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Apostila de Ciência Política 2017 (1)

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CIÊNCIA POLÍTICA 
 
 
 
 
 
 
 
Prof. Pedro R. Campanini 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
Capítulo Página 
I - Conceito de Política - Noção de TGE - Política e Direito Constitucional 02 
II – A origem do Estado 04 
III – Constituição e Poder Constituinte 11 
IV – Estado e Direito 15 
V – Estado: povo, território e soberania 20 
VI – Estado Moderno e democracia 28 
VII – A separação de poderes 38 
VIII - Formas e sistemas de governo 41 
Bibliografia 47 
 
 2 
CAPÍTULO I 
CONCEITO DE POLÍTICA - NOÇÃO DE TGE - POLÍTICA E DIREITO CONSTITUCIONAL 
 
I - POLÍTICA 
 
- Conceito: Ciência dos fenômenos referentes ao Estado (Dicionário Aurélio). 
- Na Antiguidade grega a palavra política significava a ciência de bem governar a 
cidade (polis). 
- A definição clássica de política encontra-se na obra de Aristóteles, “Política”. 
Refere-se à cidade e, consequentemente, a tudo que é urbano, civil, público e social. 
Em outras palavras, o conceito de política era habitualmente empregado para indicar 
a atividade ou conjunto de atividades inerentes a Polis. 
- Modernamente, para Max Weber, a política pode ser vista como a direção do 
agrupamento político denominado Estado, assim, a organização e funcionamento do 
Estado são regidos por decisões políticas. 
- Com a presente globalização, a política deixou de ser assunto estritamente estatal, 
passando a ser importante também para outras organizações, como por exemplo, a 
ONU, a OEA, que são grupos interestatais, bem como de grupos menores, como 
ONGs, associações, etc. 
- Para o jurista alemão Herman Heller, o conceito de política é muito mais amplo do 
que o do simplesmente estatal. Pode-se afirmar, portanto, que a política atualmente 
é, ou ao menos deveria ser, de interesse de todos os grupos sociais, pois cada 
cidadão é sujeito passivo das decisões políticas governamentais, e ainda, conta com 
inúmeras possibilidades de atuação e participação importante. 
- Cabe, nessa introdução, citar o texto de Bertold Brecht, “O analfabeto Político”: 
“O pior analfabeto é o analfabeto político, ele não ouve, não fala, 
nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo da vida, o 
preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem 
das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o 
peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política 
nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o 
político vigarista, 
pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.” 
 
II - CIÊNCIA POLÍTICA OU TEORIA GERAL DO ESTADO 
 
NOÇÃO: 
“É uma disciplina de síntese, que sistematiza conhecimentos jurídicos, 
filosóficos, sociológicos, políticos, históricos, antropológicos, econômicos, 
psicológicos, valendo-se de tais conhecimentos para buscar o 
aperfeiçoamento do Estado, concebendo-o, ao mesmo tempo como um fato 
social e uma ordem, que procura atingir os seus fins com eficácia e justiça”.1 
 
OBJETO: 
“Estudo do Estado em geral, do Estado como fato social, que se repete 
uniformemente, quanto à natureza intrínseca, no tempo e no espaço; é a 
ciência que investiga e expõe os princípios fundamentais da sociedade política 
denominada Estado, sua origem, estrutura, formas e finalidade.”2 
 
“Estudo do Estado sob todos os aspectos, incluindo a origem, a organização, o 
funcionamento e as finalidades, compreendendo-se no seu âmbito tudo o que 
se considere existindo no Estado e influindo sobre ele.”3 
 
 
III - DIFERENCIAÇÃO ENTRE TGE E DIREITO CONSTITUCIONAL 
 
Ciência Política ou TGE Direito Constitucional 
 
1
 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1979, p. 02. 
2
 AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 23. ed. Rio de Janeiro: 1984, p. 10. 
3
 DALLARI, op. cit., p. 04. 
 3 
Estuda o Estado em Geral, seus 
elementos permanentes, sua origem e 
finalidade. 
Estuda a organização de um Estado 
determinado. Ex: Dir. Constitucional 
Brasileiro. 
Descreve a estrutura e funcionamento 
dos órgãos do Estado. 
Descreve a analisa a constituição política 
de um Estado. 
Analisa a formação política dos Estados, 
observando os fatos históricos, sociais e 
políticos. 
Analisa a estrutura, organização das 
instituições e órgãos de um Estado. 
Estuda as formas, tipos e características 
gerais dos Estados. 
Analisa o modo de aquisição e limitação 
dos poderes estatais. 
A TGE, por ser geral, é anterior ao Direito 
Constitucional, que acaba por se 
fundamentar na TGE. 
Analisa a previsão de direitos e garantias 
fundamentais expressos em um texto 
constitucional. 
 
 4 
CAPÍTULO II 
A ORIGEM DO ESTADO 
 
 
I - A ORIGEM DA SOCIEDADE 
 
– Teorias sobre a origem da sociedade: 
1. Sociedade natural 
2. Ato de escolha => contratualismo 
 
1. Sociedade natural 
 O primeiro a afirmar que a sociedade surge da própria natureza humana foi 
Aristóteles, ao dizer que o homem é um animal político, ou seja, precisa viver 
em sociedade para desenvolver sua plenitude. Por outro lado, aqueles que 
vivem à margem da sociedade são os de natureza vil. 
 Posteriormente, no século I a.C., Cícero afirma que o homem para bem viver 
procura o apoio comum, pois isto é da sua natureza. 
 São Tomás de Aquino compactua da mesma ideia, afirmando ser o homem um 
animal naturalmente político, que só vive à margem da sociedade quando 
extremamente superior aos demais homens, quando tiver anomalia mental, 
ou quando houver um acidente que o distancie (exemplo: náufrago). 
 Na atualidade, Ranelleti afirma que o homem, em qualquer época ou estado 
de civilização, sempre é encontrado vivendo socialmente, portanto, é da sua 
natureza o agrupamento. A associação de humanos é condição essencial da 
vida do homem, pois somente assim pode suprir suas necessidades, preservar 
melhor a si mesmo e conseguir atingir os fins de sua existência. 
 O que diferencia as associações humanas das dos demais animais? Para 
Aristóteles, somente o homem sabe discernir o certo do errado, tem conceitos 
de justiça e portanto somente o homem é capaz de criar o Estado. Os demais 
animais reúnem-se por instinto, o homem porque é de sua natureza 
(necessidade) e vontade (raciocínio). 
 
- Política - O homem é um animal político4, Aristóteles: 
“É evidente que a cidade faz parte das coisas naturais, e que o homem é por 
natureza um animal político. E aquele que por natureza, e não simplesmente por 
acidente, se encontra fora da cidade ou é um ser degradado ou um ser acima dos 
homens, segundo Homero (Ilíada IX, 63) denuncia, tratando-se de alguém: sem 
linhagem, sem lei, sem lar. 
Aquele que é naturalmente um marginal ama a guerra, e pode ser comparado a uma 
peça fora do jogo. Daí a evidência de que o homem é um animal político mais ainda 
que as abelhas ou que qualquer outro animal gregário. Como dizemos 
frequentemente, a natureza não faz nada em vão; ora, o homem é o único entre os 
animais a ter linguagem [logos]. O simples som é uma indicação do prazer ou da 
dor, estando portanto presente em outros animais, pois a natureza destes consiste 
em sentir o prazer e a dor e em expressá-los. Mas a linguagem tem como objetivo a 
manifestação do vantajoso e do desvantajoso, e portanto do justo e do injusto. Trata-
se de uma característica do homem ser ele o único que tem o senso do bom e do 
mau, do justo e do injusto, bem como de outras noções deste tipo. E a associação 
dos que têm em comum essas noções que constitui a família e o estado.” 
- Para Aristóteles a cidade é o lugar natural para a realização plena do ser humano e 
de suas capacidades, porque é uma comunidade ordenada segundo a justiça e o bem 
comum. Assim, a sociedade teria surgido naturalmente,mas evoluído e se 
organizado racionalmente, eticamente. É natural ao homem viver em sociedade, pois 
ali seus membros encontram um bem comum. 
 
2. Contratutalismo 
- A sociedade surge de um contrato hipotético entre os homens. 
 
4
 In MARCONDES, Danilo. Textos Básicos de Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. 2. ed. Rio de 
Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2000, p. 55-56. 
 5 
- Muitos autores adotam o contratualismo. Vejamos duas correntes: 
1 - Thomas Hobbes (1588/1679), descrita em “O Leviatã”: 
 O homem vive inicialmente em estado de natureza: não há repressão às 
ações, todos são livres, inclusive para usar a força. No confronto de duas 
liberdades pode surgir o conflito. 
 Sem uma autoridade para reprimir o uso da força, todos estão ameaçados 
pela violência. Esse estado ameaça a existência humana, pois não há ordem. 
 Para Hobbes, os homens em estado de natureza são egoístas, luxuriosos e 
inclinados à agressão aos outros, para alcançar poder e protegerem-se dos 
demais. É a chamada guerra de todos contra todos: o homem é o lobo do 
homem. 
 Com a interferência da razão humana, celebra-se o contrato social em direção 
ao estado civil (autoridade governamental controlando o uso da força). A vida 
fica protegida pelo Estado que exerce o poder soberano. O Estado é uma 
necessidade para o homem. 
 Assim são formuladas duas leis fundamentais: a) cada homem deve esforçar-
se pela paz, se não for possível por bem que seja então pela guerra; b) a 
liberdade de todos os homens deve ser cerceada de forma homogênea, para 
que haja respeito idêntico entre todos. 
 O contrato então é a irrestrita transferência de direitos dos cidadãos que são 
conferidos ao Estado. Por uma vontade humana os homens restringem sua 
liberdade em benefício da paz. Os cidadãos submetem-se a um terceiro (o 
soberano) que está acima das partes para que então alcancem o estado civil. 
 Para Hobbes, os poderes conferidos ao governo devem ser absolutos, pois 
melhor um governo ruim do que o estado de natureza. Assim, obedecer às leis 
do governo deve ser considerado sempre correto por parte do cidadão. O 
soberano somente poderá ser desrespeitado caso não esteja oferecendo à 
sociedade paz e segurança. 
 Hobbes entende que as leis civis servem ao Estado. Por ser o soberano quem 
faz as leis, ele não precisa se submeter a elas, pois pode fazê-las e revogá-las 
conforme entender melhor. 
 Hobbes prefere ainda o Estado monárquico, pois assim não há desagregação 
no poder, com disputas entre diferentes dirigentes. 
 
2 – Jean-Jacques Rousseau (1712/1778), descrita na obra “O contrato social”: 
 O homem é bom por natureza. 
 No entanto, os obstáculos que se impõem à conservação do homem em 
estado natural são muito grandes para serem superados pelos homens 
individualmente. O maior problema surge quando o homem cria o conceito de 
propriedade (o maior dos males humanos) e começa a lutar por ela. 
 Assim sendo, o homem precisa de um aumento de força para sobreviver. Este 
aumento vem exatamente da união com outros seres humanos. 
 Contudo, a união com outros homens promove limitações no maior bem 
humano: a liberdade. É necessário assim que haja uma combinação correta 
entre força e liberdade, que são os instrumentos fundamentais da 
conservação humana. 
 O contrato social resolve tal questão: os homens alienam todos seus direitos 
em favor da comunidade, produzindo o Estado, que é o executor das vontades 
coletivas. O poder do Estado é a síntese das vontades dos associados, mas 
acima das vontades individuais, busca proteger o coletivo. Assim o poder 
soberano pertence aos associados e é exercido em seu benefício. 
 Diante disso tudo, a igualdade natural que antes era falha, pois os mais fortes 
dominavam os mais fracos, passa por uma correção: todos são iguais perante 
o Estado, criando-se dois princípios fundamentais: liberdade e igualdade. 
Estes princípios fundamentam a democracia. 
 As leis civis devem pautar-se nas leis naturais, respeitando, por exemplo, o 
direito à vida. Contudo, o Estado perdeu-se no seu caminho, preocupando-se 
com questões artificiais (como a propriedade). Assim, seria melhor ao homem 
voltar ao seu status quo ante (estado anterior de coisas), a volta ao estado de 
 6 
natureza, já que “se o homem nasceu livre, então por que se encontra, e se 
submete a encontrar-se sob ferros?”. 
 Todavia, se a volta à uma situação sem o Estado é inconcebível, deve então a 
lei pautar-se no direito natural (direitos humanos, por exemplo). 
 
 
Observação: Segundo José Cretella Júnior e José Cretella Neto (in 1.000 Perguntas e 
respostas sobre Teoria Geral do Estado. Rio de Janeiro: Forense, 2000), atualmente, 
predomina uma corrente de pensamento mista, que reúne elementos do naturalismo 
e também do contratualismo; ao mesmo tempo em que se entende existir uma 
necessidade natural do homem de associar-se, reconhece-se a importância de sua 
consciência e manifestação da vontade para moldar a forma de organização. O ser 
humano é considerado, portanto, como um homem social. 
 
 
II - ELEMENTOS CARACTERÍSTICOS DA SOCIEDADE 
 
 - Historicamente, todas as sociedades apresentam as seguintes características: 
1. Uma finalidade ou valor social; 
2. Manifestações de conjunto ordenadas; 
3. O poder social. 
 
 
1 - Uma finalidade ou valor social 
 
- A finalidade social precisa ser um objetivo estabelecido de forma livre e consciente. 
- Como são vários os cidadãos, a escolha da finalidade deve ser um bem comum 
aceito por todos. Tal bem comum foi bem definido pelo Papa João XXIII (apud Dallari, 
p. 24): “conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o 
desenvolvimento integral da personalidade humana”. 
- Contudo a finalidade social precisa estar adequada às leis naturais e à fatores 
históricos do povo que se organiza. 
 
Obs: o posicionamento finalista é contraditado pelo determinista. Por esta posição, o 
homem está submetido a uma série de leis naturais, sujeitas ao princípio da 
causalidade. Nesse sentido, ele se une em sociedade forçado por alguns fatores, tais 
como o econômico ou o geográfico, que também acabam por determinar a finalidade 
que a sociedade deve buscar (assim não há escolha humana para a finalidade 
social). 
 
 
2 - Manifestações de conjunto ordenadas 
 
- O simples agrupamento de pessoas, mesmo com uma finalidade estabelecida, não 
seria suficiente para a consecução desse fim. É preciso então que os membros da 
sociedade passem a se manifestar em conjunto e busquem o cumprimento da 
finalidade. 
- Com as reiteradas manifestações sociais num mesmo sentido, torna-se possível 
concluir o bem comum buscado. Contudo, isso não passará de costume ou uso social, 
que estará apenas disperso na moral da sociedade. 
- No entanto, como os desejos humanos são muito variados, pois cada um tem seus 
valores e ambições, para que o bem comum possa ser estabelecido, as 
manifestações devem ter uma ordem que a sustente. 
- Assim, além da ordem social (moral e objetivo social buscado) é necessária a 
presença da ordem jurídica (tipificações legais e sanções). 
 
 
3 – O poder social 
 
- O poder social é decorrência da sociedade, pois para que haja a consecução de 
suas finalidades é necessária uma ordem que necessita de sanção (o ser humano 
 7 
não é totalmente ético, então precisa ser limitado e obrigado a seguir a ordem 
social). 
- Esse poder é ainda bilateral: advém das relações entre Estado e povo. O Estado 
deve respeitar as aspirações do povo que, por sua vez, precisa respeitar as regras. 
Ambos podem exigir do outro direitos e deveres. 
- O poder somente será legítimo quando harmônico com a vontade do povo. 
- Os anarquistas entendem ser possível a ordem social sem que haja a figura do 
poder, principalmenteporque este somente serve às classes dominantes. 
 
 
III – A SOCIEDADE POLÍTICA 
 
- É uma sociedade de fins gerais: objetivo indefinido e genérico de criar condições 
necessárias para que os indivíduos e as sociedades que nela se integram (famílias e 
igrejas, por exemplo) consigam atingir seus fins particulares. 
- O Estado organiza-se então não como um fim em si mesmo, mas para propiciar aos 
seus cidadãos condições adequadas de vida e, na atual sociedade capitalista, o 
progresso econômico. 
- Fica clara essa questão no artigo 3º da CF/88: 
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: 
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; 
II - garantir o desenvolvimento nacional; 
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e 
regionais; 
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e 
quaisquer outras formas de discriminação. 
 
IV - O ESTADO 
 
1. Primeiras noções: 
 “Todas as sociedades políticas que, com autoridade superior, fixaram as 
regras de convivência de seus membros” (Dallari, p. 46). 
 “Sociedade política dotada de certas características bem definidas.” (Dallari, 
p. 45) 
 
2. Quando aparece o Estado: 
1ª Corrente: o Estado sempre existiu, porque o homem sempre esteve 
integrado numa organização social dotada de poder e autoridade para dirigir o 
comportamento do grupo. 
2ª Corrente: os Estados surgiram para atender às necessidades humanas, 
assim, não existiram sempre e foram surgindo em cada região em épocas diferentes, 
ou seja, dependendo das condições concretas de cada lugar. 
3ª Corrente: parte-se do pressuposto que o Estado só existe quando há 
características muito bem definidas. Para Karl Schmidt, o Estado não existiu sempre, 
é sim um conceito histórico, que surge quando nasce a ideia e a prática de soberania 
no século XVII. Segundo Balladore Pallieri, o Estado surge no ano de 1648, com a 
assinatura da Paz de Westfália, pela qual os reinos europeus determinaram os limites 
territoriais resultantes das guerras religiosas, e a soberania do poder interno de cada 
Estado. Esta terceira corrente observa o Estado como o conhecemos hoje (uma 
organização política, com poder e território próprios, dotada de soberania 
internacionalmente reconhecida). 
 
3. Causas do aparecimento dos Estados – Teorias: 
 
a) Origem familial ou patriarcal 
- Cada família primitiva se ampliou e deu origem a um Estado 
 
b) Origem em atos de força, violência ou de conquista 
- A superioridade de força de um grupo social permitiu-lhe submeter um grupo mais 
fraco, nascendo o Estado dessa conjunção de dominantes e dominados. O Estado 
surge para regular a exploração dos mais fortes sobre os mais fracos. 
 8 
 
c) Origem em causas econômicas ou patrimoniais 
- Motivo econômico: o Estado surge da necessidade de divisão do trabalho, para que 
a produção a todos beneficie. 
- Para Karl Marx e Friedrich Engels, conforme expuseram na obra “A origem da 
família, da propriedade privada e do Estado”, o Estado somente surge depois de 
alcançado certo grau de desenvolvimento. Para eles, o homem em princípio é 
comunista, ou seja, divide igualmente toda a produção, no entanto, para que as 
novas riquezas individuais fossem asseguradas, foi necessário o estabelecimento da 
propriedade privada. Surgem então as classes sociais, uma exploradora e outra 
explorada, uma detentora dos meios de produção, outra apenas da força de trabalho. 
O Estado então vem para organizar a exploração da burguesia sobre o proletariado. 
 
d) Origem no desenvolvimento interno da sociedade 
- O Estado é inerente às sociedades, assim, quando a sociedade alcança um nível 
complexo de evolução, o Estado surge como necessidade natural. 
 
e) Origem por formação derivada 
- Atualmente é o processo mais comum. 
- Processos: 
1) Fracionamento de Estados 
 Uma parte de um território de um Estado se desmembra, criando um novo 
ente. Assim, há uma diminuição no território original e o novo Estado passa a 
atuar com total independência. 
 Exemplo: antiga URSS. 
2) União de Estados 
 Dois ou mais Estados unem-se, adotando uma mesma constituição (poderes, 
leis, organização social e política única). 
 Exemplo: Alemanha Ocidental e Oriental que se uniram após a queda do Muro 
de Berlim em 09 de novembro de 1989. 
3) Formas atípicas 
 Formas não previsíveis, que podem originar novos Estados. 
 Exemplo: com o término da Segunda Grande Guerra, os países vencedores 
decidiram dividir a Alemanha em dois Estados, para assim diminuir o seu 
poder e evitar uma futura guerra. Dividiu-se o Estado então em Alemanha 
Ocidental e Alemanha Oriental. 
 Exemplo: o Vaticano, que mesmo estando dentro do território italiano, tornou-
se um Estado independente por questões religiosas. 
 
 
4. Evolução histórica do Estado 
 
a) Estado Antigo 
 Também conhecido como Estado Oriental ou Teocrático. 
 Questões de família, religião, organização econômica, moral e filosofia se 
confundiam na organização do Estado. 
 Natureza unitária: o Estado não comportava subdivisões, o poder único era do 
monarca. 
 Religiosidade: o elemento teocrático do Estado. O monarca tinha legitimidade 
divina para exercer o poder, bem como criava as normas como fruto da 
vontade divina. 
 
b) Estado Grego 
 Cada cidade (polis) tinha autonomia, independência e características próprias. 
 Por causa disto, e pela busca da autossuficiência, as polis formavam as 
cidades-Estados. 
 Mesmo com conquistas militares de uma polis sobre outra região, a 
característica de autossuficiência permanecia, ou seja, a nova região não era 
incorporada ao Estado dominador. 
 9 
 Na decisões políticas, a Grécia se destaca pela participação popular, havendo 
o surgimento da democracia. 
 
c) Estado Romano 
 Em princípio Roma teve características básicas de cidade-Estado. No entanto, 
com a expansão das conquistas territoriais, superou-se a cidade-Estado e 
tornou-se um império, com poder centralizado na Cidade de Roma, e com 
unidades de poder espalhadas pelos territórios conquistados. 
 Roma surgiu da união de famílias, portanto as famílias mais importantes 
dispunham de privilégios diversos. 
 
d) Estado Medieval 
- O cristianismo 
 Pretende-se a afirmação da igualdade entre os cristãos. Contudo, os não 
cristãos são preteridos. 
 Ocorre a unificação da igreja católica. Com isso, surge a ideia de que todos 
devem ser cristãos e submetidos à mesma ordem política. Daí advém o Estado 
Universal, ou seja, o Império da Cristandade, capacitador de uma ordem 
estatal única. 
 Com este intuito a Igreja confere à Carlos Magno o título de imperador, no ano 
de 800. Entretanto, pelo fato da Igreja querer mandar demais e por causa da 
desobediência dos reinos espalhados pela Europa, o império nunca se 
constituiu com supremacia. 
 A briga entre o Papa e os Imperadores que se seguiram marcou os últimos 
séculos da Idade Média, terminando apenas com o surgimento do Estado 
Moderno, que confere supremacia de poderes ao monarca na ordem temporal 
(não religiosa). 
- As invasões bárbaras (século III ao VI) 
 Com as conquistas dos germanos, eslavos, godos, etc, no território europeu, 
novos costumes se difundiram, bem como houve estímulo para que tais 
regiões conquistassem autonomia, surgindo novos Estados. Isto abalou 
profundamente o Império. 
- O feudalismo 
 Com as constantes guerras e invasões, o comércio foi profundamente 
prejudicado. Assim, a terra passa a ser o principal meio de subsistência, de 
onde ricos e pobres tirarão a sobrevivência. 
 Surgem dois institutos que pulverizam ainda mais a concentração de poder, 
ou seja, os senhores feudais aumentam seu poder próprio: 
o A vassalagem: o proprietário menos poderoso de terras servia ao 
senhor feudal,dando-lhe ainda uma contribuição pecuniária em troca 
de proteção. 
o O benefício: um pai de família, sem terras, recebia uma faixa de solo 
para plantar, dividindo a produção com o senhor feudal. O senhor 
feudal tinha total poder sobre o servo e sua família, podendo 
determinar até mesmo a morte destes. 
 
e) O Estado Moderno 
 Com a pulverização do poder, determinada pelos caracteres do Estado 
Medieval, a busca pela unificação do controle político se intensificou. 
 Com a Paz de Westfália, surgem as principais características do Estado 
Moderno: 
1. soberania 
2. território 
3. povo 
4. finalidade 
 
f) O Estado Contemporâneo 
 Principalmente após o fim da II Guerra Mundial, a ordem política e econômica 
mundial passa por alterações profundas. 
 10 
 Atualmente o conceito de soberania sofre alterações, podendo ser 
compartilhada. 
 Com a criação das comunidades de Estados, a noção de povo tem 
acrescentada a ideia de cidadania da comunidade. 
 Surgem os blocos políticos, militares, comerciais e econômicos entre nações. 
 Surge a união entre países, com caráter econômico, social e político. 
 Há união entre Estados para preservação da paz e de interesses econômicos, 
através da criação de organizações (ONU, OTAN, G7, etc). 
 11 
CAPÍTULO III 
CONSTITUIÇÃO E PODER CONSTITUINTE 
 
 
I - DIREITO CONSTITUCIONAL 
 
- Conceito: “é um ramo do Direito Público, destacado por ser fundamental à 
organização e funcionamento do Estado, à articulação dos elementos primários do 
mesmo e ao estabelecimento das bases da estrutura política.” 
 
- Objeto: a constituição política do Estado, analisando sua estrutura, organização de 
suas instituições e órgãos, o modo de aquisição e limitação do poder e os direitos e 
garantias fundamentais. 
 
 
II - CONSTITUIÇÃO 
 
- Conceito: lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes 
à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e 
aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e 
deveres do cidadão. 
 
 
III - PODER CONSTITUINTE 
 
- Conceito: é a manifestação soberana da suprema vontade política de um povo, 
social e juridicamente organizado. 
 
- Distinção: é importante distinguir o poder constituinte dos poderes constituídos. Ele 
é o poder que elabora a Constituição, não devendo ser confundido com aqueles, que 
são o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Estes são instituídos, pela Constituição, 
obra do poder constituinte, que poderia optar por outros, como já ocorreu no Brasil-
Império, com a previsão de um quarto poder, o Moderador. O poder constituinte está 
acima dos poderes constituídos, não devendo ser confundido com nenhum deles. 
 
- Noções gerais: 
 A teoria do poder constituinte foi desenvolvida no século XVIII, período em que as 
ideias do racionalismo prevaleciam. Tais ideias eram decorrentes de uma 
profunda mudança de mentalidade dos séculos anteriores. O final da Idade Média 
e a passagem para a Idade Moderna é marcada pelo fim do teocentrismo, assim, 
todas as teorias políticas adotaram um posicionamento 
racionalista/antropocentrista. 
 Com o Iluminismo e o próprio constitucionalismo, surge a ideia de origem popular 
do poder. Nessa época o abade Emanuel Sieyès desenvolve a teoria do poder 
constituinte, publicada no livro “O que é o Terceiro Estado”, às vésperas da 
Revolução Francesa. O 3º Estado era o Povo (clero, nobreza e povo). Sieyès 
questionava o que era o povo e o que tem sido o povo. Ele sustentava que 
existiria um poder de origem popular, o poder constituinte, que teria a força de 
elaborar a Constituição, que teria então uma característica de superioridade. 
Seria superior até mesmo sobre os poderes constituídos, que seriam fruto do 
poder constituinte. 
 A ideia de poder constituinte materializa-se com as primeiras constituições 
escritas (EUA em 1787 e França em 1791). Não se tratam das primeiras 
constituições, mas iniciam o constitucionalismo moderno. A Magna Carta na 
Inglaterra, que no ano de 1215 limita os poderes do rei João Sem Terra, também 
não é a primeira Constituição, mas nela encontramos, pela primeira vez, os 
elementos essenciais do constitucionalismo moderno: limitação do poder do 
Estado e declaração de direitos da pessoa. 
 
1 - Titularidade 
 12 
- O titular do poder constituinte é o povo, pois a existência do Estado decorre da 
soberania popular. 
- A vontade da constituinte é a vontade do povo, que é expressa por meio de seus 
representantes. 
- Distingue-se titularidade (povo) de exercício (representantes do povo). 
- Segundo o Prof. Dalmo Dallari, da própria noção de Constituição resulta que o 
titular do poder constituinte é sempre o povo. Porém, como aponta o Prof. Celso 
Bastos, titular também do poder constituinte pode ser uma minoria, quando o Estado 
terá então a forma de aristocracia ou oligarquia. Por essa razão, alguns autores 
fazem uma distinção entre titularidade e exercício do poder constituinte. Segundo 
essa concepção, o titular seria sempre o povo, mas o seu exercício poderia ser 
atribuído somente a uma parcela dele. 
Dentro de uma concepção democrática, o titular do poder constituinte deveria ser 
sempre o povo, que elaboraria uma nova Constituição por intermédio de 
representantes legitimamente eleitos. Infelizmente, dentro de uma visão mais 
realista, titulares são as forças que em um determinado momento histórico detêm os 
fatores reais de poder. 
 
2 – Espécies de poder constituinte 
 
2.1 – Poder constituinte originário ou de primeiro grau 
- Estabelece a constituição de um novo Estado, organizando-o e criando os poderes 
destinados a reger os interesses de uma comunidade. 
- Há poder constituinte originário tanto na confecção da primeira constituição de um 
Estado, como naquelas que a substituem. 
- O poder constituinte é quem constitui os poderes que serão utilizados pelo Estado: 
executivo, legislativo e judiciário (se for adotada a divisão tripartida de poderes). 
Assim, o poder constituinte é a fonte da autoridade dos poderes constituídos. 
 
2.1.2 – Formas de expressão do poder constituinte originário 
- Pelo fato do poder originário ser ilimitado e incondicionado, não há forma prefixada 
para sua manifestação. 
- No entanto, historicamente, é possível visualizar duas formas mais comuns de 
expressão: 
a) Assembleia Nacional Constituinte 
 Nasce da deliberação ou convenção da representação popular 
(parlamentares). 
 Para tanto, há convocação dos parlamentares para estabelecer novo texto 
organizatório e limitativo do poder. 
 Exemplos no Brasil: Constituições de 1891 (proclamação da República), 1934, 
1946 e 1988. 
b) Movimento Revolucionário ou outorga 
 É o estabelecimento da Constituição por declaração unilateral do agente 
revolucionário, que autolimita seu poder. 
 Exemplos no Brasil: Constituições de 1824 (independência do Brasil), 1937 
(imposição do Estado Novo por Getúlio Vargas) e 1967 (fruto do golpe militar, 
que vinha sendo mantido pelo AI n. 1 de 1964). 
 
2.1.3 – Características do Poder originário 
- Inicial: porque a Constituição que será produzida é a nova base da ordem jurídica. 
Não há um direito ou fato anterior que o oriente. 
- Ilimitado e autônomo: pois não está de modo algum limitado a direito anterior, não 
tendo que respeitar ou seguir o direito positivo anterior. 
- Incondicionado: não está sujeito a qualquer forma prefixada para manifestar sua 
vontade; não precisa seguir procedimentos pré-determinados. Não há submissão a 
poderes anteriores. 
 
2.2 – Poder Constituinte Derivado 
- Conceito: o poder derivado está inserido na própria Constituição, decorrendo de 
uma regra jurídica constitucional. 
 13 
- Por causa disso, possui limitações constitucionais expressas e implícitas. Assim, é 
passível de controle de constitucionalidade.2.2.1 – Características do Poder Constituinte Derivado: 
- Derivado: retira sua legitimidade do Poder Constituinte originário. 
- Subordinado: se encontra limitado pelas normas expressas e implícitas do texto 
constitucional, às quais não poderá contrariar, sob pena de inconstitucionalidade. 
- Condicionado: seu exercício deve seguir as regras previamente estabelecidas no 
texto da Constituição que o autoriza. Está sujeito à regras formais/procedimentais. 
 
2.2.2 – Espécies de Poder Constituinte Derivado 
a) Poder Constituinte Reformador 
 Também conhecido como competência reformadora. 
 Consiste na possibilidade de alterar-se o texto constitucional, respeitando-se a 
regulamentação especial prevista na própria Carta. 
 Deve ser exercido pelos órgãos expressamente determinados. No Brasil, por 
exemplo, pelo Congresso Nacional (Câmara dos Deputados + Senado Federal) 
por meio da edição de emendas constitucionais. 
 
b) Poder Constituinte Decorrente 
 Consiste na possibilidade que os Estados-membros de uma federação, têm em 
virtude de sua autonomia político-administrativa, de se auto organizarem por 
meio de suas respectivas constituições estaduais. 
 A criação de constituições estaduais deve sempre respeitar as regras da 
Constituição Federal (CF). 
 
c) Poder Constituinte Revisor 
 Alguns autores, entre eles Pedro Lenza, mencionam a existência de um Poder 
Constituinte Derivado Revisor. Este poder teria sido previsto pelo art. 3º do 
ADCT, que dava ampla margem de alteração material, mas previa limitações 
formais (procedimento específico). 
 
d) Poder Constituinte Difuso 
 Tema recente na doutrina, que o define como o poder que os agentes políticos 
possuem para promover a chamada "mutação constitucional", ou seja, atribuir 
novas interpretações à Constituição para que ela consiga se adequar à 
realidade da sociedade sem que seja necessário alterar o texto formal da 
norma. A mutação constitucional não é irrestrita, devendo respeitar certos 
limites como os princípios estruturantes do Estado e a impossibilidade de se 
subverter a literalidade de norma que não dê margem a interpretações 
diversas. 
 Decorre principalmente das novas interpretações dadas pelas decisões 
emanadas pelo Poder Judiciário, em especial o STF. 
 Há autores que ainda consideram como mutação as interpretações firmadas 
por agentes políticos como os parlamentares, ou pelo Presidente na aplicação 
da norma. E ainda, os que consideram até mesmo os costumes do povo como 
mutação constitucional. 
 
3. Limites do Poder Constituinte 
- Sempre que for feita referência a limites do poder constituinte, ela o será ao poder 
constituinte derivado. O originário, como já vimos, é um poder absoluto, de fato, que 
não encontra qualquer limitação de ordem jurídica. Os limites do poder constituinte 
derivado são estabelecidos pelo poder constituinte originário. Podemos classificar 
esses limites dentro dos critérios a seguir expostos: 
 Limites explícitos: circunstanciais e materiais. 
 Limites Implícitos: temporais ou formais e procedimentais. 
 
3.1 - Limites circunstanciais 
- Certas Constituições não podem ser alteradas em determinadas situações de 
instabilidade política. Pretende-se que qualquer alteração do Texto Constitucional 
 14 
ocorra em plena normalidade democrática, sem qualquer restrição a direitos 
individuais ou à liberdade de informação, para que as consequências de eventuais 
modificações do Texto Fundamental sejam amplamente discutidas antes de qualquer 
deliberação. Exemplos: a) a Constituição brasileira de 1988 não admite emendas na 
vigência de intervenção federal, estado de defesa ou estado de sítio: b) a 
Constituição francesa não permite modificações com a presença de forças 
estrangeiras de ocupação em território francês. 
 
3.2 - Limites materiais 
- Determinadas matérias não podem ser objeto de modificação. São as denominadas 
cláusulas pétreas, o cerne fixo da Constituição, a parte imutável do Texto 
Constitucional. Exemplo: todas as Constituições brasileiras, desde 189l, passaram a 
proibir qualquer emenda visando a alteração tanto da forma republicana como da 
Federação. 
- A atual CF tem como cláusulas pétreas a forma federativa de Estado, o voto direto, 
secreto, universal e periódico, a separação dos Poderes e os direitos e garantias 
individuais (CF, art. 60, § 4º). 
- As limitações materiais além de explícitas, podem ser também implícitas. As 
primeiras são as que já vêm enunciadas na própria Constituição, as já mencionadas 
cláusulas pétreas. Implícitas são as que decorrem do sistema constitucional, como as 
que estabelecem o processo de alteração de normas constitucionais, as que fixam as 
competências das entidades federativas etc. 
- O Poder derivado decorrente, ao ser exercitado na confecção de uma constituição 
estadual, deve respeitar o texto da Constituição Federal, devendo ainda, em boa 
parte das regras a serem produzidas, respeitar o princípio da simetria. Luiz Alberto 
David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior lecionam: “O princípio da simetria, 
segundo consolidada formulação jurisprudencial, determina que os princípios magnos 
e os padrões estruturantes do Estado, segundo a disciplina da Constituição Federal, 
sejam tanto quanto possível objeto de reprodução nos textos das constituições 
estaduais". (Ex: se na CF há tripartição de poderes, deverá haver também na CE). 
 
3.3 - Limites temporais 
- Certas Constituições contêm normas que impossibilitam qualquer modificação 
durante certo período após a sua promulgação ou só admitem a aprovação de 
alterações de tempos em tempos, de forma espaçada. Exemplo: a Constituição 
brasileira do Império, que admitia qualquer alteração somente quatro anos após a 
sua promulgação. 
 
3.4 - Limites procedimentais 
- A própria Constituição estabelece o rito a ser seguido para sua alteração. Esse 
procedimento deve ser rigorosamente obedecido, sob pena de inconstitucionalidade 
formal da norma aprovada. 
 
 15 
CAPÍTULO IV 
ESTADO E DIREITO 
 
I – PERSONALIDADE JURÍDICA DO ESTADO 
 
- A origem da concepção de Estado como pessoa jurídica pode ser atribuída aos 
contratualistas, através da ideia de coletividade ou povo como unidade, dotada de 
interesses diversos dos de cada um de seus componentes, bem como de uma 
vontade própria, também diversa da vontade dos membros isoladamente 
considerados. 
- É certo que uma pessoa, física ou jurídica, deve ser dotada de vontade própria. No 
caso da pessoa jurídica, a sua vontade deve ser diferenciada da vontade de seus 
membros. Numa sociedade empresarial, por exemplo, deve prevalecer a vontade da 
maioria dos sócios ou acionistas, ou seja, da coletividade. 
- No entanto, no que tange aos Estados, a supremacia do interesse coletivo sobre os 
interesses particulares da nobreza e classes no poder, demorou a acontecer. Durante 
muitos séculos existiram governos autoritários e totalitários, que utilizavam o Estado 
para realizar interesses particulares. 
 
 
1. Teorias Ficcionistas da Personalidade do Estado 
 
- Para Savigny, fundador da escola histórica de Direito, no século XIX, o Estado já 
aparece como dotado de personalidade jurídica. Contudo, na sua teoria, a 
personalidade jurídica do Estado aparece apenas como ficção, ou em outras 
palavras: os sujeitos de direito são apenas os indivíduos (cidadãos) dotados de 
consciência e de vontade. Assim, por necessidade prática para o funcionamento do 
Estado, capacitando-o para ser sujeito de direitos e obrigações, cria-se 
artificialmente, por meio de uma lei, a personalidade jurídica para o Estado. 
- Por sua vez, Hans Kelsen, já no século XX, relata que o Estado é a personificação da 
ordem jurídica. Desse modo, para Kelsen também é o Estado uma ficção, pois, pela 
carência prática na criação de uma personalidade jurídica, faz-se com que o Estado 
seja representado pela figurade uma pessoa jurídica. Tudo isso, fruto de uma 
convenção justificável por motivos de conveniência e apoiado na legislação. 
 
 
2. Teorias Realistas da Personalidade do Estado 
 
- Para tais teóricos a personalidade do Estado não está desligada da realidade, pois o 
Estado torna-se uma pessoa de grande porte, precisando de tratamento próprio. 
- Para Gierke, o Estado tem vontade própria, sendo um organismo, que por meio de 
órgãos próprios atua sua vontade. 
- Laband acentua que o Estado é uma unidade organizada com vontade própria, 
sendo sujeito de direitos próprios. Assim, as relações jurídicas do Estado são 
diferentes das relações jurídicas individuais de seus cidadãos. 
- Por fim, Georg Jellinek explica que sujeito, em sentido jurídico, não é uma essência, 
uma substância, algo material, e sim uma capacidade criada mediante a vontade da 
ordem jurídica. Desse modo, a qualidade de sujeito pode ser conferida não apenas 
aos indivíduos, mas também ao Estado. Para Jellinek, o Estado é uma unidade 
coletiva, advinda da necessidade e da consciência de indivíduos, que formam as 
instituições. 
 
3. Necessidade de reconhecimento da personalidade jurídica do Estado: 
 
- Estabelecida a personalidade jurídica do Estado, resta claro que as pessoas físicas, 
quando representam o Estado, devem nortear sua atuação pela vontade do Estado e 
não pelos seus próprios interesses. 
- Somente pessoas são sujeitos de direitos e deveres. Nesse sentido, para que 
possamos cobrar do Estado atuação (saúde, moradia, segurança, etc), é necessário 
que ele seja sujeito de direitos e obrigações, tornando-se essencial o reconhecimento 
de sua personalidade jurídica. 
 16 
- Os limites da atuação do Estado somente podem ser cobrados se ele tiver 
personalidade própria, evitando-se, portanto, autoritarismos. 
- Somente possuindo personalidade jurídica própria é que o Estado pode realizar 
acordos e tratados internacionais, pois somente assim pode assumir obrigações. 
- Também é através de sua personalidade jurídica que o Estado pode exigir 
comportamentos do cidadão, através da edição de leis ou, em caso de 
comportamento ilegal, aplicando sanções. 
 
 
II – ESTADO, DIREITO E POLÍTICA 
 
 - O Estado se estabelece sobre bases jurídicas, no entanto, para que ele seja 
realizável é imprescindível observarmos que ele tem também conteúdo político. Sua 
atividade é dinâmica e está ligada a objetivos e justificativas, que acabam por 
estabelecer os meios para atingir-se suas finalidades. Para melhor gerir os interesses 
dos governados, o Estado precisa definir seus modos de atuação, esta definição 
então é política (sistema de regras respeitantes à direção dos negócios públicos – 
arte de bem governar o povo). 
- Assim, a ordem jurídica estabelece para o Estado as regras para sua atuação. Por 
sua vez, a ordem política auxilia na definição dos meios para realização da finalidade 
do Estado, ou seja, seus fins políticos. 
- A ordem política então depende do estabelecido na ordem jurídica, pois de outra 
forma será ilegítima e ilegal. Para definição da organização política mais eficaz na 
busca da realização dos interesses coletivos, deve a ordem política sempre respeitar 
o regramento jurídico. Apesar de tal preocupação, a ordem não deixa de ser 
substancialmente política. 
 
1. O Poder Político 
 
- A principal preocupação do poder político é com a eficácia. Quem detém o poder 
político, preocupa-se em conseguir aceitação de seus planos e métodos, ou seja, 
seus comandos devem ser respeitados, mesmo que algumas vezes seja necessário 
recorrer à violência para conseguir obediência. 
- Contudo, a eficácia deve ser buscada sempre no interesse do coletivo e com 
respeito à ordem jurídica. 
- Diante disso, temos duas noções importantes de política, uma neutra, outra 
positiva. 
1. Para Cassirer, política é a arte de unificar e organizar as ações humanas e 
dirigi-las para um fim comum. 
2. Para Max Weber, após conceituar o Estado como uma comunidade humana 
que, dentro dos limites de determinado território, reivindica o monopólio do 
uso legítimo da violência física, a noção de política aparece como: o conjunto 
de esforços feitos com vistas a participar do poder ou a influenciar a divisão 
do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado. 
- O caráter político do Estado lhe dá a função de coordenação dos grupos e dos 
indivíduos, em vista de fins a serem atingidos, por meio da imposição de meios 
adequados. Conseguir esse objetivo depende de três dualismos fundamentais: 
1. Necessidade e possibilidade 
a. É preciso, antes de qualquer coisa, analisar as necessidades do povo 
(sobrevivência e progresso); 
b. Antes da tomada de qualquer ação, faz-se necessária a análise dos 
meios disponíveis para consecução dos objetivos, ou seja, as 
possibilidades determinarão a organização e etapas a serem colocadas 
em prática para o atendimento das necessidades. 
2. Indivíduos e coletividade 
a. Necessidade de conciliar os interesses dos indivíduos e da coletividade. 
b. Proteger o indivíduo é importante, no entanto, é necessário ter em 
conta que ele não existe isoladamente, sendo a coletividade a soma de 
vários indivíduos. 
c. Devem então ser pesados os interesses coletivos e individuais, para 
que nenhum dos dois sofra males excessivos. 
 17 
3. Liberdade e autoridade 
a. Na escolha dos meios de atuação para satisfação das necessidades do 
povo, é preciso determinar limitações à liberdade individual, com o fim 
de aumentar-se a eficácia do projeto de governo. 
b. Para que a ordem seja respeitada, a coação faz-se necessária. Já 
afirmou Kelsen: não existe ordem jurídica sem coação. 
c. Acertar o limite, o equilíbrio entre liberdade e autoridade é um 
problema difícil. Liberdade individual ilimitada gera descontrole e 
desordem social, por outro lado, liberdade excessivamente controlada 
gera desconforto dos indivíduos e autoritarismo do Estado. 
 
III – Principais apresentações dos Estados Ocidentais 
 
1 – Estado absolutista 
- O Estado absolutista, existente principalmente após o término da Idade Média, 
início da Idade Moderna, tem como principal ponto a concentração de poderes nas 
mãos do monarca. Dessa forma, o rei pode legislar, julgar e administrar. 
- Essa espécie de sistema é capaz de gerar governos autoritário e ditatoriais, exato 
que não há como cobrar o governante por seus mandos e desmandos. 
 
2 – Estado liberal 
- O liberalismo inicia-se nos séculos XVI e XVII, época em que os Estados Nacionais 
estavam em formação. A princípio, enquadrava-se como uma luta pela liberdade 
religiosa, que deveria ser uma opção do cidadão e não uma imposição do Estado. 
Tornou-se uma doutrina política, quando começou a pregar uma limitação do poder 
do Estado e a defender as liberdades individuais na sociedade. Como teoria 
econômica começa a perder forças com as mudanças políticas e sociais acontecidas 
após a Primeira Guerra Mundial. 
- O Estado liberal contrapõe-se diretamente ao absolutismo, de modo a aumentar as 
liberdades civis, através da diminuição dos poderes do Estado. Traz como 
características o declínio das monarquias, as declarações de Direitos, a separação de 
Poderes e o Estado de Direito. De forma resumida, a ideia principal é de que o 
governante também deve estar submetido às leis, pois assim são garantidos aos 
indivíduos os seus direitos fundamentais. 
- Já o neoliberalismo é uma doutrina político-econômica que faz a adaptação dos 
princípios do liberalismo à economia. Baseada na retirada das normas que regulam o 
mercado de trabalho, os bens e serviços, a teoria neoliberal agride propositalmente o 
Estado, questionando suas intervenções na economia, buscando privatizações, 
abrindo os mercados à concorrência internacional e ao capital estrangeiro. Os 
primeiros impactos da teoria neoliberal na organização dos Estados começam a sersentidos na década de 1970, quando surgem os primeiros Estados organizados como 
neoliberais. 
 
3 – Estado social 
- Na linha cronológica, é o modelo que sucede o Estado liberal. 
- O Estado social, ou de bem-estar social (Welfare State), tem como principal 
característica monopolizar todas as atividades que sejam de interesse da população, 
deixando assim de agir apenas como ente político, passando a acumular funções 
econômicas e privadas. 
- O Estado social atua diretamente na prestação de serviços públicos de caráter 
universal (saúde, educação, habitação, previdência social, etc.) e na regulação da 
economia. 
 
4 – Estado totalitário 
- No regime político totalitário, existe uma corrente ideológica única, imposta certas 
vezes por partido de massa (ex: Partido Comunista soviético), também único, de 
forma que o poder político é exercido de forma concentrada e centralizada, por um 
grupo dominante, que se perpetua no governo, somente podendo ser dele afastado 
por meio de processos de ruptura, frequentemente com emprego de violência, como 
revolução, golpe de estado, guerra civil, ou guerrilha. 
 18 
- O Estado e seus governantes encontram-se submetidos às leis, todavia, tais regras 
são mudadas conforme a vontade dos dirigentes. 
 
 
IV – NAÇÃO 
 
- O Estado, quando distante dos interesses do povo, se sujeita à revoluções 
engendradas pela insatisfação dos cidadãos. 
- Por outro lado, para agradar e estimular o povo a seguir e legitimar o poder do 
Estado, faz-se necessário o incentivo da adesão emocional de todos. 
- Para tanto, criou-se artificialmente o conceito de Nação. 
- No século XVIII, na França e EUA, explorou-se demasiadamente a noção de nação, 
incentivando a burguesia à conquista do poder político diante das monarquias 
absolutas existentes. 
- O conceito de nação é mais simples de ser assimilado e entendido pelo povo do que 
a noção de Estado. Assim, foi mais facilmente explorado. Assim, envolver o povo no 
processo de derrubada e manutenção de novos poderes, passou a ser tarefa mais 
simples, caso todos se envolvessem com os interesses da nação. 
- Diante disto, percebe-se que a ideia de nação serviu para levar o povo a travar uma 
luta que era de outros, acreditando lutarem por si mesmos. Até hoje, a palavra nação 
é utilizada em sentido ideológico5, fortalecendo a união do povo pelo bem do Estado. 
 
- Para entendermos o conceito de Nação, precisamos entender e distinguir: 
 Sociedade: grupo social que se forma por um ato de vontade, não se exigindo 
que seus membros tenham afinidades espirituais, psicológicas ou culturais. 
Pode por exemplo, um grupo de pessoas absolutamente diferentes (língua, 
religião, costumes, etc), unir-se em uma sociedade para alcançar um objetivo 
que a todos interessa. Cria-se assim, por meio de vínculos jurídicos, uma 
sociedade. 
o Há ato de vontade e de inteligência humana para a união. 
o Há manifestação de um conjunto juridicamente ordenado. Seus 
membros se ligam por relação jurídica. 
o Há poder social reconhecido pela ordem jurídica. 
 Comunidade: a união de homens numa comunidade não depende de atos de 
vontade, surgindo de forma espontânea. Para a criação de uma comunidade o 
primeiro passo é que exista simpatia entre os membros do grupo. A evolução 
da simpatia leva a uma relação de confiança, gerando vínculos sentimentais 
de união. 
o Não depende de ato artificial de vontade, ocorre porque os membros 
buscam a preservação da própria comunidade. 
o Não existe qualquer relação jurídica entre os membros, há apenas 
sentimentos comuns. 
o Por não haver ordem jurídica, não há poder definido, existindo apenas 
pessoas com influência adquirida pelo respeito da comunidade. 
o Todavia, pode uma comunidade tornar-se uma sociedade também. 
Contudo, a comunidade continua a existir, mesmo havendo a nova 
sociedade. O contrário, uma sociedade tornar-se uma comunidade, é 
muito mais difícil, pois envolve questões culturais, mas não é 
impossível. 
 
 
5
 Alguns caracteres da ideologia: 
- Universalização: é a criação de uma justificativa coerente de imagens e de representações que 
explicam a realidade vivida. Os valores da classe dominante são aceitos como universais e verdadeiros. 
- Lacuna ou ocultação: A ideologia é ilusória, pois oculta como a realidade é de fato. Seu conteúdo é 
convincente, parece estar correto, mas possui partes silenciadas, ocultadas dos olhos da população. 
- Abstração: A ideologia apresenta uma realidade sem contradições. Analisa a realidade pela aparência 
social, sem levar em conta a organização cultural e social. As diferenças reais das condições de vida são 
tratadas como pequenas diversidades. Assim, por exemplo, o pobre é pobre por culpa dele, não do 
sistema. 
 19 
- Conceito de nação: Agrupamento humano, mais ou menos numeroso, cujos 
membros, fixados num território, são ligados por laços históricos, culturais, 
econômicos e/ou linguísticos. 
 
 
- ESTADO E NAÇÃO 
 
- Um Estado que coincida com a ideia de nação, na forma pura é praticamente 
impossível. 
- Dessa forma, o sonho de um Estado-nação, ou Estado-nacional, é de difícil 
consecução. O que se tem, via de regra, são Estados plurinacionais. 
- Plurinacionalismo: significa a existência, dentro de um mesmo Estado, de grupos 
sociais claramente distintos por sua cultura e por seus costumes. Cabe ao Estado, 
por meio da unidade jurídica, respeitar os valores fundamentais do homem, 
conciliando igualdade jurídica e diversidade cultural. 
- Assim, as regras jurídicas devem parecer justas para todos os grupos, 
indistintamente. No mesmo sentido, não pode um grupo predominar sobre outros e 
ter essa atuação acobertada ou legitimada pelo sistema jurídico. 
- O Estado Federal, que respeita a existência e localização dos grupos culturais 
dentro de seu território, dando a cada unidade autonomia e autodeterminação sobre 
muitos assuntos, segue o caminho correto. 
- Por outro lado, em lugares em que não se respeita os diferentes grupos culturais, é 
mais evidente a injustiça e desorganização social. Exemplo: o continente africano, 
que ao ser colonizado pelos europeus foi dividido sem que houvesse respeito pelas 
tribos e grupos até então existentes. 
- Pode-se concluir que o Estado é uma sociedade e a Nação aproxima-se mais do 
conceito de comunidade. 
- Diante disso, é importante aos Estados criar uma imagem nacional, que seja capaz 
de superar as diferenças culturais enraizadas em seu território. 
- O Estado perfeito é aquele que consegue realizar o Estado Nacional, unificado pela 
consciência social, pela identidade de interesses, pela comunhão de ideias de uma só 
nação. 
 
 20 
CAPÍTULO V 
ESTADO: POVO, TERRITÓRIO E SOBERANIA 
 
I – POVO 
 
- A noção jurídica de povo é uma questão recente. Na Grécia Antiga, os habitantes 
com direitos políticos eram chamados cidadãos (somente homens, nascidos na Polis 
e proprietários de terra). 
- Durante a Idade Média também não houve um conceito uniforme de povo, uma vez 
que havia camadas sociais bem definidas em que os direitos eram em muito 
diferentes (nobreza, clero e plebe). 
- Somente com Georg Jellinek, em torno de 1900, que houve uma construção 
doutrinária consistente que fixou a noção jurídica de povo e disciplinou sua 
participação perante o Estado. 
- Pela teoria de Jellinek há dois principais pontos: 
 Aspecto subjetivo: o Estado é sujeito do poder público bem como o povo, uma 
vez que este é componente daquele. Assim, o povo está numa relação de 
subordinação e, portanto, é sujeito de deveres. 
 Aspecto objetivo: o povo é objeto da atividade do Estado e por isso é sujeito 
de direitos, uma vez que o Estado deve atuar em favor de seu povo. 
- Jellinek desenvolveu uma doutrina conferindo à relação indivíduo-Estado quatro 
status. Quais são eles: Status passivo: o indivíduo encontra-se perante o Estado em posição de 
subordinação aos poderes públicos, caracterizando-se como detentor de deveres 
para com o Estado, que por sua vez tem competência para vincular o indivíduo, 
através de mandamentos e proibições. 
 Status negativo: em certas circunstâncias, faz-se necessário que o Estado não se 
intrometa na autodeterminação do indivíduo, garantindo sua liberdade de 
atuação, sem ingerências dos poderes públicos. 
 Status positivo: o indivíduo em situação de exigir do Estado que atue 
positivamente em seu favor, através da oferta de bens e serviços, principalmente 
os essenciais à sobrevivência e sadia qualidade de vida da própria comunidade. 
 Status ativo: o indivíduo desfruta de competências para influir sobre a formação 
da vontade estatal, correspondendo essa posição ao exercício dos direitos 
políticos, manifestados principalmente através do voto. 
- Desenvolvendo as teorias de Jellinek, Dallari (p. 99) define povo como: “conjunto 
dos indivíduos que, através de um momento jurídico, se unem para constituir o 
Estado, estabelecendo com este um vínculo jurídico de caráter permanente, 
participando da vontade do Estado e do exercício do poder soberano”. 
 
 
II - TERRITÓRIO 
 
- A noção de que o território também é componente do Estado somente começa a 
surgir com o Estado Moderno. Contudo, isso não quer dizer que os Estados não 
possuíam território. 
- Isso tudo aconteceu porque nas zonas rurais da Antiguidade, a população pouco se 
opunha às ordens reais, tendo então pouca importância a exata delimitação das 
fronteiras territoriais. 
- Com o surgimento da ideia de soberania na Idade Média, torna-se necessário definir 
os limites geográficos para efetividade da soberania. 
- Para Hans Kelsen, é exatamente a noção e delimitação dos territórios que 
possibilita a vigência simultânea de várias ordens estatais soberanas, sem que uma 
se sobreponha à outra. 
 
1 - Estado e seu território 
- Algumas teorias consideraram que o Estado tinha domínio pleno sobre o território, 
podendo aliená-lo em parte e sobrepor-se ao domínio dos particulares. Em outras 
palavras, o Estado era o proprietário absoluto do território, podendo fazer com ele o 
que bem quisesse. Ficava, portanto impedida a propriedade privada de terras. 
 21 
- Outros teorizaram, Jellinek por exemplo, que o Estado tem império quanto ao 
território, ou seja, é o poder que o Estado possui sobre os que se encontram no seu 
território. Assim, o direito estatal sobre o território é um reflexo da dominação sobre 
as pessoas proprietárias das áreas que compõem o território. 
 
- Sintetizando várias teorias, pode-se concluir: 
a) Não existe Estado sem território. 
b) O território delimita a ordem jurídica do Estado. Dentro do território 
prevalecem as leis do Estado, podendo coexistir normas jurídicas externas 
adotadas pelo poder soberano. 
c) O território é objeto de direitos e deveres. Assim o Estado pode instituir 
deveres para porções do território, bem como alienar partes dele, caso haja 
interesse do povo. 
 
- Conceito de território (Dicionário Aurélio): A parte juridicamente atribuída a cada 
Estado sobre os rios, lagos e mares contíguos, e bem assim o espaço aéreo que 
corresponde ao território, até a altura determinada pelas necessidades da polícia e 
segurança do país, devendo-se, ainda, considerar como parte do território os navios 
de guerra, onde quer que se encontrem, e os navios mercantes em alto-mar ou em 
águas nacionais. 
- Em outras palavras, território é a área sobre a qual o Estado exerce soberania, ou 
seja, é o domínio de validade da ordem jurídica de cada Estado. O território de um 
Estado é uno, embora por motivos de cunho didático, seja costume dividi-lo em 
aéreo, marítimo e terrestre. 
 
 
 
2 - Limites do território 
 
A - Quanto ao subsolo 
- Por questões técnicas de difícil exploração das profundezas do subsolo, nunca 
houve problemas que tivessem tornado necessária a criação de limites de 
profundidade dos territórios para problemas que pudessem surgir entre Estados. 
- Contudo, é pacífico que a exploração do subsolo é exclusiva do governo no Brasil. O 
inciso IX, do artigo 20 da CF, determina que pertencem à União os minerais e o 
subsolo do território brasileiro. 
 
B - Quanto ao mar 
- Há muito tempo atrás, o que importava para a delimitação de uma faixa marítima 
territorial eram as questões de segurança. Assim, o primeiro critério para fixação de 
mar territorial foi o alcance de uma bala de canhão no século XVII. 
- Somente no século XX é que, com o imenso potencial das armas, deixou-se de lado 
essa limitação definida pelo alcance de um equipamento de guerra. 
- Diante disso, estabeleceu-se por um tratado internacional o mar territorial como a 
faixa de três milhas marítimas. 
- Também no século XX, houve interesse em exploração comercial de faixa exclusiva 
do mar, como se território único do país fosse. Assim, a quantidade de milhas 
marítimas precisou ser ampliada para que se evitassem conflitos entre nações. As 
questões de segurança ficaram em segundo plano, prevalecendo as situações 
econômicas e até mesmo de preservação ambiental. 
- Chegou-se a conclusão, consagrada em tratados internacionais, que o mar 
territorial é de duzentas milhas marítimas (370,6 km). 
- No Brasil, a situação foi regrada pela Lei Federal 8.617/1993, que dispõe sobre o 
mar territorial, a zona contígua, a zona econômica exclusiva e a plataforma 
continental brasileiros, e dá outras providências. 
Art. 1º O mar territorial brasileiro compreende uma faixa de doze milhas marítimas 
de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular, tal 
como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhecidas oficialmente no 
Brasil. 
Art. 2º A soberania do Brasil estende-se ao mar territorial, ao espaço aéreo 
sobrejacente, bem como ao seu leito e subsolo. 
 22 
Art. 4º A zona contígua brasileira compreende uma faixa que se estende das doze às 
vinte e quatro milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem 
para medir a largura do mar territorial. 
Art. 5º Na zona contígua, o Brasil poderá tomar as medidas de fiscalização 
necessárias para: 
I - evitar as infrações às leis e aos regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou 
sanitários, no seu territórios, ou no seu mar territorial; 
II - reprimir as infrações às leis e aos regulamentos, no seu território ou no seu mar 
territorial. 
Art. 6º A zona econômica exclusiva brasileira compreende uma faixa que se estende 
das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que 
servem para medir a largura do mar territorial. 
 
3 - Quanto ao espaço aéreo 
- Com o desenvolvimento da aviação, tornou-se necessária a regulação sobre a 
soberania territorial do espaço aéreo. 
- Em regra, o espaço vertical acima de cada Estado é regulado e controlado pelas leis 
locais (inclui-se o espaço aéreo sobre o mar territorial). 
- Adiantando-se às conquistas espaciais, a ONU, em 1966 aprovou um Tratado do 
Espaço Exterior, determinando que nenhum Estado pode se apossar, no todo ou em 
parte, do espaço ultraterrestre, inclusive da Lua ou outros satélites naturais ou 
planetas. 
- Para efeitos práticos, a região a partir da qual a densidade do ar é insuficiente para 
sustentar aviões (20 a 25 milhas da superfície da Terra) poderia ser considerada 
como o início do espaço exterior. No Congresso da Federação Aeronáutica 
Internacional, realizado em 1960, propôs-se que o espaço exterior se iniciaria onde 
terminasse o espaço aéreo, isto é, 90 milhas. Ainda não existe consenso sobre o 
início preciso da região denominada "espaço exterior", não tendo jamais sido 
colocado qualquer obstáculo ao voo de satélites artificiais, foguetes, cápsulas ou 
naves espaciais. 
 
 
III - SOBERANIA 
 
1 - Noção histórica- O conceito de soberania é uma das bases do Estado Moderno. 
- Para que se pense no conceito de soberania, segundo Jellinek, necessário se faz que 
outros poderes afrontem o poder dos Estados. Na Antiguidade o confronto do Estado 
com a ordem privada era reduzido, pois sua função era apenas de prover segurança. 
A situação de confronto entre Estado e ordem privada surge com maior ênfase na 
Idade Média, aí então se inicia a conceituação e a necessidade de definição de 
soberania. Começam a surgir maiores problemas com as disputas entre reis e 
senhores feudais: uma soberania real outra feudal (século XII). A partir do século XIII 
o monarca amplia seus poderes e sua esfera de competência, coordenando a justiça, 
a polícia e o poder legislativo. Com esse domínio geral, o poder do rei passa a ser 
supremo, ensejando uma soberania absoluta. Assim, no final da Idade Média, os 
monarcas possuem poder supremo, sem grandes confrontos com a ordem privada ou 
mesmo da Igreja, ou seja, todos respeitam o poder soberano do rei. 
- Jean Bodin, por volta de 1576, esclarece que a soberania é o poder absoluto e 
perpétuo de uma República. A palavra república é sinônima, neste caso, do conceito 
moderno de Estado. 
- Para Bodin, a soberania como poder absoluto significava que nenhum poder a 
limitava. Assim, nenhuma lei humana, nem mesmo proferida pelo próprio rei, poderia 
limitar o poder soberano do Estado. Contudo, Bodin entendia que se o monarca 
desafiasse as leis divinas e da natureza, estaria aceitando declarar guerra a Deus. 
- A característica de perpetuidade da soberania advém da ideia de que esta não pode 
ser usufruída por tempo determinado. 
- Além dessas características, outros autores apontaram a inalienabilidade da 
soberania. Entre eles Rousseau em 1762, que adverte que a soberania não pode ser 
transferida ou concedida a outro monarca ou Estado, isto porque é exercício da 
vontade geral do povo. 
 23 
- Rousseau também aponta a indivisibilidade da soberania, já que somente será 
vontade soberana quando for a vontade geral, com a participação do todo. A vontade 
não é soberana quando há identificação de um desejo particular. 
- Para Rousseau, o poder soberano então se limita pelo próprio bem estar do povo, 
uma vez que o monarca não pode exigir excessivamente do povo, já que deve tratar 
todos com igualdade. 
- Com a Revolução Francesa, que combateu os Estados absolutistas, a ideia de 
soberania popular ganha força, gerando ainda o conceito de soberania nacional. 
 
2 - Concepções de Soberania 
a) Concepção política: poder incontrastável de querer coercitivamente e de 
fixar as competências. É a supremacia do poder do mais forte, ou seja, do 
Estado sem contestações. 
b) Concepção jurídica: poder de decidir em última instância sobre a 
atributividade das normas, ou seja, a eficácia do direito. Poder soberano é 
aquele que decide se a ordem jurídica deve ou não ser aplicada e deve ou 
não ser modificada. 
c) Concepção política de Miguel Reale: é o poder que tem uma nação de 
organizar-se juridicamente e de fazer valer dentro de seu território a 
universalidade de suas decisões nos limites dos fins éticos de convivência. 
Dentro dos fins éticos de convivência o Estado tem possibilidade de impor 
sua vontade. Tal concepção parte do pressuposto de que o Estado envolve 
questões sociais, jurídicas e políticas. 
 
3 – Características da soberania 
a) Una: não se admite num mesmo Estado a convivência de duas soberanias. 
b) Indivisível: não há partes separadas dentro da mesma soberania, ela representa a 
vontade geral do povo. A teoria da divisão de poderes não afronta a soberania, pois 
se divide funções de um mesmo poder. 
c) Inalienável: não há Estado sem poder, então a soberania não pode ser alienada 
(transferida a outro), pois faria desaparecer a noção de Estado. 
d) Imprescritível: não pode existir prazo para a duração do Estado. A ideia é que o 
poder soberano deve aspirar existência permanente. 
e) Originária: nasce com a própria criação do Estado. 
f) Incondicionado: só há limites postos pelo próprio Estado. 
g) Coativo: o Estado além de ordenar tem como coagir ao cumprimento de suas 
ordens. 
 
- Observação: Pode existir, apesar de a soberania ser incondicionada, um desejo de 
autolimitação do Estado. Isto porque, se assim não fosse seria impossível a 
existência de um direito internacional. Pode assim o Estado autolimitar sua soberania 
ao aceitar regras internacionais como válidas, mesmo que essas regras não tenham 
sido criadas exclusivamente por sua soberania. Isso tudo, segundo Ihering, não 
diminui a soberania, uma vez que o Estado se sujeita às regras internacionais por 
interesse próprio. 
 
4 – ESTADO E SOBERANIA 
- Para a existência de um Estado, nos moldes modernos, imprescindível a presença 
de no mínimo três elementos de identificação: território, população e governo. O 
governo necessita de atributos fundamentais, que caracterizam sua ordem jurídica: a 
soberania, a autonomia e o poder de autodeterminação. 
- A soberania é atributo da ordem jurídica que se manifesta como poder a ser 
exercido pelo governo, possuindo dois aspectos principais: no plano interno do país, 
ao se apresentar como qualidade jurídica do poder de império do Estado (summa 
potestas)6 e, como predicado de todos os Estados, garantido e determinando 
igualdade entre todas as nações. 
 
6
 Para Jean Bodin, o primeiro a trabalhar o conceito de soberania em 1576, o poder do Estado tem caráter 
absoluto, consagrando assim a soberania como poder absoluto e perpétuo de uma república. Cabe observar, no 
entanto, o contexto histórico de tal afirmação, que apresentava um cenário de redução de poderes dos senhores 
feudais para concentração nas mãos do monarca. 
 24 
- Assim, o governo pode possuir o atributo da soberania interna e, ao possuir 
capacidade de manter relações com outros Estados porque estes o reconhecem 
como governo soberano, possuir o atributo da soberania externa. A soberania 
externa confere ao Estado condição homóloga aos demais países, tornando suas 
relações, ao menos no campo teórico, horizontais. Desta maneira, é possível afirmar 
que não há entidades de poder superior aos países soberanos7, mas a existência de 
uma ordem jurídica internacional imprime certos e necessários limites aos Estados. 
 
 
4.1 - Soberania clássica e soberania compartilhada 
- A soberania clássica enseja que o Estado possui ordem não submetida a outra 
ordem estatal na esfera internacional e, no âmbito interno, nenhum outro poder o 
limita. Exatamente a ausência de subordinação é o elemento fulcral do conceito 
clássico de soberania. É importante asseverar que o Estado possui como limites sua 
própria ordem jurídica e a garantia dos direitos de seu povo. 
- No entanto, com a difusão dos conceitos de integração, de supranacionalidade e, 
principalmente, de direito comunitário, a noção clássica e absoluta de soberania 
necessita ser suavizada e redefinida. 
- A revisão do conceito de soberania tem escopo porque muitos autores dizem que 
quando um Estado aceita uma ordenação jurídica superior ao seu direito interno, 
está perdendo sua soberania. No entanto, isto não é o que realmente acontece. 
Como explicitado acima, o Estado pode autolimitar suas competências quando lhe 
aprouver, agindo assim soberanamente, decidindo e escolhendo o melhor para seus 
próprios interesses. As regras supranacionais são uma escolha dos Estados e não 
uma imposição. Neste sentido, o Estado que adota a supranacionalidade organiza-se 
juridicamente para fazer valer dentro de seu território regras que eticamente 
alcancem os objetivos positivos da convivência de seu povo. 
- É possível assim, dizer que as obrigações a que se submetem os Estados soberanos 
por meio de tratados internacionais não podem aniquilar sua soberania, uma vez 
que,se a Constituição permite a adoção de tais documentos e esta Carta foi lavrada 
por um poder constituinte pleno estar-se-á exercendo o disposto soberanamente na 
Lei Maior. O que acontece à soberania quando há a instituição de um direito 
supranacional, derivado de processo de integração avançado, é o compartilhamento 
das soberanias de todos os Estados-Membros do bloco com todos estes mesmos 
Estados. 
 
4.2 - Cooperação entre Estados 
- Dado o terror e sofrimento das Guerras Mundiais do século passado, as tendências 
do Direito Internacional sofreram mudanças e passaram a contemplar a proteção aos 
indivíduos, ao ambiente, ao comércio e à paz entre os Estados. 
- Isto tudo promoveu a ideia de multilateralidade que é um avanço civilizatório 
trazido pelo advento da organização internacional, visto que denota a capacidade de 
três ou mais Estados trabalharem em conjunto na consecução de objetivos comuns, 
passando-se do bilateralismo para o multilateralismo e da diplomacia secreta para a 
diplomacia pública. 
- Dentro do mesmo cenário, a Organização das Nações Unidas passou a promover o 
conceito de ajuda mútua entre nações para a solução de problemas econômicos, 
sociais, culturais ou humanitários. 
 
4.3 - Integração 
- Atualmente a grande demanda por acordos entre nações advém das necessidades 
econômicas mundiais. O regionalismo aparenta ser uma possível solução para a 
sustentabilidade ou progresso comercial das nações frente ao fenômeno da 
globalização. 
- O aprofundamento da cooperação, na forma regional, pode levar a um Direito da 
Integração. Emerge o Direito da Integração quando os laços entre as nações 
extrapolam a simples cooperação econômica, ao objetivarem além do envolvimento 
econômico outras aspirações mais profundas, quais sejam, uma unidade política, 
 
7
 Expressa tal entendimento o artigo 12 da Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA): “Os direitos 
fundamentais dos Estados não podem ser restringidos de maneira alguma.” 
 25 
social, cultural e uma harmonização jurídica para posterior uniformização, que pode 
levar a um Direito Comunitário. 
- Objetivos da integração: a ampliação das potencialidades dos Estados-Membros 
envolvidos, a manutenção da paz e a conclusão de um objetivo maior, como por 
exemplo o mercado comum. 
- A integração, via de regra, ocorre com a efetivação de acordos regionais entre 
nações fisicamente próximas, não necessariamente limítrofes, mas com interesses 
políticos semelhantes. 
 
4.4 - Supranacionalidade 
- É possível explicar o conceito de nação como o grupo de indivíduos com interesses 
comuns, origens comuns, e principalmente, ideais comuns, apresentando uma 
unidade homogênea. O prefixo “supra” pode significar aquilo que ultrapassa, 
transcende. Assim, a supranacionalidade tem como base a noção de ser aquilo que 
transcende o nacional. 
- Para que haja ordem em um país, fundamental é a presença de um sistema de 
organização legal, consubstanciado em normas. Estas normas são, em sua maioria, 
emanadas do poder legislativo nacional, para aplicação no âmbito interno do Estado-
nação. 
- Geralmente a organização de uma nação fundamenta-se em sua Constituição. Esta 
Carta apresenta a forma de organização social, política, legislativa e judiciária. No 
Brasil, por exemplo, a autoridade para criação de normas tem fundamento na 
Constituição Federal, que é quem confere competências e poderes governamentais. 
- Como sobredito, é certo que pode o Estado, através de dispositivo constitucional 
interno, prever a supranacionalidade de tratados internacionais, no que tange a ele 
próprio. Com isto é possível vislumbrar que a supranacionalidade tem caráter 
voluntário que deve surgir de ato interno de cada Estado, por meio de transferência 
de competência. 
- A ideia de transferência de competência advém da noção de que os tratados 
internacionais possuem a mesma função das normas emanadas do Poder Legislativo 
de cada país: regular pelo Direito. Quando um Estado confere a um tratado 
internacional o caráter de supranacionalidade, transfere voluntariamente parte de 
sua competência legislativa. 
 
5 – Fatores históricos que modificaram o conceito de soberania no século XX 
- Com o intuito de alguns Estados de aumentar territórios e, consequentemente 
poder, através de métodos expansionistas, ou seja, por meio de conquistas, muitas 
guerras proporcionaram espetáculos de terror e destruição. No século XX a Primeira 
Guerra Mundial e a Segunda Guerra Mundial assolaram e arrasaram o continente 
europeu, com a destruição de vidas, culturas, estruturas produtivas, habitacionais e 
econômicas. 
- Com essas tragédias da humanidade, o princípio do individualismo das soberanias 
internas passa a dividir as discussões com a ideia de solidariedade internacional. Tal 
situação produz modificações em diversos aspectos do Direito Internacional, que 
deixa de lado apenas os contextos de paz e guerra, individualismos dos Estados, e 
passa a abordar valores como a pessoa humana, a melhoria das condições de vida 
dos povos, buscando a união entre nações. 
- Com o fim da Segunda Guerra Mundial, Estados Unidos, Grã-Bretanha e União 
Soviética, os principais Estados que sufocaram o avanço dos nazistas, passam a 
reorganizar a estrutura geopolítica, econômica e financeira do mundo. Josef Stalin, 
Harry Truman e Winston Churchill reuniram-se na Conferência de Potsdam, em 
Berlim, ainda em 1945, quando o mundo foi partilhado entre comunistas e 
capitalistas, dando origem aos blocos da Guerra Fria. 
- Em 1947 o EUA apresenta o Plano Marshall com intenção de promover a 
recuperação econômica e social dos países da Europa Ocidental arrasados pela 
Segunda Guerra, estimulando e encorajando as nações europeias a trabalharem 
juntas pela sua recuperação econômica. Através do plano os estadunidenses 
emprestam dinheiro aos europeus que, por causa desta dívida, ficaram grande 
período vinculados às orientações dos EUA. O plano também age, com sua ligação 
posterior à Doutrina Truman, como meio de barrar o expansionismo soviético. 
 26 
- Para consecução do plano foi criada a Organização para Cooperação Econômica 
Europeia (OCEE) pelo Programa de Reconstrução, constituída por dezessete nações. 
- A união entre países também teve, na mesma época, exemplos militaristas com o 
Tratado do Atlântico Norte (OTAN), surgido em 1949, para proteger os países 
capitalistas integrantes do bloco e o Pacto de Varsóvia, engendrado em 1955 como 
resposta dos soviéticos e demais aliados militares. 
- Parece claro que com o sofrimento das guerras com perda de vidas humanas, com 
a destruição da economia dos países envolvidos e com o sentimento de impotência 
contra as nações dominantes do cenário mundial (EUA e URSS) os europeus 
aprendem que a união entre países é a saída para a perpetuação da paz e a 
superação das crises. 
- Com tal intuito, os europeus dão ousado passo em busca da integração entre 
nações, quando em 1957, assinam o Tratado de Roma, instituindo a Comunidade 
Econômica Europeia. A grande novidade estava no fato de que, além da integração 
econômica, buscava-se um mercado comum, com livre circulação de mercadorias, 
serviços, capitais e pessoas. 
- Concomitantemente à mudanças políticas e sociais acontecidas após a Primeira 
Guerra Mundial, o liberalismo econômico entra em declínio, tornando os Estados os 
principais determinadores das economias nacionais, intervindo e ditando regras para 
funcionamento das atividades financeiras. Com o fim da Segunda Guerra, a política 
do Welfare State (bem-estar social) passa a ganhar força, dadas as péssimas 
condições da população europeia com a devastação causada pelos conflitos. A 
política do Welfare State possibilitou crescimento econômico sem precedentes, 
viabilizando com relativa eficácia a concretização dos direitos econômicos e sociais

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