Buscar

Princípios constitucionais penais - Celso Afonso Favoretto

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 39 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 39 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 39 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

AFFONSO CELSO FAVORETTO
PRINCÍPIOS
CONSTITUCIONAIS
PENAIS
Dignidade da pessoa humana S Intervenção mínima
S Igualdade
S Legalidade e anterioridade 
S Irretroatividade da lei penal 
^ Personalidade da pena 
/ Individualização da pena 
» Humanidade
S Alteridade 
S Culpabilidade 
S Proporcionalidade 
S Ofensividade ou lesividade 
S Insignificância 
v' Adequação social
Prefácio 
Edson Luz Knippel
re?EDITORA 
REVISTA DOS TRIBUNAIS
SUMÁRIO
IN T R O D U Ç Ã O ............................................................................................................ I 5
1. C O N C EIT O E IM PO RTÂN CIA DOS P R IN C ÍP IO S ....................... 19
2. O D IREITO PEN A L N O ESTADO D EM O CRÁ TICO DE D IREI­
T O ............................................................................................................................... 25
3 . BEM JU R ÍD IC O -P E N A L ................................................................................ 24
3 .1 C onceito e n oções gerais .................................................................. 2 l)
3 .2 Relação do bem ju ríd ico co m os princípios con stitu cio ­
nais p e n a is .............................................................................................. 30
3 .3 Bem ju ríd ico-p en al e C o n stitu ição ............................................. 32
3 .4 Bem ju ríd ico -p en al d ifu so............................................................... 3 3
4 . PRIN C ÍPIO DA D IG N ID AD E DA PESSOA H U M A N A ................. 35
4 .1 N oções in tro d u tó ria s ......................................................................... 35
4 .2 Dignidade hum ana e direito p e n a l............................................. 40
4 .3 A dignidade hum ana e o sistem a carce rá rio ......................... -II
4 .4 A dignidade da pessoa hum ana na fase de investigação
crim inal: o papel exercido pela m íd ia .................................... 4 ^
4 .5 D ign id ade h u m an a e crim e s se x u a is . A Lei 1 2 .0 1 5 /
2 0 0 9 ............................................................................................................ 47
4 .6 A questão do bullying à luz da dignidade h u m a n a ............ 49
4 .7 O D ireito Penal do inim igo à luz da dignidade hum ana.
Aplicabilidade no D ireito Penal b rasileiro?......................... 5 5
- 5 . PRIN C ÍPIO DA IG U A L D A D E .................................
5 .1 N oções in tro d u tó ria s .......................................
5 .2 C onceito e real significado da igualdade
59
"W
f>0
1 2 | PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS
5 .3 Isonom ia form al e isonom ia m aterial...................................... 6 3
5 .4 A igualdade na individualização da p e n a ................................ 6 4
5 .5 A Lei M aria da Penha (Lei 1 1 .3 4 0 /2 0 0 6 ) ................................ 6 5
5 .6 A Lei de D iscrim inação Racial (Lei 7 .7 1 6 /1 9 8 9 ) ................. 6 9
5 .7 Análise crítica da redação da Lei de T ortu ra.......................... 7 0
5 .8 A p roteção penal das pessoas portad oras de deficiência
física ............................................................................................................ 71
5 .9 A parte crim inal do E statu to do ín d io ....................................... 75
5 .1 0 Dos p roced im en tos investigativos da Lei do C rim e O r­
gan izad o.................................................................................................... 7 7
6. PRIN CÍPIO S DA LEG A LID A D E E DA A N T ER IO R ID A D E .... 8 3
6 .1 N oções in tro d u tó ria s .......................................................................... 8 3
6 .2 O princípio da legalidade ao longo da história no B ra­
sil .................................................................................................................. 8 4
6 .3 Significados do princípio da legalidade.................................... 8 6
6 .4 Breves con sid erações sobre a origem h istó rica .................... 8 8
6 .5 Postulados do princípio da leg alid ad e ..................................... 8 8
6 .6 O princípio da legalidade na teoria geral do c r im e ........... 9 0
6 .7 C aracterísticas do tipo penal. A questão dos tipos penais
abertos e das norm as penais em b ra n co ................................ 91
7. PRIN CÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI P E N A L ............ 9 5
7.1 N oções in tro d u tó ria s ......................................................................... 9 5
7 .2 A lei processual p e n a l ........................................................................ 9 7
7 .3 Lei penal benéfica em período de vacatio le g i s .................... 9 8
7 .4 A questão referente à Lei 1 1 .4 6 4 /2 0 0 7 ..................................... 1 0 0
7 .5 A Súm ula V inculante 2 6 do S T F ................................................. 103
7 .6 A questão da Lei de D ro g a s ............................................................ 1 0 4
7 .7 A retroatividade da lei benéfica e a execu ção p e n a l ......... 1 0 7
7 .8 A retroatividade da lei penal nos crim es p erm an en te e
co n tin u ad o .............................................................................................. 1 0 7
8. PRIN CÍPIO DA PERSO N ALID AD E DA P E N A .............................. 109
8 .1 N oções g e ra is ...................................................................................... 109
8 .2 Os efeitos da sanção penal perante terceiros. O aspecto
inform al do princípio da personalidade da p en a.............. 1 1 0
9. PRIN CÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA P E N A ...................... 113
9 .1 N oções in tro d u tó ria s ...................................................................... 113
9 .2 Visão geral das etapas da individualização da p en a ....... 1 1 4
9 .3 Individualização legislativa......................................................... 115
9 .4 Individualização ju d icial............................................................... 1 16
9 .5 Individualização e x e cu tó ria ........................................................ 123
9 .6 O princípio da coculpabilidade no con texto da aplicação
da p e n a ...................................................................................................... 1 24
10. PRIN CÍPIO DA H U M A N ID A D E............................................................ 1 27
1 0 .1 N oções in tro d u tó rias ....................................................................... 1 27
1 0 .2 A spectos h is tó rico s .......................................................................... 128
1 0 .3 O p eríodo hum anitário do D ireito Penal. O papel de
B eccaria na defesa de um Direito Penal hum anizado e 
p rop orcional........................................................................................... 130
1 0 .4 O princípio da hum anidade das penas em relação ao
Regim e Disciplinar D iferenciado (R D D )............................... 133
Quadro sinótico dos princípios constitucionais penais 
e x p líc ito s ......................................................................................... 1 36
11. PRIN CIPIO DA IN TERV EN ÇÃ O M ÍN IM A ....................................... 13 7
1 1 .1 N oções in tro d u tó ria s ....................................................................... 137
1 1 .2 O princípio da fragm entariedade.............................................. 1 38
1 1 .3 A Lei de C ontravenções Penais à luz dos princípios da
in terven ção m ínim a e da fragm entariedade........................ 139
1 1 .4 Aspectos da Política Criminal atual. A influência da mídia
e do clam or públicona elaboração de leis penais............ 141
12 . PRIN C ÍPIO DA A LT E R ID A D E ................................................................. 147
12 .1 N oções in tro d u tó ria s ........................................................................ 147
SUMÁRIO | 1 3
1 4 | PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS
1 2 .2 O p rincípio da alteridade e a a u to le sã o ................................... 1 4 8
1 2 .3 A questão da Lei de D ro g a s ............................................................ 1 4 8
13. PRIN CÍPIO DA C U LPA B ILID A D E......................................................... 151
1 3 .1 N oções in tro d u tó ria s ......................................................................... 151
1 3 .2 Significados distintos da culp abilid ad e................................... 151
1 3 .3 N exo de ca u sa lid a d e .......................................................................... 1 5 3
1 3 .4 E x ce çõ e s ao princípio da cu lp ab ilid ad e................................. 1 5 3
1 3 .5 Responsabilidade penal da pessoa ju r íd ic a .......................... 1 5 4
1 3 .6 A questão da em b ria g u e z ................................................................ 1 5 7
14. PRIN CÍPIO DA PRO PO R C IO N A LID A D E.......................................... 15 9
1 4 .1 N oções in tro d u tó ria s ......................................................................... 1 59
1 4 .2 Das proibições de excesso e p roteção in su ficien te........... 161
1 4 .3 C onteúdo do princípio da proporcionalid ad e..................... 1 62
1 4 .4 Proporcionalidade e razoabilid ad e............................................ 1 6 4
1 4 .5 A p ro p o rcio n alid ad e em re lação à P arte E sp ecia l do
Código P en al.......................................................................................... 1 6 6
15. PRIN CÍPIO DA LESIVID AD E O U O FEN SIV ID A D E.................... 1 6 9
1 5 .1 N oções g e ra is ......................................................................................... 1 6 9
1 5 .2 Os crim es de perigo a b stra to ......................................................... 1 7 0
16. PRIN C ÍPIO DA IN SIG N IFIC Â N C IA ..................................................... 1 7 5
17. PRIN CÍPIO DA A D EQ U A ÇÃ O S O C IA L ............................................. 181
Q uadro sinótico dos princípios con stitu cionais penais im plí­
c ito s ..................................................................................................................... 1 83
R EFER ÊN C IA S BIBLIO G RÁFICA S.................................................................. 185
INTRODUÇÃO
O Direito Penal pode ser apontado como o ramo do ordena­
mento jurídico que tem o poder de impor as mais árduas sanções 
em face do indivíduo, uma vez que a prática da infração penal 
possibilita a aplicação de reprimendas que se voltam diretamente 
à liberdade do ser humano.
Em virtude dos elevados índices de criminalidade, a inter­
venção do Direito Penal é diariamente defendida para combater 
as referidas estatísticas. Há que se ressaltar que, muitas vezes, 
discussões desta estirpe são desenvolvidas por pessoas despre­
paradas, que não apresentam ligação alguma com a área jurídica 
e, tampouco, com o Direito Penal.
A influência da mídia e do clamor público no Direito Penal 
m ostra-se cada vez mais intensa, fato que propicia tratamento 
um tanto singelo e leviano acerca de assuntos de grande com ­
plexidade.
Devido à grande repercussão provocada pelo crime, os meios 
de comunicação investem cada vez mais no jornalism o especia­
lizado em discutir questões ligadas à criminalidade. Porém, nem 
sempre as discussões observam o conteúdo da Constituição e da 
legislação ordinária, desenvolvendo-se, portanto, em nível su­
perficial e, muitas vezes, equivocado diante dos dogmas previstos 
pelo ordenamento jurídico.
Rogério Greco segue a mesma linha de pensamento, ao afir­
mar que “as discussões travadas são as mais bisonhas e grotescas 
possíveis. Todos se intitulam especialistas no assunto. A fim de 
acabar com as práticas criminosas, propõem soluções sempre 
ligadas à neocriminalização ou a neopenalização, ou seja, as pro-
A lição do mencionado autor retrata que o Direito Penal 
tradicional pode se mostrar insuficiente para resguardar determi­
nados bens jurídicos, notadamente aqueles que ostentam natureza 
difusa e coletiva.
Assim sendo, a observância inegociável aos direitos e garan­
tias fundamentais pode se mostrar um óbice ao combate em face 
de formas modernas de criminalidade. Não se trata de ignorar o 
catálogo de direito previstos na Constituição, mas, na realidade, de 
uma flexibilização a determinados direitos, para que, desta forma, 
seja possível reprimir comportamentos que exigem postura mais 
rigorosa por parte do Estado.
I I , ru iN t ll'l( )M ON STITUCIONAIS PENAIS
PRINCÍPIO DA DIGNIDADE 
DA PESSOA HUMANA
S u m á r i o : 4.1 Noções introdutórias-4.2 Dignidade humana e di­
reito penal -4.3 A dignidade humana e o sistema carcerário-4.4 
A dignidade da pessoa humana na fase de investigação criminal: 
o papel exercido pela mídia - 4.5 Dignidade humana e crimes 
sexuais. A Lei 12.01 5/2009 - 4.6 A questão do bullyinga luz da 
dignidade humana - 4.7 O Direito Penal do inimigo à luz da 
dignidade humana. Aplicabilidade no Direito Penal brasileiro?
4
4.1 Noções introdutórias
A Constituição brasileira de 1988 foi elaborada após longo 
período em que o País ficou sob os ditames da ditadura militar, 
lendo representado considerável avanço no sentido de proteção 
aos direitos fundamentais da pessoa humana.
De fato, a edição de um novo Texto Constitucional repre­
senta, na verdade, a criação de um novo Estado;que passa a ser 
regido por novas diretrizes. O cenário sociopolítico da época é 
bem exposto pelo historiador Boris Fausto. Vejamos:
“A Assembleia Nacional Constituinte começou a se reunir 
em 1 ,° de fevereiro de Í9 8 7 . As atenções e as esperanças do País 
voltaram-se para a elaboração da nova Constituição. Havia um 
anseio de que ela não só fixasse os direitos dos cidadãos e as 
instituições básicas do País, como resolvesse muitos proble­
mas fora de seu alcance. (...) A Constituição de 1988 refletiu o 
avanço ocorrido no País na área da extensão dos direitos sociais 
e políticos aos cidadãos em geral”.
O mesmo autor conclui seu raciocínio afirmando que “a 
Constituição de 1988 pode ser vista com o o m arco que pôs fim aos 
últimos vestígios form ais do regime au toritário” .l (destacamos)
A Lei Maior de 1988 transparece em suas características
o m om ento h istó rico em que foi elaborada, em virtude de 
consagrar vasto elenco de direitos e garantias fundamentais, 
de modo a afastar o autoritarism o que imperava no período 
anterior a 1988.
A Constituição atual diferencia-se dos textos anteriores em 
sua própria estrutura, uma vez que trata dos direitos fundamentais 
antes mesmo de abordar o próprio Estado, lição que é trazida por 
Flávia Piovesan. Confira-se:
“Note-se que as C onstituições anteriores primeiramente 
tratavam do Estado, para, somente então, disciplinarem os di­
reitos. Ademais, eram petrificados temas afetos ao Estado e não 
a direitos, destacando-se, por exemplo, a Constituição de 1967, 
ao consagrar como cláusula pétrea a Federação e a República. A 
nova topografia constitucional inaugurada pela Carta de 1988 
rellete a mudança paradigmática da lente ex parte príncipe para a 
lente ex parte populi. Isto é, de um Direito inspirado pela ótica do 
Estado, radicado nos deveres dos súditos, transita-se para a um 
Direito inspirado pela ótica da cidadania, radicado nos direitos 
dos cidadãos (...). Assim, é a sob a perspectiva dos direitos que se 
afirma o Estado e não soba perspectiva do Estado que se afirmam 
os direitos’'.2
No Estado Democrático de Direito instituído pelo consti­
tuinte de 1988, a dignidade da pessoa humana ostenta status de 
princípio fundamental, de modo a constituir diretriz obrigatória 
a todos os operadores do Direito.
3 6 PRIN CÍPIOS CON STITUCIO N AIS PENAIS
1. F a u s t o , Boris. H istória concisa do B rasil. 2. ed. São Paulo: Edusp, 2009 . 
p. 288-289 .
2. P io v iísa n , Flávia. D ireitos hum anos e d ireito constitucional in tern a c ion a l
10. ed. São Paulo: Saraiva, 20 0 9 . p. 33.
PRIN CÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 3 7
Nas palavras de Dalmo de Abreu Dallari, “não é uma verda-
i Ir 11 a C Constituição uma lei que tenha o nome de Constituição, mas 
i|iic apenas imponha regras de comportamento, estabelecendo 
iima ordem arbitrária que não protege igualmente a dignidade de 
todos os indivíduos e que não favorece a sua promoção”.3
Pode ser considerado o principal fundamento da República
I rclerativa do Brasil, de observância obrigatória para alcançar os 
próprios objetivos traçados pelo legislador constituinte.
Com relação ao conteúdo do princípio da dignidade da
I x ssoa humana, há que se constatar a dificuldade em estabelecer 
sru conceito, uma vez que, devido à sua magnitude, a tarefa de 
.i nletizá-lo em escassas palavras não é das mais simples.
Contudo, acreditamos que o referido princípio esteja con- 
rcituado de forma competente nas palavras de Ingo Wolfgang 
Sarlet, ora transcritas:
“temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrín­
seca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz mere­
cedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da 
comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos 
e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo 
e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham 
a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida 
saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e 
corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em 
com unhão com os demais seres humanos, mediante o devido 
respeito aos demais seres que integram a rede da vida”.4
Desta form a, resta-nos absolutam ente induvidoso que a 
dignidade da pessoa seja, de fato, um princípio superior, o qual
3 . D a l l a r i, Dalmo de Abreu. C onstitu ição e constituinte. 4 . ed. São Paulo: 
Saraiva, 2 0 1 0 , p. 29.
4. S a r l e t , Ingo Wolfgang. D ign id ad ed ap essoa hum ana e d ireitosfundam entais 
na C onstitu ição F ed eral d e 1988. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 
2 0 0 9 , p .67.
3 8 ' PRIN CÍPIO S CON STITUCIO N AIS PENAIS
acaba por nortear todos os demais princípios ju ríd icos e, por 
conseqüência, todo o ordenamento jurídico positivo.
Todavia, poucas vezes a doutrina fornece critérios objetivos 
para se verificar o desrespeito à dignidade do ser humano. Em 
outras palavras, este verdadeiro pilar estruturante da República 
Federativa do Brasil não pode constar apenas na letra fria da 
Constituição, sendo necessário concretizá-lo no cotidiano de 
cada indivíduo.
O constituinte estabeleceu uma série de objetivos fundamentais 
a se alcançar. Todavia, passados mais de vinte anos de vigência do 
Texto Constitucional, muitos deles ainda carecem de efetividade, 
constituindo-se em meras normas programáticas ã espera de efetiva 
concretização.
De acordo com o art. 3.° da Lei Magna, constituem objetivos 
fundamentais da República Federativa do Brasil:
Art. 3.°, I, da CF/1988 Construir uma sociedade livre, justa e so­
lidária.
Art. 3.°, II, da CF/1988 Garantir o desenvolvimento nacional.
Art. 3.°, III, da CF/1988 Erradicar a pobreza e a marginalização e re­
duzir as desigualdades sociais e regionais.
Art. 3.°, IV, da CF/1988 Promover o bem de todos, sem precon­
ceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e 
quaisquer outras formas de discriminação.
Além disso, a Constituição consagra vasta gama de direitos 
fundamentais, dentre os quais merecem destaque os direitos so­
ciais encartados no art. 6.°. Diante das referidas metas, conclui-se 
que a inobservância de determinados padrões mínimos dentro de 
uma sociedade inviabiliza a própria dignidade humana.
Neste sentido, Celso Antonio Pacheco Fiorillo desenvolve 
posicionam ento relevante, ao apresentar a ideia de um “piso 
m ínim o norm ativo” ou “piso vital m ínim o”, como prefere parte 
da doutrina.
Na importante lição do mencionado autor, “para que a pessoa 
liumana possa ter dignidade (CF, art. 1.°, 111), necessita que lhe 
m iiiiii assegurados os direitos sociais previstos no art. 6 o da Carta 
Miigna (educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, previdência 
m u ml, proteção à m aternidade e à infância e assistência aos desam ­
parados) como ‘piso mínimo normativo’, ou seja, com o direitos 
básicos".5 (destacamos)
Síntese:
Concretização da Dignidade HumanaI
Devem ser assegurados os direitos básicos do ser humano, em especial 
aqueles previstos no art. 6.° da Constituição.
PRIN CÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA j 3 9
Sem que sejam assegurados os direi­
tos básicos do ser humano, não se 
pode falar em dignidade da pessoa 
humana, que passa a ser, apenas e 
tão somente, uma previsão constitu­
cional carente de efetividade.
Trata-se de posicionamento que busca a concretização do 
princípio da dignidade da pessoa humana, por meio do cum ­
primento efetivo das disposições garantidoras instituídas pelo 
próprio legislador constituinte.
Somente com o cumprimento das metas estabelecidas pelo 
constituinte é que se pode falar em respeito à dignidade do ser
Educação 
J Saúde 
Trabalho 
Lazer
Segurança etc.
5. F io rillo , Celso Antonio Pacheco. O direito de antena em fa c e do direito 
am bien ta l no B rasil. São Paulo: Saraiva, 2000 . p. 14.
4 0 PRIN CÍPIO S CON STITUCIO N AIS PENAIS
humano. Caso contrário, o rico conteúdo do referido princípio 
ficará absolutamente desprovido de efetividade, o que, sem dúvida 
alguma, não foi o objetivo do legislador constituinte de 1988.
4.2 Dignidade humana e direito penal
A despeito de se irradiar por todo o ordenamento jurídico, 
não há como negar que o princípio da dignidade humana exerce 
especial influência no contexto do Direito Penal, tendo em vista 
que se trata do ramo do Direito que invade de forma mais severa 
a liberdade do indivíduo, tendo a possibilidade de lhe aplicar as 
sanções mais rígidas que o arcabouço jurídico pátrio contempla.
Tal incidência não permite, contudo, considerar a dignidade 
humana como princípio especificamente penal. Conforme ensina 
Guilherme de Souza Nucci,
“a dignidade da pessoa hum ana é uma m eta a ser atingida pelo 
Estado e pela sociedade brasileira, nada tendo a ver com um prin­
cípio penal específico. Quem pratica um homicídio, por exemplo, 
m erecendo punição, ofendeu a dignidade da pessoa humana. 
Logo, todas as normas penais estão, em conjunto, protegendo o 
respeito ao ser humano e seus valores fundamentais. N ão se trata 
de um princípio penal, mas de um fundam ento do Estado D em ocrático 
de Direito”.6 (destacamos)
Diante da forte influência entre o Direito Penal e a dignidade 
humana, Guilherme de Souza Nucci caracteriza esta como um 
princípio regente do Direito Penal, do qual jam ais pode prescindir
o legislador ao edificar leis penais e tampouco o magistrado, ao 
aplicar o conteúdo da norma abstrata ao caso concreto.7
A influência da dignidade humana não se restringe ao Direito 
Penal, sendo certa a sua relevância no sistema criminal como um
6. Nucci, Guilherme de Souza. M anual d e d ireito penal. í>. ed. São Paulo: Ed. 
R T ,2010. p. 84.
7. Nucci, Guilherme de Souza. P rincípios constitucionais p en ais e processuais 
pen ais. São Paulo: Ed. RT, 20 1 0 . p. 39.
P R IN C ÍP IO DA D IG N ID A D E DA PESSO A H UM ANA 4 1lodo. Assim, tam bém rege o processo penal e a execução penal, 
rsl a última em im portantes aspectos, tais com o a situação existente 
no sistem a carcerário.
Importante:
Não se pode confundir o princíp io da dignidade da pessoa humana (art.
I.", III, da CF/1988) com o princíp io da hum anidade das penas (art. 5.°, 
XLVI1, da CF/1988). Apesar da íntima relação entre os princípios, o primeiro 
lem caráter geral, aplicando-se a todos os ramos do Direito, ao passo que o 
segundo é princíp io específico do D ireito Penal.
Nos tópicos subsequentes, buscaremos abordar alguns aspec- 
tos nos quais se verifica a relação concreta da dignidade humana 
com o Direito Penal.
4.3 A dignidade humana e o sistema carcerário
Quando se fala em afronta ao princípio da dignidade da 
pessoa hum ana, o tema relacionado ao sistem a carcerário é de 
abordagem obrigatória.
A falta de efetividade das disposições previstas pela Constitui­
ção e pela legislação ordinária pode ser apontada como um sério 
problema a ser combatido, sendo certo que as condições apresenta­
das pelo cárcere no Brasil se encontram nessa triste estatística. Não 
raras vezes, a solução de determinado problema é buscada por meio 
da edição de novas leis, quando, na realidade, o simples cumpri­
mento das disposições vigentes já seria apto a resolver a situação.
Além de princípios penais fundamentais, o art. 5.° da Consti­
tuição Federal de 1988 também dedicou alguns dispositivos para 
abordar especificam ente a questão penitenciária.
A Lei Magna prevê que “a pena será cumprida em estabele­
cim entos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade 
e o sexo do apenado” (art. 5.°, XLVIII, da CF/1988), garante aos 
presos “o respeito à integridade física e moral” (art. 5.°, XLIX, da 
CF/19 8 8 ), além de estabelecer que “às presidiárias serão assegu­
radas condições para que possam permanecer com seus filhos 
durante o período de amamentação” (art. 5.°, L, da CF/1988).
5 8 PRIN CÍPIO S CON STITUCIO N AIS PENAIS
e garantias fundamentais em face do acusado, conforme defende 
a teoria de G üntherjakobs.
Como dito de in ício , há posições no sentido de apontar 
resquícios do Direito Penal do inimigo no direito brasileiro. Os 
exemplos costumeiramente citados são a Lei dos Crimes Hedion­
dos, o Regime Disciplinar Diferenciado, dentre outros.
A nós não parece que assim seja, uma vez que não se pode 
confundir Direito Penal do inimigo com hipóteses nas quais o 
Estado atua de maneira mais severa, ainda que os contornos de 
sua atuação possam ser contestados. Desta forma, não há como 
vigorar no Brasil sistema idêntico ao previsto para o Direito Penal 
do inimigo, pois seria completamente incompatível com a ordem 
jurídica vigente.
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
5
S u m á r i o : 5.1 Noções introdutórias-5.2 Conceitoe real significado 
da igualdade - 5.3 Isonomia formal e isonomia material - 5.4 
A igualdade na individualização da pena - 5.5 A Lei Maria da 
Penha (Lei 11.340/2006)-5.6A Lei de Discrim inação Racial (Lei 
7.71 6/1 989)-5.7 Análise crítica da redação da Lei deTortura-5.8 
A proteção penal das pessoas portadoras de deficiência fís ica-5.9 
A parte criminal do Estatuto do Indio - 5.10 Dos procedimentos 
investigativos da Lei do Crime Organizado.
5.1 Noções introdutórias
A igualdade enlre os seres humanos encontra-se consagrada 
cm diversos dispositivos do Texto Constitucional de 1988. Em 
seu art. 5.°, caput, dispositivo inaugural do catálogo de direitos e 
garantias fundamentais, a Lei Maior dispõe que “todos são iguais 
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos 
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do 
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprieda­
de...". (destacamos)
Em seu art. 3.°, a Constituição trata dos objetivos fundamen­
tais da República Federativa do Brasil e, dentre estes, podemos 
destacar a busca pela erradicação da pobreza e a marginalização 
e a redução das desigualdades sociais c regionais (art. 3.°, 111, da 
CF/1988), além da missão de prom over o bem de todos, sem pre­
conceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras form as 
de discrim inação (art. 3.°, IV, da CF/1988).
Importante
De forma semelhante à dignidade humana, a igualdade não pode ser aponta­
da como um princípio penal, fato que não diminui sua importância no refe­
rido contexto, já que seu conteúdo pode ser observado em temas de grande 
relevância, tais como a aplicação da pena e a discussão instalada acerca da 
Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Lei 11.340/2006).
Antes de apontarmos aspectos concretos da igualdade no Direito 
Penal, cumpre-nos tecer alguns comentários acerca da adequada 
interpretação do referido princípio, uma vez que sua exegese nem 
sempre é feita da maneira adequada.
5.2 Conceito e real significado da igualdade
A Constituição Federal de 1988 estabelece a igualdade de 
todos perante a lei. Questiona-se, porém, acerca da intenção do 
constituinte ao estabelecer referida igualdade. Teria buscado 
vedar, de forma absoluta, todo e qualquer tipo de distinção entre 
os seres humanos? Por certo que não, já que seres hum anos e 
situações fáticas se mostram distintos por natureza, inviabili­
zando a aplicação absolutamente igualitária da lei a todos os seus 
destinatários.
Tal consideração serve de alerta para que o estudioso do 
Direito não desenvolva interpretação equivocada acerca da apli­
cabilidade do princípio da igualdade, uma vez que o mesmo não 
acarreta inexorável igualdade de tratamento a todos os indivíduos 
e a todos os fatos ocorridos no mundo fenomênico.
Na realidade, conforme pontifica Celso Antônio Bandeira de 
Mello, “o princípio da igualdade interdita tratamento desuniforme 
às pessoas. Sem embargo, consoante se observou, o próprio da 
lei, sua fu n ção precípua, reside exata e precisam ente em dispensar 
tratam entos desiguais. Isto é, as nonnas nada mais fazem que discri­
m inar situações, à m oda que as pessoas com preendidas em umas ou 
em outras vêm a ser colhidas p or regimes diferentes" -1 (destacamos)
6 0 PRIN CÍPIO S CON STITU CIO N A IS PENAIS
i . B a n d e i r a d e M e l l o , Celso A ntônio. C on teú d o ju r íd ic o do p r in c íp io da 
igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2 0 0 8 . p. 12.
PRIN CÍPIO DA IGUALDADE 6 1
A atenção às diferenças existentes entre os indivíduos e entre 
as situações de fato abarcadas pelo Direito se mostra essencial
I >ara que o ditame ora abordado seja de fato observado. Posto isto, 
pode-se afirmar o já consagrado postulado de que a igualdade 
significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, 
na exata medida de suas desigualdades, visando, assim, a atingir 
,i isonomia real e não meramente formal.
A busca por critérios que auxiliem o intérprete da Cons- 
titu ição e das leis a com preender os exatos co n torn o s do 
princípio da igualdade se im põe, posto que a sim ples in ter­
pretação gram atical do Texto C onstitucional não conduz a tal 
entendim ento.
Não resta dúvida de que a lei deve constatar as situações que 
?.e encontrem em desigualdade e buscar equilibrá-las. Todavia, 
são necessários alguns critérios aptos a responder as seguintes 
perguntas:
• Quem são os iguais e quem são os desiguais?
• Quais discriminações podem ser consideradas compatí­
veis com o princípio da igualdade?
Note-se que o exegeta incorre em erro ao desenvolver inter­
pretação exageradamente simplista do princípio da igualdade, 
abstendo-se da verificação do contexto em que a situação sob 
análise se insere. Nas palavras de Bandeira de Mello,
“supõe-se, habitualm ente, que o agravo à isonomia radica- 
se na escolha, pela lei, de certos fatores diferenciais existentes 
nas pessoas, mas que não poderiam ter sido eleitos como matriz 
do discrímen.Isto é, acredita-se que determinados elementos ou 
traços característicos das pessoas ou situações são insuscetíveis 
de serem colhidos pela norma como raiz de alguma diferenciação, 
pena de se porem às testilhas com a regra da igualdade. Assim, 
imagina-se que as pessoas não podem ser legalmente desequi- 
paradas em razão da raça, ou do sexo, ou da convicção religiosa
(art. 5.°, caput, da Carta C onstitucional) ou em razão da cor dos 
olhos, da com pleição corporal etc. D escabe, totalm ente, buscar 
a í a barre ira insu perável d itada p e lo prin cíp io da igu a ldade" .2 
(destacam os)
Assim, a interpretação meramente relacionada com o elemen­
to tomado como fator de discriminação pode levar a constatações 
inteiramente equivocadas. A discriminação, por exemplo, pautada 
em critério racial não será, em toda e qualquer hipótese, violadora 
do princípio da igualdade.
Exemplificando a situação exposta, Celso Antônio Bandeira 
de Mello vislumbra um “concurso público para seleção de candi­
datos a exercícios físicos, controlados por órgãos de pesquisa, que 
sirvam de base ao estudo e medição da especialidade esportiva 
mais adaptada às pessoas de raça negra. É óbvio que os indivíduos 
de raça branca não pod erão concorrer a este certam e. E nenhum 
agravo existirá ao princípio da isonom ia na exclusão de pessoas de 
outras raças que não a negra”.3 (destacamos)
Destacado estudioso da igualdade, o mesmo autor ensina que
o reconhecimento das diferenciações que não podem ser feitas 
sem quebra da igualdade se divide em três questões.4 São elas:
• A primeira relaciona-se com o elemento tomado como 
fator de discriminação.
• A segunda diz respeito à correlação lógica abstrata exis­
tente entre o supramencionado fator erigido como cri­
tério de discrímen e a disparidade estabelecida no trata­
mento jurídico diversificado.
• A terceira exige a consonância desta correlação lógica 
com os interesses consagrados na Constituição Federal.
6 2 j PRIN CÍPIO S CON STITU CIO N A IS PENAIS
2. Iclem.p. 15.
3. Idem ,p. 16.
4. Idem, p. 21.
►
PRINCÍPIO DA IGUALDADE ! 6 3
Segundo o mesmo autor, “tem -se que investigar, de um
l.ulo, aquilo que é adotado como critério discrim inatório; de 
milro lado, cumpre verificar se há justificativa racional, isto é, 
1111 idamento lógico, para, à vista do traço desigualador acolhido,
• M i ibuir o específico tratamento jurídico construído em função 
da desigualdade proclamada. Finalmente, impende analisar se 
,i correlação ou fundamento abstratamente existente é, in con- 
t icto, afinado com os valores prestigiados no sistema normativo 
constitucional”.5
O simples fato de uma lei escolher o critério cor, idade ou 
sexo como fator discriminatório não significa, por si só, que exista 
.i I i onta ao princípio da igualdade. Essa polêmica poderá ser obser­
vada quando da análise da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), 
í ontestada por parte da doutrina que alega afronta à igualdade 
constitucional.
Assim sendo, não se cogita em afronta à igualdade quando 
exista pertinência entre o elem ento diferenciador escolhido 
raça, por exemplo - e o tratamento distinto que se pretende 
atribuir.
S.3 Isonomia formal e isonomia material
A falta de efetividade das disposições constitucionais e in-
I raconstitucionais pode ser apontada como um dos maiores 
problemas a serem enfrentados na atualidade. Não raras vezes, 
a norma traz a previsão adequada para regulamentar a vida em 
sociedade, sendo fácil constatar, todavia, diferenciado cenário 
no campo prático.
A garantia de tratamento igual a todos apenas como previsão 
positivada na Constituição não basta para que este postulado seja, 
de fato, observado.
5. Idem ,p. 21 -2 2 .
PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE 
E DAANTERIORIDADE
S u m á r i o : 6.1 Noções introdutórias-6.2 O princípio da legalidade 
ao longo da história no Brasil - 6.3 Significados do princípio da 
legalidade - 6.4 Breves considerações sobre a origem histórica
- 6.5 Postulados do princípio da legalidade- 6.6 O princípio da 
legalidade na teoria geral do crime - 6.7 Características do tipo 
penal. A questão dos tipos penais abertos e das normas penais 
em branco.
6
6.1 Noções introdutórias
Previstos tanto pela Constituição Federal (art. 5.°, XXXIX) 
quanto pelo Código Penal (art. 1.°), os princípios da legalidade 
e da anterioridade traduzem-se no postulado de que “não há 
crim e sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia co- 
minação legal”.
Trata-se de ditame constitucional do mais alto relevo, já que 
atribui unicamente à lei a tarefa de criar tipos penais e, consequen­
temente, estabelecer a sanção penal correspondente.
Seu conteúdo mostra-se “indispensável à segurançajurídica e 
à garantia da liberdade de todas as pessoas, impedindo que alguém 
seja punido por um com portamento que não era considerado 
delituoso à época de sua prática, bem como evitando que a pena 
aplicada seja arbitrária, impondo a ela prévios limites”.1
1 . D e l m a n t o , Celso e outros. C ódigo P enal com en tado. 8 . ed. São Paulo: 
Saraiva, 20 1 0 . p. 76.
Síntese
No contexto do Estado Dem ocrático de Direito, o indivíduo terá a garan­
tia de que somente será processado crim inalmente caso o comportamento 
proibido esteja delimitado pela lei penal. Além disso, referida lei deverá ser 
anterior ao fato, visando a evitar que o indivíduo seja surpreendido pelo 
Estado.
6.2 O princípio da legalidade ao longo da história no Brasil
A legislação penal que por mais lempo vigorou no Brasil não 
era brasileira, uma vez que, com o descobrimento, o País passou 
a ser regido pela legislação portuguesa, merecendo destaque as 
Ordenações do Reino.
Do contexto das Ordenações do Reino, ganha destaque o 
conteúdo das Ordenações Filipinas, que vigoraram no Brasil 
por mais de 200 anos. A parte criminal era prevista no Livro V, 
caracterizado pela crueldade de suas sanções e pela falta de mo­
deração entre crime e pena. Na lição de Aníbal Bruno, “baseadas 
na ideia da intimidação pelo terror, como era comum naqueles 
tempos, distinguiam-se as Filipinas pela dureza das punições, pela 
(requência com que era aplicada a pena de morte e pela maneira 
de executá-la, morte por enforcamento, morte pelo fogo até ser 
o corpo reduzido a pó, morte cruel precedida de tormentos cuja 
crueldade ficava ao arbítrio do ju iz; mutilações, marcas de fogo, 
açoites abundantemente aplicados, penas infamantes, degredos, 
confiscações de bens”.2
Trata-se de legislação marcada por traços muito distintos dos 
atualmente verificados, uma vez que não havia qualquer compro­
metimento com a humanização das penas, fato evidenciado pela 
imposição da pena de morte a inúmeras hipóteses.
8 4 j PRIN CÍPIOS CON STITU CIO N A IS PENAIS
2 . B r u n o , Aníbal. D ireito p en al - P arte geral. 3 . ed. Rio dejaneiro: Forense,
1 9 6 7 . 1 . 1 , p . 1 7 4 .
PRIN CÍPIO S DA LEGALIDADE E DA AN TER10RIDADE 8 5
Dentre os princípios fundamentais ignorados ou pouco ob­
servados pelo Livro V das Ordenações Filipinas, há que se destacar 
o princípio da legalidade, conforme preleciona José Henrique 
Pierangeli, “Nas Ordenações não vigia o que hoje denominamos 
de princípio da legalidade: nullum crimen n ullapoenasinelege. Por 
tal razão, compreende-se que para alguns delitos fosse cominada 
a chamada pena crime arbitrária, exatamente aquela que ficava ao 
talante do julgador, que a fixava como ‘lhe bem, e direito parecer, 
segundo a qualidade da malícia, e a prova que dela houver (Livro 
V, Tit. CXVIII, parágrafo l . 0)’”.5
No ano de 1822, o Brasil tornou-se independente de Por­
tugal, tendo sido elaborada, no ano de 1824, a primeira Cons­
tituição da história brasileira. A partir do referido marco histó­
rico, o princípio da legalidade passou a receber maior atenção, 
conform e ensina N élson Hungria, ao afirmar que“no Brasil 
independente, o nullum crimen, nulla poen a sine lege tem sido, 
tradicionalm ente, um princípio constitucional e uma norma de 
direito penal”.4
O primeiro Código genuinamente brasileiro foi o Código 
Criminal do Império de 1830. O art. 1.° consagrava a legalidade, 
ao prever que “não haverá crime ou delicto (palavras synonimas 
neste Codigo) sem uma lei anterior que o qualifique”.
O Código Penal Republicano de 1890 também trazia a pre­
visão do princípio já em seu artigo inaugural, ao prever que “nin­
guém será punido por fa c lo que não tenha sido anteriormente 
qualificado crime, e nem com penas que não estejam previamente 
estabelecidas”.
3 . P ie r a n g e l i , José Henrique. C ódigos Penais do Brasil. Evolução histórica.
2. ed. São Paulo: Ed. RT, 20 0 4 . p. 58.
4. H u n g r ia , Nélson; F r a g o s o , Heleno Cláudio. C om entários a o C ódigo Penal
- P arte g era l. 6. ed. Rio dejaneiro: Forense, 1980. vol. 1, t. I,p . 47.
8 6 PRIN CÍPIO S CON STITUCIO N AIS PENAIS
6.3 Significados do princípio da legalidade
O princípio ora em comento possui três significados distin­
tos, a saber:
• significado político;
• significado jurídico em sentido amplo;
• significado jurídico em sentido estrito ou penal.
Em seu sentido político, o princípio representa uma garantia 
do cidadão em face da atuação estatal. Nas palavras de Francisco 
de Assis Toledo, o princípio da legalidade “constitui uma real 
limitação ao poder estatal de interferir na esfera das liberdades 
individuais. Daí sua inclusão na Constituição, entre os direitos e 
garantias fundamentais”.5
Sob o enfoque jurídico, o princípio da legalidade, como já elen- 
cado anteriormente, pode se traduzir em sentido amplo ou estrito.
Em sentido amplo, significa que ninguém será obrigado a 
fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, 
conforme dispõe o art. 5.°, II, da Constituição Federal.
Vale destacar que neste momento o princípio recebe inter­
pretações distintas no Direito Privado e no Direito Público.
Sob o regime ju ríd ico de Direito Privado, ao particular é 
permitido fazer tudo aquilo que a lei não proíbe.
Ao revés, no âmbito do Direito Público só se permite a reali­
zação daquilo que estiver expressamente autorizado por lei. Assim 
sendo, mesmo no contexto dos atos discricionários, é necessário 
ressaltar que a margem de liberalidade atribuída ao Poder Públi­
co para agir deverá ser ancorada nos limites legais, tratando-se, 
desta forma, de uma discricionariedade vinculada às limitações 
estabelecidas em lei.
5 . T o l e d o , Francisco d e Assis. P rincípios bá s ico s de d ireito p en al. 5. e d . São 
Paulo: Saraiva, 20 0 8 . p. 21.
Já em seu sentido estrito ou penal, o princípio traduz a ideia 
de que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem 
prévia cominação legal, norma prevista tanto pelo art. 1.° do Có­
digo Penal, quanto pelo art. 5.°, XXXIX, do Texto Constitucional 
de 1988.
No que diz respeito ao último sentido mencionado (jurídico), 
a doutrina costuma estabelecer discussão no seguinte sentido: 
seria a legalidade uma expressão sinônima de reserva legal? Po­
deriam os referidos termos ser confundidos?
Na verdade, conforme os ensinamentos de Fernando Capez, 
“o princípio da legalidade é gênero que compreende duas espécies: 
reserva legal e anterioridade da lei penal”. Assim, o princípio da 
legalidade “contém, nele embutido, dois princípios diferentes: o 
da reserva legal, reservando para o estrito campo da lei a existência 
do crime e sua correspondente pena (não há crime sem lei que 
o defina, nem pena sem cominação legal), e o da anterioridade, 
exigindo que a lei esteja em vigor no momento da prática da in­
fração penal (lei anterior e prévia com inação)”.6
A com petência para legislar em matéria penal é da União 
(art. 2 2 ,1, da CF/1988), sendo certo que a criação de tipos penais 
só pode ocorrer por meio de lei em sentido estrito. Vale registrar 
que o parágrafo único do art. 22 da Constituição dispõe que “lei 
complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre ques­
tões específicas das matérias relacionadas neste artigo”.
Outro aspecto que outrora provocou polêmica na doutrina 
residia na possibilidade de Medida Provisória tratar de matéria 
penal. Trata-se de discussão superada, já que a Emenda Consti­
tucional 32/2001 foi expressa em vedar essa possibilidade (art. 
62, § 1.°, b, da CF/1988).
PRIN CÍPIO S DA LEGALIDADE E DA ANTERIORIDADE j 8 7
6 . C a p e z , Fernando. C urso de d ireito p en al - Parte geral. 14. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2 0 1 0 . p. 57.
8 8 PRIN CÍPIO S CON STITUCIO N AIS PENAIS
6.4 Breves considerações sobre a origem histórica
A doutrina costuma indicar a Magna Carta de 1215 como a 
raiz histórica do princípio da legalidade. Neste histórico docu­
m ento, encontra-se a regra de que “nenhum homem pode ser 
preso ou privado de sua propriedade a não ser pelo julgam ento 
de seus pares ou pela lei da terra”.
Porém, conforme bem pontua Luiz Luisi, “a lição mais notá­
vel e clara se encontra no Dos Delitos e das Penas, o pequeno grande 
livro de Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, ‘só as leis’ - diz o 
nobre Lombardo - ‘podem decretar as penas para os delitos’. Esta 
autoridade não pode residir senão no legislador, que representa 
toda a sociedade organizada por um contrato social”.'
De fato, a obra do Marquês de Beccaria representa marco 
histórico para o Direito Penal, em virtude de ter sustentado a apli­
cação de princípios fundamentais ao sistema penal vigente à época, 
que, por sua vez, era caracterizado pelo rigor e pela crueldade.
Conforme veremos no momento oportuno, a obra de Cesa­
re Bonesana ainda permanece extremamente atual no contexto 
jurídico-penal, em que pese ter sido elaborada no ano de 1764.
6.5 Postulados do princípio da legalidade
O princípio da legalidade, tradicionalmente representado 
pela expressão nullum crimen, nulla poena sine lege, desdobra-se em 
quatro importantes postulados, que estabelecem as características 
obrigatórias das leis penais. Vejamos quais sejam:
1. nullum crimen, nulla poen a sine lege previa;
2. nullum crimen, nulla poena sine lege scripta;
3. nullum crimen, nulla poen a sine lege stricta;
4. nullum crimen, nulla poen a sine lege certa.
7. L u is i , Luiz. Os princíp ios constitucionais p en a is .*'2. ed. Porto Alegre: Safe, 
2003 . p. 19-20.
O primeiro dos postulados indicados diz respeito à necessida­
de de ser a lei penal prévia ao fato delituoso. Trata-se do princípio 
da anterioridade da lei penal, que serve para conferir efetividade 
ao princípio da legalidade.
A necessária anterioridade da lei penal garante o importante 
postulado da segurança jurídica, assegurando que o indivíduo 
não seja surpreendido com a sua posterior incriminação por uma 
conduta que, quando com etida, era aceita pelo ordenamento 
jurídico.
A segunda característica elencada sustenta que a lei penal 
deva ser escrita, afastando a incidência dos costumes para a fun­
damentação ou agravação da pena.
Em que pese os costumes não terem o condão de criar nem 
revogar tipos penais, não há como não reconhecer sua importância 
no contexto da interpretação da norma penal. Assim, a verificação 
dos costumes pode contribuir para uma posterior modificação da 
ordem jurídica, servindo, assim, de importante instrumento que 
possui o legislador.
Além de prévia e escrita, a lei penal também deve ser estrita, 
característica a qual afasta a admissibilidade da analogia, como 
regra, no âmbito do Direito Penal. Apenas em caráter excepcional, 
quando venha a trazer algum benefício ao acusado e, além disso, 
quando houver lacuna na lei, é que o referido meio supletivo de 
lacuna poderá ser admitido.
Por fim, há a exigência de que a lei penal seja certa, isto é, 
clara, precisa, de maneiraque possa ser corretamente compreen­
dida por seus destinatários.
Conforme ensina Fleleno Cláudio Fragoso, a presente ca­
racterística proíbe “a incriminação vaga e indeterminada, que 
não permite saber de forma exata qual é a conduta incriminada 
(...). Trata-se, como se percebe, de exigência dirigida ao legisla­
dor, proibindo a formulação de tipos imprecisos, de contornos 
incertos. Estando, no entanto, o princípio da Reserva Legal ins-
PRIN CÍPIO S DA LEGALIDADE E DA ANTERIORIDADE j 8 9
PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE 
DA LEI PENAL
S u m á r io : 7.1 Noções introdutórias-7.2 A lei processual penal -
7.3 Lei penal benéfica em período de vacatio legis - 7.4 A questão 
referente à Lei 11.464/2007 - 7.5 A Súmula Vinculante 26 do 
S T F -7.6 A questão da Lei de Drogas-7.7 A retroatividade da lei 
benéfica e a execução penal - 7.8 A retroatividade da lei penal 
nos crimes permanente e continuado.
7
7.1 Noções introdutórias
O estudo que ora se inicia acerca do princípio da irretroa- 
tividade da lei penal apresenta íntima correspondência com os 
postulados do princípio da legalidade, já desenvolvidos em tópico 
antecedente.
Segundo Aníbal Bruno, “há um princípio que regula superior­
mente o conflito de leis sucessivas em geral. É o da não retroativi­
dade da lei, princípio de garantia e estabilidade da ordem jurídica, 
sem o qual faltaria a condição preliminar de ordem e firmeza nas 
relações sociais e de segurança dos direitos do indivíduo”.1 O 
conteúdo do princípio é previsto pelo ordenamento jurídico da 
seguinte maneira:
• Art. 5.", XL, da CF/1988: "a lei penal não retroagirá, salvo para be­
neficiar o réu".
1 . B r u n o , Aníbal. Direito penal - Parte geral. 3. ed. Rio dejaneíro: Forense,
1 9 6 7 .1.1, p. 261 .
• Art. 2.°, parágrafo único, do CP: "a lei posterior, que de qualquer 
modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que 
decididos por sentença condenatória transitada em julgado".
Em regra, a lei penal não retroagirá. Todavia, deverá retroagir quando 
trouxer algum benefício ao réu.
Em regra, adota-se o princípio do tempus regit actum, ou seja, 
a aplicação da lei vigente à época dos fatos. Dentre suas exceções 
encontra-se a aplicação da lei penal mais benéfica a fatos ocorridos 
antes de sua vigência. A lei penal nova terá natureza benéfica em 
duas hipóteses:
1. A bolitio criminis:
Ocorre quando o legislador ordinário deixa de considerar 
uma determinada conduta como criminosa, configurando-se, 
desta forma, uma causa extintiva da punibilidade do agente, de 
acordo com o art. 107, III, do CP. Como exemplo, podemos citar a 
Lei 11.106/2005 que revogou, dentre outras condutas, o adultério 
(art. 240 do CP).
Vale registrar um alerta relacionado à Lei 12.015/2009, que 
alterou de forma significativa a disciplina dos crimes sexuais. 
Dentre várias alterações realizadas no Código Penal, a referida 
lei revogou o art. 214, que tratava do crime de atentado violento 
ao pudor, tendo sido a referida conduta incorporada ao delito de 
estupro.
Assim sendo, não há que se falar em abolitio criminis em rela­
ção ao atentado violento pudor. Na verdade, tal comportamento 
deixou, apenas, de ser punido de forma autônoma pela lei, tendo 
sido integrado, contudo, ao art. 213, relativo ao crime de estupro.
2. Novatio legis in mellius:
Ao contrário da hipótese anterior, a conduta continua a ser 
considerada crim inosa. Contudo, o legislador ordinário traz 
algumas condições mais benéficas ao sentenciado, tais como a 
possibilidade de progressão de regime, a diminuição de pena etc.
9 6 j PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS
I xcmplo: Lei 11.343/2006, que deixou de prever a imposição de 
pena privativa de liberdade para a conduta relativa ao porte de 
drogas para consumo próprio (art. 28).
Im portante m encionar que determinadas leis costumam 
irr seu caráter benéfico contestado pela doutrina. É o caso, por 
e xemplo, da Lei 11.464/2007, que passou a permitir a concessão de 
progressão de regime para criminosos hediondos. Como veremos,
i c ferido diploma penal provocou muita polêmica na doutrina e 
na jurisprudência brasileira, situação que somente se pacificou 
com a edição da Súmula Vinculante 26 do STE
7 .2 A lei processual penal
Pelo exposto até o m om ento, pudemos definir que a lei 
penal poderá retroagir caso seja favorável ao réu. Neste sentido, 
cumpre-nos responder à seguinte indagação: a disciplina aplicada 
cm relação à Lei Penal também pode ser aplicada no contexto da 
Lei Processual Penal?
A resposta ao questionamento proposto é negativa, uma vez 
que o Direito Processual Penal ostenta regramento diferente. De 
acordo com o art. 2.° do CPP, “a lei processual aplicar-se-á desde 
logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência 
da lei anterior”. Segundo Fernando Capez,
“isso significa que o legislador pátrio adotou o princípio 
da aplicação imediata das normas processuais: o ato processual 
será regulado pela lei que estiver em vigor no dia em que ele for 
praticado ( tempus regit actum ). Quanto aos atos anteriores, não 
haverá retroação, pois eles permanecem válidos, já que praticados 
segundo a lei da época. A lei processual só alcança os atos prati­
cados a partir de sua vigência (dali para frente)”.2
PRIN CÍPIO DA IRRETROATIV1DADE DA LEI PENAL ' 9 7
2. C a p e z , Fernando. C urso de processo penal. 1 / .ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 
p. 88.
“A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou 
ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da 
continuidade ou da permanência”.
A regra contida na Súmula 711 do Supremo Tribunal Federal 
justifica-se em razão da própria natureza prolongada tanto do 
crime permanente, quanto do crime continuado.
O primeiro é aquele em que a consumação prolonga-se no 
tempo. Exemplo: seqüestro. Já o segundo ocorre quando o agen­
te, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais 
crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, 
maneira de execução, devem os subsequentes ser havidos como 
continuação do primeiro. Exemplo: indivíduo que, semanalmen­
te, com ete furtos, utilizando-se do mesmo modus operandi, na 
Zona Leste da cidade de São Paulo.
Portanto, caso haja a entrada em vigor de uma lei mais gra- 
vosa ao agente, durante o andamento de um crime de seqüestro, 
o sujeito ativo deverá responder com base nesta lei nova, ainda 
que mais grave, em respeito ao que reza a Súmula 711 do STF 
A situação definida pela citada súmula pode ser ilustrada pelo 
seguinte exemplo:
1 0 8 j PRIN CÍPIO S CO N STITUCIO N AIS PENAIS
Tício seqüestra M évio no dia 1.° de agosto de 2009, tendo a vítima sido liber­
tada apenas no dia 10de agosto do mesmo ano. Nesse ínterim, imaginemos 
que o Código Penal tenha sot'rido alteração no dia 5 de agosto, consistente no 
aumento da pena em abstrato para o crime de seqüestro e cárcere privado.
Nesse caso, conforme orientação da Súmula 711 do STF, Tício deve res­
ponder pela nova redação da lei, mesmo que mais gravosa, uma vez que o 
seqüestro é crime permanente, ou seja, prolonga-se no tempo em razão do 
comportamento do próprio sujeito ativo do delito.
PRINCÍPIO DA PERSONALIDADE 
DA PENA
S u m á r i o : 8.1 Noções gerais - 8.2 Os efeitos da sanção penal 
perante terceiros. O aspecto informal do princípio da persona­
lidade da pena.
8
8.1 Noções gerais
O art. 5.°, XLV, da Constituição Federal prevê que nenhuma 
pena passará da pessoa do condenado, salvo nos casos de repara­
ção dos danos e da decretação do perdimento de bens, hipóteses 
nas quais a obrigação poderá ser estendida aos sucessores, até o 
limite da herança.
Para Guilherme de Souza Nucci, “trata-se de outra conquista 
do direito penal moderno, impedindo que terceiros inocentes e 
totalmente alheios ao crime possam pagar pelo que não fizeram, 
nem contribuírampara que fosse realizado”.'
Não resta dúvida de que o conteúdo do princípio da perso­
nalidade seja absolutamente consagrado nos tempos atuais, não 
havendo dificuldade alguma em se concluir que a reprimenda 
penal não poderá ultrapassar a pessoa do condenado. Contudo, 
a situação que atualmente nos parece natural por muito tempo 
não foi observada, já que, em tempos remotos, verificava-se a
1. Nucci, Guilherme de Souza. M anual de d ireito penal. 6. ed. São Paulo: Ed. 
RT, 20 1 0 . p. 79.
transferência da responsabilidade penal para terceiros que em 
nada haviam colaborado para a prática criminosa.
Em legislações remotas, como o Código de Hamurabi, en­
contramos exemplos expressos neste sentido. Em seu art. 229 
está previsto que “se um arquiteto constrói para alguém e não 
o faz solidamente e a casa que ele construiu cai e fere de morte 
o proprietário, esse arquiteto deverá ser morto”. No dispositivo 
subsequente há a seguinte previsão: “Se fere de morte o filho do 
proprietário, deverá ser morto o filho do arquiteto”.
O caráter pessoal da reprimenda penal foi, de fato, um impor­
tante avanço do Direito Penal moderno, afastando, desta forma, a 
indesejável transferência de responsabilidade para terceiros, total­
mente alheios ã prática criminosa geradora da imposição da pena.
Como visto, no regramento estabelecido pela Constituição 
da República, o caráter personalíssimo da pena somente poderá 
ser minimizado para duas finalidades, nas quais determinados 
efeitos podem atingir terceiros. Vejamos:
• Dever de reparar o dano: a prática do delito gera o dever de reparar 
o dano, situação que atinge o terceiro até o limite da herança deixa­
da pelo agente do delito.
• Perdimento de bens: trata-se do confisco pelo Estado dos produtos 
do crime. A medida diz respeito, portanto, ao patrimônio ilícito do 
agente, não se confundindo com a pena restritiva de direitos relativa 
à perda de bens e valores, que recai sobre o patrimônio lícito do 
agente.
As hipóteses acima destacadas constituem efeitos da conde­
nação, previstos no art. 9 1 , 1 e II, do CP.
8.2 Os efeitos da sanção penal perante terceiros. O aspecto
informal do princípio da personalidade da pena
Os conceitos até aqui desenvolvidos permitem-nos concluir 
que a pena, no direito penal moderno, é destinada apenas e tão 
somente àquele indivíduo que, com sua conduta, colaborou para
1 1 0 j PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS
a consumação de uma infração penal. Quanto a isto, portanto, 
não há controvérsias.
Contudo, acreditamos que uma reflexão seja necessária 
neste sentido.
Naturalmente que, no âmbito jurídico, a resposta penal do 
Estado não ultrapassa a pessoa do condenado. Contudo, não há 
como negar que a imposição de pena acaba, de forma indireta, 
acarretando prejuízos consideráveis a terceiros, principalmente 
aos familiares do condenando.
Neste sentido, Rogério Greco ensina que o princípio da per­
sonalidade pode ser abordado sob um aspecto informal, distinto, 
portanto, da previsão expressa da Constituição de 1988. Segundo 
o autor, “sob o aspecto informal, o princípio perde a sua natu­
reza absoluta, pois sabemos que quando alguém é condenado, 
segregado temporariamente do convívio familiar, a pena estende 
o seu raio de ação àquelas pessoas que, embora não tivessem 
praticado o delito, sentem a força da sanção penal em razão da 
separação daquele que, por exemplo, mantinha a subsistência 
da fam ília”.2
A reflexão não tem a intenção de defender a não aplicação 
da pena. Na verdade, busca reforçar a ideia de que a resposta do 
Estado por intermédio da pena criminal somente deve ocorrer 
nos casos realmente necessários, demonstrando, nas palavras de 
Rogério Greco, “a necessidade de sua aplicação somente aos casos 
mais graves, realmente intoleráveis socialmente, em decorrência 
do seu efeito devastador”.3
Destaca-se, portanto, a relação existente entre o princípio 
da personalidade e o caráter subsidiário do Direito Penal, isto
PRIN CÍPIO DA PERSONALIDADE DA PENA I 1 1 1
2. G r e c o , Rogério. D ireito p en al do equ ilíbrio. 4. ed. Niterói: Impetus, 2009 . 
p. 10 5 -1 0 6 .
3. Idem, p. 28.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
16
O princípio da insignificância sustenta que nao deve o Direito 
Penal levar em consideração ínfimas lesões ao bem jurídico.
Trata-se de princípio que ainda gera muita divergência no 
tocante à sua incidência, sendo certo que muitos Tribunais no 
Brasil ainda demonstram resistência à sua aplicação.
Segundo Francisco de Assis Toledo, o princípio da insig­
nificância “permite, na maioria dos tipos, excluir os danos de 
pouca importância”. O referido autor prossegue seu raciocínio 
afirmando que “o direito penal, por sua natureza fragmentária, 
só vai até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico. 
N ão se deve ocupar de bagatelas V (destacamos)
Ao que nos parece, para a adequada aplicação do princípio da 
insignificância, é necessária a verificação, em cada caso concreto, 
se a conduta do agente merece ou não receber uma resposta penal 
por parte do Estado. No mesmo sentido, posiciona-se Fernando 
Capez, ao sustentar que “o princípio da insignificância não é 
aplicado no plano abstrato (...). O furto, abstratamente, não é 
uma bagatela, mas a subtração de um chiclete pode ser. Em outras 
palavras, nem toda conduta subsumível ao art. 155 do Código 
Penal é alcançada por este princípio, algumas sim, outras não. É 
um princípio aplicável no plano concreto, portanto”.2
1. T o l e d o , Francisco de Assis. P rincípios básicos d e direito penal. 5. ed. São 
Paulo: Saraiva, 2 0 0 8 . p. 133.
2. C a p e z , Fernando. C urso de d ireito p en al - P arte geral. 14. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2 0 1 0 . p. 30.
O crime, segundo a teoria tripartida, é um fato típico, ilícito 
e culpável. Já para os adeptos da visão bipartida, é fato típico e 
ilícito, sendo a culpabilidade um pressuposto para a aplicação da 
pena. Independentemente do conceito adotado, não resta dúvida 
de que a tipicidade é elemento indispensável no conceito de crime, 
seja qual for a posição adotada.
O fato típico, isto é, aquele previsto em lei como criminoso, 
é formado pela conduta, pelo resultado, pelo nexo de causalidade 
entre aquela e este e, por fim, pela tipicidade. Esta, por sua vez, é o 
encaixe perfeito entre o fato concreto e a norma abstrata. Trata-se, 
na verdade, do fenômeno da subsunção.
Como bem ensina Cezar Roberto Bitencourt, “a tipicidade 
penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos 
protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou 
interesses é suficiente para configurar o injusto típico”.3
Isto posto, constatada a insignificância da lesão ao bem 
jurídico, afasta-se a tipicidade da conduta, excluindo-se, conse­
quentemente, o delito.
A explicação acima desenvolvida diz respeito às diferentes 
facetas da tipicidade, que se subdivide em fo rm a l e m aterial. A 
primeira é representada pela simples adequação do fato concreto 
ao conteúdo da norma abstrata, configurando, em tese, o delito 
previsto pela lei penal.
Contudo, no contexto do Estado Democrático de Direito, 
não se pode exigir apenas a tipicidade formal da conduta, sendo 
necessária a demonstração de que, além de forma de crime, existe 
conteúdo de crime, traço verificado na tipicidade material. Em 
outras palavras, exige-se um mínimo de lesividade do comporta­
mento humano, de maneira a afastar a interpretação meramente 
literal do dispositivo penal.
1 7 6 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS
3. B it e n c o u r t , Cezar Roberto. Tratado d e d ireito p en al - P arte geral. 10. ed. 
São Paulo: Saraiva, 2006 . vol. I, p. 26.
PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 1 7 7
O princípio da insignificância, como dito de início, não goza 
de pacífica aceitação na jurisprudência brasileira, fato que muito 
se deve em razãode não se saber, com exatidão, quais seriam os 
contornos desse princípio. Em outras palavras, como saber se 
determinada conduta é ou não insignificante?
Não basta afirmar que o Direito Penal não deve se ocupar de 
condutas insignificantes, sendo necessário estabelecer critérios 
idôneos a constatar, no caso concreto, a natureza ínfima da lesão 
ao bem jurídico.
Em virtude da falta de previsão legal expressa do princípio, 
os critérios aludidos devem ser buscados na jurisprudência, es­
pecialmente nas decisões do Supremo Tribunal Federal. Nesse 
sentido, pedimos vênia para transcrever as palavras do Ministro 
Celso de Mello, relator do HC 98152-M G :
“O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circuns­
tância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do 
indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias 
à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens 
jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos 
em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, 
efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O 
direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam re­
sultado, cujo desvalor - por não importar em lesão significativa 
a bens ju ríd icos relevantes - não represente, por isso mesmo, 
prejuízo im portante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, 
seja à integridade da própria ordem social. O princípio da insig­
nificância qualifica-se como fator de descaracterização material 
da tipicidade penal. O princípio da insignificância - que deve ser 
analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da 
intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido 
de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada esta 
na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Precedentes. Tal 
postulado - que considera necessária, na aferição do relevo ma­
terial da tipicidade penal, a presença de certos valores, tais como
1 7 8 I PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS
(a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma 
periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de repro- 
vabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão 
jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação 
teórica, no reconhecim ento de que o caráter subsidiário do sis­
tema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos 
por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O fato 
insignificante, porque destituído de tipicidade penal, importa 
em absolvição criminal do réu. A aplicação do princípio da insig­
nificância, por excluir a própria tipicidade material da conduta 
atribuída ao agente, im porta, necessariam ente, na absolvição 
penal do réu (CPP, art. 386, III), eis que o fato insignificante, por 
ser atípico, não se reveste de relevo jurídico-penal. Precedentes” 
(STF, HC 98152-M G , 2 .a T., rei. Celso de Mello, 19 .05 .2009).
O acórdão transcrito mostra-se bastante elucidativo, já que 
fornece uma série de critérios im portantes para o reconheci­
mento do princípio da insignificância no caso concreto. Diante 
dos elementos propostos, vale estabelecer um roteiro acerca do 
princípio em estudo:
• O princípio da insignificância deve ser analisado em 
consonância com os princípios da intervenção mínim a e 
da fragm entariedade.
• Deve ser analisado em cada caso concreto, não sendo 
possível seu reconhecim ento no campo abstrato.
• Deve haver mínima ofensividade na conduta do agente.
• Nenhuma periculosidade social do comportamento do 
agente.
• Reduzido grau de reprovabilidade da conduta do agen­
te.
• Inexpressividade da lesão jurídica provocada.
• Não se deve avaliar o valor do bem jurídico apenas sob 
a ótica do agente, mas também sob o ponto de vista da 
vítima. Por vezes, algo que possa parecer insignificante 
para muitos representa considerável valor para a vítima.
PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 179
A relação entre os princípios da insignificância e da inter­
venção mínima é flagrante e fundamental para a correta aplicação 
do primeiro princípio, uma vez que não se busca deixar nenhum 
bem jurídico desprovido de proteção, sendo necessário, apenas, 
avaliar em qual nível este deverá ser tutelado, se civil, adminis­
trativo ou penal.
Desta forma, caso a conduta seja considerada penalmente 
insignificante, isso não significa que a vítima não deva ser reparada 
pelo prejuízo sofrido, ainda que de pequena monta. Nesse mo­
mento, a composição do dano na esfera cível mostra-se suficiente 
para pacificar a controvérsia, tornando-se dispensável a atuação 
do Direito Penal.
Por fim, vale relembrar que o delito insignificante não pode 
ser confundido com o delito de m enor potencial ofensivo. Se­
gundo Capez, estes últimos “são definidos pelo artigo 61 da Lei 
9.099/95 e submetem-se aosjuizados Especiais Criminais, sendo 
que neles a ofensa não pode ser acoimada de insignificante, pois 
possui gravidade ao menos perceptível socialmente, não podendo 
falar-se em aplicação desse princípio”.4
Assim sendo, não há razão para que sejam confundidos os 
conceitos acima abordados, sendo certo que o delito insignificante 
pode ser verificado em cada caso concreto, não havendo relação 
necessária destes com os delitos de menor potencial ofensivo.
4 . C a p e z , Fernando. C urso de d ireito p en al... cit., p. 30.

Continue navegando