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Resumo de Linguística

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Linguística IV
Resumo dos textos:
1. A variação linguística
2. O dinamismo das línguas
3. A variável gênero/sexo
4. A relevância da variável escolaridade
1.As Línguas Variam
Um fato linguístico com o qual convivemos, mas a que talvez não atribuímos tanta importância é de que existem diferenças dentro das línguas, isso é: As línguas variam.
	A palavra "jerimum", por exemplo, muito usada na Bahia, corresponde, no Sul e no Sudeste, a "abóbora", um exemplo de variação lexical. Apesar de variações como essa, é inegável que se trata da mesma língua, tendo ambos os vocábulos os sons e padrão silábico do português.
	Esse é apenas um dos modos como uma língua pode variar. Numa mesma língua, um mesmo vocábulo pode ser pronunciado de formas diferentes, seja conforme o lugar— variação diatópica—, seja conforme a situação (mais ou menos formal)— variação diafásica.
	O exemplo acima "jerimum" x "abóbora" constitui um caso de variação diatópica, já que varia de acordo com o estado (São Paulo ou Bahia, por exemplo). Podemos também lembrar, agora focalizando nos sons, a diferença que distingue falantes cariocas de paulistanos: o -r em final de sílaba, pronunciado pelos paulistanos como vibrante, e aspirado pelos cariocas.
	No nível morfológico, temos como exemplo de variação o -r encontrado no final dos verbos em sua forma infinitiva, que pode ser pronunciado(andar) ou não (andá). Sabemos que variação é morfológica, e não fonética, pois esse -r é um morfema flexional, um signo linguístico que tem como significado não um referente externo à língua, mas uma categoria linguística (nesse caso, significa "verbo no infinitivo"). Pode-se dizer, assim, que existem dois morfemas para expressar noção gramatical de infinitivo, o morfema -r e o morfema Ø —vazio.
	Se estabelecemos a hipótese de que o falante nativo do PB "apaga" partes de palavras quando está numa situação de bastante informalidade, temos um caso de variação diafásica. Pode-se estabelecer também a hipótese de que o falante pronunciaria o -r d infinitivo com maior ou menor frequência de acordo com seu nível de escolaridade. Devemos prestar atenção ao fato de que uma variante pode ser definida por mais de um fator de natureza extralinguística, ou social.
	Até aqui, falamos da variação dentro dos limites da palavra. Será que poderíamos estender esses limites e pensar a variação nos limites da frase de uma língua?
	Vejamos que há mais de uma forma de expressar negação no PB:
	(1) Olha, eu não vou sair agora...
	(2) Olha, eu não vou sair agora, não...
	
	Afirmar que (1) é igual a (2) significa dizer que temos duas construções sintáticas diferentes que expressam o mesmo sentido em PB, ou seja, existe uma variação sintática.
	Por outro lado se consideramos que (1) é diferente de (2), pois (2) é mais enfática, então as duas frases, não sendo intercambiáveis, não podem ser variantes, mesmo sendo a diferença sutil. De fato, a observação da variação na sintaxe não se dá de forma tão pacífica como no caso da morfologia e da fonética.
	
2. Os Limites da Variação
	
Se nos lembrarmos de uma das primeiras lições de Saussure, em O Curso de Linguística Geral, é inevitável que retomemos sua afirmação de que "o ponto de vista cria o objeto". Isto é, como não temos uma definição simples de língua, devemos "criar o objeto", não apenas delimitá-lo. Para cada definição diferente , temos um objeto de interesse.
	O que é a língua, portanto, para um linguista variacionista? 
	Quando admitimos a variedade de línguas no mundo, intuitivamente consideramos um rol de "regras linguísticas" que faz com que o PB seja diferente do espanhol, ou do kabiye. Regras de combinação de fonemas, de morfemas, de palavras na frase e de frases no texto. Quando observamos que o espanhol e o português são línguas diferentes, podemos concluir que a primeira tem um conjunto de regras que, no todo, a faz distinta da outra. 
	Nesse primeiro momento, parece razoável considerar que a variação ocorre num nível mundial, cada língua sendo um domínio sem variação. Como vimos, porém, uma mesma língua pode variar acordo com a localização geográfica. com aspectos sociais. Concordamos, também, que um mesmo falante de português, numa mesma localização geográfica, numa mesma situação de fala, pode usar variantes. Um falante universitário de alto poder aquisitivo, na faixa dos 25 anos, nascido e criado na capital de São Paulo, pode utilizar variantes como andar e andá. Seguindo esse raciocínio, constatamos, então, que a variação chega ao nível do indivíduo.
	
A Comunidade de Fala
	
	Embora o indivíduo possa usar variantes, é no contato com os outros falantes de sua comunidade que ele vai encontrar s limites para sua variação individual, por isso não vivemos numa anarquia linguística.
	Interessa para nós, portanto, identificar agrupamentos de falantes que têm características linguísticas em comum, ou seja, comunidades de fala.
	Definição de comunidade de fala por Guy (2001):Ela 'formada por falantes que:
	-Compartilham traços linguístico que distinguem seu grupo de outros;
	-Comunicam-se relativamente mais entre si do que com outros e
	-Compartilham normas e atitudes diante do uso de linguagem
	O primeiro quesito evidencia a existência de fronteiras externas para as comunidades. O seguinte, é de certa forma, explicativo, a fala do carioca é da maneira que é porque a comunicação entre os membros da comunidade de fala carioca é mais intensa do que sua comunicação com membros de outra comunidade pois há mais oportunidades para troca dentro da comunidade do que entre comunidades. 
	Por fim, quando falamos de atitudes do uso linguístico, vale notar que não basta que os membros de uma comunidade tenham contato linguístico com outra para adotar suas características linguísticas. Não adotamos as características linguísticas daqueles de quem não gostamos, atitude que fica clara quando pensamos nos julgamentos de valor frequentemente feitos sobre a fala de indivíduos de outras comunidades.
	Isso não se aplica apenas às diferenças geográficas, mas também às sociais, como escolaridade e nível econômico. Por exemplo, um falante de maior nível de escolaridade e situação econômica tenderá a evitar formas sem concordância nominal, por serem estigmatizadas.
O Dinamismo das Línguas
	Sabemos que as línguas mudam com o tempo, basta comparar o português com o latim. Essa mudança se dá a logo prazo— normalmente no espaço de várias gerações— e não de maneira abrupta, e se processam de maneira gradual em várias dimensões. Os falantes mais velhos, por exemplo, tendem a preservar mais as formas antigas. 
	No estágio atual da ciência da linguagem, não sabemos até que ponto a língua falada pelo indivíduo pode realmente mudar no decorrer dos anos. Existem duas posições teóricas, ambas sem evidência empírica convincente. A primeira, ou clássica, postula que o processo de aquisição de linguagem se encerra no começo da puberdade, e que a partir desse momento, a língua desse indivíduo fica essencialmente estável. A gramática desse indivíduo não poderia sofrer mudanças significativas, pois a chamada faculdade da linguagem estaria bloqueada, permitindo apenas mudanças esporádicas: troca de uma palavra por outra, etc.
	Assim, a fala de uma pessoa com 60 anos hoje representa a língua de 45 anos atrás. A escala em tempo aparente, obtida através do estudo de falantes de idades diferentes, é chamada de "gradação etária", e corresponde, sob a hipótese clássica, a uma escala de mudança em tempo real.
	Essa hipótese apresenta algumas dificuldades, já que nem toda variação representa mudança linguística em progresso, podendo ser uma variação estável. 
	Além disso, outros fatores interferem na escolha de variantes pelos falantes de diferentes idades, como inatividade no mercado de trabalho, que aproxima o comportamento dos grupos extremos—os jovens e os velhos— em oposição a grupo de meia idade, que se adequa a forma standard em função dasexig6encias do mercado de trabalho. Vemos, portanto, que aevid6enciacontradiz a hipótese clássica, já que o falante muda sua língua no decorrer dos anos.
A Variável Gênero/Sexo
	
	Em que limite e de que forma fenômenos linguísticos variáveis estão correlacionados ao gênero/sexo do falante?
	As diferenças mais evidentes entre a fala dos homens e das mulheres se encontram no plano lexical. Apesar da tendência ocidental ao desaparecimento da distinção entre um vocabulário feminino e um masculino, ainda podemos ouvir expressões como: "não fica bem para uma garota falar dessa forma". 
	Porém, análise da dimensão social e forma linguística não pode ignorar a associação entre gênero/sexo do falante e a maior ou menor ocorrência de variantes padrão/não padrão e o processo de implementação de mudanças.
	Diversos estudos de orientação sociovariacionista apontam uma preferência das mulheres pelas variantes de prestígio, como o de Fischer (1958). Essa análise de conservadorismo linguístico, porém, emerge de variações em comunidades de fala ocidentais. Um estudo do árabe por Haeri (1987) mostra que em comunidades muçulmanas, a variante uvular, de prestígio — mais literária— é utilizada pelos homens, enquanto as mulheres estão associadas ao maior uso de formas não prestigiadas.
	No estudo de Labov(1956) sobre o inglês de nova York, contatou-se que quando se trata de implementar uma forma de prestígio, como no caso da pronúncia retroflexa em Nova York, as mulheres tendem a assumir a liderança na mudança. O oposto se dá quando se trata de implantar uma forma socialmente desprestigiada, as mulheres assumem uma atitude conservadora, enquanto os homens tomam a liderança, apesar de essa regra não ser universalmente aplicável.
	O que se pode generalizar, no entanto, é a maior sensibilidade feminina ao prestígio social atribuído pela comunidade às variantes linguísticas.
	
A Relevância da Variável Escolaridade
	
	A observação cotidiana confirma que a escola gera mudanças na fala e escrita de quem a frequenta, atuando como preservadora de formas de prestígio. Veículo de familiarização com a literatura nacional, a escola incute gostos, normas, padrões estéticos e morais sendo o nível de escolarização um fator de grade influência na promoção ou resistência à mudança.
	Para essa análise, devem ser levadas em consideração algumas distinções:
	-Forma de prestígio social e forma neutra:
	Focaliza o status econômico e o prestígio social dos usuários da língua. As formas socialmente prestigiadas se tornam normas prescritas pelo professor.
	-Fenômeno socialmente estigmatizado e fenômeno imune à estigmatização
	O modo de comunicação das pessoas desprovidas de prestígio econômico e social tende a ser coletivamente avaliado como estigmatizado, e considerado inferior (ex: framengo, homi, etc)
	-Fenômenos situados no nível de discurso e no nível da gramática
	A gramática e a sintaxe têm sido beneficiadas com a atenção quase exclusiva dos pesquisadores, em detrimento do nível textual, razão pela qual maioria dos fenômenos estudados apresenta alta concentração de fatores estruturais e poucos discursivos ou funcionais.
	-Ensino prescritivo: aquisição das formas de prestígio e erradicação das estigmatizadas
	-Ensino descritivo: naturaliza como boas as formas de prestígio e as descreve com detalhe e circunstância, ignorando as menos prestigiadas
	-Ensino produtivo: Supõe a aquisição de novos hábitos linguísticos a incorporação de novos modos de dizer e escrever, sempre com ênfase nos modos prestigiados de comunicação.
	-Divisão do ato comunicativo entre fala e escrita: Os estudos concentram-se na fala enquanto a escola prioriza a escrita
	As distinções acima se justificam, já que o sino prescritivo e descritivo interferem no domínio das formas e prestígio e no abandonadas formas socialmente estigmatizadas.
	Alguns fatores que tornam mais claro o efeito da variável escolaridade são o nível de formalidade de uma gravação, assim como a presença de um pessoa culta a entrevistar, a presença do gravador, ou mesmo o tópico da conversa.
	Cabe a escola o mérito de ser responsável por uma parcela relevante da tarefa socializadora, que o uso de uma língua nacional, de prestígio requer.	
	
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