos uma hipótese para justificar a profissão atribuída. 2. Que critérios você utilizou para atribuir a profissão a cada uma dessas pessoas? 3. Na sua opinião, quem entre essas pessoas mais se assemelha a um filósofo ou filósofa? Por quê? 4. Houve preconceito em suas respostas? O objetivo desse questionamento é cha- mar a atenção para a possibilidade de que os próprios alunos, muitas vezes, expressam uma visão preconceituosa e estereotipada da Filo- sofia e dos filósofos. Após a discussão, peça que se divi- dam em grupos para ler o texto “Ideias que as pessoas têm da Filo- sofia”, que consta no Caderno do Aluno, na seção Leitura e análise de texto, e respondam às questões que o seguem. Ao terminarem, abra novamente o debate, a fim de que possam ava- liar a experiência que tiveram ao refletir sobre a própria concepção de Filosofia. Ideias que as pessoas têm da Filosofia Se fizermos uma rápida pesquisa com as pessoas à nossa volta, indagando o que elas pensam da Fi- losofia, muito provavelmente ouviremos opiniões diversas. Umas dirão, por exemplo, que a Filosofia é algo muito difícil e que, porisso mesmo, só pode ser praticada por pessoas de inteligência privilegiada, sendo inacessível aos “simples mortais”; outras responderão que a Filosofia é coisa de gente doida, que vive no mundo da Lua e que só se preocupa com assuntos abstratos, e que ela, a Filosofia, nada tem a ver com a vida prática; outras, ainda, concordando com estas últimas, emendarão que a Filosofia, por não ter uma aplicação prática imediata, não serve para nada. Pode ser que alguém, remando contra toda essa maré de opiniões pejorativas a respeito da Filosofia, arrisque-se a dizer que a considera uma matéria linda, já que permite o contato com o pensamento dos filósofos, expresso em frases de rara profundidade e beleza, ainda que, por vezes, incompreensíveis; por fim, certamente haverá também aquelas que confessarão, com algum sarcasmo ou menosprezo, não ter a menor ideia do que seja a Filosofia. Todas essas opiniões, na realidade, são, pelo menos em certa medida, expressão de um preconceito em relação à Filosofia. Por que preconceito? Porque, em geral, são opiniões emitidas apressadamente, precipitadamente, sem a preocupação de se examinar com o devido cuidado o assunto sobre o qual se está opinando a fim de conhecê-lo melhor. Afinal, é justamente isso que caracteriza o preconceito. Sempre que adotamos tal postura, corremos mais seriamente o risco de nos enganar em nosso julga- mento e até de cometer injustiças com as pessoas. Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola. 1. Você se considera preconceituoso em rela- ção a alguma coisa? Argumente. Esta é uma questão aberta, que visa garantir um espaço para que os alunos falem e debatam com liberdade sobre as diferentes experiências de preconceitos por eles viven- ciadas. 12 2. E em relação à Filosofia? Justifique. Espera-se que reconheçam a existência, neles próprios, de preconceito em relação à Filosofia e que discutam entre si, sob a sua coordenação, as razões e as consequências de tal preconceito. Uma delas, por exemplo, seria afastá-los do contato com a Filosofia. Para ampliar e aprofundar o tema, sugerimos uma pequena pesquisa, conforme orientação contida no Caderno do Aluno, na seção Lição de casa. Cada aluno deverá entrevistar uma pessoa conhecida (pode ser alguém da própria famí- lia, amigo, vizinho, parente etc.) a fim de identificar a ideia que essa pessoa tem da Fi- losofia. Para tanto, deverá registrar no Ca- derno do Aluno a definição de Filosofia dada pelo entrevistado, a utilidade a ela atribuída, os adjetivos positivos e negativos que forem ci- tados e a opinião do entrevistado a respeito do que faz um filósofo e do que uma pessoa precisa fazer para filosofar. Com base nos resultados obtidos com a pesquisa indicada, você poderá dividir a tur- ma em grupos, pedindo a eles que analisem, comentem e sintetizem os resultados obtidos com as entrevistas. Após alguns minutos de discussão, peça a cada grupo que relate para a sala a síntese elaborada e anote na lousa as respostas obtidas para os quatro itens da entrevista: Cite dois adjetivos que você atribui- ria à Filosofia; O que é Filosofia para você?; Na sua opinião, para que serve a Filosofia? Na sua opinião, o que faz um filósofo e o que uma pessoa precisa fazer para filosofar? Peça que deem ênfase especial aos adjetivos que apa- receram, distinguindo os positivos dos nega- tivos. Ao término do relato dos grupos, você terá construído um inventário das opiniões mais comumente associadas à Filosofia e preparado o cenário para que se inicie a dis- cussão sobre a questão do preconceito em relação a ela. Essa discussão pode ser estimu- lada por questões como: f Qual é o conceito de Filosofia que preva- leceu? f Quais tipos de adjetivo foram predominantes: positivos ou negativos? f Entre os negativos, qual é o que mais apa- receu? f Que finalidades ou utilidades as pessoas atribuem à Filosofia? Na visão da maioria, para que serve a Filosofia? f Como a maioria dos entrevistados vê a fi- gura do filósofo? f O que as pessoas acreditam ser necessário para que uma pessoa filosofe? f Qual é a sua hipótese de como as pessoas chegaram à opinião dada? f Será que as pessoas que pensam assim co- nhecem de fato o assunto do qual estão fa- lando? f As opiniões manifestadas revelam um pre- conceito em relação à Filosofia e aos filó- sofos? Justifique. f O que é, afinal, um preconceito? Após essa motivação inicial, cabe apro- fundar um pouco mais a discussão sobre o preconceito em relação à Filosofia, de- monstrando que não se trata de algo novo ou recente, mas que, ao contrário, remonta às origens da Filosofia na Grécia Antiga. O exemplo a ser analisado, neste momento, será Tales de Mileto. Por meio do exame de duas anedotas con- tadas sobre Tales, uma registrada por Platão e outra por Aristóteles, é possível perceber que, muitas vezes, as opiniões correntes sobre a Filosofia e os filósofos não correspondem inteiramente à verdade, revelando-se fruto de juízos precipitados ou mesmo de total desco- nhecimento do assunto. Para empreender esse aprofunda- mento, sugerimos que oriente os alunos a ler, ainda em grupos, o texto “Tales de Mileto: o distraído” que está reproduzido 13 Filosofia – 3a série – Volume 1 no Caderno do Aluno, na seção Leitura e análise de texto. Os excertos de Platão e Aristóteles, além de cumprir o objetivo de explicitar o caráter equivocado das opiniões correntes sobre Tales de Mileto, permitem ainda o contato direto dos alunos com o tex- to filosófico clássico, mesmo que por meio de fragmentos. Seria apropriado se você aproveitasse essa oportunidade para expor outras informações e elementos sobre esses autores e suas obras (dados biográficos, con- texto histórico em que viveram, aspectos de seu pensamento, curiosidades sobre sua vida etc.) com base em seu próprio estudo, visan- do ampliar o conhecimento e o interesse dos alunos. Tales de Mileto: o distraído O preconceito e a hostilidade em relação à Filosofia não são algo novo, recente, mas, ao contrário, remontam às origens da Filosofia na Grécia Antiga. Talvez o registro mais antigo desse preconceito seja aquele de que foi vítima Tales de Mileto, que viveu no século VII a.C. e é considerado o primeiro filósofo da história. A respeito dele, contava-se a seguinte anedota, bastante difundida na Grécia Antiga e recuperada por Platão em sua obra Teeteto1: Tales era tão interessado no estudo dos astros que costumava caminhar olhando para o céu. Certo dia, absorto em seus pensamentos e raciocínios, acabou tropeçando e caindo em um poço, sendo motivo de riso e caçoada para uma escrava que ali se encontrava. Espalhou-se, então, o boato de que Tales se preocupava mais com as coisas do céu, esquecendo-se das que estavam debaixo de seus pés. “Essa pilhéria”, adverte Platão, “se aplica a todos os que vivem para a Filosofia” 2. Essa imagem de um homem distraído e trapalhão, porém, não parece condizer com a verdade sobre Tales, que, ao que tudo indica, era uma pessoa bem esperta, viva e inteligente. É o que se conclui, por exemplo, de outra anedota contada a respeito de sua sabedoria, registrada por Aristóteles em sua obra A política: “Como o censuravam pela pobreza e zombavam de sua inútil filosofia, o conhecimento dos astros permitiu-lhe prever que haveria abundância de olivas. Tendo juntado todo o dinheiro que podia, ele alugou, antes do fim do inverno, todas as prensas de óleo de Mileto e de Quios. Conseguiu-as a bom preço, porque ninguém oferecera melhor e ele dera algum adiantamento. Feita a colheita, muitas pes- soas apareceram ao mesmo tempo para conseguir as prensas e ele as alugou pelo preço que quis. Tendo ganhado muito dinheiro, mostrou a seus amigos que para os filósofos era muito fácil enriquecer, mas que eles nãose importavam com isso. Foi assim que mostrou sua sabedoria.”3 Na verdade, Tales deve ter gozado de grande prestígio em sua época. Tanto que passou para a poste- ridade como um dos sete sábios da Grécia4: na política, empenhou-se em organizar as cidades gregas da Jônia para enfrentar a ameaça dos persas; como engenheiro, quis desviar o curso de alguns rios para fins de navegação e irrigação; como pesquisador, investigou as causas das inundações do rio Nilo, rompendo com as explicações míticas que se davam para elas; como astrônomo, previu um eclipse solar e descobriu a constelação denominada Ursa Menor; como matemático e geômetra, teria descoberto um método para medir a altura de uma pirâmide do Egito, do qual teria derivado o famoso “teorema de Tales”. 1 PLATÃO. Diálogos. Teeteto/Crátilo. Tradução Carlos Alberto Nunes. Belém: Editora Universitária UFPA, 2001. p. 83 [174a]. 2 Ibidem. 3 ARISTÓTELES. A política. Tradução Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 30. 4 De fato, atribuem-se a ele inúmeros feitos importantes, como revela a professora e filósofa Marilena Chaui, em Introdução à história da Filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p. 55. 14 Além disso, não podemos esquecer que Tales foi, segundo Aristóteles, o primeiro a dar uma respos- ta racional, isto é, sem recorrer aos mitos, para a pergunta que mais incomodava os filósofos chamados pré-socráticos ou filósofos físicos: Qual era o elemento primordial que dava origem a todas as coisas? Para Tales esse elemento era a água, por ela estar presente nos alimentos necessários à vida, pelo fato de as coisas vivas serem úmidas, enquanto as mortas ressecam, e porque a Terra repousa sobre as águas. Daí sua conclusão de que ela deve ter sido o elemento primordial. A hipótese que associa todos os seres a uma única matriz (substância primária), a água, é uma hi- pótese que poderia ser considerada corriqueira, mas significou uma revolução intelectual. Ao afirmar que, apesar da diversidade entre os seres, apresentamos um elemento em comum, e que tal elemento é natural (no caso a água), Tales e outros filósofos jônicos superaram a necessidade de uma explicação mitológica acerca da existência das coisas do mundo. Tales, assim como Anaxímenes (ar como ele- mento primordial) e Anaximandro (ápeiron – matéria infinita da qual todas as coisas se separam como elemento primordial) estabeleceram um critério, um modelo de compreensão que pode ser empregado para todos os seres, homens, natureza e deuses. Dessa forma, Tales, Anaximandro e Anaxímenes im- plantaram um novo modo de reflexão. “Da origem do mundo, de sua composição, de sua ordem, dos fenômenos meteorológicos, propõem explicações livres de toda a imaginária dramática das teogonias e cosmogonias antigas. [...] Nada existe que não seja natureza, physis. Os homens, a divindade, o mundo formam um universo unificado, homogêneo, todo ele no mesmo plano”5. Vemos, portanto, que Tales, ao contrário do que sugere a primeira anedota, não tinha nada de lunático, distraído e desligado dos problemas concretos. Eis por que a tal anedota revela, de fato, um preconceito, isto é, um conceito precipitado e desprovido de fundamentação. Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola. 5 VERNANT, Jean-Pierre. As origens do pensamento grego. Tradução Isis Borges B. da Fonseca. Rio de Janeiro: Difel, 2002. p. 109-110. Para expandir o significado dessa leitura, o Caderno do Aluno traz ainda um conjunto de questões que procura articular o conteúdo do texto com a questão do preconceito, as quais podem ser respondidas em grupos ou indivi- dualmente. São elas: 1. Na sua opinião, Tales foi vítima de precon- ceito? Por quê? Sim, pelo menos no que se refere à primeira anedota. Isso porque, como ficou demonstrado pelo texto, a ideia de uma pessoa desligada e desinteressada dos problemas concretos do cotidiano parece não corresponder à verdade sobre Tales. 2. De acordo com o excerto de Aristóteles, e baseado nos outros dados do texto anali- sado, você consideraria a filosofia de Tales como algo sem utilidade? Justifique. Não, porque, ao filosofar, ele mostrava preocupação com questões de astronomia e de cosmologia (por exemplo, a pergunta sobre qual elemento dá origem a todas as coisas), até sem dar importância se isso lhe traria lucros ou riquezas materiais. Aliás, sendo um comerciante bem-sucedido, Tales não precisava mesmo se preocupar muito com isso. Além disso, a filosofia de Tales parecia inútil porque, para a maioria das pessoas, os temas que ele investigava aparentavam não ter nenhuma relevância. 3. E quanto a você? Já sofreu algum precon- ceito? Já presenciou alguma situação em que alguém sofreu preconceito? Relate a experiência. Resposta pessoal. 4. Você acredita que uma pessoa que passe a se interessar pela Filosofia será alvo de pre- conceito, hostilidade ou rejeição? Por quê? Teme que isso aconteça com você? 15 Filosofia – 3a série – Volume 1 Resposta pessoal. Se for possível, pode-se introduzir a dis- cussão sobre as razões políticas que podem estar por trás da hostilidade em relação à Filosofia. Por exemplo, o receio de que as pessoas passem a pensar mais crítica e sistematica- mente, desenvolvendo questionamentos e argumentações não habituais. Finalmente, para consolidar e aprofundar o conhecimento sobre Tales e os filósofos pré-socráticos, sugerimos, conforme proposta do Caderno do aluno, na seção Pesquisa individual, uma pe- quena pesquisa complementar, a ser feita em casa, cujos dados devem ser inseridos no qua- dro indicado. Para auxiliar os alunos, você pode sugerir fontes bibliográficas de consulta, ou mesmo sites confiáveis na internet. Alerte, porém, para que evitem o esquema do “recor- ta e cola”, mostrando que o objetivo é que produzam uma síntese pessoal a partir da compreensão que conseguirem ter do tema es- tudado. É importante, também, que você, pro- fessor, motive os alunos para essa pesquisa por meio de breves comentários e explicações pré- vias sobre esses filósofos. Cada aluno pode pesquisar individualmente todos os pré-socrá- ticos, ou você pode distribuir um filósofo para cada grupo, cuidando para que, posteriormen- te, todos tenham acesso à pesquisa desses grupos. Quanto ao prazo de devolução dos re- sultados da pesquisa, somente você, professor, por conhecer sua turma, poderá avaliar o tem- po e o grau de complexidade que ela deverá ter. Uma vez realizada a pesquisa, confira o trabalho proposto, abrindo espaço para os alunos se manifestarem sobre a experiência. Ainda no Caderno do Aluno, há a indicação de algumas questões que servem de roteiro para a pesquisa. Procure verificar se essas questões atendem a seus critérios. Caso julgue necessário, pode ampliá-las ou reformulá-las. Professor, além dessa abordagem inicial, sugerimos que amplie o tema proposto com base no caso emblemático de Sócrates. Trata- -se de um filósofo que pode chamar a atenção da turma, seja por sua posição na História da Filosofia, seja por seu modo de abordar seus interlocutores, ou ainda pela sua história de vida. Pode ser interessante iniciar o “caso” Sócrates pela causa de sua morte, em geral associada à sua capacidade de conversar com os jovens, como nos relata Platão na obra Apologia de Sócrates. Convém, pois, aprovei- tar-se desse carisma do filósofo para motivar ainda mais os alunos a conhecer suas ideias. Para estimular os alunos, você pode propor a eles que reflitam por alguns instantes sobre duas questões contidas no Caderno do Aluno, na seção “Sócrates: aquele que vive nas nuvens”, aparentemente muito simplórias ou inocentes: 1. Quanto mede o pulo de uma pulga? Você consegue imaginar uma forma de medir essa distância? Se consegue, exponha-a. Respostapessoal. O objetivo não é propriamente que o alu- no tenha uma resposta pronta, mas motivá-lo ao estudo de Sócrates, permitindo a ele experimentar a situação vivida pelo filósofo, ao ser ridicularizado na comédia As nuvens, de Aristófanes, que o retrata como alguém preocupado com questões sem a menor relevância ou utilidade. 2. Por onde é produzido o zumbido do mos- quito: pela tromba ou pelo traseiro? Resposta pessoal, com o mesmo objetivo da anterior. Essas duas questões, na realidade, apare- cem na comédia As nuvens, de Aristófanes, cujo objetivo é ridicularizar a imagem de Só- crates. Apresentando-as de surpresa aos alu- nos, você permitirá que eles experimentem a sensação de se ocupar de assuntos banais, sem qualquer relevância prática, a exemplo do que faziam filósofos como Sócrates, segundo a visão que deles tinham seus críticos e opo- sitores. Você pode provocá-los perguntando: Essas questões são relevantes? Como você se sentiu tendo de encontrar respostas para elas? Que tipo de pessoa se ocuparia de questões como essas? Teria razão quem julgasse essas pessoas desocupadas e até meio malucas? 16 Feita essa motivação inicial, o passo seguinte é solicitar aos alunos que leiam atentamente o texto reprodu- zido a seguir e na sequência do Caderno do Aluno, na seção Leitura e análise de texto, e levantem questionamentos sobre ele. Sócrates: aquele que vive nas nuvens Outra célebre vítima do preconceito e da intolerância contra a Filosofia foi Sócrates. E neste caso as consequências foram muito mais sérias, visto que o levaram à morte. Na realidade, não há uma imagem única de Sócrates. Isso porque todas as informações que temos dele nos chegaram por testemunhos indiretos, já que ele mesmo nada escreveu. Assim, enquanto seus amigos, admiradores e discípulos, como Xenofonte e Platão, o viam como sábio, patriota, respeitador das leis e da religião, piedoso, justo, valoroso como guerreiro nas batalhas etc., seus críticos o retrata- vam como uma pessoa esquisita, deslocada, excêntrica, charlatã, corruptora de jovens e ímpia. Entre todos os críticos da figura de Sócrates destacamos Aristófanes, dramaturgo grego, conserva- dor e satírico que escreveu As nuvens1, comédia que ridicularizava a figura de Sócrates. Neste texto, aparece um Sócrates “se movendo livremente, proclamando que caminhava no ar e dizendo uma plêiade de outras tolices” das quais não entende nada2. É um Sócrates mestre dos so- fistas, isto é, charlatão, enganador e que ensinava às pessoas a arte desse engano. Aliás, essa imagem dos sofistas também era, em boa medida, preconceituosa. Na peça de Aristófanes, ele surge em cena empoleirado em uma cesta suspensa no ar, significando que ele vivia nas alturas, preocupado com questões de cosmologia e de astronomia (movimento dos astros, origem do universo etc.), ou com assun- tos sem a menor relevância, como a medida do pulo de uma pulga, ou se o zumbido de um mosquito é produzido por sua tromba ou seu traseiro, ficando totalmente alheio aos problemas realmente importantes da vida dos cidadãos de Atenas. A certa altura, um dos discípulos conta que, certa vez, “uma lagartixa atrapalhou uma indagação transcendental” de Sócrates. Isso aconteceu, segundo o relato, quando ele “observava a Lua para estudar o curso e as evoluções dela, no momento em que ele olhava de boca aberta para o céu, do alto do teto uma lagartixa noturna, dessas pintadas, defecou na boca dele”3. Essa imagem depreciativa e até cômica de Sócrates provavelmente revela a ideia que a maioria das pessoas tinha a respeito dele e dos filósofos em geral. No entanto, é uma imagem bastante distorcida. Na realidade, Sócrates e os sofistas inauguraram um novo período na história da Filosofia em que a reflexão filosófica se deslocou da cosmologia e da física (princípio que dá origem a todas as coisas) para as questões relativas à vida concreta na cidade (pólis), isto é, à política, à ética, ao conhecimento. Entre os temas abordados por Sócrates, podemos elencar a justiça, a beleza, a coragem, o amor, a educação, entre outros. Convém destacar que o que mais chamava atenção, para além do tema em debate, era a forma como o filósofo abordava o assunto. Além disso, no que se refere aos sofistas, Sócrates tinha, certamente, muito mais diferenças e mesmo divergências com eles do que semelhanças. Enquanto os sofistas se apresentavam como sábios, isto é, pes- soas entendidas em diversos assuntos, especialmente na técnica da retórica, Sócrates dizia: “Sei que nada sei”; enquanto os sofistas cobravam pelos ensinamentos que ministravam, Sócrates condenava essa práti- ca e filosofava com as pessoas gratuitamente na praça (ágora) de Atenas; enquanto os sofistas eram céticos 1 ARISTÓFANES. As nuvens; Só para mulheres; Um deus chamado dinheiro. Tradução Mário da Gama Kury. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000. p. 11-101. 2 PLATÃO. Apologia de Sócrates. Diálogos socráticos III. Tradução Edson Bini. São Paulo; Bauru: Edipro, 2008. p. 139-140 [19 c]. 3 ARISTÓFANES. Op. cit. p. 21. 17 Filosofia – 3a série – Volume 1 em relação à possibilidade de se conhecer a verdade universal, Sócrates a perseguia incansavelmente; enquanto os sofistas contentavam-se com a opinião (doxa), Sócrates exigia o saber verdadeiro (episteme). A respeito dos sofistas, diz Sócrates ironicamente por ocasião de seu julgamento: “Cada um desses homens [...] é capaz de dirigir-se a qualquer cidade e persuadir os jovens, os quais podem se associar, segundo queiram, com qualquer de seus concidadãos sem pagar, a deixar a companhia dessa pessoa para se juntarem a ele, remunerá-lo e, além disso, mostrar-lhe gratidão”4. Vemos, assim, que a imagem de Sócrates traçada por Aristófanes, procurando retratá-lo como al- guém que anda nas nuvens, preocupado com assuntos alheios ao cotidiano das pessoas e identificado com os sofistas, não corresponde à verdade sobre ele. Ao contrário, baseia-se em um preconceito, a exemplo do que ocorrera com a anedota sobre Tales. É interessante observar que em seu julgamento Sócrates fez menção à comédia de Aristófanes (As nuvens) como um dos fatores que provocaram as acusações contra ele5. 4 PLATÃO. Op. cit. p. 140 [19e–20a]. 5 Ibidem, p. 139 [19c]. Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola. Dessa leitura, importa destacar: f a existência de várias imagens de Sócrates, construídas de acordo com a simpatia ou antipatia que as pessoas tinham em relação a ele, lembrando que essa multiplicidade de imagens foi facilitada pelo fato de Sócrates nada ter escrito; f o retrato negativo e satírico traçado dele por Aristófanes; f as diferenças reais entre Sócrates e os so- fistas. Você pode iniciar a atividade traçando algumas considerações sobre Aristófanes (dados biográficos e principais obras) e a im- portância da comédia na Atenas dos séculos V e IV a.C. Sobre Aristófanes, cabe destacar, entre outros aspectos, que foi o mais famo- so comediógrafo da Antiguidade grega e que escreveu cerca de 44 comédias, das quais 11 chegaram até nós, entre elas: As nuvens, As vespas, Os pássaros, As rãs, A greve do sexo (ou Lisístrata), A revolução das mulheres e Um deus chamado dinheiro (cf. KURY, Aristófanes, 2000, p. 7). Nunca é demais recomendar aos alunos a leitura dessas obras, particularmente As nuvens, depois que a discussão sobre ela for feita. Quanto às comédias, eram repre- sentações teatrais muito populares, nas quais se criticavam e satirizavam as instituições, os costumes, os políticos e, claro, os filósofos, como no caso da obra em questão. Sobre As nuvens, você pode narrar resumidamente o enredo para a sala, a fim de contextualizar melhor os trechos citados e facilitar sua com- preensão. Vale ressaltar, no entanto, como nos lembra Marilena Chaui (2003, p. 183), que Aristófanes não nosdá uma representa- ção absolutamente fiel de Sócrates e de sua filosofia. O que ele nos revela é, sobretudo, a imagem predominantemente negativa que boa parte dos atenienses tinham de Sócrates, o que se evidencia pelo riso que esta persona- gem provocava. Visando ajudar na compreensão e no apro- fundamento da leitura realizada, são propos- tas duas atividades no Caderno do Aluno. A primeira consiste em um conjunto de ques- tões destinadas a “apimentar” o debate. São elas: 1. A comédia e o humor podem ser formas de propagação de preconceitos? Justifique sua resposta e, se possível, dê exemplos. 2. Essas formas de manifestação artística e cultural são importantes para a democra- cia? Justifique. 18 3. Você vê alguma semelhança entre o papel da comédia no tempo de Sócrates e o dos programas humorísticos atuais? Dê exem- plos e comente. A segunda atividade é uma pesqui- sa individual, a ser feita em casa, sobre o período histórico em que Sócrates viveu (Período Clássico). O aluno de- verá consultar obras de história da Filosofia indicadas por você, ou mesmo a internet (sites confiáveis e sem “recorta e cola”) e responder às seguintes questões: 1. O que foi a comédia e qual era sua importân- cia para a democracia ateniense? Cite alguns dos principais comediógrafos e suas obras. Filósofos Contexto histórico Pensamento Pré-socráticos Colônias gregas da Ásia Menor e da Magna Grécia; século VI ao IV a.C.; Período Arcaico. Preocupação em investigar o princípio que dá origem a todas as coisas (physis); constroem explicações racionais (não mí- ticas) para essa indagação. Sócrates Atenas, século V a.C.; Período Clássico; de- mocracia ateniense; “Século de Péricles”; Guerra do Peloponeso. Preocupação com a política, a ética e o conhecimento; não se apresenta como sábio: “Sei que nada sei”; “Conhece-te a ti mesmo”; filosofa por meio do diálogo – método dialético – e nada cobra por isso; busca da verdade (episteme); amigo do saber (philosopho). Sofistas Contemporâneos de Sócrates. Ensinam por discursos eloquentes e não por diálogo; cobram por seus ensinamen- tos; desacreditam na possibilidade de se conhecer a verdade universal – relativistas; preocupação em persuadir e não com a busca da verdade; praticantes da retórica; apresentam-se como sábios; amantes da opinião (philodoxos). 2. Pode-se afirmar que a imagem de Sócrates construída por Aristófanes é preconceituo- sa? Por quê? Em que sentido? 3. Como era a democracia ateniense e em que ela se diferencia da democracia brasileira atual? 4. Quais são as principais diferenças entre Sócrates, os filósofos pré-socráticos e os sofistas? Referente à última questão, o Caderno do Aluno traz um quadro para ajudar a organizar as respostas. A seguir, há um esboço de como ele pode ser preenchido. No entanto, cabe a você complementá-lo ou fazê-lo do modo que julgar mais adequado. Quadro 1. 19 Filosofia – 3a série – Volume 1 Com essas atividades, espera-se que os alu- nos consolidem aspectos essenciais do conteú- do estudado e sejam capazes de posicionar-se diante dele. Para fechar (sem encerrar) a discussão so- bre o preconceito e a hostilidade em relação à Filosofia, propomos a abordagem da “morte de Sócrates” a fim de explicitar a natureza po- lítica muitas vezes inerente a esse preconceito e a essa hostilidade. Inicialmente, retome as questões respondi- das em casa e peça aos alunos que exponham suas respostas, promovendo um breve debate em classe. Em seguida, para introduzir o tema da morte de Sócrates, proponha aos alunos que conversem por alguns instantes com o colega ao lado sobre a seguinte questão, que se encontra no Caderno do Aluno: Como é possível alguém ser a pessoa mais sábia que existe e, ao mesmo tempo, ser também alguém que nada sabe? O objetivo dessa indagação é introduzir o tema que será tratado no texto sobre Sócrates. Proponha, então, que façam a leitu- ra cuidadosa do texto a seguir, cha- mando a atenção para os trechos transcritos da obra de Platão, Apologia de Só- crates. O texto está no item Leitura e análise de texto no Caderno do Aluno. A morte de Sócrates De acordo com Platão, as acusações contra Sócrates foram: “Sócrates é réu por empenhar-se com excesso de zelo, de maneira supérflua e indiscreta, na investi- gação de coisas sob a terra e nos céus, fortalecendo o argumento mais fraco e ensinando essas mesmas coisas a outros”1. “Sócrates é réu porque corrompe a juventude e descrê dos deuses do Estado, crendo em outras divindades novas”2. Levado a julgamento, foi condenado à morte. Como e por que isso ocorreu? Tudo começou quando Sócrates tomou conhecimento de que o oráculo do templo de Delfos, de- dicado ao deus Apolo, havia proclamado que ele era o homem mais sábio de Atenas. Não se conside- rando como tal, mas, ao mesmo tempo, não podendo duvidar da palavra do deus, decidiu investigar o significado de tal revelação. Procurou, então, aqueles cidadãos mais ilustres de Atenas e que eram tidos como os mais sábios da cidade. Eles pertenciam a três categorias sociais: os políticos, os poetas (autores de tragédias, como Aristófanes – embora mais conhecido por suas comédias –, e de ditirambos – cantos religiosos em homenagem ao deus Dionísio) e os artesãos. Interrogando esses cidadãos (por meio de seu método dialético), constatou que, na realidade, nada sabiam dos assuntos em que eram tidos como sábios. Ao término da conversa com cada uma dessas pessoas, Sócrates concluía: “Sou mais sábio do que esse homem; nenhum de nós dois realmente conhece algo de admirável e bom, entretanto ele julga que conhece algo quando não conhece, enquanto eu, como nada conheço, não julgo tampouco que conheço. Portanto, é provável, de algum modo, que nessa modesta medida seja eu mais sábio do que esse indivíduo – no fato de não julgar que conheço o que não conheço.”3 Daí a famosa expressão atribuída a Sócrates: “Tudo o que sei, é que nada sei”. 1 PLATÃO. Apologia de Sócrates. Diálogos socráticos III. Tradução Edson Bini. São Paulo; Bauru: Edipro, 2008. p. 139 [19b-c]. 2 Ibidem, p. 146 [24c]. 3 Ibidem, p. 142-143 [21d]. 20 Para explicitar a natureza política das acu- sações contra Sócrates, você pode chamar a atenção para o contexto político, cultural e so- cial em que ele está inserido e para o perfil das pessoas que se sentem ameaçadas pelo seu jeito de abordar temas e pessoas. Na sequência, você pode pedir que os alu- nos retomem a pesquisa realizada no início da Situação de Aprendizagem sobre o que as pessoas em geral pensam da Filosofia e con- frontem essas posições com as afirmações que seguem. Em seguida, você poderá solicitar aos alunos a produção de um texto sobre as dife- rentes perspectivas acerca da Filosofia. Esta proposta, assim como os textos a seguir sobre a importância da Filosofia para a formação dos educandos, estão no Caderno do Aluno. Acontece que Sócrates praticava esses diálogos em praça pública, à vista de todos. Entre os presentes havia sempre muitos jovens, filhos de famílias ricas, que dispunham de tempo livre e, por isso, podiam acompanhá-lo nessas ocasiões. Eles se divertiam vendo Sócrates “desbancar” os que se julgavam sábios e, mais tarde, punham-se a imitá-lo, interrogando outras pessoas e descobrindo muitas que supunham saber o que de fato não sabiam. Essas pessoas, que em geral eram gente importante e de prestígio na cidade, sentindo-se constrangidas, tornavam-se furiosas não contra esses jovens, mas contra aquele que consideravam responsável por tê-los ensinado tal comportamento; e passavam a propagar: “Sócrates é o mais pestilento dos indivíduos e está corrompendo a juventude”. Na verdade, quando indagadas, tais pessoas não conseguiam provar tal acusação. Mas, para esconder seu constrangimento,lançavam mão daquelas acusações que sempre são usadas contra todo “filósofo, ou seja, que [ensina] ‘as coisas no ar e as coisas sob a terra’ e ‘não crê nos deuses’, e ‘torna mais forte o argumento mais fraco’”4. Esta é a origem das “inimizades, a um tempo implacáveis e aflitivas”, do ódio, das “calúnias” e das acusações contra Sócrates5 e que acabaram por levá-lo à morte. No fundo, Sócrates foi condenado porque, na democracia ateniense, os assuntos mais importantes da vida da cidade eram decididos em assembleias (ekklesía) nas quais cada cidadão podia expressar livremente sua opinião a favor ou contra uma determinada posição. Era, pois, um regime político sus- tentado pela crença no valor das opiniões. Ora, o que Sócrates fazia com sua dialética era justamente pôr em xeque as opiniões, mostrando que, muitas vezes, elas refletiam um conhecimento falso sobre o assunto em questão. Assim, para as pessoas importantes da cidade que costumavam discursar nessas assembleias, a “má” influência de Sócrates, sobretudo sobre os jovens, representava uma ameaça ao sistema democrático do qual se beneficiavam. Eis aí a natureza política da condenação de Sócrates. 4 Ibidem, p. 145 [23d]. 5 Ibidem, p. 144 [23a]. Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola. “[...] qual a contribuição específica da Filosofia em relação ao exercício da cidadania para essa eta- pa da formação? A resposta a essa questão destaca o papel peculiar da Filosofia no desenvolvimento da competência geral da fala, leitura e escrita – competência aqui compreendida de um modo bastante especial e ligada à natureza argumentativa da Filosofia e à sua tradição histórica.” Orientações Curriculares para o Ensino Médio – Ciências Humanas e suas Tecnologias. Brasília: Secretaria de Educação Básica – SEB/Ministério da Educação – MEC, 2006. p. 26. Disponível em: <http:// portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/ book_ volume_03_internet.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2013. “No caso do aluno de Filosofia do Ensino Médio, o grau mínimo que assinala a construção das competências previstas [...] deve poder ser medido, em último caso, através da constituição dessa au- 21 Filosofia – 3a série – Volume 1 tonomia discursiva ou (o que vem a ser sinônimo) da construção de uma competência de participação democrática.” Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – PCNEM. Parte IV. Brasília: Ministério da Educação, 2000. p. 62. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/cienciah.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2013. “Que a Filosofia não seja, muitas vezes, afirmativa, pode ser muito útil, quando tudo o que se necessita, num momento de formação, é examinar criticamente as certezas e verdades, questionar os valores e deixar aberto o espaço para a invenção significativa da própria vida.” Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – PCNEM. Parte IV. Brasília: Ministério da Educação, 2000. p. 59. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/cienciah.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2013. O resultado da confrontação da pesquisa com as afirmações propostas pode apresentar diferentes aspectos. Contudo, na redação do texto os alunos devem demonstrar que enten- deram que, ao terem contato com a Filosofia, estão desenvolvendo habilidades de argumen- tação necessárias para a vida democrática. Você pode recolher esses textos, comentá- -los e devolvê-los na aula seguinte. Se desejar, esse pode ser também um instrumento de ava- liação. Avaliação da Situação de Aprendizagem A avaliação deve verificar se as com- petências e habilidades esperadas foram satisfatoriamente desenvolvidas. As ativi- dades sugeridas ao longo dessa Situação de Aprendizagem podem ser tomadas como instrumentos de avaliação. De todo modo, apresentamos a seguir algumas atividades de avaliação, lembrando, porém, que cabe a você, professor, que conhece de fato seus alunos, elaborar os instrumentos de avalia- ção mais adequados. Questões para avaliação 1. Comente a afirmação: “A Filosofia é uma ciência com a qual ou sem a qual o mundo fica tal e qual”. Espera-se que os alunos sejam capazes de criticar essa ideia, interpretando-a como expressão de preconceito, intolerân- cia e desconhecimento da natureza da Filosofia. 2. Com base no excerto a seguir, explique o significado político das acusações contra Sócrates. “Sócrates é réu porque corrompe a juven- tude e descrê dos deuses do Estado, crendo em outras divindades novas.” PLATÃO. Apologia de Sócrates. Diálogos socráticos III. Tradução Edson Bini. São Paulo; Bauru: Edipro, 2008. p. 146 [24c]. Espera-se que o aluno demonstre ter compreendido as ra- zões políticas das acusações contra Sócrates e de sua con- denação e que, de certo modo, essa situação pode se repetir com a Filosofia e os filósofos nos dias de hoje. Proposta de situação de recuperação Com base no estudo realizado, sugerimos que você solicite aos alunos que não conse- guiram demonstrar um bom entendimento do tema que retomem os textos disponíveis para esta Situação de Aprendizagem e esco- lham um deles para reescrevê-lo na forma de um diálogo fictício. Esse diálogo deve res- peitar o tema e o desenvolvimento do texto original. 22 O objetivo desta Situação de Aprendiza- gem é destacar e problematizar uma das for- mas mais comuns de preconceito contra a Filosofia, qual seja, aquela que a considera como uma atividade intelectual muito difícil e, por isso, acessível apenas a uma minoria de in- teligência privilegiada. Com base nas contri- buições de Antonio Gramsci, a ideia é mostrar que, em um certo sentido, todos somos “filó- sofos”, pois todos somos capazes de refletir, pensar, conhecer com algum grau de logicida- de e sistematização, ainda que não o façamos da mesma maneira que os filósofos profissio- nais. Na realidade, é interessante explicitar, como também faz Gramsci, a diferença entre o “filósofo” (entre aspas) que todos somos e o filósofo (sem aspas) especialista, mas não para dizer que este último é melhor ou superior ao primeiro, mas, ao contrário, para deixar claro que todos são potencialmente filósofos (sem aspas) e capazes de avançar na direção de um filosofar cada vez mais próximo daquele pra- ticado pelos filósofos especialistas. O desafio é despertar nos alunos a cons- ciência dessa sua potencialidade e da impor- tância de que seja desenvolvida, atualizada, mostrando-lhes que esse desenvolvimento é essencial para a sua formação como cidadãos críticos e conscientes de sua condição de sujei- tos da história e que o estudo da Filosofia na escola pode ajudá-los a atingir esse objetivo. Daí a importância de que sejam motivados a se dedicar a ele com afinco. A obra Cadernos do cárcere, de Antonio Gramsci, é a principal referência teórica desta Situação de Aprendizagem. Inicialmente, pro- curaremos demonstrar que a Filosofia, de certo modo, está presente em diversas instâncias do senso comum (na linguagem, no bom senso, na religião etc.), ainda que a maioria das pes- soas não se dê conta disso. Tal fato é importante para demonstrar que, na realidade, a Filosofia não está assim tão distante das pessoas como comumente se imagina. Uma vez constatado isso, será preciso esclarecer que, a despeito de certa familiaridade que, de algum modo, todos temos com a Filosofia, há uma clara distinção entre o “filósofo” que todos somos e o filóso- fo especialista ou profissional. Essa distinção, no entanto, não visa a estabelecer barreiras en- tre esses dois níveis do filosofar, mas, ao con- trário, apontar caminhos para que o “filosofar” espontâneo, comum a todos os homens, avance cada vez mais na direção de um filosofar mais parecido com o dos filósofos especialistas. E a escola pode contribuir para isso na medida em que possibilita o contato dos alunos com o pensamentodos filósofos. Retomaremos, nesta Situação de Aprendi- zagem, agora em bases um pouco diferentes, o conceito de Filosofia, já trabalhado na 1a série do Ensino Médio. A proposta é basear- -se na etimologia da palavra (filosofia como amor pelo saber) para apresentar o filósofo como aquele que se reconhece como ignorante (não sábio), mas que, ao mesmo tempo, an- seia pelo saber (sofia) e que, nesse sentido, se distingue do philodoxo (amante da opinião). Neste momento, serão utilizados alguns ex- certos da obra O banquete, de Platão. E pre- tendemos, ao final desta Situação de Aprendi- zagem, apresentar a atividade filosófica como “reflexão radical, rigorosa e de conjunto so- bre os problemas da realidade”, segundo a concepção de Dermeval Saviani, exposta no texto A Filosofia na formação do educador. Concluindo, retornaremos a Gramsci para re- forçar a importância política do contato com a Filosofia para a formação da cidadania. SITUAÇÃO DE APRENDIZAGEM 2 FILOSOFIA COMO ATIVIDADE REFLEXIVA E SUA IMPORTÂNCIA PARA O EXERCÍCIO DA CIDADANIA 23 Filosofia – 3a série – Volume 1 Aqui também a proposta é que os alunos reflitam criticamente sobre esses temas, indivi- dual e coletivamente, e se expressem oralmente e por escrito a respeito deles de forma rigorosa, apoiados na mediação do professor e na leitura dos textos contidos no Caderno do Aluno. Conteúdos e temas: a presença da Filosofia no cotidiano (linguagem, senso comum, bom senso, religião etc.); a distinção entre o “filósofo” que todos somos e o filósofo profissional ou especialista; a Filosofia como reflexão; a importância da Filosofia na formação da cidadania. Competências e habilidades: relacionar informações, representadas de diferentes formas, e conhecimen- tos disponíveis em diferentes situações, para construir argumentação consistente; identificar a presença da Filosofia no cotidiano; estabelecer a distinção entre o “filosofar” espontâneo e o filosofar propria- mente dito, típico dos filósofos especialistas; entender que a Filosofia está intrinsecamente associada a uma atividade reflexiva; ler, compreender e interpretar textos teóricos e filosóficos; expressar-se por escrito e oralmente de forma sistemática; elaborar hipóteses e questões com base nas leituras e nos de- bates realizados. Sugestão de estratégias: levantamento das noções contidas no senso comum e que têm origem em dou- trinas filosóficas por meio de dinâmicas de grupo e debates sobre expressões da linguagem comum, ditados populares e músicas; leitura sistemática e problematizadora de textos e elaboração escrita do próprio pensamento; pesquisa bibliográfica e na internet. Sugestão de recursos: textos para leitura conforme Caderno do Professor e Caderno do Aluno e, para fins de consulta, dicionários de filosofia e sites relacionados ao tema proposto. Sugestão de avaliação: sugere-se que os alunos sejam avaliados não apenas pelo desempenho em uma avaliação final, mas que o envolvimento dos alunos nas atividades propostas possa ter lugar na avaliação e na composição da nota final. Como instrumentos de avaliação, recomendam-se dissertações indivi- duais; provas dissertativas e reflexivas; outros trabalhos que o professor julgar adequados e pertinentes. Sondagem e sensibilização Propomos que, inicialmente, com os alunos distribuídos em grupos, você lhes apresente as seguintes expressões extraídas da linguagem comum, chamando sua atenção para os ter- mos destacados em negrito. “O essencial é invisível aos olhos.” “As aparências enganam.” “A justiça tarda, mas não falha.” “Todos somos iguais perante a lei.” “É preferível a democracia à ditadura.” “A liberdade exige responsabilidade.” “A felicidade não se compra.” “O amor é lindo.” 24 Você pode comentar com os alunos os conceitos filosóficos destacados e verificar se eles se recordam de ter entrado em contato, por meio de estudos, leituras ou outros meios, com algum deles. Em seguida a essa primeira abordagem, proponha aos alunos a ativida- de, conforme descrito no Caderno do Aluno. Dessa forma, sugerimos que solicite, antes da realização dos exercícios, que os alunos pes- quisem em dicionário de Filosofia os termos “senso comum” e “bom senso” e, em grupo, respondam às questões que seguem. a) O que os termos destacados significam para você? b) Você sabia que esses termos são, na verda- de, conceitos filosóficos que se tornaram senso comum? c) Cite mais algumas expressões do senso comum que você acredita que contenham conceitos filosóficos. A ideia é ajudá-los a perceber que a Filo- sofia está mais próxima de nós e presente em nosso dia a dia do que imaginamos. Essa per- cepção tem por objetivo mostrar que a ideia de que a Filosofia é algo muito difícil e dis- tante das pessoas comuns é falsa e reflete um preconceito que, em última instância, leva à exclusão dessas pessoas do contato com o pensamento filosófico. Após a atividade, oriente os alunos a ler o texto contido no Caderno do Aluno, na seção Leitura e análise de texto, e reproduzido a seguir. O objetivo é que compreendam, na perspectiva gramsciana, em que sentido se pode afirmar que todos os ho- mens são “filósofos”. Trata-se de mostrar que, de certo modo, a Filosofia está presente em nos- so cotidiano (na linguagem, no senso comum, no bom senso, na religião, enfim, em todo o nos- so sistema de crenças e opiniões), influenciando nosso modo de agir e pensar, mesmo que não tenhamos consciência disso. Com esse texto, você pode, também, explorar os conceitos de “senso comum” e “bom senso”, cuja compreen- são será importante para a percepção do papel da Filosofia como meio de superação do senso comum. Todos os homens são “filósofos” Antonio Gramsci, um filósofo italiano do século passado, já alertava para a necessidade de se com- bater o preconceito muito difundido de que a Filosofia é uma atividade intelectual muito difícil e, por isso, restrita a uma minoria de inteligência supostamente privilegiada. Isso porque, para ele, em um certo sentido, “todos os homens são ‘filósofos’”, pois, de algum modo, todas as pessoas, sem distinção, independentemente de seu grau de escolaridade, lidam, convivem, trabalham com a Filosofia e a utili- zam no seu dia a dia, mesmo que não se apercebam disso. Afinal, a Filosofia está presente “na lingua- gem, no senso comum, no bom senso, na religião”, enfim, “em todo sistema de crenças, superstições, opiniões, modos de ser e agir” que caracteriza o que convencionalmente se denomina de “folclore”1 e do qual todos participam2. A Filosofia está presente na linguagem porque esta não é pura e simplesmente um amontoado de “palavras gramaticalmente vazias de conteúdo”. Ao contrário, ela é um “conjunto de noções e con- ceitos determinados”3, muitos dos quais derivados da Filosofia, como vimos nas frases apresentadas. Portanto, a Filosofia está presente na linguagem que utilizamos, mesmo que não tenhamos consciência 1 Folclore: do inglês, folk = povo, nação + lore = conhecimento tradicional, instrução, educação. Portanto, o termo “folclore” pode ser traduzido genericamente como “conhecimento popular” ou “cultura popular” ou, ainda, como, “senso comum”. 2 GRAMSCI, A. Caderno 11 (1932-1933). Introdução ao estudo da Filosofia. In: Cadernos do cárcere. Vol. 1. Edição Carlos Nelson Coutinho com Marco Aurélio Nogueira e Luiz Sérgio Henriques. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. p. 93. 3 Ibidem. 25 Filosofia – 3a série – Volume 1 disso. Daí por que, para Gramsci: “Linguagem significa também cultura e Filosofia (ainda que no nível do senso comum)”4. O senso comum é o conjunto de valores, crenças, opiniões, preferências, que constitui a nossa vi- são de mundo e que orienta nossas ações e escolhas cotidianas. Em geral é assimilado acriticamente, sem qualquer questionamento. A exemplodo que acontece com a linguagem, muitos desses valores e crenças têm origem na Filosofia, mas nós os assimilamos espontaneamente, sem nos darmos conta de sua origem. Simplesmente pensamos e vivemos de uma determinada maneira, acreditamos em certo grupo de valores, defendemos alguma posição política, ideológica ou religiosa, e assim por diante, sem, no entanto, nos preocuparmos em fundamentar nossas opiniões. Ao contrário, contentamo-nos com argumentos superficiais, muitas vezes até inconsistentes ou contraditórios. O “bom senso”, por sua vez, “coincide com a Filosofia”5. Enquanto o senso comum é acrítico, espontâneo, irrefletido, o bom senso implica refletir, tomar consciência de que os acontecimentos pos- suem uma dimensão racional e que, portanto, devem ser compreendidos e enfrentados também de forma racional, a fim de se obter uma orientação consciente para a ação, evitando se deixar levar por “impulsos instintivos e violentos”6. Esse “bom senso” é o que Gramsci chamou de “núcleo sadio do senso comum”7. Ou seja, mesmo no nível do senso comum é possível refletir, pensar de maneira crítica sobre a realidade, tomar consciência dela e agir de modo coerente com essa consciência. E isso, de certo modo, já é “filosofar”, pelo menos um filosofar ao nível do senso comum. De fato, não é raro vermos pessoas simples, às vezes com pouca ou ne- nhuma escolaridade, que revelam um entendimento aguçado e bem elaborado da realidade em que vivem. Finalmente, a Filosofia está presente na religião porque também na experiência religiosa nos de- paramos com questões e conceitos (Deus, alma, morte etc.) que foram e continuam sendo objeto da reflexão e da elaboração dos filósofos. Portanto, se a Filosofia está contida na linguagem, no senso comum, no bom senso e na religião, podemos dizer então que ela está presente em todas as dimensões da vida humana, sendo, portanto, fa- miliar a todas as pessoas. Afinal, toda atividade humana, mesmo aquelas que são predominantemente práticas (as diversas formas de trabalho manual, por exemplo), é sempre acompanhada de um pensar, de um saber, em suma, de um trabalho intelectual, racional, reflexivo. É nesse sentido que podemos afirmar que “todos os homens são ‘filósofos’”. Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola. 4 Ibidem, p. 398. 5 Ibidem, p. 96. 6 Ibidem, p. 98. 7 Ibidem, p. 98. Após a leitura do texto, sugerimos uma ati- vidade, que consta na seção Leitura e análise de texto do Caderno do Aluno, e que tem por objetivo fazê-los refletir sobre algumas sen- tenças: o quanto elas podem ser manifestação de um senso comum destituído de reflexão ou a expressão de sabedoria popular que mere- cem ser pensadas. Para encaminhar essa ativi- dade, você pode dividir a sala em grupos para que discutam o que entendem acerca de cada ditado: f Se conselho fosse bom não se dava de graça. f É só dormir que a dor passa. f Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. f Quem brinca com fogo acaba se queimando. f Quem espera sempre alcança. 26 f Pense duas vezes antes de agir. f Devagar se vai ao longe. f Quem semeia vento colhe tempestade. Para continuar a atividade, apresente-lhes a música Bom conselho, de Chico Buarque, e peça que comparem os ditados em sua formu- lação original com a versão escrita por Chico Buarque na canção. Para tanto, devem usar como roteiro as questões propostas no Cader- no do Aluno: a) O que a inversão efetuada por Chico Buar- que provoca nos ditados? b) O que foi preciso ao compositor para che- gar ao resultado por ele obtido? Essa atividade tem o intuito de fazer os alu- nos refletirem sobre os ditados populares pro- postos e a versão elaborada por Chico Buar- que e possam constatar em ambas as versões possibilidades de análise e problematização considerando as suas experiências de vida. A seguir, apresentamos a letra da música de Chico Buarque. Seria interessante tocá-la para os alunos. Bom conselho Ouça um bom conselho Eu lhe dou de graça Inútil dormir que a dor não passa Espere sentado Ou você se cansa Está provado Quem espera nunca alcança Venha meu amigo Deixe esse regaço Brinque com meu fogo Venha se queimar Faça como eu digo Faça como eu faço Aja duas vezes Antes de pensar Corro atrás do tempo Vim de não sei onde Devagar é que não se vai longe Eu semeio vento Na minha cidade Vou pra rua e bebo a tempestade. HOLANDA, Chico Buarque de. 1972 © Marola Edições Musicais Ltda. A título de complementação e aprofunda- mento do estudo, você pode solicitar que, em casa, os alunos releiam o texto “Todos os ho- mens são filósofos” e respondam a uma ficha de leitura que poderá ser proposta por você. Trata-se, em suma, de um modelo simplifica- do de fichamento, cujo objetivo é familiarizar o aluno com esta técnica de estudo, de modo que ela lhe seja útil no estudo de textos filosó- ficos e também no de outras disciplinas. Suge- rimos as seguintes questões: f Qual é a tese (ideia central) do autor? f Que argumentos ele utiliza para sustentar sua tese? f A que conclusão ele chega? f Você concorda com a tese do autor? Justi- fique. Com essa atividade, espera-se que os alunos aprendam a identificar a ideia central de um texto (tese) e os argumentos que a sustentam e a se posicionarem crítica e consistente- mente em relação ao autor. Trata-se, portanto, de exercitá- -los na leitura e interpretação de textos teóricos, competên- cia necessária à prática do filosofar. Propomos, como atividade com- plementar, uma pesquisa a ser fei- ta em casa, sugerida na seção Pes- quisa individual do Caderno do Aluno. Os alunos deverão buscar em livros ou sites o poema “O operário em construção”, de Vini- cius de Moraes, e, valendo-se dos conceitos “senso comum” e “bom senso”, analisar a tra- jetória percorrida pela consciência do operá- rio. Para essa tarefa, você pode dar a eles um 27 Filosofia – 3a série – Volume 1 tempo maior, por exemplo, de uma ou duas semanas. Esta última atividade poderá tam- bém ser usada como instrumento de avalia- ção, caso você julgue pertinente. A seguir, examinaremos a distinção entre o “filósofo” que todos somos (um filosofar espontâneo, do bom senso) e o filósofo es- pecialista, profissional. Para introduzir este tema, você pode pedir aos alunos que pen- sem por uns instantes sobre a seguinte ques- tão: “Todo brasileiro é um técnico de futebol, embora nem todos exerçam essa função profis- sionalmente”. Após a reflexão, peça a eles que comparem essa frase com a exclamação de Gramsci de que “Todos os homens são ‘filósofos’”. Você pode chamar a atenção dos alunos para o fato de a palavra “filósofos” aparecer entre aspas e indagar, conforme propõe a atividade do Ca- derno do Aluno, o que isso significa. O objetivo desta atividade é instigar os alunos para a leitura do texto a seguir, que pode ser acompanhado pelo Caderno do Aluno na seção Leitura e análise de texto, bem como as questões que dizem respeito a ele. Filósofos e “filósofos” Se “todos os homens são ‘filósofos’”, como quer Gramsci, qual é, então, a diferença entre o filoso- far de uma pessoa comum e o de um filósofo profissional ou especialista? O próprio autor esclarece: “O filósofo profissional ou técnico não só ‘pensa’ com maior rigor lógico, com maior coerência, com maior espírito de sistema do que os outros homens, mas conhece toda a história do pensamento, isto é, sabe as razões do desenvolvimento que o pensamento sofreu até ele e está em condições de reto- mar os problemas a partir do ponto em que eles se encontram após terem sofrido a mais alta tentativa de solução etc. Ele tem, no campo do pensamento, a mesma função que nos diversos campos científi- cos têm os especialistas”1. Trocando em miúdos, podemos dizer que o filósofo especialista: pensa, reflete, raciocina
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