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Jeitinho Brasileiro

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Jeitinho Brasileiro Corruptível: uma nova concepção
Jânia do Couto Michirefe
Mariana Espírito santo de Brito
RESUMO
O presente artigo fala sobre o jeitinho brasileiro. Por meio de uma revisão bibliográfica e autores reconhecidos neste tema conceituamos o “jeitinho” e destacamos o seu âmbito de corrupção, mostrando que, às vezes, o termo “jeitinho” é usado como sinônimo de corrupção. No estudo perceber-se-á que não se trata apenas disso, mas que o jeitinho corruptível é uma realidade e começa a incomodar. Esse incômodo, aqui, será sustentado pelas manifestações de 2013 que demonstram uma diminuição na tolerância em relação ao jeitinho corruptível brasileiro e, quiça, um passo inicial para quebrar o paradigma cultural vigente.
Palavras-chave: jeitinho brasileiro, corrupção, manifestações 2013.
1 INTRODUÇÃO
A pesquisa sobre o conceito de jeitinho brasileiro inicia-se com os estudos decorrentes das ciências sociais, sobretudo da sociologia, antropologia, filosofia e psicologia. O jeitinho é uma instituição marcante no cotidiano do brasileiro e todos sabem o que é esse jeitinho. Nem todo jeitinho é intencional já que a instituição do jeitinho é um problema cultural, de “identidade social”. 
Existem o jeitinho bom e o mau. E de forma alguma se tem a intenção de não reconhecer o jeitinho bom, aquele jeitinho que se caracteriza pela flexibilidade, cultura de relacionamento e capacidade de adaptação que são algumas das qualidades do executivo do Brasil mais valorizadas no mundo. Mais que isso, que Betânia Tanure de Barros (apud CARVALHO, 2010) explica como as principais características da cultura brasileira incluindo ainda a importância dada as relações pessoais, a capacidade de lidar com a ambiguidade e com as incertezas do futuro. 
Entretanto, o estudo tem como objetivo analisar o jeitinho mau intrinsecamente atrelado à corrupção, aquele que, hoje, tratado como simplesmente jeitinho ou jeitinho brasileiro passa a ser alvo de críticas e quiçá de mudanças que estão por vir. Afinal, ideal seria ter o jeitinho mau extinto e o conceito de jeitinho substituído e restringido ao seu caráter qualitativo do bem. Não estamos falando de tarefa fácil, trata-se de romper um paradigma vigente desde os primórdios da civilização brasileira e que, por isso, encontra-se arraigado na sociedade brasileira.
Em pleno século XXI, porém, podemos vislumbrar uma mudança no pensamento até então imutável do brasileiro. Mas, quais os elementos que evidenciam uma diminuição na tolerância quanto ao “jeitinho” enquanto corrupção? O estudo busca revelar por meio de uma revisão bibliográfica que permeia entre livros, artigos e dados, os indícios que revelem uma fomentação dos brasileiros com o intuito de mudanças, de quebra de um paradigma cultural extremamente estruturado para sua posterior reconstrução, utilizando as manifestações de 2013 para sustentar a ideia de que nós, brasileiros, começamos a nos incomodar com a situação do jeitinho corruptível vigente. Afinal, como defende a antropóloga Lilia Schwarcz ( apud CAVALCANTE, 2005) o caráter de um povo é sim passível de mudança. 
2 MARCO TEÓRICO
2.1 O jeitinho brasileiro – uma primeira análise
Para as Ciências Sociais o surgimento do jeitinho e da malandragem é uma consequência da imposição de uma cultura legal e formalista proveniente da monarquia portuguesa e da igreja católica. Por outro lado, há também quem enxergue a raiz da "malemolência" brasileira no nosso caráter cultural mestiço, por sermos um amálgama de diversas tradições e que, portanto, não conseguiu fixar uma ética coesa (E. NETO, 2009). 
Afinal, quem somos nós, os brasileiros? Segundo Rodrigo Cavalcante, a primeira vista, a resposta para essa pergunta é fácil: somos o produto da miscigenação entre os colonizadores portugueses, os índios que aqui viviam e os africanos trazidos como mão-de-obra escrava, além dos imigrantes que chegaram entre os séculos 19 e 20 – como alemães, italianos, japoneses. Somos um povo mestiço genética e culturamente que, apesar da diversidade, compartilha certos traços em comum. Segundo Darcy Ribeiro (1995):
Nós brasileiros somos povos marcados, somos ao mesmo tempo carne da carne dos pretos e índios, e também a mão possessa que os flagelou. Somos descendentes de escravos e senhores. A cicatriz de torturador impressa na alma explode na brutalidade racista e classista, mas essa mesma brutalidade, provoca crescente indignação e dá força para buscar uma sociedade solidária.
O povo brasileiro se fez com uma configuração distinta de suas matrizes (indígenas, luso, africanas, e outras nacionalidades imigratórias) e, na tentativa de difundir os povos tão diversos que reuniu, precisou definir aquilo que em principio surgiu das estranhezas e dos antagonismos com suas matrizes, mas que hoje traz na sua brasilianidade: a identidade étnica. (RIBEIRO, 1995)
Explicar os brasileiros torna-se ainda mais complicado quando se trata de buscar a essência do que se convencionou chamar de caráter nacional, aqueles traços que explicam uma série de comportamentos que costumamos encarar com naturalidade, mas que, quase sempre, causam surpresa entre os estrangeiros. Brooke Unger, correspondente da revista inglesa The Economist em São Paulo, é mais um que se diz a um só tempo encantado e estarrecido com certos traços do povo brasileiro. “Quando cheguei ao Brasil pela primeira vez, vi garis em um desfile pelas praias do Rio, numa cena impensável para um americano.” Em contrapartida, ele diz não entender a espécie de amnésia coletiva diante de casos graves de violência e impunidade. Segundo o correspondente, a maior parte dos brasileiros sabe mais sobre atos de violência contra Estados estrangeiros do que sobre atentados contra o seu próprio Estado.” (CAVALCANTE, 2010)
Diversas são as teses que justificam a malandragem tupiniquim, entretanto, apesar dessa heterogeneidade de hipóteses, há um elemento em comum: a noção de que o jeitinho, a malandragem e seus afins surgem como um “mecanismo de adaptação às situações perversas brasileiras”. (BARBOSA, 2006)
A antropóloga Lilia Schwarcz, pesquisadora do tema, diz que o advento do malandro está vinculado à questão racial no país. O malandro seria a figura do mulato brasileiro que dribla o preconceito e consegue uma certa ascensão social por meio de favores conquistados com ginga e simpatia. (CAVALCANTE, 2010)
Estima-se que mais de 4 milhões de escravos tenham vindo da África para o Brasil entre os séculos 16 e 19. No Rio imperial, viajantes estrangeiros já observavam como a escravidão marcava a vida dos brasileiros. Uma das mais perniciosas heranças escravagistas teria sido a naturalidade com que se convive com a miséria no Brasil. “É como se a escravidão tivesse feito com que o país se acostumasse com a existência de cidadãos de primeira e de segunda classe”, diz a antropóloga Lilia Schwarcz. “Essa convivência com a desigualdade durante séculos faz com que as pessoas não se comovam mais com a miséria.” (CAVALCANTE, 2010).
Mas se a figura do malandro surge como uma estratégia criativa de sobrevivência para ex-escravos, descendentes de escravos, enfim, todos aqueles que não se transformaram em cidadãos logo após a abolição, como entender a malandragem presente também na elite nacional?
Pensando em uma hipótese genealógica para tais atitudes desviantes oriundas de uma mistura entre a árdua condição social e o histórico desamparo do poder publico, o jeitinho constituiu um instrumento de sobrevivência. E assim, essas transgressões ganham, culturalmente, status de infração aceitável socialmente que, na maioria das vezes, pode ser justificada, ou por uma facilidade em relação aos trâmites burocráticos das instituições oficiais, ou por uma necessidade resultante da dura realidade socioeconômica brasileira. Em ambos os casos, a de se ressaltar que essas violações ético legais são uma espécie de "drible" nas adversidades da vida num país que desde sua fundação histórica é repleto de desigualdades (E. NETO, 2009), assim o jeitinho tem ainda como característicao apelo emocional do qual as regras normativas não dão conta (MUNIZ, 2009).
O historiador Sérgio Buarque de Holanda dedicou um dos capítulos do seu livro Raízes do Brasil ao estudo do chamado “homem cordial”, termo usado para tentar elucidar o caráter do brasileiro. Para ele, o brasileiro, de certa forma, tenderia a rejeitar a impessoalidade de sistemas administrativos em que o todo é mais importante do que o indivíduo. Daí a dificuldade de encontrar homens públicos que respeitem a separação entre o público e o privado e que ponham os interesses do Estado acima das amizades.
Toda essa prioridade dada ao particular em detrimento daquilo que é público se explicaria pelo fato de que, durante boa parte da colonização do país, o Estado se confundia com a figura do senhor de engenho, do fazendeiro de café e, anteriormente, com os próprios donatários das capitanias hereditárias. Essa fusão histórica é visível até os dias de hoje, onde confluem para um mesmo sentido o público e o privado.
Tomando essa premissa, no Brasil, burlar as regras morais e legais foi algo que se impôs como forma de adaptação ao "ambiente hostil". O brasileiro precisou ser malandro para sobreviver numa sociedade cruel e de enorme abandono do poder público. E daí surge o fundamento mais antigo da malandragem: a conservação da vida. (E. NETO, 2009)
Com o desenrolar histórico, a própria transgressão teria se transformado em uma espécie de modelo "ético". A antropóloga Lívia Barbosa (2006) define: "de drama social do cotidiano [o jeitinho brasileiro] passou a elemento da identidade social. (...) de simples mecanismo adaptativo, reflexo de nossas condições de subdesenvolvimento, o jeitinho se transformou em elemento paradigmático de nossa identidade (...)". E se antes dissemos que a conservação da vida foi o ponto de partida para o surgimento do jeitinho, agora, além desse fundamento, existe uma derivação potencializadora dessa transgressão: o surgimento, no desenrolar histórico-cultural do Brasil, da apologia da malandragem. (E. NETO, 2009)
Mas o que seria a apologia da malandragem ou do jeitinho brasileiro? Trata-se de exaltar o tipo esperto - aquele que sempre se dá bem e leva vantagem em tudo - ou glorificar o malandro como resultado de processos culturais, onde esse “tipo esperto” teria passado a ser admirado como um vitorioso na luta pela vida. O malandro passou então a ser visto como exemplo a ser seguido, torna-se um referencial para o "dever ser" e transfigurando-se em um "paradigma ético paralelo". Logo, a malandragem que, de início, foi impulsionada pelas imposições de conservação da vida - se converteu em referência para si mesma, é dizer, ela se transformou em valor moral e passou a ser norteada por si mesma, transformando-se em modelo ético para a própria malandragem. (CAVALCANTE, 2010)
A partir daí, a malandragem passou a ser compreendida como uma espécie de essência biológica. Ou seja, se transformou em caráter inerente e distintivo de certos indivíduos. De um lado, teríamos a "espécie" dos malandros enquanto, do outro, a dos "manés" – observados na tautologia cantada pelo sambista Bezerra da Silva: "malandro é malandro e mané é mané". (E. NETO, 2009)
De toda essa construção histórico-cultural deriva o senso comum que concebe o "tipo malandro" como sendo esperto de nascença segundo João E. Neto (2009), entretanto, essa realidade começa a se transfigurar. A malandragem gratuita, a da "lei de Gerson", a malandragem pela malandragem começa a incomodar, mais que isso, vai em sentido contrário àquele da conservação e engrandecimento da vida, sentidos que serviram de fundamento maior para sua instituição e estruturação na sociedade brasileira.
Reduzir o povo brasileiro como essencialmente malandro traz consigo o perigo da justificação de uma corrupção generalizada e, por conseguinte, todo um encadeamento de problemas sociais. Se concebida como característica natural, a corrupção assume um caráter de algo inevitável no Brasil, o que, posteriormente, nos leva a justificar e a aceitar a corrupção como uma espécie de determinação biológica. Essa banalização e justificação da corrupção trazem como consequência uma desestruturação social que torna as condições de vida ainda mais precárias. Temos instituído, nesse momento, um ciclo vicioso retroalimentado de malandragem. Mas será que a necessidade de tanta malandragem não nos coloca no papel de “manés”? (CAVALCANTE, 2010) Talvez sim, e também, talvez por isso começa-se a questionar esse tal jeitinho brasileiro.
Segundo Sérgio Buarque de Holanda, ao se conceber como um povo essencialmente malandro, um povo pacífico e cordial, um povo que resolve seus problemas na base do jeitinho, o brasileiro estaria se distanciando de transformações significativas. "Ao funcionar como válvula de escape, ela [a transgressão pelo jeitinho] impede o surgimento de uma pressão social efetiva que leve a mudanças tão necessárias no nosso aparato legal e administrativo" (BARBOSA, 2006).
O brasileiro precisou ser malandro para sobreviver numa sociedade cruel e de enorme abandono do poder público, mas o que surgiu como questão de sobrevivência se transfigurou. A malandragem - em achar-se no direito de tirar sempre vantagem e só ver o corrupto no que é externo ao indivíduo - começa a incomodar, um incômodo capaz de, num futuro próximo, realmente quebrar o paradigma vigente da malandragem, restringindo o jeitinho brasileiro ao seu caráter bom e qualificando positivamente o jeitinho das novas gerações.
2.2 O “jeitinho” por Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Roberto DaMatta.
O jeito ou jeitinho já se tornaram palavras frequentes no cotidiano brasileiro. Mais que isso, o seu significado está presente na realidade brasileira de uma forma geral, seja no dia a dia da população, nas relações interpessoais, sejam estudos acadêmicos acerca do tema.
O jeitinho é um importante elemento cultural da sociedade brasileira, identificado nos costumes, práticas e hábitos cotidianos dos brasileiros, e constitui um dos componentes da identidade nacional brasileira.
Pode ser utilizado desde uma simples requisição de um favor entre amigos até atingir a esfera da corrupção ou de uma conduta delituosa. 
Assim, o que pode ser considerado jeitinho para alguém, apenas um favor, da mesma forma uma ação pode ser entendida como um ato corrupto.
No Brasil, existe uma lacuna, uma zona cinzenta entre o que é legal e do que é ilegal. Neste lugar as regras e as leis são relativas, porque podem valer ou não, dependendo de que contexto ela se encontra e, sobretudo, “quem” são os atores sociais envolvidos nas negociações deste contexto. 
O jeitinho é o elo entre o proibido e o permitido. Liga o impessoal ao pessoal e torna o que era público em privado. Transforma a burocracia, as regras e a impessoalidade da lei em simpatia, afeto e relações tremendamente personalistas.
Convém reafirmar mais uma vez que o jeitinho brasileiro não é apenas uma prática dos mais desfavorecidos para subir na escada da hierarquia. Tanto quem está embaixo, quanto quem se encontra no topo da pirâmide social enxergam o jeitinho brasileiro como um valor nacional. Tributo da nossa esperteza personalista e da capacidade histórica de levar vantagens em tudo.
O jeitinho, entendido pelos brasileiros, é uma categoria intermediária que se situa entre a honestidade e a marginalidade, pois é justamente este o lugar do malandro, o “profissional do jeitinho”. 
Em outros países, as fronteiras entre a transgressão da lei e sua obediência são claramente definidas pela população e governantes. 
Presente em várias obras que se propuseram a estudar o Brasil, notadamente aquelas escritas sob um viés cultural, ou ainda, que se baseiam nos costumes, na história social e em questões do cenário cotidiano, o jeitinho brasileiro foi objeto de estudo de diversos escritores. Aqui iremos abordar a posição de Gilberto Freyre, de Sérgio Buarque de Holanda e de Roberto DaMatta.
Gilberto Freyre, em seu livro Casa Grande e Senzala, abordou as questões de nacionalidadee do significado do que vem a ser homem brasileiro. 
A obra Casa Grande e Senzala abandona a explicação racial existente nos estudos da sociedade brasileira e assumem uma perspectiva dos fenômenos culturais como explicação para os acontecimentos sociais. 
Cada raça possui suas características culturais próprias, e é Gilberto Freyre quem melhor consegue ilustrar como são os aspectos culturais que interferem na sociedade e não as questões raciais. 
Estas questões raciais começam a ser entendidas como características de cunho biológico e genético que não são as motivadoras do comportamento. São as características culturais que permitem isso.
Em Casa Grande e Senzala, Freyre demonstra que no Brasil houve uma solução própria para os diferentes tipos de vivência e padrões culturais, que teria resultado na “singularidade brasileira”.
Foi o primeiro autor a defender a ideia de que a miscigenação cultural e racial que houve no Brasil não é ruim, ao contrário é boa. Também relatou que a mistura de índios, negros, portugueses e imigrantes foi responsável por estabelecer o traço distintivo de nossa brasilidade, e que essa mistura também contribuiu para formar o espírito nacional.
Freyre desenvolveu a ideia de miscigenação no sentido de encontrar uma identificação social aos brasileiros, todavia sofreu críticas que muitos chamam de “mito da democracia racial”.
As críticas dizem respeito à descrição na qual a formação social do país é abordada, e na qual o conflito é negado, abafado, na constituição do Estado brasileiro.
Florestan Fernandes retrucou o otimismo daquele autor com a tese de que a assimetria da escravidão permaneceu a funcionar, e que a democracia racial não foi tão agradável, pois de fato os escravos não se submetiam de forma tão alegre aos seus senhores.
Enfim, para Gilberto Freyre a questão central de Casa Grande e Senzala é o encontro intercultural das três raças constituidoras do povo brasileiro, um encontro fraterno, solidário e generoso, possível somente com a miscigenação.
Os portugueses tiveram que condescender com negros e indígenas acerca de aspectos familiares e sociais. Neste sentido, a miscigenação corrigiu a distância social entre a casa grande e a senzala. O português é descrito por sua miscibilidade, capaz de se misturar nos locais em que chegava, e no caso brasileiro não foi diferente sua mistura com indígenas e negros.
Neste mesmo sentido dispõe Freyre:
Híbrida desde o início, a sociedade brasileira é de todas da América a que se constituiu mais harmoniosamente quanto às relações de raça: dentro de um ambiente de quase reciprocidade cultural que resultou no máximo de aproveitamento dos valores e experiências dos povos atrasados pelo adiantado; no máximo de contemporização da cultura adventícia com a nativa, da do conquistados com a do conquistado (FREYRE, 1983, p. 128).
Freyre é inovador a seu tempo, ao desvincular raça de cultura, para ele:
A formação patriarcal do Brasil explica-se tanto nas suas virtudes como nos seus defeitos, menos em termos de “raça” e “religião” do que em termos econômicos, de experiência de cultura e de organização da família, que foi aqui a unidade colonizadora (FREYRE, 1983, p. XXXV).
A herança lusitana é marcada por uma aversão congênita a qualquer ordenação impessoal e o patriarcalismo presente no Brasil é o responsável por isso.
Portugal sempre foi um país focado na ética da aventura, em total contraposição à ética protestante existente em alguns outros países europeus, baseados no trabalho. 
Nessa linha, não só Gilberto Freyre, mas também Sérgio Buarque de Holanda irão descrever a formação social brasileira a partir de uma visão culturalista, sem abordar a vertente política. Ou seja, enxergam uma sociedade sem conflitos na qual o jeitinho e a cordialidade são expedientes comuns na solução de problemas sociais.
Em 1936, o historiador Sérgio Buarque de Holanda publica o livro Raizes do Brasil, e utilizando do método Weberiano, estabelece o tipo ideal do brasileiro, a quem Holanda chama de “o homem cordial”. O autor chama atenção para os aspectos culturais herdados da Península Ibérica, principalmente as raízes ibéricas do patriarcalismo no Brasil. 
O conceito de “homem cordial” é o que melhor consegue sintetizar a cultura ibérica e a estrutura social, marcada pelo culto à personalidade. Esse conceito retrata a personificação da herança ibérica, da baixa capacidade de racionalização e abstração, do tipo aventureiro de dominação portuguesa, numa estrutura rural, patriarcal, que é a base da estrutura social brasileira. 
O “homem cordial” representa a impossibilidade de existência de um estado puramente impessoal. Isso ocorre pelos padrões de convívio existentes, em que prevalece o concreto sobre o abstrato, do emocional sobre o racional, do íntimo sobre o impessoal. São elementos que ultrapassam a esfera privada e projetam-se nas esferas social e política. Há a invasão do público pelo privado.
Os elementos culturais ibéricos impactam não só no processo de colonização, mas na estrutura social brasileira. A natureza do Estado brasileiro é claramente influenciada pelo culto à personalidade e à consequente confusão entre público e privado, traço característico de um estado patrimonial:
No Brasil, pode-se dizer que só excepcionalmente tivemos um sistema administrativo e um corpo de funcionários puramente dedicados a interesses objetivos e fundados nesses interesses. Ao contrário, é possível acompanhar, ao longo de nossa história, o predomínio constante das vontades particulares que encontram seu ambiente próprio em círculos fechados e pouco acessíveis a uma ordenação impessoal. Dentre esses círculos, foi sem dúvida o da família aquele que exprimiu com mais força e desenvoltura em nossa sociedade. E um dos efeitos decisivos da supremacia incontestável, absorvente do núcleo familiar [...] está em que as relações que se criam na vida doméstica sempre forneceram o modelo obrigatório de qualquer composição social entre nós. Isso ocorre mesmo onde as instituições democráticas, fundadas em princípios neutros e abstratos, pretendem assentar a sociedade em normas antiparticularistas (HOLANDA, 2008, p. 146).
O ponto mais importante da obra de Sérgio Buarque é sem dúvida o conceito de homem cordial. Trata-se de um ser social e produto de nossa formação histórica, que de acordo com a definição de Buarque, seria um componente psicológico avesso à civilidade, a aspectos da formalidade, como regras e convenções, constituindo um traço marcante do caráter brasileiro. Assim é descrita a cordialidade e o tipo ideal do homem cordial:
A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade, virtudes tão gabadas por estrangeiros que nos visitam, representam, com efeito,um traço definido do caráter brasileiro, na medida, ao menos, em que permanece ativa e fecunda a influência ancestral dos padrões de convívio humano, informados no meio rural e patriarcal. Seria engano supor que essas virtudes possam significar “boas maneiras”, civilidade. São antes de tudo expressões legítimas de um fundo emotivo extremamente rico e transbordante. Na civilidade há qualquer coisa de coercitivo – ela pode exprimir-se em mandamentos e em sentenças. Entre os japoneses, onde, como se sabe, a polidez envolve os aspectos mais ordinários do convívio social, chega a ponto de confundir-se, por vezes, com a reverência religiosa. [...] Nenhum povo está mais distante dessa noção ritualista da vida do que o brasileiro. Nossa forma ordinária de convívio social é, no fundo, justamente o contrário da polidez (HOLANDA, 2008, p. 146-147).
Sérgio Buarque reconhece no homem cordial um ser social, produto da nossa formação histórica. O indivíduo moderno constrói molda em si mesmo uma máscara de civilidade, que apesar de polida, é espontânea e retira sua individualidade, ou seja, viver em sociedade é um subterfúgio do homem cordial ao horror de viver consigo mesmo. Não cabe à cordialidade qualquer juízo ético, é um elemento constitutivo de um ser e está enraizado na historicidade desteser social. 
Com o termo “homem cordial” o historiador tenta explicar o caráter do brasileiro. Um dos traços do brasileiro cordial era, segundo o historiador, a propensão para sobrepor as relações familiares e pessoais às relações profissionais ou públicas.
O que é verificada logo na abertura do capítulo que aborda o homem cordial: “O Estado não é uma ampliação do círculo familiar”, afirma o autor. “Não existe, entre o círculo familiar e o Estado, uma gradação, mas antes uma descontinuidade e até uma oposição.” (HOLANDA, 1995, pag 141).
O brasileiro, de certa forma, tenderia a impessoalidade de sistemas administrativos em que o todo é mais importante do que o indivíduo. Daí a dificuldade em encontrar homens públicos capazes de respeitar a separação entre o público do privado e que ponham os interesses do Estado acima das amizades.
Nesse sentido, podemos encontrar em livros de História do Brasil a explicação de que durante boa parte da colonização do país o Estado se confundia com a figura do senhor de engenho, do fazendeiro de café e, anteriormente, com os próprios donatários das capitanias hereditárias. Ou seja: a autoridade estava acima de qualquer outra lei.
Para Sérgio Buarque de Holanda a força da família na nossa história é o que estabelece a raiz do nosso caráter, é o que faz de nós sermos como somos. A família possui uma força tão intensa na nossa história que essa intensidade é capaz de transpor-se para outras relações, fazendo com que o brasileiro busque criar intimidade, familiaridade, proximidade em outras relações sociais que não as familiares.
Buarque de Holanda exemplifica fazendo a diferença entre a Língua Portuguesa falada no Brasil da Língua Portuguesa falada em outros países, quando aqui instituimos o diminutivo “inho” para estabelecer a proximidade, criar intimidade, tornando as pessoas mais acessíveis.
Outro exemplo dado pelo autor é a tendência dos brasileiros em omitir o nome da família no tratamento social. No geral o nome individual, de batismo, prevalece nas relações sociais brasileiras, como ideia de abolição psicológica de barreiras entre os indivíduos.
O desconhecimento de qualquer forma de convívio que não seja emotiva é o que caracteriza essa maneira do brasileiro ser. O brasileiro tem certa repulsa, distância, por aquilo que é muito impessoal, que é muito burocrático. Há sempre a busca pela intimidade. Prevalece o espírito do governo patrimonialista.
Estas estratégias patrimonialistas de favorecimento operam como um mecanismo de cooptação e mostram em sua faceta o controle social, pois na aparência os dominados recebem privilégios, se igualando aos dominadores, porém estes continuam com sua dominação e àqueles continuam subjugados.
Podemos identificar que há uma ética emotiva no homem cordial descrito por Sérgio Buarque de Holanda. Uma pessoa dominada pelo coração. De um lado muito afável, que abre as portas da casa, mas de outro lado, movida pela emoção, uma pessoa muito violenta, incapaz de respeitar o outro, de exercer o sentimento de empatia. 
Em pesquisa sistemática de internações realizada pelo Sistema Único de Saúde os acidentes de trânsito foram responsáveis por um total de 37.801 mortes no de 2008.. 
Dessa forma resistimos em enfrentar as mazelas da sociedade brasileira. Assim, faz-se necessário enxergar que esse homem cordial, e ao mesmo tempo violento, pode esconder uma grande indiferença para nossas desigualdades sociais.
Todavia, Sérgio Buarque de Holanda acreditava que o homem cordial, de origem patriarcal, estaria fadado a desaparecer, pois a expansão da urbanização e o progressivo desenvolvimento das cidades levariam ao colapso dessa caracterização pessoal do homem brasileiro, já que a racionalização das interações sociais seria inevitável.
Em seu livro Carnavais, Malandros e Heróis, o antropólogo Roberto DaMatta descreve o dilema herdado pelo brasileiro. De um lado, nos submetemos a um sistema de leis impessoais, cuja obediência nos países desenvolvidos nos causa inveja e admiração. Contudo, no Brasil encaramos essas leis como uma espécie de estraga prazeres, como artifício com intuito de dificultar a vida do cidadão. 
DaMatta identifica na sociedade brasileira um sistema de rede de contatos, em que impera o parentesco, a amizade ou qualquer outra ligação pessoal com a finalidade de desrespeitar de forma velada a legislação.
Ou seja impera por aqui a ideia de que a lei é uma forma de castigo, e que para fugir deste castigo vale a malandragem, o “jeitinho”. 
DaMatta descreve o “jeitinho brasileiro” no dia a dia da nossa sociedade exemplificando diversas situações. 
Relata aquele antropólogo a atuação do servidor no serviço público, dizendo que aqui no Brasil o servidor toma “posse” nos cargos públicos, e que essa posse muitas vezes se confundem, fazendo com que haja o empossamento do Estado pela pessoa do servidor. 
Diz também que no Brasil há lei especial para presos, e que essas leis criam diferenciação social no país, cita lei especial para preso militar; lei especial, no caso de responder processo criminal, para aquele que possui nível universitário.
Afirma que a sociedade brasileira combina o que há de mais moderno, no sentido de uma ideologia igualitária e individualista, com as relações de alta pessoalidade tão básica em nossa sociedade.
O autor descreve como nós nos sentimos mal quando chegamos a algum local onde ninguém nos conhece, como por exemplo no saguão de aeroporto. 
Pergunta porque os dramas se repetem, e finaliza a reportagem respondendo que todos nós faríamos a mesma coisa no lugar daquela pessoa, porque aqueles são costumes enraizados na sociedade brasileira.
DaMatta busca em sua abordagem confrontar alguns conceitos, elevando-os a uma dualidade: pessoal e impessoal, público e privado, casa e rua, pessoa e indivíduo. Assim, DaMatta define o Brasil:
um sistema onde a conjugação tem razões que os termos que ela relaciona podem perfeitamente ignorar. [...] é básico estudar aquele & que relaciona a casa-grande com a senzala e aquele suposto espaço vazio [...] que relaciona dominantes e dominados (DAMATTA, 1997a, p. 25).
É neste contexto que é formada a relação entre a Casa e a Rua. A questão entre tradição e modernidade é vista pela sociedade brasileira da seguinte forma:
O seu lado tradicional (simbolizado no paradigma da casa; ou melhor: da casa como um modelo para a sociedade) e o seu lado ‘moderno’ (representado por um conjunto de leis que deveriam tornar o país uma sociedade contemporânea) (DAMATTA, 1997b, p. 24).
Outra distinção que DaMatta faz diz respeito ao dualismo entre pessoa e indivíduo, como duas formas de conceber o universo social e nele agir. O indivíduo representa a igualdade e o individualismo, o anonimato, a ênfase nas leis universais, sendo apresentada como igual para todos. 
A pessoa refere-se à hierarquia e à pessoalização, é uma vertente coletiva da individualidade, uma máscara colocada em cima do indivíduo ou entidade individualizada (linhagem, clã, família, associação, clube, etc.). Dá-se personificação à pessoa.
A importância desta distinção é latente quando DaMatta estuda o “sabe com quem está falando”, que abandona o caráter de homem cordial do brasileiro e denota seu lado autoritário e hierarquizante. O elemento pessoal domina o elemento abstrato, legal, que se refere ao mundo dos indivíduos indiferenciados.
É como se tivéssemos duas bases por meio das quais pensássemos o nosso sistema. No caso das leis gerais e da repressão, seguimos sempre o código burocrático ou a vertente impessoal e universalizante, igualitária, do sistema. Mas no caso das situações concretas, daquelas que a “vida” nos apresenta, seguimos sempre o código das relações e da moralidade pessoal, tomando a vertente do jeitinho, da malandragem e da solidariedade como eixo de ação. Na primeira escolha, nossa unidade é o indivíduo; na segunda, a pessoa. A pessoa merece a solidariedade e um tratamento diferencial. O indivíduo, ao contrário, é o sujeito da lei, foco abstrato para o qual as regras e arepressão foram feitas (DaMatta, 1997b, p. 218).
Ao que tudo indica, no caso brasileiro o indivíduo representa a noção moderna, ligada a um poderoso sistema de relações pessoais. Em formações sociais desse tipo, calcado nas relações pessoais, a oposição indivíduo/pessoa é sempre mantida (DAMATTA, 2001).
Roberto DaMatta considera que no primeiro documento sobre o Brasil já existe a presença do jeito. Na Carta de Pero Vaz de Caminha a El Rei de Portugal, o autor encerra a mesma com um pedido ao rei de Portugal para transferir seu genro Jorge de Osório da ilha de São Tomé. Para DaMatta, os elogios citados na carta referentes à nova terra na verdade tinham como objetivo primeiro permitir tal pedido. Pero Vaz de Caminha escreveu a elogiosa carta sobre a descoberta e o novo mundo, mas um de seus objetivos, além do relato da descoberta, era conseguir um benefício a um parente.
A partir da colocação de DaMatta é plausível considerar que o jeitinho pode ser considerado como uma herança ibérica, ou ainda, fruto do processo de colonização e miscigenação ocorridos no Brasil. Não se trata, pois, de um elemento recente da cultura e comportamento brasileiro.
Um dos principais autores que aborda a questão do jeitinho é Roberto DaMatta. Algumas de suas obras são de fundamental importância para a o estudo e compreensão da cultura brasileira. Em O que faz o brasil, Brasil, escrito em 1984, o autor trata a questão do jeito sem desconsiderar a malandragem, considerando-os como uma navegação social.
No dia a dia o jeitinho representa a imposição do eu contra a norma impessoal que desvaloriza a individualidade. Assim, o jeitinho surge na realidade de suas implicações sociológicas como uma instituição de pleno direito, como instrumento que ajuda a navegar o oceano turbulento do oceano brasileiro (DaMatta, 2001). Uma regra universalizante pode deixar de ser considerada se o requerente for uma velhinha simpática, um deputado ou uma moça bonita. 
A origem do jeito ocorre, como um foco cultural no relacionamento doméstico, ainda na infância, onde se aprende que sempre haverá um caminho para se satisfazer os desejos, ainda que tal caminho seja contrário às normas. 
Já na perspectiva adulta do indivíduo, há o dilema da sobrevivência perante situações sociais e legais desfavoráveis que o indivíduo precisa encontrar uma solução ou um caminho alternativo. Para isto, utiliza-se das relações pessoais. 
Assim, o autor considera a malandragem e o jeito como modos profundamente originais e brasileiros de se viver (DaMatta, 2001, p. 97).
O jeito constitui, pois, uma forma de navegação social diante da proibição autoritária. Na maior parte dos países as regras são obedecidas. A coerência entre regra jurídica e a vida diária, os indivíduos seguem as regras no seu dia a dia, seja apenas para parar numa placa de trânsito. Para eles a regra não foi criada inutilmente ou para criar situações de desconforto ao cidadão, mas como instrumento benéfico e regulador da sociedade. Para o brasileiro isso soa como absurdo, a lei não é considerada como algo a ser seguido e obedecido. Muitas leis ao serem criadas recaem sobre a população como algo totalmente alheio a sua realidade. 
Dessa forma, a lei “é insensível e não é gente como nós, todo mundo fica, como se diz, numa boa, e a vida retorna ao seu normal” (DaMatta, 2001, p. 89).
Podemos ver nesta obra que DaMatta traça parâmetros fundamentais sobre a análise de estudos posteriores referentes ao jeito. A obra é fundamental por tratar a questão lidando diretamente com as questões do cotidiano e fazer uma abordagem a partir das relações pessoais. Os estudos de DaMatta foram de crucial importância para alicerçar a base teórico conceitual do Jeitinho.
Para se estudar o jeitinho enquanto uma categoria cultural brasileira é preciso compará-lo com a categoria apresentada por DaMatta do “Você sabe com quem está falando?”, fruto do dilema constante na sociedade brasileira entre indivíduo e pessoa, que representam duas vertentes ideológicas centrais no Brasil, o individualismo e a hierarquia. O “você sabe” representa a matriz hierárquica e autoritária da sociedade brasileira, enquanto que o jeitinho representa o lado cordial do individualismo.
O “você sabe” ocorre quando há uma situação de confronto entre uma regra ou a pessoa que a representa, ou entre pessoas que momentaneamente esqueceram suas identidades sociais e se colocaram momentaneamente em igualdade. O “você sabe” é utilizado como forma de resgatar a hierarquização e recolocar cada um em seu lugar estamental. Já o jeitinho depende da lógica da situação, caracterizando uma multiplicidade de eventos e desorientando aqueles que se encontram alheios à mecânica do sistema (BARBOSA, 2006, p. 92).
A grande diferença entre estas categorias é a possibilidade de seu emprego: enquanto o “você sabe” tem uso restrito a alguns que ocupam posição de destaque ou se encontram próximo a eles, o jeitinho é utilizado por todos de forma democrática, pode ser conseguido por qualquer pessoa, independente de sua posição na escala social. Além disso, enquanto que no jeitinho o anonimato pode ser preservado, no “você sabe” esta possibilidade está excluída. 
As situações podem evoluir do jeitinho para o “você sabe”, em que se começa com uma forma de se conseguir algo através do anonimato e diante da impossibilidade de sua obtenção o ator adota o “você sabe”. Isto só é possível porque tanto o jeitinho quanto o “você sabe” são estratégias de ação social, válidas e expressivas, entre os brasileiros (BARBOSA, 2006, p. 94-95).
Existem alguns pontos semelhantes entre as duas categorias e pontos de diferenciação. 
Barbosa apresenta a seguinte tabela comparativa dos pontos do jeitinho e do “você sabe”, conforme pode ser visto abaixo:
	“Você sabe com quem está falando?
	Jeitinho
	Faz uso da autoridade e do poder
	Faz uso da barganha e da argumentação
	Parte do pressuposto de que as desigualdades sociais têm valor
	Parte do pressuposto igualitário
	Não é acessível a todos da sociedade em todas as situações
	É acessível a todos da sociedade
	Baseia-se, para sua eficácia, na identidade social. Faz uso de laços com a sociedade
	Não depende, exclusivamente, de laços mais profundos com a sociedade Depende basicamente de atributos pessoais, da personalidade.
	Pode começar e terminar anonimamente
	A identidade social dos participantes sempre termina desvendada
	Não é conhecido por todos da sociedade
	É conhecido por todos da sociedade
	É um rito de separação
	É um rito aglutinador
	A reação ao uso da expressão é sempre enfática e negativa
	A reação ao uso da expressão é predominantemente positiva; a negativa é sempre expressa de forma branda
	Está ausente de qualquer imagem do país e do povo de forma explícita
	É tomado como elemento de identidade social 
de forma explícita
	Suscita reciprocidade direta e negativa
	Suscita reciprocidade difusa positiva
	Possui ritual simétrico oposto
	Não possui qualquer situação social que seja a sua simétrica inversa
	Estabelece sempre uma relação negativa
	Estabelece sempre uma reação positiva
Referência: Barbosa, 2006, p. 99-100
Ambos só podem existir em universos sociais contaminados pela ótica individualista, impessoal, igualitária e anônima. Um universo social, hierárquico e holista prescinde de qualquer um destes mecanismos, pois as posições dos interlocutores já estão dadas previamente (BARBOSA, 2006, p. 100).
Estas categorias mostram que existem alternativas para a resolução de problemas e conflitos e existem diferentes valores sociais atribuídos a cada um 
deles.
Como já vimos, esta locução traz à tona todo o caráter hierárquico da sociedade brasileira, sendo este provável fruto das relações patriarcais e patrimoniais constituídas na formação brasileira. 
A cordialidade permanece na sociedade brasileira concomitantemente com as relações hierárquicas existentes. O jeitinho se configura como um traço característico da cordialidade. Enquantoa locução hierárquica “você sabe” é restrita a alguns poucos que possuem alguma posição destacada na configuração político-social, o jeitinho pode ser apropriado por todos, em todas as esferas. Enquanto o “você sabe” diz respeito a hierarquia, o jeitinho se refere à barganha e à argumentação.
Nesta relação entre jeitinho e “você sabe”, podemos concluir, nas palavras de Barbosa, que o jeitinho expressaria, na prática social brasileira, uma complexa relação existente no nível de nossas representações entre a visão hierárquica e individualista de perceber o mundo e as formas específicas de atualização de uma e outra, a partir do contato que estabeleceram. 
Enquanto o “você sabe” exprime a tensão entre essas duas visões de mundo e a tentativa metafórica de limitar o avanço do individualismo, por meio da colocação de todos nos seus devidos lugares, o jeitinho exprimiria a relação que a sociedade brasileira tem tentado estabelecer entre as duas, de forma a que nenhuma seja hegemônica em relação à outra.
O drama social do jeitinho tenta, a um só tempo, conciliar princípio individualista da regra universalizante e da igualdade ao tratamento personalizado, concebido e previsto pela ótica hierárquica e holista (BARBOSA, 2006, p. 105).
2.3 Jeitinho brasileiro e corrupção
A palavra jeito possui a característica de ser uma habilidade (mesmo que a de enganar) que faz parte do caráter do indivíduo e que, no popular brasileiro, na expressão - dar um jeito -, é “encontrar uma solução para determinada situação” (AURÉLIO, 1999) difícil de ser deliberada ou problemática. (MUNIZ, 2009)
É raro encontrar alguém no Brasil que não saiba responder sobre o que é o jeitinho. Logo, a pluralidade dos brasileiros reconhece que o jeitinho é uma forte instituição que marca o seu dia a dia, sendo conhecido e legitimado por segmentos sociais. O antropólogo Roberto DaMatta afirma que o jeitinho é “como um instrumento que ajuda a navegar o oceano turbulento do cotidiano brasileiro, um dia a dia marcado pelo inferno das incoerências entre as leis explícitas... e as práticas sociais”. Assim, constatamos que a utilização do jeitinho é comum entre a população, que usufrui dessa “prática social” por motivos variados. (MUNIZ, 2009)
É possível considerar que não existe uma única classe social na qual o jeitinho não tenha sua utilidade. Ele é aproveitado por todas as camadas sociais, porém não da mesma forma e a grande diferença reside na maneira através da qual cada uma consegue tirar sua vantagem. Uns usam o dinheiro, outros a argumentação, outros a coerção, mas todos os segmentos da sociedade incorporaram essa conduta na sua rotina. O domínio do jeitinho é a burocracia, pois se (principalmente) a coisa pública fosse mais rápida e eficiente, o uso de tal método não seria tão instituído (BARBOSA, 2006).
Na obra O jeitinho brasileiro (2006), a antropóloga Lívia Barbosa afirma que a instituição do jeitinho é vista tanto em sentido positivo, o que tem aprovação, o valorizado, o elogiado, quanto negativo, aquele desaprovado, recusado, repelido. Quando é utilizado em questões políticas e econômicas, é visto como negativo como um “produto direto das distorções institucionais”; no entanto, ao ser empregado nas relações sociais, é visto como saudável e capaz de “promover ajustes face às imponderabilidades da vida e humaniza as regras a partir da igualdade moral entre os homens e das desigualdades sociais” (BARBOSA, 2006).
Na obra Dando um jeito no jeitinho e nos estudos feitos pelo autor é visível a divisão do jeitinho entre os aspectos mau e bom. O aspecto mau, que segundo ele é mais perceptível e mais considerado como jeitinho, é quando ele é visto como forma de burlar, de enganar, a fim de prejudicar o outro com veemência. Inúmeros casos podem ser citados para exemplificar essa forma negativa, entre eles, quando o jeitinho passa a ser desmoralizante e inconveniente. É o lado nefasto, o lado nocivo do jeitinho. Entretanto, existe outro contexto desta instituição que se manifesta no instinto de sobrevivência. É quando o ser humano se vê obrigado a ultrapassar seus limites de certo e errado perante as normas pré-estabelecidas de convívio em sociedade a fim de continuar a viver. Um exemplo seria quando uma pessoa perde o emprego e, para prover o seu sustento, se vê obrigada a vender mercadorias nem sempre lícitas. É o aspecto positivo do jeitinho, no qual se burla certa norma com o impulso espontâneo e alheio à razão para sobreviver, lembrando que tal instituição pode significar a diferença entre a morte e a sobrevivência e, por esse motivo, ela é empregada por todos, sem distinção. (MUNIZ, 2009)
Barbosa (2006) afirma que o jeito não é o favor, nem a corrupção, mesmo que a linha que os diferencia seja muito tênue. O favor é algo que pede uma reciprocidade, ou seja, geralmente as pessoas fazem favor umas às outras esperando algo em troca, ou ainda, se fica para pagar com outro favor quando o favorecedor precisar. Aqui já começa a diferença com o jeitinho que não tem a necessidade de ser retribuído; outro ponto diferencial é que um favor pressupõe o conhecimento entre as pessoas relacionadas, no entanto, em se tratando do jeitinho, esse poderá ser pedido a qualquer pessoa, inclusive a desconhecidos; o terceiro item de diferenciação é que o favor “não envolve a transgressão de alguma norma ou regra estabelecida, enquanto que o jeitinho envolve, quase sempre, algum tipo de infração”; um quarto ponto é o de que o favor “seria um comportamento mais formal, enquanto que o jeitinho, mais informal” (BARBOSA, 2006).
Já a corrupção é distinguida do jeitinho através da “vantagem material advinda da situação” (BARBOSA, 2006). A distinção entre esses dois elementos também é um pouco confusa, pois dependendo da situação o jeitinho poderá ser confundido com corrupção ou vice-versa. Se o resultado do montante da vantagem material for grande, a ação é configurada como corrupção, caso contrário, trata-se do jeitinho. Existem algumas diferenças entre jeitinho, favor e corrupção, porém é mais fácil perceber tal distinção quando os conceitos estão expostos teoricamente; já na prática, inúmeras vezes estes conceitos são usados para designar a mesma situação. (MUNIZ, 2009)
A questão sociológica do “jeitinho” é que ela mostra uma relação ruim com a lei geral, com a norma desenhada para todos os cidadãos, com o pressuposto que essa regra universal produz legalidade e cidadania. Exemplificando: se eu pago meus impostos integralmente, posso exigir dos funcionários públicos do meu país. Tenho o direito, como cidadão, de tomar conta da biblioteca ou do museu, que nacionais, também são meus. Agora, se eu dou um jeito nos meus impostos porque o delegado da receita federal é meu amigo ou parente e faz a tal “vista grossa”, aí temos o “jeitinho” virando corrupção. (DAMATTA, 2010)
DaMatta (1997) classifica o Brasil como o país do “não pode” e é por isso que se torna fácil, segundo o autor, desenvolver um modo, um jeito, um estilo de navegação social que transite sob o regime autoritário do “não pode”. É a confluência do que é permitido com o que não se permite que dá origem a tal prática social brasileira, que passa a ser “um modo simpático, desesperado ou humano de relacionar o impessoal com o pessoal... é um modo pacífico e até mesmo legítimo de resolver tais problemas, provocando essa junção inteiramente casuística da lei com a pessoa que a está utilizando” (DAMATTA, 1997). 
Entre as questões que propiciam o jeitinho, é citado o “legalismo”, ou seja, a necessidade no Brasil de se colocar tudo no papel e a “tendência de acreditar como resolvido tudo aquilo que é transformado em lei”. O que não é, nem de longe, a solução para os problemas sociais, e que ainda dá mais espaço para que o jeitinho se configure. Tal instituição implica “custos e benefícios” para a sociedade brasileira. Dentre os custos, temos: o custo econômico que gera má alocação de recursos, o aumento dos custos de produção ou má qualidade do produto e a injustiça social, além do retardamento em setratando da eficiência administrativa. (BARBOSA, 2006)
No Brasil, a República se fez e instituiu com ela o faz de conta de que todos obedecem à lei, quando sabemos que os velhos aristocratas e os donos do poder (os burocratas, e altos funcionários, e os eleitos) são mais donos do que o “povo”. Com isso, podemos continuar contemplando o privilégio de não cumprir integralmente a lei, debaixo de um regime igualitário. Em regimes onde o valor organizatório era calcado na desigualdade, o jeitinho era libertar o escravo, dar a um pobre as mesmas oportunidades de crescimento, educação e atuação. Implantando um regime social aristocrático de fato, de direito e de protocolo ideológico, a revolução igualitária. Na França, ela levou muitos para a guilhotina, aqui, ela inventou o “jeitinho” e o “você sabe com quem está falando?” ambas partes de uma mesma ficção jurídica. (DAMATTA, 2010)
No contexto popular, a instituição do jeitinho é uma forma singular de atingir objetivos de forma peculiar, sem percorrer as normas pré-estabelecidas, ou seja, sem respeitar as leis, burlar, enganar, mentir com a intenção de conseguir alcançar algum propósito. É visto pejorativamente, como algo mau, prejudicial, como uma falta de caráter. Dependendo do ponto de vista e da posição em que o indivíduo se encontra (se é ele quem usufrui do jeitinho ou se é vítima deste). (MUNIZ, 2009)
Costuma-se apontar a corrupção como uma das maiores mazelas da sociedade brasileira e, normalmente, quando questionada acerca desse assunto, a opinião pública tem como alvo favorito de críticas à classe política. É curioso, no entanto, que boa parte dessas pessoas que avaliam negativamente seus representantes costuma recorrer, usualmente, a pequenos artifícios que burlam o costume ético e, muitas vezes, até a lei. Estamos nos referindo ao nosso jeitinho brasileiro, à malandragem e ao jogo de cintura, "categorias" que, já incorporadas à nossa cultura, convivem lado a lado com os valores ético-morais mais tradicionais. A "ética" do jeitinho e da malandragem coexistindo com a ética oficial. (E. NETO, 2009)
Claro que a desonestidade não é uma exclusividade nacional. Mas é interessante ressaltar a peculiaridade brasileira na admissão das "categorias" jeitinho e malandragem como elementos paradigmáticos à ação "moral". Ou seja, no Brasil, curiosamente, exaltam-se, ao mesmo tempo, dois tipos aparentemente incompatíveis: o honesto e o malandro. Nesse sentido, como bem observou o antropólogo Renato da Silva Queiroz, a cultura brasileira é permeada por uma ambiguidade ética em que termos como "honesto", "corrupto", "esperto", "otário", "malandro" e "mané" se misturam e geram confusão no âmbito da moralidade. Esse caráter peculiar de nossa sociedade propicia alguns questionamentos: O que levou a cultura brasileira a essa ambiguidade moral? O que fez com que nossa sociedade cultivasse a glorificação da malandragem? A exaltação do tipo "malandro" tem contribuído para o engrandecimento de nossa cultura ou para sua degeneração? (E. NETO, 2009)
No final do século XIX, o filósofo Friedrich Nietzsche (Neto, 2009) se propõe a realizar uma crítica dos valores morais e, com isso, inaugura o seu procedimento genealógico, rompendo com a tradição religiosa que considera os valores como sendo eternos, universais e imutáveis. O pensador alemão passa a pensar esses valores por um viés histórico. Ou seja, os juízos de valor, antes concebidos como absolutos, teriam sido criados numa determinada época e a partir de uma cultura específica.
Tomando como ponto de partida essa perspectiva, o pensador alemão realiza um exame acerca das condições históricas por meio das quais os valores foram engendrados. Para efetivar essa investigação, Nietzsche utiliza-se de recursos da História, da Filologia, e da Fisiologia. Para ele, a investigação genealógica já é um procedimento que já implica uma determinada perspectiva valorativa. Sendo assim, sua análise deve ser entendida como uma interpretação - tem Brasileiro, que é malandro, sempre dá um jeitinho de lucrar. Quem está no poder, cheio de oportunidades de usar a influência do cargo para ganhar algo por fora, tem usado e abusado desta "ética frouxa" que nossa cultura da malandragem estimula.( E. NETO, 2009) 
Fazer uma fotocópia "clandestina" de um livro – do ponto de vista da Ética formalizada - seria algo reprovável e até mesmo ilegal, porém esta prática é uma das mais comuns em muitas universidades brasileiras. Apesar de se tratar de algo desviante de uma Ética tradicionalmente instituída, essa atitude não é difícil de encontrar sua justificativa: “no Brasil, onde o investimento em educação é precário e o acesso aos livros de qualidade é extremamente limitado, os estudantes - em sua grande maioria com restrições econômicas - são obrigados a recorrer a meios extraoficiais. Mas, será? (E. NETO, 2009)
Além desse exemplo, poderíamos citar diversas outras situações em que as condições efetivas da vida no Brasil se impõem ao "formalismo" ético: a mãe que fura a fila do atendimento médico de um sistema de saúde saturado para salvar o filho; o morador de uma comunidade carente que faz uma "gambiarra" (ligação clandestina com a rede elétrica) por não ter acesso econômico aos meios legais de distribuição de energia elétrica; o motorista que avança o sinal vermelho à noite para não ser assaltado; ou mesmo um saque de alimentos a um caminhão tombado na estrada. (E. NETO, 2009)
Mas não se trata de justificar uma transgressão generalizada. Como foi dito anteriormente, essa posição assume a "conservação da vida" como fundamento originário desse tipo de burla, contudo, é necessário ressaltar que isso não significa dizer que a "vida" continua sendo o único referencial criador para toda e qualquer atitude de infração à legalidade e ao costume ético tradicional. (E. NETO, 2009)
Em seu livro Carnavais, Malandros e Heróis, o antropólogo descreve o dilema herdado pelo brasileiro. De um lado, nos submetemos a um sistema de leis impessoais cuja obediência nos países ricos nos causa inveja e admiração. Internamente, contudo, encaramos essas leis como uma espécie de estraga-prazeres – e os burocratas, sabendo disso, parecem muitas vezes aplicá-las para dificultar a vida do cidadão. De outro lado, existiria o sistema da nossa “rede de contatos”, em que impera o parentesco, a amizade ou qualquer ligação pessoal que drible a lei. Trocando em miúdos: a lei é vista – e muitas vezes aplicada – como um castigo e para fugir desse castigo vale a malandragem, o jeitinho. (CAVALCANTE, 2010)
Em suma, o jeitinho se confunde com corrupção e é transgressão, porque ela desiguala o que deveria ser obrigatoriamente tratado com igualdade, ou seja, sem sine ira et studio, como dizia Max Weber.(DAMATTA, 2010)
2.4 Uma diminuição de tolerância e a busca por mudanças no século XXI
“A base dessas interpretações ainda é essencial, mas é preciso lembrar que o chamado caráter de um povo é algo que muda a cada instante”, diz a antropóloga Lilia Schwarcz, da USP. (CAVALCANTE, 2010)
Mas qual será a cara do brasileiro no século 21? “Acredito que algo está mudando”, diz a antropóloga Lilia Schwarcz. “A população parece menos propensa a aceitar o jeitinho quando ele significa a promiscuidade entre o privado e o público”, afirma. Segundo Lilia, um dos erros do brasileiro é acreditar que precisamos nos tornar sisudos e impessoais para fazer com que o país se desenvolva e todos tenham acesso à cidadania, o que para ela seria um falso dilema. (CAVALCANTE, 2010)
Guerreiro Ramos (apud MUNIZ, 2009) afirma que com o tempo o jeitinho está fadado ao desaparecimento e isso ocorrerá a partir do momento em que estas sociedades (em desenvolvimento) começarem a prosperar econômica e socialmente, pois, a partir daí, elas seriam obrigadas a ter posturas mais próximas à realidade social.
Visível é o início das transformações no contexto atual da sociedade brasileira. São diversas as formas de manifestações. Campanhas educativas, livros e artigos críticos sobre o paradigma do jeitinho são cadavez mais presentes nas ruas, na internet, nas livrarias, na televisão, etc., tornando-se conhecimento de alta acessibilidade e domínio público. E, como o jeitinho está ligado ao caráter emocional, pessoas começaram a externar sua intolerância quanto aos assuntos vinculados à corrupção e, para exemplificar essas manifestações, temos:
1. Protesto aconteceu no dia 3 de dezembro de 2013, em Piracicaba - SP.
Fonte: G1 – Central Globo de Produções
2. Campanha do CNJ nas redes sociais estimula o combate à corrupção e ao “jeitinho”.
Fonte: Site do CNJ
3. Campanha da CGU contra o fim do “jeitinho brasileiro” e que gerou grande repercussão nas redes
Fonte: Site da CGU
4. Marcha contra a corrupção realizada em Abril de 2013, com ênfase na derrubada da PEC 37 ( conhecida como PEC da Impunidade, a PEC 37 foi uma Proposta de Emenda Constitucional que não foi aprovada devido a grande pressão da sociedade. Basicamente, sua proposta era limitar o poder de investigação criminal as polícias civil e federal, retirando essa atribuição de outras instituições importantíssimas no combate a crimes, como o Ministério Público).
5. Charge veiculada na página da comunidade - Acorda Cidadão! Movimento de Cidadania e Politização - no facebook
6. Post veiculado na página de apresentador aclamado no facebook
3 CONCLUSÃO
O jeitinho é sim muitas vezes confundido com corrupção ou usado para designar tal ato. É também fruto histórico e cultural, que assumiu caráter institucional e está diretamente relacionado com valores ético-morais que permeiam a sociedade brasileira. A intolerância quanto aos atos corruptíveis vem aumentando e, quiséramos nós assegurar que é resultado de desenvolvimento. Mas como falar em resultado se a mudança não se concretizou e talvez não se concretize? Essa resposta ainda não tem uma solução possível, mas verificar as manifestações de insatisfação com relação à corrupção nos dá, com certeza, a possibilidade de enxergar a luz no fim do túnel. O fato de perceber que corrupção é corrupção, que não existe gradação de pecado e que a educação é um ponto de partida é um marco para uma futura mudança de paradigma. Não será um caminho fácil, afinal quebrar paradigma é por si só um enorme desafio, mas como todo bom brasileiro, que também o sou, eu acredito, acredito que é possível. Afinal, “a esperança é a ultima que morre”. E para finalizar cito Cavalcante (2005):
Digo então que se nossa malandragem estiver associada ao nosso lado bem-humorado, autocrítico e tolerante, cuja adaptabilidade se faz invejável, e ficar fora da política - aqui definida como a relação entre o privado e o público, o individual e o coletivo - então não há com que se preocupar. “Os holandeses, por exemplo, conseguem ser flexíveis e rir de si mesmos sem que isso signifique desrespeito às leis.” O jornalista espanhol Juan Arias (apud Cavalcante, 2005) concorda: “Por muito tempo, os espanhóis também acreditavam que não conseguiriam ser desenvolvidos como as nações vizinhas sem perder a sua identidade ibérica e católica”, diz. “Mas tanto a Espanha quanto a Irlanda e outros países viriam a descobrir que o problema não era de identidade, mas de falta de acesso da população a educação de qualidade, emprego – enfim, de cidadania.”
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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