Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
DIREITO PENAL Cezar R. Bittencourt 1. Considerações introdutórias: Modernamente, criminalidade é um fenômeno social normal, que cumpre a função de manter aberto o canal de transformações que a sociedade precisa. O fato social que contrariar o ordenamento jurídico constitui ilícito jurídico, cuja modalidade mais grave é o ilícito penal, que lesa os bens mais importantes dos membros da sociedade. Direito Penal surge como sua natureza peculiar de meio de controle social formalizado. 2. Conceito de Direito Penal: Conjunto de normas jurídicas que tem por objeto a determinação de infrações de natureza penal e as sanções correspondentes – penas e medidas de segurança. Conjunto de princípios e valorações que orientam a própria aplicação e interpretação das normas penais. Finalidade de tornar possível a convivência humana. Ciência Penal função criadora de libertar-se das amarras do texto legal ou da vontade estática do legislador. Papel valorativo e critico Para Zaffaroni, Direito Penal designa-se pelo conjunto de leis penais – legislação penal- e pelo sistema de interpretação dessa legislação, o saber do Direito Penal Welzel: “ é aquela parte do ordenamento jurídico que fixa as características da ação criminosa, vinculando-se penas ou medidas de segurança” Mezger: “é o conjunto de normas jurídicas que regulam o exercício do poder punitivo do Estado, associando o delito, como pressuposto, a pena como consequência.” 3. Caracteres do Direito Penal Meio de controle social altamente formalizado, exercido sob o monopólio do Estado. Os bens protegidos pelo Direito Penal não interessam ao individuo, exclusivamente, mas à coletividade como um todo. Representa o ultimo recurso do sistema para a proteção daqueles bens e interesses de maior importância para o individuo e a sociedade à qual pertence. Quanto à forma se caracteriza pela imposição de sanções especificas. Quanto à finalidade tem o objetivo de produzir efeitos sobre aquele que delinque como sobre a sociedade que representa. Finalidade preventiva: antes de punir o infrator procura motiva-lo para que da ordem jurídica não se afaste, estabelecendo normas proibitivas e cominando sanções respectivas, visando evitar a pratica do crime. Função motivadora Prevenção genérica destinada a todos e prevenção especifica atuando sobre o individuo infrator. Pertence à classe das ciências do dever ser. É ciência normativa porque tem como objetivo o estudo da norma do Direito positivo e a sistematização de critérios de valoração jurídica. É uma ciência pratica, pois serve a administração da justiça e, também, constitui teoria do atuar humano, justo e injusto. Função criadora: preocupa-se não só com o campo puramente normativo, como também com as causas do fenômeno criminal e seu impacto sobre a sociedade. Função valorativa: sua atuação está pautada sobre os valores consolidados pelo ordenamento jurídico que integra, os quais, por sua vez, são levados à pratica por meio de critérios e princípios jurídicos. Função finalista: visa a proteção dos bens jurídicos fundamentais. Funcional: pretende garantir a sobrevivência da ordem jurídica. Sancionador: protege a ordem jurídica cominando sanções. Para Zaffaroni : “é predominantemente sancionador e excepcionalmente constitutivo. Sancionador no sentido de que não cria bens jurídicos, mas acrescenta a tutela penal aos bens jurídicos regulados por outras áreas do Direito. E será, ainda que excepcionalmente constitutivo, quando protege bens ou interesses não regulados por outras áreas do Direito, como, por exemplo, omissão de socorro [...]” 4. Direito Penal objetivo e Direito Penal subjetivo. Ordenamento jurídico- positivo: conjunto de normas criadas e reconhecidas por uma comunidade politicamente organizada que garanta sua efetividade mediante a força pública. Direito positivo é posto pelo poder politico. O Direito Penal é direito positivo, pois sua obrigatoriedade não depende da anuência individualizada dos seus destinatários, mas da vontade estatal soberana que impõe, e o seu cumprimento está garantido pela coerção, sua forma mais eloquente é a pena. Direito Penal objetivo constitui-se de conjunto de preceitos legais que regulam o exercício do direito de punir do Estado, definindo crimes e cominando as respectivas sanções penais. Direito Penal subjetivo constitui-se no direito a castigar ou o ius puninendi, cuja titularidade exclusiva pertence ao Estado, soberanamente. O Direito Penal subjetivo, ou o direito de punir, é limitado pelo Direito Penal Objetivo, que, através de normas positivas, estabelece os limites da atuação estatal na prevenção e persecução de delitos. 5. Direito Penal comum e Direito Penal especial Quanto ao órgão : Direito Penal comum : norma penal objetiva pode ser aplicada através da justiça comum Direito Penal especial: norma penal aplicada por órgãos especiais, constitucionalmente previstos, exp: Direito Penal Militar e Eleitoral . Quanto à legislação: Direito Penal comum: legislação penal comum – Código Penal Direito Penal especial: legislação penal especial – leis extravagantes (fora do Código) 6. História do Direito Penal: Nas sociedades primitivas os fenômenos naturais maléficos eram recebidos como manifestação divina, revoltadas com a prática de atos que exigiam reparação. Punia-se o infrator para desagravar a divindade. O castigo aplicável consistia no sacrifício da vida do infrator.. A pena representava o simples revide à agressão sofrida pela coletividade, absolutamente desproporcional. Fase da vingança divina: resultado da grande influencia da religião na vida dos povos antigos. O principio que domina a repressão é a satisfação da divindade. Finalidade de purificar a alma do criminoso por meio de castigo, aplicado, por delegação divina, pelos sacerdotes, com penas cruéis, desumanas e degradantes. Fase da vingança privada: podia envolver desde o individuo isoladamente ate o seu grupo social. Quando a infração fosse cometida por membro do próprio grupo a punição era o banimento, quando, no entanto, fosse cometida por alguém estranho ao grupo, a punição era a vingança de sangue, verdadeira guerra grupal . Com a evolução social, para evitar a dizimação de tribos, surge a lei de talião, determinando reações proporcionais ao mal praticado: olho por olho, dente por dente. Maior exemplo de tratamento igualitário entre o infrator e a vitima, representando a primeira tentativa de humanização da sanção criminal. Com o passar do tempo, como o numero de infratores era grande, as populações iam ficando deformadas, evoluiu-se então para a composição, sistema através do qual o individuo comprava sua liberdade, livrando-se do castigo. Fase da composição: antecedente da moderna reparação civil. Fase da vingança pública: com a maior complexidade e organização social, o Estado assume o poder-dever de manter a ordem e a segurança social. Nos primórdios, a vingança publica mantinha absoluta identidade entre poder divino e poder politico. Mantem-se a influencia do aspecto religioso, com o qual o Estado justificava a proteção do soberano. O crime e a pena se desvinculam da religião pela contribuição de filósofos como Aristóteles e Platão, que defendiam a necessidade do livre arbítrio e a finalidade da pena como meio de defesa social, que devia intimar pelo rigorismo. Em nenhuma das fases de vingança houve a liberação total do caráter místico ou religioso da sanção penal. 6.1 DIREITO PENAL ROMANO Maior fonte originaria de inúmeros institutos jurídicos. Período da fundação de Roma a pena era utilizada com o caráter sacral. Primitiva organização jurídica Roma monárquica prevaleceu o Direito consuetudinário, rígido e formalista Lei das XII Tábuas, foi o primeiro código romano escrito, inicia o período dos diplomas legais, impondo a necessária limitação à vingança privada, adotando a lei de talião, além de admitir a composição. Distinção entre crimes públicos e privados: crimes públicos era a traição ou conspiraçãopolitica contra o Estado e o assassinato, e crimes privados eram as demais ofensas ao individuo e ao seu patrimônio. Julgamento dos crimes públicos realizados por magistrados em tribunais especiais, cuja sanção era a pena de morte e os crimes privados era confiado ao próprio ofendido, interferindo o Estado apenas para regular seu exercício. Direito Romano Clássico: conjunto de leis publicas como leges Corneliae (preocuparam-se com crimes praticados nas relações interpessoais) e leges Juliae ( crimes praticados contra o Estado) Administração estatal passa a exercer o direito de punir e desaparece a vingança privada. Fundamento da pena essencialmente retributivo. Exigência de que os fatos incriminados e as sanções correspondentes estivessem previamente catalogados. A pena de morte ressurge com força, crimes extraordinários e religiosos. Institutos jurídicos como dolo, culpa, agravante e atenuantes na medição de pena. Características: Direito Penal com caráter público e social Pena como reação pública, correspondendo ao Estado sua aplicação. 6.2 DIREITO PENAL GERMÂNCICO: Direito Germânico primitivo: leis consuetudinárias, não escritas. Direito concebido como ordem de paz e sua transgressão como ruptura da paz, publica ou privada. A perda da paz, por crime publico, autorizava que qualquer pessoa pudesse matar o agressor. Já os crimes particulares autorizavam a entrega do transgressor a vitima e seus familiares, para que exercessem o direito de vingança, dever de vingança de sangue. Composição: substitui gradativamente a vingança de sangue, consistia no dever de compensar o prejuízo sofrido com uma certa importância em pecúnia. As leis bárbaras definiam detalhadamente as formas, meios, tarifas e locais de pagamentos segundo a qualidade da pessoa, sexo, idade e natureza da lesão. Composição representava um misto de ressarcimento e pena: parte destinava-se a vitima ou seus familiares e parte era devolvida ao tribunal ou ao rei, simbolizando o preço da paz. 6.3 DIREITO PENAL CANÔNICO: A influencia do Cristianismo no Direito Penal consolidou-se após a decretação de religião oficial do Estado romano, por Teodosio I. Inicialmente, como repressão penal de crimes religiosos e a jurisdição eclesiástica, protegendo os interesses de dominação. Com a crescente influencia da Igreja e enfraquecimento do Estado, o Direito Canonico foi-se estendendo a religiosos e leigos, desde que os fatos tivessem conotação religiosa. Direito Canônico formado pelo Corpus Juris Canonici. A jurisdição eclesiástica dividia os crimes: em razão da pessoa (rationae persoane), onde o religioso era sempre julgado por um tribunal da Igreja, qualquer que fosse o crime cometido, e em razão da matéria (rationae materiae), a competência eclesiástica era fixada, ainda que o crime fosse cometido por um leigo. Direito Canônico contribuiu para o surgimento da prisão moderna, especialmente no que se refere às primeiras ideias sobre a reforma do delinquente. A penitenciaria – local de penitencia, expiação dos pecados. Crime era um pecado contra as leis humanas e divinas. Função de corrigir e reabilitar o delinquente 6.4 DIREITO PENAL COMUM: Feito de costumes locais, Direito feudal, Direito Romano, Direito Canônico e Direito Comercial, renascimento dos Estados Nacionais. Renascimento dos estudos do Direito Romano através do glosadores e pós glosadores. Por influencia dos glosadores e pós glosadores surgiam importantes diplomas legias que aspiravam ao status de Direito Comum. Fortalecimento do poder politico e a atribuição definitiva do poder de punir ao Estado. Outros diplomas legais reforçaram o Direito locas, movimento de unificação das normas que deveriam ser aplicadas dentro dos nascentes dos Estados Nacionais. Introdução da Razão do Direito Penal: arbítrio judiciário criava em volta da justiça uma atmosfera de incerteza, insegurança e justificado terror. Regime injusto e cruel, desigualdade na punição para nobres e plebeus e seu sistema repressivo aplicado com penas capitais e meios brutais, exp: forca, fogueira, estrangulação, arrancamento das viceras, torturas... Revolução Francesa e seu movimento reformador, foi marco das lutas em prol da humanização do Direito Penal. 7. PERÍODO HUMANITÁRIO: Os reformadores. As leis até então em vigor inspiravam-se em ideias e procedimentos de excessiva crueldade, prodigalizando os castigos corporais e a pena capital. O Direito era um gerador de privilégios, o que permitia aos juízes, dentro do mais destemido arbítrio, julgar os homens de acordo com sua condição social . Século das luzes: filósofos, moralistas e juristas defendem a reforma do contexto social, defendendo as liberdades do individuo e enaltecendo os princípios de dignidade do homem. As correntes iluministas e humanitárias realizam uma severa critica dos excessos imperantes na legislação penal. A pena deve ser proporcional ao crime, devendo levar em consideração, quando imposta, as circunstancias pessoais do delinquente, grau de malícia e, sobretudo, produzir a impressão de ser eficaz sobre o espirito dos homens, sendo, ao mesmo tempo, a menos cruel ao corpo do delinquente. Iluminismo: concepção filosófica que se caracterizou por ampliar o domínio da razão a todas as áreas do conhecimento humano. Objetivo no Direito Penal de reforma do sistema punitivo. CESAR DE BECCARIA Marca o inicio definitivo do Direito Penal Moderno Máxima: “é melhor prevenir o crime do que castigar.” Associação do contratualismo e do utilitarismo Estimulou os práticos do Direito a reclamarem dos legisladores uma reforma urgente. Constrói um sistema criminal que substituirá o desumano, impreciso, confuso e abusivo anterior. Importância vital na preparação e amadurecimento do caminho da reforma penal dos últimos séculos. “Os homens se reúnem e livremente criam uma sociedade civil, a função das penas impostas pela lei é precisamente assegurar a sobrevivência dessa sociedade” Todo comportamento ilegal produzido em uma sociedade é essencialmente patológico e irracional, típico de pessoas que, por seus defeitos pessoais, não podem celebrar contratos. Concepção utilitarista da pena: exemplo pro futuro e não vingança pelo passado. Proporcionalidade da pena e sua humanização. O objetivo preventivo da pena não precisava ser obtivo através do terror, mas com eficácia e certeza da punição. Não renuncia a ideia de que a prisão tem um sentido punitivo e sancionador, mas já insinua uma finalidade reformadora da pena privativa de liberdade. Principios realibitadores e reformadores. JOHN HOWARD Inspirou corrente penitenciarista preocupada em construir estabelecimentos apropriados para o cumprimento da pena privativa de liberdade. Importância no processo de humanização e racionalização das penas. Finalidade econômica da pena, indiretamente socializante. Necessidade de construir estabelecimentos adequados para o cumprimento das penas privativas de liberdade, sem ignorar que as prisões devem proporcionar ao apenado um regime higiênico, alimentar e assistência medica que permitisse cobrir as necessidades elementares. Separação dos presos: por sexo e grau de maturidade. Fiscalização da vida carcerária por magistrados a fim de evitar abusos de poder por parte da administração da prisão. Com Howard, nasce o penitenciarismo e o inicio da luta interminável para alcançar a humanização das prisões e a reforma do delinquente. JEREMY BENTHAM Procurou um sistema de controle social de acordo com o principio ético Utilitarismo: procura da felicidade para a maioria ou simplesmente da felicidade maior. Um ato possui utilidade se visa a produzir o beneficio, vantagens, prazer e bem estar, e serve para prevenir a dor. Homens sempre buscam o prazer e fogem da dor. Teoria da pena: função principal da pena era prevenir delitos semelhante. “Em muitos casos é impossível remediar o mal cometido, mas sempre se pode tirar a vontade de fazer o mal, porque por maior que seja o proveito de umdelito sempre pode ser maior o mal da pena”. O efeito preventivo geral é preponderante, embora admitisse o fim correcional da pena. Importância dos aspectos externos e cerimoniais da pena, destacando o valor SIMBÓLICO da resposta estatal . Abandono do conceito de pena como dor e sofrimento. Não abandonou a finalidade retributiva da pena, mas sim a clara preponderância da finalidade preventivo- geral. Aceita a necessidade de que castigo fosse um mal, mas como um meio para prevenir danos maiores à sociedade. Considerava as prisões como melhores condições para infestar o corpo e a alma, “saem dali para serem impelidos outra vez ao delito pelo aguilhão da miséria”. Subcultura carcerária: Os homens segregados assimilam linguagem e costumes, por um consentimento tácito e imperceptível fazem suas próprias leis. “Panótico” : faculdade de ver com um olhar tudo o que nele se faz. Consciente da importância da arquitetura penitenciaria.
Compartilhar