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A Cultura Jurídica Europeia OPERADOR: . PROVAS as PASTA NOME DO FICHEIRO Im p .P N 2 .1 re v. 0 0 PROVAS RECEBIDAS ENVIAR NOVAS PROVAS? PRONTA PARA IMPRESSÃO? Ficha: 3 13 04 2012 João Jegundo MRDR#JUD¿FDGHFRLPEUD�SW 7UDEDOKR�$OPHGLQD 2�&DQRQH�9HUQDFXORV 1692 O DIREITO MODERNO 457 teleológica estava a abandonar o formalismo, a incorporar a realidade da vida no seu campo de estudo. A importância de Jhering foi muito grande864, nomeadamente no plano dogmático, ao introduzir a noção de interpretação teleológica865, ou seja, de uma interpretação (das normas e dos negócios jurídicos) de acordo com as finalidades que a norma visava prosseguir no sentido de uma ponderação adequada dos interesses em presença. No entanto, contrariamente ao que se poderia inferir desta ideia de uma organização espontânea e objetiva das finalidades sociais, Jhering nunca negou ao Estado o papel de árbitro dos conflitos de interesses; e, por isso, o monopólio da edição do direito. Isto explica-se, porventura, tanto pelo impacto do imaginário do Estado numa Alemanha que acabava de se unificar, como pelo papel que tanto o pensamento organicista como o pensamento hegeliano tinham atribuído ao Estado. O primeiro encarando-o como corporização da sociedade e garante da sua solidariedade (cf., infra, 7.5.4), o segundo vendo no Estado a síntese que racionalizava as contradições sociais. Daí que o principal legado dogmático desta escola se situe, como se disse, no plano da teoria da interpretação (da lei do Estado), não no da teoria das fontes do direito. Mais tarde – sobretudo após a sua reelaboração por Phillip Heck (1858- -1943)866 –, esta linha metodológica vem a desembocar em duas correntes de ambição diferente. Por um lado, numa corrente que se propõe desamar- rar o direito do Estado da exegese legislativa, procurando-o diretamente na própria vida – a Escola do Direito Livre (Freie Rechtschule). Por outro, numa corrente cujas propostas se situam apenas no domínio da teoria da interpretação – a “jurisprudência dos interesses” (Interessenjurisprudenz) que desenvolverá a crítica de Jhering à “jurisprudência dos conceitos” (Begri;sjurisprudenz), típica do formalismo da pandectística. 7.5.2. A Escola do Direito Livre A Escola do Direito Livre constitui um movimento de contestação mais radical do formalismo, em nome da atribuição ao juiz de uma maior capa- cidade de conformação do direito, com base na sua leitura da justiça 864 Sobre Jhering, v., por todos, Wieacker, 1993, 514-518; Kaufmann, 1994, 144. 865 De telos (em grego, finalidade). 866 Gesetzauslegung und Interessenjurisprudenz [Interpretação da lei e jurisprudência dos in- teresses], 1914; Begri;sjurisprudenz und Interessenjurisprudenz [Jurisprudência dos conceitos e jurisprudência dos interesses], 1932; sobre ele, Kaufmann, 1994, 145 ss. 458 A CULTURA JURÍDICA EUROPEIA concreta do caso. Na sua origem está a constatação, feita por um jurista prático – Ernst Fuchs, 1859-1929, Die gemeinschädlichkeit der konstruktiven Jurisprudenz (O caráter socialmente danoso da jurisprudência constru- tiva), 1907 –, de que o juiz, no processo de achamento da solução jurídica, partia sempre do seu sentido de justiça (Rechtsgefühl) e não dos dados da lei e de considerações de lógica formal. O contributo de um historiador – Hermann Kantorowicz (1877-1940, Rechtswissenschaft und Soziologie, 1910) – e de um sociólogo do direito – Eugen Ehrlich (1862-1922, Grundlegung der Soziologie des Rechtes, 1912) – contribuíram para dar uma maior consis- tência teórica às propostas de problematização ou abandono do modelo formalista legalista e conceitualista do direito, a caminho de uma funda- mentação “livre”, fundada na sensibilidade jurídica comunitária, auscul- tada, caso a caso, pelo juiz. Esta ideia de que os juristas decidem com base na sua sensibilidade, só depois encontrando argumentos racionais ou fundamentos legais corres- ponde ao senso comum dos juristas, ainda hoje. Mas, no contexto histórico a que nos referimos, esta insistência no caráter “pessoal” e “não racional” da decisão não pode ser desligado, por um lado, da crise do conceitua- lismo da pandectística, mas, também, num âmbito mais geral, de corren- tes filosóficas de crítica ao racionalismo, que afirmavam ou o primado da sensibilidade (intuição), da vontade ou da ação (élan vital) como forma de realização do homem, ou o caráter político (i.e., radicado na vontade de poder) de todos os valores867. O extremismo das posições metodológicas da Escola do Direito Livre foi matizado pela limitação desta liberdade de criação do direito aos casos em que existissem lacunas da lei. Em todo o caso, os seguidores deste movi- mento insistiam em que existia uma lacuna sempre que a interpretação da lei não fosse clara e inequívoca, pelo que, na prática, haveria “tantas lacunas quantas as palavras da lei” (H. Kantorowicz). Por isso, este movi- mento – além de ter sido tido como bastante estranho, nos seus interesses e métodos, ao mundo dos juristas – foi sempre considerado como subver- sivo para a certeza e segurança do direito868. 867 É clara a consonância de alguns destes pontos de vista com a filosofia, crítica do racionalismo e exaltadora da ação, de Friedrich Nietzsche (1844-1900) ou de Henri Bergson (1859-1941). Sobre Nietzsche e o direito, Kaufmann, 1994, 86; Valadier, 1998; Litowitz, 1995, 56-57. 868 Sobre a Escola de Direito Livre, por todos, Wieacker, 1993, 670 ss., e Kaufmann, 1994, 146 ss. O DIREITO MODERNO 459 Não pode, contudo, deixar de se sublinhar a ênfase que este movimento deu à natureza política da decisão do juiz (do jurista), insistindo na res- ponsabilização pessoal que lhe está inerente e, com isto, no compromisso ético e social do juiz quando decide, compromisso que tinha sido escamo- teado pelo positivismo, ao apresentar o juiz como um autómato executor da lei ou dos princípios científicos do direito. O jurista – dizem – decide livremente e, nessa decisão, ao mesmo tempo que afirma convicções, com- promete o seu destino pessoal869. 7.5.3. A jurisprudência dos interesses A “jurisprudência dos interesses” (Ph. Heck, 1858-1943) tem, em certa medida, um alcance menos ambicioso do que a jurisprudência teleológica de Jhering (ou a “Escola Livre do Direito”). Enquanto estas davam alguma abertura em relação a formas antilegalista de “encontrar” o direito, a juris- prudência dos interesses aceita basicamente os pressupostos do positivismo legal e tenta apenas resolver um problema “limitado”, a que já o constru- tivismo pandectista tinha tentado responder – o problema das lacunas do ordenamento legal – que as grandes mudanças sociais e políticas dos finais do século XIX e inícios do século XX, incompletamente cobertas pela legislação, tinham tornado ainda mais evidente. Na verdade, a sua proposta de base é a de que, constituindo qualquer caso jurídico um conflito de interesses, a decisão a atingir se deve basear numa adequada ponderação desses interesses e não na dedução formal a partir de conceitos. Os conceitos teriam uma função apenas heurística ou didática. Constituiriam fórmulas sintéticas com auxílio das quais pode- ria ser descrita a forma típica ou usual de obter a correta ponderação dos interesses num determinado tipo de casos. E, por isso, sugeririam provi- soriamente uma solução para o problema a resolver. Mas – ao contrário do que pretendia a jurisprudência dos conceitos – não teriam qualquer função decisiva ou final no achamento da solução jurídica. Daí que esta corrente critique o método dedutivo-conceitual como uma inversão (“método da inversão”, Umkehrunsmethode), pois coloca no ponto de partida da inven- ção jurídica o que devia estar no fim. Se critica o conceitualismo, a jurisprudênciados interesses mantêm- -se nos quadros do legalismo, pois a ponderação adequada dos interesses 869 Importante, neste sentido, Hermann Isay (1873-1938), Rechtsnorm und Entscheidung, 1923.
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