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Trabalho de Direito Constitucional I Ações Constitucionais

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Trabalho de Direito Constitucional I
As Ações Constitucionais: Síntese
Aluno: Malone Ferreira Pena N. Insc: 201610990022
Universidade Federal do Amapá
1. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
O monopólio de ação outorgado ao Procurador​-Geral da República no sistema de 1967/69 não provocou uma alteração profunda no modelo incidente ou difuso. Este continuou predominante, integrando​-se a representação de inconstitucionalidade a ele como um elemento ancilar, que contribuía muito pouco para diferençá​-lo dos demais sistemas “difusos” ou “incidentes” de controle de constitucionalidade.
Nos termos do art. 103 da Constituição de 1988, dispõem de legitimidade para propor a ação de inconstitucionalidade o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa da Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa, o Governador de Estado ou do Dis​trito Federal, o Procurador​-Geral da República, o Conselho Federal da Or​dem​ dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso​Nacional, as confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.
Com a introdução desse sistema de controle abstrato de normas, dotado de ampla legitimação e, particularmente, com a outorga do direito de propositura a diferentes órgãos da sociedade, pretendeu o constituinte reforçar o controle abstrato de normas no ordenamento jurídico brasileiro como peculiar instrumento de correção do sistema geral incidente.
Assim, se se cogitava, já no sistema da Constituição de 1967/69, de um modelo misto de controle de constitucionalidade, é certo que o forte acento residia, ainda, no amplo e dominante sistema difuso de controle. O controle direto ou abstrato continuava a ser algo acidental e episódico dentro do sistema difuso.
Não é menos certo, por outro lado, que a ampla legitimação conferida ao controle abstrato, com a inevitável possibilidade de se submeter qualquer questão constitucional ao Supremo Tribunal Federal, operou uma mudança substancial – ainda que não desejada – no modelo de controle de constitucionalidade até então vigente no Brasil.
A Constituição de 1988 reduziu o significado do controle de constitucionalidade incidental ou difuso, ao ampliar, de forma marcante, a legitimação para propositura da ação direta de inconstitucionalidade (art. 103), permitindo que muitas controvérsias constitucionais relevantes sejam submetidas ao Supremo Tribunal Federal mediante processo de controle abstrato de normas.
Portanto, parece quase intuitivo que, por essa forma, acabou o constituinte por restringir, de maneira radical, a amplitude do controle difuso de constitucionalidade.
A ampla legitimação, a presteza e a celeridade processual do modelo abstrato, dotado inclusive da possibilidade de suspender imediatamente a eficácia do ato normativo questionado, mediante pedido de cautelar, fazem com que as grandes questões constitucionais sejam solvidas, na sua maioria, mediante a utilização da ação direta, típico instrumento do controle concentrado.
2. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
2.1. Legitimação para agir e capacidade postulatória
Tal como assinalado, nos termos do art. 103 da CF de 1988, dispõem de legitimidade para propor a ação direta de inconstitucionalidade o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa de uma Assembleia Legislativa, o Governador de Estado, o Governador do Distrito Federal, o Procurador​-Geral da República, o Conselho Federal da OAB, partido político com representação no Congresso Nacional e as confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.
A extensa lista de legitimados presentes no texto constitucional fortalece a impressão de que o constituinte pretendeu reforçar o controle abstrato de normas no ordenamento jurídico brasileiro, como peculiar instrumento de correção do sistema geral incidente.
Quanto à capacidade postulatória, entende o Supremo Tribunal Federal que “o Governador do Estado e as demais autoridades e entidades referidas no art. 103, incisos I a VII, da Constituição Federal, além de ativamente legitimados à instauração do controle concentrado de constitucionalidade das leis e atos normativos, federais e estaduais, mediante ajuizamento da ação direta perante o Supremo Tribunal Federal, possuem capacidade processual plena e dispõem, ex vi da própria norma constitucional, de “capacidade postulatória”, podendo subscrever a peça inicial sem auxílio de advogado. Os partidos políticos e as confederações sindicais e entidades de classe não dispõem, segundo esse entendimento, de capacidade postulatória, devendo estar representados no processo por profissional da advocacia.
Advirta​-se, ademais, que, segundo orientação dominante no Tribunal, da procuração outorgada a advogado para propositura da ADI devem constar, expressamente, a indicação das normas a serem impugnadas.
Assim, com exceção das confederações sindicais e entidades de classe de âmbito nacional e dos partidos políticos (CF/88, art. 103, VIII e IX), todos os demais legitimados para a ADI dispõem de capacidade postulatória especial.
3. A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
É possível que a problemática atinente à inconstitucionalidade por omissão constitua um dos mais tormentosos e, ao mesmo tempo, um dos mais fascinantes temas do direito constitucional moderno. Ela envolve não só a questão concernente à concretização da Constituição pelo legislador e à eficácia das normas constitucionais. A ADO desafia também a argúcia do jurista na solução do problema sob uma perspectiva estrita do processo constitucional. Quando se pode afirmar a caracterização de uma lacuna inconstitucional? Quais as possibilidades de colmatação dessa lacuna? Qual a eficácia do pronunciamento da Corte Constitucional que afirma a inconstitucionalidade por omissão do legislador? Quais as consequências jurídicas da sentença que afirma a inconstitucionalidade por omissão?
O constituinte de 1988 emprestou significado ímpar ao controle de cons​titucionalidade da omissão com a instituição dos processos de mandado de injunção e da ação direta da inconstitucionalidade por omissão. Como essas inovações não foram precedidas de estudos criteriosos e de reflexões mais apro​fundadas, afigura​-se compreensível o clima de insegurança e perplexidade que elas acabaram por suscitar nos primeiros tempos.
É, todavia, salutar o esforço que se vem desenvolvendo, no Brasil, para definir o significado, o conteúdo, a natureza desses institutos. Todos os que, tópica ou sistematicamente, já se depararam com uma ou outra questão atinen​te à omissão inconstitucional, hão de ter percebido que a problemática é de transcendental importância não apenas para a realização de diferenciadas e legítimas pretensões individuais. Ela é fundamental sobretudo para a concretização da Constituição como um todo, isto é, para a realização do próprio Estado de Direito democrático, fundado na soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho, da iniciativa privada, e no pluralismo político, tal como estabelecido no art. 1º da Carta Magna. Assinale​-se, outrossim, que o estudo da omissão inconstitucional é indissociável do estudo sobre a força normativa da Constituição.
Não obstante o hercúleo esforço da doutrina e da jurisprudência, muitas questões sobre a omissão inconstitucional continuam em aberto, ou parecem não ter encontrado, ainda, uma resposta adequada.
Esse estado de incerteza decorre, em parte, do desenvolvimento de uma “teoria da omissão inconstitucional”. Aqueles que quiserem se aprofundar no exame do tema perceberão que seu estudo sistemático constituía, até muito pouco tempo, monopólio da dogmática constitucional alemã. Esse aspecto contribuiu, sem dúvida, para que a questão fosse tratada, inicialmente, como quase uma excentricidade do modelo constitucional desenvolvido a partir da promulgação da Lei Fundamental de Bonn.
Observe​-se, contudo, que o reconhecimento da inconstitucionalidadepor omissão configura fenômeno relativamente recente também na dogmática jurí​dica alemã.
Em 1911, ressaltava Kelsen que a configuração de um dever do Estado de editar determinada lei afigurava​-se inadmissível640. Anteriormente, reconhecera Georg Jellinek que a impossibilidade de formular pretensão em face do legislador constituía communis opinio641. Sob o império da Constituição de Weimar (1919) negava​-se, igualmente, a possibilidade de se formular qualquer pretensão contra o legislador. Esse entendimento assentava​-se, de um lado, na ideia de uma irrestrita liberdade legislativa e, de outro, na convicção de que o legislador somente atuava no interesse da coletividade.
Essa questão sofreu significativa mudança com o advento da Lei Fundamental de 1949. A expressa vinculação do legislador aos direitos fundamentais (art. 1º, par. 3º) e à Constituição como um todo (art. 20, III) estava a exigir o desenvolvimento de uma nova concepção. Já em 1951 passou a doutrina a admitir, pela voz eloquente de Bachof, a possibilidade de responsabilização do Estado em virtude de ato de índole normativa643, caracterizando uma ruptura com o entendimento até então vigente, baseado na própria jurisprudência do Reichsgericht. Bachof rejeitava, porém, uma pretensão à edição de uma lei por entender que isso seria incompatível com o princípio da divisão de Poderes.
A Corte Constitucional alemã viu​-se compelida a arrostar questão atinente à omissão do legislador logo no seu primeiro ano de atividade.
Na decisão de 19-12-1951, o Tribunal negou a admissibilidade de recurso cons​titucional contra omissão do legislador, que, segundo alegado, fixara a pensão previdenciária em valor insuficiente para a satisfação das necessidades bási​cas de uma família. Segundo o entendimento então esposado pela Corte, os postulados contidos na Lei Fundamental não asseguravam ao cidadão, em princípio, qualquer pretensão a uma atividade legislativa suscetível de ser perseguida mediante recurso constitucional.
As decisões proferidas em 20​-2​-1957 e em 11​-6​-1958 estavam a sinalizar a evolução jurisprudencial que haveria de ocorrer. Na primeira decisão, proferida em processo de recurso constitucional, a Corte Constitucional alemã admitiu, expressamente, o cabimento de medida judicial contra omissão parcial do le​gislador, reconhecendo que, ao contemplar determinado grupo ou segmento no âmbito de aplicação de uma norma, o legislador poderia atentar contra o princípio da isonomia, cumprindo, de forma defeituosa, dever constitucional de legislar647. Na decisão de 11​-6​-1958, também proferida em recurso constitucional648 impetrado contra lei federal que fixava a remuneração de funcionários públicos, a Corte declarou que, embora não estivesse legitimada a fixar os vencimentos de funcionários públicos, dispunha ela de elementos sufi​cientes para cons​tatar que, em virtude da alteração do custo de vida, os valores estabelecidos na referida lei não mais correspondiam aos parâmetros mínimos exigidos pelo art. 33 (5) da Lei Fundamental649. Não se declarou aqui a nulidade do ato normativo, até porque uma cassação agravaria ainda mais o estado de inconstitucionalidade. O Tribunal li​mitou​-se a constatar a ofensa a direito constitucional dos impetrantes, em virtude da omissão legislativa.
Portanto, a jurisprudência da Corte Constitucional alemã identificou, muito cedo, que configura omissão inconstitucional não só o inadimplemento absoluto de um dever de legislar (omissão total), mas também a execução falha, defei​tuo​sa ou incompleta desse mesmo dever (omissão parcial). Assentou​-se, igualmente, que a lacuna inconstitucional poderia decorrer de uma mudança nas relações fáticas, configurando para o legislador imediato dever de adequação.
A identificação da omissão inconstitucional do legislador, no juízo de constitucionalidade, tornava imperioso o desenvolvimento de novas técnicas de decisão, que se afigurassem adequadas a eliminar do ordenamento jurídico essa peculiar forma de afronta à Constituição, sem violentar a própria sistemática constitucional consagrada na Lei Fundamental. A Corte Constitucional recusou, de plano, a possibilidade de substituir​-se ao legislador na colmatação das lacunas eventualmente identificadas, entendendo que a tarefa de concretização da Constituição foi confiada, primordialmente, ao legislador. Assim, tanto o princípio da divisão de Poderes, quanto o postulado da democracia obstavam a que os Tribunais se arrogassem ao direito de suprir lacunas eventual​mente identificadas.
Essa orientação fez com que o Tribunal desenvolvesse, como técnica de decisão aplicável aos casos de lacuna inconstitucional, a declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade (Unvereinbarerklärung). Trata​-se de decisão de caráter mandamental, que obriga o legislador a suprimir, com a possível presteza, o estado de inconstitucionalidade decorrente da omissão650. Essa forma de decisão, construída pela jurisprudência, foi incorporada à lei que disciplina o processo perante a Corte Constitucional.
Outra técnica de decisão, desenvolvida sobretudo para os casos de omissão inconstitucional, é o apelo ao legislador (Appellentscheidung), decisão na qual se afirma que a situação jurídica em apreço ainda se afigura constitucional, devendo o legislador empreender as medidas requeridas para evitar a consolidação de um estado de inconstitucionalidade. Essa técnica de decisão assumiu relevância ímpar nos casos da legislação pré​-constitucional incompatível com a Lei Fundamental. A cassação dessas leis pré​-constitucionais poderia levar, em muitos casos, a uma situação de autêntico caos jurídico. Daí ter a Corte Cons​titucional reconhecido que o legislador haveria de dispor de um prazo razoável para adaptar o direito ordinário à nova ordem constitucional, reconhecendo como ainda constitucional o direito anterior, que deveria ser aplicado nessa fase de transição. A doutrina constitucional mais moderna considera que o apelo ao legislador configura apenas uma decisão de rejeição de inconstitucionalidade, caracte​rizando​-se essa recomendação dirigida ao legis​lador como simples obiter dictum. Essa qualificação não retira a eficácia desse pronunciamento, não havendo, até agora, registro de qualquer caso de recalcitrância ou de recusa do legislador no cumprimento de dever constitucional de legislar atestado pela Corte Constitucional.
No Brasil, a ação direta por omissão teve até agora uma aplicação restrita. Pouco mais de uma centena de ações diretas de inconstitucionalidade por omissão foram propostas perante o Supremo Tribunal Federal.
4. HABEAS CORPUS
4.1 Considerações gerais
O habeas corpus configura proteção especial tradicionalmente oferecida no sistema constitucional brasileiro. Não constava, porém, da Constituição de 1824, tendo sido contemplado, inicialmente, no Código de Processo Criminal, de 1832, e posteriormente ampliado com a Lei n. 2.033, de 1871.
A Constituição de 1891 estabeleceu, no art. 72, § 22: “dar​-se​-á habeas corpus sempre que o indivíduo sofrer violência, ou coação, por ilegalidade, ou abuso de poder”.
A formulação ampla do texto constitucional deu ensejo a uma interpretação que permitia o uso do habeas corpus para anular até mesmo ato administrativo que determinara o cancelamento de matrícula de aluno em escola pública, para garantir a realização de comícios eleitorais, o exercício de profissão, dentre outras possibilidades565.
A propósito, observam Ada Pellegrini, Gomes Filho e Scarance Fernandes:
“Na verdade, três posições firmaram​-se com o advento da Constituição republicana: alguns, como Rui Barbosa, sustentavam que a garantia deveria ser aplicada em todos os casos em que um direito estivesse ameaçado, manietado, impossibilitado no seu exercício por abuso de poder ou ilegalidade; em sentido oposto, afirmava​-se que o habeas corpus, por sua natureza e origem histórica, era remédio destinado exclusivamente à proteção da liberdade de locomoção; e finalmente, uma terceira corrente, vencedora no seio do SupremoTribunal Federal, propugnava incluir na proteção do habeas corpus não só os casos de restrição da liberdade de locomoção, como também as situações em que a ofensa a essa liberdade fosse meio de ofender outro direito. Assim, exemplificava Pedro Lessa: quando se ofende a liberdade religiosa, obstando que alguém penetre no templo, tem cabimento o habeas corpus, pois foi embaraçando a liberdade de locomoção que se feriu a liberdade religiosa; quando se ofende a liberdade religiosa, porque se arrasam as igrejas, ou se destroem os objetos do culto, não é possível requerer o remédio, porque aí não está em jogo a liberdade de locomoção das pessoas”.
Esse desenvolvimento foi cognominado de “doutrina brasileira do habeas corpus”.
Em 1926, o habeas corpus teve seu âmbito de proteção reduzido, ficando vedada a sua aplicação para proteção de outros direitos que não a liberdade de ir e vir (“Dar​-se​-á habeas corpus sempre que alguém sofre violência por meio de prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade de locomoção”).
Todas as demais Constituições brasileiras, sem qualquer exceção, incorporaram a garantia do habeas corpus (Constituição de 1934, art. 113, n. 23; Constituição de 1937, art. 122, n. 16; Constituição de 1946, art. 141, § 23; Constituição de 1967/69, art. 150, § 20). Durante todo esse tempo, essa garantia somente foi suspensa pelo Ato Institucional n. 5, de 1968, no que concerne aos crimes políticos, contra a segurança nacional, contra a ordem econômica e social e contra a economia popular.
4.2. Âmbito de proteção - Considerações gerais
O habeas corpus destina​-se a proteger o indivíduo contra qualquer medida restritiva do Poder Público à sua liberdade de ir, vir e permanecer.
A jurisprudência prevalecente no STF é dominante no sentido de que não terá seguimento habeas corpus que não afete diretamente a liberdade de locomoção do paciente.
Em que pese a extensão e a amplitude que essa interpretação tem assumido, não impressiona, contudo, o argumento de que o habeas corpus é o meio adequado para proteger tão somente o direito de ir e vir do cidadão em face de violência, coação ilegal ou abuso de poder.
Outrossim, ressalte​-se que, se a coação à liberdade individual comumente advém de atos emanados do Poder Público, não se pode descartar a possibilidade da impetração de habeas corpus contra atos de particular568. Embora qualquer ato de particular que implique cerceamento à liberdade de locomoção de alguém possa configurar, em tese, o crime de sequestro ou cárcere privado (CP, art. 148), sanável, portanto, por meio de intervenção policial em favor da vítima, há situações em que a atuação da polícia pode não se mostrar viável, como no caso, por exemplo, de indevida internação em hospital, manicômio ou qualquer outro estabelecimento para fins de tratamento. O típico exemplo disso, citado por Nucci, é o da internação em hospital para doentes mentais, determinada por médico:
“Se alguém questionar a legitimidade dessa internação, acoimando-a de indevida, torna-se complicada a atividade da polícia, pois, para libertar a pretensa vítima, deveria invadir o local, desafiando a autoridade médica, sem muitos dados técnicos acerca disso. Se estiverem errados, os agentes policiais podem responder por abuso de autoridade. Diante disso, torna-se adequado impetrar habeas corpus contra o diretor do nosocômio, havendo a intervenção do juiz, que determinará ao médico não somente a apresentação do detido, como também a prestação de informações. Em face delas, poderá o magistrado decidir se a detenção é legal ou ilegal”.
Embora o habeas corpus seja, via de regra, uma ação individual, não parece haver impedimento para sua impetração na defesa de direitos coletivos, de forma semelhante ao que ocorre com o mandado de segurança. No entanto, há precedentes em sentido contrário.
O Superior Tribunal de Justiça registra julgados afastando o cabimento do writ em caráter coletivo.
Seguindo essa linha, a justiça do Distrito Federal negou-se a conhecer de habeas corpus impetrado em favor da coletividade indeterminada de motoristas particulares que usavam aplicativo de telefonia móvel para aceitar corridas (Uber), enquadrados pela administração local na contravenção de exercício irregular de atividade econômica – art. 47 da Lei de Contravenções Penais. Supostamente, os motoristas estariam exercendo irregularmente a profissão de taxista.
O cabimento da impetração de habeas corpus em caráter coletivo é objeto do Recurso Extraordinário 855.810, rel. Min. Dias Toffoli, impetrado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra decisão local que concedeu salvo conduto a guardadores autônomos de veículos para impedir a Polícia Civil, a Polícia Militar e a Guarda Municipal de deter ou autuar os flanelinhas sob a alegação de prática de contravenção ou exercício irregular da profissão. O recurso ainda não foi analisado.
Entende​-se que, por sua natureza, cuida​-se de ação sumaríssima, que, por isso, exige prova pré​-constituída, o que impede a sua utilização para superar situação de fato controvertida ou que demande dilação probatória. A jurisprudência já está pacificada no sentido de não ser possível, por meio da via processual estreita do habeas corpus, o revolvimento do conjunto fático​-probatório do feito. Assim, não se tem aceitado a viabilidade do writ, por exemplo, para examinar questão relativa à incidência de causa excludente de culpabilidade, para a análise de comprovação de indícios de autoria e materialidade do crime, para se aferir a importância ou não da prova para o caso concreto, para examinar a tipicidade da conduta do paciente (exce​tuados os casos de atipicidade manifesta, em especial nas hipóteses de aplicação do princípio da insignificância) ou para verificar-se a decisão dos jurados é ou não manifestamente contrária à prova dos autos.
A liberdade de locomoção há de ser entendida de forma ampla, não se limitando a sua proteção à liberdade de ir e vir diretamente ameaçada, como também a toda e qualquer medida de autoridade que possa afetá-la, ainda que indiretamente. Daí serem comuns as impetrações de habeas corpus contra instauração de inquérito criminal para tomada de depoimento, contra o indiciamento de determinada pessoa no inquérito policial, contra o recebimento de denúncia, contra decisão de pronúncia no âmbito do processo do Júri, contra a sentença condenatória.
A jurisprudência dominante sustenta ser inadmissível habeas corpus contra pena de multa, se ela não pode ser convertida em pena de prisão. Atualmente, a redação conferida pela Lei n. 9.268, de 1996, ao art. 51 do Código Penal veda expressamente a conversão da pena de multa em pena privativa de liberdade. Daí estar consagrado na Súmula 693 do Supremo Tribunal Federal que “não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada”.
Da mesma forma, considera​-se que as penas acessórias relativas à perda da função pública impostas em sentença condenatória não podem ser impugnadas em sede de habeas corpus.
Entende​-se, ainda, ser inadmissível o habeas corpus quando, por qualquer razão, já estiver extinta a pena privativa de liberdade (Súmula 695 do STF). Assim, segundo essa orientação, não cabe habeas corpus para obter reconhecimento de nulidade de processo em que a pena imposta já foi cumprida ou declarada extinta.
Essa orientação restritiva, embora compreensível em razão das características processuais do instituto, suscita dúvidas legítimas, uma vez que a condenação criminal tem consequências para a vida futura do paciente (questão de reincidência, maus antecedentes).
Assinale​-se, ainda, que, embora em relação às ações constitucionais de defesa da liberdade surja discussão sobre a titularidade da legitimidade passiva (se seria afeta à autoridade impetrada ou se ligada à pessoa jurídica de direito público a que ela pertence580), o habeas corpus permite sugerir que a relação se estabelece com o coator, que aqui tanto podeser órgão público como pessoa de direito privado.
O Supremo Tribunal Federal entende incabível o habeas corpus contra ato jurisdicional de seus ministros ou de seus órgãos fracionários.
Ressalte​-se, por último, que, tendo em vista sua característica de ação constitu​cional voltada para a defesa da liberdade, os juízes e tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso do processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal (art. 654, § 2º, do CPP). Trata​-se, portanto, de uma possibilidade de automático desempenho da proteção efetiva pelo Judiciário que extrapola, por definição, os rigores formais da noção processual da inércia da jurisdição.
5.1 MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO
Admite​-se expressamente o uso de mandado de segurança por partido político com representação no Congresso Nacional, organização sindical, entidade de classe ou por associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos direitos da totalidade ou parte de seus membros ou associados, (CF, art. 5º, LXX, a e b, e Lei n. 12.016/2009, arts. 21 e s.). A ação constitucional de mandado de segurança, portanto, está destinada tanto à proteção de direitos individuais como à tutela de direitos coletivos.
O mandado de segurança coletivo deverá ser impetrado na defesa de interesse de uma categoria, classe ou grupo, independentemente da autorização dos associados (art. 21, Lei n. 12.016/2009). Assim, dispõe a Súmula 629 do Supremo Tribunal Federal que “a impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes”. Diferentemente da hipótese contemplada pelo art. 5º, XXI, que trata de representação processual, a legitimidade das organizações sindicais, entidades de classe e associações, para impetração do mandado de segurança coletivo, é extraordinária, consistindo em típico caso de substituição processual.
Não se trata, dessa forma, de nova modalidade de ação constitucional, ao lado do mandado de segurança tradicional, mas de forma diversa de legitimação processual ad causam. Segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, “os princípios básicos que regem o mandado de segurança individual informam e condicionam, no plano jurídico​-processual, a utilização do writ mandamental coletivo”628, que, do mesmo mo​do, apenas será cabível na hipótese de direito líquido e certo violado por ato ilegal ou abuso de poder emanados de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Assim, também entende o Tribunal que “simples interesses, que não configuram direitos, não legitimam a válida utilização do mandado de segurança coletivo”.
Por outro lado, é preciso reconhecer que o regime de substituição processual conferido ao mandado de segurança para a tutela coletiva de direito líquido e certo deu novas dimensões ao writ, transformando​-o em verdadeira ação coletiva. Por isso, ao mandado de segurança coletivo serão aplicadas também as normas relativas às ações coletivas.
Quanto à legitimação dos partidos políticos, o Supremo Tribunal Federal tem entendido que o mandado de segurança coletivo poderá ser utilizado apenas para a defesa de direitos de seus filiados, observada a correlação com as finalidades institucionais e objetivos programáticos da agremiação.
Esse entendimento vem sendo contestado com boas razões. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado pelos partidos da oposição, em defesa de interesses difusos, ameaçados por atos do Poder Executivo.
A Lei n. 12.016/2009, que “disciplina o mandado de segurança individual e coletivo”, indica em sentido contrário. O parágrafo único do art. 21, específico da impetração em caráter coletivo, afirma que a ação pode ser manejada para tutela de direitos coletivos e individuais homogêneos, não mencionando os direitos difusos.
A leitura restritiva vem sendo criticada com excelentes argumentos. Teori Zavascki, em obra doutrinária, defende que os partidos políticos têm legitimidade ampla para manejar a ação, independentemente de vinculação com interesse de seus filiados. E vai além, sustentando que a ação pode ser manejada para a tutela de interesses difusos, ligados às finalidades do partido. Assim, um partido com programa voltado para a área ambiental poderá requerer a segurança contra ato ofensivo ao meio ambiente. Segundo defende Teori Zavascki, o “elo de relação e de compatibilidade” entre o interesse defendido e os “fins institucionais ou programáticos do partido político” seria o limite para a aferição do cabimento da ação.
Leonardo José Carneiro, José Afonso da Silva e Alexandre de Moraes também apontam no sentido do cabimento da impetração para a tutela de interesses difusos.
A concretização do dispositivo constitucional que prevê a legitimidade do uso do mandado de segurança coletivo por partido político ainda é uma obra em andamento. Os limites do art. 21 da Lei n. 12.016/2009 servem como indicativo, mas certamente não como limite das hipóteses de cabimento da ação. Tratando-se de garantia constitucional, não poderia o legislador restringir seus contornos para aquém de seu significado. Nesse sentido, leciona Alexandre de Moraes:
“A supremacia absoluta das normas constitucionais e a prevalência dos princípios que regem a República, entre eles, a cidadania e o pluralismo político como seus fundamentos basilares, obrigam o intérprete, em especial o Poder Judiciário, no exercício de sua função interpretativa, aplicar não só a norma mais favorável à proteção aos direitos humanos, inclusive aos direitos políticos, mas também eleger, em seu processo hermenêutico, a interpretação que lhes garanta a maior e mais ampla proteção; e, consequentemente, exigem a inconstitucionalidade, com a respectiva declaração de nulidade parcial, do caput do artigo 21 da Lei 12.016/09, no sentido de se excluir a restrição ao objeto do mandado de segurança coletivo ajuizado por partidos políticos tão somente à defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária”.
Uma solução que exclua a tutela de interesses difusos ou relacione necessariamente a vinculação da ação a interesse de seus integrantes é excessivamente restritiva. Como bem anotado por Teori Zavascki, “tal limitação implicaria não apenas o desvirtuamento da natureza da agremiação partidária – que não foi criada para satisfazer interesses dos filiados –, como também a eliminação, na prática, da faculdade de impetrar mandado de segurança coletivo”.
Por outro lado, é preciso ter cuidado para evitar que a ação confira uma legitimidade universal aos partidos políticos. O critério da finalidade partidária é uma limitação segura e correta.
Creio, porém, que a melhor interpretação ainda precisa ir um passo além. Aqui deve ser feito um paralelo com o mandado de segurança impetrado contra desvios no processo legislativo.
Atualmente, a jurisprudência do STF está pacificada no sentido de que “o parlamentar tem legitimidade ativa para impetrar mandado de segurança com a finalidade de coibir atos praticados no processo de aprovação de leis e emendas constitucionais que não se compatibilizam com o processo legislativo constitucional”.
Também aqui se afigura evidente que se cuida de uma utilização especial do mandado de segurança, não exatamente para assegurar direito líquido e certo de parlamentar, mas para resolver peculiar conflito de atribuições ou “conflito entre órgãos”.
Esse tipo de ação é um mecanismo de defesa institucional, uma salvaguarda das prerrogativas das minorias parlamentares contra abusos cometidos pela maioria.
Aqui pode ser construída solução paralela. A oposição tem claro interesse em levar ao Judiciário atos administrativos de efeitos concretos lesivos a direitos difusos.
E nosso sistema consagra a tutela de violações a direitos difusos como um valor a ser buscado, na perspectiva do acesso à jurisdição.
Logo, tenho por cabível a utilização do mandado de segurança coletivo pelos partidospolíticos, para a defesa de interesses difusos, ligados a suas finalidades institucionais, ou a desvios no poder exercido pela situação. O contrário ocorre em relação às organizações sindicais, entidades de classe e associações, que só poderão pleitear em juízo direito líquido e certo de seus próprios associados, porque o “objeto do mandado de segurança coletivo será um direito dos associados, independentemente de guardar vínculo com os fins próprios da entidade impetrante do writ, exigindo​-se, entretanto, que o direito esteja compreendido nas atividades exercidas pelos associados, mas não se exigindo que o direito seja peculiar, próprio, da classe”.
Portanto, para a configuração da legitimidade ativa ad causam das entidades de classe, basta que o interesse seja apenas de parcela da categoria, verificada a relação de pertinência temática entre o objeto da impetração e o vínculo associativo637. Tal orientação está hoje expressa na Súmula 630 do Supremo Tribunal Federal, que diz: “a entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria”638.
Em relação ao objeto do mandado de segurança coletivo, pode​-se afirmar que tal instrumento processual, na qualidade de ação coletiva, não visa apenas à tutela de direitos individuais (simples ou homogêneos), mas também de direitos coletivos639. No caso dos partidos políticos, afigura-se viável a tutela de interesses difusos, como afirmado.
Sobre o tema, é importante ainda mencionar que o Supremo Tribunal já teve oportunidade de afirmar que o Estado​-membro não dispõe de legitimação para propor mandado de segurança coletivo contra a União em defesa de supostos interesses da população residente na unidade federada, seja porque se cuide de legitimação restrita, seja porque esse ente político da federação não se configura propriamente como órgão de representação ou de gestão de interesse da população640.
Entende o Tribunal, também, que não se aplica, ao mandado de segurança coletivo, a exigência do art. 2º​-A da Lei n. 9.494/97, segundo o qual, “nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da Assembleia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços
5.1. Considerações preliminares
Na linha da especialização dos instrumentos de defesa de direitos individuais, a Constituição de 1988 concebeu o habeas data como instituto destinado a assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público e para permitir a retificação de dados, quando não se prefira fazê​-lo de modo sigiloso.
Concebido como instrumento de acesso aos dados constantes dos arquivos do Governo Militar, o habeas data acabou por se constituir em instrumento de utilidade relativa no sistema geral da Constituição de 1988. Talvez isso se deva, fundamentalmente, à falta de definição de um âmbito específico de utilização não marcado por contingências políticas.
É certo, porém, que uma reflexão livre sobre o tema há de indicar que o objeto protegido pelo habeas data só em parte traduz a preocupação hoje manifestada pela ideia de autodeterminação sobre dados pessoais desenvolvida em várias ordens constitucionais.
5.2 Âmbito de proteção
Tal como decorre da própria formulação constitucional, o habeas data destina​-se a assegurar o conhecimento de informações pessoais constantes de registro de bancos de dados governamentais ou de caráter público, podendo ensejar a retificação de dados errôneos deles constantes.
O texto constitucional não deixa dúvida de que o habeas data protege a pessoa não só em relação aos bancos de dados das entidades governamentais, como também em relação aos bancos de dados de caráter público geridos por pessoas privadas. Nos termos do art. 1º da Lei n. 9.507/97, são definidos como de caráter público “todo registro ou banco de dados contendo informações que sejam ou que possam ser transmitidas a terceiros ou que não sejam do uso privativo do órgão ou entidade produtoras ou depositárias das informações”. Tal compreensão abrange os serviços de proteção de crédito ou de listagens da mala direta663.
Como instrumento de proteção de dimensão do direito de personalidade, afigura​-se relevante destacar que os dados que devem ser conhecidos ou retificados se refiram à pessoa do impetrante e não tenham caráter genérico.
É interessante notar que, diferentemente do que se poderia esperar, o habeas data, na forma expressa na Constituição, ficou limitado, em princípio, ao conhecimento e à retificação de dados existentes em bancos de dados governamentais ou de caráter público.
Tal abordagem mostra um déficit de concepção no aludido instrumento proces​sual, ao revelar que talvez o objeto de proteção tenha acabado por ficar demasiadamente restrito (conhecimento ou retificação de dados).
Em verdade, a questão central que o instituto pretendeu arrostar assenta​-se, muito provavelmente, no plano do direito material, isto é, em saber em que condições e limites os dados pessoais – enquanto materializações do direito de personalidade – podem ser arquivados.
Além disso, o instituto também deve ser compreendido a partir da valorização do direito constitucional de acesso à informação, afigurando-se, portanto, um importante instrumento de accountability de que se vale o cidadão em face do Poder Público.
Acerca do seu âmbito material de proteção, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 673.707, considerou que o habeas data pode ser utilizado para a obtenção de dados próprios armazenados em cadastro utilizado pela receita estadual para fins de arrecadação tributária. O Tribunal afastou a tese de que esses dados seriam de uso exclusivo do Fisco por estarem abrangidos por sigilo fiscal. O relator do processo, Min. Luiz Fux, destacou que “a suposta ausência de caráter público não constitui argumento idôneo a impedir o acesso às informações e consequentemente indeferir o habeas data, haja vista ser o cadastro mantido por entidade governamental, qual seja, a Receita Federal, e não por pessoa privada” e que “argumentações de cunho técnico não podem solapar um direito subjetivo assegurado ao cidadão-contribuinte no texto constitucional”. Nos termos do voto condutor, foi reconhecida repercussão geral à tese de que “o habeas data é a garantia constitucional adequada para a obtenção dos dados concernentes ao pagamento de tributos do próprio contribuinte constantes dos sistemas informatizados de apoio à arrecadação dos órgãos da administração fazendária dos entes estatais”.
5.3 Conformação e limitação
Por definição, o habeas data contempla uma fase extrajudicial, destinada a obter as informações junto ao órgão ou entidade responsável pelo banco de dados. Questão controvertida diz respeito ao conhecimento de informações sigilosas.
Nos termos do art. 5º, XXXIII, o acesso a informações de órgãos públicos não abrange aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
Evidentemente, tal ressalva não pode ser banalizada, sob pena de se tornar inócua a garantia de que se cuida. Ademais, dados de caráter pessoal não podem, em princípio, estar cobertos pelo sigilo em relação ao próprio sujeito
6.1 MANDADO DE INJUNÇÃO
7.2. CONSIDERAÇÕES GERAIS
A Constituição de 1988 abriu a possibilidade para o desenvolvimento sistemático da declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade, na medida em que atribuiu particular significado ao controle de constitucionalidade da chamada omissão do legislador.
O art. 5º, LXXI, da Constituição previu, expressamente, a concessão do mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora tornar inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, àsoberania e à cidadania. Como bem revela estudo sobre a origem do mandado de injunção, o instituto foi criado com vistas a sanar o problema da ineficácia das disposições constitucionais que concediam direitos sociais, em particular daquelas definidoras das obrigações estatais no plano da educação pública. Daí ser correto afirmar que o mandado de injunção surgiu “a partir da necessidade de elaborar​-se instituto jurídico​-processual, com assento na Constituição, para a defesa do direito à Educação” 717. A regulamentação do permissivo constitucional se deu com a edição da Lei n. 13.300, de 23 de junho de 2016, que disciplinou o processamento e o julgamento dos mandados de injunção individual e coletivo.
Ao lado desse instrumento destinado, fundamentalmente, à defesa de direitos individuais contra a omissão do ente legiferante, introduziu o constituinte, no art. 103, § 2º, um sistema de controle abstrato da omissão.
Assim, reconhecida a procedência da ação, deve o órgão legislativo competente ser informado da decisão, para as providências cabíveis. Se se tratar de órgão administrativo, está ele obrigado a colmatar a lacuna dentro do prazo de trinta dias.
7.3. NOÇÕES PRELIMINARES
A adoção do mandado de injunção e do processo de controle abstrato da omissão tem dado ensejo a intensas controvérsias na doutrina. O conteúdo, o significado e a amplitude das decisões proferidas nesses processos vêm sendo analisados de forma diferenciada pela doutrina e jurisprudência.
Alguns nomes da literatura jurídica sustentam que, como as regras constantes do preceito constitucional que instituiu o mandado de injunção não se afiguravam suficientes para possibilitar a sua aplicação, ficava sua utilização condicionada à promulgação das regras processuais regulamentadoras. Outros doutrinadores afirmam que, sendo o mandado de injunção instrumento dirigido contra omissão impeditiva do exercício de direitos constitucionalmente assegurados, competiria ao juiz proferir decisão que contivesse regra concreta destinada a possibilitar o exercício do direito subjetivo em questão719. Uma variante dessa corrente acentua que a decisão judicial há de conter uma regra geral, aplicável não apenas à questão submetida ao Tribunal, mas também aos demais casos semelhantes720.
Segundo essa concepção, o constituinte teria dotado o Tribunal, excepcionalmente, do poder de editar normas abstratas, de modo que essa atividade judicial apresentaria fortes semelhanças com a atividade legislativa. Para superar as dificuldades que decorrem dessa concepção, procura​-se restringi​-la, afirmando​-se que se o direito subjetivo depender da organização de determinada atividade ou de determinado serviço público ou, ainda, da disposição de recursos públicos, então deverá ser reconhecida a inadmissibilidade do mandado de injunção. Assim, não poderia o mandado de injunção ser proposto com vistas a garantir, v. g., o pagamento do seguro​-desemprego.
É interessante registrar a manifestação de Calmon de Passos a propósito do tema:
“Entendemos, entretanto, descaber o mandado de injunção quando o adimplemento, seja pelo particular, seja pelo Estado, envolve a organização prévia de determinados serviços ou a alocação específica de recursos, porque nessas circunstâncias se faz inviável a tutela, inexistentes os recursos ou o serviço, e construir​-se o mandado de injunção como direito de impor ao Estado a organização de serviços constitucionalmente reclamados teria implicações de tal monta que, inclusive constitucionalmente, obstam, de modo decisivo, a pertinência do mandamus na espécie. Tentarei um exemplo. O seguro​-desemprego. Impossível deferi​-lo mediante o mandado de injunção, visto como ele é insuscetível de atribuição individual, sem todo um sistema (técnico) instalado e funcionando devidamente. Também seria inexigível do sujeito privado uma prestação inapta a revestir​-se do caráter de pessoalidade reclamada na injunção, como, por exemplo, a participação nos lucros da empresa. A competência deferida ao Judiciário, de substituir​-se ao Legislativo para edição da norma regulamentadora, não derroga todos os preceitos que disciplinam a organização política do Estado, sua administração financeira, as garantias orçamentárias e a definição de políticas e de estratégias de melhor aplicação dos dinheiros públicos alocados para atendimento das necessidades de caráter geral”.
Uma corrente diversa entende que o mandado de injunção destina​-se, tão somente, a aferir a existência de omissão que impede o exercício de um direito constitucionalmente assegurado. A pronúncia de sentença de conteúdo normativo revelar​-se​-ia, por isso, inadmissível. Segundo esse entendimento, as decisões que o Supremo Tribunal Federal profere na ação de mandado de injunção e no processo de controle abstrato da omissão têm caráter obrigatório ou mandamental.
A expectativa criada com a adoção desse instituto no ordenamento constitucional brasileiro levou à propositura de inúmeras ações de mandado de injunção perante o Supremo Tribunal Federal, o que acabou por obrigá​-lo, num curto espaço de tempo, a apreciar não só a questão relativa à imediata aplicação desse instituto, independentemente da promulgação de regras processuais próprias, como também a decidir sobre o significado e a natureza desse instituto na ordem constitucional brasileira.
Algumas das controvérsias relacionadas ao instituto encontram-se superadas com o advento da Lei n. 13.300, de 23 de junho de 2016.
Quanto ao seu âmbito de proteção, o art. 2º do diploma legal dispôs que o mandado de injunção – individual ou coletivo – será cabível sempre que a falta total ou parcial de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Consagrou-se, portanto, a adequação dessa via para impugnar o não cumprimento de dever constitucional de legislar que, de alguma forma, afete direitos constitucionalmente assegurados.
O diploma legislativo também repisou que a mora do legislador pode se traduzir tanto em omissão absoluta ou total quanto em omissão parcial729. Na primeira hipótese, que se revela cada vez mais rara, tendo em vista o implemento gradual da ordem constitucional, tem-se a inércia do legislador que pode impedir totalmente a implementação da norma constitucional. A omissão parcial envolve, por sua vez, a execução parcial ou incompleta de um dever constitucional de legislar, que se manifesta seja em razão do atendimento incompleto do estabelecido na norma constitucional, seja em razão do processo de mudança nas circunstâncias fático​-jurídicas que venha a afetar a legitimidade da norma (inconstitucionalidade superveniente), seja, ainda, em razão de concessão de benefício de forma incompatível com o princípio da igualdade (exclusão de benefício incompatível com o princípio da igualdade).
A legitimidade ativa para impetração do mandado de injunção individual foi conferida às pessoas naturais ou jurídicas que se afirmam titulares dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas cuja fruição encontra-se obstada pela mora legislativa impugnada, nos termos do art. 3º da lei. O mandado de injunção coletivo, por sua vez, poderá ser promovido pelo Ministério Público, por partido político com representação no Congresso Nacional, por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, ou ainda pela Defensoria Pública, nas condições previstas no art. 12, incisos I a IV, do diploma legal.
Quanto à eficácia das decisões, o art. 8º da Lei n. 13.300, de 23 de junho de 2016, previu que o reconhecimento da mora legislativa pelo Poder Judiciário pode ensejar a fixação de prazo razoável para que o impetrado realize a edição da norma regulamentadora cuja omissão está sendo impugnada. A lei também autoriza o juiz a estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições em quepoderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo determinado.
O art. 9º do diploma legal trouxe importantes disposições acerca da eficácia das decisões proferidas em sede de mandado de injunção. Em alinho à evolução jurispruden​cial do instituto, a Lei n. 13.300, de 23 de junho de 2016, consagrou que as sentenças poderão ter efeito restrito ou mesmo efeito geral. Na primeira hipótese, a decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes e produzirá efeitos até o advento da norma regulamentadora. Já na segunda hipótese, a decisão produzirá efeitos mesmo em relação a terceiros não diretamente envolvidos na controvérsia judicial. Isso poderá se dar, segundo o § 1º do art. 9º da lei, nos casos em que a omissão legislativa impugnada comprometer o exercício do direito, liberdade ou prerrogativa objeto da impetração, permitindo-se, nesses casos, que seja atribuída eficácia ultra partes ou erga omnes à decisão. Adicionalmente, com o trânsito em julgado da sentença, o § 2º do art. 9º permite que o relator estenda os efeitos da decisão a casos análogos por decisão monocrática. Por fim, o § 3º do art. 9º garante que as decisões terminativas fundadas em insuficiência de prova não obstam nova impetração de mandado de injunção laestrado em outros elementos probatórios.
Ainda em relação à eficácia das decisões, o art. 10 da Lei n. 13.300, de 23 de junho de 2016, institui o cabimento de ação revisional destinada à desconstituição de sentença em mandado de injunção, que poderá ser ajuizada por qualquer interessado quando sobrevierem relevantes modificações das circunstâncias fáticas ou jurídicas.
BIBLIOGRAFIA
MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 12.ed.2017
BARROSO, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional. 4 ed. São Paulo - Saraiva, 2013
Acesso: 12/03/2018.

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