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Histórico da Saúde do Trabalhador no Mundo e no Brasil Júnior Pereira 2018 E disse Deus a Adão: no suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra, pois dela foste formado; porqu tu és pó e ao pó tornarás. (Gênesis 3:19) A atividade laboral é um dos elementos que mais interferem nas condições e qualidade de vida do homem e, consequentemente, na sua saúde. Trabalhar é bom, uma bênção, não é um castigo. A ideia de castigo e sofrimento pelo trabalho talvez venha de uma que Adãointerpretação errônea do texto bíblico por conta de vivia no eterno ócio. quem acredita Outros sustentam que o erro teve origem com a palavra latina tripallium (trabalho), que significa torturar, ou simplesmente pelos significados constantes da palavra trabalho nos dicionários: esforço incomum, luta, labuta, lida, labor, tarefa árdua, demorada e penosa. A questão se complica pelo fato de a maioria das pessoas não ter o prazer ou a possibilidade de escolher exatamente o que gostaria de fazer, associando a satisfação à sua atividade laboral. Somado a tudo isso está a questão de que, normalmente, o trabalhador não tem domínio sobre as condições (local, salários, horário da jornada, turnos, folgas, férias etc.) e sobre os processos e resultados de sua atividade ocupacional(CARVALHO, 2011). O trabalho é uma necessidade natural e um direito do indivíduo garantido pela constituição, mas para trabalhar é preciso que o indivíduo esteja saudável e que mantenha a sua saúde. A saúde é um bem do trabalhador, uma condição essencial e fundamental para o convívio social, indissociável do trabalho. Assim, saúde, segurança e daqualidade de vida são requisitos à manutenção da produtividade e qualidade do produto. Não é admissível que o indivíduo adoeça meramente por trabalhar. Histórico no mundo Ainda que o trabalho tenha sido estabelecido com o surgimento da humanidade, a relação entre trabalho algumas dezenas de anos atrás. e doença foi praticamente ignorada até Só em 1700, na Itália, seria publicado, com importante repercussão mundial, o livro De morbis artificum diatriba (“As doenças dos trabalhadores”), do médico italiano Bernardino Ramazzini, considerado o criador da medicina do trabalho. Na sua obra, Ramazzini descreve diversas doenças diretamente relacionadas com cinquenta profissões diferentes. Mas foi a partir da Revolução Industrial, marco inicial da moderna industrialização, ocorrida entre 1760 e 1830, inicialmente na Inglaterra e estendendo-se mais tarde para Alemanha, França e demais países europeus, que começaram os problemas de saúde dos trabalhadores. A industrialização, com a introdução de máquinas no trabalho, transformou profundamente a sociedade na segunda metade do século 18. A improvisação dos locais das fábricas nas grandes cidades e a mão de obra constituída principalmente por mulheres e crianças, sem qualquer restrição quanto ao estado de saúde, vindas de famílias numerosas e de baixo nível socioeconômico, resultaram em sérios problemas ocupacionais. Os acidentes de trabalho eram numerosos, provocados por máquinas sem qualquer tipo de proteção, movidas por correias expostas, e cujo funcionamento era desconhecido por parte dos funcionários. O desconhecimento da toxicidade das substâncias manipuladas e a ausência de outras medidas de segurança causavam mortes frequentes, principalmente de crianças. Não existia um limite na jornada de trabalho. Os trabalhadores iniciavam suas atividades de madrugada, terminando-as somente no início da noite, e em alguns casos continuavam durante a noite, em ambientes mal iluminados por bicos de gás. Os locais de trabalho eram pouco ventilados, e o ruído das máquinas, altíssimo, dificultando a comunicação e contribuindo para o aumento do número de acidentes. As doenças ocupacionais aumentavam à medida que novas atividades industriais tinham início. Do mesmo modo crescia a quantidade de doenças não profissionais, principalmente as infectocontagiosas, como o tifo europeu (causada pela bactéria Salmonella typhi em alimentos ou água contaminada), conhecido como “febre das fábricas” e facilmente disseminado pelas péssimas condições dos locais de trabalho, pela grande concentração de gente e pela promiscuidade dos trabalhadores. doença infectocontagiosa Tal situação mobilizou a opinião pública, levando o parlamento britânico a criar uma comissão de inquérito. Em 1802, o parlamento conseguiu aprovar a primeira lei de proteção aos trabalhadores: “Lei de Saúde e Moral dos Aprendizes” Estabelecia uma jornada de 12 h de trabalho diárias, proibia o trabalho noturno, exigia a ventilação nas fábricas e obrigava os empregados a lavar suas paredes duas vezes por ano. Com a evolução do processo industrial, as condições de trabalho pioraram. Por isso, em 1830, o governo britânico nomeou o doutor Robert Baker como inspetor médico de fábricas, e assim surgiu o primeiro serviço médico industrial do mundo. Em 1833, com as péssimas condições de trabalho, o Parlamento Britânico promulgou o “Factory Act”, considerada a primeira norma realmente eficiente no campo da proteção ao trabalhador, e que fixava em nove anos a idade mínima para o trabalho, proibia o trabalho noturno para menores de 18 anos e exigia exames médicos de todas as crianças trabalhadoras. A partir de 1833, as condições de trabalho nas fábricas começariam a melhorar, apesar da resistência dos empresários. Histórico no Brasil Em 1919, surgiu no Brasil a primeira lei que tratava de acidentes do trabalho nopelo Decreto 3.724. Quatro anos mais tarde, em 1923, a Lei Eloi Chaves criou uma Caixa de Aposentadoria (CAP) para empresas ferroviárias. noEm 1933, pelo Decreto dos marítimos. 22.872, criou-se o Instituto de Aposentadoria (IAP) Nos anos subsequentes, seguindo o mesmo modelo, foram criados IAP para categorias profissionais, como comerciários, bancários, industriários, servidores do Estado, empregados em transportes e cargas, entre outros. No entanto, as preocupações com os problemas ocupacionais surgiriam apenas em 1940, quando foi fundada a Associação de Prevenção de Acidentes do Trabalho. Em 1943, entrou em vigor a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que representa um marco da proteção legal dos trabalhadores. Na década de 1950, iniciaram-se as contribuições aos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP), para os quais foi criado um regulamento único. Na década de 1960, foram criados o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), atualmente aquele quechamado de Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pelo qual sofre o acidente de trabalho é assegurado. Portanto, a previdência social surge da necessidade de se garantir a sobrevivência do trabalhador e seus dependentes quando da perda ou redução de sua capacidade de trabalho. Essa preocupação se voltava para os trabalhadores mais vulneráveis, das atividades de maiores riscos e desgastes; contudo, ao longo do tempo, todos passaram a se beneficiar do sistema de previdência, independentemente da natureza de sua atividade noEm 1963, o Estatuto do Trabalhador Rural (Lei 4.214) criou o Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural (Funrural), e em 1971, passou a oferecer igualdade de benefícios a esses trabalhadores. Em 1966 surgiu a Fundação Jorge Duprat Figueiredo de do Trabalho (Fundacentro) e a Associação Nacional de (1968) em São Paulo. Segurança e Medicina Medicina do Trabalho nosEm 1972, pelas Portarias 3.236 e 3.237 do Ministério do Trabalho, tornava- se obrigatória nas empresas com mais de 100 empregados a existência de um serviço de saúde composto pelosseguintes profissionais: Médico do trabalho; Engenheiro de segurança; Técnico em segurança; Auxiliar de enfermagem do trabalho. Em 1976, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) lançou um programa de melhoria das condições de trabalho e recomendando que o trabalho deve: do meio ambiente do trabalho, Respeitar a vida e a saúde do trabalhador; Possibilitar necessidades de Possibilitar que o trabalhador disponha de tempo suficiente para suas repouso e lazer; ao trabalhador servir à sociedade e se autorrealizar, desenvolvendo aptidões pessoais. Em 1977, houve reformulação da Previdência Social e foram criadas duas autarquias, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) e o Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (IAPAS), que junto com o INPS e outras entidades constituíram o Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (SINPAS). O INAMPS prestava assistência médica aos trabalhadores regidos pela CLT em instituições próprias ou conveniadas. Após a Constituição Federal de 1988, a assistência à saúde tornou -se uma responsabilidade do Ministério da Saúde (MS) com o SUS. Em 1993, extinguiu-se o INAMPS, deixando as funções da previdência social – aposentadorias, pensões e seguros referentes aos acidentes de trabalho – como competência do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Obrigações das empresas com relação ao trabalho noEm 8 de junho de 1978, o Ministério do Trabalho aprovou a Portaria 3.214, que criou 28 normas regulamentadoras (NR) que orientam as obrigações das empresas com relação ao trabalho. Elas são modificadas periodicamente, acompanhando novos conhecimentos técnicos, e regulamentadas por meio de uma nova portaria desse ministério. Atualmente, são 36 NRs. noA partir de 1987, pela Portaria 34, tornou-se obrigatório no Brasil, para todas as empresas com empregados regidos pela Consolidação Trabalho (CLT), ter um Serviço Especializado em Engenharia de em Medicina do Trabalho (SESMT), obedecendo à graduação das Leis do Segurança e de risco da atividade desenvolvida e ao número de pessoal do estabelecimento, conforme a NR 4. Porém, somente alguns anos mais tarde, com maior fiscalização e aplicação de multas, as empresas brasileiras começaram a obedecer à legislação. E qual seria a situação atual com relação ao cumprimento da legislação ocupacional pelas empresas brasileiras? Apesar das melhorias, temos muito o que progredir, conforme relatam Haag et al. (2009): Algumas empresas contratam um técnico somente para cumprir a lei, dificultando o acesso a informações, tais como fatores nocivos, matérias-primas envolvidas na produção, entre outras. Tais empregadores estão muitas vezes distantes dos problemas de profissionalização deficiente, alimentação, habitação, ausência de escola para os filhos e falta de humanização nas empresas. No campo da reabilitação profissional, segundo as mesmas autoras, a situação é ainda pior: São muitas as empresas que demitem os empregados em vez de reabilitá-los, e os serviços de saúde nem sempre se ocupam dos aspectos laborais, desenvolvendo dentro das empresas o mesmo modelo clínico- assistencial do restante do sistema de saúde. Por outro lado, algumas empresas que atendem aos preceitos legais são socialmente responsáveis e têm buscado promover a saúde e o bem-estar de seus funcionários, com o objetivo de garantir a qualidade de seus produtos e serviços. Danos à saúde dos trabalhadores na atualidade Atualmente os principais agravos à saúde dos trabalhadores estão ligados a substâncias químicas que se multiplicam no processo industrial, agentes físicos e biológicos, mecânicos, acidentais e ergonômicos. Principais agravos à saúde dos trabalhadores Asma ocupacional; Dermatoses ocupacionais; Perda auditiva induzida por ruído (PAIR); Pneumoconioses (acúmulo de poeira nos pulmões e reação tecidual); Intoxicações por metais pesados; Lesões por esforços repetitivos (LER) ou distúrbios osteomusculares relacionados com o trabalho (DORT); Distúrbios psicológicos. Referência CARVALHO, Geraldo de. Enfermagem do Trabalho, 2ª edição. Guanabara Koogan, 01/2014.
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