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RN - Capitulo 06

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CAPÍTULO 6 : CUIDADOS COM O RECÉM-NASCIDO 
COM MALFORMAÇÕES OU 
TRAUMA AO NASCIMENTO 
 
 
 
1. ANOMALIAS CONGÊNITAS 
 
Ocorrem em 3-4% dos nascimentos. Algumas delas podem ser 
reconhecidas ao nascimento, muitas tornam-se evidentes mais tarde 
na infância, enquanto outras nunca são identificadas. Muitas mortes 
devidas à anomalias congênitas no período neonatal são 
provenientes de malformações incompatíveis com a vida ou aquelas 
onde a sobrevivência é impossível se não houver intervenção 
cirúrgica. 
 
Neste capítulo, descreveremos apenas as anomalias congênitas cujo 
rápido reconhecimento podem guiar para um simples e imediato 
tratamento. Defeitos maiores que requerem cuidados sofisticados 
devem ser encaminhados a hospitais de referência com nível de 
cuidados terciários, e portanto estão fora dos objetivos desse curso. 
 
Como todo transporte de paciente de risco, o transporte do RN doente 
não se improvisa e obedece regras que serão descritas. Deve-se 
fazer esforço para contactar por telefone os serviços de referência 
para reservar vaga e explicar a patologia do paciente que se está 
enviando. 
 
Na organização do transporte, um dos fatores essenciais é a 
manutenção da cadeia do calor para que a hipotermia não agrave 
ainda mais o prognóstico da criança. 
 
 
QUADRO 1. Avaliação e classificação do RN com anomalia congênita ou 
tocotraumatismo 
 
 NASCIMENTO 
 ⇓ 
 SEQUE O BEBÊ e se necessário DESOBSTRUA AS VIAS AÉREAS 
 
 AVALIE 
 1. RESPIRAÇÃO NORMAL 
 
 2.FREQUÊNCIA CARDÍACA FC > 100 bpm 
 
 3. PESO / IDADE GESTACIONAL PN > ou < 2500 gramas 
 > ou < 37 semanas 
 
 4.ANOMALIA CONGÊNITA PRESENTE 
 TRAUMATISMO DE PARTO 
 ↓ 
 CLASSIFIQUE ESPECIFIQUE A ANOMALIA 
 CONGÊNITA OU TRAUMATISMO DE PARTO 
 ↓ 
 MANUSEIE TRATAMENTO APROPRIADO QUANDO 
POSSÍVEL 
 
 
 
Lábio leporino e Fenda palatina 
 
É uma malformação relativamente freqüente de gravidade variável 
que pode envolver: 
- só o lábio superior 
- além do lábio, o palato uni ou bilateral. 
 
O problema mais urgente é a dificuldade para se alimentar. Se o 
defeito for pequeno a amamentação ao seio é possível, se for maior a 
mãe pode fazer a ordenha do seu leite e dar ao bebê com 
colherzinha, seringa ou conta-gotas. No hospital pode ser usado 
sonda gástrica. 
 
A criança corre risco de ganhar pouco peso, ter infecções pulmonares 
ou mesmo morrer por aspiração de leite. 
 
A cirurgia de correção geralmente em várias etapas, pode ser 
planejada para ser realizada nos três primeiros meses. 
 
 
Síndrome de Pierre Robin 
 
Esta síndrome associa um micro-retrognatismo, fenda palatina e 
glossoptose. 
O recém-nascido apresenta um desconforto respiratório pela ptose da 
língua que obstrui a nasofaringe, impedindo a passagem do ar. 
O diagnóstico é feito pela observação de um queixo pequeno com 
uma boca difícil de abrir com a língua obstruindo a fenda palatina. 
 
Esta criança corre o risco de ir a óbito por insuficiência respiratória 
aguda. Para desobstruir as vias aéreas deve-se introduzir uma 
cânula de Guedel número 00. Uma opção seria a CHUPETA 
CANALIZADA NOEMI preconizada por José Américo no seu livro 
Perinatologia - Ciência e Arte (ver anexo). . Colocar a criança em 
decúbito ventral e aspirar com frequência. 
 
A intubação traqueal é muito difícil e só em casos excepcionais deve 
ser executada por uma pessoa experiente. 
 
Durante o transporte para um serviço especializado que disponha de 
cirurgia otorrinolaringológica, manter o decúbito ventral, as vias 
aéreas pérvias com aspirações frequentes. 
 
 
Atresia de esôfago 
 
Interrupção da continuidade do esôfago podendo existir um fundo de 
saco superior e inferior. O fundo de saco inferior na forma mais 
freqüente apresenta fístula com a traquéia (tipo III). A criança corre o 
risco de apresentar pneumonia aspirativa pela saliva ou pelo refluxo 
de líquido gástrico. 
 
Deve-se suspeitar desta malformação quando a genitora tem 
polidrâmnio ou quando o RN apresenta dificuldades alimentares nas 
primeiras 24 horas, associado ou não a desconforto respiratório. De 
forma geral, o RN apresenta secreção espumosa abundante pela 
boca. 
 
O diagnóstico deve ser feito na sala de parto quando existe 
polidrâmnio, ou nas primeiras horas de vida. Introduzir sonda 
orogástrica número 8 ou 10. Se houver dificuldade na progressão a 
mais ou menos 10 cm da arcada dentária, não forçar - eventualmente 
a sonda pode dobrar e o examinador não perceber. Deve-se sempre 
verificar a permeabilidade do esôfago com o teste da seringa. Injeta-
se cerca de 2 ml de ar em “bolus” na sonda orogástrica e ausculta-se 
com a ajuda do estetoscópio ao nível do epigástrio o barulho causado 
pela entrada súbita do ar. Se a sonda não progride ou não se ausculta 
ruídos com o teste da seringa a criança provavelmente tem uma 
atresia de esôfago. 
 
É contra-indicado utilizar produto de contraste para visualizar o fundo 
de saco superior. 
 
Conduta para transporte: 
• é fundamental não alimentar o RN 
• transferir para um hospital com capacidade de proceder a 
intervenção cirúrgica. 
• durante o transporte manter o RN semi-sentado em cadeira “bebê 
conforto” 
• deixar a sonda no fundo de saco do esôfago aberta 
• aspirar boca e sonda de 30 em 30 minutos. 
• se possível instalar venóclise periférica 
 
 
Pé torto 
 
Se não é redutível, faz-se necessário a correção com bota gessada, 
que se for colocada logo nos primeiros dias de vida melhora o 
prognóstico. 
 
 
Imperfuração anal 
 
O exame sistemático do períneo ao nascimento permite firmar o 
diagnóstico de anomalia ano-retal. 
Geralmente se acompanha de fístula vaginal ou perineal em meninas 
e fístula urinária com eliminação de mecônio pela uretra em meninos. 
 
Pode vir associada a outras malformações renais, vertebrais e, em 
particular, atresia de esôfago. 
 
A imperfuração anal poderia ser incluída entre os problemas de 
correção cirúrgica urgente, mas na realidade pode esperar um ou dois 
dias. Esta atitude permite que o ar alcance a parte mais inferior do 
reto, e pela análise do exame radiológico se estimar a extensão da 
atresia, distinguindo as formas altas (graves) das formas baixas 
(melhor prognóstico). 
 
Alguns RN tem apenas uma pele encobrindo o orifício anal, mas 
mesmo nesse caso, a cirurgia pode ser retardada por um ou dois 
dias. 
 
A conduta para o transporte deve ser: 
• não alimentar 
• sonda gástrica aberta 
• perfusão periférica 
 
 
Defeitos da parede abdominal: 
 
Ao nascimento o diagnóstico é feito pela observação dos orgãos 
eviscerados (alças intestinais, estômago, fígado...) encobertos ou 
não por um saco membranoso. 
A onfalocele e a gastroquise diferem em vários pontos (associações 
malformativas, fatores prognósticos e evolutivos), mas elas são 
consideradas em conjunto para a indicação de transporte. 
O RN que apresenta um destes defeitos da parede abdominal corre o 
risco imediato de: 
• hipotermia, favorecida pelas grandes superfícies de troca 
determinadas pela malformação. 
• ruptura do saco que envolve as vísceras na onfalocele. 
• infecção das vísceras exteriorizadas. 
• desidratação e distúrbios metabólicos pela perda de líquido, 
principalmente na gastroquise. 
• torsão dos pedículos vasculares e risco de necrose digestiva. 
 
Quando o diagnóstico é feito em pré-natal, a gestante deve ser 
tranferida para um centro que disponha de cirurgia pediátrica, o que 
melhora muito o prognóstico da criança. 
 
Conduta necessária diante de uma onfalocele ou gastroquise: 
• Evitar de tocar a malformação - manipular com assepsia 
unicamente quando indispensável.• Imediatamente após o nascimento, proteger as alças por um saco 
plástico estéril (o tronco e os membros inferiores do RN são 
fechados dentro deste saco que remonta até as axilas). Nunca 
colocar curativo úmido, mesmo que aquecido, sobre as alças. 
• colocar uma sonda gástrica, esvaziar o estômago e deixar a sonda 
aberta em saco coletor. 
• colocar a criança em decúbito lateral 
• perfusão em veia periférica 
• contactar serviço terciário com cirurgia pediátrica 
 
 
Spina bifida 
 
É o não fechamento de um ou vários arcos vertebrais posteriores 
associado, nas formas mais graves, a uma exteriorização das 
meninges e da medula (meningomielocele). 
 
Quando o diagnóstico é feito em pré-natal, a gestante deve ser 
tranferida para um centro que disponha de neurocirurgia pediátrica. 
 
O risco para a criança é inicialmente infeccioso mas o prognóstico 
posterior vai depender do comprometimento neurológico. 
 
Conduta para transporte: 
• colocar a criança em decúbito ventral 
• não manipular a malformação 
• recobrir com compressa seca estéril 
• contactar e referir para serviço com neurocirurgia 
 
 
2. TOCOTRAUMATISMO 
 
Quando o problema é decorrente de trauma mecânico, seja ele 
evitável ou não, ocorrido durante o parto. 
 
Entre os fatores predisponentes, podemos citar: 
• macrossomia 
• desproporção céfalo-pélvica 
• trabalho de parto prolongado 
• apresentação pélvica 
• prematuridade. 
 
 
Cefalohematoma 
 
 
Ocorre durante o trabalho de parto por rotura dos vasos sangüíneos 
do sub-periósteo, provocando hemorragia, que fica restrita a sutura 
entre os ossos. 
 
A tumoração não aparece logo após o parto porque a hemorragia é 
lenta, podendo demorar horas para tornar-se visível. 
 
Não há necessidade de nenhum tratamento, a não ser assegurar aos 
pais de que desaparecerá espontânea e lentamente. Qualquer 
tratamento é potencialmente perigoso (infecção). 
 
Se necessário, nos grandes cefalohematomas, acompanhar o 
aparecimento de icterícia e anemia. 
 
 
Bossa sero-sanguínea 
 
É uma massa mole, mal limitada, edemaciada e equimótica localizada 
no couro cabeludo, ao nível da apresentação do RN. O tratamento é 
conservador porque geralmente regride rapidamente em alguns 
dias. 
 
 
Fratura de clavícula 
 
É vista freqüentemente nas distócias de ombro, macrossomia fetal ou 
no parto pélvico. A sensação de crepitação no local da fratura pode 
ser palpada com certa facilidade. 
 
Não há necessidade de nenhum tipo de tratamento. Orientar a 
genitora quanto ao manuseio e trocas de roupa, pois o RN apresenta 
dor durante a manipulação do membro superior do lado afetado. 
Avisar aos genitores sobre o aparecimento do calo ósseo após 
algumas semanas. 
 
 
Paralisia Braquial 
 
Os partos prolongados e difíceis, com desprendimento traumático por 
tração sobre a cabeça ou membro superior, são causas freqüentes de 
paralisias obstétricas, principalmente do plexo braquial. 
 
São três os tipos de paralisia braquial: 
 
1. Paralisia braquial superior (C5 e C6) - Erb-Duchenne. 
O braço está em adução e rotação interna com pronação do 
antebraço e flexão do punho, ou seja, o braço está estendido 
próximo ao tronco com o punho dobrado para fora (posição de 
gorjeta de garçon). 
 
O reflexo de moro está afetado. O reflexo de preensão palmar está 
conservado. 
 
2. Paralisia braquial inferior (C8 e T1) - Klumpke 
A mão é paralítica e os movimentos do punho não são obtidos. Há 
ausência do reflexo de preensão palmar. 
 
A associação com síndrome de Horner do mesmo lado (pupila em 
miose ptose palpebral e enoftalmia) é comum, porque pode haver 
também lesão das fibras do simpático cervical, a nível de T1. 
 
 
 
3. Paralisia braquial total (C5, C6, C8, T1) 
O braço permanece totalmente imóvel e flácido, com ausência de 
todos os reflexos e deficit sensorial, que chega até o ombro. 
O tratamente baseia-se na imobilização do membro afetado com o 
braço junto ao tronco e o cotovelo em 90º durante a primeira 
semana de vida. 
Após a primeira semana, a criança deve ser encaminhada para 
acompanhamento com fisioterapeuta e ortopedista.

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