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1 I RELATÓRIO NACIONAL SOBRE GESTÃO E USO SUSTENTÁVEL DA FAUNA SILVESTRE 1ª edição, abril de 2016 Sumário Sumário Sumário Sumário Sumário Sumário Sumário Sumário 10 ApRESENTAçÃO O Brasil é uma nação que possui grandes e difí- ceis desafios. Se por um lado temos abundância de recursos naturais, por outro, ainda não con- seguimos definir claramente uma agenda eficaz para garantir a harmonia entre as nossas neces- sidades sociais, econômicas e ambientais. Den- tre todos os desafios, nenhum é mais comple- xo do que encontrar o ponto de equilíbrio entre a promoção do desenvolvimento nacional e a conservação da biodiversidade brasileira. O caminho mais seguro para enfrentarmos as adversidades que se impõe à nação brasileira é a construção de Políticas públicas eficientes, cla- ras e objetivas. Porém, no Brasil, essas políticas são elaboradas e regidas prioritariamente pela política partidária e pela temporalidade dos go- vernos. Falta-nos ainda a solidez de uma Política Dener Giovanini Jornalista e Coordenador-Geral da Renctas. ì 12 de Estado. Eis aí a maior ameaça que paira sobre toda a nossa riqueza ecológica, em espe- cial, sobre a fauna silvestre. A ausência de um rumo em nossas políticas públicas implica em imensas perdas para a nossa diversidade biológica. O sistemático avanço econômico sobre as nossas reservas naturais acarreta um acelerado e descontrolado processo de desaparecimento dos bio- mas nacionais. Continuadamente, a fauna silvestre brasileira padece sob a redução drás- tica de seus territórios, sob a contínua deficiência de projetos de pesquisas e conservação e sob a permanente ameaça do comércio ilegal de animais, dentre outras. Ao longo de 15 anos de intenso, árduo e reconhecido trabalho em prol da biodiversidade brasileira, a Renctas sempre atuou de forma a manter a sua independência institucional. Todo o seu rico e profícuo portfólio de ações credenciaram a instituição como uma fonte confiável de informações e uma referência nacional e internacional não apenas no com- bate ao tráfico de animais silvestres, mas também como um modelo bem-sucedido para se alcançar resultados reais. Fomos a primeira organização brasileira a atuar nacionalmente no combate ao tráfico de animais silvestres. Influenciamos decisivamente a mídia a pautar esse tema. Treinamos e capacitamos milhares de agentes públicos com a realização de 17 workshops nacio- nais. Realizamos a I Conferência Sul-Americana Sobre o Tráfico de Animais Silvestres, o que promoveu a integração de ações governamentais e não governamentais em todo o continente. Fomos também responsáveis por seis Campanhas Nacionais de Conscienti- zação Ambiental, além de termos atuado decisivamente na realização de duas CPIs sobre o tema. Nossa atuação foi ampla, diversa, e não caberia citar aqui todas as nossas ações. Elas estão disponíveis para quem desejar consultá-las em nosso site: www.renctas.org.br Entendemos que a Renctas cumpriu de forma exitosa a missão que abraçou. Os prêmios e reconhecimentos nacionais e internacionais que nos agraciaram são uma certificação e reconhecimento da eficiência do trabalho que realizamos. Inspiramos muitas outras organizações a se engajarem no combate ao tráfico de animais silvestres ao tornarmos esse tema uma pauta recorrente na mídia nacional e internacio- nal. Hoje, o Brasil possui muitas entidades que atuam no combate ao tráfico de animais e continuam seguindo a trilha demarcada pela Renctas. Nos sentimos orgulhosos ao cons- tatarmos que os nossos números, nossas estratégias e nosso modelo de atuação estão sendo copiados e replicados continuamente em nosso País e também no exterior. Marcarmos a história no combate a essa atividade criminosa, mas, principalmente, inspi- ramos seguidores a cumprir essa missão, o que nos faz sentir que estamos preparados e capacitados para trabalhar numa fundamental e prioritária pauta para a conservação da biodiversidade brasileira: a efetivação de uma política nacional de fauna. Mais grave e muito mais danoso que o tráfico de animais silvestres é a ausência de uma Política de Estado que organize, normatize as ações governamentais e sociais e impacte diretamente na conservação da fauna brasileira. 13 No Brasil de hoje assistimos a uma sistemática indefinição jurídica, uma conflituosa nor- matização e uma perigosa “personalização” das ações do poder público sobre a nossa fauna silvestre. Isso acarreta – além da eliminação de milhões de espécimes – uma con- tínua desorganização estatal, que fomenta o afastamento de investimentos em projetos de conservação, particularmente aqueles destinados à pesquisa científica, ao manejo e ao uso sustentável da biodiversidade brasileira. Desde 2003, o Brasil vem assistindo a um constante e forte retrocesso em suas políticas de meio ambiente. Ações como o enfraquecimento do Ibama, através do seu esquarte- jamento para a criação do ICMBio e demais órgãos desestruturados e amorfos, é apenas um dos muitos exemplos de uma gestão ambiental desastrosa e inconsequente. Diante de tamanha e alarmante situação, a Renctas entende que precisa atuar de forma global, dinâmica e mais ampla na conservação da fauna silvestre brasileira. Restringir-se apenas ao combate ao tráfico de animais silvestres é fechar os olhos para o caos. É con- seguir enxergar apenas a ponta do iceberg. É restringir a visão apenas aos sintomas, sem sanar as verdadeiras causas da doença. Como já foi aqui dito, atuamos com competência e deixamos seguidores. Agora é o mo- mento ideal para trilharmos caminhos mais difíceis e desafiadores. É com esta perspectiva que apresentamos o I Relatório Nacional Sobre Gestão e Uso Sustentável da Fauna Silvestre. Um documento elaborado com a participação dos mais respeitados e renomados especialistas em gestão e conservação de fauna do Brasil e do exterior. Esse documento será – mais uma vez – um marco não apenas na história de nossa or- ganização, mas principalmente de nosso País, assim como foi o I Relatório Nacional So- bre o Tráfico de Animais Silvestres que a Renctas publicou em 2001. Temos a absoluta convicção de que o leitor encontrará nesse Relatório uma importante fonte de consulta para a criação de uma política nacional de fauna que priorize a conservação e, fundamen- talmente, a promoção do conhecimento científico e a compreensão do que necessita- mos fazer, deixando no passado os 12 anos de profundo e sombrio descaso com a nossa biodiversidade. Agradeço a todos os colaboradores que ajudaram na elaboração desse Relatório e fica aqui o desejo de uma boa e profícua leitura a todos. Brasília, abril de 2016. Dener Giovanini Coordenador-Geral - Renctas 14 CENÁRIO NACIONAL ATUAL I.I - Os principais problemas que incidem sobre a fauna silvestre brasileira Capítulo I Introdução O acúmulo de problemas relacionados à defe- sa da fauna silvestre brasileira chegou a um es- tado de atenção inédito na história ambiental do País. Naturalmente, para começar a pensar nas mudanças necessárias no atual modelo de gestão da fauna, é fundamental apontar as ad- versidades que ela enfrenta e submetê-la a es- tudos mais acurados, a fim de entender como tais problemas podem ser superados. RISCOS ImINENTES perigos e problemas que ameaçam a fauna silvestre brasileira 16 É importante notar que uma parcela considerável desses infortúnios não atinge apenas o meio ambiente, mas também a saúde pública e as atividades comerciais. Atualmen- te existem diversos atritos na legislação que incidem sobre a gestão da fauna silvestre e exótica no País. Em alguns casos, esse conflito entre legislação, portarias e instruções normativas resultam numa disparidade na interpretação de conceitos essenciais (como a própria definiçãode fauna silvestre) que justificam decisões judiciais sem base legal. Isso acaba abrindo brechas de natureza jurídica e, consequentemente, um obstáculo adicional para a proteção de nossa biodiversidade. A falta de unidade e a divergência interpretativa na legislação ambiental, em suas várias instâncias, resultam numa grande insegurança jurídica que não só afeta a gestão da fau- na, como acaba interferindo até mesmo nas atividades dos órgãos ambientais, gerando, em muitos casos, desentendimentos entre eles. Alguns números surpreendem. O Ibama, por exemplo, arrecadou apenas 2% do total de multas emitidas entre 2005 e 2010, numa clara evidência de que algo está errado no que tange à aplicabilidade das leis ambientais e à sua eficácia no território da punibilidade. Além do âmbito jurídico, existem outras ameaças da mesma magnitude. A perda dos ha- bitats da fauna silvestre em consequência da ação humana é a principal causa da extinção de espécies no mundo, e essa talvez seja a ameaça mais crucial no cenário contempo- râneo. De acordo com dados divulgados pelo Ministério do Meio Ambiente, 9,57% das espécies da fauna brasileira enfrentam algum grau de ameaça. Os fatores de redução dos ambientes naturais variam. Figuram, porém, entre os principais a construção de hidrelé- tricas, rodovias e obras de infraestrutura; desmatamentos e queimadas para abertura de áreas para as atividades agropecuárias; e a expansão urbana. A influência da agricultura no equilíbrio ambiental merece destaque, pois a atividade está diretamente conectada aos ecossistemas e depende dos recursos naturais e dos serviços ambientais para sua própria sobrevivência. A introdução de espécies exóticas com potencial de invasão também resulta em situações críticas para a saúde pública, a economia e o meio ambiente. Um bom exemplo é a disse- minação da dengue no País. O mosquito Aedes aegypti, transmissor da doença, chegou da África às terras brasileiras acidentalmente. O mesmo pode ocorrer com os vetores da gripe aviária e das febres chikungunya e do Nilo. Estima-se que cerca de 5% de toda eco- nomia mundial seja afetada em razão da invasão de espécies exóticas, um fenômeno que gera enormes prejuízos para a agricultura, a pecuária e a pesca, entre outros setores pro- dutivos. Soma-se a esse quadro os danos ambientais propriamente ditos, que interferem diretamente na manutenção das espécies, no equilíbrio dos ecossistemas e na redução da biodiversidade local. Apesar da posição de alguns especialistas de que as espécies exóticas são uma consequência natural da expansão das atividades humanas, existem medidas ca- pazes de controlar ou minimizar os efeitos dessas invasões. Uma dificuldade para a proteção da fauna silvestre advém da falta de articulação entre os órgãos responsáveis pela gestão ambiental em nosso País. Soma-se a isso a falta de in- formação da sociedade, que em grade parte ainda desconhece a existência de criatórios 17 autorizados a comercializar espécies silvestres para o mercado pet ou de estabelecimen- tos certificados para criarem e abaterem animais nativos para o consumo de sua carne ou subprodutos, como o couro. A biopirataria, aqui entendida como o uso indevido dos recursos genéticos e dos conhe- cimentos tradicionais, é outro tema que merece atenção da sociedade brasileira. São fre- quentes os casos de coletas, pesquisas e apropriação dos nossos recursos naturais por ins- tituições estrangeiras. Entre os principais exemplos estão as espécies Jararaca (Bothrops jararaca), serpente cujo veneno é a base para o desenvolvimento de medicamentos cardí- acos, e o sapo-kambô (Phyllomedusa bicolor), cuja secreção se extrai a deltorfina, impor- tante substância utilizada como analgésico. Apesar de não existir uma estimativa oficial do Governo Federal do prejuízo econômico relacionado à biopirataria, o caminho principal para sua prevenção está na ampliação da fiscalização ambiental, desenvolvendo um trabalho de inteligência investigativa e planejando ações integradas, envolvendo o Ibama, a Polícia Fede- ral, a Funai, entre outros órgãos federais. Tal tipo de ação coordenada seria útil também para inibir o comércio ilegal e o tráfico inter- nacional de nossa fauna. Calcula-se que cerca de 38 milhões de espécimes animais sejam retirados anualmente dos ecossistemas brasileiros para serem vendidos irregularmente no território nacional e em outros países. A influência dessa atividade ilícita causa danos diretos e irreparáveis ao meio ambiente e à economia. Os animais traficados também não passam por nenhum tipo de controle sanitário, podendo representar riscos para a saúde pública e disseminar doenças para os rebanhos de produção. O desequilíbrio ecológico é um outro problema gerado pela retirada ilegal de fauna silvestre. É sabido que cada es- pécime cumpre uma função biológica importante – seja para a variabilidade genética das populações selvagens, para a dispersão de sementes, para a polinização ou, por fim, como indicador da qualidade ambiental dos ecossistemas onde vive. 18 CENÁRIO NACIONAL ATUAL I.I - Os principais problemas que incidem sobre a fauna silvestre brasileira políticas públicas Capítulo I A legislação ambiental no Brasil é vasta e com- plexa. Além das principais leis que regulamen- tam o tema, há também portarias e instruções normativas criadas para regulamentar o setor. Na prática, no entanto, os conflitos entre as leis e algumas dessas portarias e instruções criam uma insegurança jurídica aos que se orientam por esses dispositivos. As contradições legais começam pela própria Lei n° 5.197/67, que EmARANhADO LEGAL Não faltam leis de proteção à fauna silvestre. O que falta é integração entre elas e punições capazes de inibir a reincidência 20 dispõe sobre a proteção à fauna e definiu como fauna silvestre quaisquer espécies que vivem naturalmente fora do cativeiro. Desta forma, entende-se que os espécimes nasci- dos no cativeiro, mesmo aqueles pertencentes as espécies silvestres, são considerados animais domésticos. No entanto, em normativas publicadas pelo Ibama, a fauna silvestre é definida como todo animal pertencente à espécie nativa que tenha todo ou parte do seu ciclo de vida ocorrendo dentro do território nacional, ou seja, inclusive aqueles nascidos em cativeiro. O resultado é uma conceituação teórica e confusa do ponto de vista legal. Quando en- tram em conflito com uma lei superior, as portarias e instruções normativas são, por ve- zes, consideradas inconstitucionais ou ilegais, já que não podem regulamentar o que não está previsto por lei. Tais conflitos trazem, portanto, diferentes interpretações, gerando dúvidas e permitindo que procedimentos sejam adotados de modo diferente em cada re- gião do País. Se, por um lado, as portarias, instruções normativas e resoluções dos órgãos ambientais visam facilitar mudanças em situações de emergência, por outro, acabam ge- rando insegurança jurídica em seu uso. Outro questionamento importante a ser feito é sobre o sistema de competências no Di- reito Ambiental. A chamada “segurança jurídica” para quem cria ou comercializa animais silvestres é escassa, uma vez que existem muitos conflitos entre os próprios órgãos am- bientais. Toma-se o exemplo de um determinado órgão que expede uma licença e, de- pois, outro que a contesta e revoga, com a alegação de que a emissão foi realizada por um órgão sem competência para tal, colocando, assim, outro problema no caminho do empreendedor. Entre 2005 e 2010, o Ibama emitiu R$ 630 milhões em multas para crimes contra a fau- na, mas só recebeu 2% desse valor. Além do não pagamento de multas devido às brechas legais ou à ausência de uma cobrança efetiva, as penas aplicadas para esse tipo de crime são muito leves, o que incentiva a reincidência. Surge, então, outra questão: qual a razão de quem praticacrimes ambientais quase nunca pagar as multas e nem permanecer preso? O Código Penal traz dois tipos de penalidades para esses casos: a pena privativa de liber- dade e a restritiva de direitos. Em muitos casos, o juiz substitui a primeira pela segunda. Ou seja, para não ficar preso, o criminoso paga pelo crime que cometeu de forma mais bran- da, como por exemplo, prestando serviços comunitários. De acordo com o Código Penal, a pena privativa de liberdade só pode ser substituída caso não seja superior a quatro anos e se o crime não tiver sido praticado com violência ou grave ameaça à pessoa. Se o réu não for reincidente, se avaliadas a sua conduta social, personalidade e antecedentes e verificar-se que a substituição é eficiente, ele recebe uma pena alternativa. Nos crimes contra a fauna, as penas de restrição de liberdade são inferiores a quatro anos. Sendo assim, quem mata, persegue ou caça espécies silvestres sem autorização do ór- gão competente pode, no máximo, receber de seis meses a um ano de prisão. A prestação de serviços à comunidade obriga o infrator a trabalhar durante um determina- do tempo, sem recompensa, favorecendo à sociedade. Em contrapartida, ele fica livre. Há quem defenda as penas restritivas de direito, pois entendem que a prestação de serviços 21 é positiva, uma vez que não abstêm o criminoso do convívio social e o seu trabalho traz mais benefícios que uma pena privativa de liberdade. No entanto, há quem não concorde com esta medida por acreditar que o infrator, diante da impunidade, voltará a praticar os mesmos crimes. Alguns legisladores defendem que o infrator da fauna seja enquadrado em outros crimes, como o de formação de quadrilha e receptação. Com isso, a pena seria sensivelmente aumentada. A Lei n° 9.605/98, de Crimes Ambientais, também é constantemente alvo de críticas, princi- palmente por não diferenciar criminosos contumazes de alguém que adquire um animal de forma ilegal. Outra crítica é pelo fato dela não estabelecer uma divisão clara entre infração e crime ambiental. Tal falha permite recorrente abusos e erros na fiscalização ambiental. Da forma como está, a lei deixa margem para que o órgão gestor sistematicamente converta falhas de procedimentos em delito, deixando de avaliar se de fato ocorreu algum dano ao meio ambiente, seja de forma direta ou indireta. As normas para a gestão de fauna estão dispostas no Decreto-Lei n° 4.339/02, que dispõem sobre a Política Nacional de Biodiversi- dade. É importante esclarecer que os atos administrativos – como, por exemplo, instruções normativas e portarias que regulamentam o uso da fauna – são normas infralegais, e na prá- tica não atendem o que está previsto no Decreto n° 4.339/02, sendo alteradas constante- mente, de acordo com a ideologia do gestor responsável pela fauna no momento. A Lei n° 9.605/98 também revogou a maior parte da Lei n° 5.197/67, principalmente no que se refere às penalidades previstas para os crimes contra a fauna. Na segunda, da década de 1960, o comércio ilegal era um crime inafiançável e previa pena de dois a cinco anos de reclusão. A lei era criticada por ser muito dura, enquanto que os crimes de fraude e corrupção tinham penas menores e eram afiançáveis. Na prática, o seu cum- primento dependia do delegado, ou seja, o traficante podia ficar na delegacia ou não. Às vezes, o grande traficante era liberado, enquanto que o pequeno, que não tinha condi- ções de custear um advogado, ficava preso. O objetivo da legislação ambiental não deveria ser apenas punir o criminoso, mas garantir a execução de uma política pública nacional de fauna, uma Política de Estado, de caráter amplo. Sendo assim, necessitamos de uma norma que tipifique o tráfico, a finalidade e, acima de tudo, diferencie o pequeno do grande traficante. Uma norma que dite penas dis- tintas para cada tipo de crime, de medidas socioeducativas à total reclusão, diferenciando inclusive o criminoso ambiental daquele que cometeu infrações administrativas. Para isso, bastaria implementar e normatizar o que está previsto em nossa política nacional de fau- na, que consta no Decreto nº 4.339/02. Transporte de animais No Decreto n° 5.741/06, o Ministério da Agricultura prevê a fiscalização do trânsito de ani- mais silvestres. Seguindo este decreto, seja qual for a via, é necessária a apresentação de um documento obrigatório, a Guia de Trânsito Animal (GTA), com informações sobre o destino e as condições sanitárias, além da finalidade do transporte. O objetivo é assegurar que o animal esteja em perfeitas condições sanitárias, para que não haja possibilidade de 22 difusão de zoonoses. Para obter o documento, é obrigatório o atestado de saúde emitido por um veterinário inscrito no Conselho Regional de Medicina Veterinária. Além desses procedimentos, o Ibama prevê a emissão de uma licença de transporte de animais silvestres. Aqueles animais que foram capturados na natureza são obrigados a passar por esse procedimento. Animais formadores de plantel, de centros de triagem e de apreensões de órgãos de fiscalização também devem ter a licença. Qualquer animal doméstico, que seja de criação e comercializado, está dispensado da documentação. Para a exportação ou viagens internacionais, são exigidos o Certificado Zoossanitário In- ternacional (CZI), que cumpre a mesma função da GTA ao atestar que os requisitos do País de destino estão sendo cumpridos, e a licença CITES, considerada uma espécie de passaporte para animais silvestres e exóticos listados pela convenção. Para as espécies não listadas, o Brasil emite uma licença específica do Ibama. As espécies contempladas pela CITES estão listadas em três apêndices, de acordo com o grau necessário de proteção para não impactar suas populações na natureza. O primeiro apêndice inclui as espécies ameaçadas de extinção, sendo que o comércio delas só é per- mitido em circunstâncias excepcionais. O segundo inclui espécies não necessariamente ameaçadas de extinção, cujo comércio deve ser controlado para evitar exploração incom- patível com a manutenção da viabilidade das populações selvagens. O terceiro, por fim, in- clui as espécies que são protegidas em pelo menos um país, com o objetivo de controlar o comércio auxiliado pelas partes da convenção. Para as espécies do Apêndice I, exige-se uma licença de importação emitida pela autorida- de do país importador. Além de uma licença prévia do país exportador, que tem a finalidade de informar as autoridades do país de importação que o animal tem origem compatível com a finalidade da transação, para munir este de informações prévias. Para as espécies incluídas no Apêndice II é necessária uma licença de exportação emitida pela autoridade do país de exportação. Para o Apêndice III, por fim, é emitido apenas um certificado. O comércio das espécies coletadas na natureza e incluídas nos apêndices da CITES só é possível ser regula- mentado e autorizado após uma avaliação sobre o impacto da atividade sobre a população selvagem da espécie, evitando assim que a venda afete o seu equilíbrio ecológico. Já para as espécies nascidas em cativeiro, este procedimento não é necessário, inclusive para as espécies listadas nos Apêndices I e II, sendo comercializadas sobre outra dinâmica, estabe- lecida no artigo VII, item 4, do texto da Convenção. Está previsto que os membros da Convenção se reúnam a cada dois ou três anos para exa- minar e avaliar o andamento da CITES, tomando medidas necessárias de ajustes ou reco- mendando medidas para melhorar sua eficácia. O comércio internacional monitorado pela CITES, entre 1995 a 1999, abrangeu cerca de 1.500.000 aves vivas, 640.000 répteis vivos, 300.000 peles de crocodilo, 1.600.000 peles de lagartos, 1.100.000 peles de cobras, quase 300 toneladas de caviar e mais de 1.000.000 fragmentos de corais. Historicamente, o Brasil é celebrado como umanação detentora de uma legislação am- biental avançada e satisfatória. Essa percepção foi construída mais por fatos isolados, que tive- ram uma grande repercussão na mídia, do que propriamente por uma análise mais criteriosa sobre a eficácia do arcabouço legal brasileiro. Entre os fatos que contribuíram para formar esse conceito da boa legislação, destaca-se a mUITO A REpENSAR Análise da atual legislação ambiental brasileira para fauna silvestre 24 promulgação da Constituição Federal de 1988. O Brasil foi uma das nações pioneiras ao dedicar um capítulo inteiro da Lei Maior ao meio ambiente. Grandes eventos ambientais, como a ECO-92, realizada na cidade do Rio de Janeiro, também contribuíram para dar um “ar progressista” ao nosso País. Some-se a esses fatos a postura diplomática do Brasil de nunca ter sido um grande empecilho na elaboração de acordos e tratados ambientais na comunidade internacional. De fato, a nação brasileira sempre se esforçou para dispor de instrumentos legais que fi- zessem jus a imensa riqueza biológica do País. Porém, nem sempre a boa intenção teve resultados práticos. Muito se perdeu – e continua se perdendo – na fragilidade jurídica que as próprias leis promovem. Grande parte da fragilidade em nossa legislação ambiental deve-se à nossa própria cultura burocrática, que busca internalizar dificuldades que objetivam muito mais dar um aspecto de rigor no controle do que propriamente ser efetiva nos resultados. A nossa legislação ambiental tornou-se um grande polvo que, por excesso de tentáculos e ventosas que a tudo se prende, não consegue mais se locomover. Se em tempos passados – como na Constituição de 88 – os debates para a construção de dispositivos legais ambientais ficavam restritos a grupos de especialistas e de poucos políticos com maior interesse no tema, hoje a realidade é outra. Com uma sociedade or- ganizada mais ativa e atenta, qualquer iniciativa no Congresso Nacional sobre o tema é acompanhada de perto e possui grande capacidade de despertar debates que podem se arrastar por anos, como foi o Código Florestal. No caso específico da fauna brasileira, a realidade é um pouco diferente. Por ainda não ser um tema que atraia fortemente o interesse de grupos econômicos, as iniciativas de normatização e regulação do setor ainda são restritas a um público menor, sem grande mobilização da sociedade civil e sem manchetes na grande imprensa. A fauna só ganha maior destaque quando algum aspecto econômico está em jogo, como no caso de re- gistros de patentes sobre princípios ativos ou a regulamentação sobre o uso do patrimô- nio genético da biodiversidade. Porém, mesmo nesses casos, os debates geralmente só conseguem alcançar um público mais especializado. Essa ausência de interesse sobre os temas que rodeiam os debates sobre a nossa fauna silvestre acaba por contribuir também para aumentar o distanciamento da sociedade so- bre o assunto. Como consequência, vemos surgir, cada vez mais, pequenos grupos mais ativos que tentam impor sua visão sobre os demais. Muitas vezes esses grupos baseiam suas convicções muito mais em argumentos ideológicos do que em análises técnicas, o que resulta no empobrecimento do debate e, consequentemente, produz instrumentos jurídicos deficientes. E as deficiências são muitas. Para um leitor menos atento, a Lei nº 9.605/98 – que entre outros temas tipifica os crimes contra a fauna – pode parecer à primeira vista uma legislação bastante robusta. Porém, ao 25 nos determos com mais afinco à sua leitura, podemos encontrar problemas graves, como o caso da não distinção entre um traficante contumaz da fauna silvestre daquele indivíduo que possui apenas um único exemplar obtido de forma ilegal. A lei, conforme está redi- gida, acaba por contribuir mais ainda para a fragilidade da punição, pois na incapacidade de se punir efetivamente aquele que comete o crime maior, deixa-se de punir a todos. É como se não existisse diferenciação entre um usuário de maconha e um grande trafican- te, ou ainda como se tratasse o receptador de um carro roubado como ladrão. São crimes distintos em nosso Código Penal, mas não em nossa legislação ambiental. Outro fator que contribui para enfraquecer a legislação ambiental está na aplicabilidade das penalidades. Todos os crimes ambientais no Brasil são passíveis de penas de reclusão de no máximo um ano. Já o nosso Código Penal diz que penas inferiores a quatro anos de deten- ção podem ser substituídas por penas alternativas, como a prestação de serviços à comuni- dade. Dessa forma, o criminoso ambiental nunca é punido efetivamente pela pena de reclu- são, o que aumenta a sensação de impunidade e contribui para a perpetuação dos crimes. As penas pecuniárias, como é o caso das multas aplicadas nos crimes contra a fauna, também não surtem o efeito desejado de inibir a prática criminosa, pois não representam nenhuma punição efetiva ao infrator ambiental, uma vez que elas não impactam em seu cotidiano. Um traficante de animais não tem o seu nome inscrito nos serviços de proteção ao crédito, como o SPC ou o SERASA. Na prática, o máximo que ele terá de dificuldade por não pagar a sua multa será ficar impedido de celebrar convênios com o Governo Federal. Some-se às dificuldades apresentadas anteriormente um outro grave problema: a regu- lamentação das leis. Uma lei precisa ser regulamentada. A lei diz o que pode, mas nem sempre diz como pode. É aí que entram as portarias, decretos, instruções normativas, re- soluções e outros instrumentos legais que vão orientar o cidadão no cumprimento da le- gislação. É nesse momento que a burocracia ganha força e a racionalidade perde espaço. Os gestores públicos responsáveis pela redação desses instrumentos legais nem sempre seguem o princípio que está na lei. Muitas vezes criam tantos embaraços jurídicos que acabam por deformar a própria lei que querem regulamentar. E o pior, como geralmente esses gestores ocupam cargos comissionados, ocorre uma rotatividade grande na fun- ção, o que gera novos instrumentos normativos. É nesse momento que a insegurança ju- rídica ganha força e os argumentos técnicos perdem espaço. Se entre os gestores federais ocorrem conflitos de competência na regulamentação – onde ministérios como o do Meio Ambiente e o da Agricultura vez por outra se contra- dizem –, não é difícil imaginar o caótico quadro que se instala quando somamos a essa situação os estados e os municípios. Esse excesso de instrumentos normativos cria um ambiente de desestímulo para quem maneja a fauna silvestre ou exótica, afasta investi- mentos e, por fim, faz aumentar a perda da nossa biodiversidade. O risco de o quadro acima mencionado piorar é real: com a Lei Complementar nº 140/11, que flexibiliza a gestão ambiental no País – dando mais autonomia aos estados e aos mu- nicípios, além do Distrito Federal – será necessária uma maior atenção por parte daqueles que lidam diretamente com a fauna silvestre e exótica. Esse agravamento pode se conso- 26 lidar em diversas frentes: na ausência de técnicos capacitados e experientes em manejo de fauna; na politização ou ideologização na condução do tema; ou ainda na criação de uma permanente dependência das diretrizes do antigo gestor nacional da fauna: o Ibama. A solução para esses impasses e dificuldades passa, necessariamente, pela consolida- ção da legislação ambiental pertinente ao tema num Código Nacional de Fauna Silvestre e Exótica, nos mesmos moldes de códigos e estatutos bem-sucedidos, como o do Consu- midor, do Idoso, da Criança e do Adolescente, entre outros. Somente com um instrumento legal com a força de um Código Nacional será possível eli- minar as discrepâncias e conflitos normativos e, acima de tudo, assegurar a tranquilidade jurídica necessária a quem se dedica na lida com a fauna silvestre ou exótica no Brasil. É tambémcom a criação de um Código Nacional de Fauna Silvestre e Exótica que podere- mos garantir a efetiva implementação dos acordos e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como a Convenção Sobre o Comércio Internacional da Fauna e da Flora Ame- açadas de Extinção (CITES) e da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), entre outras. Assim como nas demais atividades econômicas e sociais, a manutenção ou expansão do aparato burocrático só atende aos interesses daqueles que, munidos das canetas oficiais, enxergam nas dificuldades jurídicas uma oportunidade para o ganho fácil. Quem de fato tem a legítima, intenção de promover o uso sustentável e racional da biodiversidade bio- lógica brasileira não irá se opor ao reordenamento aqui proposto. Os danos causados à biodiversidade pela atual legislação ambiental brasileira é irrepará- vel. Essa legislação – por maior boa vontade que se tenha em reconhecer alguma eficácia em sua existência – não foi capaz de impedir que a nossa Lista de Espécies Ameaçadas passasse de 200, em 1998, para 600, em 2008, e que em 2014 alcançasse quase 1.200 espécies. Independente dos argumentos sobre a metodologia na elaboração da lista, o certo é que esses números só vêm aumentando. Se somos um dos poucos países do mundo a reconhecer constitucionalmente a impor- tância da conservação dos recursos naturais, também somos um país que não conseguiu equilibrar desenvolvimento com a conservação da biodiversidade. Apesar dos reconheci- dos ganhos de conscientização da sociedade brasileira sobre o tema, ainda estamos lon- ge de uma situação confortável, que nos permita garantir a manutenção da permanência das espécies silvestres in situ ou ex situ. 27 Conflitos legais que causam impacto nas políticas de conservação e manejo da fauna Case 01 É comum o uso de superlativos quando tratamos da biodiversidade brasileira. Temos a maior floresta tropical, a maior planície alagável, biomas extraordinários que, devido à sua variedade de ambientes, re- sulta no conjunto de uma das maiores diversidades biológicas do planeta. Apenas o Cerrado concentra quase dez tipos de fisionomias de vegetação, de matas a campos alagados. A conservação desse imenso patrimônio é um tema a ser discutido a partir dos impactos decorrentes das ações humanas. Porém, devido ao nosso modelo de ocupação do solo, voltado principalmente à produção agropecuária, mineração, urbanização e industrialização, o debate sobre a conservação vem perdendo espaço de for- ma expressiva, com ausência de ações efetivas para manter a biodiversidade brasileira. A extinção da fauna ainda ocorre pela retirada de espécies, que sofrem pressão do comércio ilegal. Fóruns internacionais, como a conferência da ONU que resultou na Convenção da Diversidade Biológica1 (CDB) e a CITES2 (Convenção Internacional sobre o Comércio de Es- pécies Ameaçadas), destacam a importância de direcionar esforços a favor da perpetuação das espécies, seja pela conservação de ambientes, pelo manejo de espécies invasoras ou pela criação em cativeiro de qualquer estratégia que permita a reprodução dos espécimes, principalmente das espécies mais ameaçadas, é um esforço bem-vindo e recomendado. Em resposta à CDB, o Decreto n° 4.339/023 determina o estímulo à implantação de criadouros e de políticas de apoio aos novos empreendimentos, visando agregar valor para a conser- vação e para o uso sustentável dos recursos biológicos e genéticos. Outras ações federais – como a política de desenvolvimento sustentável resultante das discussões da Agenda 21 ou a política nacional da biodiversidade – também consideram a criação e o desenvolvimento de cadeia econômica como uma estratégia para fomentar a conservação dos ambientes e das espécies. No entanto, desde 1967, a Lei nº 5.1974 determinou que todos os animais que viviam natu- ralmente fora do cativeiro eram propriedade do Estado e, portanto, com acesso controlado, sendo proibida a caça profissional, a captura, o comércio e a criação de qualquer espécie sil- vestre sem a devida autorização. Com a Constituição Federal de 1988, a natureza jurídica da fauna passou a ser considerada um bem difuso, ou seja, uma propriedade de todos, assim como os demais recursos ambientais. Isto alterou muitas estratégicas jurídicas e técnicas. Em 1998, a Lei de Crimes Ambientais criou restrições para o acesso a biodiversidade, e a Por- taria no 102/985 proíbe a manutenção de animais sem origem comprovada em residências, o que teve sua gravidade criminal aumentada através do Decreto no 6.514 de 19986, que definiu penas e valores das infrações cometidas contra a fauna. A retirada ilegal de material 1 CDB 2 CITES. 3 BRASIL. Presidência da República. Dec no 4.339. 4 BRASIL. Lei no 5.197. 5 BRASIL. Portaria no 102/98. 6 BRASIL. Dec no 6514/98. 28 Case 01 Case 01 biológico e a registro de patentes fora do País desencadeou uma discussão sobre a biopirataria, desta forma, as pesquisas científicas para o desenvolvimento tecnológico, realizadas por instituições bra- sileiras que necessitavam de acesso ao patrimônio genético e ao co- nhecimento tradicional, foram regulamentadas pela Medida Provisória no 2.186/017 e passaram a depender de autorização do Conselho de Ges- tão do Patrimônio Genético (CGEN) para serem realizadas. O Ibama, segundo as atribuições descritas no Decreto no 6.099/078, é responsável por executar os instrumentos das políticas de meio ambiente. Também é o órgão administrati- vo e científico designado para efetivar a CITES no Brasil, além das atribuições de fiscalizar e controlar os processos de acesso e uso do gigantesco patrimônio biológico brasileiro. No entanto, muitas destas atribuições foram repassadas para a responsabilidade dos estados do Distrito Federal e dos municípios, por meio da Lei Complementar no 140/11. Para regulamentar o setor, existem alguns instrumentos jurídicos e administrativos, como a IN no 1699 que orienta a criação de fauna silvestre nativa, estabelecendo critérios e compe- tências para as diferentes categorias de criadouros. O SisFauna é a ferramenta para cadastro de interessados em obter as autorizações prévia de instalação (AI) e de manejo (AM) para todas as categorias de criadores de fauna. A IN no 169 também definiu as finalidades dos Centros de Recuperação de Animais Silvestres para reintrodução e conservação da fauna e dos Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) que recebem animais provenientes de apreensão e entrega voluntária, e extingue a categoria de criadouros conservacionistas mantidos por pessoas físicas, transformando-os em mantenedores de fauna, que implica na impossibilidade de reproduzir seus animais. A Complementar no 140, de 2011,10 estabelece que as autorizações e licenças para novos empreendimentos que utilizem a fauna silvestre serão de responsabilidade dos estados e do Distrito Federal. No entanto, também estabelece que, na ausência de um órgão ambien- tal competente, as responsabilidades retornam à esfera federal. As normativas dificultam o encaminhamento das ações relacionadas à fauna e restringem enormemente as possibili- dade de reduzir as pressões sobre as espécies silvestres. Em resumo, muitas das situações apresentadas nos estudos de caso a seguir ilustrarão situações atuais que aguardam uma resposta urgente dos órgãos competentes, de forma a atender a demanda existente para o aproveitamento sustentável do grande potencial que a fauna silvestre possui. O bom funcionamento do SisFauna deveria ser a base para aliviar a pressão da coleta ilegal, viabilizar o repovoamento de ambientes que têm seu ritmo de degradação crescente em todos os biomas brasileiros e, em última análise, facilitar a conservação, garantindo a reno- vação de licenças, avaliação de novos pedidos, fiscalização dos estabelecimentos, análises de mercado e fortalecendo ações de gestão e manejode fauna. No entanto, o sistema não permite acesso aos cadastros e os criadores reclamam da perda de dados e da inoperância 7 BRASIL. MP no 2.186 8 -BRASIL. Dec no 6.099/07 9 Ibama. Institui e Normatiza as Categorias de Uso e Manejo da Fauna Silvestre em Cativeiro em Território Brasileiro. Instrução Normativa nº 169, de 20 de fevereiro de 2008. 10 BRASIL. Presidência da República. Lei Complementar no 140, de 8 de dezembro de 2011. 29 Case 01 Case 01 desta ferramenta. Dos mais de cinco mil criadores registrados no SisFauna, cerca de 75% não tem autorização de manejo, muitos cria- dores antigos estão distribuindo seus plantéis por dificuldade em mantê-los e por não conseguirem autorização para reprodução dos animais sob a sua tutela. Os usuários criticam a descontinuidade do sis- tema que não permite acessar estatísticas e cadastros dos produtores de fauna silvestre e não promove nenhuma integração com a esfera estadual e municipal, além de não desenvolver qualquer estratégia de manejo e reprodução, deixando uma lacuna nas atividades de conservação da fauna silvestre. A enorme biodiversidade brasileira, com seus endemismos e dados biológicos pouco estu- dados, aliados a um sistema sobrecarregado pelas demandas desenvolvimentistas do País tem direcionado políticas e instrumentos para restrição ao acesso e uso da biodiversidade brasileira. Os interessados na criação legal de exemplares da fauna silvestre têm sido igno- rados em suas demandas, com decisões que se arrastam, pendentes, às vezes por mais de décadas. Isso impede o desenvolvimento de toda uma cadeia produtiva que se dedica no desenvolvimento de novos negócios e na produção de bens e tecnologias. O mercado, se estimulado, geraria um percentual para a conservação de áreas para as espécies ameaçadas, colaborando inclusive para diminuir a retirada ilegal de animais tanto para o tráfico quanto para a caça predatória. A adoção de medidas econômicas que diminuam a pressão sobre a fauna silvestre é uma das ferramentas para a reestruturação de populações de vida livre. As técnicas de manejo, os incentivos governamentais e o melhor aproveitamento dos recursos faunísticos deve- riam resultar em benefícios, apoiando a conservação em cativeiro como instrumento de conhecimento que permita o manejo e viabilize a utilização sustentável da fauna silvestre. Esse modelo tem sido adotado em muitos países, para grupos taxonômicos diversos, e tem sustentado financeiramente programas de conservação em áreas naturais preserva- das, que permitem a sustentabilidade das espécies também na natureza. 30 A pendência da Lista Pet e os prejuízos para o manejo da fauna silvestre no Brasil Case 02 Uma série de normativas mal-elaboradas, sobre o ma- nejo e o uso da fauna silvestre impedem o acesso à grande parte do patrimônio biológico do País. Parado- xalmente, os incentivos voltados à produção de espé- cies exóticas para uso doméstico ou de seus subprodu- tos só tende a crescer, facilitando a disseminação de doen- ças e a introdução de espécies invasoras que desequilibram a fauna nativa. No contraponto, países como a Holanda, os Estados Unidos, a Alemanha e vários outros reproduzem em seus territórios mais espécies da fauna brasileira do que as autorizadas para serem criadas em território nacional, movimentando um co- mércio de milhões de dólares, sem que nenhum recurso retorne ao Brasil para a con- servação dos exemplares da nossa biodiversidade. São 287 espécies de aves brasileiras comercializadas legalmente no mercado internacional, enquanto que no País temos apenas 185 espécies liberadas para a reprodução em cativeiro. A IN no 15/101 ainda tentou reduzir para 20 espécies de passeriformes silvestres passíveis de criação no Bra- sil. E quando tratamos de répteis e anfíbios, o comércio internacional oferece 166 espé- cies brasileiras, mas em nosso território só podemos reproduzir legalmente 6 espécies, e a proposta é reduzir para apenas duas. São encontradas 67 espécies de mamíferos brasileiros sendo criadas no exterior; no Brasil, são autorizadas apenas 22 espécies. A intenção do Ibama é de proibir a criação para todos os mamíferos2. O comércio legal internacional de papagaios, araras, saguis, serpentes e até mesmo de invertebrados brasileiros, reproduzidos em criadouros em condições que se atentam para o bem-estar animal e tecnologias que simulam o ambiente natural da espécie mesmo em regiões frias, tem movimentado o mercado pet internacional. A cadeia pro- dutiva vai desde a alimentação mais apropriada, passando por estruturas e recintos cli- matizados, até medicamentos adequados a cada animal, de maneira a garantir a repro- dução em cativeiro. O processo de regulamentação e controle faz com que o comércio legal seja de qualidade distinta do mercado clandestino, inviabilizando a presença de animais debilitados e doentes como acontece na venda ilegal. 1 Ibama. Institui e Normatiza as Categorias de Uso e Manejo da Fauna Silvestre em Cativeiro em Território Brasileiro. Instrução Normativa nº 15, de 22 de dezembro de 2010; 2 Casedf. 31 Case 02 A Instrução Normativa n° 163/083 determina que as espé- cies silvestres passíveis de criação sejam definidas por meio da Lista Pet que, segundo a Resolução no 394/074 do Conama, deveria ter sido publicada até o início de 2008. Em abril de 2015 foi publicada a Instrução Nor- mativa n° 07/15, que revogou a IN n° 169/08, cujo ob- jetivo é normatizar as categorias de uso e manejo da fauna silvestre em cativeiro. Na visão dos pesquisadores e mantenedores da fauna, esta normativa é um verdeiro desastre do ponto de vista da conservação, pois criou a cate- goria “mantenedor conservacionista”, mas proibiu a reprodução das espécies em cativeiro. O desestímulo ao uso sustentável de fauna silvestre tem se tornado uma conduta cada vez mais frequente dentro dos órgãos ambientais, resultando num empecilho quan- do tratamos de desenvolvimento econômico. Programas de manejo diferenciados, de acordo com o bioma ou o grupo taxonômico, são escassos, baseado muito mais em aspectos ideológicos do que técnicos. Porém, isso acontece em meio a falta de esclare- cimento sobre os limites legais que regulem a produção e o uso das espécies silvestres como subsídio ás ações de conservação da fauna. A falta de definição da Lista Pet tem desestimulado os empreendimentos que traba- lham legalmente com a fauna silvestre e incentivado ainda mais o comércio ilegal, justamente por não ter estabelecido os meios para a regularização do uso deste im- portante recurso. 3 Ibama. Institui e Normatiza as Categorias de Uso e Manejo da Fauna Silvestre em Cativeiro em Território Brasileiro. Instrução Normativa nº 169, de 20 de fevereiro de 2008; 4 Conama Res no 394/07. A fiscalização ambiental no Brasil sempre foi alvo de críticas. Desorganização de um lado e truculência de outro ajudam a compor a ima- gem de uma atividade que não consegue aten- der, a contento, as obrigações de zelar e pro- teger os recursos naturais brasileiros. E o que torna mais caótico os serviços públicos de fis- calização ambiental no país não é – ao contrá- Um COmBATE EQUIVOCADO A falta de clareza nos objetivos e a divisão irracional de trabalho entre os vários órgãos impedem uma fiscalização ambiental eficaz no País 33 rio do que se propaga – a falta de recursos financeiros e humanos. O que falta é diretriz e competência gerencial. O número de agentes ambientais que atuam na fiscalização não é pequeno. Só a Polícia Ambiental do estado de São Paulo possui um efetivo de quase dois mil soldados. Servido- res dos órgãos ambientais federais – como Ibama e ICMBio – somam-se a um considerável contingente dos órgãos públicos estaduais e, em muitos casos, municipais. Sem contar que outros entes públicos por vezes atuam, participam oucontribuem diretamente com a fisca- lização ambiental, como é o caso das Forças Armadas e do Departamento de Polícia Federal. No âmbito federal, a principal instituição pública voltada para o controle e a fiscalização ambiental, particularmente sobre a fauna silvestre e exótica, é o Ibama. Essa instituição é constantemente alvo de denúncias envolvendo esquemas de corrupção e mau uso do dinheiro público, além de constantes relatos de abuso de autoridade e ações midiáticas com o claro objetivo de demonstrar um serviço que a realidade sempre desmente. Cabe ressaltar aqui que os agentes de fiscalização do Ibama (e dos demais órgãos fede- rais que atuam na fiscalização ambiental), em sua grande maioria, são profissionais dedi- cados e comprometidos com a honradez que a função lhes impõe. Porém, esses mesmos funcionários – quase sempre – são vítimas de um comando incompetente, inoperante e incapacitante. Eles sempre são misturados ao pequeno, mas, barulhento, joio, constituído principalmente por servidores que ultrapassam o limite da ética e da civilidade, ao perse- guirem – com armas em punho – pequenos infratores ambientais, ou ainda quando atuam de forma a afrontar a legislação vigente, colocando suas convicções pessoais acima da função de Estado. Cabe salientar ainda que, no Brasil, é prática comum da fiscalização ambiental se concen- trar no varejo, no pequeno infrator, enquanto que o crime ambiental das grandes corpora- ções ou das quadrilhas organizadas seguem quase sempre sem incômodo. No caso da fauna silvestre brasileira, a situação é alarmante. O tráfico de animais silves- tres, por exemplo, continua sendo uma atividade presente no País. Pontos tradicionais e conhecidos de venda ilegal de animais silvestres operam sem grandes problemas, como é o caso de feiras livres em diversas cidades brasileiras. Porém, nada retrata mais fielmente a falência da ação fiscalizatória do Ibama do que a Internet. Basta algumas horas de “navegação” na rede para constatar uma grande quantidade de comércio ilegal envolvendo a fauna silvestre. Nas redes sociais não é incomum a presença de grupos específicos, atuando nessa atividade criminosa virtual. Os anúncios de com- pra e venda ilegal – muitas vezes explicitamente informando tal situação – proliferam em chats, bate-papos e listas de discussão. Tudo feito às claras, sem demonstrar a menor preocupação com a aplicação da lei. Tal segurança dos criminosos ambientais virtuais se alimenta do descaso e da imobilidade do Ibama. Frequentemente também se nota o silêncio do Ibama quando situações envolvendo animais silvestres – com grande repercussão nas redes sociais – em nada resultam. Um exemplo que aqui pode ser citado é o caso de um vídeo onde uma onça foi morta com um remo quando tentava atravessar um rio. Mesmo com milhares de compartilhamentos e 34 diversos apelos na Internet, até o presente momento a “inteligência fiscalizatória” da ins- tituição não mostrou resultados. Como esses, são inúmeros outros casos. Porém, tamanha passividade do Ibama não se faz presente junto aos criadores de fauna silvestre autorizados pela instituição a funcionarem no país. Comerciais ou domésticos, os criadores são alvo de constante, intensa e minuciosa ação fiscalizatória. A atuação do Ibama nesses estabelecimentos é permanentemente alvo de denúncias e críticas fun- damentadas pelos criadores. Simples infrações administrativas são sumariamente toma- das como crime ambiental, ao contrário do que preza a legislação vigente. Os excessos são frequentes e torna-se cada vez mais comum a ocorrência de casos que extrapolam o bom senso (ver box). Tamanho empenho fiscalizatório talvez seja explicado pelo fato dos mantenedores legais possuírem endereço fixo e CPF/CNPJ registrado junto ao órgão, ao contrário dos que comercializam ilegalmente animais na Internet e feiras livres. Esses últimos devem dar muito trabalho. Nos demais órgãos federais, o único a manter um sistema de inteligência eficiente é o Departamento de Polícia Federal, que prioriza a sua atuação na desarticulação de qua- drilhas especializadas no comércio ilegal da biodiversidade. O ICMBio – a quem está en- tregue a responsabilidade pela fiscalização dos parques nacionais brasileiros – a situação não é diferente. Apesar de ser uma instituição com um quadro insuficiente de agentes de fiscalização ambiental, a atuação do ICMBio poderia ser amplificada, por meio de termos de cooperação com outras instituições públicas, como as Forças Armadas. Infelizmente, desde que foi criado, a direção do órgão vem insistindo numa política de gestão que re- lega as áreas de proteção ambiental ao mais completo abandono, transformando-as em áreas abandonadas, em ilhas entregues à própria sorte. O Brasil ainda está muito longe de alcançar um estágio efetivo de combate às ilicitudes ambientais. Falta ao País uma estratégia de fiscalização que tenha por base a inteligência e a capacidade de efetivar um rigoroso e necessário controle sobre as atividades que direta ou indiretamente incidem sobre patrimônio faunístico brasileiro. Falta ao País o compro- misso – de grande parte dos gestores públicos que comandam a fiscalização ambiental no país – com a eficiência. Os passarinhos e a multa de R$ 28 milhões Braz Anastácio da Silva tem 60 anos e mora no município paulista de Moji das Cru- zes. Ele foi um dos pioneiros na criação comercial de passeriformes no Brasil. Entu- siasmado com a possibilidade de criar e reproduzir curiós, sua antiga paixão, em 2001 ele obteve a licença para implantar um criadouro dessa espécie em sua cidade. Durante 10 anos, o negócio do senhor Braz foi um sucesso. Reproduziu os pássaros e os comercializou seguindo a orientação que lhe foi repassada pelo Ibama. Ao longo desse tempo, surgiram diversas modificações nas normas do Ibama que regulamenta- vam a atividade desenvolvida por ele. Em 2008, o Ibama requisitou todas as Notas Fis- ì 35 cais por ele emitidas desde que começou a sua criação. Foram 1.300 documentos. O órgão ambiental lhe devolveu as Notas Fiscais após algum tempo e informou que elas não estavam de acordo com as normas vigentes. Decidiu então o Ibama aplicar- lhe uma multa de 10 mil reais sobre cada documento, totalizando um boleto para ser quitado no valor de 13 milhões (Figura 1). Hoje, a dívida de Braz com a União, corrigida monetariamente, alcança a inacreditável soma de 28 milhões (Figura 2). Braz é um homem simples. Sua vida virou um caos. Não pode sequer ter uma conta bancária. Chegou a ter R$ 14 sequestrados de uma conta que lhe pertencia para pa- gar a dívida com o Governo era a soma total do que possuía no banco. Ele segue sua vida, tentando sobreviver. Tentando imaginar como sua situação che- gou a tal ponto. Ele não cometeu nenhum crime ambiental. Não capturou animais na natureza. Talvez possa – por descuido ou falta de orientação – ter cometido alguma infração administrativa. Hoje lhe resta um pesadelo: conseguir quase R$ 30 milhões para se livrar de uma tormenta. Figura 1 Figura 2 ì 36 Um incentivo legal ao tráfico de animais O Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) aprovou em 2013 a Resolu- ção nº 457, com o apoio do Ibama e da Polícia Ambiental do estado de São Paulo. Tal instrumento legal incentiva o tráfico de animais silvestres no país, uma vez que abre a possibilidade para que o infrator ambiental – que adquiriu um exemplar da fauna na- tiva ilegalmente – permaneça com a posse do animal. Segundo alegações do Ibama e da Polícia Ambiental do estado de São Paulo, a iniciativa visava contribuir com os órgãos de fiscalização, uma vez que eles encontravam dificuldades para destinar os animais apreendidos. Com a Resolução nº 457 foi instituída a figura dos Termos de Guarda de Animal Silvestre (TGAS) e Termo de Depósito de Animal Silvestre (TDAS). Segundo o coronel Nomura, comandanteda Polícia Ambiental paulista, a Resolução 457 é “a melhor alternativa para salvaguardar a vida de milhares de animais silvestres sem locais de destinação”. De acordo com o modelo de raciocínio do comandante, ninguém deveria ser preso no Brasil, uma vez que faltam vagas no sistema prisional. Ou ainda, caso o pátio do Detran fique lotado, o melhor é deixar os veículos furtados com os meliantes. ì Em SINTONIA COm O mUNDO Gabriela G. B. Lima Advogada e Professora da UNB. ì A eficácia jurídica do combate ao comércio ilegal de fauna, flora e dos recursos genéticos à luz do direito internacional: a CITES, a CDB e o protocolo de Nagoia A colaboração formalizada e regulada entre os países é um dos elementos essenciais no combate ao tráfico de fauna e flora no âmbi- to mundial, atividade esta que pode se servir tanto das espécies e espécimes obtidos da fauna e da flora como do comércio ilegal de suas informações genéticas. Esta cooperação internacional permite harmonizar a forma de controle e de coibição desse tipo de prática por 38 meio de ação conjunta, potencializando a sua inibição e, consequentemente, a proteção ambiental. O direito internacional constitui-se como o âmbito para as nações buscarem a cooperação na resolução de um problema comum, sendo que, no que diz respeito ao comércio ilegal de fauna e flora, três convenções merecem destaque: a Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies de Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (do inglês CITES1), a Convenção de Biodiversidade (CDB) e o Protocolo de Nagoia. A CITES diz respeito ao comércio da fauna e da flora, enquanto que no âmbito da CDB e do Proto- colo, importa observar a proteção da biodiversidade e a coibição da biopirataria (comércio irregular dos recursos genéticos). Esclarecer a eficácia jurídica2 de cada uma delas e a sua relação com este tipo de atividade é fundamental para a percepção de estratégias esta- tais e não estatais na sua coibição. As convenções mencionadas integram o direito internacional ambiental e correspondem a diferentes acordos entre os países, com o intuito de organizar e harmonizar regras em torno de um problema ou situação cujos efeitos repercutem entre eles de modo interde- pendente. De modo geral, impõem obrigações internacionais que cabem aos Estados- membros implementar no momento em que se tornam normas vigentes. A fim de com- preender a sua relação com o combate ao tráfico de fauna e flora e à biopirataria, analisa- se a seguir cada uma delas. É claro que para a efetividade da proteção ambiental não basta apenas o entendimento do direito respectivo; outros aspectos, como a participação de organizações não governa- mentais, conscientização social, responsabilidade social das empresas, entre outros, são igualmente fundamentais. No entanto, focaliza-se aqui para o estudo da colaboração do direito internacional na proteção ambiental, a partir das normas acima mencionadas que norteiam as ações estatais em sua relação ao âmbito nacional, além de contarem com a colaboração de outros atores sociais para a sua efetividade. Cada uma dessas normas possui instrumentos específicos que construíram diferentes estruturas de eficácia jurídi- ca do combate ao tráfico de fauna e flora. Assim, o presente artigo visa colaborar com os estudos acerca do combate ao comér- cio ilegal a partir do entendimento do modo como a CITES1, a CDB e o Protocolo de Na- goia2 regulam a proteção ambiental associada ao tráfico de fauna e flora, vislumbrando-se como tais convenções ajudam a montar estratégias governamentais e não governamen- tais também na coibição desse tipo de atividade. 1 Do ingês: Convention On International Trade Of Endangered Species. Disponível em: www.cites.org. Acesso em: 17 nov. 2014; 2 Por eficácia jurídica entende-se a qualidade das normas de produzir a proteção pretendida. Difere-se de efetividade jurídica, que consiste no seu cumprimento propriamente dito. MALJEAN-DUBOIS, Sandrine, La mise en oeuvre du droit international de l’environnement, IDDRI. Analyses, Gouvernance Mondiale, n° 03/03, p. 23; BARROSO, Luís Roberto, “Interpretação e Aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora”, 5. ed, Editora Saraiva, 2003, p. 247.; VARELLA, Marcelo Dias, A efetividade do direito internacional ambiental: análise comparativa entre as convenções da CITES, CDB, Quioto e Basiléia no Brasil. In: BARROS-PLATIAU, Ana Flávia; VARELLA, Marcelo Dias (orgs.), A efetividade do direito internacional ambiental, Brasília: UNICEUB, UNITAR e UnB, 2009, p. 34-35. 39 1. A CITES e o comércio de fauna e flora em ameaça de extinção O âmbito jurídico regulado pela CITES é o comércio internacional de fauna e flora em ameaça de extinção. As regras de proteção são mais rígidas conforme o grau de ameaça de extinção, percebido pela divisão das espécies em três anexos à Convenção, estes que enquadram nas categorias de maior ameaça, com ameaça mediana e com pouca ameaça de extinção3. De modo estratégico, ela coíbe o comércio ilegal na medida em que orienta a regulamentação e a construção de um comércio legalizado. Essa legalização é feita pela obrigação dos Estados de implementarem em seus âmbitos nacionais um processo de licenciamento que depende de certificados atestando a procedência regular, o transporte não prejudicial à espécie e o caráter não prejudicial daquela comercialização à sobrevivên- cia da espécie4. Os Estados devem ainda garantir a presença de mecanismos nacionais de coibição do comércio ilegal, bem como o retorno da espécie ou espécime irregular ao país de origem5. A verificação internacional do cumprimento da convenção é feita por relató- rios periódicos6 do Estado ao Secretariado da Convenção e discutido nas Conferências das Partes (COP). Nesse sentido, a Convenção visa regular o comércio de fauna e flora, identificando o grau de ameaça de extinção para os quais processos específicos de licenciamento devem ser garantidos pelos Estados-membros. São mecanismos de controle da convenção: licen- ciamentos, pareceres, certificações, relatórios e mecanismos nacionais de coibição da atividade ilegal. Como convenção internacional cuja implementação depende da sua internalização nos âmbitos nacionais dos Estados-membros, a análise da efetividade da convenção se dá justamente pelo estudo da forma como foi internalizada e tem sido aplicada no campo na- cional. Nesse raciocínio, com o intuito de compreender como se dá a estrutura da conven- ção na sua relação com o combate ao tráfico de fauna e flora, esclarecemos, aqui, primeiro os aspectos formais de criação e de validade jurídica da convenção no plano internacional e nacional, com foco para a sua aplicação no Brasil. Após análise dos aspectos formais, verificam-se quais as principais obrigações estatais na sua relação com os elementos de controle apresentados pela convenção. A CITES surgiu dos primeiros esboços apresentados em 1963, na 7ª Assembleia Geral da União Mundial para a Conservação da Natureza (IUCN)7, e em 1972 teve o seu projeto ra- tificado por uma recomendação, na Conferência de Estocolmo. Foi finalmente celebrada 3 Estão no anexo I espécies à beira extinção que possam ser afetadas pelo comércio internacional e a sua comercialização somente é permitida em circunstâncias excepcionais. O anexo II inclui espécies que não estão em alto risco de extinção, mas sua comercialização deve ser regulamentada a fim de evitar que esse risco ocorra, e no anexo III estão as espécies protegidas em pelo menos um país-membro, que busca a cooperação das outras partes para assistência no controle do mercado de tais espécies. 4 Conforme artigos III, IV e V da Convenção. “CITES”. Disponível em: http://www.cites.org/eng/disc/text.php#IX . Acesso em: 18 nov. 2014. 5 Conforme o item 1 do artigo VIII da Convenção.“CITES”. Disponível em: http://www.cites.org/eng/disc/text.php#IX . Acesso em: 18 nov. 2014. 6 Conforme o item 7 do artigo VIII da Convenção. “CITES”. Disponível em: http://www.cites.org/eng/disc/text.php#IX . Acesso em: 18 nov. 2014. 7 Do inglês: The World Conservation Union. Disponível em: http://www.iucn.org/. Acesso em: 17 nov 2014. 40 em 1973, em Washington, com a participação de 88 países8. Atualmente, a convenção possui 180 Estados-membros9. O Brasil aderiu à convenção em 1973, e foi formalmente inserida na legislação quando da sua ratificação, em 24 de junho de 1975, pelo Decreto Legislativo nº 54, promulgado pelo Decreto nº 76.623, de 1975, entrando em vigor 90 dias após o ato. A sua ratificação e promulgação se deram nos moldes constitucionais10, legitimando a sua validade formal11: o Presidente da República promulgou a CITES, para que fosse a Convenção executada e cumprida, nos termos em que foi concluída, havendo o Congresso Nacional aprovado pelo Decreto Legislativo nº 54. A Convenção entrou em vigor para o Brasil em 04 de no- vembro de 1975. A implementação de seus termos foi aprimorada somente em 2000, pelo Decreto nº 3.60712. Dentre as obrigações estatais da convenção destaca-se a necessidade de designar ór- gãos nacionais de controle administrativo e científico13 para liderarem no plano nacional, a regulamentação do comércio de fauna e flora em ameaça de extinção. Dentre as prin- cipais obrigações da autoridade administrativa estão o encaminhamento ao Secretariado da CITES, dos relatórios periódicos atestando o cumprimento da convenção. Além disso, exige-se o emprego de um processo de licenciamento que garanta o controle da proce- dência regular dos espécimes das espécies presentes na CITES. A autoridade científica, por sua vez, é responsável pela emissão de pareceres sobre se determinada exportação é ou não prejudicial à sobrevivência da espécie, recaindo sobre as espécies incluídas nos anexos I e II da Convenção. São pareceres que subsidiam a decisão da autoridade admi- nistrativa14. Estes são os elementos da eficácia jurídica da convenção. No Brasil, a competência administrativa foi designada ao Instituto Brasileiro do Meio Am- biente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e a competência científica corres- ponde aos trabalhos do Jardim Botânico (RJ), do Instituto Chico Mendes de Conserva- ção da Biodiversidade (ICMBio) e também do próprio Ibama.15 No ICMBio, por exemplo, há Centros de Pesquisa que auxiliam nos respectivos estudos de sobrevivência das es- pécies. Para a fauna, existem, por exemplo, o Centro de Pesquisa para a Conservação de Aves Silvestres (Cemave), o Centro de Conservação de Manejo de Répteis e Anfíbios (RAN), o Centro Nacional de Conservação e Manejo das Tartarugas Marinhas (Tamar), en- tre outros.16 Para a flora, se destacam o Laboratório de Produtos Florestais (LPF), Centro Nacional de Apoio ao Manejo Florestal, entre outros.17 8 Ibama. Plano de Ação GT-CITES. Brasília, 2005. p. 03-04. 9 CITES, “What is CITES?”, Disponível em: http://www.cites.org/eng/disc/what.php . Acesso em: 18 nov 2014. 10 No Brasil, é previsto constitucionalmente que a ratificação de tratados que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional depende da aprovação do Congresso Nacional, mediante Decreto Legislativo, e após a ratificação, o tratado será promulgado, que é ato privativo do Presidente da República, e por fim, publicado no Diário Oficial da União, tornando-se válido e executável, com força de lei nacional. 11 Torna-se ato perfeito, cumprindo todas as suas etapas para a sua existência jurídica, estando apto a produzir efeitos. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 26ª edição, São Paulo, Editora Atlas, 2012, p.232. 12 Alterações anteriores foram feitas pelo Decreto Legislativo nº. 35, em 1985, e tal alteração promulgada pelo Decreto nº 92.446, de 07 de março de 1986. 13 Conforme o artigo IX da Convenção. “CITES”. Disponível em: http://www.cites.org/eng/disc/text.php#IX . Acesso em: 18 nov. 2014. 14 Ibama. “CITES”. Disponível em: http://www.ibama.gov.br/servicos/cites. Acesso em: 18 nov. 2014. 15 Ibama. “CITES”. Disponível em: http://www.ibama.gov.br/servicos/cites. Acesso em: 18 nov. 2014. 16 Ibama. plano de Ação GT-CITES. p. 01-17.Brasília, 2005, p.08. 17 Ibama. plano de Ação GT-CITES. p. 01-17.Brasília, 2005, p. 08-09. 41 O empresário que desejar comercializar produtos de fauna e flora deve obediência às nor- mas acima elencadas, comprovada por meio dos registros, licenças, autorizações e cer- tificados perante a Administração Pública. A procedência dos espécimes é garantida pela sua origem de criadouros, no que diz respeito à fauna, e pela origem vinda de laboratórios e de produtos florestais regularizados, no que concerne à flora. A existência dos criadou- ros é previsto na Lei de Proteção à Fauna (Lei no 5.197/67), na Lei de Crimes Ambientais (Lei no 9.605/98) e no Decreto no 3.179/99, que proíbem, ainda, a retirada direta do habi- tat. Os criadouros foram a forma encontrada para se possibilitar a existência desse tipo de comércio, ao mesmo tempo em que se garante a sobrevivência das espécies. Atualmente existe um sistema eletrônico de gestão e controle de empreendimentos en- volvidos com o manejo da fauna silvestre em cativeiro, tais como os criadouros, zoológi- cos, centros de triagens, entre outros. Trata-se do Sistema Nacional de Gestão da Fauna Silvestre (SisFauna), pelo qual há o cadastro dos empreendimentos, acompanhamento do procedimento de autorização e a própria emissão da autorização das atividades18. A au- torização oriunda desse procedimento de licenciamento19 é competência estadual, nos termos da Lei Complementar no 140/1120, cabendo auxílio federal subsidiário21, caso seja solicitado diante da falta de condições estaduais para o procedimento. O empreendedor que deseja participar desse tipo de comércio deve ter o seu estabele- cimento licenciado pelo SisFauna, uma vez registradas e verificadas todas as exigências para o projeto do criadouro, da sua instalação, do seu funcionamento e comércio, pode adquirir a autorização de funcionamento. Esse documento será essencial para demons- trar a procedência das espécies. Assim como na fauna existe o SisFauna, para a flora existe o Documento de Origem Flo- restal (DOF), que funciona integralmente de forma eletrônica. Na verdade, a passagem para as vias eletrônicas foi uma estratégia contra o crime organizado, que se especializara em falsificar e comprar guias de papel do antigo sistema para o comércio ilegal de madei- ras e de carvão vegetal, principalmente22. Os criadouros de animais da fauna silvestre exótica com fins econômicos e industriais são regulados pela Portaria no 102/98. Há também a Portaria no 118/97, que regulamenta 18 Ibama. Autorização de empreendimentos utilizadores de fauna silvestre. Disponível em: http://www.ibama.gov.br/servicos/ autorizacao-de-empreendimentos-utilizadores-de-fauna-silvestres-sisfauna 19 É preciso ter em mente uma diferença entre a Autorização e a Licença, pois são vocábulos presente no Direito Administrativo e no Direito Ambiental, mas que podem possuir consequências distintas. A Autorização como ato administrativo é ato precário e discricionário, ou seja, a Administração Pública pode autorizar de acordo com a conveniência e oportunidade da situação, podendo retirar a autorização também por conveniência e oportunidade, já que é ato precário. A Licença é ato administrativo vinculado, não há que se falar em discricionariedade, proporcionando maior segurança jurídica à pessoa beneficiada. Esse é o entendimento no Direito Administrativo. Em Direito Ambiental, contudo, é preciso averiguar qual a intenção que o legislador quis colocar para aquele ato, pois o processo de licenciamento dos criadouros parece adquirir aspectos dediscricionariedade, se a Administração entender que podem prejudicar a sobrevivência das espécies. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 26ª edição, São Paulo, Editora Atlas, 2012, p. 234. 20 Antes da Lei Complementar no 140 de 2011, a competência era federal, concentrada no Ibama. Portanto, para empreendimentos mais antigos, a licença era federal. 21 Conforme o artigo 2, III e o artigo 16 da Lei Complementar n° 140 de 2011. Conforme aponta Curt e Terence Trennepohl, até que os órgãos estaduais assumam integralmente a competência que lhes foi delegada pela Lei Complementar no 140/11 o Ibama continuará com o papel de mantedor da fauna silvestre em cativeiro. TRENNEPOHL, Terence; TRENNEPOHL, Curt. Licenciamento Ambiental. 5ª edição. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2013, p. 156. 22 AMADOR, Rubens; SATO, Sandra; MOTTA, Luiz da. DOF: O big brother do transporte florestal. Revista Ibama. Brasília: Ano II – no 02. p. 28-31. 42 criadouros de animais da fauna silvestre brasileira, seus produtos e subprodutos voltados para fins comerciais e industriais. O comércio de animais vivos abatidos, partes e produtos oriundos de criadouros, com finalidades econômica e industrial, são regulados pela Porta- ria no 117/97 e pela Portaria no 93/98. Esta última dispõe sobre importação e exportação de espécimes vivos, produtos, subprodutos da fauna silvestre e exótica brasileira. Destacam-se ainda a Instrução Normativa nº 02, de 2001, que trata da obrigatoriedade na identificação individual de espécimes da fauna para fins de controle de criação e comércio. Para os recursos pesqueiros, destacam-se a Instrução Normativa nº 56/04, que estabelece normas para utilizar peixes ornamentais marinhos, e Instrução Normativa nº 13/05, que visa as regras para a utilização de peixes ornamentais de águas continentais. Para a flora existe a Portaria nº 112/85, que regulamenta a coleta, transporte, comerciali- zação e industrialização de plantas ornamentais, medicinais, aromáticas ou tóxicas, a Por- taria nº 83/96, que trata da exportação de produtos e subprodutos oriundos da flora bra- sileira, e a Instrução Normativa nº 03/04, que estabelece procedimentos para a emissão de licenças CITES. No que se refere à comercialização, buscou-se fortalecer o sistema de registro das espécies e espécimes envolvidos, que é a própria garantia da legalidade do respectivo recurso. Além da regulamentação da origem das espécies pela constatação da regularidade dos empreendimentos, é preciso uma licença específica quando se trata das espécies elen- cadas na CITES, cuja competência permanece como sendo federal, junto ao Ibama e de- pende ainda do cadastro respectivo23. A outra esfera de implementação da CITES consiste na disposição de mecanismos de coibição do tráfico. Importante esclarecer que “tráfico”, nomenclatura utilizada para falar do comércio ilegal, não é em si um crime tipificado, consistindo na junção de diferentes crimes e contravenções penais. Para o infrator, constitui crime matar, caçar, apanhar, uti- lizar, transportar espécimes da fauna silvestre sem a devida permissão, licença ou autori- zação da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida, conforme o artigo 29, da Lei nº 9.605/98. A pena é de detenção de 6 meses a 1 ano ou multa, devendo ser agravada caso se trate de espécie em ameaça de extinção. Há ainda o crime de maus-tratos, no artigo 32, cuja pena é de detenção de três meses a um ano e multa, aumentada de um sexto a um terço, caso ocorra a morte do animal. De um ponto de vista crítico, não parece ser uma pena proporcional às repercussões das consequências desse tipo de crime, já que a ameaça criada pela conduta afeta diretamente o equilíbrio na qualidade de vida terrena, haja vis- ta ser esta uma das funções da biodiversidade caracterizada pela variedade de espécies da fauna e da flora. De toda forma, além do crime tipificado, tais condutas se enquadram como infrações administrativas conforme Decreto nº 6.514/08. Algumas ações governamentais que buscaram melhorar a efetividade da proteção das espécies em ameaças de extinção, além das acima elencadas, consistem em capacita- 23 Ibama. Licença para importação e exportação de flora e fauna CITES e não CITES. Disponível em: http://www.ibama.gov.br/ perguntas-frequentes/licenca-para-importacao-e-exportacao-de-flora-e-fauna-cites-e-nao-cites . Acesso em: 04. Nov. 2014. 43 ções dos servidores públicos. Capacitações para lidar com a gestão desse tipo de ativida- de ao buscar setorizar um sistema próprio para as licenças CITES. Além disso, cursos com os servidores das entidades administrativas, científicas e com a Polícia Federal foram fei- tos para capacitá-los a identificar as espécies CITES no momento da fiscalização. A ação conjunta com a Polícia Federal é essencial, já que são as fronteiras os principais focos para o comércio ilegal24.Outro elemento é a expansão da quantidade de Centros de Triagens de Animais Silvestres, que são a estadia dos animais vivos apreendidos. As unidades são estrategicamente distribuídas onde há o maior número de apreensões25. A CITES compreende um instrumento que busca sintonizar uma atividade econômica com a proteção ambiental pela regularização do comércio da fauna e da flora silvestres em ameaça de extinção. Com isso, a sociedade tem um instrumento que não somente orienta como deve ser a atividade, mas que também a promove, permitindo seu desen- volvimento social e econômico. Ainda que o objeto da Convenção se restrinja apenas à conservação e ao monitoramento das espécies e espécimes afetados pelo comércio in- ternacional, não englobando toda fauna e flora existente, ela é de extrema importância para a conservação da biodiversidade. A questão se percebe ainda mais complexa quando se volta para o seu campo de atuação, pois se está atingindo a manutenção da conserva- ção da biodiversidade em seus extremos, qual seja, a ameaça de extinção de várias espé- cies e os efeitos de sua função ecológica. Nesse raciocínio, a CITES se apresenta como instrumento de coibição do comércio ile- gal26. Por exemplo, conforme o 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Animais Silvestres, promovido pela organização não governamental Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas), o comércio internacional monitorado pela CITES nos anos de 1995 a 1999 abrangeu cerca de 1.5 milhões de pássaros vivos, 640.000 répteis vivos, 300.000 peles de crocodilo, 1.600.000 peles de lagartos, 1.100.000 peles de cobras, qua- se 300 toneladas de caviar e mais de 1.000.000 pedaços de coral. Todavia, a utilização de recursos silvestres ainda é objeto do tráfico, que ocupava, na época, a terceira maior ativi- dade ilegal no campo mundial, movimentando de US$ 10 a 20 milhões por ano, sendo que o Brasil participa com cerca de 5% a 15% do total mundial27. A coibição do comércio ilegal pela implementação da CITES se dá diante do contexto de que a Convenção permite e implementa uma opção de continuidade da atividade, pelo uso sustentável do recurso. Todavia, é ainda intensa conscientização da população para que não participem desse tipo de atividade, além das próprias autoridades, que muitas vezes não percebem a gravidade que gera esse tipo de crime. Uma vez compreendida a CITES, segue a análise para o estudo da CDB e do Protocolo de Nagoia. 24 Por exemplo, a operação Copa, no meio do ano de 2014. Ibama. Notícias. Operação Copa: Guarulhos e Viracopos são alvos de intensa fiscalização. Disponível em: http://www.ibama.gov.br/publicadas/operacao-copa-ibama-apreende-animais-silvestres-no- aeroporto-internacional-de-viracopos . Acesso em: 20.11.2014. 25 MOTTA, Luiz da. Cetas: Expansão da rede de triagem de animais silvestres. Revista Ibama. Brasília: Ano II – no 02. p. 39. 26 LIMA, Gabriela G. B. A situação da CITES no Brasil: rumo à implementação do desenvolvimento
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