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Reabilitação de um paciente vítima de acidente vascular cerebral
Autora: Paula Bortolin
Professora Orientadora: Ms. Giovana de Cássia Rosim*
Fisioterapeuta co-orientadora: Cleusa Maria Francisco
Centro Universitário Anhanguera -Câmpus Leme
Resumo
Introdução
O Acidente Vascular Cerebral (AVC) é
uma patologia que se refere ao desenvolvimento
súbito de um déficit neurológico provocado por
anormalidades do aporte sangüíneo no cérebro.
Os objetivos deste trabalho foram estudar a
literatura, avaliar um caso, realizar a fisioterapia
e reavaliar em seguida, para avaliar a eficácia da
fisioterapia para o caso estudado. A metodologia
utilizada foi revisão bibliográfica, elaboração e
aplicação de uma ficha de avaliação, realização
do tratamento e reavaliação. Os dados da
avaliação e reavaliação foram analisados e foi
possível detectar melhora na recuperação da
função do lado acometido, diminuição da
espasticidade e mais facilidade na realização das
atividades da vida diária. Poucas alterações
positivas também foram detectadas na marcha a
na amplitude de movimento. O trabalho nos
permitiu concluir que a aplicabilidade dos
recursos e técnicas fisioterapêuticas tem grande
potencial para interferir na qualidade de vida do
paciente vítima de acidente vascular cerebral,
sendo a avaliação inicial um dos pontos mais
importantes para o sucesso das condutas eleitas
para o tratamento.
Palavras-chave: Acidente vascular
cerebral; hemiplegia; hemiparesia; reabilitação;
fisioterapia.
* Bolsista
FUNADESP
O acidente vascular cerebral,
popularmente conhecido como “derrame”, é
mais comum em idosos e tem tido sua freqüência
de aparecimento aumentada em pessoas cada
vez mais jovens. (Santos, 2004)
É uma doença caracterizada por um
déficit neurológico (diminuição da função)
decorrente de uma restrição na irrigação
sangüínea ao cérebro devido a uma hemorragia
(sangramento) ou isquemia cerebral. Podem ser
classificados em dois grandes grupos: o AVC
isquêmico (chamado de infarto cerebral) e o AVC
hemorrágico (chamado de hemorragia cerebral).
Como conseqüências, podem surgir síndromes
de imobilização, síndromes neurológicas,
fraqueza, distúrbios visuais, alterações de
sensibilidade, distúrbios da linguagem e da fala e
convulsão. (Santos, 2004)
Os danos às funções neurológicas são
dependentes da região afetada, da localização
anatômica e da extensão da lesão. Esses fatores
é que determinarão o quadro neurológico
apresentado por cada paciente. (O’Sullivan e
Schimitz, 1993)
André (1999) investigou a epidemiologia
do AVC e constatou uma incidência maior no
sexo masculino em relação ao sexo feminino. Em
relação à faixa etária, a incidência maior atingiu
a faixa de 56 a 65 anos para homens e 46 a 55
anos para mulher. Os fatores de risco que mais
atingem os pacientes, ainda segundo este autor,
são a hipertensão arterial, o tabagismo e o
diabetes.
André (1999) também afirma que o AVC
pode surgir em qualquer idade, inclusive entre
crianças e recém-nascidos. Afirma que a raça
negra exibe maior tendência ao desenvolvimento
de AVC, provavelmente por maior tendência
genética ao desenvolvimento de hipertensão
arterial sistêmica, concluindo assim, que os
fatores de risco dependem de fatores ambientais
e genéticos.
Quanto às causas do AVC, são
consideradas as mais comuns os trombos,
embolismos e hemorragias. (O’Sullivan e
Schimitz, 1993)
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Após o diagnóstico clínico realizado pelo
médico, o paciente pode ser encaminhado para
o serviço de Fisioterapia. Antes de iniciar o
tratamento fisioterapêutico, é feita uma avaliação
inicial para que seja possível a elaboração de
um plano de tratamento adequado. A partir daí,
deve ser realizada a monitoria contínua a fim de
acompanhar o progresso do paciente. (Downie,
1987)
Os objetivos deste trabalho foram estudar
a literatura, avaliar um caso, realizar a fisioterapia
e reavaliar em seguida, para avaliar a eficácia da
fisioterapia para o caso estudado.
Metodologia
A metodologia utilizada foi estudo da
literatura, elaboração e aplicação de uma ficha
de avaliação, realização do tratamento
fisioterapêutico em um paciente vítima de AVC
e reavaliação. O local de estudo foi o Abrigo
São Vicente de Paulo, localizado em Leme - SP,
domicílio do paciente que participou do estudo.
Apresentação do caso
O paciente A. S. V., 71 anos, viúvo há
sete meses, residente no Abrigo São Vicente de
Paulo, chegou ao abrigo apresentando um quadro
de depressão, após a morte de sua esposa,
associado a seqüelas de um AVC (acidente
vascular cerebral). Hipertenso e sedentário,
sofreu um AVC isquêmico, em setembro de
2001, ficando por dez dias hospitalizado. Após
a alta hospitalar, permaneceu por 2 anos e um
mês na residência de seus familiares, sendo em
seguida encaminhado ao abrigo, onde vive há
um ano e recebe tratamento fisioterapêutico 3
vezes por semana desde então. O paciente não
possui exames laboratorias e/ou de imagens, que
pudessem ser estudados junto com a avaliação
fisioterapêutica.
Na avaliação fisioterapêutica, realizada em
julho de 2004, foram detalhadas as disfunções
presentes no paciente. Foi observada a presença
de uma hemiparesia e hipoestesia esquerda, com
hipotonia muscular. O teste de força muscular
foi aplicado segundo Kendall (1987) utilizando
a escala: 5 para normal; 4 para bom; 3 para
regular; 2 para precário; 1 para traço de
contração; e 0 para ausência de contração. Os
resultados encontrados no teste de força
muscular foram abaixo de precário para o
hemicorpo esquerdo nos grupos musculares dos
flexores, extensores e abdutores de ombro;
flexores de punho; flexores e extensores dos
dedos da mão; flexores, extensores e abdutores
de quadril; e abdutores de quadril, certamente
afetados pela perda da função deste lado. A
goniometria revelou limitações nas amplitudes de
movimento passiva de ambos os lados, com
maior acometimento do lado esquerdo. A
avaliação também identificou dificuldades na fala
e limitações nos testes de coordenação e
equilíbrio. Seu equilíbrio sentado demonstrou-
se bom. Para a marcha, o paciente necessitou
auxílio, ou das barras paralela ou do
fisioterapeuta. Para as outras AVDs (atividades
da vida diária), o paciente demonstrou-se
totalmente dependente para vestimenta e higiene
pessoal e parcialmente dependente para sua
alimentação.
Objetivos do tratamento
De acordo com os dados da avaliação
fisioterapêutica, foram apontados os seguintes
objetivos para o caso estudado: melhorar as
amplitudes de movimento (ADM); melhorar força
muscular, sensibilidade e função; alcançar a
independência nas AVDs; melhorar equilíbrio e
coordenação; manter as capacidades
pulmonares; e promover sociabilização.
Apresentação do tratamento
O tratamento fisioterapêutico foi realizado
no abrigo São Vicente de Paulo, 3 vezes por
semana, durante 1 mês, totalizando 12 sessões
contendo exatamente os exercícios e técnicas
apresentadas a seguir. Este protocolo de
tratamento foi baseado nas considerações de
Downie (1987), O’Sullivan e Schimitz (1993) e
Kisner & Colby (1998).
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Coluna cervical e face:
• Alongamento passivo para músculos do
pescoço (flexão, extensão, flexão lateral para
direita e esquerda, rotação para direita e
esquerda);
• Exercícios de fortalecimento para os
músculos do pescoço (flexão, extensão, flexão
lateral para direita e esquerda, rotação para
direita e esquerda); e
• Mímicas faciais em frente ao espelho
com cinesioterapia ativa e resistida.
Cintura escapular:
• Cinesioterapia resistida do lado direito
e ativa do lado esquerdo;
• Movimentação passiva de escápula
esquerda; e
• Técnica de alongamento passivo e técnica
de contração / relaxamento em ombros (flexão,
extensão, abdução, adução horizontal, rotação
interna e rotação externa), bilateralmente.
Membros superiores:
• Técnica de alongamento passivo e técnica
de contração / relaxamentoem grupos
musculares do cotovelo, punho e artelhos
bilaterais;
• Exercícios de amplitude de movimento
passivos e ativo-assistidos em cotovelo,
antebraço, e punho no lado esquerdo; e
• Cinesioterapia ativa e resistida em grupos
musculares do cotovelo, punho e mão no lado
direito.
Tronco:
• Técnica de alongamento passivo em
grupos musculares da coluna lombar (extensores
e rotadores);
• Exercícios de fortalecimento de
músculos abdominais retos e oblíquos internos e
externos;
• Dissociação de cintura pélvica e
escapular ativa e resistida; e
• Cinesioterapia respiratória ativa.
Membro inferior:
• Técnica de alongamento passivo e técnica
de contração / relaxamento em grupos
musculares do quadril, joelhos, tornozelos e
artelhos, bilaterais;
• Cinesioterapia ativa e resistida em grupos
musculares do quadril, joelho, tornozelo e pé no
lado direito;
• Exercícios ativos de tornozelo para
melhor a circulação;
• Técnicas de facilitação (tapping com
gelo) visando dorsiflexão do tornozelo esquerdo;
e
• Estímulos sensitivos no lado esquerdo
utilizando diferentes texturas e temperaturas.
Treino Sentado:
• Transferência de peso para lado direito
e esquerdo;
• Dissociação de cinturas pélvica e
escapular com bastão, bola e bambolê; e
• Exercícios ativos e ativo-assistidos
membros superiores, visando equilíbrio e
coordenação.
Treino na bola:
• Exercícios de transferência de peso,
dissociação de cinturas escapular e pélvica e
treino de equilíbrio e coordenação.
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Em pé:
• Treino funcional de sentado para em pé,
com apoio no espaldar; (FIGURA 1)
• Transferência de peso com apoio no
espaldar;
• Alongamentos de membros superiores
utilizando espaldar; e
• Exercícios resistidos utilizando espaldar
e peso corporal. (FIGURA 2)
Na barra paralela:
• Treino de marcha; (FIGURA 3)
• Exercícios de coordenação e equilíbrio
com auxílio das barras; e
• Exercícios de transferência de peso.
(FIGURA 4)
No colchonete:
• Treino funcional
- De decúbito dorsal para decúbito
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lateral (para direita e esquerda);
- De decúbito lateral para decúbito
ventral;
- De decúbito ventral com os membros
inferiores estendidos para decúbito ventral com
membros inferiores flexionados;
- De decúbito ventral com os membros
inferiores flexionados para gato;
- De gato para sentado;
- De sentado para ajoelhado;
- De ajoelhado para semi-ajoelhado; e
- De semi-ajoelhado para em pé.
Treino das outras AVDs:
• Simulação da alimentação;
• Simulação higiene pessoal;
• Simulação da vestimenta.
Resultados
Os dados da avaliação inicial e da
reavaliação realizada após 1 mês de tratamento
foram comparados e, para testar o efeito do
tratamento, aplicou-se o teste t para as
observações pareadas.
Na comparação da goniometria da
cervical, a média das diferenças foi 1,83, a
variância das diferenças foi 4,6 e o valor de t foi
2,09. Para os cálculos desenvolvidos temos um
grau de liberdade de 6 – 1 = 5 ao nível de
significância de 1%. Sendo 4,03 o valor de t
correspondente na tabela do teste t para grau 5
e significância de 1% e tendo sido encontrado o
valor de t de 2,09, podemos afirmar que o
tratamento ainda não apresentou efeitos
significativos ao nível de 1%. Em termos práticos
o tratamento ainda não comprovou total
eficiência neste segmento corporal observado.
Na comparação da goniometria do
membro superior e inferior esquerdos, a média
das diferenças foi 2,6 e 2,0, respectivamente, a
variância das diferenças foi 55,4 e 12,5,
respectivamente e o valor de t foi 0,59 e 1,59,
respectivamente. Para os cálculos desenvolvidos
temos um grau de liberdade de 8 – 1 = 7 ao
nível de significância de 1%. Sendo 3,5 o valor
de t correspondente na tabela do teste t para
grau 7 e significância de 1% e tendo sido obtidos
os valores de t de 0,99 e 1,59, respectivamente
para o membro superior membro inferior
esquerdos, podemos afirmar que o tratamento
ainda não apresentou efeitos significativos ao
nível de 1%. Em termos práticos o tratamento
ainda não comprovou total eficiência para esses
segmentos corporais observados.
Já na comparação da evolução da força
muscular do membro superior e inferior direito,
a média das diferenças foi 0,59, a variância das
diferenças foi 0,34 e o valor de t foi 4,72. Para
os cálculos desenvolvidos temos um grau de
liberdade de 22 – 1 = 21 ao nível de significância
de 1%. Sendo 2,83 o valor de t correspondente
na tabela do teste t para grau 21 e significância
de 1% e tendo sido obtido o valor de t de 4,72,
podemos afirmar que o teste apresentou
resultado positivo em relação aos dados, ou seja,
houve uma significativa evolução dos graus de
força muscular no hemicorpo direito.
Resumindo, na goniometria realizada em
cervical, membro superior e inferior esquerdos,
apesar do ganho numérico das ADMs, não houve
diferença significativa sob o ponto de vista
bioestatístico, diferente da observação dos graus
de força muscular do lado direito, quando o
tratamento realizado comprovou ser eficaz, sob
o ponto de vista da bioestatística.
Quanto ao equilíbrio, coordenação e
AVDs, após um mês, não foram observadas
alterações positivas. Em compensação, o
paciente melhorou o aspecto da sociabilização
e humor, tomando iniciativas de interação com
a fisioterapeuta e com os companheiros do
Abrigo.
Conclusão
O tratamento fisioterapêutico deve ser
iniciado precocemente, o que não aconteceu
neste caso estudado, em que o paciente ficou
na casa de seus familiares por cerca de 2 anos
sem intervenção de reabilitação. Deve haver
maior empenho dos profissionais de fisioterapia
na questão das orientações familiares e do
próprio paciente, quando possível, pois a partir
do momento em que as pessoas se tornam
cientes de sua situação e da extensão das suas
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disfunções, elas se envolvem mais com o
propósito do tratamento. O fisioterapeuta deve
ajudar as pessoas a entender o ocorrido e suas
conseqüências, além de dar um retorno ou feed
back periódicos à medida que o paciente evolui
positivamente e adapta-se a nova situação.
O fisioterapeuta começará por atividades
de mobilidade. Conforme aumenta a confiança
entre o fisioterapeuta e o paciente e entre as
próprias inseguranças do paciente nessa nova
situação, deverão ser iniciados os exercícios de
fortalecimento muscular, treino de equilíbrio,
coordenação, propriocepção e atividades da
vida diária.
A partir dos autores estudados para a
realização deste estudo, não temos dúvidas dos
benefícios do tratamento fisioterapêutico para
pacientes vítimas de AVC, principalmente
quando a intervenção é precoce. Porém,
podemos afirmar que o tempo de duração do
tratamento é um fator determinante para os
sucessos alcançados, ou seja, o tempo que
utilizamos neste estudo (1 mês) foi muito curto
para atingir todos os objetivos pertinentes ao
caso. Portanto, a proposta seguinte é aplicar este
protocolo de tratamento em mais casos
semelhantes e por um tempo mais prolongado.
Referências Bibliográficas
ANDRÉ, C. Manual de AVC. 1. ed. Rio de Janeiro:
Revinter, 1999.
Downie, P. A. Cash Neurologia para Fisioterapeutas.
São Paulo: Panamericana, 1987.
FILHO, G. B. Bogliolo Patologia Geral. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.
Kendall, F. P.; Mc Creary, E. K. Músculos: Provas e
Funções. 3. ed. São Paulo: Manole, 1987.
KISNER, C.; COLBY, L. A. Exercícios Terapêuticos.
Fundamentos e Técnicas. 3. ed. São Paulo: Manole,
1998.
O’Sullivan, S.B; Schimitz, T. J. Fisioterapia
Avaliação e Tratamento. São Paulo: Manole, 1993.
Santos, J. F. L. Documentário do Jornal Notícia - Leme/
SP, 2004.
Agradecimentos
Agradecimento especial à fisioterapeuta Cleusa
Maria Francisco, responsável pelo Abrigo São Vicente
de Paulo e à Profa. Daniela Amadeu Zacatei, pela
valiosa colaboração na análise estatística dos dados.
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	reabilitacao_de_um_paciente_85-90

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