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Insuficiência Cardíaca Congestiva Definição: A insuficiência cardíaca (IC) é a incapacidade do coração de manter a perfusão adequada às necessidades metabólicas dos tecidos, levando a congestão, dispneia e limitação funcional. Epidemiologia: É uma importante causa de morbimortalidade no Brasil Um quarto das internações por doenças cardiovasculares em geral Um terço das internações acima dos 65 anos. Prognóstico muito reservado, comparável ao de muitas neoplasias malignas. Etiologia: Várias causas cardíacas e não cardíacas podem levar à IC, podendo afetar: função contrátil do ventrículo esquerdo pressão de enchimento (pré-carga) resistência ao seu esvaziamento (pós-carga) Na tentativa de compensá-los, surgem, primeiramente, taquicardia e aumento da pré--carga e do volume circulatório e, posteriormente, hipertrofia e dilatação do ventrículo esquerdo, com piora da função contrátil. Estadiamento da insuficiência cardíaca Estágio Situações Exemplos A Assintomáticos, sem cardiopatia estrutural ou funcional, com alto risco de desenvolverem insuficiência cardíaca Hipertensos, diabéticos, tabagistas pesados ou com outros fatores de risco para cardiopatia isquêmica; usuários abusivos de álcool B Assintomáticos, com cardiopatia estrutural que pode levar à insuficiência cardíaca Hipertrofia, dilatação ou hipocontratilidade de ventrículo (inclusive fração de ejeção reduzida); valvulopatia assintomática; infarto do miocárdio C Sintomáticos, atuais ou passados, com sintomas ligados à cardiopatia presente Pacientes com insuficiência cardíaca, compensada ou descompensada, em todas as classes funcionais D Muito sintomáticos, com cardiopatias avançadas e necessidade de múltiplas intervenções de maior complexidade Pacientes com descompensações e internações frequentes; usuários de oxigenoterapia; pacientes em espera de transplante cardíaco Quadro Clínico: fadiga e dispneia (tanto em repouso quanto aos esforços) sinais de congestão (edema de extremidades, crepitantes finos na ausculta pulmonar), principalmente em idosos. Causas de insuficiência cardíaca Aumento do trabalho cardíaco – Estados hipercinéticos Hipertireoidismo Anemia Fístulas arteriovenosas sistêmicas Alguns problemas dermatológicos (p. ex., eritroderma) Alguns problemas metabólicos (p. ex., doença de Paget) – Regurgitação valvular ou shunts do lado esquerdo para o direito do coração – Impedância aumentada à sístole Hipertensão arterial sistêmica Hipertensão pulmonar Estenose pulmonar ou aórtica Transtornos do miocárdio – Miocardiopatias (viral, alcoólica, induzida por outras drogas) – Infarto do miocárdio – Restrição ao enchimento ventricular – Constrição ou derrame pericárdico – Mixoma atrial – Estenose mitral ou tricúspide – Aumento da rigidez ventricular Infiltração miocárdica (p. ex., amiloidose, hemocromatose) Hipertrofia ventricular Miocardiopatia hipertrófica Diagnostico: Anamnese Os sintomas mais frequentes na IC são a dispneia e o cansaço. A dispneia é consequência do aumento da pré-carga, com congestão venosa e capilar dos pulmões, o que diminui a capacidade vital e aumenta o trabalho respiratório. O cansaço, decorrente da redução do débito cardíaco, pode surgir na anamnese como “fraqueza” ou “falta de força”. Ortopneia é a dispneia ao decúbito dorsal, ocasionada pelo aumento do retorno venoso dos membros inferiores ao coração, com congestão pulmonar e diminuição da capacidade vital. A intensidade da ortopneia é comumente medida pela quantidade de travesseiros que a pessoa necessita para elevar o tronco e conseguir respirar sem dificuldade. Dispneia paroxística noturna, causada por mecanismos semelhantes, faz a pessoa despertar algumas horas depois de adormecer, buscando alívio em posição ortostática, sentando-se ou pondo-se de pé, reduzindo, assim, o retorno venoso para o coração. Tosse seca também é um sintoma de congestão pulmonar e também costuma piorar no decúbito dorsal. Noctúria, que surge por conta do aumento do fluxo sanguíneo renal no decúbito, uma vez que o débito cardíaco, em posição ortostática, costuma ser redistribuído para outros órgãos. Ganho de peso (“inchaço”) e de edema de extremidades decorrentes da retenção de fluido. Em casos mais avançados, ocorre emagrecimento. Cardiopatia isquêmica e a hipertensão arterial sistêmica. Congestão gastrintestinal: náusea, diminuição do apetite, dor em hipocôndrio direito (por distensão da cápsula hepática) e alterações do hábito intestinal. Sintomas psiquiátricos: confusão mental, psicose, ansiedade e depressão. Exame físico Taquicardia Terceira bulha (B3) sobre o ictus cordis, em decúbito lateral esquerdo, logo após a segunda bulha cardíaca. Trata-se do sinal clínico isoladamente mais específico para IC, e acredita-se que reflita a restrição súbita do enchimento ventricular. A quarta bulha (B4), ouvida logo antes da sístole, é menos específica, mas pode ser o único sinal em pacientes compensados. Distensão venosa cervical (turgência jugular). Distensão da jugular interna junto ao triângulo cervical anterior Refluxo hepatojugular Distensão jugular. Taquipneia Cardiomegalia Sopros cardíacos Edema nos membros inferiores inelástico (com o sinal do cacifo) e bilateral. Edema pulmonar (crepitantes finos inspiratórios). Exames complementares Dosagem do peptídeo natriurético cerebral (brain natriuretic peptide [BNP]), Radiograma de tórax (cardiomegalia e congestão vascular pulmonar). Eletrocardiograma (ECG) Ecocardiograma Cintilograma (ventriculografia radioisotópica) Espirometria Exames laboratoriais (hemograma, testes de função tireóidea, creatinina e potássio séricos. Fatores desencadeantes de descompensações de IC Falta de adesão ao tratamento Ingestão de sódio e de líquidos Ganho de peso Infecções (principalmente respiratórias) Anemia Hemorragias Hipertensão arterial Doença pulmonar obstrutiva crônica e suas exacerbações agudas Isquemia miocárdica Uso de medicamentos (principalmente anti-inflamatórios não esteroides) Abuso de drogas lícitas (tabaco e álcool) e ilícitas (cocaína) Abordagem diagnóstica de insuficiência cardíaca. Clique na imagem para ampliar Conduta proposta Os objetivos do tratamento da IC são a redução dos sintomas, o aumento da sobrevida e a melhora da qualidade de vida das pessoas acometidas. Classificação da capacidade funcional Classe Descrição Atividade máxima tolerada I Pessoas com doença cardíaca, mas sem limitações em atividade física dela resultantes. Carregar peso, subir escadas, exercício físico moderado. A atividade física habitual não causa cansaço anormal, palpitações, dispneia ou angina. II Pessoas com doença cardíaca que resulta em limitações leves na atividade física. Subir um lance de escadas, relação sexual, jardinagem. Eles estão confort·veis em repouso. A atividade física habitual causa cansaço, palpitações, dispneia ou angina. III Pessoas com doença cardíaca que resulta em limitação clara da atividade física e causa cansaço, palpitação, dispneia ou angina. Sem interrupção: tomar banho, trocar de roupa, caminhar no plano. IV Pessoas com doença cardíaca que resulta em incapacidade de realizar qualquer atividade física sem desconforto. Sintomas de insuficiência cardíaca ou da síndrome anginosa podem estar presentes mesmo em repouso. Se qualquer atividade física é realizada, o desconforto aumenta. Sintomas presentes aos mínimos esforços ou ao repouso. Tratamento Não farmacológico: Repouso absoluto não é recomendado. Exercício físico parece melhorar a qualidade de vida e reduzir as internações por IC. Cessação do tabagismo Restrição sódica a 2 g Aumento de fibra alimentar Restrição hídrica é indicada em pessoasque usam doses altas de diuréticos, para evitar hiponatremia, ou em casos graves, sugerindo-se um volume de 30 mL/kg/dia (D). Evitar automedicação: evitar fármacos que promovam a retenção de sódio, como os corticosteroides, os estrogênios e, principalmente, os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), incluindo os inibidores seletivos da cicloxigenase-2 (COX-2) (D). Farmacológico: Diuréticos Diminuem a congestão e aliviam sintomas, mas não reduzem mortalidade por IC (D). Diuréticos tiazídicos, como a hidroclorotiazida, são suficientes somente nos casos leves de IC, em que há pouca congestão, e na presença de função renal normal. Em casos de insuficiência renal, ou de congestão mais pronunciada, diuréticos mais potentes, como a furosemida, devem ser usados. Quando houver a necessidade de doses altas de furosemida, deve-se considerar antes a adição de um diurético tiazídicos pelo efeito sinérgico (D). O efeito dos diuréticos sobre a congestão não se sustenta a longo prazo, devendo ser associados, no seguimento, a inibidores da enzima conversora da angiotensina e a betabloqueadores. Inibidores da enzima conversora da angiotensina Os inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECAs) reduzem sintomas de IC e aumentam a sobrevida, devendo ser instituídos em todas as pessoas com IC. Reduzem a perda de função sistólica, a necessidade de hospitalização, os eventos isquêmicos (infarto e angina instável) e a mortalidade. Diminuição da função renal Aumento da creatinina sérica. Tosse seca Betabloqueadores Melhoram a fração de ejeção e a qualidade de vida Aumentam a tolerância ao exercício e reduzem a mortalidade. Devem ser propostos a todas as pessoas com IC compensada (B) e em pessoas assintomáticas que apresentem disfunção sistólica (redução de fração de ejeção) após infarto do miocardio. Espironolactona Poupador de potássio reduz a mortalidade em IC severa Deve ser usado em todas as pessoas com classes sintomáticas III-IV que já estejam em uso de IECA e diuréticos. Digitálicos Os digitálicos diminuem a necessidade de hospitalização, sem redução da mortalidade. São úteis, também, para controlar a resposta ventricular a arritmias supraventriculares (como a fibrilação e o flutter atriais). Devem ser usados em pessoas com IC que ainda estejam muito sintomáticas, mesmo com doses máximas toleradas dos fármacos mencionados anteriormente. Bloqueadores dos receptores de angiotensina (BRA) Devem ser usados somente em pessoas que não toleram IECAs. Quando encaminhar? IC aguda (edema agudo de pulmão). IC avançada (estágio D). Na vigência de infecções sistêmicas. Portadores de patologias congênitas ou adquiridas que demandem correção cirúrgica. Arritmias graves ou de recente começo. Cardiopatia isquêmica sem controle sintomático. Sinais de hipoperfusão. Mau controle sintomático, mesmo com o uso de todas as opções terapêuticas acessíveis. Instalação rápida em pessoas previamente hígidas. Pessoas com menos de 40 anos. Dúvidas sobre o diagnóstico. Prognóstico e complicações possíveis A morte normalmente ocorre pela progressão da falência sistólica ou pela síndrome de morte súbita, especialmente por arritmias ventriculares.