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História e evolução do Direito Empresarial

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História e evolução do Direito Empresarial
» Luis Eduardo Oliveira Alejarra
RESUMO: Este trabalho foi realizado através de revisão de literatura, buscando encontrar o máximo de subsídio para a questão da história e evolução do Direito Empresarial, desde seu nascimento como direito comercial, passando pelas diversas teorias que lhe definiam até os dias atuais com sua nova nomenclatura de Direito Empresarial. Foram utilizados livros e artigos científicos da base de dados SciElo e Google Acadêmico, reconhecidas para trabalhos acadêmicos. O objetivo da pesquisa era analisar a evolução do comércio diante das diversas sociedades históricas, visando encontrar o marco de nascimento do Direito Comercial, bem como sua evolução, perpassando pelas diversas teorias que caracterizaram o Direito Comercial, tais como a teoria subjetiva, das Corporações de Mercadores, a teoria objetiva, dos atos de comércio, até a chegada do foco na empresa e a mudança de nomenclatura para Direito Empresarial, como encontrado atualmente. Considera-se importante a posição de alguns doutrinadores e historiadores do direito, encontrando diversos pontos controvertidos referentes ao nascimento da atividade comercial e seu desenvolvimento e o nascimento do Direito Empresarial. Superando esse ponto de partida a doutrina é praticamente uníssona no que tange a evolução destes institutos na história. Assim, de forma clara e concisa, o presente trabalho visa apresentar as diversas vertentes doutrinárias no tocante ao nascimento do comércio e do Direito Comercial e sua evolução histórica até a atualidade.
Palavras-chave: comércio, Direito Comercial, Direito Empresarial, evolução, história.
INTRODUÇÃO
            Na busca pelo nascimento do comércio, depara-se com Platão[1], o qual o descreve de forma sucinta e completa em seu livro “A República”. O filósofo ao explicar a origem da justiça, de forma indireta indica a origem do Estado e do comércio. Segundo este filósofo, pelo fato dos indivíduos não conseguirem saciar todas as suas necessidades, se viram obrigados a aproximarem-se uns dos outros com o intuito de trocar os excedentes de seus trabalhos. Tal aproximação acarreta a vida em grupo e posteriormente a sociedade.
MARTINS[2] assinala que no início os grupos sociais buscavam bastar-se a si mesmos, mantendo-se com suas produções rurais familiares. O natural crescimento populacional forçou as trocas de mercadorias e posteriormente a criação da moeda, o que tinha o único intuito de facilitar o escambo. Segundo CAVALCANTE[3], inaugura-se o cum merx, ou escambo de mercadorias, derivando mais tarde na expressão cummerciun. Já TOMAZETTE[4], afirma que a palavra comércio vem do latim commutatio mercium, o que significa troca de mercadorias.
Em decorrência de algumas limitações impostas pelo escambo (economia de troca) ocorre a evolução para a economia de mercado e o uso da moeda, em sistema muito similar ao utilizado até hoje. Com esta atualização no comércio, o produtor de determinado insumo produz mais e com mais variedade, pois a produção deixou de ser unicamente para subsistência e troca do excedente, agora também para venda.
Comércio foi bem conceituado por ROCCO[5], “o comércio é aquele ramo de produção econômica que faz aumentar o valor dos produtos pela interposição entre produtos e consumidores, a fim de facilitar a troca das mercadorias”.
Neste sentido encontra-se o conceito de BORGES[6], “é o ramo da atividade que tem por objeto a aproximação de produtores e consumidores, para a realização ou facilitação de trocas”.
A atividade comercial remonta à Antiguidade, tendo como bom exemplo de grandes comerciantes os fenícios. Segundo PALMA[7], os fenícios são ancestrais dos Libaneses, e fizeram de seu território um dos maiores recantos de prosperidade do Oriente.
O ilustre professor PALMA[8] demonstra a pujança comercial dos fenícios nos séculos X e IX a.C.:
“... a Fenícia vivia em absoluto estado de esplendor graças ao intenso comércio e à dedicação às navegações marítimas, que legaram à sua gente uma sólida reputação nesse campo. Com muita habilidade e coragem ímpar, os fenícios ousaram singrar os oceanos a bordo de embarcações bem construídas. Fundaram colônias no Norte da África, dentre as quais Cartago se evidencia ...”
Urge salientar que o conceito de comércio não se confunde com o objeto de estudo do direito comercial, ou modernamente o direito empresarial, não devendo limitar o direito comercial como direito do comércio. Um bom exemplo de que o direito comercial é mais amplo que o comércio, e sua necessidade de lucro, são aspectos das associações sem fins lucrativos que fazem parte do direito comercial, como a criação e alteração de seus estatutos.
Destarte, ocasionado por essa comum confusão entre direito comercial e comércio diversos doutrinadores modernos, como Rubens Requião[9], entendem que a nomenclatura mais correta seria Direito Empresarial, ou Direito das empresas mercantis.
HISTÓRICO DO DIREITO COMERCIAL
Há uma enorme controvérsia entre doutrinadores do direito, filósofos, sociólogos e antropólogos sobre o nascimento do Direito Comercial. REQUIÃO[10], afirma que o direito comercial surgiu na Idade Média com o desenvolvimento do tráfico mercantil.
De acordo com FERNANDES[11], o desenvolvimento histórico do Direito Comercial perpassa pela época romana, pelos fenícios, assírios, babilônicos e os gregos onde estes não trouxeram contribuições diretas para o desenvolvimento da matéria.
Todavia, relata que alguns historiadores encontraram vestígios de normas de direito comercial no Código de Manu, na Índia. No Museu do Louvre, está a pedra em que foi esculpido o Código de Hamurabi, a mais de 2.000 anos a.C., contendo normas de regulavam a atividade mercantil, mas sem configurar um sistema de normas passível de ser chamado de Direito Comercial.
MAMEDE[12] cita o aparecimento de normas de Direito Comercial em épocas mais longínquas ainda nas regiões de Ur e Lagash, porém informando que a maciça doutrina indica como florescimento desse ramo do direito privado o aparecimento dos primeiros burgos (cidades burguesas).
Muitos anos após, no Império Romano, berço da Civil Law, com sua estrutura social fundada sobre a propriedade e atividade rural, ainda não havia surgido o Direito Comercial como ramo autônomo do direito. Até mesmo por seu caráter social aristocrático, os Senadores e Patrícios eram proibidos de exercer atividade mercantil, restringindo-se tais práticas aos escravos.
Em Roma encontravam-se algumas normas fragmentadas que versavam sobre a regulação do comércio, porém nada substancial capaz de caracterizar o nascimento de um ramo autônomo do direito.
REQUIÃO[13] entende que apesar de existir algumas regras de direito comercial em tempos remotos, tais regras esparsas não formaram um corpo sistematizado de normas capazes de inaugurarem a autonomia do Direito Comercial.
Com a derrocada de Roma e, por conseguinte a ausência de um poder estatal unificado e central, diversas pequenas cidades foram brotando no território romano. Estas cidadelas não eram autossuficientes e necessitavam de outras cidades e povos próximos para sobreviverem, fomentando o comércio entre essas cidades.
Acrescido ao advento da era Cristã, e a decadência da aristocracia, nasce o capitalismo mercantil em território romano e os primeiros esboços do Direito Comercial como disciplina autônoma, impulsionado pelo tráfego mundial no Mediterrâneo.
Segundo REQUIÃO[14], com a invasão bárbara e o retalhamento do território romano, inicia-se a fase feudal. Nos séculos VIII e IX surgem em Bizâncio, oriundas das Institutas de Justiniano, as leis pseudórias e o jus greco-romano incorporando os costumes Mediterrâneos, bem como a origem do direito comercial medieval.
Este doutrinador ainda afirma que no século XI se inicia o desenvolvimento econômico da Europa, ainda mal visto pelos preceitos do direito canônico, o qual tem aversão às atividades lucrativas, citando o versículo bíblico de Deuteronômio, ”Ao teu irmão não emprestarás com usura...”.[15]Na Idade Média com a ascensão da burguesia e crescimento das cidades, haja vista o êxodo rural, bem como a abertura das vias comerciais do norte e do sul da Europa, observa-se a pequena sobrevida do sistema feudal.
TOMAZETTE[16] descreve tal situação:
“Essa mudança foi provocada pela crise do sistema feudal, resultado da subutilização dos recursos do solo, da baixa produtividade do trabalho servil, aliadas ao aumento da pressão exercida pelos senhores feudais sobre a população. Em função da citada crise, houve uma grande migração que envolveu, dentre outros, os mercadores ambulantes, que viajavam em grupos e conseguiram um capital inicial, que permitiu a estabilização de uma segunda geração de mercadores nas cidades, desenvolvendo um novo modo de produção.”
Assim, nascem as corporações de mercadores, onde se reúnem os comerciantes, que detém riquezas, porém não possuem títulos de nobreza. Essas corporações visavam à proteção dos comerciantes frente ao decadente sistema feudal. Assim, vão paulatinamente ganhando poder político e militar, chegando a conseguir a autonomia de centros comerciais, como as cidades italianas de Veneza, Florença e Gênova.
SISTEMA SUBJETIVO – AS CORPORAÇÕES DE MERCADORES
Em toda a Europa Ocidental viu-se rapidamente o fortalecimento das corporações mercantes as quais se sobrepuseram aos soberanos, principalmente na Itália e Alemanha, nas costas do Mar do Norte, esta última onde foi criada a Hansa, que era uma liga de cidades comerciais alemãs dentre elas Hamburgo e Lubeck, congregando em torno de oitenta cidades comerciais, desde Bergen até os Países Baixos, monopolizando o comércio exterior da Inglaterra.
REHME[17], explica que nessa região da Alemanha, diversos povoados que possuíam boas feiras, grandes mercados, se expandiram rapidamente fomentados pelo forte comércio e tornaram-se cidades medievais.
De acordo com GARRIGUES[18], tais mercados brotavam em territórios neutros, geralmente fronteiriços, onde se pactuava uma paz em prol do mercado e protetora dos estrangeiros. A Lei 4ª, Título 7, das Leis das Setes Partidas, Da Espanha, assegurava, “todos los que vengan a las ferias de estes Reynos o a otro ponto de ellos en cualquier tiempo, sin distincción de cristianos, morros e judíos, seron salvos y seguros em sus personas, bienes y mercaderías, así em la venida como e su estada y vuelta”.
Nessa fase histórica começa a se desenvolver o direito comercial, através do direito costumeiro aplicado no interior das corporações de mercadores pelos juízes consulares. A partir daí surgiram os primeiros repositórios de costumes e decisões emanadas dos juízes consulares, tais como Rôles d´Oleron, da França; Consuetudines, de Gênova; Capitulare Nauticum, de Veneza; Constitutum Usus, de Pisa; Consolat Del Mare, de Barcelona.
Explica PEREIRA[19], que como o direito comum da época não apresentava regramento capaz de regular as relações comerciais de forma satisfatória. Assim, os comerciantes se viram compelidos a organizarem-se e criarem uma estrutura jurídica interna nas corporações, onde o direito era aplicado pelos juízes consulares, que eram eleitos em assembleias cerradas para os membros das corporações mercantis.
O direito comercial exercido no interior das corporações era um direito corporativo, consuetudinário e subjetivista, vez que era limitado aos membros das corporações. ROCCO[20] aduz:
“Aos costumes formados e difundidos pelos mercadores, se estes estavam vinculados; os estatutos das corporações estendiam a sua autoridade até onde chegava à autoridade dos magistrados das corporações, isto é, até os inscritos na matrícula; e, igualmente à jurisdição consular que estavam sujeitos, somente, os membros da corporação”.
            Os cônsules objetivando ampliar seu poder de atuação, sua jurisdição, modificaram as regras das corporações de mercadores passando a aplicar o direito comercial não só para os inscritos nas corporações, mas a todos que praticarem atos condizentes com o comércio, delineando-se o novo conceito objetivista do direito comercial.
            A abertura do direito das corporações aos demais cidadãos foi vista pela população em geral com bons olhos, visto que o direito outorgado pelo Estado era precário e com sérias tendências usurpadoras. Assim, o povo começou a depositar grande confiança nas decisões emanadas pelos juízes consulares.
            Neste ínterim, as corporações da Idade Média foram o trampolim do Direito Comercial para se estabelecer como um direito especial e autônomo, tendo principalmente a Itália como berço desse ramo do direito.
SISTEMA OBJETIVO - TEORIA DOS ATOS DO COMÉRCIO
Com o incremento do comércio e novas práticas de atividades mercantis, o crédito comercial ganha importância e surge a atividade bancária concedendo crédito tanto para os comerciantes como para os consumidores. As transações de crédito bancário eram documentadas através de títulos cambiais, deixando tais atos acessórios ao comércio de serem exclusivos de comerciantes para abrangerem toda a população, impondo uma objetivação do direito comercial.
REQUIÃO[21] cita muito bem Vivante quando este explica esta transição do sistema subjetivo para o objetivismo aduzido pela Teoria dos Atos de Comércio;
“... passou-se do sistema subjetivo ao objetivo, valendo-se da ficção segundo a qual deve reputar-se comerciante qualquer pessoa que atue em juízo por motivo comercial. Essa ficção favoreceu a extensão do direito especial dos comerciantes a todos os atos do comércio, fosse quem fosse seu autor, do mesmo modo que hoje a ficção atribui, por ordem do legislador, o caráter de ato de comércio àquele que verdadeiramente não o tem, serve para estender os benefícios da lei mercantil aos institutos que não pertencem ao comércio”.
            Seguindo esta teoria, encontra-se o primeiro Código Comercial moderno, o Código de Savary, da ordenação de Colbert, datado de 1673, o qual fixa a figura do comerciante de forma objetiva, sendo todo aquele que pratica atos pertinentes à matéria comercial.
            Outro código que adota a teoria objetiva é o famoso Código Napoleônico de 1807, pois agindo de acordo com a Teoria dos Atos de Comércio estaria a serviço da Revolução Francesa, com suas ideias de igualdade em confronto com a teoria subjetiva que restringia o privilégio do Direito Comercial aos inscritos nas corporações.
            O Código Napoleônico expressamente tinha o objetivo de romper com o sistema aristocrático feudal e consolidar o poder da burguesia emergente. Neste liame, encontram-se as sábias palavras do professor NÚÑEZ[22]:
“En efecto, tal como lo ha señalado Francesco Galgano, el Code pudo más que la guillotina. Con unos cuantos artículos fracturó la propriedade nobiliaria, destruyendo para siempre las bases materiales del poder aristrocrático y abrió a la burguesia el acceso a la propriedade de la tierra. La Revolución francesa, la verdadeira revolución – disse Galgano – no fue obra de Robespierre, sino de Pothier. Fue el produto de la fuerza poderosa del Derecho.”
            Salienta-se que na mesma época foi editada a celebre Lei Chapelier, a qual visava assegurar plena liberdade profissional, extinguindo os privilégios de determinadas classes ou corporações, bem como fez o Código Napoleônico ao incorporar a Teoria dos Atos de Comércio.
            No Brasil esta concepção foi adotada pelo Código Comercial de 1850. Contudo, ao perceber que este dispositivo limitou-se a disciplinar a atividade profissional do comerciante, sem mencionar ou definir atos de comércio, viu-se a latente necessidade de tal regulamentação.
            A necessária regulamentação na legislação brasileira surgiu através do Regulamento 737, de 25 de novembro de 1850, definindo no artigo 19 o que era considerado atos de comércio.
“Artigo 19. Considera-se mercancia:
§1º - A compra e venda ou troca de efeitos móveis ou para os vender por grosso ou a retalho, na mesma espécie ou manufaturados , ou para alugar o seu uso;
§2º - As operações de câmbio, banco e corretagem;§3º - As empresas de fábricas, de comissões, de depósitos, de expedição, consignação e transporte de mercadorias, de espetáculos públicos;
§4º - Os seguros, fretamentos, risco e quaisquer contratos relativos ao comércio marítimo;
§5º - A armação e expedição de navios.”[23]
            Por se resumir ao estabelecimento de uma relação de atividades econômicas, o sistema francês dos atos de comércio gerou indefinições quanto à natureza mercantil de algumas delas, principalmente, porque quando à época de sua definição pelo legislador pátrio, apenas foi considerada a natureza comercial dos atos que já eram realizados pelos comerciantes, ou seja, baseando exclusivamente na tradição histórica do comércio. Essa foi a razão de algumas atividades não terem sido consideradas atos de comércio, tais como a prestação de serviços, a agricultura e a negociação imobiliária, uma vez que essas atividades não eram tradicionalmente desenvolvidas pelos comerciantes da época.
            A inexistência de parâmetros científicos na estipulação das atividades econômicas e a exclusão de importantes atividades no rol dos atos comerciais constituíram os principais motivos ensejadores para que a Teoria dos Atos do Comércio perdesse prestígio e fosse substituída pelo sistema italiano da Teoria da Empresa. Vale destacar que tal substituição só ocorre mais de um século após editado o Código Napoleônico, tempo mais que suficiente para inspirar todas as legislações que seguiram seus princípios, dentre elas o Código Comercial Brasileiro de 1850.
            A Teoria da Empresa chegou ao Brasil e propagou-se pela legislação pátria, sendo encontrada atualmente em diversos dispositivos normativos, como o Código do Consumidor e o Código Civil de 2002, sendo esta a teoria utilizada pelo Direito Empresarial brasileiro.
TEORIA DA EMPRESA – SISTEMA SUBJETIVO MODERNO
Alguns passos adiante e com o crescimento do entendimento de que o Direito Comercial é muito maior que a simples prática de atos de comércio, bem como as falhas encontradas na Teoria dos Atos de Comércio, iniciou-se uma nova forma de enxergar o Direito Comercial, ultrapassando os limites dos atos de comércio e buscando a empresa como um todo.
            O extraordinário desenvolvimento da economia capitalista tornou a visão objetiva e isolada de ato de comércio desacreditada. No século XIX, auge da Revolução Industrial, destaca um novo ponto de vista do comércio e do Direito Comercial, tendo como foco o empresário e a empresa.
            Na pobre visão dos atos de comércio e por óbvios motivos de completo rompimento com o sistema feudalista, a agricultura e a pecuária não eram entendidos como comércio, bem como outras atividades que essencialmente eram empresariais, e assim, faziam a circulação de bens e riquezas, o que gerava falhas e lacunas na competência do Direito Comercial.
            A limitação imposta ao Direito Comercial pela Teoria dos Atos de Comércio era tamanha que segundo o artigo 632, do Código Francês, empresa nada mais era que a prática reiterada e em cadeia dos atos de comércio, conceito este que não valora a organização do capital e trabalho[24].
            Na vanguarda da troca do foco no comércio puro e simples para uma visão mais complexa de empresa, encontra-se o Código Comercial de 1897, da Alemanha, o qual reintroduziu o conceito subjetivo, devidamente modernizado e readequado aos tempos em que se inseria[25].
            O referido código, no artigo 343, expressa que os atos de comércio são aqueles praticados por comerciantes, relativos e estritamente relacionados à prática comercial, vinculando o comerciante a exploração empresarial. Com este novo conceito surge o Direito das empesas, tal como conceituado também em 1942 no respeitado Código Unificado Italiano.
            De acordo com a Teoria da Empresa, o Direito Comercial tem seu campo de abrangência ampliado, incorporando atividades até então excluídas pela Teoria dos Atos de Comércio. Ao contrário da teoria francesa não se divide mais as atividades econômicas em dois grandes grupos, civil e comercial. A Teoria da Empresa prevê de forma ampla as atividades econômicas, excluindo somente atividades específicas, que são, as atividades intelectuais, de natureza literária, artística ou científica.
 Já no tocante a atividade agrícola o Direito Empresarial brasileiro deixou a cargo do agricultor decidir, vez que cabe a este a opção pelo regime comercial, através do registro empresarial perante as Juntas Comerciais e Registro Público de Empresas. Vale consignar que tal opção não caracteriza a manutenção da agricultura e pecuária fora do direito empresarial.
Tal opção somente existe em face dos pequenos produtores rurais e da agricultura familiar, que efetivamente não podem ser considerados empresas ou empresários, pois praticamente trabalham para sua subsistência e não com o intuito de comercializar sua produção.
A Teoria da Empresa nasceu em 1942, na Itália, alargando a incidência do Direito Comercial. Esta terceira etapa de desenvolvimento do Direito Comercial apareceu aos olhos do mundo em época e local que devem ser considerados, haja vista o mundo estar em plena Segunda Guerra Mundial e a Itália ser governada pelo ditador fascista Mussolini.
O fascismo buscava a harmonização da luta de classes intermediada pelo estado nacional. A empresa no ideário fascista representa o local de harmonização entre o proletariado e a burguesia, reunindo os ideais econômicos da empresa com os interesses dos trabalhadores.
Obviamente a configuração empresarial moderna não encontra como seu princípio norteador os interesses dos trabalhadores, porém a Teoria da Empresa sobreviveu a redemocratização da Itália graças aos seus méritos jurídico-tecnológicos, facilitando a operacionalidade das empresas perante o ordenamento jurídico moderno.
A Teoria da Empresa começa a surgir no direito brasileiro a partir de 1960 em contraposição à defasada Teoria dos Atos de Comércio, especialmente pela não inclusão de atividades de extrema importância ao desenvolvimento econômico nacional, como a prestação de serviços, atividades rurais e negociação de imóveis.
Em 1965 a Teoria da Empresa é adotada pelo Projeto de Código das Obrigações que não veio a se tornar lei. Posteriormente em 1975 esta teoria figura novamente no Projeto de Código Civil, o qual tramitou com lentidão histórica, tornando-se o atual Código Civil de 2002. Todavia, durante a tramitação do Código Civil diversas leis de interesse comercial utilizaram o sistema italiano, por exemplo o Código de Defesa do Consumidor de 1990, a Lei de Locação Predial Urbana de 1991 e a Lei de Registro de Empresas de 1994[26].
HISTÓRIA E EVOLUÇÃO DO DIREITO COMERCIAL NO BRASIL
            No Brasil colonial as relações jurídicas eram caracterizadas pela legislação da pátria mãe, Portugal, vigorando a época as Ordenações Filipinas e forte influência do Direito Canônico e Romano.
            Todavia, com a chegada da família real ao solo da colônia tupiniquim, acossada pela invasão de Portugal pelas tropas de Napoleão, foi imprescindível a atualização das práticas comerciais implantadas no Brasil, e consequentemente do Direito Comercial que regia tais transações.
            Ato de Dom João VI, assinado em 28 de janeiro de 1808, seis dias após a chegada da Família Real portuguesa a Salvador, decretou a abertura dos portos brasileiros às nações amigas de Portugal, o que excluía a França, então em guerra contra Portugal. Antes da vigência da abertura dos portos toda mercadoria que era importada ou exportada pelo Brasil deveria obrigatoriamente ter como entreposto Portugal, onde era pesadamente taxada.
            No mesmo ano outros avanços legislativos e econômicos vieram à tona, como a criação do Banco do Brasil através do alvará de 12 de outubro de 1808 e a criação da Real Junta de Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, que tinha como intuito fomentar a produção e comercio de insumos brasileiros.
            A principal função da Junta de Comércio, Agricultura,Fábricas e Navegação era organizar as frotas, fiscalizar o comércio e intervir nas falências, além de receber as contribuições para pagamento dos marinheiros da Índia, definir a capacidade e preço do frete dos navios e fiscalizar a carga e descarga de produtos nos navios, atuando como agente alfandegário.
            Com a Proclamação da Independência não houve uma completa secção da legislação portuguesa, fato este comprovado pela Lei da Boa Razão, que autorizava em caso de lacuna da lei pátria, invocar os subsídios da legislação comercial das nações cristãs mais evoluídas e depuradas da boa jurisprudência. Neste liame, durante anos a legislação comercial brasileira foi na verdade o Código Francês de 1807, o Código Comercial Espanhol de 1829 e por fim o de Portugal de 1833[27].
            O jovem Império não satisfeito com a utilização de legislação estrangeira, através da Real Junta de Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, incumbiu o Visconde de Cairu de organizar um novo Código Comercial puramente brasileiro. Em 1832, o Príncipe Regente nomeou comissão para este fim, a qual era composta quase integralmente de grandes comerciantes nacionais da época, dentre eles Antônio Paulino Limpo de Abreu, José Antônio Lisboa, Inácio Ratton, Guilherme Midosi, e Lourenço Westin. A comissão presidida por Antônio Paulino Limpo de Abreu e posteriormente por José Clemente Pereira enviou o projeto do Código Comercial Brasileiro à Câmara em 1834.
            Frisa-se que quase todos os idealizadores do Código Comercial eram homens vinculados a importantes atividades comerciais: Ratton era banqueiro e membro da Sociedade dos Assinantes da Praça do Comércio do Rio de Janeiro, Midosi era comerciante sediado no Rio de Janeiro, Westin cônsul da Suécia no Brasil e proprietário da casa de comércio Westin e Cia, Limpo de Abreu era genro de um importante fazendeiro e comerciante de Minas Gerais, figurando como principal abastecedor de alimentos da Corte[28].
            O projeto foi exaustivamente debatido no legislativo até sua promulgação em 1850, Lei 556 de 25 de junho de 1850. O atual Código Comercial Brasileiro, atualmente quase inteiramente esvaziado pelo Código Civil de 2002, permanecendo em vigência somente as normas de Direito Marítimo.
            De acordo com MENDONÇA[29], o código Comercial não é cópia servil de nenhum diploma antes encontrado, sendo o primeiro trabalho original que apareceu na América, porém baseou-se principalmente no Código Português de 1833, e subsidiariamente no Francês de 1807 e Espanhol de 1829.
            Revela esclarecer que o Código Comercial brasileiro apesar de baseado na Teoria dos Atos de Comércio, em nenhum de seus artigos apresenta a enumeração dos atos de comércio, nos moldes do Código Comercial Francês de 1807, o qual delimita os atos de comércio nos artigos 632 e 633[30].
            Visando sanar esta lacuna o legislador brasileiro editou o Regulamento nº. 737, de 1850, que tratava do processo comercial, e nos artigos 19 e 20 enumerou os atos de comércio baseando-se novamente no Código Comercial Francês.
            Com o advento do Código Comercial os tribunais do comércio foram modificando-se até sua extinção pela Lei 2.662, de 1875, com a unificação do processo judicial. Em 1866 o juízo arbitral, que era obrigatório, ganhou caráter facultativo e, em 1882, as sociedades anônimas desvincularam-se do controle estatal, podendo serem constituídas livremente. Em 1908, o Direito Cambiário, por meio do Decreto 2.044, adaptou-se à nova fase do país, dando origem ao instituto da concordata[31].
A importância do rol dos atos de comércio do Regulamento 737 só veio a diminuir a partir do ano de 1960, com a aproximação do direito italiano e a utilização da teoria da empresa no Projeto de Código das Obrigações.
            Com o advento do Código Civil de 2002, o Direito Comercial, modernamente chamado de Direito Empresarial, voltou a aplicar o caráter subjetivo, focando no profissional empresário, aquele que exerce como profissão atividade empresarial, voltada para a produção e circulação de bens e serviços, conforme estabelecido pelo Código Civil de 2002 nos artigos 966 a 1195[32].
CONSIDERAÇÕES FINAIS
            A proposta deste artigo foi realizar um levantamento histórico do comércio e do Direito Comercial, visando um melhor entendimento da atual situação dessa tão importante matéria do Direito Privado.  Decalca-se que é indispensável o estudo histórico do Direito para que se possa compreender profundamente as instituições e dispositivos existentes na atualidade.
No decorrer do levantamento bibliográfico pode-se perceber algumas contradições sobre o início das atividades comerciais no mundo antigo, bem como do Direito Comercial, seja através de normas esparsas, as quais regulavam situações pontuais na evolução comercial, seja através do Direito Comercial como disciplina autônoma na seara jurídica.
Vale consignar que a dificuldade para delimitar a atividade comercial e o Direito Comercial no tempo é grandemente fruto da falta de estudos mais detalhados e da falta de documentos antigos escritos, capazes de convalidar as diversas teorias sobre o nascimento deste ramo do direito privado.
 A autonomia do Direito Comercial, hoje Direito Empresarial, no direito nacional pode ser defendida sobre três aspectos: didática, formal e substancial ou jurídica.
A autonomia didática percebe-se através de fácil análise curricular nas universidades de Direito, sendo o Direito Empresarial uma cátedra autônoma. O ponto de vista formal é o mais difícil de ser defendido, haja vista o esvaziamento do Código Comercial pelo Código Civil de 2002, persistindo as regras de Direito Marítimo.
Todavia, ao analisar a vasta legislação esparsa que trata exclusivamente de questões puramente empresariais, como a Lei 6.404/1976 (Lei das Sociedades Anônimas), o Decreto 57.663/1966 (Letra de Câmbio e Nota Promissória), Lei 7.357/1985 (Lei do Cheque), Lei 8.934/1994 (Registro de Empresas), dentre outras, comprava a autonomia substancial ou jurídica.  
Conclui-se que do comércio à empresa, o Direito Comercial modificou-se em decorrência da necessidade de acompanhar as rápidas transformações econômicas, das arcaicas corporações de ofício às atuais multinacionais e empresas digitais. Neste cenário espera-se um ritmo cada vez maior de evolução do comércio e sua consequente transformação no Direito Comercial 
que deve estar em constante mutação e atualização para regulamentar a nova economia globalizada.
RESUMO
Este artigo tem por objetivo apresentar o caminho evolutivo do Direito Comercial a partir das mudanças sofridas pela própria natureza da atividade mercantil, em decorrência da evolução das relações sociais. De início, busca-se a compreensão da origem do Direito Comercial, que passa pela noção de comércio e pela caracterização desse tipo de atividade através dos tempos. Após a abordagem geral, trata-se do desenvolvimento do Direito Comercial no Brasil: desde a época da colonização, passando pelo Código Comercial de 1850 e a teoria dos atos de comércio até o advento do Código Civil de 2002 e a adoção da teoria da empresa pela legislação pátria. Na sequencia, cuida-se das fontes do Direito Comercial e da transição de comércio à empresa na nomenclatura dessa disciplina. Ao final se abordada a problemática em torno da possível perda de autonomia desse ramo do direito, em razão da unificação legislativa do direito privado brasileiro.
Palavras-chave: Direito Comercial. Comércio. Código Civil.
ABSTRACT
The present work has for objective to present the evolutionary road of the Commercial Right, starting from the suffered changes for the own nature of the mercantile activity, due to the evolution of the social relationships. At the beginning, the understanding of the origin of the Commercial Right is looked for, that goes by the trade notion and for the characterization of that activity type through the times. After the general approach, it is treated of the development of the CommercialRight in Brazil: from the time of the colonization, going by the Commercial Code of 1850 and the theory of the trade acts to the coming of the Civil Code of 2002 and the adoption of the theory of the company for the legislation homeland. In the sequence, he/she takes care of the sources of the Commercial Right and of the trade transition to the company in the nomenclature of that discipline. At the end, if approached the problem around the possible loss of autonomy of that branch of the right, in reason of the legislative unification of the Brazilian private right.
Word-key: Commercial right. Trade. Civil code.
1 INTRODUÇÃO
Não há dúvida que o comércio sempre ocupou importante lugar no seio da humanidade, tendo papel fundamental no seu desenvolvimento. Isso se apresenta hoje no grande fascínio exercido pelo consumismo na vida das pessoas, o que, ajudado pelo avanço tecnológico, facilita a aquisição de bens e serviços.
Diante dos grandes conglomerados econômicos que não param de se fortalecer, fica difícil imaginar a vida sem a atividade mercantil, uma vez que, de um jeito ou de outro, praticamente todos, cada um em sua medida, estão envolvidos na rede mundial de consumo que se transformou o comércio.
Essa incrível participação das transações mercantis na vida moderna faz surgir várias outras relações jurídicas, as quais necessitam de uma regulamentação própria em razão de sua natureza específica. É aí que entra o papel decisivo do Direito Comercial, ou empresarial como muitos já o definem.
Tal disciplina da atividade mercantil, que surgiu, como se verá mais detalhadamente no decorrer deste artigo, dos usos e costumes da classe comerciante da Idade Média, adquiriu grandes proporções e elevada importância, disciplinando toda a seara mercantilista: operações de crédito, direitos do consumidor, celebração de contratos, fusão de grandes empreendimentos, controle de práticas econômicas abusivas, consumo de produtos importados, cheques sem fundos, circulação de bens e valores, entre muitas outras operações executadas pela quase totalidade dos habitantes do planeta.
Isso é apenas uma amostra de como os empreendimentos comerciais e, consequentemente, o Direito Comercial, estão presentes no atual modelo social; mais inserido na vida das pessoas do que se pode dar conta, principalmente pela tênue fronteira que separa os países em tempos de globalização, ou mundialização como preferem alguns. Se historicamente o comércio nunca conheceu fronteiras, isso está ainda mais acentuado na contemporaneidade.
Diante dessa constatação, depreende-se que só vem a aumentar a importância de se ter um Direito Comercial sintonizado com as novas exigências da vida moderna. Menos conhecido do que vários outros ramos jurídicos, como o Direito Civil ou o Direito Penal, mas talvez tão ou mais utilizado que muitos, torna-se cada vez mais necessário se estudar essa disciplina jurídica com a mesma atenção dispensada às demais.
É com essa perspectiva que este artigo será desenvolvido. Assim, buscando-se um maior entendimento sobre o atual Direito Comercial, o trabalho será iniciado ressaltando-se os principais aspectos de sua evolução histórica, a começar pelo desenvolvimento da atividade comercial, que foi seu objeto primeiro, passando pelas teorias que mais influenciaram sua evolução.
A partir daí será feita uma incursão pelo desenvolvimento do Direito Comercial em território brasileiro, das leis portuguesas ao advento do Código Civil de 2002, com ênfase na unificação legislativa do direito privado, na figura do empresário e no papel da empresa.
Por fim, serão feitas algumas considerações em torno de questões afetas às fontes do Direito Comercial, à possível mudança de nomenclatura para direito Empresarial e à sua autonomia tendo em vista sua unificação legislativa com o Direito Civil.
2 O COMÉRCIO ATRAVÉS DOS TEMPOS
Etimologicamente, o termo "comércio" vem do latim, commercium, que quer dizer "tráfico de mercadorias". Tal significado é facilmente resgatado no definição desse termo, que vem a ser a troca voluntária de produtos e serviços por outros produtos ou por valores, ou mesmo de valores entre si [01], estando implícito o ato de negociar, vender, revender, comprar algo, em síntese, são todas as relações de negócios. O comércio é uma relação social que é singular ao homem.
Vale ressaltar que o ato de comercializar precisa refletir o desejo de alguém em adquirir algo e a conveniência de outrem em cedê-lo ou vendê-lo.
Não é possível identificar a existência de comércio formalmente instituído nos tempos primitivos pelo fato de, nessa época, os produtos se destinarem apenas à subsistência; isto é, não ocorria a troca de excedentes, o que se deu gradativamente, como ensina Fran Martins (1991, p. 01):
No início da civilização, os grupos sociais procuravam bastar-se a si mesmos, produzindo material de que tinham necessidade ou se utilizando daquilo do que poderiam obter facilmente da natureza para a sua sobrevivência – alimentos, armas rudimentares, utensílios. O natural crescimento das populações, com o passar dos tempos, logo mostrou a impossibilidade desse sistema, viável apenas nos pequenos aglomerados humanos... Passou-se, então, à troca dos bens desnecessários, excedentes ou supérfluos para certos grupos, mas necessários a outros [...]. Inegavelmente, a troca melhorou bastante a situação de vida de vários agrupamentos humanos.
Nessa época remota, as mercadorias que se barganhavam eram, na verdade, o que se produzia em excesso, tornando-se mais intensa essa atividade à medida que foi sendo necessário diversificar os materiais de que se dispunha, uma vez que a produção para consumo próprio já não era suficiente e as riquezas passaram a ser produzidas com fins de permuta.
Os grupos, nômades e geralmente de uma mesma família, isolados uns dos outros eram auto-suficientes; ao iniciarem um processo de aproximação, iniciou também a primeira forma de comércio – a troca. Com as trocas, as riquezas foram sendo melhor aproveitadas e cada grupo podia se dedicar a produzir aquilo para o que fosse mais apto.
Com o desenvolvimento das relações humanas, a permuta de um produto por outro foi sendo paulatinamente substituída por itens intermediadores – gado, peixe e até conchas – que serviam como um tipo de moeda.
Avançando na história, na Grécia o comércio era à base de costumes, mas é lá que surgem os primeiros contratos e o uso da lei escrita, os quais orientavam a comercialização marítima. Em Roma, o comércio era praticado pelos estrangeiros, disciplinados pelo jus gentium, uma vez que a aristocracia não via com apreço tal atividade, tida como desonrosa.
Paulatinamente, o homem promoveu uma série de evoluções que facilitaram o fluxo de mercadorias e as atividades comerciais, então foram criadas moedas, bancos, bolsas de valores e diversos outros institutos. No entanto, nessas civilizações clássicas não havia uma legislação comercial especial, o que se inicia a partir da Idade Média. Ricardo Negrão (1999, p. 28-29), assim assevera em relação ao comércio medieval:
Nesse período, o comércio, estava ligado ao comércio itinerante: o comerciante levava mercadorias de uma cidade para outra através de estradas, em caravanas, sempre em direção a feiras que ocorriam e tornavam famosas as cidades européias [...] Em sua evolução, as feiras se especializam, surgem os mercados (feiras cobertas) [...] As lojas, cuja função é a venda constante, num mesmo local, surgem quase que simultaneamente às feiras [...] Os mascates completam o quadro de distribuição de mercadorias.
É nessa época que se pode falar do surgimento de um direito organizado para o comércio vigente, afinal já existia um considerável sistema comercial em funcionamento, distante do sistema de trocas dos povos antigos. Então, diante da fragmentação social provocada pelo sistema feudal, tornou-se necessária a formação de associações, as chamadas corporações de ofício, nascedouro do Direito Comercial, que era baseado nos costumes e tradições dos comerciantes de então.Com o fim da Idade Média a partir do surgimento dos Estados Nacionais, essas normas passam a ser fruto da emanação estatal, adquirindo um caráter nacional. Após a Revolução Francesa e com o surgimento do liberalismo econômico, o intervencionismo estatal nas atividades econômicas, que aceleram seu processo evolucionista, diminui consideravelmente. Na França, são editados o Código Civil e o Comercial para dar conta das novas circunstâncias sociais e comerciais, os quais irão influenciar codificações posteriores.
Diante do exposto, observa-se que desde a antiguidade o comércio faz parte da vida do homem de forma bastante decisiva, estando a história de ambos interligada: basta relembrar a formação de núcleos comerciais em torno dos castelos feudais; as grandes navegações em busca do comércio nas Índias ou as caravanas pelos desertos orientais e, com elas, o desenvolvimento dos transportes e das suas vias; a supremacia econômica do império romano, dentre tantos outros marcos da história que tem o comércio como integrante.
Como o homem, o comércio também evoluiu, indo da simples troca de itens excedentes aos mercados globalizados de hoje. Depois do desenvolvimento do comércio marítimo, na Idade Média, e do advento das feiras e mercados, acontece a Revolução Industrial que, na Idade Moderna, promoveu uma ruptura em toda a estrutura econômica e social existente.
A atividade mercantil, responsável pelo fluxo das mercadorias – outrora entre famílias e feudos – precisava agora ir mais longe para fazer a comunicação entre as cidades, que se multiplicavam, e entre os países, que se tornavam mais "próximos". Tal atividade passava a ter, mais que em qualquer outra época, o papel de integração dos povos, visto que, ao promover a circulação de produtos, também gera a comunicação entre as culturas.
O comércio exerceu uma colaboração muito importante nas sociedades, no desenvolvimento de novas tecnologias e, principalmente, na melhoria de infra-estrutura através da construção de estradas, ferrovias, portos, pontes etc., o que veio a facilitar o fluxo de mercadorias em nível planetário, até resultar no processo de globalização.
Atualmente, com o assustador desenvolvimento tecnológico e as facilidades da era digital – destaque para a internet – é possível comercializar algo com qualquer parte do planeta sem precisar, para tanto, locomover-se. Isso não significa que o comércio tradicional, face to face, tenha perdido seu lugar de destaque na sociedade; pelo contrário, ele continua em evidência e tem como maior símbolo os shoppings centers (os correspondentes modernos dos mercados e lojas referenciados anteriormente)que se multiplicam nas grandes cidades. Isso se deve ao consumismo que não pára de crescer, permitindo que o comércio de feições tradicionais e o moderno desfrutem de lucros também crescentes.
Num contexto em que o fluxo de mercadorias precisa ser crescente para dar sustentação às economias dos países, a ligação entre a atividade mercantil e a história humana fica ainda mais clara quando ocorre uma crise econômica como a atual, que abalou o poder aquisitivo das pessoas mundo a fora, em virtude da globalização, toda a estrutura econômica mundial acabou sendo afetada.
Como se pode notar, numa menor ou maior escala, o comércio sempre se fez presente na vida do homem e, como ele, vem se desenvolvendo ao longo do tempo. Na sequencia, será exposta a relação existente entre o comércio e o direito, tendo em vista ser necessária a existência de regras cada vez mais abrangentes para regulamentar a atividade mercantil.
3 DIREITO E COMÉRCIO
Inicialmente, a idéia era que o Direito Comercial se prestava a reger apenas as relações dos comerciantes, uma vez que, historicamente, foi para isso que ele surgiu. Mas, no decorrer dos anos, as atividades comerciais evoluíram sobremaneira, abrangendo a indústria e outras atividades antes não consideradas mercantis. Isso fez com que aquela idéia reducionista do Direito Comercial se tornasse insatisfatória e fosse, paulatinamente, sendo deixada de lado, como se verá adiante.
Como todas as relações humanas, também o comércio precisa de regras com vistas à otimização de seu funcionamento e à proteção das partes envolvidas. O Direito Comercial, cuja evolução histórica é o tema central deste artigo, é o ramo do direito privado responsável por regulamentar as relações comerciais. O intuito deste trabalho é o de apresentar a evolução que o Direito Comercial sofreu para acompanhar as transformações da atividade mercantil e da própria sociedade. Para tanto, será necessário entender como se deu seu surgimento histórico, como se desenvolveu e, também, qual a atual situação desse campo jurídico.
Apesar de se falar na existência de comércio desde a Idade Antiga, não se pode afirmar; pela escassez de elementos históricos, haver nas remotas sociedades um direito autônomo, com princípios, normas e institutos sistematizados, voltados à regulamentação da atividade mercantil [02]. Nos tempos antigos, de acordo com MARTINS (1991, p.5-6), são os usos e costumes advindos do comércio marítimo que regulam as relações comerciais em cada cidade, entretanto, não se pode considerar direito propriamente dito pela falta de abrangência de suas normas, o que só viria a ocorrer a partir da Idade Média.
Durante a Idade Média, todavia, o comércio já atingira um estágio mais avançado, e não era mais uma característica de apenas alguns povos, mas de todos eles. É justamente nessa época que se costuma apontar o surgimento das raízes do Direito Comercial. [...] é a época do renascimento das cidades ("burgos") e do comércio, sobretudo o marítimo. [03]
Na verdade, não existe consenso quanto ao início histórico do Direito Comercial: enquanto alguns estudiosos defendem uma divisão conforme a divisão clássica da história do homem; outros, os quais aqui serão considerados, apontam a Idade Média como sendo o marco inicial do Direito Comercial, tendo em vista as idéias econômicas que, ligadas à ascensão da classe burguesa urbana, contrapunham-se ao feudalismo predominante, o que promoveu uma verdadeira revolução no mundo ocidental. A partir daí, o Direito Comercial apresentaria diferentes momentos, conforme o contexto histórico em que está situado, cuja divisão tem por norte as características que o particularizam nas diferentes épocas, desde a sua utilização até a forma como é estipulado para a sociedade, como se expõe a seguir.
3.1 DIVISÃO DO DIREITO COMERCIAL
Como exposto anteriormente, o Direito Comercial surgiu formalmente na Idade Média devido à ascensão de formas de comércio mais organizadas, surgimento das corporações de mercadores e crescimento das cidades medievais. Tudo isso gerou, naturalmente, a necessidade de se criar normas que regulamentassem essas atividades, as quais foram criadas pela classe comerciante e, dessa forma, privilegiava-lhe.
Com a filosofia liberal da Idade Moderna, que dava ênfase à igualdade entre os cidadãos, criou-se uma forma de regulamentação das atividades mercantis que não se sujeitasse à conveniência da classe dos comerciantes, reorientando o foco daqueles que faziam parte das corporações para qualquer um que se enquadrasse como realizador de uma atividade tida como comercial.
Com os novos horizontes alcançados pelo mundo do comércio, com o capitalismo e sua revolução nos sistemas de produção, também essa forma de regulá-lo ficou obsoleta, o que faz surgir uma nova visão para o Direito Comercial. Nessa nova ótica, entre em cena a figura do empresário, o conceito de empresa, a distribuição de bens e de serviços em larga escala, e o Direito Comercial precisou ser o disciplinador, também, das empresas comerciais. Assim, tendo em vista as mudanças de contexto pelas quais passou o comércio e, consequentemente, o Direito Comercial, sua evolução é dividida em fases históricas.
Conforme Negrão [04], que segue a divisão proposta por Oscar Barreto Filho com o Direito Comercial dividido em quatro fases históricas, a primeira delas, que vai o século XII ao XVI, está assim caracterizada:existência de um direito de classes, no caso a dos comerciantes, com regras estabelecidas por eles e para eles, sem a participação estatal, apenas podendo ser usadas por quem integrasse as corporações de ofício. É a época do comércio itinerante, que evolui para feiras, mercados e lojas. Seriam os serviços originados nessas feiras os responsáveis pelo surgimento de vários institutos jurídicos, como o câmbio, os títulos de crédito, os bancos e as bolsas; surgindo aí, inclusive, os mercados financeiros acionários. Ocorre a evolução das sociedades marítimas (um sócio em terra e outro na embarcação, negociando pelos mercados por onde passa), as quais viram a ser reguladas pelas Ordenações Filipinas em 1603. Ainda são identificadas nesse período ascompanhias (instituições familiares, mais tarde chamadas de sociedade por causa da solidariedade e da não limitação de responsabilidade perante terceiros) e as sociedades por ações, que são as últimas a surgir.
A segunda fase, caracterizada pelo mercantilismo e pela colonização, está compreendida entre os séculos XVII e XVIII. Época em que se observa a evolução das grandes sociedades. Aqui as normas do Direito Comercial, como todas as outras, tem origem num poder soberano central – o rei. Na Europa, surgem as codificações tanto para matéria de direito marítimo quanto para de direito terrestre.
A terceira fase do Direito Comercial compreende o século XIX e é marcada pelo liberalismo econômico. Aqui, com a promulgação do Código Napoleônico de 1806, surge o conceito objetivo de comerciante, que seria todo aquele que praticasse atos de comércio profissionalmente e de forma habitual. O Direito Comercial deixa de ser dos comerciantes e passa a ser dos atos de comércio, isto é, perde o caráter subjetivo, pessoal, e adquire um caráter objetivo ligado às atividades tidas legalmente como comerciais. A Teoria dos Atos de Comércio será tratada de forma mais detalhada posteriormente.
A quarta e última fase, que é a contemporânea, caracteriza-se por uma nova visão do Direito Comercial que culmina com a terminologia do direito de empresa, ou empresarial, a qual foi adotada inicialmente pelo Código Civil italiano de 1942 e integra o Livro II do Código Civil brasileiro de 2002. A Teoria da Empresa também será tratada em tópico específico.
Na visão de Ramos [05], que apresenta uma divisão menos fragmentada, o Direito Comercial teria três períodos históricos, os quais são a seguir apresentados apenas para fins de comparação com a caracterização anterior:
Primeiro período: compreende a Idade Média e tem por contexto o mercantilismo, o ressurgimento das cidades, a aplicação dos usos e costumes mercantis e a codificação privada do Direito Comercial – pelos comerciantes, tendo assim um caráter subjetivista.
Segundo período – abrange a Idade Moderna que, com a formação dos Estados Nacionais monárquicos e a consequente monopolização jurisdicional, objetiva o Direito Comercial, que deixa de ser da classe dos comerciantes e passa a valer para qualquer cidadão que exerça uma atividade comercial; destaque para a Codificação Napoleônica com a bipartição do direito privado – civil e comercial – e para a teoria dos atos de comércio.
Terceiro período – corresponde à Idade Contemporânea. tem como marco o Código Civil Italiano de 1942 e se caracteriza pela unificação formal do direito privado, pela prevalência da teoria da empresa no regime jurídico-empresarial e pelo papel da empresa como atividade econômica organizada.
Como é possível observar, a opção por uma ou outra divisão não interfere no entendimento da evolução histórica da disciplina comercial, pois as duas trazem informações similares sobre o tema, diferindo apenas no corte temporal. O importante a observar em ambas as divisões é o reflexo imediato dos acontecimentos sociais e políticos de cada época no contexto de criação e utilização das regras que regulamentam as atividades mercantis.
Isso demonstra que, assim como o comércio se desenvolveu conforme o homem e suas relações, o direito que o rege tem acompanhado esse desenvolvimento, indo da inexistência de regras ou das regras direcionadas a um determinado grupo, para ser o regulador de todas as atividades mercantis, sejam elas comerciais ou empresariais.
https://www.youtube.com/watch?v=duUhG-pIWZg
Historicidade do Direito Comercial
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Publicado por Ademarcos Almeida Porto - 1 ano atrás
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1 - Historicidade do Direito Comercial
O surgimento e a evolução do direito comercial ocuparão destaque nessa retrospectiva devido ao vínculo direto com o tema.
1.1 - O comércio através dos tempos
A origem do termo "comércio" vem do latim, commercium, que quer dizer "permutação, troca, compra e venda de produtos ou valores". Tal significado é facilmente resgatado na definição desse termo, que vem a ser a troca voluntária de produtos e serviços por outros produtos ou por valores, ou mesmo de valores entre si, estando implícito o ato de negociar, vender, revender, comprar algo, em síntese, são todas as relações de negócios. O comércio é uma relação social que é singular ao homem.
Os Homens trocaram, desde a Pré-história, produtos entre si. Se um grupo tinha sorte com as colheitas e conseguia obter mais cereais do que precisava para se alimentar, podia procurar um grupo vizinho e trocar as sobras por coisas que, na altura, lhe faziam falta (gado, cestos, ferramentas, etc.).
As primeiras trocas terão sido feitas num impulso de acaso ou por uma necessidade imediata. Mas, a pouco e pouco, as pessoas perceberam que valia a pena produzir a mais para futuras trocas. A este tipo de comércio primitivo em que não havia moeda dá-se o nome de troca direta.
Não é possível identificar a existência de comércio formalmente instituído nos tempos primitivos pelo fato de, nessa época, os produtos se destinarem apenas à subsistência; isto é, não ocorria a troca de excedentes, o que se deu gradativamente, como ensina Fran Martins (2000, pag. 1):
“No início da civilização, os grupos sociais procuravam bastar-se a si mesmos, produzindo material de que tinham necessidade ou se utilizando daquilo do que poderiam obter facilmente da natureza para a sua sobrevivência – alimentos, armas rudimentares, utensílios. O natural crescimento das populações, com o passar dos tempos, logo mostrou a impossibilidade desse sistema, viável apenas nos pequenos aglomerados humanos. Passou-se, então, à trocados bens desnecessários, excedentes ou supérfluos para certos grupos, mas necessários a outros [...]. Inegavelmente, a troca melhorou bastante a situação de vida de vários agrupamentos humanos”.
Nessa época remota, as mercadorias que se barganhavam eram, na verdade, o que se produzia em excesso, tornando-se mais intensa essa atividade à medida que foi sendo necessário diversificar os materiais de que se dispunha, uma vez que a produção para consumo próprio já não era suficiente e as riquezas passaram a ser produzidas com fins de permuta.
Os grupos, nômades e geralmente de uma mesma família, isolados uns dos outros eram autossuficientes; ao iniciarem um processo de aproximação, iniciou também a primeira forma de comércio – a troca. Com as trocas, as riquezas foram sendo mais bem aproveitadas e cada grupo podia se dedicar a produzir aquilo para o que fosse mais apto.
Avançando na história, na Grécia o comércio era à base de costumes, mas é lá que surgem os primeiros contratos e o uso da lei escrita, os quais orientavam a comercialização marítima.
A principal atividade econômica dos fenícios era o comércio. Em razão dos negócios comerciais, os fenícios desenvolveram técnicas de navegação marítima, tornando-se os maiores navegadores de Antiguidade. Desse modo, comerciavam com grande número de povos e em vários lugares do Mediterrâneo, guardando em segredo as rotas marítimas que descobriam.
Considerável parte dos produtos comercializados pelos fenícios provinha de suas oficinas artesanais, que dedicavam à metalurgia (armas de bronze e de ferro, joias de ouro e de prata,estátuas religiosas), à fabricação de vidros coloridos e à produção de tintura de tecidos (merecem destaque os tecidos de púrpura). Por sua vez, importavam de várias regiões produtos como metais, essências aromáticas, pedras preciosas, cavalos e cereais. Tiro era a principal cidade que se dedicava ao comércio de escravos, adquirindo prisioneiros de guerra e vendendo-os aos soberanos do Oriente próximo.
Em Roma, o comércio era praticado pelos estrangeiros, disciplinados pelo jus gentium, uma vez que a aristocracia não via com apreço tal atividade, tida como desonrosa.
Paulatinamente, o homem promoveu uma série de evoluções que facilitaram o fluxo de mercadorias e as atividades comerciais, então foram criadas moedas, bancos, bolsas de valores e diversos outros institutos. No entanto, nessas civilizações clássicas não havia uma legislação comercial especial, o que se inicia a partir da Idade Média. Ricardo Negrão, assim assevera em relação ao comércio medieval:
Nesse período, o comércio, estava ligado ao comércio itinerante: o comerciante levava mercadorias de uma cidade para outra através de estradas, em caravanas, sempre em direção a feiras que ocorriam e tornavam famosas as cidades europeias [...] Em sua evolução, as feiras se especializam, surgem os mercados (feiras cobertas) [...] As lojas, cuja função é a venda constante, num mesmo local, surgem quase que simultaneamente às feiras [...] Os mascates completam o quadro de distribuição de mercadorias.
Na idade média, o comércio chegou a um estágio mais avançado, e não era mais uma característica de apenas alguns povos, mas de todos eles. André Ramos assim escreve:
É justamente nessa época que se costuma apontar o surgimento das raízes do direito comercial. Fala-se, então, na primeira fase desse ramo do direito. É a época do renascimento das cidades e do comércio, sobretudo o marítimo. (2009, pag, 28).
Nesta época, o comércio era praticado em cada região de forma desvinculada uma da outra, já que não havia um poder político central forte, capaz de impor regrais gerais e aplica-las a todos, assim, surgiu uma série de “direitos locais” nas diversas regiões da Europa. Doutro lado, ganhava força o direito canônico que pregava contra o lucro, a cobrança de juros, o que levava ao desinteresse da classe burguesa que se formava e ganhava força.
Por conseguinte, essa classe de comerciantes ou mercadores teve que se organizar e construir seu próprio direito, a ser aplicado nos diversos conflitos que passaram a eclodir com a efervescência da atividade mercantil, que até então estava estagnada. Com isso as regras do direito foram surgindo com a própria dinâmica da atividade comercial.
Mais adiante, em 1804 e 1808, respectivamente, são editados, na França, o Código Civil e o Código Comercial. O Código Civil napoleônico era, na sua síntese, um corpo de leis que atendia os interesses da burguesia fundiária, pois estava centrado no direito de propriedade; já o Código Comercialencarnava o espírito da burguesia comercial e industrial, valorizando a riqueza mobiliária.
Com a divisão do direito privado (Direito Civil e Direito Comercial), foi necessário criar um critério que delimitasse o âmbito de incidência do direito comercial, que fora criado para regular a atividade mercantil. Assim, a doutrina francesa criou a teoria dos “atos comércio”, designando que o praticasse de comerciante e estes sujeitavam aos Tribunais do Comércio.
O objetivo da Revolução Francesa foi o de acabar com osprivilégios pessoais dos nobres e da realeza. O comércio estava muito desenvolvido e não tolerava mais os limites que as corporações e o Rei lhes impunham. Mas não é só isso: o povo pobre, que não pertencia a corporações, nem tinha sangue azul, estava cada vez mais revoltado. Esse povo, que não tinha perspectiva alguma na vida, foi a massa da Revolução Francesa. Sob o aspecto jurídico, a Revolução Francesa foi uma ação contra os direitos da nobreza, do clero e das corporações.
Nota-se que o Código Comercial Napoleônico põe fim à segunda parte da história do direito comercial e dá início ao período moderno, quando cria um sistema de normas objetivamente aplicáveis, quaisquer que sejam os sujeitos do ato
Como o homem, o comércio também evoluiu, indo da simples troca de itens excedentes aos mercados globalizados de hoje. Depois do desenvolvimento do comércio marítimo, na Idade Média, e do advento das feiras e mercados, acontece a Revolução Industrial que, na Idade Moderna, promoveu uma ruptura em toda a estrutura econômica e social existente.
Pulando para mais de um século depois da codificação napoleônica, a Itália edita um novo código civil, tendo em vista a noção totalmente ultrapassada da figura do “ato do comércio”, já que a efervescência do mercado, sobretudo após a revolução industrial, acarretou o surgimento de diversas outras atividades econômicas relevantes e muitas delas ao estavam compreendidas no conceito de “ato do comércio”.
Nasce assim, a teoria da empresa, na qual pretende a transposição para o mundo jurídico de um fenômeno que é sócio-econômico a empresa como centro fomentador do comercio, como sempre foi, mas com um colorido com o qual nunca foi vista (Luiz Antonio Soares Hentz –www.jus.com.br).
Ao longo dos séculos XIX e XX, o direito comercial foi definido como o conjunto de normas jurídicas que regulava as atividades dos comerciantes no exercício de sua profissão e os atos por lei considerados comerciais. Essa definição era sustentada no conceito de comerciante e de atos de comércio, razão pela qual o direito comercial era o direito dos comerciantes e dos atos de comércio.
O comércio exerceu uma colaboração muito importante nas sociedades, no desenvolvimento de novas tecnologias e, principalmente, na melhoria de infraestrutura através da construção de estradas, ferrovias, portos, pontes etc., o que veio a facilitar o fluxo de mercadorias em nível planetário, até resultar no processo de globalização.
Atualmente, com o assustador desenvolvimento tecnológico e as facilidades da era digital – destaque para a internet – é possível comercializar algo com qualquer parte do planeta sem precisar, para tanto, locomover-se. Isso não significa que o comércio tradicional, face to face, tenha perdido seu lugar de destaque na sociedade; pelo contrário, ele continua em evidência e tem como maior símbolo os shoppings centers (os correspondentes modernos dos mercados e lojas referenciados anteriormente) que se multiplicam nas grandes cidades. Isso se deve ao consumismo que não para de crescer, permitindo que o comércio de feições tradicionais e o moderno desfrutem de lucros também crescentes.
1.2 - O direito Comercial no Brasil
A evolução do direito comercial no Brasil se inicia em 1808, com a chegada da família real portuguesa e a abertura dos portos às nações amigas, que incrementou o comércio na colônia, fazendo com que fosse criada a “Real Junta de Comércio, Agricultura, Fábrica e Navegação, ” que dentre outros objetivos, tinha a possível ideia de criar um direito comercial brasileiro.
Sabe-se que antes da vinda do rei de Portugal ao Brasil, não existia nenhuma consolidação sistematizada de leis, particularmente brasileira, dotado de princípios gerais definidos.
“Assim, pode-se dizer que o Direito Comercial Brasileiro teve início com a Lei de Abertura dos Portos, de 1808, inspirada por José da Silva Lisboa”. (Verçosa, p. 55).
Em 1815, com a paz novamente reinando na Europa, D. João VI retorna a Portugal dando condições para que aqui surgisse o estado brasileiro, o que é concretizado em 1822 com a independência. Mesmo independente, especificamente em 1832, foi criada uma comissão com a finalidade de por essa ideia em prática. Assim foi que, em 1834, a comissão apresentou ao congresso um projeto de lei, que uma vez aprovado, foi promulgada a Lei nº 556, de 25 de junho de 1850, que fez nascer o Código Comercial Brasileiro, já que antes as relações jurídico-mercantis do Brasil eram regidas pelas leis portuguesas e os Códigos Comerciais da Espanha e da França. Issoacontecia em razão de entre as leis portuguesas existir a "Lei da Boa Razão" a qual previa que, no caso de lacuna da lei portuguesa, fossem aplicadas as leis das "nações cristãs, iluminadas e polidas para dirimir os conflitos”.
Como o Brasil apresentava grande potencial econômico, surgiu a necessidade de se ter um código comercial próprio em substituição às disciplinas estrangeiras, culminando com a aprovação, pelo então Imperador D. Pedro II, do Código Comercial Brasileiro, inspirado diretamente no Código Comercial francês.
Dessa maneira o direito brasileiro passou a disciplinar a atividade econômica pelos critérios da teoria dos atos de comércio, embora nenhum dos seus artigos apresente a enumeração desses atos, como acontece no Código Comercialfrancês de 1807 nos artigos 632 e 633. Essa ausência foi proposital e se justificou pelos problemas que a enumeração causava na Europa em relação à caracterização da natureza comercial ou civil de determinadas atividades econômicas constantes da lista dos atos de comércio. Temendo que isso se repetisse no Brasil, o legislador optou por não inserir tal enumeração no Código Comercial Brasileiro.
[...] trouxe para o direito nacional o sistema francês de disciplina privada da atividade econômica. O próprio Código não menciona a expressão"atos de comércio"e tampouco os enumera. [...] Contudo, a despeito dessa proposital inexplicitação, todos os dispositivos do Código são acentuadamente marcados pela teoria dos atos de comércio. E, de qualquer modo, a legislação brasileira não teve como fugir do elenco normativo desses atos, editando-se, ainda em 1850, o Regulamento n. 737, diploma processual de qualidade técnica destacada, em cujo art. 19 definem-se as atividades sujeitas à jurisdição dos Tribunais do Comércio.
A importância da lista do Regulamento 737 só vem a diminuir a partir de 1960 quando o direito brasileiro começa a se aproximar do italiano e de sua disciplina privada uniformizada.
A utilização de um sistema geral para disciplinar a atividade econômica, deixando de fora apenas certas modalidades menos importantes, adotado desde 1942 pelo direito italiano, atraiu muitos países de tradição romanística, entre eles o Brasil. Vigente desde 1850, em muitas das tentativas de reforma do Código Comercial Brasileiro houve intenção de unificar o direito privado.
A tão buscada unificação do direito privado brasileiro veio a ocorrer, formalmente, apenas em 2002, com o novo Código Civil. Mas, apesar dessa"unificação"ter se consolidado apenas aí, é possível constatar que desde os anos 1970 o sistema italiano da teoria da empresa já vinha sendo considerado pela doutrina pátria; bem como, vinha sendo utilizado em julgados de causas mercantis em razão da teoria francesa não mais abarcar os conflitos que surgiam.
O Direito Comercial brasileiro filia-se, desde o último quarto do século XX, à teoria da empresa. Nos anos 1970, a doutrina comercialista estuda com atenção o sistema italiano de disciplina privada da atividade econômica. Já nos anos 1980, diversos julgados mostram-se guiados pela teoria da empresa para alcançar soluções mais justas aos conflitos de interesse entre empresários. A partir dos anos 1990, pelo menos três leis (Código de Defesa do Consumidor, Lei das locações e Lei do Registro do Comércio) são editadas sem nenhuma inspiração na teoria dos atos do comércio. O Código Civil de 2002 conclui a transição, ao disciplinar, no Livro II da Parte Especial, o direito de empresa. (André Ramos).
As dificuldades encontradas na definição da comercialidade das relações jurídicas e a adoção da teoria da empresa para caracterizar determinadas atividades econômicas como comerciais caracterizam o período de transição do Direito Comercial brasileiro. Esse período transitório entre a teoria dos atos de comércio, presente no Código Comercial, e teoria da empresa, já usada no âmbito jurídico-mercantil na doutrina, na jurisprudência e algumas leis comerciais, se vê finalizado com a edição do novo Código Civil brasileiro.
1.3 - Direito e Comércio
Inicialmente, a ideia era que o Direito Comercial se prestava a reger apenas as relações dos comerciantes, uma vez que, historicamente, foi para isso que ele surgiu. Mas, no decorrer dos anos, as atividades comerciais evoluíram sobremaneira, abrangendo a indústria e outras atividades antes não consideradas mercantis. Isso fez com que aquela ideia reducionista do Direito Comercial se tornasse insatisfatória e fosse, paulatinamente, sendo deixada de lado.
Como todas as relações humanas, também o comércio precisa de regras com vistas à otimização de seu funcionamento e à proteção das partes envolvidas. O Direito Comercial, cuja evolução histórica é o tema central deste artigo, é o ramo do direito privado responsável por regulamentar as relações comerciais.
Apesar de se falar na existência de comércio desde a Idade Antiga, não se pode afirmar; pela escassez de elementos históricos, haver nas remotas sociedades um direito autônomo, com princípios, normas e institutos sistematizados, voltados à regulamentação da atividade mercantil. Nos tempos antigos, de acordo com MARTINS (1991, p.5-6), são os usos e costumes advindos do comércio marítimo que regulam as relações comerciais em cada cidade, entretanto, não se pode considerar direito propriamente dito pela falta de abrangência de suas normas, o que só viria a ocorrer a partir da Idade Média.
Durante a Idade Média, todavia, o comércio já atingira um estágio mais avançado, e não era mais uma característica de apenas alguns povos, mas de todos eles. É justamente nessa época que se costuma apontar o surgimento das raízes do Direito Comercial. [...] é a época do renascimento das cidades (" burgos ") e do comércio, sobretudo o marítimo. [03]
Na verdade, não existe consenso quanto ao início histórico do Direito Comercial: enquanto alguns estudiosos defendem uma divisão conforme a divisão clássica da história do homem; outros, os quais aqui serão considerados, apontam a Idade Média como sendo o marco inicial do Direito Comercial, tendo em vista as ideias econômicas que, ligadas à ascensão da classe burguesa urbana, contrapunham-se ao feudalismo predominante, o que promoveu uma verdadeira revolução no mundo ocidental. A partir daí, o Direito Comercial apresentaria diferentes momentos, conforme o contexto histórico em que está situado, cuja divisão tem por norte as características que o particularizam nas diferentes épocas, desde a sua utilização até a forma como é estipulado para a sociedade.
1.4 - Divisão do Direito Comercial
Conforme já salientado, Direito Comercial surgiu formalmente na Idade Média devido à ascensão de formas de comércio mais organizadas, surgimento das corporações de mercadores e crescimento das cidades medievais. Tudo isso gerou, naturalmente, a necessidade de se criar normas que regulamentassem essas atividades, as quais foram criadas pela classe comerciante e, dessa forma, privilegiava lhe.
Com a filosofia liberal da Idade Moderna, que dava ênfase à igualdade entre os cidadãos, criou-se uma forma de regulamentação das atividades mercantis que não se sujeitasse à conveniência da classe dos comerciantes, reorientando o foco daqueles que faziam parte das corporações para qualquer um que se enquadrasse como realizador de uma atividade tida como comercial.
Com os novos horizontes alcançados pelo mundo do comércio, com o capitalismo e sua revolução nos sistemas de produção, também essa forma de regulá-lo ficou obsoleta, o que faz surgir uma nova visão para o Direito Comercial. Nessa nova ótica, entre em cena a figura do empresário, o conceito de empresa, a distribuição de bens e de serviços em larga escala, e o Direito Comercial precisou ser o disciplinador, também, das empresas comerciais. Assim, tendo em vista as mudanças de contexto pelas quais passou o comércio e, consequentemente, o Direito Comercial, sua evolução é dividida em fases históricas.
Alguns juristas, dentre eles Ricardo Negrão e Oscar Barreto Filho, divide o Direito Comercial em quatro fases históricas,sendo:
1ª) Que vai o século XII ao XVI, está assim caracterizada: existência de um direito de classes, no caso a dos comerciantes, com regras estabelecidas por eles e para eles, sem a participação estatal, apenas podendo ser usadas por quem integrasse as corporações de ofício. É a época do comércio itinerante, que evolui para feiras, mercados e lojas. Seriam os serviços originados nessas feiras os responsáveis pelo surgimento de vários institutos jurídicos, como o câmbio, os títulos de crédito, os bancos e as bolsas; surgindo aí, inclusive, os mercados financeiros acionários. Ocorre a evolução das sociedades marítimas (um sócio em terra e outro na embarcação, negociando pelos mercados por onde passa), as quais viram a ser reguladas pelas Ordenações Filipinas em 1603. Ainda são identificadas nesse período ascompanhias (instituições familiares, mais tarde chamadas de sociedade por causa da solidariedade e da não limitação de responsabilidade perante terceiros) e as sociedades por ações, que são as últimas a surgir;
2ª) Caracterizada pelo mercantilismo e pela colonização, está compreendida entre os séculos XVII e XVIII. Época em que se observa a evolução das grandes sociedades. Aqui as normas do Direito Comercial, como todas as outras, tem origem num poder soberano central – o rei. Na Europa, surgem as codificações tanto para matéria de direito marítimo quanto para de direito terrestre;
3ª) Compreende o século XIX e é marcada pelo liberalismo econômico. Aqui, com a promulgação do Código Napoleônico de 1806, surge o conceito objetivo de comerciante, que seria todo aquele que praticasse atos de comércio profissionalmente e de forma habitual. O Direito Comercial deixa de ser dos comerciantes e passa a ser dos atos de comércio, isto é, perde o caráter subjetivo, pessoal, e adquire um caráter objetivo ligado às atividades tidas legalmente como comerciais. A Teoria dos Atos de Comércio será tratada de forma mais detalhada posteriormente e
4ª) A última fase, que é a contemporânea, caracteriza-se por uma nova visão do Direito Comercial que culmina com a terminologia do direito de empresa, ou empresarial, a qual foi adotada inicialmente pelo Código Civil italiano de 1942 e integra o Livro II do Código Civil brasileiro de 2002. A Teoria da Empresa também será tratada em tópico específico.
Na visão de André Luiz Santa Cruz Ramos, que apresenta uma divisão menos fragmentada, o Direito Comercial teria três períodos históricos, os quais são a seguir apresentados apenas para fins de comparação com a caracterização anterior:
Primeiro período: compreende a Idade Média e tem por contexto o mercantilismo, o ressurgimento das cidades, a aplicação dos usos e costumes mercantis e a codificação privada do Direito Comercial – pelos comerciantes, tendo assim um caráter subjetivista.
Segundo período – abrange a Idade Moderna que, com a formação dos Estados Nacionais monárquicos e a consequente monopolização jurisdicional, objetiva o Direito Comercial, que deixa de ser da classe dos comerciantes e passa a valer para qualquer cidadão que exerça uma atividade comercial; destaque para a Codificação Napoleônica com a bipartição do direito privado – civil e comercial – e para ateoria dos atos de comércio.
Terceiro período – corresponde à Idade Contemporânea. Tem como marco o Código Civil Italiano de 1942 e se caracteriza pela unificação formal do direito privado, pela prevalência da teoria da empresa no regime jurídico-empresarial e pelo papel da empresa como atividade econômica organizada.
Como é possível observar, a opção por uma ou outra divisão não interfere no entendimento da evolução histórica da disciplina comercial, pois as duas trazem informações similares sobre o tema, diferindo apenas no corte temporal. O importante a observar em ambas as divisões é o reflexo imediato dos acontecimentos sociais e políticos de cada época no contexto de criação e utilização das regras que regulamentam as atividades mercantis.
1.5 - O novo Código Civil e o Direito de Empresa
As mudanças ocorridas na sociedade, com a evolução cultural e com o desenvolvimento científico, provocaram transformações em todo o planeta no último século. Como não podia ser diferente, diante do caráter social que tem o Direito, essas mudanças exigiram que as normas jurídicas se adaptassem às novas situações existentes nas relações que elas intermediam. No Brasil, merecem destaque as muitas modificações pelas quais passou o Direito Civil, que culminaram com o novo Código Civil.
É bem verdade que a morosidade é uma das características marcantes da história do novo Código Civil, ao ponto dele já ser considerado um código ultrapassado em alguns aspectos. Isso se deve ao grande tempo que levou para ser editado, uma vez que ele tramitava no Congresso Nacional desde 1975 (Projeto nº 634/75).
Uma das maiores mudanças do novo diploma legal foi a tão aguardada unificação formal (legislativa) do direito privado brasileiro, disciplinando tanto a matéria civil quanto a matéria comercial, a exemplo do que ocorreu na Itália em 1942. Finalmente, depois de décadas de uma nítida aproximação do sistema italiano da teoria da empresa,Código Civil e Comercial são unificados e o direito brasileiro abandona a teoria francesa dos atos de comércio.
Ao afastar-se da antiga ideia francesa da enumeração não criteriosa de atividades econômicas tidas, legalmente, como atos de comércio, o Brasil abandona a prática que excluía, do regime comercial, importantes atividades econômicas por causa do gênero como, por exemplo, a prestação de serviços e a atividade imobiliária. Ao adotar a teoria da empresa, o novo Código Civil brasileiro unifica a legislação nacional do direito privado e consolida o Direito Comercial como o direito da empresa, maior e mais adequado para disciplinar o desenvolvimento das atividades econômicas no país.
Baseado no Código Civil italiano de 1942 (conhecido pela unificação legislativa do direito privado e, também, por apresentar uma nova teoria para disciplinar as atividades econômicas, a teoria da empresa) o novo Código Civilbrasileiro promove a substituição da imprecisa e ultrapassada teoria dos atos de comércio. Isso, consequentemente, culminou com a revogação da Primeira Parte do Código Comercial de 1850, fazendo desaparecer a noção jurídica de"atos de comércio", uma vez que a parte revogada era a que conferia um regime jurídico diferenciado para os atos jurídicos que fossem considerados como"atos de comércio"e para os comerciantes.
Desaparece a figura do comerciante, e surge a figura do empresário (da mesma forma, não se fala mais em sociedade comercial, mas em sociedade empresária). A mudança, porém, está longe de se limitar a aspectos terminológicos. Ao disciplinar o direito de empresa, o direito brasileiro afasta-se, definitivamente, da ultrapassada teoria dos atos de comércio, e incorpora a teoria da empresa ao nosso ordenamento jurídico, adotando o conceito de empresarialidade para delimitar o âmbito de incidência do regime jurídico comercial.
Economicamente falando, no entanto, os"atos de comércio"não desapareceram. O que deixou de existir foi apenas sua dimensão jurídica. Dito de outro modo, o ato de comprar e vender algo continua ocorrendo como antes, só que agora sem existir diferença entre uma compra e venda mercantil e uma compra e venda civil, sendo qualquer ato dessa natureza regido pelo novo Código Civil, que agora também engloba, formalmente, a disciplina mercantil.
Além dos atos de comércio, com o advento do novo Código Civil, também sai de cena o termo"comerciante"(que era toda pessoa física ou jurídica que praticasse atos de comércio em nome próprio com habitualidade, profissionalismo, como meio de vida e intuito de lucro), que foi substituído por"empresário".
Dessa forma, torna-se imprescindível compreender o significado de empresário e de empresa, dentro da perspectiva jurídica do novo Código, para se ter uma exata noção do que tais mudanças significam, na prática, para as relações jurídico-mercantis, motivo pelo qual serão tratados

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