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FACULDADE FUTURA LINGUÍSTICA E COMUNICAÇÃO VOTUPORANGA – SP SUMÁRIO LÍNGUA ................................................................................................... 5 Linguagem .............................................................................................. 6 Linguagem e sociedade ........................................................................ 11 3.1 Hymes ............................................................................................ 15 3.2 Labov .............................................................................................. 16 3.3 A noção de comunidade de fala ..................................................... 17 Os condicionamentos sociais e estilísticos' .......................................... 20 Variedade linguísticas ........................................................................... 24 Tipos de variedades linguísticas ........................................................... 29 O ensino das vaRiações linguísticas nos anos iniciais ......................... 31 Gêneros textuais ................................................................................... 41 Exemplos de gêneros textuais ................................................................ 42 Tipos e gêneros textuais ....................................................................... 44 Exemplos de tipos textuais: ..................................................................... 44 Gêneros textuais pertencentes aos textos narrativos:............................. 45 Gêneros textuais pertencentes aos textos descritivos: ........................... 45 Gêneros textuais pertencentes aos textos expositivos:........................... 45 Gêneros textuais pertencentes aos textos argumentativos: .................... 45 Gêneros textuais pertencentes aos textos injuntivos: ............................. 46 Gêneros textuais pertencentes aos textos prescritivos: .......................... 46 Gêneros textuais e gêneros literários ...................................................... 46 Exemplos de gêneros literários: .............................................................. 46 Texto Narrativo ........................................................................................ 48 Texto Descritivo ...................................................................................... 48 Texto Dissertativo-Argumentativo ........................................................... 49 Texto Expositivo ...................................................................................... 49 Texto Injuntivo ......................................................................................... 50 Redação oficial características e especificidades .............................. 51 10.1 O que é uma redação oficial? ..................................................... 52 Formalidade ............................................................................................ 52 Padronização .......................................................................................... 53 10.2 Concisão ..................................................................................... 53 10.3 Clareza ........................................................................................ 53 10.4 Impessoalidade ........................................................................... 53 SINTAXE e SEMÂNTICA .................................................................. 55 11.1 Funções e Relações sintáticas .................................................... 55 11.2 Funções sintáticas ...................................................................... 56 11.3 Relações sintáticas ..................................................................... 56 Semântica .......................................................................................... 56 Individualidade e Diversidade ............................................................ 60 produção de textos ............................................................................ 67 14.1 Como produzir um texto? ............................................................ 70 14.2 Tipos de Textos ........................................................................... 72 14.3 Como Produzir um Bom Texto? .................................................. 73 14.4 Crie a Estrutura do Texto – Tema e Título .................................. 73 14.5 Apresentação .............................................................................. 74 14.6 Desenvolvimento ......................................................................... 74 14.7 Conclusão ................................................................................... 75 Dicas para Produzir um Bom Texto ................................................... 75 Produção de texto em diferentes formatos ........................................ 76 LÍNGUA A língua é uma forma de linguagem, é um dos instrumentos de interação sociocomunicativa e, assim como as religiões, a culinária, as vestimentas, integra- se na cultura dos povos. Os idiomas são mecanismos de expressão das manifestações culturais e estão a serviço da comunicação social. As aquisições culturais são ensinadas e transmitidas, em grande porte, pela língua. Existem no mundo pelo menos, 3 mil línguas. Além dessas línguas faladas hoje, existem entre 7 a 8 mil dialetos que são variantes de um idioma. Cada língua desenvolveu seus próprios padrões de nomeação de experiência perceptivas. Não há duas línguas iguais quanto à maneira de dividir a realidade conceitual. Os esquimós têm uma serie de palavras para designar diferentes tios de neve, enquanto outros povos têm apenas um termo para ‘’neve’’. Existem povos que só tem uma palavra para designar o azul e o verde, enquanto nós temos essas duas palavras para essas cores. Nem todas as línguas em escrita. Todos os países têm sua língua oficial, que é aquela em que o governo conduz seus trabalhos e foi adotada com essa finalidade por decisão governamental; é a conhecida como língua do país. É a língua de um Estado, a qual e obrigatória. Nem sempre ela é a língua materna, ou seja, a língua cujos falantes praticam por ser a primeira aprendida, geralmente, em ambiente familiar. No Brasil, a língua oficial é a língua portuguesa, embora nosso país seja multilíngue. Em nosso país, são faladas línguas indígenas, além das origens africanas, ainda praticadas nos quilombos, e das línguas dos imigrantes que vieram principalmente da Europa e da Ásia. Entre elas, é possível citar o alemão, o árabe, o chinês, o coreano, o espanhol, o holandês, o inglês, o italiano e o japonês. Além dessas línguas, existem em nosso país, as línguas de fronteiras que são os idiomas praticados pelas diferentes etnias índios, espanhóis, árabes, portugueses alemães, entre outros – em contato. Em todos os países, existe uma variedade da língua de prestigio social, denominada língua padrão; é aquela eleita como a mais apropriada nos contextos formais e educacionais. A íngua padrão é a variedade da língua que tem um status especial na sociedade e é adquirida pelo ensino formal. A maior parte das publicações acadêmicas, dos noticiários nacionais é feita em língua padrão. Ela é a recomendada para a escrita formal, tem prestigio social e é protegida por lei. Podemos conceber língua como um fenômeno natural, um organismo dinâmico, que evolui com o passar do tempo; como um sistema formal em funcionamento numa comunidade. Pelos usos diferentes no tempo e nos diversos agrupamentos sociais, as línguas passam a existir como um conjunto de falares diferentes, todos muito semelhantes entre si, mas cada qual apresentando suas peculiaridadescom relação a alguns aspectos linguísticos. A língua de um povo surge e se constrói junto com seu modo de ver o mundo, sua história e sua cultura, e, nessa construção, ela se transforma e deixa que o tempo lhe traga novas nuances. A língua não é um sistema homogêneo, ela varia no espaço e na hierarquia social. Não é um sistema fixo e imutável. Além de evolui no tempo, a língua ainda está em evolução, em constante mudança, pela ação dos falantes. Sua história ainda não acabou; está sempre se fazendo pela ação dos falantes. Como o homem dispõe e inúmeras possibilidades para se comunicar, cada língua corresponde à expressão de uma escolha entre essas possibilidades, apresentando variações relevantes em função de valores sociais, regionais, de faixa etária, de situação, etc., concretizando, dessa forma, a relação entre linguagem, língua e cultura.1 LINGUAGEM Uma língua, seja ela qual for, tem a função de permitir a comunicação entre os indivíduos. Essa é sua função primordial. Há uma relação direta e indissolúvel 1 Texto adaptado: www.pt.slideshare.net entre sociedade e língua ou língua e sociedade, que não permite que se pense em indivíduos vivendo conjuntamente sem o estabelecimento de comunicação entre si e, da mesma forma, não é possível a comunicação sem que haja uma convenção social a respeito dessa comunicação, o que chamamos de língua. Língua nada mais é que um conjunto de convenções sociais historicamente constituídas, que permite que os seres humanos se comuniquem entre si. Somente os seres humanos têm essa capacidade, uma capacidade relacionada talvez com algum dispositivo biológico, que permite que se formule e se entenda um conjunto de sons e a eles se associe um sentido. É possível que outros seres vivos se comuniquem como é o caso, por exemplo, das abelhas, que, com um conjunto de movimentos (danças) são capazes de transmitir informações a respeito da localização de alimento ou mesmo do risco iminente à colmeia, porém não se pode confundir esse tipo de comunicação, de propósito restrito, com linguagem ou mesmo língua. Fonte: www.ericasitta.wordpress.com Da mesma forma, observam-se alguns pássaros que são capazes de produzir um conjunto de sons muito parecidos com os sons produzidos pelos seres humanos, o que não permite às aves, porém, dialogar com seres humanos ou entre si, estabelecendo um raciocínio a respeito dos sons produzidos e produzindo, como os seres humanos, outros conjuntos de sons, como resposta. Os macacos, animais que guardam grande semelhança com o homem, também não possuem um mecanismo capaz de estabelecer comunicação por meio da língua, ainda que seu raciocínio beire o raciocínio humano. As baleias também têm sua ‘’linguagem’’, produzem, ao menos, dois tipos de sons: os que intervêm e seu sistema de eco localização, funcionando como uma espécie de sonar biológico, e as vocalizações, conhecidas canções das baleias, que parecem ser um meio de comunicação entre os membros da mesma espécie. Inúmeros estudos com animais em cativeiro e selvagens tem mostrado que esses mamíferos marinhos são capazes de comunicação com qualquer ouro usando uma ‘’linguagem’’. Embora essa forma de linguagem não possa ser comparada com a linguagem humana, e um sistema articulado de comunicação, no qual cada som e modulado em tons e frequências que são repetidos constantemente durante atos específicos e situações particulares. Animais domésticos se comunicam com seus donos. Podemos dizer que os cachorros emitem sons que nos permitem identificar sentimentos como medo, raiva e dor. Um cão abana o rabo, demonstrando satisfação; rosna, expressando ameaça. Os animais em modos de se expressar; entretanto, a natureza dessa comunicação não se compara à utilizada pelo homem. A ‘’linguagem’’ animal possui características bem distintas da linguagem humana. Em linhas gerais, trata-se de uma forma de adaptação à situação concreta, relacionada a uma forma fixa de resposta e determinado estímulo. A linguagem está no limiar do universo humano porque caracteriza o homem e o distingue do animal. O homem tem a capacidade de ultrapassar os limites da vida animal ao entrar no mundo do símbolo. A natureza da comunicação animal não se compara à revolução que a linguagem humana provoca na relação do homem como o mundo. A diferença entre a linguagem humana e a ‘’linguagem’’ do animal está no fato de que este não conhece o símbolo, mas somente o índice. O índice está relacionado com a forma fixa e a única com a coisa a que se refere. Por exemplo, as frases com que adestramos o cachorro devem ser sempre as mesmas, pois são índices, isto é, indicam alguma coisa muito específica. A linguagem humana é uma manifestação cultural; relaciona-se com padrões de comportamentos, crenças, conhecimentos, realizações, costumes que podem ser transmitidos de gerações. O homem imprime sentido às linguagens que cria. Ele cria palavras, gestos, símbolos, enfim, formas de expressar suas ideias. A linguagem é atividade. É forma de ação, ação entre indivíduos, orientada para uma finalidade, e lugar de interação que possibilita aos membros de uma sociedade a prática dos mais diversos tipos de atos, que vão exigir dos semelhantes reações e/ou comportamentos, levando ao estabelecimento de vínculos e compromissos anteriores inexistentes. (KOCK, 1997,p.9) A linguagem humana envolve a representação simbólica de conceitos e diversos tipos de relações entre eles. Ela está em toda parte; sem ela, as sociedades não seriam o que são. Por meio da apresentação simbólica e abstrata, o homem dá sentido ao mundo, distancia-se da experiencia vivida é capaz de compreender o mundo e nele agir. Desde que nascemos, estamos mergulhados no mundo da linguagem. Crescemos imersos em um universo de sons, de gestos e sinais, através dos quais passamos a interagir com tudo o que nos cerca. Nosso pensamento, a forma de entendermos as coisas, começa, então a ter por primordiais as palavras, a linguagem, o nome das coisas existentes no mundo. A linguagem impregna nossos pensamentos, é intermediária em nossas relações com os outros, e se insinua até em nossos sonhos. O volume esmagador de conhecimentos humano é guardado e transmitido pela linguagem. A linguagem é, de tal modo, onipresente que a aceitamos e sabemos que sem ela a sociedade, tal como a conhecemos, seria impossível. (LANGACKER,1972, p.11) A linguagem e o pensamento se misturam à medida que a capacidade da comunicação simbólica se desenvolve. Uma criança, com cerca de dois anos de idade, começa a usar o idioma para se comunicar. Seu conhecimento sobre o mundo, antes baseado em experiências sensoriais e motoras, torna-se lentamente mais e mais simbólico. A partir de então, a criança não precisa mais aprender tudo através de suas próprias experiências – ela pode aprender através da linguagem. O mundo que resulta do pensar e o agir humanos não pode ser chamado de natural, pois se encontra transformado e ampliado por nós. Portanto, as diferenças entre pessoa e animal não são apenas de grau, porque, enquanto o animal permanece mergulhado na natureza, nós somos capazes de transforma-la, ornando possível a cultura. Fonte: www.vitaclinica.com.br A linguagem e a comunicação por meio de uma língua são, portanto, atividades estritamente humanas. A facilidade com que uma criança adquire sua língua materna é algo quase inexplicável, levando em consideração a complexidade de uma língua. Em aproximadamente três anos, adquire-se um conjunto razoavelmente grande de palavras, aliado às regras de uso da língua, as chamadas regras da gramática dos usuários de uma língua, algo que permite que se estruturem frases coesas e coerentes, ou seja, que permite que se diga “O bebê está com fome” em vez de “Fome bebê com está”, uma operaçãoque parece simples, mas que possui uma grande complexidade, mesmo para adultos que tentam adquirir uma segunda língua. Além dessa facilidade na apreensão das estruturas e do léxico (palavras), some-se a isso a estruturação, por parte da criança, de frases nunca ouvidas, demonstrando sua capacidade criativa e não somente reprodutiva, provando que o ser humano possui uma estrutura em seu cérebro capaz de criar e modificar a língua. É essa capacidade única que coloca o homem como espécie central do planeta terra, essa capacidade de se organizar em sociedade e se comunicar que faz do ser humano um animal capaz de exercer dominação sobre outras espécies e permite-lhe, dentre outras coisas, o desenvolvimento e a manipulação de objetos, o que o torna tão diferente das demais espécies. O que permite a esse ser alterar seu meio e traçar o seu destino, mas, por outro lado, o que lhe permite galgar a própria destruição.2 A linguagem é um sistema organizado de símbolos a serviço das sociedades humanas. Esse sistema é amplo, complexo, extenso e possui propriedades particulares que possibilitam a codificação, a estruturação das informações sensoriais, a capitação a transmissão de sentidos, que favorecem a interação entre os homens. LINGUAGEM E SOCIEDADE Os estudos sistemáticos que tratam da relação entre linguagem e sociedade começam a se solidificar ao longo de 1960, quando a sociolinguística emerge como 2 Texto extraído: https://www.portaleducacao.com.br um campo de saber interdisciplinar, com suas bases fortemente ancoradas na linguística, na antropologia e na sociologia. Como se trata de uma relação, duas questões antagônicas naturalmente se põem: a linguagem determina a realidade social? a sociedade determina a linguagem? Dada a natureza da temática proposta neste ensaio, abordo três diferentes perspectivas: de Sapir e Whorf, de Hymes e de Labov', examinando a hipótese determinística no que concerne à maneira pela qual linguagem e sociedade podem se implicar. Consideramos, então, uma terceira questão: em que medida é possível falar em determinismo sob a ótica dos referidos autores? Na discussão aqui proposta releva aos seguintes aspectos: a realidade social como produto linguístico, segundo Sapir e Whorf o papel do contexto e da competência comunicativa no que diz respeito à relação entre linguagem e mundo, na visão de Dell Hymes; e a importância do conceito de comunidade de fala e da correlação entre fatos linguísticos, estratificação social e estilo, para Labov. Concluo que as relações entre linguagem e sociedade são permeadas por um certo determinismo (de diferentes tipos e em diferentes graus) nas três perspectivas abordadas. Inicialmente, chamamos atenção para o fato de que Sapir e Whorf tratam explicitamente das relações linguagem/cultura e linguagem/ pensamento. Entretanto, considerando-se que "cultura pode ser descrita como conhecimento adquirido socialmente, isto é, como o conhecimento que uma pessoa tem em virtude de ser membro de determinada sociedade' (Hudson 1980: 74 apudLyons 1987: 274 grifo meu), pode-se dizer que há uma estreita ligação entre cultura e sociedade. Ademais, segundo Sapir, "não há duas línguas que sejam bastante semelhantes para que se possa dizer que representam a mesma realidade social' (1969:20 grifo meu). Assim, para efeito da discussão proposta nesta seção, tomo o termo 'sociedade' como equivalente a 'realidade social' e, grosso modo, a 'cultura'. De acordo com Sapir, a realidade é produzida pela linguagem, o que significa dizer que não há mundos iguais, visto que não há línguas iguais. Para o autor, a linguagem possui, sobretudo, o papel de produzir e organizar o mundo mediante o processo de simbolização. O caminho para compreensão do(s) mundo(s) se dá pela decifração dos símbolos, que referem (produzem) a realidade e remetem a conceitos (pensamento). Por exemplo: entender um poema exige a "compreensão plena de toda a vida da comunidade, tal como ela se espelha nas palavras ou as palavras a sugerem em surdina" (op. cit). O processo de simbolização da linguagem exige um sistema fonético que articule imagens acústicas "gerando" o símbolo, o qual proporcionará condições para a produção de conceitos/pensamentos. Sem os símbolos na matemática, por exemplo, um raciocínio matemático não seria possível, o que vale dizer que a matemática não existiria e muito menos se expandiria em níveis de complexidade. Os símbolos, por sua vez, geram um efeito sobre a linguagem que é o de sua ampliação (abstração), mediante um processo de classificação, categorização e seriação - característicos do pensamento. É dessa forma que o mundo ao nosso redor é possível/ construído, segundo Sapir. Uma ilustração clássica da construção da realidade a partir da linguagem é apresentada por Whorf em relação à língua hopi, na qual não é possível pensar o tempo de forma linear como em outras línguas, pois não há palavras, expressões ou formas gramaticais que permitam isso. Ao invés das noções de tempo e espaço (passado, presente e futuro), essa língua permite organizar o contraste entre partícula e onda 2, obrigando, "ao ser obrigatório pela forma de seus verbos, o povo hopi a perceber e observar os fenômenos vibratórios, animando-os além disso a encontrar nomes e a classificar esta classe de fenômenos" (1971:72). Fonte: www.atosociologico.blogspot.com Para o autor, é possível descrever qualquer fenômeno observável no universo sem levar em consideração os contrastes entre espaço e tempo, ou seja, sem considerar o espaço como algo homogêneo e independente do tempo, mas sim levando em conta as inter-relações existentes entre os fenômenos. Segundo Whorf, "o ponto de vista da relatividade, pertencente à física moderna, é um desses pontos concebidos em termos matemáticos, e a concepção universal do hopi é outra muito diferente e que não é matemática, mas sim linguística" (p. 74). As ideias desses dois estudiosos costumam ser referidas como a "hipótese de Sapir-Whorf", podendo ser assim sintetizadas: a linguagem determina a forma de ver o mundo, e consequentemente, de se relacionar com esse mundo (hipótese do determinismo linguístico); isso significa que para diferentes línguas há diferentes perspectivas e diferentes comportamentos (hipótese do relativismo linguístico). É interessante destacar que, para Sapir, tanto a língua como a cultura (realidade social) é passível de modificações: é da natureza da linguagem a mudança, visto que "não há nada perfeitamente estático" e a "deriva geral de uma língua tem fundo variável" (1969: 137). Entretanto, existe um paradoxo: embora ambas estejam sujeitas a mudanças, essas se dão em velocidades diferentes - a língua se modifica mais lentamente, pois "um sistema gramatical, no que depende dele próprio, tende a persistir indefinidamente. Em outras palavras, a tendência conservadora se faz sentir muito mais profundamente nos lineamentos essenciais da língua do que da cultura" (p. 61). As consequências disso são que as culturas não poderão WORKING PAPERS EM LINGÜÍSTICA, UFSÇ N.8, 2004 130 - Cristine Gorski Severo ser sempre simbolizadas pela linguagem, conforme a passagem do tempo; e que será muito mais fácil simbolizar a cultura no passado do que no momento atual. Posto isso, remeto-me às questões colocadas na introdução: para Sapir e Whorf, a linguagem determina a realidade social. Todavia, a versão forte da hipótese do determinismo linguístico parece se enfraquecer diante do descompasso verificado entre as mudanças na língua e na cultura, conforme exposto no parágrafo acima. 3.1 Hymes Hymes pauta sua teoria no pressuposto da linguística constituída socialmente, o que implica uma relação entre ideologia/cultura e linguagem no que diz respeito à utilização da forma linguística motivada pelo usosocial. Esse pressuposto estipula que usos linguísticos se diferenciam mediante instituições, valores, crenças e diferenças individuais, no sentido de que são as diferenças do mundo/ da realidade/ do contexto que causam diferenças linguísticas: "valores culturais e crenças são em parte constitutivos da realidade linguística" (Hymes apud Figueroa 1994:42). O autor não está preocupado com o sistema gramatical formal, mas compreende a linguagem dentro de uma perspectiva comunicativa'', o que invoca outras áreas para o seu estudo, uma vez que a linguagem pode ser considerada como uma "parte integrada de uma organização sociocultural geral do comportamento" (Figueroa 1994:33). Para ele, a definição de língua é complexa e deve levar em conta diferentes aspectos, como o histórico, o social, o cultural e as particularidades individuais. Com a inserção do contexto histórico e etnográfico há a consequente supremacia do aspecto funcional em detrimento do formal. Segundo o autor, "não é a forma linguística que cria o padrão social, mas o padrão social informa a forma linguística. Nesse caso, a inferência é dos dados etnográficos para as funções da língua" (p. 42). Vemos assim que Hymes atribui ao contexto social uma propriedade causal - prioritária - em relação ao uso linguístico. Mesmo a estrutura formal está subordinada ao contexto que, para ele, é sempre comunicativo. Dessa forma, o autor subordina a competência gramatical à competência comunicativa, que implica "a habilidade de escolher, dentre uma variedade de falas possíveis, aquela que é mais apropriada para a situação (...) a competência consiste numa variedade de habilidades, incluindo conhecimento gramatical, mas sem se reduzir a esse" (op. cit p.53). Ainda na visão do linguista, diferentes línguas refletem diferentes mundos e isso implica um certo relativismo linguístico, que, em seu grau máximo, nos remete à hipótese de Sapir-Whorf (discutida na seção anterior). Como características desse relativismo, destacam-se: que ele se baseia em um princípio de diversidade e heterogeneidade ao invés de homogeneidade ou invariância; que os aspectos a priori e universais da língua não são suficientes e que não há igualdade linguística entre os falantes (devido, por exemplo, à natureza política da interação) (cf. Figueroa 1994: 42). Novamente aqui percebemos em evidência o caráter heterogêneo da língua permeando a relação linguagem e sociedade. Em síntese: ao atribuir relevância ao contexto social/cultural como constitutivo da realidade linguística, Hymes não deixa de operar com um certo determinismo. Só que, diferentemente de Sapir e Whorf o autor não prevê que a linguagem cria o contexto, mas que diferentes contextos motivam diferentes linguagens. Seria um tipo de determinismo sócia 3.2 Labov Em relação à teoria laboviana, dois aspectos principais merecerão nossa atenção: o contexto social (sociedade) traduzido pela noção de comunidade de fala e (os condicionamentos sociais e estilísticos. Fonte: www.opiniaoenoticia.com.br 3.3 A noção de comunidade de fala Labov propõe "o estudo da estrutura e da evolução da língua dentro do contexto social da comunidade de fala "(1972: 184 grifos meu). Interessa a ele, sobretudo, um certo tipo de macro linguística, que "coloca os lócus da linguagem em algum tipo de ordem social (a comunidade de fala) ao invés do indivíduo" (Figueroa 1994: 70). A preocupação de Labov com a fala da comunidade fica patente em sua definição de linguagem como "o instrumento de comunicação utilizado por uma comunidade de fala, um sistema comumente aceito de associações entre formas arbitrárias e seus significados" (Labov 1994: 09). Daí a questão: quais os limites que fazem com que um falante pertença a uma determinada comunidade de fala e não a outra? Para o socio linguista, os limites não estão presentes no fato de um falante se considerar pertencente a uma dada comunidade, mas sim nas características essenciais - as regras gramaticais - do sistema linguístico abstrato daquele falante, em relação à comunidade a que pertence. A aquisição desse sistema linguístico não se dá conscientemente, ou seja, não diz respeito à vontade do falante de falar de determinada forma; a aquisição da gramática ocorre de forma inconsciente, como também são também inconscientes, em grande parte, as reações subjetivas s dos falantes em relação à língua. Além disso, para o autor, a característica principal da comunidade de fala está no fato de que seus integrantes devem compartilhar as mesmas atitudes e os mesmos valores em relação à língua: "atitudes sócias em relação à língua são extremamente uniformes numa comunidade de fala" (Labov 1972: 248). Guy (2001), com base em Labov, aponta três características essenciais na definição de uma comunidade de fala 6: os falantes devem compartilhar traços linguísticos que sejam diferentes de outros grupos; devem ter uma frequência de comunicação alta entre si; e devem ter as mesmas normas e atitudes em relação ao uso da linguagem. Entretanto, a identificação de uma comunidade de fala, ou o estabelecimento de seus limites, não é uma tarefa fácil, o que pode ser ilustrado pelo seguinte exemplo fornecido pelo autor: há diferenças entre o falar dos nativos de Fortaleza e de Florianópolis em relação aos três aspectos colocados acima, o que permite distinguir duas comunidades de fala; contudo, ao se considerar Brasil e Portugal, provavelmente os nativos de Fortaleza e de Florianópolis integrariam uma mesma comunidade de fala. Guy levanta então algumas questões: quais seriam os limites internos de uma comunidade? Até que ponto uma comunidade de fala seria caracterizada pelo uso linguístico? Guy considera aspectos quantitativos e qualitativos para limitar uma comunidade de fala. Quanto aos primeiros, tem-se como exemplo a frequência com que uma certa comunidade apaga o -r final no português brasileiro. Isso teria uma implicação (e motivação) social e dialetal, mas, também, poderia ser motivado pelo efeito de contexto', havendo uma grande frequência de apagamento do -r final em verbos no infinitivo para quase todos os brasileiros, diferentemente do apagamento do -r final em outras palavras. Avançando em suas reflexões, o linguista aponta duas possibilidades: pode haver diferenças de frequência em diferentes comunidades de fala, sendo que o efeito de contexto permanece semelhante; ou pode haver diferenças em termos do efeito de contexto (peso relativo) entre as comunidades, o que determinaria diferenças estruturais ao invés de diferenças simplesmente quantitativas. Assim, a sua hipótese é: falantes que variam apenas na frequência possuem a mesma gramática e falantes que variam em termos de efeito de contexto possuem gramáticas diferentes. Daí os limites postos por Guy: as diferenças em uma mesma comunidade de fala implicam diferenças em uma mesma gramática (não-gramaticais) enquanto que diferentes comunidades de fala fazem uso de diferentes gramáticas. Essa hipótese lançada por Guy não só encontra respaldo nos pressupostos labovianos - pois, conforme visto acima, Labov considera que os limites de uma comunidade de fala devem ser buscados no sistema linguístico abstrato dos falantes, além do compartilhamento de atitudes sociais -, como também operacionaliza uma forma de medir o partilhamento de traços linguísticos pelos falantes. Diante do exposto parece possível falar em um certo determinismo linguístico, uma vez que usos linguísticos de uma mesma gramática funcionariam como identificadores de uma mesma comunidade de fala, ao passo que usos de gramáticas diferentes apontariam para diferentes comunidades de fala. Em outras palavras, a estrutura gramatical estaria delineando a comunidade de fala. As bases para a identificação de uma comunidade de fala seriam, nesse sentido, de natureza linguística'.Fonte: www.zellacoracao.wordpress.com OS CONDICIONAMENTOS SOCIAIS E ESTILÍSTICOS' Weinreich, Labov e Herzog (1968), ao postularem a noção de comunidade de fala, a justificam em termos de que "as estruturas variáveis contidas na língua são determinadas por funções sociais" (p.188 grifo meu), destacando que "fatores linguísticos e sociais estão fortemente inter-relacionados no desenvolvimento de uma mudança linguística"(op. dt). Nessa mesma direção, Labov (1972) aponta como uma das propriedades de uma variável sociolinguística que a "distribuição do traço deve ser altamente estratificado"(p. 08). Observa-se, assim, uma correlação sistemática entre a estratificação social e o uso variável da língua. Segundo Figueroa, Labov "mantém a posição realista de que o contexto social é formado por fatos sociais que atuam sobre o indivíduo, mas que não são criados pelo indivíduo", entendendo como fato social "uma forma de comportamento, que é geral na sociedade e exerce condicionamento sobre os indivíduos; mas esse condicionamento é peculiar em termos de geralmente ser inconsciente e, portanto, não poder agir diretamente" (p. 72). Nos moldes labovianos, através da linguagem é possível tirar "um retrato" da realidade social. Em outras palavras, o indivíduo se identifica ao falar ("função de identificação", cf. Labov 1978). Desse modo, o determinismo soda/preconizado por Weinreich, Labov e Herzog (1968) estaria mantido. Mas isso deve ser visto com reservas diante de indagações como: até que ponto se pode dizer que o uso de certa estrutura linguística define o grupo ao qual a pessoa "genuinamente" pertenceria? O uso "consciente" do [r] em posição pós-vocálica pelos empregados da loja de padrão alto, por exemplo, não identifica necessariamente as características sociais "naturais" do falante, podendo esse ser "enquadrado" em um grupo social diferente daquele ao qual realmente pertence. Assim, através do uso "consciente" de certas formas, o falante" pode mostrar características sociais tais que lhe permitam ser "identificado" como pertencendo a um grupo X (embora de fato pertença ao grupo Y), e isso romperia com a perspectiva determinística de que o contexto social determina a linguagem. Essa questão, entretanto, deve ser examinada sob a ótica da variação estilística, o que será discutido adiante. Por outro lado, Weiner & Labov (1983) mostram, em seu estudo da passiva sem agente, que a variação entre o uso da construção passiva e da ativa em inglês não é sensível a fatores sociais, sendo condicionado apenas por fatores de natureza linguística. Nesse caso, uma das exigências originariamente formuladas para se caracterizar uma variável linguística - a de que a mesma fosse estratificada -, deixou de ser atendida. Como fica, então, a questão do condicionamento social, nesse caso? Para Labov (1972), os indivíduos variam seu modo de falar conforme a situação em que se encontram", considerando a relação entre diferentes estilos (informal, cuidado, de leitura, etc.) e diferentes usos linguísticos, no que diz respeito especialmente à atenção e ao monitoramento Retomando o exemplo anterior, o uso do [r] pelos Working Papear em linguística, UFSÇ N.8,2004 136 - Cristine Gorski Severo diferentes grupos sociais mostram também a relação entre fatores estilísticos (fala cuidada ou não) e a pronúncia ou não da vibrante. Nesse caso, teríamos o que Labov (1978) chama de "função de acomodação"" da linguagem, em que o falante se adequa à situação comunicativa. Posteriormente, Labov (2003) amplia sua noção de variação estilística, postulando que as variações linguísticas no indivíduo de acordo com o contexto, são determinadas por três aspectos: as relações entre os interlocutores, particularmente as relações de poder e solidariedade entre eles; o contexto social mais amplo - escola, trabalho, vizinhança; e o tópico" (p234). Desse modo, a par de condicionamentos sociais (normalmente inconscientes), que podem ser observados na comunidade de fala, existem também condicionamentos estilísticos, que operam no plano individual, no âmbito das escolhas linguísticas conscientes. Apesar de a noção de sociedade e suas implicações ser explorada de forma diferenciada pelos autores aqui discutidos, com enfoque ora em aspectos concernentes à realidade social; ora no contexto histórico social e no conceito de competência comunicativa; ora na noção de comunidade de fala, estratificação social e estilo, parece possível abstrair as especificidades de enfoque e tecer considerações de caráter comparativo mais geral entre os autores e suas respectivas visões de linguagem e sociedade, na tentativa de evidenciar qual o tipo de relação que permeia o binômio em questão, a partir de uma hipótese determinística. Na formulação de Sapir-Whorf, a maneira pela qual a linguagem determina formas de percepção do mundo e o próprio mundo é identificada na literatura como determinismo linguístico. Todavia, o desencontro entre linguagem e cultura em termos de evolução (mudança), conforme apontado por Sapir, é um indício de que tal determinismo deve ser amenizado. Na proposta de Hymes, o papel atribuído à influência do contexto social/cultural sobre os usos linguísticos parece apontar para a direção do que se poderia chamar de um certo determinismo social- originado pelo contexto. O falante seria dotado de competência comunicativa para se adequar linguisticamente a diferentes situações comunicativas. Pode-se dizer que esse mesmo tipo de relação entre contexto e linguagem sustenta o que Labov chama de condicionamento estilístico. Contudo, diferentemente de Hymes, que prioriza o contexto, Labov considera a função de "acomodação" como secundária, o que parece colocar em segundo plano a importância das interações sociais no uso linguístico. Esse aparente paradoxo deve-se ao fato de que o papel de adequação ao contexto cabe ao indivíduo. Na teoria sociolinguística de Labov, percebem-se implicações determinísticas de diferentes tipos e em diferentes graus. Ao caracterizar a comunidade de fila-os lócus do objeto de estudo variacionista -, o autor atribui um importante papel à língua (uma mesma gramática recobrindo usos variáveis implica uma mesma comunidade de fala, segundo Guy), de tal modo que uma comunidade de fala poderia ser delimitada por certos usos linguísticos, entre outras propriedades (um certo determinismo linguístico). Fonte: www.opera10.com.br Por sua vez, os falantes de uma comunidade operam com regras linguísticas variáveis, e a seleção das variantes pode ser socialmente condicionada por fatores que dizem respeito à estratificação social (um certo determinismo social). A escolha das variantes pode ser também estilisticamente condicionada por fatores de natureza contextuai (um certo determinismo linguístico). Concluindo, tento responder, em termos amplos, as questões colocadas na introdução do trabalho: a sociedade determina a linguagem" - do ponto de vista do contexto e da estratificação social e estilo, segundo Hymes e Labov, respectivamente; a linguagem determina a sociedade - na produção e representação da realidade social e na delimitação de uma comunidade de fala, de acordo com Sapir-Whorf e Labov (Guy), respectivamente; as relações entre linguagem e sociedade são permeadas por um certo determinismo nas três perspectivas WORICING PAPERs EM LINGÜÍSTICA, UFSÇ N.8, 2004 138 - Cristine Gorski Severo aqui analisadas, sendo que há uma aproximação maior entre as postulações de Hymes e Labov. Esse determinismo parece atuar unilateralmente em Sapir e Whorf (linguagem à realidade social) e em Hymes (contexto social à linguagem), mas parece ser bilateral em Labov (fatores sociais e estilísticos à linguagem; e linguagem à comunidade de fala). Daí a indagação que fica em suspenso: não haveria em Labov uma certa dialética?3 VARIEDADE LINGUÍSTICASA língua não é, como muitos acreditam, uma entidade imutável, homogênea, que paira por sobre os falantes. Pelo contrário, todas as línguas vivas mudam no decorrer do tempo e o processo em si nunca para. Ou seja, a mudança linguística é universal, contínua, gradual e dinâmica, embora apresente considerável regularidade. A crença em uma língua estática e imutável está ligada principalmente à normatividade da gramática tradicional, que remota à Grécia Antiga, numa época em que os estudiosos estavam interessados principalmente em explicar a linguagem usada nos textos dos autores clássicos e em preservar a língua grega da "corrupção" e do "mau uso". A língua escrita - especialmente a dos clássicos - era tão valorizada que era considerada mais pura, mais bonita e mais correta do que qualquer outro tipo de linguagem. A linguística moderna, no entanto, prioriza a língua falada em relação à língua escrita por vários motivos, dentre eles pelo fato de que todas as sociedades 3 Texto adaptado: www.periodicos.ufsc.br humanas conhecidas possuem a capacidade da fala, mas nem todas possuem a escrita. Analisando a nossa própria sociedade, podemos concluir que a escrita pertence a poucos, uma vez que grande parte da população brasileira é constituída por analfabetos ou semianalfabetos e que mesmo os que tiveram acesso à escola não a usam muito. Além da língua falada ser mais utilizada do que a escrita e atingir muito mais situações, o ser humano a adquire naturalmente, sem precisar de treinamento especial. Apenas em contato com o modelo, ou seja, apenas exposta a uma determinada língua, qualquer criança normal é capaz de falar essa língua e compreendê-la perfeitamente nas mais variadas situações e em um período de tempo muito curto. Aos três anos, mais ou menos, uma criança já adquiriu quase todas as regras de sua língua, podendo ser considerada um falante competente da comunidade linguística da qual faz parte. Mesmo quando parece que ela não conhece a sua língua nativa, o dizer, por exemplo, "eu di" ou "eu fazi" no lugar de "eu dei" e "eu fiz", a criança está mostrando que sabe muito sobre ela, pois já compreendeu que o passado, no português, termina regularmente com "i" e está aplicando uma regra geral da língua em vez de aplicar uma particular. O processo de aquisição da escrita difere do da fala no sentido de não ser natural. Crianças que têm mais contato com a escrita sem dúvida a aprendem mais fácil e rapidamente, mas ainda assim necessitam de algum tipo de instrução. Quanto à homogeneidade, as pessoas de uma mesma comunidade linguística podem até pensar que falam exatamente a mesma língua, mas isso não é verdade. As diferenças linguísticas podem ser percebidas em todas as línguas do mundo, mesmo em pequenas comunidades de fala, nos níveis fonéticos, fonológico, morfológico, sintático ou semântico. Por exemplo, a palavra "porta" pode ser pronunciada de várias maneiras, tais como poxta, pota ou pôrta; a palavra "mulher" pode ser pronunciada "muié"; as frases "Maria assistiu ao filme" e "faz dois anos que parei de fumar" também podem ser ditas "Maria assistiu o filme" e "fazem dois anos que parei de fumar", respectivamente. Na verdade, toda língua é um conjunto heterogêneo e diversificado porque as sociedades humanas têm experiências históricas, sociais, culturais e políticas diferentes e essas experiências se refletirão no comportamento linguístico de seus membros. A variação linguística, portanto, é inerente a toda e qualquer língua viva do mundo. Isso significa que as línguas variam no tempo, nos espaços geográfico e social e também de acordo com a situação em que o falante se encontra. Podemos exemplificar a variação temporal com a forma "você", que passou por uma grande transformação ao longo do tempo. No século XII, as pessoas diziam "vossa mercê" e hoje, na linguagem falada, e mesmo na escrita informal, encontramos "cê", que não é a melhor nem a pior que "você" ou "vossa mercê", embora entre os não-linguistas a tendência seja a de considerá-la ruim, feira ou deteriorada. Isso acontece porque a sociedade normalmente é conservadora e demora para aceitar as mudanças, inclusive as linguísticas. O espaço linguístico também produz variação em um momento sincrônico de uma língua, o que pode ser explicado tanto pela existência de limites físicos como montanhas, mares ou rios que separam uma comunidade linguística de outra, como pela ideia de "rede de comunicação". Considerando-se uma população espalhada em um determinado espaço geográfico, uma pessoa se comunicará mais com aqueles que estão mais próximos a ela do que com as que se encontram mais distantes. Haverá, assim, um padrão de maior densidade de comunicação entre os indivíduos que estão mais próximos e de menor densidade de comunicação entre os que se encontram mais distantes. A maior densidade provocará maior interação entre as pessoas e, consequentemente, as formas linguísticas de uns se estenderão aos membros do grupo mais denso (que estão mais próximos) do que aos membros dos agrupamentos mais distantes. Aparecerão, dessa maneira, em cada região, diferentes variedades. No Brasil, por exemplo, a fala da região nordestina se caracteriza pela abertura das vogais pretônicas "e" e "o", como em "mérgulho" e "cólete", normalmente fechadas em outras regiões. Há lugares onde se diz ‘’tomati’’, pimênta e kaska. As variações também podem ser notadas nas estruturas sintáticas ou no nível lexical. Assim, conforme a região, encontramos "nós fomos ir embora" em vez de "nós fomos embora" e a banana pode ser "anã", "nanica" ou "d'água". Fonte: www.descomplica.com.br A densidade de comunicação também pode explicar as variedades linguísticas que existem entre os diferentes grupos sociais, uma vez que cada um formará a sua própria rede de comunicação. Assim, sociedades rurais e urbanas são importantes fatores sociais, bem como sexo, idade, escolaridade, classe socioeconômica, dentre outros. Sabemos, por exemplo, que pessoas que vivem nas áreas urbanas falam variedades diferentes dos falantes do meio rural, onde são comuns formas como "nóis vai" ou "eles prantô" em oposição às formas padrão "nós vamos" e "eles plantaram", mais características das regiões urbanas. As mulheres, por outro lado, são linguisticamente mais conservadoras e geralmente mais sensíveis à norma culta do que os homens, além de usarem expressões e até entonações mais associadas à feminilidade, enquanto os homens, de modo geral, distanciam-se da norma padrão e usam formas que acentuam sua masculinidade. Segundo Possenti, "muitos meninos não podem usar a chamada linguagem correta na escola, sob pena de serem marcados pelos colegas, porque em nossa sociedade a correção é considerada uma marca feminina". Os grupos etários também diferem linguisticamente: os mais jovens, por exemplo, tendem a ser menos conservadores que os mais velhos e isso se refletirá na sua maneira de falar. A escolaridade também é um fator muito relevante na questão da variação linguísticas e, em nosso país, está diretamente relacionada à classe socioeconômica, porque os que têm acesso à escola pertencem, de modo geral, ao grupo socioeconômico mais privilegiado. Dessa maneira, as pessoas pertencentes aos estratos sociais mais altos tendem a usar mais as formas padrão do português do que aquelas dos grupos menos privilegiados e menos escolarizados. A língua varia, ainda, de acordo com a situação em que o falante se encontra. Situações formais exigem uma variedade de língua mais cuidada, uma vez que a sociedade impõe certas regras sociais - e, consequentemente, linguísticas - que espera ver cumpridas, e que qualquer desrespeito a essas regras pode provocar não só o constrangimento ao falante como também a sua não-aceitação pelo grupo. Linguisticamente, porém, todasas formas associadas a grupos sociais e a diferentes situações são igualmente perfeitas. Nenhuma é melhor, ou mais correta ou mais bonita que outra, embora umas tenham prestígio social e outras não tenham, e embora algumas possam ser mais adequadas a certas situações sociais que outras. A aceitação ou não de certas formas linguísticas por parte da comunidade falante está relacionada com o significado social que lhe é imposto pelo grupo que as usam, ou seja, estão relacionadas com o conjunto de valores que simbolizam e que se uso comunica. Algumas variedades são estigmatizadas ou ridicularizadas não porque são feias, incorretas ou ruins em si, mas porque a sociedade, preconceituosamente, associa seu uso a situações e/ou grupos sociais com valores negativos. Cientificamente, porém, todas as variedades de uma língua qualquer são igualmente consideradas, porque possuem uma gramática, ou seja, todas possuem regras, todas têm organização e todas são funcionais. A escola, de modo geral e tradicionalmente, tem desconsiderado a questão da variação linguística e dos usos das variedades pela comunidade falante, o que é bastante grave, já que muito do que é classificado como problema de fala e escrita, principalmente na alfabetização, está diretamente relacionado ao fenômeno. O professor alfabetizador, geralmente imbuído dos conceitos da gramática tradicional, atribui valores de certo e errado aos textos de seus alunos, desconsiderando que as crianças, nesta fase, além de não possuir o domínio do sistema gráfico e das complexidades que lhe são características, tende a escrever conforme o seu dialeto regional e/ou social. Mattoso Câmara Jr., em um artigo denominado "Erros de escolares como sintomas de tendências linguísticas no português do Rio de Janeiro", apresenta resultados parciais de análises de textos em que mostra que a oralidade e a percepção fonética estão presentes na produção escrita dos alunos. Luiz Carlos Cagliari, em Alfabetização e linguística, afirma que as crianças relacionam a fala e a escrita ortográfica a todo momento e que seus erros não são frutos de distração, irreflexão ou descuido. Para ele, os alunos aprendem a escrever produzindo textos espontâneos, aplicam nessa tarefa um trabalho de reflexão muito grande e se apegam a regras que revelam usos possíveis do sistema de escrita do português. Essas regras são tiradas dos usos ortográficos que o próprio sistema de escrita tem ou de realidades fonéticas, num esforço da criança para aplicar uma relação entre letra e som que nem sempre é previsível, mas que também não é aleatória.4 TIPOS DE VARIEDADES LINGUÍSTICAS Variedades geográficas 4 Texto adaptado: www.scielo.br Varia conforme o lugar, a região ou pais em que é desenvolvida. As mudanças de tipo geográfico se chamam dialetos. Diz-se que uma língua é um conjunto de dialetos cujos falantes podem se entender. Exemplos: “menino” é dito no Sudeste.” Guri” para os gaúchos e “piá” para os paranaenses. Variedades históricas Ela varia com o tempo, com o desenvolvimento da história. Como por exemplo, a palavra “Você”, que antes era “vosmecê” e que agora, diante da linguagem reduzida no meio eletrônico, é apenas “VC”. Variedades sociais Os fatores podem variar dependendo da classe social, educação (alfabetizado e analfabeto), profissão (médico e economista), idade (criança e idoso), procedência étnica, etc. É aquela pertencente a um grupo específico de pessoas. Gírias usadas por grupos como jogadores de “games”, surfistas etc. Temos a linguagem coloquial, usada no dia a dia das pessoas; Jargões usados por profissionais como médicos, técnicos de informática, advogados e a linguagem formal, usada pelas pessoas que tem uma maior classe social. Variedades situacionais Incluem as modificações na linguagem decorrentes do grau de formalidade da situação ou das circunstâncias em que se encontra o falante. Ocorre de acordo com o contexto o qual está inserido, por exemplo, as situações formais e informais. Exemplo: Conversa em uma rede social será informal. Em uma entrevista de emprego será formal E você, qual o concurso você vai fazer? Deixe um comentário para mim, pois posso fazer postagens direcionadas para ele e te ajudar mais. Aproveita também para inscrever seu e-mail para receber conteúdos todos os dias.5 Fonte: www.mscamp.wordpress.com O ENSINO DAS VARIAÇÕES LINGUÍSTICAS NOS ANOS INICIAIS As aulas de Língua Portuguesa costumam centrar-se no ensino da gramática, ensinando centenas de regras, que muitas vezes se distanciam da realidade dos falantes brasileiros. Com isso, causam certa antipatia por parte dos estudantes, pois eles se sentem como aprendizes de um idioma estrangeiro que, por mais que se esforcem, dificilmente chegarão à fluência. Para Antunes (2003, p. 40): O conhecimento teórico disponível a muitos professores, em geral, se limita a noções e regras gramaticais apenas, como se tudo o que é uma língua em funcionamento coubesse dentro do que é uma gramática. Teorias linguísticas do uso da prosódia, de morfossintaxe, da semântica, da pragmática, teorias do texto, concepções de leitura, de escrita, 5 Texto extraído: www.centraldefavoritos.com.br concepções, enfim, acerca do uso interativo e funcional das línguas, é o que pode embasar um trabalho verdadeiramente eficaz do professor de português. Para Terra (2008), “a gramática normativa apresenta características semelhantes aos códigos de natureza ética ou moral, que nos impõem o que devemos ou não fazer, o que é permitido e o que é proibido” (Terra, 2008, p 53). Sendo assim, parece tornar o ensino autoritário e descontextualizado com a prática linguística de muitos estudantes, que têm que decorar as regras para realização de uma prova, mas que, na sua vida, muitas delas não serão utilizadas. De que adianta ter centenas de regras gramaticais, as quais não representam o modo como a grande massa dos falantes brasileiros usa a língua? Muitas dessas regras, no entanto, para os dias atuais, são obsoletas. É o que pensa Terra (2008, p. 59) quando nos diz que: Dado o caráter estático da norma e o caráter dinâmico da fala, a distância entre ambas é, em cada momento maior. A fala, por ser a realização concreta da língua, representando sua diversidade, evolui a cada instante, acompanhando as transformações da sociedade. Ensina-se a língua portuguesa como se fosse só gramática, tudo que uma língua tem de riqueza e dinamismo é posto em segundo plano. Alguns professores questionam: por que os estudantes não gostam da Língua Portuguesa? “O que a escola ensina não é a língua, mas a nomenclatura. As aulas de Língua Portuguesa costumam se caracterizar por ensinar o nome das coisas” (Terra, 2008, p 79). Pressupõe-se que o mais importante da língua não é ensinado. O seu uso social e a funcionalidade entre os homens que a utilizam parecem não ser lembrados durante as aulas. Estas mesmas aulas de português, quando dispõem de tempo para o ensino das variações linguísticas, o fazem de maneira intolerante, como aponta Bagno (2008, p. 16): É preciso evitar a prática distorcida de apresentar a variação como se ela existisse apenas nos meios rurais ou menos escolarizados, como se também não houvesse variação (e mudança) linguística entre os falantes urbanos, socialmente prestigiados e altamente escolarizados, inclusive nos gêneros escritos mais monitorados. Considerando as variações como algo que compromete a existência da Língua Portuguesa, os próprios livros didáticos contribuem para agravar esta situação, favorecendo umas variações e criticando outras. Bagno (2008, p. 16) defende que: Todos os aprendizes devem ter acesso às variedades linguísticas urbanas de prestígio, não porque sejam as únicas formas “certas”de falar e de escrever, mas porque constituem, junto com outros bens sociais, um direito do cidadão, de modo que ele possa se inserir plenamente na vida urbana contemporânea, ter acesso aos bens culturais mais valorizados e dispor dos mesmos recursos de expressão verbal (oral e escrita) dos membros das elites socioculturais e socioeconômicas. O ensino da Língua Portuguesa necessita com urgência de uma reorganização, não só no ensino das variações linguísticas, como em todas as áreas, como defendem os Parâmetros Curriculares Nacionais da Língua Portuguesa (PCNs): Essas evidências de fracasso escolar apontam à necessidade de reestruturação do ensino de Língua Portuguesa, com o objetivo de encontrar formas de garantir, de fato, a aprendizagem da leitura e da escrita (Secretaria de Educação Fundamental,1997, p. 19). A escola não pode discriminar o estudante pelo seu jeito de se comunicar. Pois, essa maneira de falar representa muito mais que um processo comunicativo, é a identidade do falante. Nela, é possível perceber de onde vem este falante, a que classe social pertence, que cultura possui, etc. É de grande relevância para o falante do português saber identificar e diferenciar sua variação linguística das demais, não para desprestigiar, e sim para respeitar e encantar-se com a riqueza que a língua materna possui. É uma das propostas dos PCNs da Língua Portuguesa dos anos iniciais: (...) conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características individuais e sociais (Secretaria de Educação Fundamental, 1997, p. 15). O conhecimento das diversas variações linguísticas também possui sua finalidade para a compreensão da linguagem do cinema, teatro e telenovelas, para a caracterização do modo de falar dos personagens, que muitas vezes o fazem de forma exagerada e totalmente diferente da realidade, por falta de informação ou intencionalmente. Um bom exemplo disso são os sotaques dos personagens nordestinos exibidos nas novelas, que muitas vezes são exagerados e tornam-se cômicos, representando quase sempre pessoas de classes populares e notadamente com pouco nível de instrução. Segundo Bagno (2008) esse sotaque deve ser de um nordestino de marte. Fonte: www.trabalhosparaescola.com.br Por conta desta ação e do ensino discriminatório, é que o preconceito linguístico vem se expandindo. Com a mesma importância que o ensino da norma padrão representa para qualquer cidadão no seu uso social, as variações não padrão também estão presentes. Durante o dia e, dependendo de com quem se fala, é necessário mudar o jeito de falar para ser compreendido. É o que acontece com os inúmeros gêneros textuais, cada um com sua função para auxiliar a escrita. O direito que é dado para todos aprenderem a norma padrão deve ser o mesmo para o ensino das variações. O estudante não pode em momento algum sentir-se linguisticamente inferior, nem superior às outras variações, pois “diferença não é deficiência nem inferioridade” (Bagno, 2008, p. 29). O autor ainda defende que: Seria mais justo e democrático explicar ao aluno que ele pode dizer “bulacha” ou “bolacha”, mas que só pode escrever bolacha, porque é necessária uma ortografia única para toda a língua, para que todos possam ler e compreender o que está escrito (Bagno, 2008, p. 69). O que se espera da escola e dos docentes é uma mudança nesta concepção do que é ensinar uma língua para o próprio falante do idioma. Que deixe de olhar para a gramática como se fosse um livro sagrado e olhe mais para os estudantes de língua Portuguesa, não como assassinos da língua, mas sim continuadores. A falta de conhecimento dos docentes e das escolas de ciências como a Linguística e a Sociolinguística deixa o ensino-aprendizagem da Língua Portuguesa intolerante. A definição de Linguística, segundo Cagliari (2007. P. 42) é: (...) a linguística é o estudo científico da linguagem. Está voltada para a explicação de como a linguagem humana funciona e de como são as línguas em particular, quer fazendo o trabalho descritivo usando os conhecimentos adquiridos para beneficiar outras ciências e artes que usam de algum modo, a linguagem falada ou escrita É imprescindível que os estudantes aprendam seu idioma de forma lúdica quando for possível ou de maneira prazerosa. Que não se considerem incapazes de falar sua própria língua e que vejam que a comunicação humana é um instrumento tão poderoso, que pode até resolver conflitos ideológicos, políticos e sociais quando se faz necessário um diálogo. É nítido que não só o ensino das variações linguísticas, como o de toda Língua Portuguesa está acontecendo de forma descontextualizada, para não dizer errada. É o que Cagliari (2007) mostra: Neste país, o aluno passa 8 anos na escola de 1° grau, 3 anos na de 2° grau e pode passar mais 4 anos na faculdade, sem contar o ano de cursinho preparatório e as reprovações [...] e, se um especialista em problemas relacionados à Língua Portuguesa fizer uma pesquisa séria para ver o que esse aluno aprendeu em mais de uma década de estudos, sem dúvidas ficará decepcionado. Então o que o aluno faz nesses anos todos de escola? Será que o ser humano precisa de tanto tempo para aprender tão pouco? O que está errado nesta história? (Cagliari, 2007, p. 23). Parece que a parte pedagógica do ensino não se importa com a bagagem que o estudante tem linguisticamente desde que entra na escola. É como se ele tivesse que esquecer tudo que já aprendeu socialmente sobre Língua Portuguesa e tenha que aprender outra língua que nada tem a ver com a forma que ele se expressa. É fundamental que o docente assuma o papel de estudioso, investigador, cientista, buscando construir o próprio conhecimento da língua, assumindo uma postura crítica que consequentemente o auxiliará a ressignificar sua prática, pois segundo Bagno (2008, p. 115), como docentes devemos: (...) acionar nosso sendo crítico toda vez que nos depararmos com um comando gramatical e saber filtrar as informações realmente úteis, deixando de lado (e denunciando, de preferência) as afirmações preconceituosas, autoritárias e intolerantes. Da parte do professor em geral, (...) essa mudança de atitude deve refletir-se na não-aceitação de dogmas, na adoção de uma nova postura (crítica) em relação a seu próprio objeto de trabalho: a norma culta. A escola e os docentes, principalmente dos anos iniciais, estão tão incutidas da norma padrão, que parecem acreditar que sua principal função é ensinar a criança a falar segundo essa norma. É um terrível engano que podemos cometer se aderirmos essa ideia, quando sabemos que isso não corresponde ao que nos diz os PCNs: Não é papel da escola ensinar o aluno a falar: isso é algo que a criança aprende muito antes da idade escolar. Talvez por isso, a escola não tenha tomado para si a tarefa de ensinar quaisquer usos e formas da língua oral. Quando o faz, foi de maneira inadequada: tentou corrigir a fala “errada” dos alunos – por não ser coincidente com a variação linguística de prestigio social, com a esperança de evitar que escrevesse errado. Reforçou assim o preconceito contra aqueles que falam diferente da variedade prestigiada. (Secretaria de Educação Fundamental, 1997, p. 48) Se fosse assim, o estudante chegaria ao ambiente escolar mudo e, com o avançar das séries, começaria a falar como o que acontece com quem está aprendendo um novo idioma, como aponta Cagliari (2007, p. 83): Um aluno na escola não pode chegar à conclusão que seus pais são “burros” porque falam errado, não pode achar que as pessoas de sua comunidade são incapazes porque falam errado, não têm valorporque falam errado, ao passo que a cultura só está com quem fala o dialeto padrão, que a lógica do raciocínio só pode ser expressa nessa variedade linguística, que o bom, belo e perfeito só pode ser expresso através das “palavras bonitas” do dialeto-padrão. Não se trata de uma apologia ao falar diferente da norma padrão, mas tão só de respeitar as variações que não seguem a normatização. Tendo em vista que toda sociedade se constitui da individualidade de cada um “não se trata de ensinar a falar ou a fala “correta”, mas sim as falas adequadas ao contexto de uso” (Secretaria de Educação Fundamental, 1997 p. 22). Fonte: www.provafacilnaweb.com.br Uma união entre um homem e uma mulher ganha mais credibilidade quando existe uma certidão de casamento. A escravidão só terminou com a assinatura da Lei Áurea. Como se percebe a sociedade dá um status de seriedade para a escrita. Por ter um papel muito relevante no mundo letrado, como nos diz Cagliari (2007, p. 96): “O ensino do português tem sido fortemente dirigido para a escrita, chegando mesmo a se preocupar mais com a aparência da escrita do que com o que ela realmente faz representar”. Porém, não se pode esquecer que, da mesma forma que a escrita tem uma funcionalidade, a fala também tem. É o que afirmam os PCNs: O domínio da língua, oral e escrita, é fundamental para a participação social efetiva, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Por isso, ao ensiná-la, a escola tem a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes linguísticos, necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos (Secretaria de Educação Fundamental, 1997, p. 19). Por isso o ensino da Língua Portuguesa concentra-se na escrita (produção textual, resolução de questões, leitura silenciosa). Já a fala raramente é trabalhada em sala de aula e quando acontece é de forma errônea, criticando a maneira como certo grupo social fala. Da mesma forma que não existe variação superior a outra, o mesmo ocorre entre a escrita e a fala durante o ensino; as duas têm que ser coniventes no processo de ensino-aprendizagem, uma vez que “pode-se perceber agora que o ensino da Língua Portuguesa não só é problemático pelo que se ensina, mas também é falho porque se deixa de ensinar muita coisa” (Cagliari, 2007, 48). As aulas de Língua Portuguesa podem dar o direito para o estudante falar, discutir seu idioma, brincar com a fonologia das palavras, como acontece com a escrita. Diante dos pressupostos, entende-se que as variações linguísticas não são muito apreciadas pela escola, por apresentarem características que “promovem” o desvio da norma padrão, pois “a escola, como espelho da sociedade, não admite o diferente e prefere adotar só as noções de certo e errado, numa falsa visão da realidade” (Cagliari, 2007, p. 65). Com essa premissa, como o professor dos anos iniciais pode ensinar a Língua Portuguesa, sem desvalorizar as variações linguísticas? Aprender português (...) não é só aprender como a língua (e suas variedades) funcionam, mas também estudar ao máximo os usos linguísticos; e isso não significa só aprender a ler e escrever, mas inclui ainda a formação para aprender e usar as variedades linguísticas diferentes, sobretudo o dialeto-padrão. A escola dessa forma não só ensinaria português, como desempenharia ainda o papel imprescindível de promover socialmente os menos favorecidos pela sociedade (Cagliari, 2007, p. 83). Geralmente, as variações linguísticas são alvo de discriminação, principalmente, por serem relacionadas à fala de pessoas das camadas sociais menos privilegiadas. A escola e o professor precisam demonstrar o respeito pela liberdade de expressão dessas pessoas e a língua precisa ser ensinada de forma a combater esse preconceito. Os PCNs discutem que a língua deve ser também objeto de reflexão, apoiando-se em dois fatores: “a capacidade humana de refletir, analisar, pensar sobre os fatos e os fenômenos da linguagem, e a propriedade que a linguagem tem de poder referir-se a si mesma, de falar sobre a própria linguagem” (Secretaria de Educação Fundamental, 1997, p. 53). É possível fazer com que o estudante aprenda sobre a linguagem verbal e sobre os contextos sociais nos quais ela se aplica. Um dos principais objetivos do ensino da Língua Portuguesa nos primeiros ciclos é trabalhar com o estudante a capacidade de “participar de diferentes situações de comunicação oral, acolhendo e considerando as opiniões alheias e respeitando os diferentes modos de falar” (Secretaria de Educação Fundamental, 1997, p. 68). A formação do sujeito está além da sala de aula, mas é nela que podemos intervir nesse processo, pois a partir do momento em que o estudante reflete sobre suas atitudes, ele também pode ter uma compreensão ampla dos fatores que implicam em determinadas situações que envolvam as variações linguísticas, se reconhecendo como agente transformador que pode e deve combater o preconceito linguístico. A escola pode e deve formar bons usuários da língua padrão, mas fazendo com que possam reconhecer e utilizar as variedades linguísticas, respeitando-as como característica de um determinado grupo social, tal como aponta Cagliari (2007, p. 84). Se os alunos aprenderem a verdade linguística das variantes, geração após geração, a sociedade mudará seu modo de encarar esse fenômeno e passará a ter um comportamento social mais adequado com relação às diferenças linguísticas. Com isso, teremos falantes conscientes da diversidade linguística da Língua Portuguesa, abolindo a intolerância e o desrespeito com as variações linguísticas. Geraldi (1997) diz que miséria social e miséria de língua confundem-se. Essa frase nos faz refletir sobre o que acontece com vários brasileiros que se sentem miseráveis, por não ter o básico para sobreviver, e mais ainda, por não falar a língua padrão exigida pela gramática, que considera a sua forma de falar errada e que não pertence à língua portuguesa. Milhares de pessoas são excluídas socialmente por não seguirem a normatização de uma determinada gramática, escolhida há séculos numa sociedade totalmente diferente da de hoje. Fonte: www.novosalunos.com.br Como nos afirma Bagno (2008, p. 29) “assim, tal como existem milhões de brasileiros sem escola, sem teto, sem trabalho, sem saúde, também existem milhões de brasileiros que poderíamos chamar de sem línguas”. Isso nos faz refletir sobre o nosso papel de docente e nossa prática em sala de aula e, também, sobre a nossa relação com os milhares de estudantes que deverão passar por nós, que refletirão nossos pontos de vista e nossas esperanças, pois que é através deles que poderemos combater o preconceito linguístico.6 GÊNEROS TEXTUAIS São textos que exercem uma função social específica, ou seja, ocorrem em situações cotidianas de comunicação e apresentam uma intenção comunicativa bem definida. Os diferentes gêneros textuais se adequam ao uso que se faz deles. Adequam-se, principalmente, ao objetivo do texto, ao emissor e ao receptor da mensagem e ao contexto em que se realiza. Você já se deu conta da infinidade de situações comunicacionais às quais somos expostos ao longo de nossa vida? Nem precisa tanto, pois durante um único dia podemos estar envolvidos em diferentes contextos e ambientes que exigem de nós um comportamento linguístico específico. A linguagem é um dos mais eficientes meios de comunicação, pois ela nos permite interagir com pessoas, assim como alterar nosso discurso de acordo com as necessidades do momento. Dessa constante necessidade que o ser humano tem de interagir e comunicar-se com o outro, surgiram os gêneros textuais. Os gêneros textuais não podem ser numerados, visto que variam muitoe adaptam-se às necessidades dos falantes. Mesmo que não possamos contá-los, é possível observar que eles possuem peculiaridades que nos permitem identificá-los e reconhecê-los entre tantos outros gêneros. Entre as características dos gêneros textuais estão a apresentação de tipos estáveis de enunciados, além de estruturas e conteúdos temáticos que facilitam sua definição. Diferentemente dos tipos textuais, que apresentam uma estrutura bem definida, além de um número limitado de possibilidades (podem variar entre cinco e nove tipos), os gêneros textuais são diversos e cumprem uma função social 6 Texto extraído: www.ipv.pt específica. Além disso, os gêneros podem sofrer modificações ao longo do tempo, embora muitas vezes preservem características preponderantes. Como exemplo dessa “evolução”, temos a carta, que depois do advento da tecnologia foi transformada no e-mail, meio de comunicação que substituiu o papel, a caneta e a necessidade de postagem pelos correios, visto que pode ser recebido instantaneamente pelo destinatário. Contudo, alguns elementos linguísticos foram preservados, como as saudações, o remetente e, claro, o destinatário. Os gêneros são utilizados todas as vezes que os falantes estão inseridos em alguma situação comunicativa. Ainda que inconscientemente, selecionamos um gênero que melhor se adapta àquilo que desejamos transmitir aos nossos interlocutores, sempre com a intenção de sobre ele obter algum efeito. Seja no bilhetinho deixado na porta da geladeira, seja nas postagens feitas nas redes sociais ou até mesmo nas piadas que contamos para os nossos amigos, os gêneros estão lá, trabalhando a serviço da comunicação e da linguagem.7 Exemplos de gêneros textuais Romance; Conto; Fábula; Lenda; Novela; Crônica; Notícia; Ensaio; Editorial; Resenha; Monografia; Reportagem; 7 Texto adaptado: www.portugues.uol.com.br Relatório científico; Relato histórico; Relato de viagem; Carta; E-mail; Abaixo-assinado; Artigo de opinião; Diário; Biografia; Entrevista; Curriculum vitae; Verbete de dicionário; Receita; Regulamento; Manual de instruções; Bula de medicamento; Regras de um jogo; Lista de compras; Cardápio de restaurante; Embora os diferentes gêneros textuais apresentem estruturas específicas, com características próprias, é importante que os concebamos como flexíveis e adaptáveis, ou seja, que não definamos a sua estrutura como fixa. Os gêneros textuais possuem transmutabilidade, ou seja, é possível que se criem novos gêneros a partir dos gêneros já existentes para responder a novas necessidades de comunicação. São adaptáveis e estão em constante evolução. TIPOS E GÊNEROS TEXTUAIS Fonte: www.revistaestante.fnac.pt Tipos e gêneros textuais são duas categorias diferentes de classificação textual. Os tipos textuais são modelos abrangentes e fixos que definem e distinguem a estrutura e os aspectos linguísticos de uma narração, descrição, dissertação e explicação. Exemplos de tipos textuais: Texto narrativo; Texto descritivo; Texto dissertativo expositivo; Texto dissertativo argumentativo; Texto explicativo injuntivo; Texto explicativo prescritivo. Os aspectos gerais dos tipos de texto concretizam-se em situações cotidianas de comunicação nos gêneros textuais, textos flexíveis e adaptáveis que apresentam uma intenção comunicativa bem definida e uma função social específica, adequando-se ao uso que se faz deles. Gêneros textuais pertencentes aos textos narrativos: romances; contos; fábulas; novelas; crônicas; Gêneros textuais pertencentes aos textos descritivos: diários; relatos de viagens; folhetos turísticos; cardápios de restaurantes; classificados; Gêneros textuais pertencentes aos textos expositivos: jornais; enciclopédias; resumos escolares; verbetes de dicionário; Gêneros textuais pertencentes aos textos argumentativos: artigos de opinião; abaixo-assinados; manifestos; sermões; Gêneros textuais pertencentes aos textos injuntivos: receitas culinárias; manuais de instruções; bula de remédio; Gêneros textuais pertencentes aos textos prescritivos: leis; cláusulas contratuais; edital de concursos públicos; Gêneros textuais e gêneros literários Conforme o próprio nome indica, os gêneros textuais se referem a qualquer tipo de texto, enquanto os gêneros literários se referem apenas aos textos literários. Os gêneros literários são divisões feitas segundo características formais comuns em obras literárias, agrupando-as conforme critérios estruturais, contextuais e semânticos, entre outros. Exemplos de gêneros literários: Gênero lírico; Gênero épico ou narrativo; Gênero dramático. Os gêneros textuais são classificados conforme as características comuns que os textos apresentam em relação à linguagem e ao conteúdo. Existem muitos gêneros textuais, os quais promovem uma interação entre os interlocutores (emissor e receptor) de determinado discurso. São exemplos resenha crítica jornalística, publicidade, receita de bolo, menu do restaurante, bilhete ou lista de supermercado. É importante considerar seu contexto, função e finalidade, pois o gênero textual pode conter mais de um tipo textual. Isso, por exemplo, quer dizer que uma receita de bolo apresenta a lista de ingredientes necessários (texto descritivo) e o modo de preparo (texto injuntivo). Cada texto possuiu uma linguagem e estrutura. Note que existem inúmeros gêneros textuais dentro das categorias tipológicas de texto. Em outras palavras, gêneros textuais são estruturas textuais peculiares que surgem dos tipos de textos: narrativo, descritivo, dissertativo-argumentativo, expositivo e injuntivo. Fonte: www.conceptodefinicion.de Texto Narrativo Os textos narrativos apresentam ações de personagens no tempo e no espaço. A estrutura da narração é dividida em: apresentação, desenvolvimento, clímax e desfecho. Alguns exemplos de gêneros textuais narrativos: Romance Novela Crônica Contos de Fada Fábula Lendas Texto Descritivo Os textos descritivos se ocupam de relatar e expor determinada pessoa, objeto, lugar, acontecimento. Dessa forma, são textos repletos de adjetivos, os quais descrevem ou apresentam imagens a partir das percepções sensoriais do locutor (emissor). São exemplos de gêneros textuais descritivos: Diário Relatos (viagens, históricos, etc.) Biografia e autobiografia Notícia Currículo Lista de compras Cardápio Anúncios de classificados Texto Dissertativo-Argumentativo Os textos dissertativos são aqueles encarregados de expor um tema ou assunto por meio de argumentações. São marcados pela defesa de um ponto de vista, ao mesmo tempo que tentam persuadir o leitor. Sua estrutura textual é dividida em três partes: tese (apresentação), antítese (desenvolvimento), nova tese (conclusão). Exemplos de gêneros textuais dissertativos: Editorial Jornalístico Carta de opinião Resenha Artigo Ensaio Monografia, dissertação de mestrado e tese de doutorado Texto Expositivo Os textos expositivos possuem a função de expor determinada ideia, por meio de recursos como: definição, conceituação, informação, descrição e comparação. Alguns exemplos de gêneros textuais expositivos: Seminários Palestras Conferências Entrevistas Trabalhos acadêmicos Enciclopédia Verbetes de dicionários Texto Injuntivo O texto injuntivo, também chamado de texto instrucional, é aquele que indica uma ordem, de modo que o locutor (emissor) objetiva orientar e persuadir o interlocutor (receptor). Por
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