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TD 0556 Utilização de Critérios Econômicos para a Valorização da Água no Brasil

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TEXTO PARA DISCUSSÃO Nº 556
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS
PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO
BRASIL*
Ronaldo Seroa da Motta**
Rio de Janeiro, abril de 1998
 
*O autor agradece a Wilfried Teuber (SEMA-GTZ), Michel Potier (Environment
Directorate-OECD), Lucia Sena (Sema/SP) e Raimundo Garrido e Luciano Meneses Silva
(SRH-MMA) pela atenção e presteza com que obtiveram referências bibliográficas das
suas instituições. A Antonio Comune (Fipe-USP), Eduardo Lanna (IPH-UFRS) e Jerson
Kelmam (Coppe-UFRJ) por colocarem prestativamente seus artigos à minha disposição
via E-mail. A Wilfried Teuber gostaria também de agradecer o incentivo recebido para
realizar este documento. Este estudo faz parte do Projeto Planagua de Cooperação
Técnica Brasil-Alemanha, Sema-GTZ.
**
 Coordenador de Estudos do Meio Ambiente na Diretoria de Pesquisa do IPEA.
O IPEA é uma fundação pública
vinculada ao Ministério do
Planejamento e Orçamento, cujas
finalidades são: auxiliar o ministro na
elaboração e no acompanhamento da
política econômica e prover atividades
de pesquisa econômica aplicada nas
áreas fiscal, financeira, externa e de
desenvolvimento setorial.
Presidente
Fernando Rezende
Diretoria
Claudio Monteiro Considera
Luís Fernando Tironi
Gustavo Maia Gomes
Mariano de Matos Macedo
Luiz Antonio de Souza Cordeiro
Murilo Lôbo
TEXTO PARA DISCUSSÃO tem o objetivo de divulgar resultados
de estudos desenvolvidos direta ou indiretamente pelo IPEA,
bem como trabalhos considerados de relevância para disseminação
pelo Instituto, para informar profissionais especializados e
colher sugestões.
ISSN 1415-4765
SERVIÇO EDITORIAL
Rio de Janeiro – RJ
Av. Presidente Antônio Carlos, 51 – 14º andar – CEP 20020-010
Telefax: (021) 220-5533
E-mail: editrj@ipea.gov.br
Brasília – DF
SBS Q. 1 Bl. J, Ed. BNDES – 10º andar – CEP 70076-900
Telefax: (061) 315-5314
E-mail: editbsb@ipea.gov.br
© IPEA, 1998
É permitida a reprodução deste texto, desde que obrigatoriamente citada a fonte.
Reproduções para fins comerciais são rigorosamente proibidas.
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRACT
INTRODUÇÃO .........................................................................................1
1 - OS PRINCÍPIOS ECONÔMICOS DA COBRANÇA DA ÁGUA...........2
1.1 - Cobrança da Água para Financiamento ..........................................2
1.2 - Cobrança da Água por Externalidade ..............................................7
1.3 - Criação de Mercado de Direitos da Água ......................................14
1.4 - Conclusões ....................................................................................20
2 - A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL ................................................25
2.1 - A Experiência Francesa .................................................................26
2.2 - A Experiência Holandesa...............................................................30
2.3 - A Experiência Alemã......................................................................32
2.4 - A Experiência Mexicana.................................................................34
2.5 - A Experiência Colombiana.............................................................35
2.6 - A Experiência Americana...............................................................37
2.7 - A Experiência Chilena....................................................................39
2.8 - Conclusões ....................................................................................40
3 - A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA ........................................................44
3.1 - Aspectos Políticos e Legais ...........................................................44
3.2 - A Cobrança nas Legislações Estaduais.........................................47
3.3 - Conclusões ....................................................................................55
4 - RECOMENDAÇÕES PARA A VALORIZAÇÃO ECONÔMICA
 DA ÁGUA NO BRASIL.....................................................................55
4.1 - Dez Critérios Econômicos para Valorização da Água....................56
4.2 - Custos de Transação.....................................................................57
4.3 - Critérios de Alocação das Receitas da Cobrança..........................60
APÊNDICE TÉCNICO............................................................................68
BIBLIOGRAFIA ......................................................................................77
RESUMO
Este documento objetiva, primeiro, revisar e analisar os critérios econômicos da
cobrança e criação de mercado de recursos naturais, em particular da água, no seu
novo contexto legal das recentes leis de recursos hídricos do país. Segundo,
analisar as experiências internacionais para subsidiar uma avaliação das propostas
de cobrança desenvolvidas no Brasil que, nem sempre, explicitam suas
justificativas e implicações econômicas. À luz dessas experiências, são propostos
alguns princípios econômicos básicos para a cobrança e criação de mercado de
água no Brasil considerando as nossas realidades legal e institucional.
ABSTRACT
This study, firstly, analyses and review the economic criteria of natural resources
pricing and market creation, with special focus on water charges in its new legal
context in Brazil. Secondly, international experiences are evaluated trying to bring
about relevant issues for the current proposals for water charge in Brazil which are
commonly presented without proper economic justification. Based on that, general
and basic economic principles are enunciated to guide water pricing and market
creation taking into account the legal and institutional constraints.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
1
INTRODUÇÃO
A gestão dos recursos hídricos (RH) no Brasil inicia uma nova fase com a
aprovação da Lei 9.433 da Política Nacional de Recursos Hídricos em janeiro de
1997. Além desta lei nacional, outros 12 estados também promulgaram legislações
semelhantes. Quatro princípios desta lei são responsáveis por tal alteração de
padrão: a gestão por bacia, a unicidade da outorga, a exigência de um plano de
gestão e o instrumento de cobrança. Todas essas legislações encontram-se na fase
de regulamentação, durante a qual os critérios de implementação desses
instrumentos serão definidos.
A gestão por bacia reconhece que o uso da água é múltiplo, excludente e gera
externalidades e, portanto, a bacia representa o mercado de água onde seus
usuários interagem. A unicidade da outorga permite uma melhor definição e
garantia de direitos de uso da água. O plano de gestão introduz os elementos de
disponibilidade e demanda do recurso no tempo. E por fim, a cobrança que
determina diretamente um preço para a água.
Note que a descrição acima das características da nova lei está estritamente
associada a uma visão econômica da água. Tal percepção não é fortuita, pois a
própria lei reconhece, explicitamente, que a água tem um valor econômico e o
instrumento de cobrança almeja a racionalização do seu uso. A transformação
desse valor em um preço, isto é, na cobrança, é o tema deste artigo. Ela depende
dos critérios econômicos adotados na determinação dos valores da cobrança e da
criação de mercado para o uso da água. Adicionalmente, serão analisadas as
vantagens e desvantagens das opções de criação de mercado de direitos de uso e
poluição da água como complemento ou substituição da cobrança.
O documento está dividido em quatro seções. A primeira enuncia os principais
critérios econômicos gerais da cobrança pelo uso ou criação de mercado de
recursos naturais, em particular ao caso da água. Uma análise mais formal é
deixada para o Apêndice Técnico, onde uma bibliografia especializada e
tradicional é registrada.
À luz desses critérios, as experiências internacionais e as propostas estaduaisbrasileiras são analisadas. Com base nessas experiências, alguns princípios
econômicos para a cobrança e criação de mercado são propostos na última seção
com base nas conclusões das seções anteriores. Na seção final também são
apresentados critérios econômicos para a repartição das receitas da cobrança.
Conforme o leitor poderá notar, este documento não tem o objetivo de propor
fórmulas de cobrança ou estimar seus valores. O nosso objetivo é, primeiro, o de
avaliar a base teórica dos critérios para valorização da água, os quais nem sempre
estão explicitados e coerentes nas propostas de cobrança ou de criação de
mercado. E, segundo, discutir a viabilidade legal e institucional de aplicá-los à luz
da experiência internacional e da realidade brasileira. Para tal, o estudo oferece
alguns princípios econômicos, básicos e de fácil implementação, para que a
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
2
valorização econômica da água possa capturar alguns ganhos de eficiência no seu
uso e, não represente somente algumas percepções pessoais, simplificadas
matematicamente, sem a devida base teórica.
1 - OS PRINCÍPIOS ECONÔMICOS DA COBRANÇA DA ÁGUA
A cobrança da água é um preço sobre o uso da água. Esta é também a base do
chamado princípio do poluidor-usuário pagador.1 Este uso, por sua vez, pode se
realizar por quantidade ou qualidade, tal como está reconhecido na nova gestão de
recursos hídricos no país (NGRH).
Do ponto de vista econômico, a cobrança da água deve atentar para dois objetivos:
o de financiamento da gestão de RH e o de redução das externalidades ambientais
negativas. Conforme veremos a seguir, preços ótimos para o financiamento da
gestão de recursos hídricos podem não representar necessariamente os preços
adequados para atendimento de objetivos ambientais e vice-versa. Mais ainda, a
criação de mercados de direitos comercializáveis, em certos casos especiais, pode
ser mais eficiente que a cobrança,
Os critérios abaixo analisados estão formalizados no Apêndice Técnico onde uma
bibliografia tradicional é referida.
1.1 - Cobrança da Água para Financiamento
Note que o aumento do consumo de um bem, como, por exemplo, a água (em
quantidade ou qualidade), realizado por um usuário B (indivíduo ou firma), pode
ou não reduzir o consumo de outro usuário A. Por exemplo, dentro dos limites da
disponibilidade ou qualidade hídrica, o consumo de B não rivaliza com o de A.
Nestes casos, para a sociedade, o aumento de consumo de B não gera um custo
social.
Como a água é um bem renovável, não ocorre também nenhum aumento do seu
custo de oferta. Em jargão econômico, equivale dizer que o custo marginal (custo
da unidade adicional) do consumo de B é zero, embora gere um benefício
marginal positivo para B. A cobrança pelo uso da água, nestes casos de não-
rivalidade, pode reduzir a eficiência econômica, pois frente a essa cobrança um
consumo, que não aumenta o custo social e gera benefícios positivos, poderia ser
excluído e, portanto, impediria níveis ótimos de alocação de água por usuário.
Conforme será discutido a seguir, nem sempre o usuário está disposto a revelar o
valor dos seus benefícios e, assim, principalmente no caso da água, o consumo de
um usuário acaba afetando a disponibilidade do recurso para outro usuário. Mais
 
1
 Neste contexto da cobrança, este princípio se refere a pagamentos ex-ante ao fato gerador,
enquanto nas situações de litígios judiciais é aplicado para pagamentos ex-post na forma, por
exemplo, de indenizações.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
3
ainda, a cobrança pelo uso pode ser necessária para o financiamento da gestão e
provisão do recurso.
Os custos de gestão e provisão podem ser associados à disponibilidade hídrica ou
ao controle da poluição. Entretanto, o rationale apresentado abaixo está mais
associado na literatura ao uso por quantidade cuja oferta pode ser viabilizada por
financiamento de investimentos e sem geração de externalidades.
1.1.1 - Preços ótimos para financiamento
Note que o custo de um aumento de consumo pode ser zero (custo marginal igual
a zero), mas existem custos fixos para manter o serviço de provisão do recurso.
No caso da água, seriam, por exemplo, os custos de gestão e obras de manutenção.
Logo, uma cobrança terá de existir senão a provisão do bem é reduzida com a
exclusão de vários usuários com benefícios marginais positivos. O princípio
econômico para tal cobrança é a sua equivalência ao benefício marginal do
consumo de água de cada usuário. Observando o Gráfico 1, o nível ótimo de
provisão do recurso, nesse caso, seria dado àquele em que o custo marginal da
provisão (Cpmg) é igual ao somatório dos benefícios marginais dos usuários (Bmg
= B1mg + ...+ Bnmg). Assim, o custo social se iguala ao benefício social, tal como
indica o ponto Q* no Gráfico 1 que determina o nível ótimo de consumo.
Esse benefício seria dado pela taxa marginal de substituição do consumo de água
por outros bens. Tal taxa apenas revela quanto vale a água em relação a outros
bens da economia que são consumidos pelo usuário e, portanto, revela sua
disposição de pagar pela água. O consumo da água tanto pode ser um insumo da
função de produção de um produtor quanto um bem de consumo direto da função
de utilidade de um indivíduo (ver Apêndice Técnico).
Para os usuários produtores (firmas) de um bem z com uma função de produção F
e preço pz, essa cobrança (C1qi) seria revelada pelo valor da produtividade
marginal da água como insumo (A) para o usuário i da seguinte forma:
 C1qi = pZ ∂F / ∂A (1)
Para os usuários consumidores direto (famílias), C1qi pode ser expressa
formalmente como uma perda de utilidade (U) por decréscimo do consumo direto
do bem para o usuário i que reflete sua disposição marginal a pagar (DAP), tal
que:
 C1qi = ∂U / ∂A = DAP (2)
O valor da DAP seria, então, uma medida do ganho de bem-estar pelo uso da
água.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
4
1.1.2 - Preços públicos
A situação anterior é uma caracterização da provisão de um bem público, cujo
consumo é não-rival e o estado é o monopolista provedor deste bem. Com tal
regra de preços a sociedade maximiza os benefícios do uso da água ao alocar o
recurso de acordo com seu retorno econômico para cada usuário. Todavia, é muito
difícil identificar para cada usuário o seu benefício marginal do consumo. Mas,
como este consumo tem que ser também não-excludente daqueles usuários com
benefício marginal positivo, existe um incentivo para o caronista (free rider), ou
seja, alguns indivíduos irão esconder suas verdadeiras disposições a pagar pelo
bem para pagarem menos ou nada pelo seu consumo. Dessa forma, a provisão do
recurso é subótima na medida em que as receitas arrecadadas não permitirão
cobrir os custos da provisão.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
5
Entretanto, devemos observar que o consumo de água é não-rival somente até
certo ponto, isto é, acima de um certo nível de consumo ocorrerá um
“congestionamento” que resultará em racionamento. Agora o consumo de B afeta
o consumo de A e, portanto, a alocação da escassez tem de seguir um critério de
eficiência. Nesse caso, os custos marginais de expansão (Cxmg) têm de ser
adicionados aos custos de provisão (Cpmg) e o novo consumo ótimo seria o ponto
Q** no Gráfico1. Note que Q** representa o somatório das quantidades ótimas de
cada usuário.
Mesmo que haja a possibilidade de eliminar os caronistas, há que se admitir que o
consumo é possível de ser medido para, assim, ser cobrado. Daí a recomendação
de que certos benspúblicos têm de ser financiados pelo Tesouro, isto é, pelo
contribuinte em geral mediante impostos sem qualquer relação com o nível de
consumo individual.2
Uma outra forma de resolver tal tendência de subotimização é determinar preços
que maximizem o bem-estar gerado pelo consumo de água dada a restrição de que
a receita marginal deve se igualar às necessidades de financiamento da provisão e
expansão. Esses preços (C2q) são iguais ao custo marginal de provisão e expansão
mais uma parcela diferenciada por usuário que é proporcional (β) ao inverso da
elasticidade de demanda (Ei) de cada usuário i da seguinte forma:
 C2qi - Cmg/C2qi = β/ Ei (3)
Assim, usuários com demanda menos elásticas pagam mais que aqueles com
demanda mais elástica (ver Apêndice Técnico). Esta tem sido a regra básica de
precificação de bens públicos, ou regra de Ramsey,3 quando estes não são
financiados diretamente pelo Tesouro.
Note que tal regra poderia ser também aplicada ao consumo por qualidade no qual
a demanda do usuário por serviços de despoluição seria dada pela sua curva de
custo de controle de poluição, ou seja, a disposição a pagar seria dada pelos custos
de controle. Todavia, conforme será visto adiante, no caso de externalidades, além
das necessidades de receita, existe um objetivo ambiental a ser atendido.
1.1.3 - As limitações no caso da água
Note que no caso da provisão de água existem problemas adicionais para a
precificação.
Conflito setorial: geralmente a indústria e a agricultura apresentam elasticidades-
preço maiores do que os usuários urbanos devido às opções tecnológicas de suas
 
2
 Estes são os casos clássicos da segurança nacional ou dos faróis de mar.
3
 Derivada inicialmente por Frank Ramsey em 1927. Dessa forma, as demandas inelásticas
financiam as demandas elásticas, uma vez estas últimas que geram maiores ganhos de excedente
econômico. Esta proporcionalidade pode também ser estimada incluindo critérios distributivos [ver
Andrade (1998)].
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
6
funções de produção. Nesses casos, com o uso da regra de preços públicos, os
preços da cobrança de consumo urbano será maior do que de outros usuários,
criando-se assim uma fonte de conflito setorial.
Interligação entre bacias (sub-bacias ou trechos):4 quase sempre o consumo de
um usuário numa sub-bacia afeta o de outros em outra bacia, sub-bacia ou trecho.
Assim, os preços em vigor em uma bacia que definem o seu nível local ótimo
podem afetar outro nível ótimo local. Logo a cobrança do usuário i, nesses casos,
teria que ser relativa a todas as bacias (sub-bacias ou trechos) j da seguinte forma:
 C3qi = qij C2qj (4)
onde q representa a matriz de coeficientes de consumo de água da bacia j pelo
usuário i. Note que q pode ser associado tanto ao uso quantitativo de um usuário
no uso de outros, quanto ao impacto da sua poluição na qualidade ambiental no
consumo dos outros. Mapear essa matriz requer amplo conhecimento sobre o
balanço hidrológico das bacias que nem sempre é preciso.
Dessa forma, ou se considera a gestão dentro de uma dimensão de uma única
bacia com várias bacias e sub-bacias interligadas ou esse consumo interligado
continua uma externalidade negativa5 (ver subseção seguinte).
A utilização desse sistema de bacias interligadas implica um sofisticado sistema
de gestão em que comitês de bacias são articulados por sua interligação. Tal
sistema talvez seja de difícil implementação, pelo menos no estágio inicial do
NGRH. Isto porque o número de usuários envolvidos cresceria e,
conseqüentemente, seriam observados custos elevados de negociação que
impediriam ações cooperativas para definição de metas e preços. Dado que essas
negociações tentam definir os benefícios e os custos de cada usuário que
dependem da ação de outro usuário, esse contexto de informação imperfeita,
portanto, pode gerar situações não cooperativas com usos subótimos do recurso.6
Medição do consumo: o custo marginal de medição de consumo (ou das emissões
de efluentes) pode ser extremamente alto que não compense a receita adicional
gerada. Nesses casos seria melhor utilizar aproximações de consumo, mesmo que
subestimadas. Existe quase que uma impossibilidade técnica de medição para a
agricultura ou tomadas diretas de água bruta de grandes firmas. Todavia,
estimativas parametrizadas são possíveis mediante dados de produção/receita,
embora seja uma forma imprecisa de medição. De qualquer forma, tal
procedimento requer um sistema de gestão capacitado para isso.
 
4
 Na literatura econômica ambiental este problema é denominado multi-zone problem [ver
Tietenberger (1996)]. Para uma análise de simulação nas bacias do Estado de São Paulo, ver Seroa
da Motta e Mendes (1996).
5
 Este é um caso típico de transferência de externalidade.
6
 Este níveis são denominados literatura econômica de equilíbrio de Nash.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
7
Racionamento: a disponibilidade hídrica é estocástica, isto é, está associada a uma
função probabilística, ou seja, em certos períodos, mesmo com uma receita
adequada e sem caronistas, a disponibilidade de água pode requerer um
racionamento por motivos puramente hidrológicos. Nesses casos, novamente o
uso da água por um usuário exclui o uso por outro e, portanto, gera uma
externalidade negativa. A precificação pela regra de preços públicos não é
possível, nesses casos, dado que a solução de oferta de água independe do nível de
receitas, porquanto que no curto prazo não haveria como disponibilizar mais água.
Note que uma gestão de oferta que mantém o consumo suficientemente abaixo da
disponibilidade máxima para não enfrentar esse racionamento periódico, estaria
realizando uma alocação não-ótima, pois por vários períodos de não-racionamento
usuários com benefícios positivos seriam excluídos.7
Dessa forma, a alocação ótima da água por precificação da água é de difícil
implementação sob a ótica da eficiência econômica, principalmente nos casos de
interligação e racionamento. Analisemos mais objetivamente estas restrições
quando da discussão sobre direitos de uso transacionáveis.
1.2 - Cobrança da Água por Externalidade
A cobrança da água para controle das externalidades ambientais negativas difere
da cobrança para financiamento em duas situações especiais. Primeiro, conforme
já analisamos, quando o consumo da água afeta terceiros sem que o usuário pague
por isso, ou seja, gera externalidades negativas. Segundo, quando se cobra por
poluição, o tratamento da água residual é realizado descentralizadamente (isto é,
sem um poder monopolista do estado ou de uma associação) pelos usuários.
Caso a água residual de todos os usuários fosse toda canalizada para uma estação
de tratamento coletiva, não haveria externalidade e o problema de precificação
seria semelhante ao de preço público, conforme acima discutido, ou seja, igualar a
receita da cobrança com as necessidades de financiamento e gestão do sistema de
tratamento.8 Entretanto, tal não é o caso geral da descarga de efluentes e, assim, há
que se determinar um nível de cobrança que afete a geração de externalidades e
incentive as ações de controle de poluentes.
Tal como na literatura, nas subseções seguintes iremos nos referir à poluição como
a forma de externalidade a ser reduzida. Quando for o caso, faremos referência às
externalidades de uso por quantidade.
 
7
 Equivale a dizer matematicamente que o ponto de congestionamento tem que ser atingido para
haver otimização.8
 Nos casos de associações de municípios e de firmas para tratamento em estações coletivas, a
questão da cobrança também pode ser resolvida por preços públicos. Entretanto, note que nessas
situações, os preços são regidos por contratos privados e sua determinação não precisa,
necessariamente, seguir a lógica da maximização do bem-estar social, como no caso dos bens
públicos. Ver Seção 3 sobre experiências desse tipo em algumas partes da Alemanha.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
8
1.2.1 - Preços ótimos
A geração de externalidades negativas (por poluição hídrica ou aérea) resulta em
danos que não são internalizados nas funções de produção e consumo dos
usuários. Desta feita, a economia perde eficiência, pois, devido a essa falha de
mercado, o custo privado não coincidirá com o custo social. Na presença de
externalidades o nível de utilização do recurso é subótimo. No caso das
externalidades negativas, a não-internalização dos seus custos induz um nível de
utilização acima daquele que ocorreria caso as externalidades fossem
consideradas.
Na ausência de externalidades, o custo privado marginal se iguala ao custo
marginal social na produção. A produção, por exemplo, de um bem X em uma
certa bacia teria uma função de custo privado Cmg(q) e os benefícios marginais
sociais desta produção (lucro da produção e satisfação no consumo do bem
produzido) seriam definidos na função Bmg(q). Observando o Gráfico 2, note que
o equilíbrio de mercado será dado na quantidade Q* onde o custo marginal
privado se iguala ao benefício marginal social.
Na presença de externalidades, o custo social incorpora os danos ambientais
representados por uma função Dmg(q) na qual o valor marginal dos danos cresce
quando varia a quantidade produzida.9 Agregando Cmg(q) com Dmg(q) temos
uma função a custo marginal social CSmg(q) e a quantidade de equilíbrio é
identificada agora, no Gráfico 2, em Q** < Q*. Assim, ao internalizar os danos
ambientais das externalidades, o próprio mercado ajusta as posições de equilíbrio.
Note que o dano total agora, dada pela área abaixo de CSmg(q), é menor em Q**
do que em Q*.
Dessa forma, o preço ótimo da poluição (taxa pigouviana10), a ser cobrado pela
emissão gerada por q, deveria ser dado pela seguinte expressão:
 C1p = ∂Dmg(q) / ∂q (5)
Logo a cobrança em termos de eficiência econômica da expressão (5),
determinaria uma quantidade de produção do bem X em Q** que, por sua vez,
dada uma função de geração de poluição Rmg(q), que associa quantidade
produzida de X à poluição gerada, identificaria um nível ótimo de poluição
equivalente a Rmg(Q**), ou seja, um nível de poluição, alcançado pelo próprio
mercado, para o qual os benefícios marginais da produção igualam-se aos custos
ambientais da poluição.
 
9
 Esta função de dano representa a relação dose-resposta entre o nível de atividade e o nível do
dano.
10
 Graças ao economista Pigou que foi o primeiro a formalizá-la nos anos 20.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
9
Entretanto, a carência de conhecimento sobre as relações de impactos entre
atividade econômica e perda de qualidade ambiental e os valores monetários que
as pessoas atribuem a essa perda, não permitem uma determinação precisa11 de
Dmg(q) para cada tipo de poluição, e, conseqüentemente, de C1p. Observe que
Dmg(q) tem de ser estimada para cada sub-bacia onde a capacidade de assimilação
e concentração de carga de efluentes fosse diferente.
Tal procedimento encerra um grande esforço institucional que, mesmo sendo
factível no contexto brasileiro, pode resultar em custos administrativos superiores
aos benefícios gerados e ainda gerar inúmeros casos de litígios por conta de
contestações das inevitáveis imprecisões das medidas realizadas.
Todavia, se existem informações precisas sobre Dmg(q), podemos substituir a
função Bmg(q) por uma função de custos marginais de controle (CCmg(a)), onde
a é o nível de controle. A função Dmg(q) torna-se uma função dos benefícios
marginais do controle Dmg(a), que são os danos evitados no nível a de controle.
 
11
 Observe que o termo preciso aqui se refere a uma relação funcional na qual se conhece
estatisticamente a magnitude, e a variância desta, do impacto ambiental. Adjetivações, tais como,
de alto, médio ou baixo impacto seriam ineficientes para um critério de diferenciação de preço,
tanto quanto gerariam efeitos distributivos consideráveis ao penalizar imprecisamente os usuários.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
10
Nesse caso, a função Dmg(a) representa a função Dmg(q) com a inclinação
trocada, pois essa agora varia com o nível de controle e não com a quantidade
produzida. A solução desse problema é uma cobrança (C2p) no ponto a*, resultante
da interseção das curvas CCmg e Dmg no Gráfico 3, que representa o nível ótimo
de controle da poluição, tal como:
 C2p = Dmg(a*) = CCmg(a*) (6)
Note que a* agora representa um quantidade socialmente ótima de controle,
equivalente ao ótimo da poluição em Q* do Gráfico 2, na qual os benefícios
marginais se igualam aos custos marginais do controle.
No uso quantitativo de água analisado anteriormente, quando o consumo de uma
bacia (ou de um usuário) afeta o de outra (o), identifica-se também um caso de
externalidade negativa. Nesses casos, a função Dmg(q) é uma que reflete a perda
de produção (ou de utilidade) da bacia (sub-bacia ou trecho) ou usuário afetado e
não do gerador de externalidade. Essa perda de produção pode ser expressa pela
expressão (1) (ou expressão (2) no caso de perda de utilidade), só que agora
relativas aos usuários afetados. Fica evidente, dessa forma, a enorme dificuldade
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
11
de determinação dessas funções, principalmente para situações que envolvem
múltiplos usuários ou bacias.
Entretanto, vale notar que se Bmg(q), Dmg(a), Dmg(q) e CCmg(a) não são
convexas, ou seja, benefícios e custos não são, respectivamente, continuamente
decrescentes ou crescentes, podem existir mais de um C1p. Nesses casos, a
determinação do nível ótimo da cobrança pode também não ser possível.
1.2.2 - Custo-eficiência de controle
Uma outra forma de resolver o nível da cobrança por externalidades é abdicando
do objetivo de um ótimo da poluição valendo-se do custo ambiental, conforme
anteriormente discutido, e atingir, opostamente, um nível desejado de poluição
(padrão ambiental para o meio e não o de emissão por usuário) mediante
minimização do custo social ou custo-eficiência, ou seja, ao invés de maximizar
uma função de benefício social, minimiza-se uma função de custo social para
derivar preços ótimos da poluição (ver Apêndice Técnico).
Dessa forma, o objetivo é minimizar os custos totais de controle da sociedade
sujeito a uma restrição de que o total de poluição, gerado por todos os usuários,
não deve exceder um padrão ambiental previamente estabelecido. O Gráfico 4
identifica essa cobrança (C3p) para um certo padrão ambiental d* que não é
considerado ótimo, mas será atingido pelo menor custo total de controle
(agregando os custos individuais dos usuários), ou seja, menor custo social.
Observe que, neste caso, estamos admitindo que a sociedade ao definir d* já
confirmou que os custos ambientais acima deste nível de controle são
extremamente significativos e excedem qualquer custo possível de controle. Tal
pode ser justificado pelo risco e incerteza sobre os danos ambientais segundo o
princípio da precaução.12 Embora tal solução não garanta a maior eficiência
econômicacomo as taxas pigouvianas, C2p, pelo menos, assegura que o custo total
de controle seja minimizado.
 
12
 Precautionary principle [ver, por exemplo, Perrings et alii (1995)].
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
12
Essa limitação será resultante da reação dos usuários frente a C3p. Somente os
usuários com custos de controle inferiores a C3p decidirão ampliar o nível de
controle e essa ampliação ocorrerá primeiro naqueles com custos mais baixos.
Sendo C3p determinada corretamente, a sociedade atingirá d* ao menor custo
social (ver Apêndice Técnico).
1.2.3 - As limitações no caso da água
Os problemas apresentados aqui para custo-eficiência não são particulares para o
caso de poluição hídrica e são também aplicáveis à poluição atmosférica. Todavia,
esses problemas serão aqui analisados no contexto de bacias hidrográficas.
Note que o valor da cobrança requer uma simulação prévia com base em funções
de custo e níveis de emissão dos usuários. Caso essas simulações não sejam
precisas, há de se processar uma monitoria fina testando valores distintos e
analisando os resultados ambientais. Na subseção seguinte serão discutidas as
condições para que tal imprecisão gere o menor custo econômico. Antes, todavia,
examinemos as causas dessas imprecisões.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
13
O formato da curva de controle: a determinação de C3p não requer o
conhecimento da função de dano e somente exige a estimação de CCmg(a) para
que, com base nas simulações, o valor de C3p seja determinado, ou seja, depende
da inclinação da curva de controle dada pela elasticidade-preço da poluição.
Quanto maior essa elasticidade menor poderá ser o preço da poluição. Tal seria
uma regra similar à regra de preços públicos.
Mas, a identificação de uma função de custo de controle não é livre de problemas
empíricos. Cada usuário exibe uma tecnologia e uma escala de controle distintas
que podem refletir uma solução particular de controle e, portanto, a estimação de
CCmg(a) pode não ser tão trivial. Adicionalmente, CCmg(a) também pode ser
não-convexa, ou seja, custos não são continuamente crescentes e, assim, existirem
mais de um C3p.
O processo de difusão da poluição: outro problema mais sério ainda é o processo
de difusão da poluição. Tal como analisado, a carga poluidora de um usuário afeta
distintamente o padrão ambiental e, mais ainda, essa dispersão pode ocorrer em
várias bacias (sub-bacias ou trechos) e, assim, transferindo poluição para outros
usuários.13 O valor da cobrança, neste caso de transferência de poluição (C4p),
seria então modificado para:
C4pi = dij C3pj (7)
onde d representa a matriz de coeficientes de transferência de poluição do usuário
i para a bacia, sub-bacia ou trecho j (ver Apêndice Técnico). Tal como para a
expressão (4) da cobrança ótima para financiamento considerando interligações
entre bacias, mapear essa matriz de impactos requer amplo conhecimento do
processo de difusão que nem sempre é conhecido ou preciso.14
Se dij é não-linear, isto é, as contribuições das emissões de cada usuário de uma
bacia para o padrão de cada bacia são afetadas pelas emissões de outros usuários
em outras bacias, a determinação de C4pi será mais complexa e variável com
problemas significativos de alocação devido à informação imperfeita e incerteza.
Aliás, a parte os problemas com CCmg(a), temos também de admitir que esses
problemas de informação imperfeita e incerteza afetam a tomada de decisão do
usuário mesmo quando C4pi é uniforme no tempo e que tais questões são de difícil
modelagem para um exercício de simulação.
Objetivo de receita versus qualidade ambiental: o objetivo de custo-eficiência tem
sido o principal argumento para a introdução de instrumentos econômicos (IEs) na
gestão ambiental onde prevalecem os instrumentos de comando e controle (ICC).
 
13
 Note que tais problemas se aplicam tanto à poluição hídrica quanto a atmosférica.
14
 Kelman (1996) propõe uma cobrança para água no Brasil com base em fórmula muito
semelhante. Entretanto, não foi possível identificar no referido texto a base teórica e as
justificativas econômicas e também de citações de referências desta formulação desenvolvida há
muitos anos em livros-textos de economia ambiental. Ver Apêndice Técnico onde esta fórmula é
formalizado com base nesta literatura.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
14
Repare que a adoção de um típico ICC seria um padrão de emissão por usuário
conjugado com um padrão ambiental. Considere um padrão de emissão comum
uniforme para todos os usuários que gerasse, assumindo total cumprimento, o
mesmo d*
 
que a aplicação de C3p. Nesse caso, no ICC os usuários com custos
baixos de controle não estariam incentivados para controlar abaixo deste padrão
de emissão e, portanto, o custo total de controle tenderia a ser maior do que com
C3p. Além desta capacidade de reduzir o custo social de controle, IEs de cunho
fiscal têm sido também justificados por gerarem receitas. Na verdade tal objetivo
fiscal, conforme será analisado nas próximas seções, tem sido a principal razão da
implementação de sistemas de cobrança de água. Dessa forma, mesmo cobranças
que não estão objetivando um padrão ambiental específico, mas sim um nível
desejado de receita, terão que utilizar o critério de preço público na qual a
cobrança terá que ser inversamente proporcional à elasticidade-preço da curva de
controle.
1.3 - Criação de Mercado de Direitos da Água
Nas seções anteriores procurou-se demonstrar que a precificação da água não é
trivial quando se deseja introduzir critérios econômicos de eficiência para a sua
racionalização, conforme explicitam os diplomas legais do NGRH. Tal realidade
resultou que nas experiências internacionais, discutidas na Seção 3, observamos
que a determinação do valor da cobrança é geralmente resolvida a níveis
subótimos. A prática da cobrança, conforme será analisado, muitas vezes não gera
a receita necessária nem cria incentivos para o uso de água de maior retorno para a
sociedade.
Tendo em vista tal realidade, será importante, antes de analisarmos as experiências
internacionais, que se discuta uma forma, a princípio mais simples e objetiva, de
revelar o valor econômico da água: direitos de uso comercializáveis, isto é, a
criação de um mercado de água por troca de direitos de uso.
Note que é a ausência de (ou dificuldade de assinalar) direitos completos de
propriedade dos recursos ambientais que torna seu uso subótimo (ou menos
eficiente). Caso a especificação dos direitos completos de uso da água seja
possível, uma negociação entre os usuários poderia ocorrer de forma que os usos
de maior retorno (mais eficiente) seriam priorizados, ou seja, as trocas de direitos
no mercado induziriam que os usuários de maior benefício de uso (ou menor
custo) fossem aqueles que pagariam mais por estes direitos. Os termos da
negociação seriam com base nos custos e benefícios percebidos pelas partes.
A discussão que se segue terá o objetivo de analisar a utilização de mercados de
direitos de uso de água (MDU) no qual a titularidade continua pública, mas
permite-se que o direito de uso por quantidade, dado pela outorga, seja
transacionado entre usuários. Outra opção seria o mercado de certificados de
poluição (MCP) que estabelece um limite de descarga de poluentes por usuários e
autoriza que os usuários transacionem entre si partes dessa permissão de carga
poluente. Desta feita, pretende-se resolver mediante criação de mercado alguns
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
15
dos problemas com precificação apontados anteriormente e qualificar essas opções
como instrumentos disponíveis para aNGRH.
Para que um mercado, entretanto, realize uma alocação ótima será necessário
atentar para inúmeros condicionantes de propriedade e competitividade, ou seja,
requer direitos de propriedade bem definidos, um grande número de participantes
comprando e vendendo com diferentes custos e benefícios e fraca
interdependência de mercado. Por outro lado, um mercado, assim,
institucionalizado, diversificado e atomizado requer um apoio institucional e legal
mais sofisticado. Portanto, conforme discutiremos adiante, esses instrumentos
apresentam alguns problemas que devem ser identificados para avaliar as
situações propícias para sua aplicação.
1.3.1 - O mercado de direitos de uso
A necessidade de utilizar instrumentos de preços para o uso quantitativo da água
(consumo de água bruta), conforme analisado anteriormente, é apenas uma
alternativa às dificuldades de administrar um mercado de direitos de uso da água.
Essas dificuldades são predominantemente de natureza cultural e se reflete na
ordem jurídica. Sendo um bem vital para a vida humana, a maioria dos países tem
considerado a água como um bem de propriedade pública. O direito privado da
água é negado para evitar uma apropriação indevida do recurso por alguns
usuários. Assim, o Estado passa a ser o agente alocativo da água.
No caso brasileiro, a titularidade da água sempre foi pública, isto é, do poder
público, e o NGRH mantém essa forma de propriedade. Assim, o poder público
outorga direitos de uso aos usuários. Os critérios dessa alocação são claros no
sentido de privilegiar o uso humano. Todavia, nos casos de escassez não existem
critérios mais objetivos para essa alocação que possam assegurar que a titularidade
pública seja mais eficiente ou equânime que um mercado privado de água. Não se
pretende, contudo, avançar aqui nessas questões político-jurídicas da titularidade
da água.
No caso do uso quantitativo da água, as transações no MDU ocorreriam de forma
semelhante a qualquer outro mercado de bem. Suponha que o poder público
realize leilões anuais de outorgas entre os diversos usuários da bacia. Nesses
casos, o usuário somente estaria disposto a pagar por tal outorga o valor adicional
que ela gera na sua produção ou utilidade pessoal.
Assim, o valor de transação da água para cada usuário seria equivalente a C1q, das
expressões (1) e (2), que representariam a produtividade ou utilidade marginal de
X do usuário. Note que com o MDU elimina-se o caronista e resolve-se o
problema da determinação do preço ótimo por indivíduo. Entretanto, o consumo
ótimo referente ao ponto Q do Gráfico 1 somente será identificado caso o leilão
seja realizado de tal forma que o poder concedente, ao observar todas as ofertas
por quantidades de cada usuário, pudesse determinar o ponto Q, tendo em vista
sua função de custo marginal de gestão e expansão (Cmg(q)). Assim, conhecendo
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
16
Cmg(q) o poder concedente realizaria as concessões de outorga até o ponto ótimo
Q.
Suponha agora uma situação de escassez na qual estas outorgas sejam parcial ou
integralmente transacionadas entre os usuários. Por exemplo, o usuário A detém o
direito de uso de uma quantidade X de água que lhe gera uma produção marginal
equivalente a ∆P. Portanto, o usuário A estaria assim disposto a vender essa
quantidade a qualquer usuário por um valor no mínimo igual a ∆P. O usuário
comprador seria aquele em quem ∆P é um valor abaixo do valor adicional de
produção gerado por X, ou seja, novamente os valores de transação seriam
orientados pelas expressões (1) e (2) e o preço de equilíbrio seria aquele referente
ao ponto Q* do Gráfico 1.
Caso as transações entre usuários fossem também permitidas entre bacias, sub-
bacias ou trechos, os preços e quantidades ótimos seriam revelados considerando
as externalidades que foram anteriormente mencionadas quando uma bacia (sub-
bacia ou trecho) dispõe de água de outra. Para tal, cada usuário teria que ser
outorgado nas diversas bacias que seu consumo afeta de acordo com o efeito do
seu consumo na disponibilidade de cada bacia. Note, entretanto, que nesse cenário
de comercialização, não está resolvido o problema de interligação da expressão
(4) de precificação. Sem o conhecimento prévio de qij não é possível definir os
direitos por bacia e, portanto, criar um mercado. Caso qij seja explicitado, um
MDU entre bacias poderia ser utilizado em lugar da precificação da expressão (4).
Para tal, mercados spot e futuros poderiam ser adotados para realizar as
transações. A vantagem do MDU seria que o próprio mercado definiria os valores
de transação da água e, assim, não haveria necessidade de calcular um nível de
cobrança e, portanto, a imprecisão do processo alocativo seria limitada ao
dimensionamento de qij.
Na situação de leilões administrados e com transações entre usuários, atinge-se o
consumo ótimo e gera-se uma receita anual suficiente para a gestão e expansão do
sistema. Adicionalmente, alocam-se eficientemente os recursos em situações de
racionamento e de expansão de consumo. Novos usuários poderiam adquirir
direitos de outorga e as bacias com expansão de consumo também poderiam
efetuar transações com outras bacias.
Conforme se mencionou no início desta subseção, tal sistema de MDU implica
uma completa alteração da distribuição das outorgas atualmente concedidas e,
portanto, geraria problemas políticos e jurídicos provavelmente intransponíveis.
Um mercado, todavia, somente sucederá se esses direitos de uso forem realmente
assegurados de forma que quem vende possa vir a comprar mais tarde caso seja
necessário. Caso contrário a falta de credibilidade restringirá as potenciais
transações. Para tanto, não se faz possível imaginar, no caso brasileiro, que estes
direitos tornem-se comercializáveis de forma repentina.
Além do mais, existem pelo menos dois problemas técnicos a serem considerados,
tais como:
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
17
a) informação imperfeita: o poder público não estaria perfeitamente informado
sobre disponibilidade hídrica, os efeitos do consumo de cada bacia em outra bacia
e os custos marginais de gestão e expansão nas diversas bacias. Adicionalmente,
nem todos os usuários estariam com informação precisa sobre a sua produtividade
marginal ou disposição a pagar. Assim, os custos de transação seriam altamente
elevados e o consumo de equilíbrio seria subótimo. Embora tal imperfeição possa
ser amenizada valendo-se de mercados futuros, a administração de tal sistema é
por demais complexa para ser implementada de forma abrangente para um país
como o Brasil com um número significativo e diverso de bacias e usuários; e
b) poder de mercado: os usuários ou bacias com poder concentrado de mercado
tenderiam a manipular a compra de direitos de outorgas para a criação de barreiras
à entrada para concorrentes (ou competição regional) ou ainda para realizar
arbitragens de preço visando a lucros anormais.15 Embora tal possibilidade possa
ser controlada por limites de outorga por usuário ou restrição de transferências,
mais uma vez a administração do sistema seria mais complexa, pois requereria
que o poder público conhecesse as demandas reais dos usuários, caso contrário os
ganhos de eficiência esperados seriam reduzidos.16
Todavia, parte deste sistema MDU pode ser aplicado, sem a incidência grave
destes problemas político-jurídicos e técnicos, quando da situação de
racionamento que é um dos principais problemas alocativos não resolvidos pela
precificação. Neste cenário as outorgas são definidas nos critérios correntes17 e
adota-se a precificação para financiamento da bacia, mas essas outorgas são
liberadas para comercialização em situações de racionamento.
No racionamento, o poder concedente tem que reduzir o volume de outorga no
percentual adequado à magnitude do racionamento. Uma redução uniforme entreusuários resultaria numa alocação subótima dado que o racionamento não
privilegiaria os usuários de maior produtividade ou utilidade marginal da água.
Para evitar tal distorção, transações de MDU poderiam ocorrer em mercados spot
em duas formas: a) com transação entre usuários ou b) leilões administrados pelo
poder concedente.
Nas transações entre usuários, o poder concedente reduz a outorga de todos os
usuários no mesmo percentual e estes são livres para “alugar” parte da sua outorga
restante ao maior valor de oferta. Note que o preço de equilíbrio deste aluguel
seria equivalente a produtividade ou utilidade marginal do usuário segundo as
expressões (1) e (2). Entretanto, se o racionamento cresce de forma contínua e as
 
15
 No caso de usuário com poder monopsônico, a compra de direitos seria abaixo do necessário
para forçar a queda do seu preço. Já no caso do monopolista haveria uma compra acima das
necessidades para gerar uma elevação do preço. Essas possibilidades especulativas são
determinadas pelas curvas de custo de controle que influenciarão, por sua vez, a demanda por tais
direitos.
16
 Este é um caso de assimetria de informação tipo principal agente.
17
 Observe que, independente do critério de alocação de outorgas, sempre haverá um problema
distributivo.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
18
alocações entre usuários têm de ser realizadas de imediato, a identificação de
negócios entre os usuários pode apresentar altos custos de transação que
reduziriam sua capacidade de alocação ótima.
Nas transações administradas por leilões, o poder concedente anuncia que o
racionamento será alocado por usuário de acordo com o valor que este está
disposto a pagar para não ser racionado. Aqueles com menor disposição a pagar
serão os primeiros atingidos. Ao contrário de a informação de preços revelar-se no
mercado, todos os usuários revelam seus preços ao poder concedente por meio de
um leilão18 que ordena o racionamento. Nesse caso, a verdadeira disposição a
pagar sugeriria também para indicar uma alocação ótima da escassez de água sem,
contudo, exigir altos custos de transação.
1.3.2 - O mercado de certificados de poluição
Agora vamos considerar o caso da poluição onde o problema amplia-se com a
presença de externalidades. Os direitos assim são assegurados não só para o uso
da água para diluição, mas também pelo direito completo de compensação às
externalidades, ou seja, a parte afetada negativamente tem legalmente assegurada
uma compensação que equivale às suas perdas por conta das externalidades
negativas.
Por exemplo, a poluição do usuário A gera para o usuário firma B um custo
equivalente a uma perda de produção ∆Q. Assim, se a firma B tem direitos legais
de compensação, estaria disposta a aceitar o montante ∆Q para permitir que A
continuasse a poluir. Por outro lado, se o direito de compensação não existe ou o
direito de poluir é assegurado ao usuário A, restaria a B pagar até ∆Q ao usuário A
para cessar essas externalidades.
Quando tais negociações são possíveis, os preços da externalidade emergem e
norteiam uma alocação eficiente dos recursos quando identificam o ótimo da
poluição equivalente a Q** no Gráfico 2, independentemente de quem tem os
direitos de propriedade assegurados. Esse processo é denominado solução de
mercado coasiana, graças ao trabalho seminal desenvolvido por R. Coase,19 e tem
sido objeto da escola dos economistas institucionalistas ou economia das leis.
Essa corrente estuda o papel das instituições na definição dos direitos de
propriedade e suas repercussões na alocação eficiente dos recursos. Nesses casos,
taxas pigouvianas não seriam necessárias, pois o próprio mercado atingiria
soluções ótimas sem uso de instrumentos fiscais, ou seja, a curva de
compensações reflete uma curva de danos ambientais e, portanto, as negociações
 
18
 Este leilão poderia ocorrer pela internet de forma simultânea. Kelman (1997) sugere que na
concessão da outorga o usuário já informe sua disposição a pagar pela água racionada. Todavia,
dado o grau de incerteza sobre a ocorrência de racionamento na época da outorga, tal
procedimento parece não oferecer nenhum ganho alocativo.
19
 Prêmio Nobel de Economia em 1992. Ver texto seminal em Coase (1960).
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
19
entre as partes revelariam os valores dos danos marginais da poluição da
expressão (5) da taxa pigouviana.
Todavia, soluções coasianas não estão livres de problemas de eficiência. Da
mesma forma que o discutido para o MDU, estruturas imperfeitas de mercado
podem gerar compensações não-ótimas quando existe um poder de mercado sob
controle de alguns poucos usuários. Segundo, embora o ponto de equilíbrio
coasiano independa também de “a quem” os direitos são assegurados, os efeitos
distributivos (pagamento ou compensações) trocam de sinal em cada caso.
Terceiro, quando pagamentos ou compensações são realizados alteram-se as
restrições orçamentárias originais dos usuários e, conseqüentemente, determinam
novos pontos de equilíbrio distintos. Por último, a magnitude dos custos de
transação para impor esses direitos reduzem também o pagamento ou
compensação líquida e, portanto, resultam em pontos de equilíbrio não-ótimos.
Essa última restrição é de suma importância para a questão dos recursos
ambientais. Devido ao caráter difuso do problema ambiental, observa-se um
número elevado de partes afetadas e geradoras de externalidades. É difícil avaliar
não só a causalidade entre cada fonte de degradação com o efeito ambiental geral,
mas também o valor econômico dos recursos ambientais que não se resume
somente a valores de uso, mas inclui igualmente valores de não-uso que afetam a
sociedade como um todo. Assim, soluções coasianas acabam gerando altos custos
de transação que podem resultar em pontos de equilíbrio muito próximos à total
degradação ou exaustão.
A solução do tipo coasiana seria, contudo, a base das compensações judiciais em
relação a danos ambientais. As dificuldades institucionais de julgar o mérito,
definir o valor e impor as sanções têm encerrado custos de transação elevados que
não permitiram que tal prática fosse satisfatória em termos de eficiência
econômica.
Se o ótimo da poluição não é viável pelas compensações, é possível que a criação
de um mercado de certificados de poluição (MCP) seja a forma mais eficiente de
atingir um nível de poluição previamente estipulado, conforme se pretende com a
cobrança C2p da expressão (6).
Tal como no Gráfico 4, ao invés de um preço c* da poluição assinalado por um
poder concedente, os usuários negociariam os d* certificados de poluição. É
possível demonstrar (ver Anexo 6) que o preço de equilíbrio destes certificados
equivaleria ao preço da poluição c* de acordo com a expressão (6). Todavia, no
caso de um processo de difusão de poluição não-linear, conforme discutido
anteriormente para a cobrança, o montante de certificados teria que ser revisto a
cada rodada de negociações ou associá-lo a uma cobrança pelas externalidades
remanescentes. Novamente, a eficiência alocativa do MCP dependerá das
condições competitivas desse mercado, tal como observou-se para o MDU e o
mercado coasiano.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
20
1.4 - Conclusões
Analisando as opções de sistema de cobrança anteriormente analisadas, o Quadro
1 resume algumas características que as diferenciam.
Quadro 1
Comparação de Sistemas de Cobrança
Objetivo Dificuldades
Nível Ótimo de Cobrança para
Financiamento
Capturar verdadeira disposição a pagar dos usuários.
Nível Ótimo de Cobrança para
Equilíbrio Orçamentário
Estimar custo marginal de expansão.
Nível Ótimo de Poluição Determinarvalores para cada usuário com base nos
danos da sua externalidade.
Custo-Eficiência de Controle Determinar valores para cada usuário com base na
sua contribuição a perda da qualidade ambiental.
O que finalmente nos interessa apreender dessa análise é que na ausência de
preços adequados para os recursos naturais a alocação eficiente destes recursos
não pode ser tentada.
Conforme ilustra o Gráfico 5, onde CCmg é a curva de custo de controle marginal
privado da poluição, quando o nível de cobrança (ou de custo de um certificado de
poluição) é t, o nível de controle da firma 1, a1, é maior do que o da firma 2, a2,
que por sua vez é maior do que o da firma 3, a3.
Quanto maior for t, maior será o controle agregado das firmas, pois o preço maior
de cobrança induzirá o controle em firmas onde o custo de controle é também
maior. Assumindo custos de transação nulos e perfeita racionalidade dos agentes
econômicos, as firmas somente pagarão sobre uma unidade de poluição se o seu
custo de controle marginal exceder o valor cobrado sobre ela.
Observe no Gráfico 5 que, se a2 é imposto a todas as firmas como um típico
instrumento de controle, a firma 1 será obrigada a controlar mais a um custo
marginal maior e a firma 3 a controlar menos a um custo marginal menor. Logo o
custo total agregado de controle em t será menor do que aquele resultante de uma
imposição geral de a2.
Note também que t poderá ser tanto uma taxa pigouviana, igualando custo social
da poluição com custos sociais de seu controle, quanto uma taxa que induz de tal
forma o nível de controle das firmas que a poluição total agregada não excede um
certo nível desejado socialmente.
Qualquer que seja t, esta resultará em um certo nível de receita desde que o preço
da cobrança seja inferior ao maior custo marginal de controle. Embora a
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
21
magnitude da receita dependa do nível de cobrança, os custos administrativos de
implementação dessa cobrança — custos econômicos de transação e custos
políticos — devem ser cuidadosamente avaliados para que estes compensem a
geração de receita resultante.
Gráfico 5
Controle Ambiental e Preço da Poluição
O Quadro 2 ilustra o amplo espectro de instrumentos que poderia estar disponível,
e todos de forma explícita ou implícita, têm algum efeito de incentivo. Mesmo os
tradicionais regulamentos do tipo comando e controle, como, por exemplo,
multas, criam um efeito presumido de incentivo, porque o poluidor seria
compelido a sujeitar-se aos regulamentos a fim de evitar as sanções.
A distribuição de direitos comercializáveis de forma gratuita20 significa,
entretanto, uma transferência de renda para os usuários beneficiados. Note no
Gráfico 4 que com o leilão de d* certificados, o custo total da firma (custo da
compra de certificados mais custo de controle) é a área sombreada abaixo da linha
de preço mais a área abaixo da curva de custo de controle (Ccmg) a partir de d*.
Já quando a distribuição de d* certificados é gratuita, o custo total das firmas seria
somente parte dessa área a partir de d* que representa o custo de controle. Logo
existe uma transferência direta de renda aos usuários equivalente à área sombreada
(área abaixo da linha de preço de 0 a d*) do Gráfico 4. Note que a receita da
cobrança seria exatamente essa área equivalente aos gastos com compra de
certificados.
 
20
 Por exemplo, proporcional ao atual nível de consumo ou descarga (critério grandfather).
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
22
Quadro 2
Mecanismos de Gestão Ambiental que Incorporam Incentivos Econômicos
<-ORIENTADOS PARA O CONTROLE->
<-ORIENTADOS PARA O MERCADO->
 <-ORIENTADOS PARA O LITÍGIO->
Regulamentos e
Sanções
Taxas, Impostos
e Cobranças
Criação de
Mercado
Intervenção de
Demanda Final
Legislação da
Responsabilização
Exemplos Específicos de Aplicações Urbanas
•Padrões de
emissões
•Licenciamento
para atividades
econômicas e
relatório de
impacto ambiental
•Restrições ao uso
do solo
•Normas sobre o
impacto da
construção de
estradas, oleodutos,
portos ou redes de
comunicações
•Diretrizes
ambientais para o
traçado das vias
urbanas
•Multas sobre
vazamentos em
instalações de
armazenagem
situadas no porto
ou em terra
•Proibições
aplicadas a
substâncias
consideradas
inaceitáveis para os
serviços de coleta
de resíduos sólidos
•Quotas de uso de
água
• Cobrança pelo
uso ou degradação
de um recurso
natural
•Tributos
convencionais
fixados sob ótica
ambiental
•Royalties e
compensação
financeira para a
exploração de
recursos naturais
•Bônus de
desempenho para
padrões de
construção
•Impostos afetando
as opções de
transporte
intermodal
•Impostos para
estimular a
reutilização ou
reciclagem de
materiais
• Cobrança por
disposição de
resíduos sólidos
em aterro sanitário
•Licenças
comercializáveis
para os direitos
de captação de
água e para
emissões
poluidoras no ar
e na água
•Desapropriação
para construção
incluindo
“valores
ambientais”
•Direitos de
propriedade
ligados aos
recursos
potencialmente
impactados pelo
desenvolvimento
urbano (florestas,
solo, pesca
artesanal)
•Sistemas de
depósito-
reembolso para
resíduos sólidos
de risco
• Rotulação de
produtos de
consumo referente
a substâncias
problemáticas (por
exemplo, fosfatos
em detergentes)
•Educação para a
reciclagem e a
reutilização
•Legislação sobre
divulgação,
exigindo que os
fabricantes
publiquem a
geração de resíduos
sólidos, líquidos e
tóxicos
•Lista negra dos
poluidores
• Compensação de
danos
•Responsabilização
legal por negligência
dos gerentes de
empresa e das
autoridades ambientais
•Bônus de
desempenho de longo
prazo para riscos
possíveis ou incertos
na construção de infra-
estrutura
•Exigências de
“Impacto Líquido
Zero” para o traçado
de rodovias, oleodutos
ou direitos de
passagem de serviços
públicos, e passagens
sobre água
Fonte: Seroa da Motta, Ruitenbeek e Huber (1996).
Vale, então, aqui ressaltar cinco pontos importantes, geralmente erroneamente
interpretados nesse tema:
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
23
a) A receita de cobrança será sempre positiva desde que seu valor não seja
superior ao menor custo de controle percebido pelo usuário.21 Neste custo de
controle deve-se considerar também, além dos custos de investimentos e operação,
os custos de transação dos usuários (custo de administração e informação).
Sistemas muito complexos com altos custos de transação podem reduzir os ganhos
de eficiência desejados com o sistema de cobrança. Nesses casos de sistemas
complexos, a receita líquida gerada pode até ser negativa se consideramos os
custos de gestão incorridos para administrar o sistema.
b) A criação de mercados pode gerar receitas cujo montante é igual ao do sistema
de cobrança, desde que os direitos sejam vendidos e não cedidos gratuitamente.
c) A receita da venda de direitos ou da cobrança não representa um pagamento
dobrado dos usuários, já que com tais mecanismos de mercado reduz-se o custo
social de controle de igual monta.
d) No caso de certificados, seria possível, então, orientar uma política de água
preferencial a um setor pela simples alocação favorável a ele, em vez de criar
subsídios cruzados no sistema de cobranças. Note que com o subsídio cruzado por
cobrança, a alocação seria subótima enquanto na distribuição de direitos
preferenciais o nível ótimo seria restabelecido valendo-se de transações no
mercado.
e) Para curvas de benefício (Gráfico 1) ou de danos (Gráfico 2) pouco inclinadas
(altamente preço-elástica), o sistema de criação de mercado seria mais
aconselhável porque uma imprecisão no valor da cobrança geraria perdas
consideráveis, ou seja, num cenáriode informação imperfeita, ajustar os valores
da cobrança via monitoria fina, onde os valores seriam calibrados vis-à-vis as
respostas de mercado, poderia gerar custos econômicos bastante significativos.
Embora as opções aumentem a eficiência alocativa do recurso água, existem, pelo
menos, dois problemas comuns que podem impedir tais benefícios alocativos.
Um seria um problema técnico relativo ao conhecimento das interligações entre
bacias e do processo de difusão da poluição, amplamente analisado anteriormente.
É necessário conhecer os impactos de consumo de água e o processo de difusão de
poluentes de um usuário para evitar a transferência de externalidades. Esse
conhecimento talvez seja a maior contribuição de um Plano Nacional (Estadual)
de Recursos Hídricos. Neste aspecto uma gestão totalmente descentralizada não
seria benéfica e o Conselho Nacional (Estadual) de Recursos Hídricos terá que
atuar para mitigar tais externalidades.
O outro problema seria de ordem legal relativo à existência de um padrão de
emissão por usuário. Tal padrão é uma limitação aos ganhos de eficiência no uso
da água por qualidade porque impede a redução dos custos totais de controle.
 
21
 Ou seja, a água é um bem normal.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
24
Caso a cobrança seja permitida apenas sobre as emissões legalmente definidas, o
ganho alocativo da redução dos níveis correntes para os níveis legais seria
perdido. Se a cobrança incidir sobre emissões acima dos níveis legais, embora
seja mais eficiente, tal procedimento “legalizaria” essas emissões excedentes.
Dessa forma, a abolição desses padrões poderia ser permitida em bacias em que
um sistema de cobrança ou de criação de mercado fosse estabelecido. Entretanto,
tal alteração teria que ser objeto de apreciação do Conselho Nacional do Meio
Ambiente (Conama) dado que se trata de um requerimento legal de âmbito
nacional.
A grande vantagem do sistema de criação de mercado sobre o de cobrança é a
possibilidade de os usuários nas suas transações revelarem suas verdadeiras
disposições a pagar e seus verdadeiros custos de controle. Com isso, o poder
concedente elimina uma fonte de informação e reduz seu grau de imprecisão na
aplicação dos instrumentos econômicos.
Ademais, para que se realize uma alocação ótima por criação de mercado, é
preciso que exista um grande número de participantes comprando e vendendo com
diferentes custos e benefícios e fraca interdependência. Nessas condições de
diversificação e atomização requer um apoio institucional e legal mais sofisticado
que evite altos custos de transação entre usuários e altos custos administrativos
para o poder concedente.
Um mercado, todavia, somente sucederá se esses direitos de uso forem realmente
assegurados de forma que quem vende possa vir a comprar mais tarde caso seja
necessário e quem compra possa garantir os benefícios da sua compra. Caso
contrário a falta de credibilidade restringirá as potenciais transações. Para tanto,
não se faz possível imaginar no caso brasileiro que tais direitos tornem-se
comercializáveis de forma repentina e, portanto, apenas algumas flexibilizações
para períodos curtos podem ser contempladas, como seria o caso de leilões em
épocas de racionamento de água. À exceção disso, uma regulamentação clara e
inequívoca na regulamentação da Lei 9.433 de recursos hídricos seria um primeiro
passo para a adoção desta vantajosa opção de instrumento de gestão.
Tendo em vista a complexidade de uma aplicação plena dos critérios econômicos,
sugerimos três princípios básicos da cobrança:
a) preços ótimos para geração de receita devem obedecer à regra de preço público
em que preços são inversamente proporcionais às elasticidades-preço do usuário;
b) preços ótimos para consecução de um objetivo ambiental têm de estar
correlacionados com o nível de externalidades gerados pelos usuários em relação
ao nível total de externalidade desejado; e
c) a criação de mercados de direitos de uso tem que observar as condições
existentes de competividade.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
25
2 - A EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL
Embora a geração de receita seja uma restrição na provisão de um bem público,
observe que os critérios econômicos analisados objetivam introduzir sinais de
preço aos usuários da água de forma que estes ajustem seus níveis individuais de
uso a patamares de maior eficiência econômica, ou seja, visem alterar o padrão de
uso da água.
Os sistemas de cobrança de água, até então implementados, não têm aplicado
plenamente esses critérios econômicos de otimização. De forma geral, essas
iniciativas têm sido orientadas para a geração de receitas, para custear
parcialmente as obras de provisão ou expansão dos serviços da água, sem qualquer
critério explícito de maximização de benefícios ou minimização de custos.
As experiências de criação de mercado de água, embora escassas, também acabam
sendo implementadas com certo distanciamento de preceitos econômicos.
Algumas dessas iniciativas de cobrança e criação de mercado serão aqui
analisadas. As experiências selecionadas são aquelas cuja natureza e resultados
nos pareceram relevantes para o caso brasileiro.22 Os países selecionados para o
sistema de cobrança são França, Holanda, Alemanha, México e Colômbia e para a
criação de mercado, os Estados Unidos e Chile. Tais experiências serão analisadas
relativamente aos seguintes aspectos:
• objetivos econômicos e ambientais;
• arranjo institucional;
• critérios adotados; e
• resultados.23
 
 
A análise dos critérios adotados será associada à discussão dos critérios
econômicos da cobrança discutidos na Seção 1. Dessa forma, sugerimos ao leitor
recorrer a ela nos casos de não-entendimento dos termos e conceitos referidos.
 
 
 
22
 Descrições sumárias de outras experiências de instrumentos econômicos na área ambiental
podem ser encontradas em Seroa da Motta, Ruitenbeek e Huber (1996) e Mendes e Seroa da Motta
(1997a).
 
23
 As taxas de câmbio utilizadas nesta subseção em relação ao dólar americano foram: franco: 5,71;
guilder: 1,97; e marco: 1,80. Outras cotações em dólar já constavam no texto de referência.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
26
 2.1 - A Experiência Francesa24
 
 
A experiência francesa com a gestão de bacias hidrográficas foi a referência
principal para o NGRH. Percebendo que os recursos hídricos se deterioravam com
a crescente industrialização e urbanização do pós-guerra, o governo francês decide
promover uma reestruturação do seu sistema de gestão de recursos hídricos. Essa
mudança se inicia em 1964 com a Lei da Água que, entre outras coisas, cria os
comitês/agências de bacia e a cobrança pelo uso da água (redevances). A operação
do novo sistema começa em 1968 após a regulamentação da lei.
 
 
O país foi dividido em seis grandes bacias com seus respectivos comitês e
agências. Os comitês são compostos de 2/5 de representantes eleitos pelas
comunidades, 2/5 de usuários e 1/5 de representantes de governo. O número total
de representantes varia entre 80 e 110 membros [ver Kaczmarec (1996)].
 
 
Os presidentes das agências são nomeados pelo Ministério do Meio Ambiente,
mas seus diretores são apontados pelo Comitê por um conselho de representantes
que procura refletir a mesma estrutura de representação dos comitês. Com tal
estrutura de poder, a gestão de bacia na França é totalmente descentralizada e
participativa. Como a regionalização e a representação desses comitês e agências
são definidas em lei, a unidade de bacia na França torna-se, além de uma unidade
ambiental, também uma unidade política equivalente a uma unidade federativa, ou
seja, a política de água é definidade forma integrada e hierárquica para uma
grande bacia a que cada sub-bacia está interligada.
 
 
O sistema de cobrança teve implementação gradual e enfrentou diversos
problemas políticos. A cobrança por quantidade, por exemplo, até hoje não foi
implantada em algumas sub-bacias e a maioria dos irrigantes não participa do
sistema.
 
 
A cobrança por poluição iniciou-se com matéria orgânica e sólidos em suspensão,
enquanto salinidade e toxicidade foram introduzidas, respectivamente, em 1973 e
1974; nitrogênio e fósforo em 1982; hidrocarbonetos e outros inorgânicos em
1992.
 
 
As receitas geradas com a cobrança são aplicadas nas bacias na forma de gastos
com gestão; estudos e pesquisa; investimentos de interesse comum e empréstimos
aos usuários. No ano de 1996 geraram um total de US$ 1,8 bilhão [ver Cadiou e
Tien Duc (1996)].
 
 
Com essa receita os comitês conseguem aportar 40% dos investimentos das
bacias. Os outros 60% são majoritariamente cobertos por dotações orçamentárias
do governo central. Os investimentos são definidos qüinqüenalmente. No período
 
 
24
 Quando não-referenciada especificamente, esta subseção está baseada em informações obtidas
em Cadiou e Tien Duc (1995), Kaczmarec (1996) e Chapuy (1996). Note que as novas diretrizes
ambientais da Comunidade Européia já começam a afetar as decisões nacionais, mas não foi
possível avaliar tais efeitos neste estudo.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
27
1992/96, foram de US$ 15 bilhões, montante igual ao total gasto de 1982/91, ou
seja, gastou-se e arrecadou-se nos últimos cinco anos, o mesmo que nos 10 anos
anteriores [ver Kaczmarec (1996)].
 
 
Os comitês/agências são responsáveis pela determinação do valor da cobrança de
acordo com uma estrutura da cobrança fixada por lei. De maneira simplificada,
esta seria a estrutura:
 
 
VAQ = QU x CB x KU x KS
 
 
onde:
 
 
VAQ = valor anual a ser pago pelo usuário;
 
QU = quantidade de água consumida ou poluição gerada;
 
CB = valor da cobrança unitária;
 
KU = coeficiente setorial; e
 
KS = coeficiente ambiental.
 
 
Estas variáveis assumem diversas formas em cada caso.
 
 
VAQ é calculado separadamente para quantidade e qualidade, mas cobrados
juntos. VAQ para a poluição pode ser deduzido de uma proporção dos gastos que
os usuários estiverem realizando para reduzir sua carga poluidora.
 
 
QU pode ser derivada de uma tabela geral que estima parâmetros por tipo de
usuário.25 O consumo por quantidade pode também ser medido diretamente
quando existir hidrômetro. Para os efluentes, o usuário pode requerer uma
medição direta da carga de poluição desde que arque com o respectivo ônus.
 
 
CB, KU e KS são primeiro propostos pela Agência de Bacia e submetidos à
discussão e aprovação dos comitês.
 
 
CB para quantidade é diferenciado por água superficial e subterrânea e por zona
dentro de cada bacia. Essa diferenciação por zona considera a escassez e a
necessidade de investimentos em regularização e outras obras necessárias. A
cobrança de água subterrânea varia de US$ 0,014/m3 a US$ 0,044/m3. A cobrança
de água superficial ocorre apenas em zonas de alta escassez nas épocas de
racionamento e pode chegar, em alguns casos, a mais de US$ 0,050/m3.
 
 
CB para qualidade é uniforme para toda a bacia e diferenciado por poluente de
acordo, a princípio, com os custos de tratamento. A cobrança média por poluentes
é apresentada na Tabela 1 para as seis bacias no ano de 1993.
 
 
 
25
 Para o consumo doméstico existem fatores nacionais fixos para converter número de habitantes
em carga poluidora.
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
28
 
KU é coeficiente de consumo que diferencia o usuário. No consumo por
quantidade, por exemplo, o coeficiente de consumo urbano é geralmente superior
ao industrial. Para a cobrança de poluição urbana, existe um coeficiente (de
aglomeração) que varia de 0,5 para pequenas comunidades a 1,4 para grandes
áreas urbanas.
 
 
KS é coeficiente que diferencia o meio receptor para assimilar poluentes. No caso
da poluição, KS varia na média de 1,4 para meios com alto padrão ambiental a 1,0
para meios de baixo padrão ambiental. Para o consumo por quantidade, o próprio
CB por zona já considera este fator zonal.
 
 
 
Tabela 1
 
Cobrança de Poluição na França por Bacias Hidrográficas (US$/kg) — 1993
 
 Bacias SM OM IS NR P SS AOX METOX
 Adour - Garonne 18,7 56,2 1053,24 28,11 70,05 70,05 163,75 163,75
 Artois - Picardie 24,17 47,99 894,57 27,15 128,90 360,07 - -
 Loire - Bretagne 16,58 25,51 1062,17 36,44 118,94 - - -
 Rhin - Meuse 19,51 39,01 805,25 26,76 44,53 28,06 - 112,52
 Rhône - Méditer.
- Corse
 18,7 56,2 1053,24 28,11 70,05 70,05 163,75 163,75
 Seine –
Normandie
 22,15 49,45 794,57 44,63 - 462,70 - -
 Fonte: Cadiou e Tien Duc (1996).
 Notas: SM = Materiais Suspensos; OM = Materiais Oxidantes; IS = Substâncias Inibidoras; NR =
Nitrogênio Reduzido; P = Fósforo; SS = Sais Solúveis; AOX = Compostos Orgânicos Alógenos;
METOX = Tóxicos e outros metais.
 
 
 
Observe que o critério norteador do nível de cobrança no sistema francês é o do
custo de provisão para o consumo de quantidade e o de custo de tratamento no
caso da poluição. Tais critérios guardariam coerência com os critérios de preços
públicos e custo-eficiência.
 
 
Os valores de KU de quantidade, mais baixos para a indústria e mais altos para o
consumidor urbano, podem estar associados às diferenças nas magnitudes das
elasticidades desses setores, segundo a regra de preço público. Os coeficientes KU
de qualidade, por outro lado, parecem indicar um critério de capacidade de
pagamento do qual se privilegiam (ou punem) alguns setores de usuários, ou seja,
um subsídio cruzado distributivo entre comunidades urbanas.
 
 
Os valores de KS de qualidade, entretanto, parecem, a princípio, também seguir
um critério de custo-eficiência ao forçarem pagamentos mais altos para zonas de
maior padrão ambiental: se o padrão de um meio é mais alto que de outro, o nível
da cobrança deve ser maior para forçar maior nível de controle. Todavia, para tal
regra ser generalizada hão de se assumir funções de custo, capacidade de
assimilação e perfil de poluição iguais entre as zonas. Além do mais, o valor
UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS ECONÔMICOS PARA A VALORIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL
29
unitário da cobrança não é determinado para que os usuários no seu conjunto
atinjam um certo nível de carga total lançada ao meio.
 
 
Enquanto a receita com a cobrança por poluição tem representado mais ou menos
o triplo da arrecadada com a cobrança de quantidade, as obras de tratamento
recebem o sêxtuplo dos recursos no período 1991/96, conforme mostra a Tabela 2.
Afinal, a melhora de qualidade tem sido considerada uma fonte de aumento de
quantidade.
 
 
 
Tabela 2
 
Usos das Receitas da Cobrança de Água na França (US$ bilhões) — 1991/96
 
 Aplicação das Receitas com Cobrança Custos de
Investimentos
 Subsídios e Pequenos
Empréstimos Concedidos
 
 Tratamento de Efluentes Líquidos na Indústria 1,93 1,16
 Tratamento de Efluentes Líquidos em
Comunidades Urbanas
 
7,99
 
3,59
 Gestão de Recursos Hídricos 1,17 0,33
 Abastecimento de Água Potável 2,65 0,88
 Outros (ecologia, áreas úmidas, agricultura etc.) 0,77 0,30
 TOTAL 1991/96 14,51 6,26
 Fonte: Kaczmarec (1996).
 
 
 
Resumindo, o sistema francês adota o princípio do poluidor-usuário pagador
utilizando indiretamente critérios de preços públicos para financiamento de gastos.
 
 
Os resultados do sistema francês são

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