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Reservatório de controle de enchentes na Praça da Bandeira: projeto e execução Francisco Marques Terratek, Rio de Janeiro, Brasil, francisco.marques@terratek.com.br Alberto Ortigão Terratek, Rio de Janeiro, Brasil, ortigao@terratek.com.br Nuno Silva Terratek, Rio de Janeiro Brasil, nuno.silva@terratek.com.br Marcelo Sepúlvida Rio Águas, Rio de Janeiro Brasil, msepulvida@gmail.com Paulo Fonseca Rio Águas, Rio de Janeiro Brasil, pfonseca13@gmail.com RESUMO: Para resolver o problema das enchentes que afetam vários bairros da cidade do Rio de Janeiro, a Prefeitura lançou um projeto de construção de reservatórios de contenção de enchentes na bacia hidrográfica do canal do Mangue. Um desses, está localizado na Praça da Bandeira (RT-2). Este artigo apresenta as análises numéricas realizadas em diversas fases da obra, para validação dos resultados obtidos pelo projetista. Empregou-se, então, modelagem numérica com elementos finitos em 2D e 3D (Plaxis 2D e 3D). Os resultados numéricos foram comparados com resultados da instrumentação. Através dessa comparação, efetuou-se uma calibração de parâmetros geotécnicos do modelo numérico e a validação do modelo. PALAVRAS-CHAVE: Escavação subterrâneas, Plaxis 2D, Plaxis 3D, Modelagem numérica 1 INTRODUÇÃO As enchentes na cidade do Rio de Janeiro são de longa data e os problemas persistem até a atualidade. Os progressos do desenvolvimento urbano e o intenso crescimento da população, ao longo do século passado, tornaram ainda mais frequentes e intensas as enchentes, causando grandes transtornos e danos materiais, e por vezes, mortais nas áreas afetadas. Somando isso, a topografia da cidade favorece bastante para reduzidos tempos de concentração de água nas diversas bacias hidrográficas. A bacia hidrográfica do canal do Mangue é das mais problemáticas, tendo a convergência de cinco rios distintos na região da Tijuca. Para resolver este problema, a Prefeitura do Rio de Janeiro lançou um projeto de construção de reservatórios de contenção de enchentes na bacia hidrográfica do canal do Mangue, descrito anteriormente por Duarte et al (2013). Um desses reservatórios, está localizado na Praça da Bandeira. Este artigo apresenta resultados de análise numéricas em elementos finitos 2D e 3D de diversas fases da obra. Os parâmetros geotécnicos destas análises numéricas foram calibrados com auxílio do resultado da instrumentação efetuada na obra 2 PROJETO O reservatório da Praça da Bandeira, construído com contenção de parede diafragma, tem 40 m de diâmetro e aproximadamente 20 m de profundidade (Figura 1). A parede diafragma foi executada até ao topo rochoso (aproximadamente 30 m) e tem 80 cm de espessura. O suporte interno das paredes contou com seis anéis internos de compressão e um de coroamento, para ajudar a combater os deslocamentos e momentos fletores da parede diafragma, durante e após a escavação. Em cada junta da parede diafragma foi executada uma coluna de jet grouting (JG) para reforçar a impermeabilidade da parede diafragma. Essa impermeabilidade foi comprovada durante os ensaios de bombeamento, realizados antes da escavação que, para além de servir para obtenção de parâmetros de permeabilidade do solo e do topo rochoso fraturado, serviu para verificar a impermeabilidade da parede diafragma. A bomba do ensaio foi instalada no poço, próximo ao topo rochoso. Durante o ensaio, os piezômetros internos (instalados na área do reservatório) tiveram variações nas suas cotas piezométricas, enquanto os piezômetros exteriores (fora da área do reservatório) só tiveram variações na sua cota piezométricas em profundidades próximas ao topo rochoso fraturado, pelo que ficou provado assim a impermeabilidade da parede diafragma e a existência de aquíferos no solo. (Figura 2). Com base no ensaio de bombeamento, foi possível excluir a necessidade de tampão de fundo em JG, pois o risco de erosão interna ou levantamento do fundo era muito pequeno. Figura 1- Reservatório RT-2 Praça da Bandeira A Figura 3 e a 4 apresentam o projeto de instrumentação que consistiu em três inclinômetros, dois conjuntos de piezômetros (cada um com quatro piezômetros) e alvos topográficos em edifícios ao redor da obra para controle de deformações, da modelação numérica, que será discutida mais adiante. Figura 2 – Variação das cotas piezométricas durante o ensaio de bombeamento Figura 3 – Locação dos inclinômetros e piezômetros Figura 4 – Edifícios monitorados com alvos topográficos (a cinza). 3 MODELO NUMÉRICO EM 2D E 3D Os autores adotaram o software Plaxis para modelagem matemática da escavação. Os modelos constitutivos selecionados foram o HSM (Hardening Soil Model) para os solos e Hoek-Brown para a rocha, ambos disponíveis no Plaxis. O modelo 3D foi utilizado para prever o comportamento geotécnico da estrutura enquanto que o 2D foi utilizado para a análise de percolação da escavação do reservatório. Os parâmetros geotécnicos do solo e do material rochoso foram estimados através de correlações empíricas (com base em sondagens SPT realizadas no campo) e no ensaio de bombeamento. As tabelas 1 a 4 apresentam parâmetros geotécnicos já calibrados com o comportamento observado em campo. Tabela 1. Parâmetros geotécnicos do solo (HSM) Solo γ (kN/m3) k (cm/s) Tipo de drenagem) Aterro 17 5E-5 Drenado Argila Orgânica 16 1E-8 Argila Argilosa 18 1E-6 Areia 1 18 1E-3 Argila 1 17 1E-7 Areia 2 19 2E-4 Argila 2 17 1E-7 Areia 3 19 5E-4 Tabela 2. Parâmetros de rigidez do solo (HSM) Solo E50 (MPa) Eoed (MPa) Eur (MPa) n Aterro 20 20 54 0.5 Argila Orgânica 3,3 3,3 9 1 Argila Argilosa 33 33 90 0.75 Areia 1 57,2 57,2 156 0.5 Argila 1 55 55 150 1 Areia 2 68,2 68,2 68,2 0.5 Argila 2 37 37 102 1 Areia 3 88 88 240 0.5 Tabela 3. Parâmetros de resistência do solo (HSM) cont. Solo c’ (kPa) φ' (°) Y (°) Aterro 10 28 0 Argila Orgânica 3 15 0 Argila Argilosa 5 22 2 Areia 1 0 33 2 Argila 1 40 55 1 Areia 2 0 35 3 Argila 2 25 31 2 Areia 3 0 38 3 Tabela 4. Parâmetros geotécnicos do material rochoso (Hoek-Brown) Rocha GSI σci (MPa) mi D Rocha Branda 30 250 26 0.7 Rocha sã 60 250 26 1 Onde Figura 5. Simbologia dos solos nos modelos 2D e 3D A Figura 6 apresenta o modelo geométrico e a malha de elementos finitos utilizados na análise numérica a 2D. Figura 6. Geometria e malha de elementos finitos do modelo 2D do reservatório RT-2 No modelo a 3D, tirou-se partido da bi-simetria do reservatório em relação aos eixos ortogonais horizontais e optou-se por modelar somente ¼ do mesmo. Elementos do tipo plate foram utilizados para representar as lamelas da parede diagrama e anéis de compressão. Como não existe continuidade de armadura entre lamelas (juntas), optou-se por representar essas juntas com elementos tipo plates com parâmetros estruturais x100 inferiores ao das lamelas, para permitir rotação relativa entre as mesmas. A Figura 7 apresenta o modelo geométrico e a malha de elementos finitos utilizados na análise 3D. Figura 7. Geometria e malha de elementos finitos do modelo 3D do reservatório RT-2 Os elementos plates no modelo 3D estão orientados de acordo com um sistema de eixos locais (Figura 8). Figura 8. Sistema de eixos locais nas plates do modelo 3D A Tabela 5 apresenta os parâmetros utilizados nos elementos estruturais. Tabela 5. Parâmetros estruturaisno modelo 2D e 3D Solo EA (kN/m) EI (kN.m/m) Tipo Parede diafragma 16,8E6 896E3 Plate Junta 16.8E4 8960 Plate Anel de compressão 1 10E6 - Anchor (2D)/ Plate (3D) Anel de compressão 2 15,8E6 - Anchor (2D)/ Plate (3D) Anel de compressão 3 40E6 - Anchor (2D)/ Plate (3D) A sobrecarga distribuída na superfície do terreno adotada em todos os modelos foi de 10 kPa. 4 RESULTADOS NUMÉRICOS As Figuras 9 a 11 mostram a evolução da deformação do solo durante a escavação resultados numéricos da obra Figura 9. Deslocamento no solo - escavação a 6 m de profundidade (deslocamento máx: 3 cm) Figura 10. Deslocamento no solo, com escavação a 12 m de profundidade (deslocamento máx: 4 cm) Figura 11. Deslocamento no solo, com escavação a 20 m de profundidade (deslocamento máx: 6 cm) As Figuras 12 a 14 mostram a evolução da tensão de cisalhamento relativa do solo, durante a escavação. É possível verificar a sua mobilização com o avançar da escavação. Figura 12. Tensão de cisalhamento relativa do solo, com escavação a 6 m de profundidade Figura 13. Tensão de cisalhamento relativa do solo, com escavação a 12 m de profundidade Figura 14. Tensão de cisalhamento relativa do solo, com escavação a 20 m de profundidade As Figuras 15 a 17 mostram a evolução da deformação horizontal (segundo o eixo X) da parede diafragma, durante a escavação. Como a estrutura é simétrica, as deformações horizontais segundo o eixo Y são simétricas ao do eixo X. A deformação máxima foi inferior a 1% da altura de escavação (0.1 %, que corresponde a 2 cm em 20 m escavados). Figura 15. Deslocamento na parede diafragma, com escavação a 6 m de profundidade (deslocamento máx: 0,9 cm) Figura 16. Deslocamento horizontal na parede diafragma, com escavação a 12 m de profundidade (deslocamento máx: 1.4 cm) Figura 17. Deslocamento horizontal na parede diafragma, com escavação a 20 m de profundidade (deslocamento máx: 2 cm) As Figuras 18 a 20 mostram a evolução do momento fletor M11 da parede diafragma, durante a escavação. Como seria esperado, os momentos nas juntas da parede diafragma são aproximadamente nulos, pois não existe continuidade de armadura. As magnitudes de esforços estão dentro da ordem de grandeza suportada pelas paredes diafragmas. Figura 18. Momento fletor 11 da parede diafragma, com escavação a 6 m de profundidade (Momento máx e min: 120 e -335 kNm/m) Figura 19. Momento fletor 11 da parede diafragma, com escavação a 12 m de profundidade (Momento máx e min: 120 e -350 kN.m/m) Figura 20. Momento fletor 11 da parede diafragma, com escavação a 20 m de profundidade (Momento máx e min: 200 e -600 kNm/m) As Figuras 21 a 23 mostram a evolução do esforço axial N11 nos anéis de compressão, durante a escavação. Registou-se esforços axiais elevados, mas dentro dos limites de capacidade axial para quais foram dimensionados. Figura 21. Esforço axial 11 dos anéis de compressão, com escavação a 6 m de profundidade (Esforço máx - 1700 kN/m) Figura 22. Esforço axial 11 dos anéis de compressão, com escavação a 12 m de profundidade (Esforço máx - 4800 kN/m) Figura 23. Esforço axial 11 dos anéis de compressão, com escavação a 20 m de profundidade (Esforço máx - 8000 kN/m) As Figuras 24 a 26 a mostram a evolução da percolação no terreno, durante a escavação. As vazões obtidas na análise de fluxo foram da mesma ordem de grandeza das vazões verificadas durante a escavação do reservatório (máximo de 2 m3/dia no final da escavação). Figura 24. Percolação 2D, com escavação a 6 m de profundidade (1 m3/dia) Figura 25. Percolação 2D, com escavação a 6 m de profundidade (1.6 m3/dia) Figura 26. Percolação 2D, com escavação a 6 m de profundidade (2.5 m3/dia) Nesta modelagem numérica foram consideradas e estudadas sobrecargas variáveis (graus de alta capacidade e o faseamento construtivo de vigas da cobertura pós-tensionadas) pelo fato se localizarem muito próximas do reservatório (Figura 27). Verificou-se que as atuações destas sobrecargas não causariam a acrescimentos significativos de recalque e tensão na parede diafragma e anéis de compressão. Acréscimo de magnitude de momentos devido a sobrecargas váriaveis ( KN.m/m) -15 -10 -5 0 5 10 15 P ro fu n d id a d e ( m ) -30 -25 -20 -15 -10 -5 0 M11 (KN.m/m) M12 (KN.m/m) M22 (KN.m/m) Figura 27. Acréscimo de magnitude de momentos, na parede diafragma devido a sobrecargas variáveis 5 INSTRUMENTAÇÃO: RESULTADOS As Figuras 28 a 30 a mostram a comparação das leituras obtidas do inclinômetro com os resultados com os parâmetros já calibrados do modelo 3D. A calibração dos parâmetros geotécnicos permitiu um ajuste razoável do modelo 3D com as leituras dos inclinômetros. Os deslocamentos horizontais da parede diafragma estiveram dentro dos limites de segurança (deslocamento horizontal máximo de 2 cm, que corresponde a 0.1 % da altura de escavação do reservatório). Figura 28. Comparação das leituras dos inclinômetros com o modelo (escavação a 6 m de profundidade) Figura 29. Comparação das leituras dos inclinômetros com o modelo (escavação a 12 m de profundidade) Figura 30. Comparação das leituras dos inclinômetros com o modelo (escavação a 12 m de profundidade) A Figura 31 apresenta as leituras dos piezômetros 1 A a D. Tal como no ensaio de bombeamento, somente o piezômetro 1D (que se localizava junto do topo rochoso) teve variação na sua cota piezométrica. Essa cota decresceu consideravelmente durante a escavação (percolação) e voltou a subir e a estabilizar-se com a execução do fundo do reservatório. Os restantes tiveram pequenas variações nas suas cotas, provando assim a estanqueidade da parede diafragma. Figura 31. Evolução da cota piezômetricas durante a escavação. Durante a escavação foram feitas leituras nos alvos topográficos instalados nos edifícios em torno da praça da bandeira. Durante o monitoramento, os recalques máximos obtidos foram na ordem dos 1 mm, como se pode verificar na Figura 32. Esse recalque é baixo, pois os edifícios se encontravam a uma distância muito considerável da obra e as condições geotécnicas do terreno não eram as mais adversas. Tempo (dias) 0 20 40 60 80 R e c a lq u e ( m m ) -1.2 -1.0 -0.8 -0.6 -0.4 -0.2 0.0 0.2 0.4 Recalque de edificio Figura 32. Recalque verificado em edifício em torno da praça da bandeira 6 CONCLUSÕES A retroanálise deste projeto permitiu entender com mais detalhe o comportamento geotécnico do reservatório da Praça da Bandeira durante a sua escavação. Ficou claro a importância da instrumentação e de realização de ensaios in situ como o ensaio de bombeamento para a convergência dos resultados numéricos com a realidade. Os resultados, após calibrados, permitiram validar os resultados, de deformações, esforços e recalques. Sendo assim ficou assegurada assim a segurança e a boa qualidade deste projeto. Face aos bons resultados nesta obra, a Rio Águas e a Terratek adotarão esta mesma metodologia nos próximos reservatórios a serem construídos em 2014-2015. Alguns previstos são os ensaios PMT (pressiômetro) e ajustes na instrumentação. (Praça Niterói; Praça Varnhagen; e Mariz e Barros). REFERÊNCIASAlonso, U. R. (2013). Rebaixamento temporário de aquíferos – Oficina de texto, São Paulo, Brasil Duarte M, Fonseca P, Ortigao A (2013) Flash flood control Works around Maracanã district in Rio de Janeiro, Brazil, Proceedings ICE Institution of Civil Engineers, Special Issue 166, November 2013, Issue CE6, pp 44- 48, http://dx.doi.org/10.1680/cien.13.00009, paper 1300009 Plaxis (2013). Plaxis 3D Reference Manual, http://www.plaxis.nl/plaxis3d/manuals/ Plaxis (2013). Plaxis 2D Reference Manual, http://www.plaxis.nl/plaxis2d/manuals/
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