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6 1. Introdução A palavra “adolescência” vem da palavra latina “adolesco”, que significa crescer. É uma fase cheia de questionamentos e instabilidade, que se caracteriza por uma intensa busca de “si mesmo” e da própria identidade, os padrões estabelecidos são questionados, bem como criticadas todas as es colhas de vida feita pelos pais, buscando assim a liberdade e autoafirmação. O propósito do nosso trabalho, portanto, é tecer algumas considerações referidas ao eixo principal em torno do qual giram as concepções do método psicogenético de Piaget, o qual, segundo Coll e Gillièron, tem como objetivo "compreender como o sujeito se constitui enquanto sujeito cognitivo, elaborador de conhecimentos válidos", Quando se convive com adolescentes, é nítida nesses indivíduos, uma conduta um tanto quanto desafiadora. Esta conduta, discutida vastamente e sob várias perspectivas na literatura, marca a passagem da infância para a idade adulta. Nela ocorrem desequilíbrios momentâneos que contribuem para um amadurecimento cognitivo muito superior ao alcançado até a fase anterior de seu desenvolvimento, conforme procuraremos discutir na seqüência deste trabalho. (pp. EDUCERE - Revista da Educação, p. 29-42, vol. 4, n.1, jan./jun., 2004) 7 1.1 Tema Os Períodos das Operaçõrs Formais 1.1.1 Probelamatização No último periodo estágio das operações formais o o individuo consegue realizar não só operações concretas mas também operações formais. Como por exemplo responderem ao seguinte problema: Três pessoas A, B e C estão sentadas num banco de jardim. Quantas hipóteses existem relativamente à ordem em que estão sentadas? o individuo é capaz de resolve-lo colocando mentalmente todas as hipóteses de resolução e assim responder corretamente ABC, ACB, BAC, CAB e CBA. 1.1.2 Hipóteses Vamos procurar saber como se manifesta os periodos das operações formais? Para tanto estabelecemos como hipóteses a serem anlizadas: H1) -Para alem de ter a capacidade de pensar dedutivamente também tem a habilidade de pensar indutivamente, “(…) indo de observações especificas para generalizações mais amplas.” (Shaffer, 2005, p. 240) H2) O sujeito passa por períodos de reorganização profunda seguidos de períodos de integração, durante os quais um novo estádio é alcançado e as mudanças são assimiladas H3) cada estádio resulta do anterior e prepara o seguinte 8 1.2. Objectivo 1.2.1 Geral O objetivo deste artigo é oferecer uma síntese das características do pensamento do adolescente, denominado Período das Operações Formais, decorrentes dos estudos realizados por Jean Piaget e seus colaboradores, visando apresentar subsídios que possam contribuir para as discussões sobre atividades realizadas com esses sujeitos, incluindo a prática pedagógica 1.2.2 Específico Tem como objetivo "compreender como o sujeito se constitui enquanto sujeito cognitivo, elaborador de conhecimentos válidos", 9 2.1 Estágio Operacional Formal Piagetiano. Piaget afirmava que as mudanças na maneira como os adolescentes pensam sobre si mesmos, sobre seus relacionamentos pessoais e sobre a natureza da sua sociedade têm como fonte comum o desenvolvimento de uma nova estrutura lógica que ele chamava de operações formais . O pensamento operatório formal é o tipo de pensamento necessário para qualquer pessoa que tenha de resolver problemas sistematicamente. O adolescente constrói teorias e reflete sobre seu pensamento, o pensamento formal, que constitui uma reflexão da inteligência sobre si mesma, um sistema operatório de segunda potência, que opera com proposições. Segundo Piaget uma das consequências de se adquirir pensamento operatório formal é a capacidade de construir provas lógicas em que a conclusão segue a necessidade lógica. Essa habilidade constitui o raciocínio dedutivo. O pensamento do adolescente se difere do pensamento da criança, ou seja, a criança consegue chegar a utilizar as operaçõe s concretas de classes, relações e números, mas não as utiliza num sistema fundido único e total que é caractedo pela lógica do adolescente. O pensamento liberta-se da experiência direta e as es truturas cognitivas da criança adquirem m aturidade. Isso significa que a qualidade potencial do seu pensamento ou raciocínio atinge o máximo quando as operações formais encontram-se plenamente desenvolvidas. A criança não ultrapassa a lógica elementar de agrupamentos ou grupos numéricos aditivos ou multiplicativos, apresentando deste modo, uma forma elementar de reversibilidade. O adolescente apresenta a lógica das proposições relacionando-a a estrutura de classes e das relações.O pensamento formal encontra-do nos adolescentes é explicado pelo fato de se poderem estabelecer as coordenações entre os objetos que também se originam de determinadas etapas da maturação deste sujeito. No entanto, esta constituição da estrutura, não apenas tem ligação com o aparato maturacional do sujeito, mas também com o meio social no qual este está inserido. Para que o meio social atue sobre os indivíduos é necessário que estes estejam em condições de assimilar as contribuições desse meio, havendo a necessidade de uma m aturação suficiente da capacidade cerebral deste indivíduo. Estes fatores estão relacionados dinamicamente. Se o adolescente constrói teorias é porque de um lado, tornou-se capaz de reflexão e, de outro, porque sua reflexão lhe permite fugir do concreto atual na direção do possível e do abstrato. A lógica não é algo "estranho” a vida do sujeito, é justamente a expressão das coordenações operatórias necessárias para atingir determinada a ação. ( Ensino e Sociedade, Bebedouro-SP, 1 (1): 134-150., 2014) 10 O pensamento do adolescente tem a necessidade de construir novas teorias sobre as concepções já dadas, no meio social, tentando chegar a uma concepção das coisas que lhe seja própria e que lhe traga mais sucesso que seus antecessores. São característicos do processo de pensamento, os patamares de desenvolvimento, que leva o nível mais elementar de egocentrismo à descentração, subordinando o conhecimento sempre a uma constante revisão das perspectivas. O adolescente exercita idéias no campo do possível e formula hipóteses, tem o poder de construir à sua vontade ref lexões e teorias. Com esta s capacidades, o adolescente começa a definir conceitos e valores. Neste sentido, caracteriza-se a adolescência por um egocentrismo cognitivo, pois o adolescente acredita que é capaz de resolver todos os problemas que aparecem, considerando as sua s próprias concepções como a s mais corretas (crença na onipotência da reflexão). A propriedade geral mais importante do pensamento operacional for-mal, a partir da qual Piaget deriva todas as demais, refere-se à distinção entre o real e o possível. Ao contrário da criança que se encontra num período operacional concreto,o adolescente, ao começar a examinar um problema com que se defronta, tenta imaginar todas as relaçõe s possíveis que seriam válidas no caso dos dados em questão; a seguir, através de uma combinação de procedimentos de experimen- tação e de análise lógica, tentando verificar quais destas relações possíveis são re- almente verdadeiras. Uma estratégia cognitiva que tenta determinar a realidade no contexto das possibilidades tem um caráter fundamentalmente hipotético-dedutivo. O adolescente ingressa corajosamente no reino hipotético. O pensamento formal é um pensamento proposicional. As mais importantes entidades que o adolescente manipula, ao raciocinar deixaram de ser os dados rudim entares da realidade e passaram a ser afirmações que contem estes dados. O que é realmente alcançado entre os 7 e 11 anos de idade, é a cognição organizada de objetos e acontecimentos concretos per se. O adolescente realiza estas operações, mas realiza também algo que as transcende, algo necessário que é precisamente o que faz com que seu pensamento seja formal e não m ais concreto. Ele toma os resultados destas operações conc retas, Formula-os sob a forma de proposições e continua a operar com eles, ou seja, estabelece vários tipos de conexão lógica entre eles. Portanto, as operações formais, na realidade, são operações realiza-das com os resultados de ope rações anteriores. A partir destas considerações pode-se estabelecer um paradigma inicial de como os adolescentes pensam. Inicialmente organizam os vários elementos dos dados brutos com as técnicas operacionais concretas dos anos intermediários da infância. A seguir estes elementos organizados são transform ados em afirmações ou proposições que podem ser combinadas de várias maneiras. Através do método de análise combinatória, eles examinam isoladamente todas as combinações diferentes destas proposições. Para Piaget o pensamento formal é uma orientação generalizada, explicita ou implícita, pa ra solução de problemas: uma orientação no sentido de organizar 11 os dados, isolar e controlar variáveis, formular hipóteses e justificar e provar logicamente os fatos. As operações formais podem ser caracterizadas não só em termos descritivo- verbais gerais, como também em termos das estruturas lógico-matemáticas que são seus modelos abstratos. As operações interposicionais não são ações isoladas sem relações mútuas. Tal como os agrupamentos das operações intraposicionais dos anos intermediários da infância, elas formam um sistema integrado, e o problema consiste em determinar a estrutura formal deste sistema. O conjunto de instrumentos conceituais que Piaget chama de esquemas operacionais formais encontra-se num nível intermediário de generalidade. Grande parte da diferença existente entre o comportamento diário da criança e do adolescente pode ser expressa da seguinte maneira: o adolescente, como a criança vive no presente, mas ao contrário da criança também vive muito na dimensão ausente, isto é no futuro e o no reino do hipotético. Seu mundo conceitual está povoado de teorias informais sobre si mesmo e sobre a vida, cheio de planos para o seu futuro e o da sociedade, em resumo, cheio de idéias que transcendem a situação imediata, as relações interpessoais atuais, etc. 2. 2 O Pensamento e suas Operações O que surpreende no adolescente é o seu interesse por problemas inabituais, sem relação com as realidades vividas no dia- a-dia, ou por aqueles que antecipam, com uma ingenuidade desconcertante, as situações futuras do mundo, muitas vezes utópicas, com u ma facilidade de elaborar teorias abstratas. Existem alguns que escrevem que criam uma filosofia, uma política, uma estética ou outra coisa. Outros não escrevem, mas falam. Por volta de onze a doze anos efetua-se uma transformação fundamental no pensamento da criança, que marca o término das operações construídas durante a segunda infância; é a passagem do pensamento concreto para o “formal” (hipotético-dedutivo). Quais são na realidade, as condições de construção do pensamento formal? Para criança, trata-se não somente de aplicar as operações aos objetos, ou melhor, de executar, em pensamento, ações possíveis sobre estes objetos, mas de refletir estas operações independentemente dos objetos e de substituí-las por simples proposições. O pensamento concreto é a representação de uma ação possível, e o formal é a representação de uma representação de ações possíveis. As operações for mais fornecem ao pensamento um novo poder, que consiste em destacá-lo e libertá-lo do real, permitindo-lhe, assim, construir a seu modo as reflexões e teorias. ( Ensino e Sociedade, Bebedouro-SP, 1 (1): 134-150., 2014) 12 2.3 Processo adaptativo do indivíduo As reflexões precedentes poderiam levar a crer que o desenvolvimento mental termina por volta de onze anos ou doze anos, e que a adolescência é simplesmente uma crise passageira, de vida à puberdade, que separa a infância da ida-de adulta. A maturação do instinto sexual é marcada por desequilíbrios momentâ-neos, que dão um colorido afetivo muito característico a todo este ultimo período da evolução psíquica. Embora o conteúdo exato das idéias do adolescente varie, tanto numa mesma cultura como em culturas diferentes, este fato não deveria obscurecer aquilo que, segundo Piaget, é o denominador comum importante: a criança se ocupa , sobretudo com o presente, com o aqui e a agora, o adolescente amplia seu âmbito conceitual e inclui o hipotético, o futuro e o espacialmente remoto. Esta diferença tem um significado adaptativo. O a dolescente começa a assumir papéis adultos; para ele o mundo de possibilidades futuras pessoalmente relevantes escolha profissional, escolha do cônjuge, etc. Passa a ser o objeto de reflexão mais importante. De modo semelhante, o adulto que ele será em breve de verá relacionar-se intelectualmente com coletividades sociais muito menos concretas e imediatas do que a família e o círculo de amigos: a cidade, o estado, os pais, o sindicato, a igreja, etc. Em geral, o adolescente pr etende inserir-se na sociedade dos adultos por meio de projetos, de programas de vida, de sistemas muitas vezes teóricos, de planos de reformas políticas ou sociais. A verdadeira adaptação à sociedade vai-se fazer automaticamente quando o adolescente, de reformador, transformar-se em realizador. A experiência reconcilia o pensamento formal com a realidade das coisas, o trabalho efetivo e constante, desde que empreendido em situação concreta e bem definida, cura todos os devaneios. Assim é o desenvolvimento mental, constata-se que a unidade profunda dos processos que da construção do universo prático, devido à inteligência sensomotora do lactente, chega à reconstrução do mundo pelo pensamento hipotético-dedutivo do adolescente, passando pelo conhecimento do universo concreto devidoao sistema de operações da segunda infância. Estas construções sucessivas consistem em descentralização do ponto de vista, imediato e egocêntrico, para situá-lo em coordenação mais ampla de relações e noções, de maneira que cada novo agrupamento terminal integre a atividade própria, adaptando- a a um a realidade mais global. A afetividade liberta-se pouco a pouco do eu para se submeter, graças à reciprocidade e a coordenação dos valores, às leis da cooperação; a afetividade que atribui valor às atividades e lhes regula a energia, mas ela atua em conjunto com a inteligência, que lhe fornece meios e esclarece fins. 13 2.4 Os estágios do desenvolvimento humano Piaget considera 4 períodos no processo evolutivo da espécie humana que são caracterizados "por aquilo que o indivíduo consegue fazer melhor" no decorrer das diversas faixas etárias ao longo do seu processo de desenvolvimento (Furtado, op.cit.). São eles: Cada uma dessas fases é caracterizada por formas diferentes de organização mental que possibilitam as diferentes maneiras do indivíduo relacionar-se com a realidade que o rodeia (Coll e Gillièron, 1987). De uma forma geral, todos os indivíduos vivenciam essas 4 fases na mesma seqüência, porém o início e o término de cada uma delas pode sofrer variações em função das características da estrutura biológica de cada indivíduo e da riqueza (ou não) dos estímulos proporcionados pelo meio ambiente em que ele estiver inserido. Por isso mesmo é que "a divisão nessas faixas etárias é uma referência, e não uma norma rígida", conforme lembra Furtado (op.cit.). Abordaremos, a seguir, sem entrar em uma descrição detalhada, as principais características de cada um desses períodos. 2.4.1 Período Sensório-motor (0 a 2 anos) Segundo La Taille (2003), Piaget usa a expressão "a passagem do caos ao cosmo" para traduzir o que o estudo sobre a construção do real descreve e explica. De acordo com a tese piagetiana, "a criança nasce em um universo para ela caótico, habitado por objetos evanescentes (que desapareceriam uma vez fora do campo da percepção), com tempo e espaço subjetivamente sentidos, e causalidade reduzida ao poder das ações, em uma forma de onipotência" (id ibid). No recém nascido, portanto, as funções mentais limitam- se ao exercício dos aparelhos reflexos inatos. Assim sendo, o universo que circunda a criança é conquistado mediante a percepção e os movimentos (como a sucção, o movimento dos olhos, por exemplo). Progressivamente, a criança vai aperfeiçoando tais movimentos reflexos e adquirindo habilidades e chega ao final do período sensório-motor já se concebendo dentro de um cosmo "com objetos, tempo, espaço, causalidade objetivados e solidários, entre os quais situa a si mesma como um objeto específico, agente e paciente dos eventos que nele ocorrem" (id ibid). 2.4.2 Período pré-operatório (2 a 7 anos) para Piaget, o que marca a passagem do período sensório-motor para o pré- operatório é o aparecimento da função simbólica ou semiótica, ou seja, é a emergência da linguagem. Nessa concepção, a inteligência é anterior à emergência da linguagem e por isso mesmo "não se pode atribuir à linguagem a origem da lógica, que constitui o núcleo do pensamento racional" (Coll e Gillièron, op.cit.). Na linha piagetiana, desse modo, a linguagem é considerada como uma condição necessária mas não suficiente ao desenvolvimento, pois existe um trabalho de reorganização da ação cognitiva que não é dado pela linguagem, conforme alerta La Taille (1992). Em uma palavra, isso implica 14 entender que o desenvolvimento da linguagem depende do desenvolvimento da inteligência. Todavia, conforme demonstram as pesquisas psicogenéticas (La Taille, op.cit.; Furtado, op.cit., etc.), a emergência da linguagem acarreta modificações importantes em aspectos cognitivos, afetivos e sociais da criança, uma vez que ela possibilita as interações interindividuais e fornece, principalmente, a capacidade de trabalhar com representações para atribuir significados à realidade. Tanto é assim, que a aceleração do alcance do pensamento neste estágio do desenvolvimento, é atribuída, em grande parte, às possibilidades de contatos interindividuais fornecidos pela linguagem. Contudo, embora o alcance do pensamento apresente transformações importantes, ele caracteriza-se, ainda, pelo egocentrismo, uma vez que a criança não concebe uma realidade da qual não faça parte, devido à ausência de esquemas conceituais e da lógica. Para citar um exemplo pessoal relacionado à questão, lembro-me muito bem que me chamava à atenção o fato de, nessa faixa etária, o meu filho dizer coisas do tipo "o meu carro do meu pai", sugerindo, portanto, o egocentrismo característico desta fase do desenvolvimento. Assim, neste estágio, embora a criança apresente a capacidade de atuar de forma lógica e coerente (em função da aquisição de esquemas sensoriais-motores na fase anterior) ela apresentará, paradoxalmente, um entendimento da realidade desequilibrado (em função da ausência de esquemas conceituais), conforme salienta Rappaport (op.cit.). 2.4.3 Período das operações concretas (7 a 11, 12 anos) Neste período o egocentrismo intelectual e social (incapacidade de se colocar no ponto de vista de outros) que caracteriza a fase anterior dá lugar à emergência da capacidade da criança de estabelecer relações e coordenar pontos de vista diferentes (próprios e de outrem ) e de integrá-los de modo lógico e coerente (Rappaport, op.cit.). Um outro aspecto importante neste estágio refere-se ao aparecimento da capacidade da criança de interiorizar as ações, ou seja, ela começa a realizar operações mentalmente e não mais apenas através de ações físicas típicas da inteligência sensório-motor (se lhe perguntarem, por exemplo, qual é a vareta maior, entre várias, ela será capaz de responder acertadamente comparando-as mediante a ação mental, ou seja, sem precisar medi-las usando a ação física). Contudo, embora a criança consiga raciocinar de forma coerente, tanto os esquemas conceituais como as ações executadas mentalmente se referem, nesta fase, a objetos ou situações passíveis de serem manipuladas ou imaginadas de forma concreta. Além disso, conforme pontua La Taille (1992:17) se no período pré-operatório a criança ainda não havia adquirido a capacidade de reversibilidade, i.e., "a capacidade de pensar simultaneamente o estado inicial e o estado final de alguma transformação efetuada sobre os objetos (por exemplo, a ausência de conservação da quantidade quando se transvaza o conteúdo de um copo A para outro B, de diâmetro menor)", tal reversibilidade será construída ao longo dos estágios operatório concreto e formal. 15 2.8 Os Período das operações formais (12 anos em diante) Nesta fase a criança, ampliando as capacidade conquistadas na fase anterior, já consegue raciocinar sobre hipóteses na medida em que ela é capaz de formar esquemas conceituais abstratos e através deles executar operações mentais dentro de princípios da lógica formal. Com isso, conforme aponta Rappaport (op.cit.:74) a criança adquire "capacidade de criticar os sistemas sociais e propor novos códigos de conduta: discute valores morais de seus pais e contrói os seus próprios (adquirindo, portanto, autonomia)". De acordo com a tese piagetiana, ao atingir esta fase, o indivíduo adquire a sua forma final de equilíbrio, ou seja, ele consegue alcançar o padrão intelectual que persistirá durante a idade adulta. Isso não quer dizer que ocorra uma estagnação das funções cognitivas, a partirdo ápice adquirido na adolescência, como enfatiza Rappaport (op.cit.:63), "esta será a forma predominante de raciocínio utilizada pelo adulto. Seu desenvolvimento posterior consistirá numa ampliação de conhecimentos tanto em extensão como em profundidade, mas não na aquisição de novos modos de funcionamento mental". Cabe-nos problematizar as considerações anteriores de Rappaport, a partir da seguinte reflexão: resultados de pesquisas têm indicado que adultos "pouco- letrados/escolarizados" apresentam modo de funcionamento cognitivo "balizado pelas informações provenientes de dados perceptuais, do contexto concreto e da experiência pessoal" (Oliveira, 2001a:148). De acordo com os pressupostos da teoria de Piaget, tais adultos estariam, portanto, no estágio operatório-concreto, ou seja, não teriam alcançado, ainda, o estágio final do desenvolvimento que caracteriza o funcionamento do adulto (lógico-formal). Como é que tais adultos (operatório-concreto) poderiam, ainda, adquirir condições de ampliar e aprofundar conhecimentos (lógico-formal) se não lhes é reservada, de acordo com a respectiva teoria, a capacidade de desenvolver "novos modos de funcionamento mental"? - aliás, de acordo com a teoria, não dependeria do desenvolvimento da estrutura cognitiva a capacidade de desenvolver o pensamento descontextualizado? Bem, retomando a nossa discussão, vale ressaltar, ainda, que, para Piaget, existe um desenvolvimento da moral que ocorre por etapas, de acordo com os estágios do desenvolvimento humano. Para Piaget (1977 apud La Taille 1992:21), "toda moral consiste num sistema de regras e a essência de toda moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por estas regras". Isso porque Piaget entende que nos jogos coletivos as relações interindividuais são regidas por normas que, apesar de herdadas culturalmente, podem ser modificadas consensualmente entre os jogadores, sendo que o dever de 'respeitá-las' implica a moral por envolver questões de justiça e honestidade. Assim sendo, Piaget argumenta que o desenvolvimento da moral abrange 3 fases: (a) anomia (crianças até 5 anos), em que a moral não se coloca, ou seja, as regras são seguidas, porém o indivíduo ainda não está mobilizado pelas relações bem x mal e sim pelo sentido de hábito, de dever; 16 (b) heteronomia (crianças até 9, 10 anos de idade), em que a moral é = a autoridade, ou seja, as regras não correpondem a um acordo mútuo firmado entre os jogadores, mas sim como algo imposto pela tradição e, portanto, imutável; (c) autonomia, corresponde ao último estágio do desenvolvimento da moral, em que há a legitimação das regras e a criança pensa a moral pela reciprocidade, quer seja o respeito a regras é entendido como decorrente de acordos mútuos entre os jogadores, sendo que cada um deles consegue conceber a si próprio como possível 'legislador' em regime de cooperação entre todos os membros do grupo. Para Piaget, a própria moral pressupõe inteligência, haja vista que as relações entre moral x inteligência têm a mesma lógica atribuída às relações inteligência x linguagem. Quer dizer, a inteligência é uma condição necessária, porém não suficiente ao desenvolvimento da moral. Nesse sentido, a moralidade implica pensar o racional, em 3 dimensões: a) regras: que são formulações verbais concretas, explícitas (como os 10 Mandamentos, por exemplo); b) princípios: que representam o espírito das regras (amai- vos uns aos outros, por exemplo); c) valores: que dão respostas aos deveres e aos sentidos da vida, permitindo entender de onde são derivados os princípios das regras a serem seguidas. Assim sendo, as relações interindividuais que são regidas por regras envolvem, por sua vez, relações de coação - que corresponde à noção de dever; e de cooperação - que pressupõe a noção de articulação de operações de dois ou mais sujeitos, envolvendo não apenas a noção de 'dever' mas a de 'querer' fazer. Vemos, portanto, que uma das peculiaridades do modelo piagetiano consiste em que o papel das relações interindividuais no processo evolutivo do homem é focalizado sob a perspectiva da ética (La Taille, 1992). Isso implica entender que "o desenvolvimento cognitivo é condição necessária ao pleno exercício da cooperação, mas não condição suficiente, pois uma postura ética deverá completar o quadro" (idem p. 21). 17 Conclusão Contudo o nosso estudo investigativo podemos dizer que teoria de Piaget cujas proposições nucleares dão conta de que a compreensão do desenvolvimento humano equivale à compreensão de como se dá o processo de constituição do pensamento lógico- formal, matemático. Tal processo, que é explicado segundo o pressuposto de que existe uma conjuntura de relações interdependentes entre o sujeito conhecedor e o objeto a conhecer, envolve mecanismos complexos e intrincados que englobam aspectos que se entrelaçam e se complementam, tais como: o processo de maturação do organismo, a experiência com objetos, a vivência social e, sobretudo, a equilibração do organismo ao meio. Em face às discussões apresentadas no decorrer do trabalho, cremos ser lícito concluir que as idéias de Piaget representam um salto qualitativo na compreensão do desenvolvimento humano, na medida em que é evidenciada uma tentativa de integração entre o sujeito e o mundo que o circunda. Paradoxalmente, no que pese a rejeição de Piaget pelo antagonismo das tendências objetivista e subjetivista o papel do meio no funcionamento do indivíduo é relegado a um plano secundário, uma vez que permanece, ainda, a predominância do indivíduo em detrimento das influências que o meio exerce na construção do seu conhecimento. 18 Referências bibliográficas Shaffer, D. (2005). Psicologia do Desenvolvimento infância e adolescência. São Paulo. Cadernos de Educação: Ensino e Sociedade, Bebedouro-SP, 1 (1): 134-150, 2014. BECKER, F. A propósito da "desconstrução". Educação e Realidade, Porto Alegre, 19(1):3-6, jan/jun. 1994 FURTADO, O.; BOCK,A.M.B; TEIXEIRA, M.L.T. Psicologias: uma introdução ao estudo de psiclogia. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 1999 BEE, Helen. O Ciclo Vital. Ed. Artes Médicas, 1997. COLE, Michael e COLE Sheila R. O Desenvolvimento da Criança e do Adolescente. Trad. Magda França Lopes – 4. ed. – Porto Alegre: Artmed, 2003. FLAVELL, John H. 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