Buscar

Aula 6 Pesquisa da Variação Sociolinguística Diastrática

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 30 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 30 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 30 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

1 
 
 
 
CURSO: Letras DISCIPLINA: Português VIII 
 
CONTEUDISTAS: Ana Cláudia Machado Teixeira 
 Luciana Sanchez Mendes 
 Nadja Pattresi de Souza e Silva 
 José Carlos Gonçalves 
 
Aula 6 – Pesquisa da Variação Sociolinguística Diastrática 
 
Meta 
 
Nesta aula, apresentamos a importância dos estudos da variação linguística diastrática que 
caracteriza diferentes formas produzidas por falantes de diferentes classes sociais. 
Complementarmente, tencionamos refletir sobre a relação variação padrão e variação não-
padrão, uma vez que esse movimento de pressão de unificação e de diversificação é típico 
da dinâmica natural e do caráter heterogêneo da língua. 
 
Objetivos 
 
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de: 
1. Compreender e relacionar heterogeneidade linguística com heterogeneidade social; 
2. Reconhecer e identificar a variabilidade da língua como fenômeno natural, influenciada 
pelos usos sociais que os falantes fazem dela; 
 3. Refletir criticamente sobre o uso da língua como representante de diferentes subgrupos 
socioculturalmente distintos; 
4. Constatar que os aspectos distintivos dos grupos sociais são condicionados por fatores 
como a idade, o sexo, a classe social, a profissão, o grau de escolaridade, entre outros. 
CEDERJ – CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA 
DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 
 
2 
Introdução 
 
Na aula anterior, iniciamos a introdução afirmando que uma língua natural é como um 
sistema vivo e, por essa razão, se modifica, se matiza, se diversifica. Essa condição básica 
da língua está implicada na relação entre linguagem e sociedade. Seres humanos se 
comunicam, se relacionam e procuram ser expressivos em quaisquer contextos devido, 
sobretudo, à necessidade de serem ouvidos, estabelecerem uma troca, manterem uma 
relação. Nesta aula, caminhamos por uma via que identifica características da variação 
diastrática (do grego “dia” = através de + do radical latino “estrato” = camada). Essa via 
pode se desdobrar no plano fonético, como em “Craudia”, no plano lexical, por exemplo, 
“presunto” para identificar “corpo de uma pessoa assassinada” e no plano sintático, como 
em “nós vai”, variante de “nós vamos”. 
 
Ilustraremos, nesta aula, variações que se manifestam na fala de indivíduos marcando 
identitariamente grupos sociais e que, muitas vezes, são relacionadas à variedade não-
padrão da língua. Na outra margem desse caminho, destacamos a polêmica da identificação 
da variante padrão, como representante oficial da língua da comunidade de fala. 
 
Leia um trecho da música “ConeCrewDiretoria” de Rap Cerva Erva & Muita Larica: 
 
Rany Money: 
Tranquilidade na nave, tamo suave a vontade 
Demoro, é só me chamar que tem rap até mais tarde 
Tem festa na laje e é só os amigo que invade 
E já que é só os amigos, hoje é só os amigos de verdade 
Quem fecha, fecha, quem não fecha, abraço 
Hoje é melhor até sair voado, porque quem não fecha vai pras frechas 
Me desculpa, esse é o papo 
Esse é o papo reto, mano, igual acordo de tráfico 
Mas sem caô, hoje eu só quero paz e amor 
3 
Um beck de Amsterdã? aham 
(...) 
Então vem meu mano, fala tu da missão 
Hoje tem 100 no bando, então vamo de busão 
 
INÍCIO DO BOX PARA SABER MAIS 
Para conhecer o grupo de rap, sua discografia e sua história acesse: 
https://pt.wikipedia.org/wiki/ConeCrewDiretoria 
 
FIM DO BOX 
 
Para este primeiro caso, recorremos ao estudo de Votre (2003, p. 51) que revela a relação 
entre a variável “nível de escolarização” como “correlata aos mecanismos de promoção ou 
resistência à mudança” e a dinâmica natural de expansão, adequação, mutabilidade ligadas 
à característica de continuidade e mudança típicas da língua. A partir do estudo de Votre, 
destacamos o binômio “forma de prestígio social e forma relativamente neutra”, “fenômeno 
imune à estigmatização e fenômeno socialmente estigmatizado”. Para a primeira, o autor 
destaca que o foco recai sobre o status econômico e o prestígio social dos falantes, já para a 
segunda, a atenção incide sobre o estigma social. Ambas estão relacionadas uma vez que 
podemos analisar a língua a partir dos dois enfoques paralelamente. É o que vemos a 
seguir, a partir do rap “ConeCrewDiretoria”. 
 
Inúmeros são os exemplos que podemos destacar dessa variável. No plano fonético, 
podemos comparar “demorô” com “demorou”, no plano lexical, “caô” com “mentira”, no 
plano sintático a marca de concordância entre “os amigo” com “os amigos”. Se, de um 
4 
lado, identificamos a marca de um grupo social, por outro, reconhecemos o nível de 
escolaridade representante desse mesmo grupo. Nesse caso, estaremos assumindo a 
heterogeneidade da língua como imbricada à heterogeneidade social. Na contramão dessa 
ideia, seguindo o movimento de estabilização e normatização, observamos dois 
desdobramentos: a questão do preconceito linguístico e a atuação da escola como 
reprodutora da norma. Pensar nesse último caso é tratar de um movimento atual e alvo de 
estudos, pesquisas e, também, de polêmicas que vão ao encontro do entendimento do 
espaço escolar apontado por Votre (2003) em termos de resistência à mudança e fenômeno 
imune à estigmatização. 
 
Para instigar ainda mais essa questão e tocar em um dos objetivos dessa aula, destacamos as 
variantes no nível fonético-fonológico “vamos” e “vamo” ou “cantar” e “cantá” em que a 
última, a princípio, era alvo de preconceito e discriminação, mas que hoje já se encontra 
praticamente disseminada em toda comunidade linguística do português do Brasil. Trata-se 
de um fenômeno muito conhecido da variação diacrônica estudada na aula 3 da língua 
chamado “apócope”, que designa a supressão de fonema no fim da palavra. 
 
Esse exemplo demonstra o caráter mutável da língua, bem como apresenta a ideia de que os 
movimentos de expansão e estabilização se apropriam de regras que já atuavam em tempos 
passados. Essa constante atualização do sistema por meio de determinada regra, então, nos 
motiva a refletir acerca de fatores não somente extralinguísticos como nível de 
escolaridade, classe social, gênero, mas também nos incentiva a refletir sobre a articulação 
do sistema fonético assim como os de ordem econômica, como a redundância. 
 
No caso da apócope, a supressão do “s” final, além de indicar/marcar a prevalência da 
paroxítona na língua portuguesa e o consequente apagamento da sílaba átona final, o 
apagamento é enfatizado pela redundância do plural como em “nós vamos” por “nós 
vamo”. No caso da apócope do fonema /R/, podemos citar o estudo de Oliveira (1997), que 
afirma que esse fenômeno é observado historicamente e tem ocorrido em outros idiomas 
vindos do latim: no francês, desapareceu quase todo /R/ em final de palavra, permanecendo 
5 
somente em monossílabos (como noir, air); no Sul da Espanha, o /R/ desapareceu em 
algumas palavras como ayer, caer em algumas regiões de Sevilha, Córdoba, Huelva, Cadiz 
e Málaga; na mudança do latim vulgar para o português, também houve a perda do fonema 
/R/ em algumas situações: persona para pessoa, por exemplo. 
 
Utilizar os estudos sociolinguísticos é investigar a linguagem relacionando-a a fatores 
sociais que distinguem diferentes comunidades de fala para a desconstrução da ideia de 
homogeneidade linguística. Tais estudos, por sua vez, ressaltam variação e mudança como 
inerentes às línguas, um fenômeno cultural motivado por fatores linguísticos e 
extralinguísticos. 
 
Dois outros fatores extralinguísticos relacionados à variação diastrática são geralmente 
explorados nos estudos sociolinguísticos, o gênero e a faixa etária do falante. Podemos 
utilizaro mesmo rap com que iniciamos esta aula para estudá-los. 
 
A partir da hipótese de que homens e mulheres falam de formas distintas seja em função do 
ritmo e do tom de voz seja pela preferência de certas estruturas, a relação sexo e linguagem 
é um tema bem discutido na sociolinguística quando se pensa em estratos sociais. A 
associação que, na maioria das vezes, se atribui é a de que falantes do sexo feminino 
tendem a utilizar a forma socialmente prestigiada. 
 
Segundo Paiva (2003, p. 33), as diferenças mais evidentes entre fala de homens e mulheres 
se destacam no plano lexical. A associação feita, num primeiro plano, é de que se segue 
uma regra na sociedade ocidental de que “não fica bem para uma garota falar dessa forma”. 
Caminhando por uma reflexão mais profunda dessa questão aparentemente preconceituosa, 
a autora destaca que, de alguma maneira, não se pode ignorar outro fator que ancora essa 
perspectiva, mesmo que, grosso modo, “a maior ou menor ocorrência de certas variantes, 
principalmente daquelas que envolvem o binômio forma padrão/forma não-padrão e o 
processo de implementação de mudanças esteja associada ao gênero/sexo do falante e à 
forma de construção social dos papéis feminino e masculino”. 
6 
 
De forma semelhante, a hipótese de que falantes com faixa etária intermediária e com idade 
mais avançada tendem a se filiar à variante de prestígio tem sido alvo de muitos estudos. 
Citando uma pesquisa acerca da concordância nominal, Scherre (1988, p. 427-8) diz que: 
“o ápice das formas de prestígio é encontrado nas faixas etárias intermediárias devido às 
pressões do mercado de trabalho”, isso em situações de variação estável. É importante 
ressaltar que a pesquisadora faz uma observação relativa ao processo de mudança do 
fenômeno pesquisado. Você deve se lembrar da aula 04, em que discutimos a diferença 
entre variação e mudança. Segundo Scherre, se o caso for de mudança, então os resultados 
com relação à faixa etária mostram uma distribuição inclinada com o peso distribuído nas 
duas pontas, ou seja, as formas inovadoras predominando entre os mais jovens e as formas 
conservadoras predominando entre os mais velhos, enquanto que os indivíduos da faixa 
etária intermediária podem demonstrar um comportamento linguístico mais ou menos 
neutro, ou seja, usam ambas as formas, tanto as conservadoras como as inovadoras. 
 
Com relação aos estudos que interligam três fatores sociais ou extralinguísticos (anos de 
escolarização, sexo e faixa etária), podemos citar o de Naro & Scherre (1998). Os autores 
assinalam que a concordância de número no português do Brasil exibe um caráter 
sistemático, apontando variantes explícitas e variante zero (Ø) de plural em elementos 
verbais e nominais. Os pesquisadores buscam correlacionar variáveis linguísticas (saliência 
fônica e posição) e sociais citadas acima. A partir desse grupo de fatores, o estudo 
explicitou que palavras/sílabas fonicamente mais acentuados (salientes) favorecem as 
marcas explícitas de plural, assim como os não nucleares à esquerda do núcleo do 
sintagma; ao passo que aqueles não nucleares à direita desfavorecem-nas. De outro lado, se 
os núcleos estiverem na mesma linha sintagmática, porém à direita da cadeia sintagmática, 
ou seja, ocuparem a primeira posição na sentença, favorecem mais marcas explícitas na 
construção sintática. As pessoas com mais anos de escolarização e as do sexo feminino 
apresentam mais a variante explícita. A associação feita por eles foi a seguinte: falantes 
com maior nível de escolarização estão diretamente mais expostos à correção gramatical, já 
o grupo do sexo feminino, como outras pesquisas já atestaram e ainda atestam, tendem a 
7 
não “transgredirem” as normas de prestígio; o último grupo, a variável faixa etária, 
apresenta um padrão ligeiramente curvilinear, de forma que quanto maior os anos de vida 
maior a probabilidade de produtividade profissional e, por isso, maior pressão para assumir 
as formas de prestígio. 
 
Outra linha de estudos geralmente relacionada à variação diastrática que, na verdade, é um 
desdobramento das questões sociais e da resistência à mudança é a dicotomia norma- 
padrão e não padrão. A primeira associada a uma prescrição muitas vezes retrógrada que 
desconsidera toda a organicidade natural da heterogeneidade linguística de que trata a 
segunda. Esse tópico será tratado na sequência das seções desta aula. 
 
INÍCIO DO BOX PARA SABER MAIS 
Vamos indicar alguns estudos desenvolvidos por pesquisadores do Brasil. 
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-44502007000300012 
http://www.ai.mit.edu/projects/dm/bp/scherre94-number.pdf 
 
SIMÕES, D.: OSÓRIO, P.; MOLLICA, M. C. (Orgs.). Contribuição à Linguística no 
Brasil: um projeto de vida. Miscelânea em homenagem a Claudia Roncarati. Rio de 
Janeiro: Dialogarts, 2015. 
 
Confira, nas referências bibliográficas, os dados do livro “Introdução à Sociolinguística: o 
tratamento da variação”, organizado pelas pesquisadoras Maria Cecília Mollica e Maria 
Luiza Braga. 
FIM DO BOXE 
 
Antes de passarmos para o outro tópico, que tal testarmos o conteúdo estudado até aqui? 
Vamos lá! 
 
 
 
8 
ATIVIDADE 01 
Vamos voltar à letra do rap do pessoal do “Rap Cerva Erva & Muita Larica”. Esse grupo é 
formado por seis rapazes, do Rio de Janeiro, com idade entre 20 – 28 anos. A tarefa é 
buscar na letra da música palavras, expressões ou estruturas sintáticas que apontem 
variantes da fala dos componentes do grupo e, ao lado, indicar como essa mesma palavra, 
expressão ou estrutura é ensinada na escola. Após preencher a tabela abaixo, veja as 
respostas sugeridas em respostas comentadas. 
 
Variantes do rap Variante padrão, ou escolar 
1) Tranquilidade na nave Está tudo calmo, sob controle 
2) Tamos suave Estamos calmos e/ou normais 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Resposta comentada: 
A ideia é você compreender a atuação das forças de variedade e de estabilidade e como os 
grupos sociais, representados muitas vezes pelos músicos, artistas, esportistas, afirmam sua 
identidade, de um lado, e, como a escola atua na “resistência à mudança”. Vamos começar: 
 
2. O padrão X o não padrão: o paradigma do preconceito 
 
Já que estamos pensando na relação entre variação linguística e fatores sociais, é importante 
retomar o tema do preconceito linguístico, que discutimos na aula 04. Isso porque, como já 
falamos, o julgamento que recai sobre uma ou outra forma de uso da língua é, antes de 
9 
tudo, fruto de uma forma de avaliação social mais ampla, direcionada para os falantes e sua 
origem social, cultural e econômica. 
 
Na área dos estudos linguísticos, essa postura preconceituosa tem muito a ver com a ideia 
que nós, falantes do português, temos a respeito do que seja “certo” ou “errado”. Ao longo 
de anos, durante toda a nossa formação educacional, ouvimos falar que, com o futuro do 
presente ou do pretérito, o pronome átono não deve aparecer nem antes nem depois do 
verbo, e sim no meio, no fenômeno de nome tão incomum quanto o seu próprio uso: a 
mesóclise, como em “dar-te-ei as estrelas” em vez de “te darei as estrelas”, por exemplo. 
 
Também fomos, e somos ainda, repetidamente instruídos a empregar apenas os pronomes 
átonos (o, a, os, as) para a função de complemento verbal, em objetos diretos, como em “eu 
o encontrei”, ainda que o uso cada vez mais frequente, inclusive, o de pessoas escolarizadas 
em situações de menor controle, seja “eu encontrei ele”. 
 
Sobre preconceito, linguistas e a língua que falamos, por Português é legal. 
4:13 
Preconceito Linguístico - entrevista com o autor Marcos Bagno, por FranciscoDarci 
Feitosa. 
24:51 
Prof. Evanildo Bechara no Programa do Jô [2002], por Razec Henriques. 
30:22 
10 
Preconceito Linguístico - Marcos Bagno, por Vídeos diversos. 
7:51 
Prof. Evanildo Bechara no Programa do Jô [2008], por Razec Henriques. 
16:57 
Linguista Ataliba T. de Castilho no Programa do Jô, por editora Contexto. 
22:23 
Preconceito Linguístico - Marcos Bagno, por Joseanne Guedes. 
3:57 
TV Brasil - A língua falada e a língua escrita (24/05/2011), por Coisas na TV. 
43:48 
Entrevista - Evanildo Bechara, por TV Camara Rio. 
37:53 
 
 
11 
D-17 - Norma culta e variedade linguística, por Univesp TV. 
24:10 
Marcos Bagno, O polêmico linguísta Parte 1por Thiago Silva. 
13:13 
01 - Variações linguísticas por Instrução Digital. 
29:05 
 
Esses e muitos outros casos que mais parecem contradizer do que confirmar a regra prevista 
nas gramáticas convencionais decorrem da visão que estas representam e reproduzem: a da 
chamada norma-padrão. Conforme nos esclarece Lucchesi (2001, p. 64), faz-se necessário 
pensar na ambiguidade do termo “norma”, do qual derivam dois adjetivos, “normativo” e 
“normal”. Do primeiro, “normativo”, vem a ideia da norma padrão como “um sistema ideal 
de valores que, não raro, é imposto dentro de uma comunidade”. Do segundo adjetivo, 
“normal”, temos a noção daquilo que é habitual, frequente, um costume para determinado 
grupo. 
 
Assumindo essa postura prescritiva, que busca dizer como devem ser e não como 
efetivamente os usos são, a gramática tradicional se coloca a serviço de um conceito de 
língua que não existe no uso, nem entre os grupos de falantes mais escolarizados. Uma das 
razões para isso, inclusive, resulta da confusão que a gramática acaba promovendo entre a 
língua e o padrão escrito literário a partir do qual apresenta as regras da língua. 
 
12 
Refletindo sobre o tema, Marcos Bagno (2007) chama a atenção para a importância de se 
diferenciar norma-padrão de norma culta, explicando que, apesar de serem usadas como 
sinônimos, são conceitos muito diferentes. A primeira, como dissemos, seria uma abstração 
imposta, uma tentativa ideológica de prescrever e controlar a natureza heterogênea e 
constitutiva da linguagem, ao passo que a segunda daria conta dos usos reais e possíveis 
que falantes mais escolarizados e representantes de grupos sociais de maior prestígio fazem 
da língua. 
 
O mesmo autor destaca a importância de não utilizarmos termos como “língua padrão”, 
“variedade padrão” ou “dialeto padrão”, pois “para se usar os termos ‘variedade’, ‘dialeto’ 
ou ‘língua’, é necessário que exista um conjunto de pessoas que realmente falem essa 
variedade, esse dialeto, essa língua. Ora, ninguém fala, efetivamente, o padrão, nem mesmo 
as pessoas altamente escolarizadas em situações de interação verbal extremamente formais. 
(BAGNO, 2007, p. 95-6). 
 
O termo norma culta, então, utilizado por autores como Dante Lucchesi e Rosa Virgínia 
Mattos e Silva, por exemplo, surge como uma possibilidade de lidar com o uso que se vê 
entre pessoas mais escolarizadas. Essa ocorrência se coloca ao lado, em termos de uso, da 
norma popular ou vernácula. A norma culta seria fruto da nossa história colonial em 
associação à língua herdada da metrópole portuguesa, conservada ao longo de séculos de 
formação do país pelos representantes da elite social brasileira em poucos centros urbanos. 
A vernácula, por outro lado, seria o português tal qual foi se forjando em contato com os 
índios, africanos e mestiços, a forma que predominava em grande parte do território 
brasileiro. 
 
Assim, caberia a constatação de que o português, entre a variedade linguística e a pressão 
por estabilidade, seriam, na verdade três, a norma-padrão, um modelo abstrato e ideológico; 
a norma culta e a norma popular ou vernácula. Refletindo, ainda, sobre a questão 
terminológica, Bagno (2007) propõe substituir os termos norma culta e norma popular ou 
vernácula por variedades prestigiadas e variedades estigmatizadas, respectivamente. 
13 
 
Essa proposta tem por fim evitar a pressuposição que se poderia extrair da expressão 
“norma culta”: se há uma norma ou normas cultas, haveria também normas que, por não 
representarem a cultural letrada e socialmente prestigiada, seriam desprovidas de 
legitimidade e representatividade cultural, o que indica mais um preconceito. 
 
Dessa forma, vemos que os termos sugeridos reforçam a ideia de que os julgamentos sobre 
os usos linguísticos são tanto mais pejorativos quanto menor o prestígio social e econômico 
dos seus falantes e vice-versa. Em outras palavras, a língua e suas variedades são avaliadas 
e mais ou menos estigmatizadas a depender da origem e da posição social de seus usuários. 
 
BOXE PARA SABER MAIS 
Para saber mais sobre esse assunto e a afirmativa de que o português, sem dúvida, não é 
apenas um, e sim dois ou, de forma mais abrangente, três e vários, sugerimos a leitura do 
livro de Rosa Virgínia Mattos e Silva, O português são dois, bem como do artigo de Dante 
Lucchesi, intitulado “Norma linguística e realidade social”. Você encontra as referências 
completas dessas e de outras obras importantes ao final desta aula, certo? 
FIM DO BOXE PARA SABER MAIS 
 
ATIVIDADE 02 
 
O título da obra de Rosa Virgínia faz uma intertextualidade explícita com o poema de 
Carlos Drummond de Andrade, chamado “Aula de Português”. Leia o poema e, depois, 
proponha uma possível relação entre o texto de Drummond e a discussão sobre norma-
padrão e as normas efetivamente usadas pelos falantes da língua. (10 linhas) 
 
 
 
 
 
14 
Aula de português 
 
A linguagem 
na ponta da língua, 
tão fácil de falar 
e de entender. 
 
A linguagem 
na superfície estrelada de letras, 
sabe lá o que ela quer dizer? 
 
Professor Carlos Góis, ele é quem sabe, 
e vai desmatando 
o amazonas de minha ignorância. 
Figuras de gramática, esquipáticas, 
atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me. 
 
Já esqueci a língua em que comia, 
em que pedia para ir lá fora, 
em que levava e dava pontapé, 
a língua, breve língua entrecortada 
do namoro com a prima. 
 
O português são dois; o outro, mistério. 
 
Resposta comentada: No poema, percebemos um nítido contraste entre a língua ensinada 
na escola, cheia de regras, normas, personificadas pelo professor e gramático do século XX, 
Carlos Góis, que “atropelam” e “desmatam” a vivacidade, a riqueza e o dinamismo da 
língua que se usa no cotidiano, que se aprende naturalmente ao longo da vida, que serve às 
múltiplas atividades sociais de que fazemos parte. De certa forma, o falante, que 
15 
acompanhamos no poema, intui a enorme distância entre o que é apresentado e ensinado 
como o padrão da língua pela escola e pelas gramáticas e o uso efetivo que dela fazemos 
para uma multiplicidade de funções sociais, o que pode ser visto nas variedades da língua. 
FIM DA ATIVIDADE 
 
A seguir, vamos conhecer algumas pesquisas de base sociolinguística que estudam e 
descrevem variações diastráticas que, em geral, são alvo de forte preconceito, tanto no 
plano lexical quanto no fonético e sintático. 
 
3. Variações e preconceito em níveis, o caso lexical 
 
Como já lembramos, a postura preconceituosa diante dos usos linguísticos está diretamente 
relacionada a fatores sociais que a condicionam como, por exemplo, a faixa etária, o 
gênero, o nível de escolaridade e a condição socioeconômica. 
 
Vamos refletir agora um pouco sobre a relação entre o nível lexical e a perspectiva social, 
que, muitas vezes, gera pontos de vista preconceituosos.Vamos pensar em duas pesquisas 
sobre o assunto, buscando relacionar as escolhas lexicais às suas motivações sociais e 
culturais, uma vez que, como já discutimos nas aulas anteriores, língua também é uma 
questão de identidade. E, nas palavras de Castilho (2010, p. 31), “é na língua que se 
manifestam os traços mais profundos do que somos, de como pensamos o mundo, de como 
nos dirigimos ao outro”. 
 
Considerando o fator faixa etário associado à condição socioeconômica, Baronas e Oliveira 
(2011) investigam as falas de um grupo de seis adolescentes, de uma classe social 
desprivilegiada, estudantes de uma escola que visa à formação profissional em Londrina. 
No grupo total de seis alunos, havia três meninos e três meninas. Um dos meninos já estava 
no mercado de trabalho e uma das meninas já havia cumprido medidas socioeducativas. 
 
16 
Além de traços fonéticos, as pesquisadoras verificaram a presença de gírias relacionadas ao 
grupo de jovens. Ao falar de suas experiências de vida e preferências musicais, por 
exemplo, as gírias apareceram na fala de todos os meninos, que utilizaram palavras e 
expressões como “tá ligado”, “cara”, “curto”, “meu”. 
 
VERBETE 
Gíria: “A gíria é uma linguagem particular e familiar que utilizam entre si os membros de 
um determinado grupo social. [...] pode ser difícil de entender para aqueles que não façam 
parte da dita comunidade.” 
(Fonte: <http://conceito.de/giria>. Acesso em: 04 de jul. de 2016) 
FIM DO VERBETE 
 
Ainda assim, gírias como “meu”, “tipo”, “tá ligado”, “sussa” (sossegado) e “mina” (garota) 
também foram encontradas na fala de uma das meninas entrevistadas. Essa jovem foi 
caracterizada, na pesquisa, pelo seu comportamento similar ao de um menino, inclusive, em 
sua forma de falar com o emprego das gírias, o que não se viu entre as outras meninas. Em 
outro momento da pesquisa, as autoras chamam a atenção para o fato de que essa jovem 
indica, também pelo uso de palavrões em sua fala, a oscilação entre diferentes identidades 
que reclama para si: a de jovem infratora, a de menina que se assemelha a um menino, a de 
aluna, o que aponta para a necessidade de se afirmar e se constituir como sujeito. 
 
As pesquisadoras também destacam a fala do rapaz já inserido no mercado de trabalho, que 
faz escolhas lexicais mais próximas às da norma padrão e também típicas do universo 
discursivo do mundo do trabalho. Ao ser indagado sobre seus planos para o futuro, o jovem 
responde (op. cit., p. 203): “Primeiro, quero passar no vestibular pra jornalismo, me formar, 
me firmar, quem sabe trabalhar como representante internacional de uma emissora 
importante... Hoje, diante da emergência do mercado, além do feedback, tem que gostar 
daquilo que se faz para ser um bom profissional e bem na carreira, eu quero isso e vou ser 
bom nisso e depois conhecer o mundo!”. 
 
17 
Entre as outras meninas entrevistadas, várias marcas que são convencionalmente associadas 
ao falar feminino apareceram, tais como o uso de diminutivo e a expressão de carinho e 
afeto por meio de certas escolhas lexicais. Quando falam de suas preferências musicais e 
também de seus projetos futuros (op. cit., p. 204), elas dizem: “Ouço sempre Victor e Leo. 
Amo eles. São lindinhos, né?” e “Penso em viaja pra aqueles lugarzinho bem bonitinho que 
aparece na novela, sabe?” 
 
Ainda que, segundo as pesquisadoras, o estudo esteja em fase inicial, é possível observar a 
relação entre língua e identidade, e entre as escolhas lexicais e o lugar que cada um ocupa 
ou deseja ocupar no mundo. Isso pode e deve ser levado em consideração, numa 
perspectiva livre de avaliações e preconceitos, como uma diretriz para a compreensão do 
universo dos jovens, sobretudo, aqueles que provêm de grupos sociais de menor prestígio. 
 
Outra pesquisa recente, relacionada ao Atlas Linguístico-Etnográfico da Região Sul do Brasil 
(ALERS), é a de Pinho e Margotti (2009) sobre as formas de se denominar “diabo”, do 
campo temático crenças e religiões, na região Sul do Brasil, destacando-se o grau de 
variação observada de acordo com as regiões mais ou menos rurais ou urbanas. 
 
 
BOXE PARA SABER MAIS 
O Atlas Linguístico-Etnográfico da Região Sul do Brasil, ALERS, foi lançado em 2002 e 
se caracteriza por ser um projeto interinstitucional, executado com o apoio do CNPq, 
FINEP, FAPERGS e das três universidades federais envolvidas, a do Rio Grande do Sul 
(UFRGS), a de Santa Catarina (UFSC) e do Paraná (UFPR). A coordenação geral do 
ALERS encontra-se, desde seu início, no Instituto de Letras da UFRGS, onde são reunidos 
os dados dos três Estados e elaboradas a cartografia, editoração e publicação do Atlas. 
 
Entre suas principais metas e contribuições estão o conhecimento mais abrangente da 
realidade sociocultural e linguística do Sul do país, sobretudo no que diz respeito aos 
estudos de "variação e mudança linguística" e de "bilinguismo e línguas em contato". Além 
18 
disso, apresenta subsídios importantes para questões centrais como a melhoria do ensino de 
línguas, a história de ocupação do território, o pluralismo étnico-cultural e a política 
linguística e educacional. 
 
(Fonte:<http://www.ufrgs.br/setordealemao/projetos_pesquisa/cleo_vilson_altenhofen/atlas
_linguistico.htm>. Acesso em: 19 de dez. 2015.) 
FIM DO BOXE PARA SABER MAIS 
 
As perguntas que nortearam a pesquisa foram: “Deus está no céu e no inferno está o...?” e 
“Que outros nomes dão para ele?”. Além das conclusões relacionadas à distribuição 
diatópica das variações para o vocábulo estudado, os pesquisadores chegaram a alguns 
resultados relacionados à dimensão social das variantes na região Sul, sobretudo em Santa 
Catarina. A observação das variantes nesse estado torna-se relevante porque ele é 
considerado como um local de transição entre as áreas linguísticas do Paraná e do Rio 
Grande do Sul. 
 
Em seis municípios urbanos de Santa Catarina (Blumenau, Chapecó, Criciúma, 
Florianópolis, Joinville e Lages), três informantes foram entrevistados: um com o Ensino 
Médio, outro com um nível de escolaridade entre o 6º e o 9º ano do Ensino Fundamental e 
um analfabeto. 
Para a primeira pergunta, não se observou grande influência do nível de escolaridade para o 
uso da variante, que foi, em geral, a mesma: diabo. Já para a segunda pergunta, um número 
maior de variantes foi visto. Ao contrário do que seria de se esperar (os sujeitos mais 
escolarizados empregariam as formas mais próximas do português padrão; e os menos 
escolarizados, os regionalismos), essa não foi a tendência observada. 
 
Ainda que ressaltem a necessidade de um estudo mais aprofundado, com maior número de 
dados, os pesquisadores apontam que “em Joinville e em Blumenau, os informantes mais 
escolarizados e os analfabetos forneceram as mesmas variantes, demônio e capeta, 
respectivamente. E os medianos o vocábulo diabo. Já em Lages, a variante santa fé, que não 
19 
é padrão no contexto urbano, foi utilizada pelo informante mais escolarizado”. (op. cit., p. 
60). 
 
Em resumo, de forma geral, os pesquisadores concluíram que a fala nas áreas urbanas se 
mostra mais padronizada que a nas zonas rurais, onde o isolamento geográfico e um menor 
grau de escolaridade tendem a propiciar um uso mais amplo de regionalismos lexicais que 
se associam às características culturais das diferentes regiões. 
Vejamos essa tendência na tabela-resumo abaixo: 
Tabela adaptada de Pinho e Margotti (2009, p. 58) 
Área Rural Área Urbana 
“Deus está 
no céu e no 
inferno está 
o...?” 
Variante N° de 
ocorrência 
“Deus está 
no céu e no 
inferno está 
o...?” 
Variante N° de 
ocorrência 
diabo 57 diabo15 
“demonho” 8 demônio 1 
Satanás 3 “demonho” 1 
Demônio 2 “saci” 1 
Capeta 2 
Lúcifer 1 
Bichinho 1 
demo 1 
“Que outros 
nomes dão 
para ele?” 
Variante N° da 
ocorrência 
“Que outros 
nomes dão 
para ele?” 
Variante N° da 
ocorrência 
“demonho” 19 Demônio 4 
satanás 13 Capeta 4 
demônio 12 Diabo 3 
capeta 12 Satanás 2 
diabo 11 “demonho” 1 
“temonho” 1 Chifrudo 1 
“coisa ruim” 1 “timbinga” 1 
20 
guampudo 1 “coisa ruim” 1 
“o coisa” 1 Santa fé 1 
serelete 1 
curisco 1 
Judá 1 
 
BOXE PARA SABER MAIS 
Para saber mais, leia os dois artigos das pesquisas aqui mencionadas. Observe também as 
referências citadas pelos pesquisadores. Elas indicarão ainda mais possibilidades de 
compreensão do fenômeno da variação linguística associada aos seus condicionantes 
sociais. Você pode encontrar as informações sobre os artigos no final desta aula. Mãos à 
obra! 
FIM DO BOXE PARA SABER MAIS 
 
ATIVIDADE 03 
 
Tendo em vista o uso do léxico em sua região e entre diferentes grupos de pessoas, procure 
investigar a variação possível para o conceito de “pessoa que é extremamente econômica 
e/ou não gosta de gastar dinheiro”. Tente realizar o levantamento cruzando diferentes 
fatores e observando de que forma cada qual interfere na escolha lexical dos falantes. Entre 
os condicionantes que você pode considerar estão a faixa etária, o nível de escolaridade, a 
origem social e o sexo dos informantes, por exemplo. Bom trabalho! (10 linhas) 
 
Resposta comentada: O objetivo é que você possa observar casos de variação lexical para 
o conceito dado em associação a condicionantes sociais, verificando que, 
independentemente das possibilidades, todos os usos cumprem seu papel comunicacional e 
interacional em língua portuguesa. 
 
 
 
21 
4. Variações e preconceito em níveis, o caso fonético 
 
A fim de ilustrar a variação fonética e recentes pesquisas a ela relacionadas, trataremos de 
dois fenômenos: a palatalização das consoantes dental-alveolares (“t” e “d”) quando 
precedidas da vogal alta “i”, e também a da realização do “r” em posição de coda silábica, 
já que ambos os fenômenos são, frequentemente, alvo de estigma e preconceito social e 
linguístico. 
 
BOXE PARA SABER MAIS 
Neste ponto, é importante que você se lembre do curso de Fonética e Fonologia. Além da 
descrição dos fonemas, vale destacar sua posição nas sílabas em língua portuguesa. O 
termo “coda” silábica diz respeito ao uso da consoante em posição pós-nuclear dentro de 
uma sílaba, ou seja, após a vogal, tal como o “r” em “mar” e em “perfeito”, por exemplo. 
FIM DO BOXE PARA SABER MAIS 
 
Vamos começar pelo caso da palatização de “t” e “d” depois das vogais “i”. Essa 
ocorrência costuma ser comum em regiões do Nordeste e, em pesquisa de 2008, Santos e 
Mota estudaram o fenômeno em três capitais nordestinas (Salvador, Maceió e Aracaju) a 
partir de dados do Atlas Linguístico Brasileiro (ALiB), obra da qual já falamos na aula 05. 
 
Em palavras como “muito” e “doido”, é comum que as consoantes sofram palatização, 
passando a [tʃ] e [dʃ], em pronúncias como “muntcho” e “dodjo”, quando são denominadas 
africadas baianas. 
 
Os informantes foram distribuídos em dois grupos, segundo a faixa etária (a primeira de 18 
a 30 anos, e a segunda de 50 a 65 anos), segundo o sexo e o nível de escolaridade 
(fundamental e universitário). Partindo do princípio de que as variações não são aleatórias, 
observaram-se elementos linguísticos e extralinguísticos que poderiam interferir na 
pronúncia dental-alveolar ou palatalizada das consoantes. Entre os primeiros, estavam, por 
exemplo, fatores como o vozeamento da consoante, a vogal da sílaba antecedente, a classe 
22 
morfológica do vocábulo e o tipo de oração; já entre os segundos, a diatopia, a 
escolaridade, o gênero e a faixa etária do informante. 
 
Entre os resultados, verificou-se que Maceió concentra o maior número de casos de 
palatalização, sobretudo entre os informantes da segunda faixa etária, isto é, os mais velhos. 
Percebeu-se que também em Aracaju os mais velhos tendem à palatalização, ao passo que, 
em Salvador, a tendência é que os mais jovens apresentem esse comportamento. 
 
O gênero masculino e feminino não foi relevante para a alteração dos resultados, mas o 
fator escolaridade revelou diferentes resultados de acordo com a capital. Em Maceió, não 
houve diferenças entre o grupo do ensino fundamental e o do ensino superior, ao passo que, 
em Aracaju e Salvador, os informantes de nível fundamental apresentaram mais variantes 
palatalizadas. 
 
Entre os fatores linguísticos enfocados, o tipo de oração se mostrou relevante no recorte 
observado. Viu-se que, em orações exclamativas, a palatalização das consoantes “t” e “d” 
foi mais frequente que em orações não exclamativas. Um exemplo seria a frase exclamativa 
“Eitcha, você está dodjo!”. (op.cit., p. 4). 
 
Outra pesquisa recente, datada de 2014, dedicou-se ao estudo do “r” e suas variações em 
final de sílaba, associado à sua avaliação social e cultural por falantes universitários da 
região de Jacarezinho, Paraná. 
 
Na pesquisa, foram ouvidos quatro falantes do Curso de Letras da Universidade Estadual 
do Norte do Paraná, campus Jacarezinho, entre os quais dois professores, um homem e uma 
mulher, e dois estudantes do primeiro ano, também um homem e uma mulher. 
 
Considerando que todos eram naturais do Jacarezinho, cidade do interior do Paraná em que 
a pronúncia do “r” caipira predomina, buscou-se descrever, a partir de diferentes 
questionários, qual era a tendência de pronúncia do “r” no grupo estudado, bem como sua 
23 
avaliação e crenças sobre o falar típico da região. Entre as pronúncias possíveis, 
relacionaram-se: o retroflexo, [ɹ]; o tepe, [ɾ]; o velar, [Χ], o apagamento [Ø] e o R rótico 
(típico da fala caipira em início de frase). 
 
Entre os principais resultados, verificou-se que, dos quatro informantes, a mulher e 
professora universitária (informante A), que realizou especialização fora do país e já residiu 
em Curitiba e Rio de Janeiro, esforçou-se para monitorar a pronúncia do “r” retroflexo, 
realizando-o, quase sempre, como o velar. Entre os demais informantes, percebeu-se a 
tendência ao “r” retroflexo ou, em alguns casos, ao apagamento da consoante, o que 
também sinalizava certo grau de monitoramento em sua fala. 
 
Quanto à avaliação dos informantes a respeito da fala local, também se notou, no discurso 
da informante A, uma tendência a um olhar qualitativo e negativo acerca da realização do 
“r” retroflexo, que ela associa a um falar “feio” ou “menos culto”. Ela própria relata, ainda, 
durante a obtenção dos dados da pesquisa, ter sido reprimida, quando criança, por seus 
avós, para que evitasse tal pronúncia. Entre os outros informantes, houve certa variação nas 
respostas, mas, em geral, também se reforçaram ideias cristalizadas e preconceituosas, 
como a de que os falantes mais velhos é que usam a gramática da língua corretamente, por 
exemplo, e a de que existe um falar “melhor” em oposição a um “pior”. 
 
Ao final do estudo, destaca-se a relevância de se investigarem as crenças que se têm sobre o 
uso e a variação linguística, pois esse conhecimento serve de base para um ensino mais 
democrático e proveitoso. Além disso, permite a professores e alunos lidar, de forma menos 
preconceituosa, com as possibilidades igualmente legítimas de uso da língua, que também 
funcionam como marcas identitárias dos grupos a que se vinculam. 
 
BOXE PARA SABER MAIS 
Quer saber mais? Leia os dois artigos aqui mencionados e conheça mais detalhes sobre os 
dados e a metodologiada pesquisa sociolinguística. As informações sobre os textos estão 
nas referências. 
24 
FIM DO BOXE PARA SABER MAIS 
 
ATIVIDADE 04 
 
Nos respectivos estudos de Dias (2014) e de Santos e Mota (2008), qual foi a influência do 
fator escolaridade na variação da pronúncia da consoante lateral “r” e também na 
palatalização das consoantes dental-alveolares? (10 linhas) 
 
Resposta comentada: No estudo de Dias (2014), observou-se que, em diferentes graus, 
houve a tendência a um maior monitoramento/controle da variante retroflexa, socialmente 
estigmatizada e típica da região do Jacarezinho, local da pesquisa. Uma das informantes 
procurou realizá-lo como um “r” velar, comum na região do Rio de Janeiro, por exemplo, 
ao passo que outros o apagaram em algumas situações. Já no estudo de Santos e Mota 
(2008), a variável escolaridade não alterou a tendência à palatalização de “t” e “d” depois 
da vogal alta em Maceió, ao passo que um menor grau de escolaridade foi relacionado a 
uma maior tendência à palatalização das consoantes dental-alveolares em Aracaju e 
Salvador. 
 
5. Variações e preconceito em níveis, o caso sintático 
 
Resta, agora, observar como a variação diastrática se manifesta no plano sintático com mais 
detalhes. Já falamos, no início desta aula, sobre o caso da variação na concordância 
nominal e verbal no português brasileiro, que oscila entre o polo da variação e da mudança. 
 
Que tal pensarmos agora em outro fenômeno cada vez mais comum no português do Brasil: 
o caso da flutuação entre “nós” e “a gente”, bem como a alternância que pode ser observada 
quanto à concordância verbal nesse mesmo contexto? 
 
Em exame comparativo entre duas capitais nordestinas, João Pessoa e Teresina, Ferreira e 
Cardoso (2008) estudaram, com base nos dados do ALiB, grupos de informantes em 
25 
diferentes faixas etárias e níveis de escolaridade: um de 18 a 35 anos e outro de 50 a 65 
anos; um com o nível fundamental e outro com o nível universitário. Para fins de 
comparação, as pesquisadoras também consultaram gramáticas e livros didáticos e 
verificaram que, apesar do seu emprego corrente no português, a descrição de a gente como 
uma possibilidade de substituição para a primeira pessoa do plural não aparece na maioria 
das obras. 
 
Os resultados da pesquisa revelaram que, em ambas as cidades, houve maior ocorrência da 
variante a gente na função sujeito. De forma geral, em relação à idade dos informantes, 
houve ligeira predominância do uso de “nós” pelos mais velhos. Já quanto ao empego de “a 
gente”, houve maior equilíbrio entre as faixas etárias em João Pessoa, e um uso bem mais 
frequente entre os jovens em Teresina. 
 
Com relação ao grau de escolaridade, o uso de “a gente” predominou entre os informantes 
do nível fundamental em Teresina e, em João Pessoa, o uso de “a gente” prevaleceu tanto 
no nível fundamental quanto no universitário. O fator sexo parece não ter sido relevante 
para o uso de uma ou outra forma nas duas cidades. 
 
Em outro trabalho, realizado por Souza e Botassini em 2009, podemos obter mais dados 
relacionados à alternância das duas formas no português do Brasil, estudado no estado de 
São Paulo. Para o exame da variável dependente “representação da primeira pessoa do 
plural”, o estudo levou em conta a faixa etária dos falantes, divididos em dois grupos (de 18 
a 30 anos, e de 50 a 65 anos) e o sexo, masculino e feminino. Quanto à escolaridade, todos 
os falantes apresentavam o quinto ano do nível fundamental. 
 
As autoras partem da explicação sobre a gramaticalização do termo “a gente”, que, de uma 
locução nominal plena passou a ser considerado um pronome de sentido indeterminador. 
Como tal, assumiu funções específicas na língua, substituindo o pronome “nós”, por 
exemplo, mas mantendo a mesma concordância gramatical de um elemento de terceira 
pessoa. 
26 
BOXE PARA SABER MAIS: 
Você deve se lembrar do conceito de gramaticalização, não é? Para refrescar a memória, 
reveja e revise a aula 7 deste curso, intitulada “Gramaticalização e mudança linguística”. 
FIM DO BOXE PARA SABER MAIS: 
 
As autoras constatam que, apesar de a tradição gramatical ainda apresentar os seis 
pronomes (eu, tu, ele, nós, vós, eles), o uso linguístico revela a coexistência das formas 
“nós” e “a gente” para a primeira pessoa do plural, inclusive no uso de falantes 
considerados mais cultos. 
 
Apesar de a alternância já não ser alvo de muita estigmatização social, os resultados 
também apontaram para a mistura, socialmente estigmatizada, da concordância com tais 
variantes: “a gente vamos” e “nós vai”. Do total de ocorrências investigadas (230 casos), as 
pesquisadoras encontraram 51 casos de “nós” com verbo em terceira pessoa do singular e 
três casos de “a gente” com verbos terminados em -mos, como em “Nóis fica em casa...” e 
“Aí tem uma prainha lá, tudo, a gente ficamo lá,...”, respectivamente. (op. cit., p. 4). 
 
A ocorrência do tipo “a gente vamos” poderia ser interpretada como um caso de 
hipercorreção, em que o falante percebe a noção de plural em “a gente” e faz a 
concordância plural no verbo. Já a concordância do tipo “nós vai” poderia ser interpretada 
como uma questão de economia, pelo fato de o falante já usar e perceber a marca de plural 
no pronome “nós” sem que tenha que aplicá-la também ao verbo. Isso também estaria de 
acordo com a simplificação do quadro de conjugação verbal que parece estar em curso no 
português brasileiro. A tabela abaixo, adaptada de Duarte (1993 apud Souza e Botassini, 
2009, p.5), ilustra esse percurso: 
 
 
 
 
 
27 
PESSOA NÚMERO PARADIGMA 1 PARADIGMA 2 PARADIGMA 3 
1ª EU singular cant-o cant-o cant-o 
2ª TU singular canta-s ---------------- ---------------- 
2ª VOCÊ singular canta-0 canta-0 canta-0 
3ª ELE/ELA singular canta-0 canta-0 canta-0 
1ª NÓS plural canta-mos canta-mos canta-0 
2ª VÓS plural canta-is ----------------- ----------------- 
2ª VOCÊS plural canta-m canta-m canta-m 
3ª ELES/ELAS plural canta-m canta-m canta-m 
 
A evolução do quadro flexional em português brasileiro – 
Tabela adaptada de Duarte (1993 apud Souza e Botassini, 2009, p. 5) 
 
A tabela mostra que, de um quadro de seis formas pronominais, passa-se a um quadro em 
que “tu” e “vós” desaparecem, e permanecem, para a segunda pessoa, “você” e “vocês”, 
com a concordância equivalente a “ele”/”ela”, ao lado de “eu”, “nós” e “eles”. Esse 
conjunto parece estar em concorrência com um ainda mais simples, em que “nós” cede 
lugar a “a gente” e a concordância verbal passa a apenas três formas: primeira pessoa do 
singular e terceira pessoa do singular e do plural. 
 
Em relação aos outros resultados da pesquisa, percebeu-se que tanto homens quanto 
mulheres empregam a forma mais inovadora “a gente”, ainda que sua maior ocorrência 
esteja entre as mulheres. Quanto às duas faixas etárias estudadas, ao contrário de estudos 
mais antigos em que se associava o uso mais tradicional aos mais velhos, o uso de “nós” e 
de “a gente” se mostrou bastante frequente entre os dois grupos, o que parece indicar um 
caso de variação estável e não de mudança em curso para o contexto específico estudado. 
 
BOXE PARA SABER MAIS: 
Não deixe de ler os textos citados para aprofundar os seus conhecimentos sobre o assunto. 
Confira os dados completos nas referências. 
FIM DO BOXE PARA SABER MAIS 
 
28 
ATIVIDADE 05 
Do ponto de vista sociolinguístico, como devemos entender as variantes lexicais, fonéticas 
e sintáticas relacionadas a fatores sociais? (10 linhas) 
 
Resposta comentada: Com base nas pesquisas sociolinguísticas, entendemos que todos os 
usos que os falantes fazemda língua não são caóticos, e sim sistemáticos, previstos pelo 
próprio funcionamento da língua, que, pelo seu dinamismo, interage e sofre influências de 
aspectos internos e externos ao sistema. Embora todos os usos sejam legítimos, há casos em 
que as variantes lexicais, fonética e/ou sintáticas acabam sendo alvo de julgamentos e 
avaliações qualitativas, o que gera preconceito linguístico. Como vimos, isso resulta, na 
maioria das vezes, de questões sociais e econômicas mais amplas que acabam sendo 
transferidas para o uso linguístico que determinados grupos apresentam. Como a língua é 
cultura e identidade, é importante não assumir uma postura discriminatória, e sim descritiva 
e interpretativa, assim como as pesquisas aqui relacionadas, a fim de que possamos 
compreender os fatores tanto linguísticos quanto extralinguísticos que condicionam as 
variações e impulsionam as mudanças na língua. 
 
Para a próxima Aula 
 
Nesta aula, você estudou a variação sociolinguística diastrática, observando como as 
questões identitárias fazem parte de uma língua natural. Para fazermos isso, trouxemos 
algumas pesquisas da sociolinguística a fim de compreendermos como os estudiosos dão 
tratamento a língua em uso. Ao abordamos a polarização da variação padrão e não padrão, 
pudemos refletir sobre os apagamentos das identidades inscritas na língua natural que são 
realizados para se atingir uma abstração ideológica. 
 
Na aula seguinte, vamos estudar as variantes socioculturais e nos ateremos mais 
detidamente aos fatores relacionados a elas. 
 
 
29 
Referências bibliográficas: 
BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística. 
São Paulo: Parábola, 2007. 
 
BARONAS, Joyce Elaine de Almeida; OLIVEIRA, Elaine Vitorino de Moura. A 
identidade adolescente e a variação linguística. Polifonia, Cuiabá, MT, v. 18, n. 23, p. 193-
208, jan./jun. 2011. 
 
DIAS, Luiz Antonio Xavier. Crenças e atitudes linguísticas no uso dos róticos de 
professores e professorandos de Jacarezinho – PR. Entrepalavras, Fortaleza, ano 4, v. 4, n. 
2, p. 90-104, jul./dez. 2014. 
 
FERREIRA, Viviane de Jesus Ferreira; CARDOSO, Suzana Alice Marcelino da Silva. Os 
pronomes pessoais-sujeito no português do Brasil: nós e a gente segundo os dados do 
Projeto Atlas Linguístico do Brasil. III Seminário de Pesquisa em Estudos Linguísticos, v. 
3, n.1, 2008. 
 
LUCCHESI, Dante. Norma linguística e realidade social. In: BAGNO, Marcos (Org.). 
Linguística da norma. São Paulo: Loyola, 2002. 
 
MOLLICA, Maria Cecília; BRAGA, Maria Luiza (Orgs.). Introdução à sociolinguística: o 
tratamento da variação. São Paulo: Contexto, 2003. 
 
OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-
histórico. São Paulo: Scipione, 1997. 
 
PINHO, Antonio José de; MARGOTTI, Felício Wessling. Aspectos de variação lexical no 
sul do Brasil: o demônio varia no sul? Interdisciplinar, Sergipe, ano IV, v. 9, p. 51-66, 
ago./dez. 2009. 
 
30 
SANTOS, Andréa Mafra Oliveira dos; MOTA, Jacyra Andrade. A variação diastrática no 
português do Brasil: Palatalização das oclusivas dento-alveolares em Inquéritos do projeto 
atlas linguístico do Brasil (AliB). III Seminário de Pesquisa em Estudos Linguísticos, vol. 
3, n. 1, 2008. 
 
SCHERRE, Pereira Maria Marta. Reanálise da concordância nominal no português. Tese 
de Doutorado. Rio de Janeiro: UFRJ, 1988. 
 
SILVA, Rosa Virgínia Mattos e. O português são dois: novas fronteiras, velhos problemas. 
São Paulo: Parábola, 2004. 
 
SOUZA, Adriana dos Santos; BOTASSINI, Jacqueline Ortelan Maia. A variação no uso 
dos pronomes-sujeito nós e a gente. Anais do SILEL, Uberlândia: v. 1. Uberlândia: 
EDUFU, 2009. 
 
VOTRE, Sebastião José. Relevância da variável escolaridade. In: MOLLICA, Maria 
Cecília; BRAGA, Maria Luiza (Orgs.). Introdução à sociolinguística: o tratamento da 
variação. São Paulo: Contexto, 2003, p. 51-57

Continue navegando