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Zaffaroni

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FICHAMENTO DO LIVRO: MANUAL DE DIREITO PENAL BRASILEIRO
Eugênio Raúl Zaffaroni & José Henrique Pierangeli
PARTE GERAL
1º BIMESTRE
	
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Primeira Parte:
A TEORIA DO SABER
DO DIREITO PENAL SIGNIFICA: QUE O SABER DO DIREITO PENAL TEM DE ESTAR COMPROMETIDO COM OS DIREITOS HUMANOS E IDEOLOGICAMENTE VINCULADO COM O AUMENTO DO ESPAÇO SOCIAL DE TODOS NA SOCIEDADE.
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1ª AULA – 18/03/03
TÍTULO I
DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO SABER DO DIREITO PENAL
CAPÍTULO I
CONTROLE SOCIAL, SISTEMA PENAL E DIREITO PENAL
I – CONTROLE SOCIAL E SISTEMA PENAL
1 - O delito como “construção” e como “realidade”
Qual a semelhança entre estes dois fatos sociais: um estupro e a emissão de um cheque sem fundos? O significado social é completamente distinto.
A única semelhança é que ambos são descritos na lei penal como crimes, ameaçados com uma pena, submetidos a um processo institucionalizado, e que paira uma ameaça de prisão sobre ambos.
CONCLUSÃO: o delito não existe sociologicamente. O delito é uma solução de uma instituição penal.
O que existe na realidade social são CONFLITOS que são resolvidos institucionalmente. Mas na essência são fatos sociais distintos.
Essas mesmas condutas geram conflitos com soluções diferentes: o estupro vira manchete, o cheque sem fundos não.
Se fizermos um exame de consciência, veremos que várias vezes na vida infringimos normas penais: não devolvo um livro emprestado; levo embora a toalha do hotel; ultrapasso um sinal fechado etc. Os juizes também cometem crimes diários: assinam documentos como se fossem eles que fizeram e não são; afirmam que testemunhas são ouvidas na sua presença e não são etc. E o cartorário vai atrás: certifico que é verdade...
Poderíamos argumentar que são infrações levíssimas. No entanto eu denuncio todos os dias pessoas porque furtaram gilete do Comper, papel higiênico do Carrefour, chinelo do Extra etc.
CONCLUSÃO: A maioria dos crimes não são praticados por aquelas pessoas que chamamos de delinqüentes, bandidos, mas pelo próprio Estado. 
Exemplo:
a construção de armas nucleares e biológicas pelo Iraque e Coréia são atos preparatórios de crimes de guerra (destruição em massa de civis);
a notícia veiculada ao mundo pelos EUA de que prenderam um suposto membro do Al Quaeda e vão torturá-lo para delatar é crime de tortura.
Nestes casos ninguém é criminalizado.
Quem são e onde estão os chamados delinqüentes? Nos setores sociais de menos recursos. Os presídios estão cheios de pobres.
CONCLUSÃO: Existe um processo de SELEÇÃO de pessoas, a quem chamamos de delinqüentes e não uma mera seleção de fatos típicos.
Por outro lado, muitas ações imorais não são alcançadas pelo direito penal:
Alguém mantém relação sexual com uma prostituta e não lhe paga ( não há solução institucional para isto;
Patrão não paga o salário do empregado ( ação trabalhista;
Consumidor não paga a conta de luz ( o fornecedor unilateralmente corta a luz.
CONCLUSÃO: Em qualquer situação de conflito social a solução penal é só uma das possíveis. Peguemos o exemplo seguinte: 5 estudantes moram juntos. Em dado momento um deles golpeia e quebra o televisor. Haverá reações e estilos diferentes para resolver o conflito:
Estudante 1 – furioso ( Não quero mais viver com este cara - PUNITIVA;
Estudante 2 – reclamará que pague o dano e tudo bem – REPARATÓRIA;
Estudante 3 – ele está louco, não sabe o que faz – TERAPÊUTICO;
Estudante 4 – para que aconteça uma violência desta aqui em casa, é sinal de que algo está errado com o grupo, o que exige um exame de consciência nosso – CONCILIATÓRIO.
Vejam que a solução punitiva admite duas variáveis:
exclusão do estudante do grupo – ELIMINATÓRIA;
atingi-lo diretamente – VINGANÇA – RETRIBUIÇÃO.
A eliminatória as vezes se confunde com a terapêutica. É uma punição com discurso terapêutico.
Por outro lado, A SOLUÇÃO PARA OS CONFLITOS SOCIAIS MUDAM COM O TEMPO:
O concubinato hoje é protegido. Já foi crime;
A homossexualidade continua sendo um conflito, como demonstram os movimentos gays. A punição era a morte. Hoje não é formal: se faz com a arbitrariedade policial;
As bruxas já foram mortas em fogueiras. Hoje estão na moda.
Conclusão geral:
Ações conflitivas de gravidade e significado sociais diversos se resolvem pela via institucionalizada do Direito Penal. Mas não são todas as pessoas que sofrem essa solução, mas uma minoria, depois de um processo de seleção que seleciona principalmente pobres;
Muitos conflitos se resolvem por outra via institucionalizada que não o direito penal;
A solução punitiva (eliminatória ou retributiva) é somente uma das alternativas, mas que exclui as outras (reparatória, conciliadora e terapêutica);
As ações que abrem a possibilidade de solução penal de maior gravidade são praticadas pelo próprio Estado, que institucionaliza tais soluções.
Tem-se a impressão que o “delito” é uma construção destinada a cumprir certa função sobre algumas pessoas a respeito de outras, e não uma realidade social individualizável.
Nosso estudo visa esclarecer se esta impressão é verdadeira ou não. Mas esta introdução serve para desmentir aqueles que dizem que o direito penal emburrece, só serve para prender bandidos etc.
2 - Conceitos e formas de controle social
O homem se organizou para viver em sociedade. Os conflitos no grupo se resolvem de forma dinâmica, estabiliza as relações no grupo e gera uma estrutura de poder institucionalizado (Estado) e difuso (mídia, família etc.).
Na sociedade se distingue uma estrutura de poder com grupos que dominam e grupos que são dominados. Com setores mais próximos e outros mais afastados dos centros de decisão.
Esta estrutura precisa de formas de controle da sociedade, tanto dos setores mais afastados, quanto dos mais próximos do centro de poder. Estes precisam se controlar reciprocamente para não se debilitarem. Ex.: Castas: só se casam entre si membros da mesma casta.
CONCLUSÃO:
Toda sociedade tem uma estrutura de poder (política e econômica);
Tem grupos mais próximos ou mais afastados do centro de poder (marginalizados), nos quais vemos graus de centralização e marginalização. Países com maior grau de democratização.
Esta estrutura centralização-marginalização tem múltiplas formas de controle social. Estudando a estrutura do poder nós podemos ver de onde e quais são as formas de controle social. Analisando essas formas de controle vemos a natureza da estrutura do poder.
O âmbito do controle social é muito grande e nem sempre evidente. Nos países centrais esses controles são mais escondidos, dissimulados. Nos periféricos, onde os conflitos são mais manifestos, aparecem mais, a não ser nas camadas mais elevadas, que imitam a sociedade dos países centrais.
Existem vários sistemas de controle social:
meios de comunicação de massa, que controlam dizendo que é diversão;
família;
educação;
saúde;
partidos políticos etc.
O controle social, portanto, é feito através de instituições mais difusas, e também com meios mais específicos, por exemplo, o direito penal (juizes, policiais, funcionários etc.).
A enorme extensão e complexidade do fenômeno controle social demonstra que uma sociedade é mais ou menos arbitrária conforme se oriente por formas de controle social variadas, e não imponha só o controle penal institucionalizado como principal.
Conclusão geral:
Para avaliar o controle social não podemos olhar só o direito penal como fator inibidor da criminalidade. Temos que ver como funcionam os outros sistemas:
escola ( métodos pedagógicos, controle ideológico de textos etc.;
medicina ( como é feita a orientação anestesiante, puramente organicista ou mais antropológica.
As relações sociais, portanto, são complicadíssimas. Não dá para fazer um modelo de sociedade sem olhar para tudo isto e querer controlá-lo.É simplismo ilusório.
3 - Saber e controle social (saber e poder)
Nós aprendemos que quanto maior o saber, maior o poder. Porém, o acompanhamento histórico demonstra que é justamente o contrário: é o poder que condiciona o saber.
No mundo inteiro existem ideologias que “encobrem”, que “ocultam”, ou até “criam” realidades, desde que o “saber” produza aumento de produção. Hoje se teme pela viabilidade do planeta. Ex.: bombas nucleares, desmatamento, poluição, esgotamento de recursos naturais – a guerra contra o Iraque.
São 500 bilhões de dólares ao ano, com aumento de 8% ao ano, aplicados em armamentos, enquanto 40 milhões de crianças por ano morrem de fome, e outros tantos não alcançam desenvolvimento físico e mental completo por desnutrição.
Some-se a isto que os países centrais realizam experiências biológicas que podem permitir ao poder central condicionar a evolução do homem, animais e vegetais. Ex.: soja transgênica, clonagem de animais e agora humana etc.
Essas estruturas de poder criam poder que condicionará, fomentará, dará explicações ou versões da “realidade”, CRIAM VERDADES, em forma de ideologias, que abarcam ideologias científicas.
Toda ciência é ideológica. É manipulada pelo poder, conforme convenha a sua conservação: privilegia o que lhe favorece e descarta o que lhe é perigoso.
Toda ciência é ideológica porque é humana. A ciência positivista, capaz de estabelecer verdades imutáveis, isentas, é coisa do passado e ninguém mais acredita nelas.
Se nem as ciências naturais são livres de ideologia, muito mais as ciências humanas. Por isto é que existem inúmeras ideologias no campo do sistema penal.
A América Latina é composta de países periféricos, que sofrem com o modelo internacional de divisão do trabalho, da economia etc. Nossos países têm características próprias e o nosso controle social através do direito penal deveria se amoldar a essas características e não importar ideologias. Por outro lado, não somos capazes de construir ideologias, de modo que importamos.
4 - Características da manipulação ideológica
O poder instrumentaliza as ideologias na parte em que lhe são úteis e descarta o resto:
O racismo não tomou do evolucionismo as advertências prudentes, mas ostentou uma ortodoxia evolucionista que não foi sustentada nem pelos seus criadores;
As tendências teocráticas – islã – tomam do espiritualismo a resignação em função da justiça do “além”. Deixam de lado que o espiritualismo tem por pressuposto obrar o justo “neste mundo”.
Alguns teóricos dão um sentido pejorativo às ideologias. Para Marx às ideologias são uma superestrutura que encobre a realidade. Mas nós entendemos com o sentido que lhe dá Abbagnano: “é toda crença adotada para controle dos comportamentos coletivos, entendendo por “crença” uma noção que vincula a conduta e que pode ou não ter validez objetiva”.
Assim, toda criação de idéias, das mais sublimes às mais aberrantes são ideologias. São um conjunto de idéias que buscam explicar um objeto. Jamais explicarão as “verdades absolutas”, porque isto está fora do conhecimento humano. Devemos ser humildes e reconhecer que todo conhecimento é parcial.
5 - Os direitos humanos e o controle social
Por maior que seja a atrocidade sempre houve uma ideologia para explicá-la.
O tráfico de milhões de africanos como escravos se explicava pela inferioridade da raça;
Hitler, com a ideologia da superioridade da raça ariana, desencadeou o maior conflito generalizado do mundo entre 1939 e 1945;
O liberalismo do séc. XVIII e começo do século XIX, junto com a teoria da necessidade, foram a ideologia de justificação do aniquilamento nuclear da população de Hiroshima e Nagasaki.
Cada atrocidade é cometida em nome da humanidade e da justiça. Cada um dizia que queria libertar o homem e construir um novo – de acordo com sua cara – acreditando num direito NATURAL.
Em 1948, no auge da 2ª Guerra, a ONU proclamou a DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM, como um ideal comum a ser alcançado por todos.
Desde então vem se construindo um sistema internacional de garantias de direitos fundamentais – direitos humanos – que vai configurando um LIMITE positivo nas Constituições às ideologias que regem o controle social em todas as nações. Vai criando uma baliza, um paradigma. Cada país tem um escalão de direitos humanos.
Pode-se argumentar que continuam as atrocidades. Concordamos, mas hoje a cara do poder está aberta. Desmascara o poder.
É inegável que:
Há ideologias genocidas ( controle de natalidade nos 3º e 4º mundos, sob ameaça de interromper ajuda de alimentos;
Ideologias de equilíbrio pelo terror.
Outras declarações internacionais complementam a da ONU. Entre nós o marco é a CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS DO HOMEM de 1969, conhecida como Pacto de S. José. Servem de parâmetro para a interpretação das leis.
6 - A importância do controle social institucionalizado ou formalizado
Claro que o direito penal tem importância como forma de controle social institucionalizado, mas menos do que lhe conferem.
CONTROLE SOCIAL
1. Difuso ( meios de massa, família, preconceitos, fofocas, modas, educação etc.;
2. Institucionalizado:
( não punitivo = direito privado;
( punitivo:
	- formalmente não punitivo, ou com discurso não punitivo (práticas psiquiátricas, asilos de velhos etc.)
	- realmente punitivo, com discurso punitivo = direito penal.
Dentro do sistema penal o direito penal é só um lugar, e limitado. Importante, mas nem tanto, tanto é que a maioria dos criminosos não são punidos.
II - SISTEMA PENAL E DIREITO PENAL
Direito penal é o controle social punitivo institucionalizado, que engloba a atividade do legislador, do público, da polícia, dos juizes, dos funcionários, e da execução penal.
Num sentido mais amplo, o sistema penal abrange ações controladoras e repressoras aparentemente não penais.
A punição muitas vezes não sanciona uma conduta, mas ações que denotam qualidades pessoais. É assim por causa da atividade classificadora do sistema. Por isto, também fazem parte do sistema penal:
procedimentos contravencionais de controle de marginalizados (vadiagem, embriaguez etc.);
faculdades policiais arbitrárias (batidas sempre em bares de periferia etc.);
internação por tempo indefinido de drogados – não são produtivos;
o asilo de velhos – sanção pela falta de produtividade e docilidade aos padrões de consumo veiculados pelos meios de massa.
7 - Os distintos setores do sistema social
São segmentos do sistema penal:
policial;
judicial;
executivo.
São três grupos humanos que têm predominância em cada etapa do processo e que podem seguir atuando um interferindo no outro. Ex.: o judicial controla a execução; o policial dá segurança à execução etc.
Na América Latina a tendência é neutralizar o Poder Judiciário, para possibilitar a intervenção do executivo. Ex.: o inquérito policial é interferência do executivo no judicial. O AI5 permitia exonerar membros do STF etc.
O legislador configura os tipos que selecionam condutas. Mas é o poder Executivo, através da polícia, que efetivamente seleciona as condutas puníveis. Por isto é que não existe na América Latina uma polícia judiciária, incumbida de investigar para o Ministério Público denunciar, por exemplo.
O grupo humano fornecedor de promotores, juizes, policiais, funcionários da justiça, não é homogêneo, mas normalmente são de camadas da classe média baixa.
8 - Os discursos do sistema penal
Criam-se ideologias para dar fundamento ao discurso de sustentação do direito penal:
o discurso jurídico é garantidor. Se transforma em legalista e burocrata;
o discurso policial é moralizador (vagabundo) e se burocratiza;
o discurso penitenciário é terapêutico, e também se burocratiza.
São todos discursos compartimentados: um ignora o outro. E na hora de apontar as falhas, um aponta o outro.
Em geral praticam discursos externos: justificação ao político, às autoridades. Não há discussão interna, da realidade, intrasistemática.Mas O DISCURSO GERAL É QUE O SISTEMA PENAL TEM UMA FUNÇÃO PREVENTIVA ESPECIAL E GERAL. RESSOCIALIZAÇÃO E EXEMPLARIDADE.
O primeiro discurso raramente corresponde à realidade: as penitenciárias – penas – não ressocializam, ao contrário. No ambiente penitenciário aumenta a violência de pessoas normalmente com problemas de personalidade instável. Esquecem-se que o processo de marginalização já começa na infância, passa pela falta de educação, trabalho etc.
Isto demonstra que o sistema penal seleciona pessoas, segundo a classe e posição social. Quanto mais incluídos, menos são pegos. Não somos todos vulneráveis ao sistema penal.
Além disto a criminalização gera a “rejeição” do etiquetado “marginal”, e também daqueles que se solidarizam ou entram em contato com eles.
Por fim, soltos são estigmatizados como “suspeitos”.
Deste modo, o sistema penal não previne condutas criminais. A criminalidade aumenta ou diminui de acordo com as variantes do sistema penal e não da prevenção. Ex.: Nos EUA se calculou que numa cidade de 500.000 habitantes há 150.000 furtos por ano. Pouquíssimos são investigados.
Quanto a prevenção especial – ressocialização – os estudos demonstram que a prisão causa deterioração psíquica no preso – as vezes incurável.
Isto demonstra que o controle social é uma ideologia que serve para sustentar a necessidade da prisão, mas que não corresponde à realidade. Por isto a comunidade presa cria mecanismos de auto-proteção: organizações de presos (PCC); corrupção organizada, motins, líderes religiosos, jurídicos etc.
Hoje se fala em fracasso da prisão, inclusive em países que efetivamente tentaram fazer dela um modelo de ressocialização.
Suspeita-se que o sistema penal seleciona pessoas humildes para mostrá-las aos demais do bairro: comportem-se, senão lhe acontecerá o mesmo.
Suspeita-se que esta ideologia também subtrai setores que estão na estrutura do poder ao sistema penal (são menos vulneráveis). Ex.: quem comanda a casta é reencarnação de espíritos evoluídos, portanto, fora da marginalização.
O Estado de direito se materializa por degraus, tem graus de realização: quanto mais se respeitam direitos humanos, mais pessoas estarão incluídos em outros sistemas e se subtraem ao controle do sistema penal.
9 - Condicionamento do direito penal
O condicionamento do direito penal é quando o sistema penal promove condições para que os selecionados continuem no crime:
reincidência;
fossiliza a pessoa ( Perde a referência do seu grupo social e fica submetido a obedecer o novo grupo da cadeia;
seleciona promotores, juizes etc. dentre a classe média baixa. Cria expectativas e metas sociais da classe média alta. Em contrapartida lhe exige que não crie problemas no trabalho, dando-lhes falsa sensação de poder. Incorporam a profissão, esquecem a origem e se afastam do problema.
10 - A função social do sistema penal
É difícil dizer qual a função:
É selecionar pessoas dos setores mais humildes, criminalizando-as, indicando à sua comunidade quais são os seus limites e espaço social;
É sustentar a hegemonia de um setor social sobre o outro – marxista;
Zaffaroni diz que é manter a hegemonia, mas também quando os outros sistemas não funcionam, o sistema penal criminaliza pessoas do próprio sistema, para que não desenvolvam condutas prejudiciais à hegemonia do grupo (contestadores), mas essa criminalização é rara. Ou então a criminalização não tem função. Só responde ao meio hegemônico por causa da manipulação dos meios de massa.
CONCLUSÃO: A função do sistema penal é simbólica frente a marginalizados e próprios setores hegemônicos (contestadores ou conformistas).
É possível que essa função social simbólica se realize por outros meios que não o direito penal:
Socialistas extremados ( que se reparta de forma igualitária o poder de forma que os conflitos diminuam;
Verdes, ecológicos ( busque-se racionalidade para resolver os conflitos. Se não é racional, não use.
Ambas são correntes abolucionistas.
A lógica abolucionista é incontestável: o sistema não é racional.
Mas o abolucionismo radical está descartado. É politicamente inviável, porque o poder não é racional.
Trabalha-se então com direitos humanos. Procura-se uma sociedade mais igualitária, mais racional para solucionar seus conflitos. Mas isto se realiza por escalões e demoradamente.
Busca-se uma política criminal alternativa, menos violenta. Os direitos humanos traçam uma linha de limite da intervenção punitiva e aumenta o nivel de racionalidade – princípio da intervenção mínima.
11 - O princípio da intervenção mínima na América Latina
A intervenção mínima na América Latina tem mais fundamento que nos países centrais.
Sofremos agressões no nosso direito humano ao DESENVOLVIMENTO – art. 22, da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Em casos concretos no Haiti e El Salvdor a OEA já reconheceu esse direito.
Essa agressão faz parte do sistema planetário de repartição de poder, que internamente nos corrompe e nos leva a autodestruição – subdesenvolvimento.
Se usamos o sistema penal como única forma de controle só acrescentamos violência à violência, o que é um SUICÍDIO como país.
CONCLUSÃO: Precisamos de um direito penal mínimo pelas mesmas razões dos países centrais e também porque sofremos o injusto jushumanista da violência ao direito ao desenvolvimento.
12 - O sistema penal e a lei penal
A lei penal é que define o âmbito de atuação do direito penal.
Mas existem outros “pretextos” que dizem ser “não penais”: contravenções, averiguação de antecedentes etc.
A lei deveria ser o norte do direito penal, determinar sua atuação. Mas na realidade o sistema opera com orientação própria, de âmbito muito maior.
Existe um DIREITO PENAL SUBTERRÂNEO�, resultado de uma estrutura de poder. Por isto ele não se esgota nele mesmo, mas demanda um programa, que se realiza no tempo.
Zaffaroni diz que é preciso uma crítica permanente na confrontação com a realidade e a capacidade do direito penal para realizar os direitos humanos.
É uma evolução da interpretação, tendo como pano de fundo os direitos humanos. O SABER DO DIREITO PENAL TEM DE ESTAR COMPROMETIDO COM OS DIREITOS HUMANOS E IDEOLOGICAMENTE VINCULADO COM O AUMENTO DO ESPAÇO SOCIAL DE TODOS NA SOCIEDADE.
Mas para isto não precisamos de direito alternativo, normas supralegais, direito natural (arbitrário). Precisamos é de uma consciência jurídica universal plasmada em instrumentos positivos que formam o direito interno, numa reelaboração teórica do saber penal, orioentada pelos direitos humanos e que abarquem dados da realidade.
2ª AULA – 25/03/03
CAPÍTULO II
O HORIZONTE DE PROJEÇÃO DO SABER DO DIREITO PENAL
I - O DIREITO PENAL
14 - Divisão da Parte Geral do Direito Penal
A Parte Geral quer responder a 3 perguntas:
O que é direito Penal? – Teoria do saber do Direito Penal.
Que requisitos jurídicos deve ter o delito? – Teoria do delito.
Quais as conseqüências penais do delito? – Teoria da coerção penal.
A resposta à 1ª pergunta será estudada em duas partes:
Teoria do saber penal
Delimitaremos o objeto do saber do direito penal = horizonte de projeção
Fundamentação filosófica e política deste horizonte
15 - Conceito geral de direito penal
A expressão direito penal designa:
O conjunto de leis penais ( a legislação penal
O sistema de interpretação desta legislação ( o saber do Direito Penal.
Quanto a letra “a” (Legislação Penal) definimos o DP assim:
“É um conjunto de leis, que traduzem normas, que pretendem tutelar bens jurídicos, e que determinam o alcance de sua tutela. A violação dessas leis chama-se “delito”, cuja sanção é a pena, que tem por finalidade evitar o cometimento de outros delitos por parte do autor.”
Quanto a letra “b” (SABER DO DIREITO PENAL) definimos o DP assim:
“É o sistema de compreensão da legislação penal. O DP interpreta o próprio DP – legislação –, o que é comum às outras ciências: a física interpreta a física etc.
A interpretação dá lugar a umsistema de compreensão de seu objeto (daquilo que se interpreta). No nosso caso, cria um sistema de compreensão do DP.
A legislação penal se diferencia do restante da legislação, por causa da sanção: pena. Com isto procura obter de forma direta e imediata que o autor não cometa novos delitos. No restante da legislação, a sanção normalmente é reparatória.
16 - Denominação
Chamam de Direito Penal ou Direito Criminal. Hoje predomina DP. Ex.: Còde Penal, Codice Penale, Código Penal em Portugal, Argentina e Espanha. É o direito da pena.
17 - O horizonte de projeção do saber do DP
Toda ciência é parcial, porque tem um só objeto, que é o seu horizonte de projeção.
Antes de construirmos um sistema de compreensão de uma ciência, devemos primeiro compreender qual o horizonte de projeção dela, qual o seu objeto, embora este se altere freqüentemente. E se altera porque o desenvolvimento do sistema de compreensão estoura o limite do horizonte de projeção, do objeto. Ex.: antigamente o objeto do DP era regular ações de animais e coisas. Hoje se reduz à conduta humana.
O DP não se ocupa do homem pelo que ele é – cor da pele. Ele só regula condutas. Quando percebemos que o DP, por exemplo, seleciona alguém pela cor da pele é necessário encontrar uma solução que exclua o sujeito da responsabilidade penal.
18 - O direito penal e a filosofia
Todas as ciências se vinculam à filosofia. Cada ciência tem um objeto, um ser, uma ontologia regional. A filosofia pergunta-se pelos seres em geral, é uma ontologia (estudo dos seres).
A filosofia não estuda todos os entes, como uma super ciência. Isto não tem sentido. Como ontologia, estuda o que é comum a todos os seres, aos objetos, aos entes de todas as ciências, inclusive pelo próprio ente do ser que faz a pergunta ( antropologia.
19 - O caráter público do DP
Como o DP tutela bens jurídicos contra ataques que lesam a segurança jurídica, é um ramo do direito público, ou seja, um ramo em que o Estado intervém diretamente – não pode ser privatizado.
Isto não significa que o Estado tenha um direito subjetivo de punir porque o bem lesado é seu – segurança jurídica, ou paz social. Isto levaria a afirmar que se pune o homicida não porque tirou a vida de alguém, mas porque afetou a segurança jurídica.
A idéia do direito de punir do Estado existe só para limitá-lo: até onde pode punir.
Esses limites vem de toda ordem jurídica. Existe um espaço livre para cada um de nós no qual o Estado não pode intervir, porque o direito reconhece que toda pessoa é capaz de autodeterminar-se de acordo com sua consciência – Art. 1º da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM.
Isto importa em que a legislação reconhece a dignidade da pessoa humana e disto advém as seguintes conseqüências:
O Estado não pode pretender impor uma ordem moral. Ex.: limitar o número de filhos, penalizando quem tiver mais de 2. Não pode proibir manifestações artísticas etc.
A moral de uma pessoa, de um povo, surge daquilo que ele livremente escolhe como moral e não do que o Estado – grupo de poder – acha que é moral. Conclusão: o Estado totalitário é imoral, porque impede a escolha pessoal – mérito moral.
Ao invés de impor uma moral, o Estado pode reconhecer um âmbito de direito moral. Assim, ele possibilita a “conduta moral” de seus habitantes. O mérito está em poder escolher o moral e o imoral.
A possibilidade de escolha redunda no fato de que a pena não recaia sobre condutas que recaiam sobre escolhas morais. Sobre estas temos autonomia – CF e leis garantem. Recaem sobre condutas que afetam o exercício desta autonomia ética. Exemplos:
- Não se penaliza a mulher porque se prostitui. É uma escolha moral sua. Mas pune-se o estuprador, porque ele obriga ou impede a mulher de exercer sua escolha moral-sexual.
- Não se pune quem dilapida seu patrimônio no jogo. Esta é a sua escolha. Mas pune-se o ladrão, que obriga ou impede a pessoa de dispor de seu patrimônio livremente.
Se optamos por um Estado moral – respeito à dignidade da pessoa humana de seus cidadãos = escolha – são delitos só as condutas que afetem bens jurídicos alheios, ou seja, aqueles necessários a que não possamos exercer a nossa livre escolha (vida, patrimônio, honra, saúde, administração pública, o Estado em si). O Estado protege direitos.
Um direito penal assim concebido usa da pena para proteger bens jurídicos. Não tem uma função de castigo, de expiação,
Zaffaroni não leva em consideração a função retributiva da pena como castigo moral. A pena garante à vítima que goze livremente de seus bens na sociedade. NÃO SE PUNE QUEM SUBTRAIU UM BEM, GARANTE-SE O USO DE BENS PELA SOCIEDADE QUANDO SE APLICA A PENA.
II - O OBJETIVO DA LEGISLAÇÃO PENAL
20 - Tem sentido perguntar-se pelo objetivo da legislação penal?
Vimos na aula passada que o direito penal tem uma função social. Esta função de controle social é estudada por sociólogos, não por juristas.
Mas tanto políticos quanto juristas devem perguntar-se: qual o objetivo da lei penal?
O político, levando em conta a realidade, criticará as leis e indicará reformas legislativas que aproximem as leis de seus objetivos.
O jurista, levando em conta a realidade, interpretará o sentido e os limites das disposições legais de maneira compatível com o objetivo geral – afastam-se normas inconstitucionais.
CONCLUSÃO: o DP tem um caráter PROGRAMÁTICO e não a mágica da solução DEFINITIVA do objeto legal alcançado porque se prendeu um criminoso.
21 - As respostas usuais
Responde-se sobre o objeto do direito (legislação penal) de modo contrário e excludente:
A meta é a segurança jurídica. A pena deve ter efeito de prevenção geral. A pena se dirige àqueles que não delinqüíram = RETRIBUIÇÃO.
É a proteção da sociedade e a defesa social. A pena deve surtir efeito sobre o delinqüente, para que não volte a delinqüir = PREVENÇÃO ESPECIAL. A pena se dirige àqueles que delinqüíram = REEDUCAÇÃO OU RESSOCIALIZAÇÃO.
É prevenção geral e especial. São as opiniões mais generalizadas hoje, com base na doutrina alemã. O fim da pena é a retribuição. Da execução da pena é a ressocialização.
	
	Posição “A”
	Posição “B”
	O direito penal deve ter como objetivo
	para uns, a segurança jurídica (entendida por uns como tutela de bens jurídicos, e, por outros, como tutela de valores ético-sociais
	e, para outros a defesa social
	A pena deve dirigir-se
	para uns, aos que não delinqüíram (prevenção geral)
	e, para outros, aos que possam vir a delinqüir (prevenção especial)
	A pena deve ter
	para uns mais conteúdo retributivo
	e, para outros, conteúdo ressocializador
A resposta parcializada – segurança jurídica ou defesa social – normalmente são ideologias importadas, baseadas em problemas concretos dos países centrais e de seus momentos políticos, que são estranhos à nossa realidade.
22 - Existe segurança jurídica?
A segurança jurídica é meta de todo direito e não só do direito penal.
Mas o que é segurança jurídica?
O direito é um instrumento para viabilizar a existência humana – relação entre homens. Então, a nossa existência é uma forma de coexistência (viver com os outros, que também existem). Disso decorre que sequer temos consciência do “eu” quando não há um “tu” de quem nos distinguimos (os dois lados da forma).
Para assegurar existências simultâneas (coexistências) é preciso uma ordem coativa que impeça a guerra civil, fazendo mais ou menos previsível a conduta alheia, ou seja, cada um sabe que o outro se absterá de condutas que afetem seres (entes) necessários para que o homem se realize em coexistência, que é a única forma de realizarmo-nos.
Estes entes são os bens jurídicos ou direitos.
Segurança jurídica é proteção de bens jurídicos como forma de assegurar a coexistência (ou seja, o viver com os outros que também existem). Só se tem segurança jurídica quando se garante que cada um possa dispor – usar – o que considere necessário para a autorealização.
Sendo assim, a pena afeta um bem jurídico do autor do delito(liberdade, patrimônio ou direitos). Isto só tem sentido se garantir os bens jurídicos do resto dos integrantes do grupo social.
Mas esta privação de bens não pode exceder certos limites, sob pena de causar insegurança jurídica: o que pensaríamos se cortassem as mãos do ladrão, se matassem quem falsificou uma CNH. 
Estes limites são determinados pelo momento histórico. Já se cortou mãos de ladrões. Mas isto era tolerável na época, como ingerência do poder nos nossos bens.
A pena deve reforçar o sentimento de segurança jurídica, ou seja, proteger bens jurídicos que garantam cada um de poder dispor e usar o que seja necessário para sua autorealização. Quando ultrapassa o limite de tolerância social traz mais insegurança. Ex.: processos contra opositores do regime militar.
Poder-se-ia argumentar que a lei penal tutela mais bens de uns que de outros, causam mais alarme numa sociedade que noutra, e que por isto não se pode dizer o que é segurança social.
Embora isto seja verdade, devemos compreender que o DP tem um objetivo político. Ele tende a diminuir certas diferenças, a procurar igualar as tutelas. Deve contribuir para diminuir diferenças, fomentar a integração e criar condições de convivência.
Essa segurança jurídica será maior na medida que a estrutura social seja mais justa e que cada homem sinta que seu espaço é maior na comunidade na medida em que ele não aumente antagonismos.
O sentimento de segurança jurídica é comunitário e depende da participação comunitária, o que é sempre uma questão de grau: sociedades mais ou menos desenvolvidas.
Por isto que, embora o objeto do DP seja a lei, nunca se deve perder de vista o momento histórico que se está inserido para interpretar a lei. O jurista não é só um aplicador da lei. Zaffaroni acha que esta é a função do direito, qual seja interpretar a lei, a partir do momento histórico que o intérprete está inserido.
23 - O que é defesa social
É um conceito obscuro. Por sociedade pode-se entender:
Um ente superior de que dependem os homens que o integram.
- é um organismo, do qual as pessoas são celular;
- é um ente (ser) composto de corpo e alma (antropomórfica);
- é um ente superior ao homem.
A esta sociedade corresponde um direito penal transpersonalista e autoritário, que será mais autoritário quanto mais se queira identificar a sociedade com o Estado.
O direito penal transpersonalista e autoritário não busca assegurar o gozo de direitos (segurança jurídica), mas a realização desse super-ente (sociedade), do qual o homem é quase nada.
O direito brasileiro não tolera essa concepção de Estado. Só tolera a limitação do homem por razões de convivência.
Se a defesa social for entendida com esses limites, ela se aproxima muito da segurança jurídica. Não há porque distinguir.
24 - Tutela de bens jurídicos ou de valores éticos?
A maioria da doutrina entende que se deve tutelar bens e valores respectivamente – PREVENÇÃO E RETRIBUIÇÃO. Discute-se qual é a prioritária e, no fundo, ambas se combinam.
Qual a diferença entre ética e moral?
A ética se refere a comportamento social. Pautas de conduta indicadas (constituídas) pelo grupo social (sociedade).
A moral é o contrário. Vem assinalada pela consciência individual. São pautas de conduta que cada um indica à sua consciência.
Se ética for isto, todo direito tem uma aspiração ética, porque regula condutas em sociedade. Aspira evitar o cometimento e repetição de ações que afetem de forma intolerável os bens jurídicos penalmente tutelados.
Se é assim, quanto mais se aproxima de sua aspiração tem uma função formadora do cidadão. A pena deve ter esta aspiração ética, não como um fim em si mesma, mas no sentido de que sua finalidade é a preservação de afetação de bens jurídicos.
O fim do direito penal é prover à segurança, tutelando bens jurídicos. Marca um limite racional à aspiração ética do DP:
Não se pune a mulher porque usa uma saia maior ou menor, porque contradiz a moda. Mas pune-se o casal que pratica ato sexual em via pública, porque isto afeta o sentimento de recato e reserva sexual daqueles que se vêem constrangidos a presenciar o ato sexual;
Não se pune quem se despe em casa, mesmo que alguém o observe de um lugar privilegiado, porque sua privacidade foi quebrada;
Não se pune quem usa barba ou cabelo comprido, porque o direito penal não visa formar cidadãos barbudos ou cabeludos, mas apenas cidadãos que não afetem bens jurídicos alheios.
E isto não tem nada a ver com a moral:
Carrara já falava: o casamento é muito moral, mas não é lícito o casal colocar a cama na calçada;
Por outro lado, pode ser imoral, mas lícito, convidar os vizinhos para partilhar o quarto conjugal, porque irão se quiserem.
O direito penal desvalora (diz que é mau) um resultado que se traduz numa afetação de bem jurídico (por lesão ou por perigo) porque é resultado de uma conduta e não porque é uma mera mutação física. O direito regula condutas e não mutações físicas.
Também desvalora uma conduta que produz resultado (impossível sem resultado) porque, embora o resultado seja distinto da conduta, para o DP só tem relevância o resultado acompanhado da conduta (relação de causalidade).
É arbitrário, portanto, separar o desvalor da conduta do desvalor do resultado, da objetividade da conduta do da sua subjetividade. Ex.: quando o DP desvalora só conduta sem resultado, normalmente confunde ética e moral e dissimula isto com o argumento de perigo abstrato. Manipula essa norma que vai servir de serva dos grupos de poder:
vadiagem;
mendicância;
embriaguez;
a lei seca americana foi resultado da luta entre grupos estabelecidos – puritanos – frente a imigrantes predominantemente católicos. Não tinha por fim proteger bens jurídicos. Os resultados foram desastrosos. Foi um pretexto ideológico – bebida – para um grupo se sobrepor ao outro. E o DP não pode ser o símbolo de uma guerra de um grupo contra o outro, porque ele protege a realização como pessoa de todos.
III - A TAREFA ASSEGURADORA DO DP NO MARCO DA ORDEM JURÍDICA
25 - O caráter diferenciador do DP
O DP como todo direito provê a segurança jurídica, é cultural, normativo etc. O que o diferencia é a sanção. Ele procura cumprir a função de prover à segurança jurídica com o uso da pena.
E a pena se diferencia das outras coerções (reparação de danos, por exemplo) porque tem um fim preventivo ou particularmente reparador (multa e restritiva de direito).
26 - O caráter sancionador do DP e sua autonomia
O DP é sancionador e não constitutivo. Isto quer dizer que ele não cria a antijuridicidade. Só agrega condutas que já são antijurídicas à luz de outras normas e as sanciona com a pena. 
As vezes ele cria antijuridicidade: omissão de socorro, tentativas que não lesionam etc. Mas isto é exceção. Podemos dizer que o DP é excepcionalmente constitutivo e predominantemente sancionador.
É autônomo, ou tem autonomia científica, porque tem um objeto próprio, a proteção de bens jurídicos através da pena, o que permite que ele elabore seus próprios conceitos, a partir do particular enfoque preventivo especial ou reparador extraordinário.
IV - A COERÇÃO PENAL COMO MEIO DE PROVER A SEGURANÇA JURÍDICA
27 - O conceito da coerção penal
Nem todas as condutas antijurídicas são delitos, mas todos os delitos são condutas antijurídicas. A conseqüência penal é a pena. Ex.: art. 157 gera reparação e pena. Esta é a penal.
Se distingue das outras coerções porque procura evitar novos delitos: prevenção especial e reparação extraordinária (que vira pena se não for cumprida).
A pena, como conseqüência do DP, deve perseguir a segurança jurídica = prevenção de outros delitos. Uns afirmam que a prevenção é geral = exemplaridade. Outras que é especial = reparadora.
28 - Crítica da tese da prevenção geral
O meio pelo qual se pretende alcançar a prevenção geral (exemplaridade) é o exemplo. Prendendo se intimida e se vinga.
O nosso inconsciente funciona assim: se eu cumpro as leis, porqueo outro não cumpre. Se me sacrifico o outro deve se sacrificar também. Se não o faz, inconscientemente clamo por vingança.
Nesse aspecto a prevenção geral se aproxima da vingança: a pena justa é aquela que retribui o mal causado – olho por olho, dente por dente. Este é o mecanismo de funcionamento da prevenção geral.
Para um Estado autoritário tudo bem. É um instrumento de dominação.
Para um Estado de direito, no qual o DP busca formar cidadãos conscientes e responsáveis, isto não é racional.
Sociologicamente falando, a sociedade é uma estrutura de poder, com pessoas perto do poder e pessoas marginalizadas. Se o DP for utilizado como vingança, essa prevenção geral será utilizada por quem detém o poder em detrimento dos marginalizados, porque são mais fracos. A prevenção geral seria o instrumento de cobertura da ideologia dominadora.
Que a pena tem um efeito de prevenção geral é inegável. Mas isto é matéria da sociologia. O que não pode é eleger como fim principal da pena, sob pena do Estado autoritário estar sempre aumentando a pena para intimidar marginalizados. É efeito secundário.
Toda ordem jurídica tem função de segurança jurídica. Toda antijuridicidade gera sanções não penais, reparadoras, retributivas. Na medida em que a ordem jurídica retribui ela tem função de prevenção geral expressa pela norma: não devemos prejudicar o próximo.
Não obstante essa prevenção geral às vezes não é suficiente. Daí a existência do direito penal aplicando uma pena, que é uma prevenção particular. Não porque o fato é mais grave que reclama uma prevenção geral mais forte, mas sim casos que se exige uma prevenção geral DIFERENTE (particular) porque a geral não funcionou.
O DP não tem uma superioridade ética sobre os outros ramos do direito, de modo que só ele tem uma função de prevenção geral. Esta é função de todo ordenamento, e não só do direito penal.
29 - Prevenção geral e função simbólica da pena
É claro que a pena tem uma função simbólica, embora a prevenção geral não seja um fim específico.
O que se quer dizer é que a pena deve ter um fim específico – que a distingue de outras penas – e esta não pode ser a prevenção geral, mas a particular. Ela não pode se limitar a ser simbólica, sob pena de violar os direitos humanos: se vale de um homem como instrumento, como um meio – e não um fim. Coisifica o homem a função simbólica da pena, visto que com fulcro na prevenção geral só serve para dar o exemplo para que a sociedade não venha mais a delinquir. Desse modo, a pena deve ter uma função especial, qual seja prevenção especial, que é ressocializar o indivíduo.
30 - A prevenção penal como objetivo da pena
A prevenção especial é a única finalidade da pena, é o que distingue a sanção penal. Mas devemos precisar o que é isto.
Utilizam-se vários vocábulos para falar da função da pena: ressocialização, reeducação, readaptação, enfim, instrumentaliza a pena como um “tratamento penitenciário”. Zaffaroni usa ressocialização como prevenção penal especial.
Prevenção especial:
Não pode ser qualquer constrangimento físico – morte, prisão perpétua etc. Prisão como afastamento do meio social só, porque isto não motiva a conduta, apenas a impede, o que fere a autonomia ética do homem (art. 1º, da Declaração Universal dos DH).
Não pode ser reeducação, nem tratamento, que visualiza o homem como um ser carente no sentido “moral” ou “médico”. O criminalizado tem plena capacidade jurídica. No plano da dignidade humana é igual a nós. Não é um ser inferior.
Como cada delito tem significado social diferente, além do que a criminalidade é um processo de seleção, a pena não pode ser rígida, mas deve traduzir objetivos concretos: resolver o conflito que surge com a criminalização;
A prevenção especial deve permitir uma pluralidade de soluções que permita resolver o conflito de modo mais adequado.
O art. 5º, § 6º, do Pacto de S. José diz que a pena visa a “reforma” e a readaptação social do condenado”. Estes objetivos são de toda prevenção especial que se dirija ao criminalizado (tem outro que se dirige à vítima).
Por reforma do condenado entendemos:
Privação de algo que ele tem por valioso e que pode gerar contramotivação. Ex.: multa, prestação de serviços à comunidade, pagamento de uma quantidade de dinheiro à vítima etc.
É o gênero de prevenção especial requerido para quem furta em lojas, ao estudante que furta gasolina para passear com a namorada etc.
Quanto a readaptação do condenado (é em síntese apertada, uma tomada de consciência por parte do criminoso) podemos dizer que às vezes a criminalização seletiva torna o homem particularmente vulnerável ao sistema penal: reincidente. Pode acontecer isto antecipadamente: gerado por outros sistemas de controle social: Ex.: mídia/violência; desadaptação escolar, residência em ruas, desemprego etc.
Nestes casos gera um condicionamento que o DP pode reforçar se cai na ficção da vingança, ou pode diminuir, se ele capta a realidade do conflito.
A função de prevenção especial nestes casos é de diminuir a vulnerabilidade ao sistema penal, a ensiná-lo a não dar a cara ao controle social institucionalizado.
Não podemos condicionar, treinar, o criminalizado no trabalho, no estudo, na religião etc., para que ele crie o hábito social. O que se deve fazer é fazê-lo tomar consciência de que se ele continuar fora dos sistemas, acabará sendo capturado pelo sistema penal. Não é um aprendizado, um adestramento, MAS UMA TOMADA DE CONSCIÊNCIA. Para isto existe assistência social, a psicologia aconselhadora etc.
Se a finalidade de prevenção especial fosse só fazer com que o criminalizado não voltasse a delinqüir, a medida da pena deveria ser a da periculosidade, justificando-se até a pena de morte. 
Mas como a finalidade da prevenção especial é prover a segurança jurídica principalmente, é preciso que haja proporção na pena, cujos limites são os direitos do homem, porque só isto reforça o sentimento de segurança jurídica. Ex.: se um vizinho bêbado chuta minha lata de lixo toda noite, concordo que ele passe uns dias na cadeia, mas não compreenderia se lhe cortassem o pé fora. Imagino que poderia ser no lugar dele e procuraria me afastar de uma sociedade assim. O sentimento seria de medo, terror, afastamento, não segurança.
Por isto que a prevenção especial deve ser um meio para prover a segurança jurídica no meio social, e não um meio para impor o terror, com base na periculosidade. A pena deve guardar proporção com:
o grau de afetação do bem jurídico;
o grau de culpabilidade, reprovação que cabe ao autor da conduta.
31 - A prevenção especial em relação à vítima
O DP pouco faz pela vítima. Preocupa-se em penalizar o autor de uma lesão ou perigo, mas nada faz pela reparação do dano pela via penal.
Isto demonstra que o DP está mais preocupado com a imposição de pautas do que com a proteção de bens jurídicos. 
Neste aspecto, durante séculos se defrontaram o direito penal romano e o direito penal germânico. Para o primeiro o fim era a afirmação do Estado. Para o segundo o fim é a paz social mediante a reparação do dano.
É uma lástima que a reparação não seja prestigiada pelo nosso DP, pois:
previne delitos, pois desestimula a vingança privada;
previne delitos, na medida em que sujeita o réu a indenizar a sua própria vítima. Efeito moral.
No caso penal, a não reparação não seria uma obrigação de fazer, porque seu descumprimento redundaria numa pena.
V - DIREITO PENAL DE CULPABILIDADE E DE PERICULOSIDADE
32 - Direito penal de culpabilidade e de periculosidade
Partidários da segurança jurídica e da teoria retributiva defendem um direito penal da culpabilidade.
Partidários da defesa social e da teoria reeducativa ou ressocializadora defendem um direito penal da periculosidade.
Direito Penal da culpabilidade:
- Para admitir a possibilidade de censura a um sujeito é necessário supor que o sujeito tem a liberdade de escolher, isto é, de autodeterminar-se. Ex.: quem escreve uma carta injuriosa aalguém, coagido por uma arma, não é reprovado, não é culpável, pois não lhe era exigível outra conduta.
- O homem tem uma autonomia ética, é uma pessoa.
- A pena é determinada pelo grau de reprovação da conduta.
Direito Penal da periculosidade:
- O homem se move por causas. Não tem liberdade de escolha;
- A escolha é só uma ilusão;
- Não há culpabilidade porque não há autonomia ética, pessoa;
- A pena é determinada pelo grau de determinação do homem para o delito = periculosidade.
	Direito penal de culpabilidade
	Direito penal de periculosidade
	O homem pode escolher
	O homem está determinado
	Se pode escolher, pode ser censurado (culpabilidade)
	Se está determinado, pode-se constatar em que medida o está (periculosidade)
	A pena retribui a culpabilidade
	A pena ressocializa neutralizando a periculosidade
	O limite da pena é o grau da culpabilidade
	O limite da pena é o grau da periculosidade, o que pode redundar até em pena de morte.
CONCLUSÃO: O homem, embora determinado pelo meio, jamais perde a sua capacidade de escolha. O excluído, marginalizado, a mantém, embora restrita. Ex.: a favela não é feita só de criminosos.
Daí que o problema deve ser resolvido em cada caso concreto, graduando a culpabilidade, não tomando o sujeito sem mais sem menos por perigoso, porque condicionado, que merece uma pena sem limite, um tratamento.
33 - Direito penal de autor e direito Penal do ato/fato
Direito penal do autor:
Revela uma forma de ser do autor – delitiva;
O ato criminoso é sintoma da personalidade;
Pune-se a personalidade e não o ato. Ex.: não se condena tanto o furto, como o ladrão;
É apropriado ao direito penal da periculosidade – personalidade perigosa, que deve ser consertada como uma máquina.
Há um direito penal de autor, mas também de ato/FATO (é o mais difundido):
Não nega a autonomia moral do homem, mas entende que isto o leva à destruição;
Há personalidade inclinada ao delito, que é gerada pela repetição de condutas, num momento livremente escolhido;
A reprovação é feita ao autor, à sua personalidade, e não em virtude do ato.
O direito penal do ato não se realiza plenamente em nenhum país. O que não se pode fazer é penalizar o homem por ser como escolheu ser, sem que isto violente sua autodeterminação.
VI - AS “TEORIAS DA PENA”
34 - As chamadas teorias da pena
Devemos saber que uma teoria da pena é uma teoria do DP.
Teorias:
Absolutas:
- A pena tem um fim em si mesma, não um fim ulterior. É a retribuição pura e simples (Kant e Hegel).
- Hoje não possui adeptos.
Relativas:
- é o contrário: a pena é um meio para obter determinados fins – utilitarismo;
- Se dividem em:
	- prevenção geral ( surte efeitos sobre os membros da comunidade que não delinqüíram. Feuerbach dizia que é uma coação psicológica a possíveis autores de crimes.
	- Prevenção especial ( A pena age sobre o apenado.
	- Positivistas em geral.
Mistas:
- Partem das teorias absolutas e se socorrem das relativas para cobrir falhas;
- Hoje são as mais difundidas;
- Alemanha: prevenção geral, mediante retribuição justa;
- Zaffaroni obviamente não concorda com elas.
35 - Sistemas unitários e sistemas pluralistas
Unitário:
- Sustentada tanto por adeptos do direito penal da culpabilidade pura ( a única conseqüência penal é a retribuição. E também por adeptos do direito penal da periculosidade ( a pena é a medida neutralizadora da periculosidade.
Pluralistas:
- Procuram combinar as partes, conciliá-las;
- Não são racionais, pois aplicam penas junto com medidas de segurança, tentam compatibilizar idéias incompatíveis;
- Foi adotada pelo CP/40.
- Na medida de segurança aplica o sistema vicariante, chamado também de UNITÁRIO.
36 - Medidas de segurança
Integram as sanções penais com base na periculosidade e tem categoria distinta da pena.
Aplicam-se:
Antes do delito:
- para prevenir delitos;
- estado perigoso sem sentido;
- estados ou condutas que revelam periculosidade, mesmo sem cometer delitos;
- vadiagem, mendicância, embriaguez, prostituição, jogo. No Brasil é pena.
- Violam o princípio da legalidade também no Brasil.
Depois do delito, para ressocializar:
- junto ou em lugar da pena;
- algumas se dirigem a reincidentes (CP/40);
- chamadas de “medidas”, na verdade são penas;
- com o pretexto de ressocializar, confinam, penalizam, e isto é pena;
- as vezes se cumprem nas próprias prisões, pois não há local adequado. Chamamos de embuste de etiquetas.
Se destinam a incapazes:
- sem capacidade psíquica suficiente;
- Não tem caráter materialmente penal, só formalmente porque é lei penal;
- Não são sanções, ainda que o sistema as distorça e as aplique algumas vezes como sanção;
- A periculosidade que a justifica não é da personalidade, mas de autolesão, que não é delito;
- As medidas de segurança são experimentadas como penas, severíssimas, porque não tem prazo e implica em internação em manicômio comum.
3ª AULA – 31/03/03
INTRODUÇÃO
Falamos na 1ª aula que:
A sociedade, ou seja, nós, somos controlados por sistemas de controle social e que o direito penal é só um destes sistemas – menos racional e mais violento;
Vimos que quem exerce o controle social é uma estrutura de poder que, se não for limitada, extrapolará – política. Estes limites estão nos direitos fundamentais do cidadão, que vêm sendo construídos e estudados desde a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, passou pelo Pacto de S. José da Costa Rica, está na C.F. do Brasil;
Vimos que a A.L. é um continente marginalizado, longe das estruturas universais do poder e, portanto, mais susceptível à manipulação e violência. Por isto os direitos humanos levam a um direito penal mínimo, para não acrescentar mais violência à violência social da marginalização. Precisamos criar uma ideologia própria do direito penal, que só se desenvolve no contexto do estudo aos direitos humanos, embora a conclusão possa ser por um DP repressivo ou humanista. É só uma ideologia.
Vimos na 2ª aula que:
O DP pode ser conceituado a partir da legislação (conjunto de leis, com finalidade de reprimir crimes, através da pena, que tem a função de prevenção especial);
O DP é um ramo do direito público, que busca a segurança jurídica – como todos os outros ramos do direito – isso é igual a prevenção geral. E faz isto através da pena, que tem uma função de prevenção especial, que nada mais é do que formar cidadãos pela: REFORMA (privação de algo para contramotivar. Pequenas penas, multa, prestação de serviços à comunidade, reparação direta à vítima etc.), e READAPTAÇÃO, que é uma tomada de consciência pelo criminalizado para não dar mais a cara ao sistema penal. (Pacto de S. José, art. 5º, § 6º);
O delito é uma intromissão proibida no gozo de meus direitos (bens jurídicos) e não a prática de um mal (moral). Por isto que a conduta e o resultado são desvalorados e não só a conduta (art. 13, do CP);
A pena só tem sentido se trouxer segurança jurídica = sociedade equilibrada pelo gozo de direitos em igualdade, e não pelo terror;
O caráter diferenciador do DP é que ele age com a pena, que tem a função de prover a segurança jurídica (como todos os outros ramos do direito = prevenção geral), que tem um fim específico, que é preventivo especial ou particularmente reparador. Por isto o DP não tem como função principal ser simbólico = prevenção geral;
A prevenção específica, respeitada a dignidade da pessoa humana, não pode ser:
- qualquer constrangimento físico;
- tratamento ou condicionamento social, porque não existem seres inferiores no plano da dignidade humana;
- a pena não pode ser rígida, inflexível. Deve ser maleável (sistema de progressão, substituição, e penas alternativas). A reparação de dano diretamente à vítima como pena é uma boa alternativa.
CAPÍTULO III
FONTES, LIMITES E RELAÇÕES DO DIREITO PENAL
I - AS FONTES DO DIREITO PENAL
37 - Fontesde produção e de conhecimento da legislação penal
	Fontes de produção da legislação penal
	Das quais emerge a legislação penal: a União
	Fontes de cognição da legislação penal
	Representadas pela própria legislação (leis federais)
São elementos legislativos que o saber penal deve interpretar e explicar
	Fontes de conhecimento do saber jurídico-penal
	São aquelas empregadas pelo saber penal para a elaboração de seus conceitos (legislação, dados históricos, jurisprudência, informação fática etc.)
	Fontes de informação do saber jurídico-penal
	De onde obtemos informações do passado ou presente deste saber penal (tratados, monografias etc.).
38 - Fonte de produção do DP do Brasil é a União
O art. 22, I, da CF diz que só a União pode legislar sobre o DP.
Estabelece também o princípio da legalidade (art. 5º, XXXIX) e como seu corolário:
o princípio da irretroatividade (inc. XL);
o devido processo legal (LIV);
o contraditório e a ampla defesa (LV).
Estes princípios tem por origem a Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. XI, n. 1 e 2).
O princípio da legalidade está também no art. 1º, do CP desde 1940 (Costa e Silva).
O princípio da legalidade deve respeitar a democracia – tripartição de poderes –, mas, através da ideologia da necessidade – injustificável numa democracia –, entram leis penais para o ordenamento através de decretos. Ex.: a Parte Especial do CP e a L.C.P. são exemplos. A Lei das Pequenas Causas foi objeto de legislação estadual no Mato Grosso do Sul. São atos de força que às vezes pegam.
39 - Fontes do conhecimento do saber jurídico penal
O saber – o que é ciência do DP – não se configura só com dados legislativos. É muito mais que isto. Ex.: são fontes do saber:
a filosofia ( crítica do saber;
dados históricos
jurisprudência;
dados políticos e econômicos.
Se os sistemas, embora independentes, se comunicam, é óbvio que um interfere no outro. Mas se comunicam através de um filtro.
Hoje ainda se fala – teorias idealistas e tecnocráticas – que o DP se resume à interpretação das leis penais dentro de um sistema penal. A crítica é que isto reduz o DP a uma técnica separada da realidade. Não é uma sociologia, mas também não possui verdades fechadas.
Zaffaroni: O DP deve se comunicar com a realidade através da filosofia – o centro onde se formam suas raízes – e é onde devem ter raízes todas as ciências.
40 - As fontes de informação da ciência do DP
Nós chamamos de bibliografia penal. São todas as obras que falam sobre direito penal.
É monstruosa e inabarcável. A biblioteca mais completa do mundo, que é a do Instituto Max Planck, Friburgo, Alemanha, tem mais de 100.000 volumes.
A nossa literatura é influenciada pela Europa, mas possui desenvolvimento original. Reconhecemos através dela:
diferenças;
períodos históricos;
correntes ideológicas etc., positivismo, principalmente.
O positivismo penal brasileiro teve representantes de nome na literatura penal e são oriundos da “Escola do Recife”, cujo principal interlocutor foi Tobias Barreto, influenciado diretamente pela obra de Darwin. (Obras: Fundamentos do Direito de Punir, Comentários ao CC do Império etc.).
Escritores do positivismo penal:
Filinto Bastos (começo do séc. XX);
Viveiros de Castro;
Moniz Sodré;
Evaristo de Morais etc.
Mais jurídico:
Galdino Siqueira (1921);
Antônio José da Costa e Silva (1930).
Com estes dois encerrou-se a ideologia positivista.
Começa-se uma época influenciada pelo tecnicismo jurídico italiano e o neokantismo alemão. Estão nessa linha os grandes comentadores do Código de 1940:
Nelson Hungria;
Roberto Lyra;
Aloysio de Carvalho Filho;
Magalhães Noronha;
Basileu Garcia;
Everardo Cunha Luna;
Anibal Bruno;
Paulo José da Costa Jr. etc.
Uma outra corrente idealista foi a do REALISMO FILOSÓFICO, que viria desembocar no FINALISMO, até hoje seguido de perto ou de longe pela literatura penal brasileira:
José Frederico Marques;
Heleno Cláudio Fragoso;
Francisco de Assis Toledo ( Ministro do STJ e coordenador da Reforma de 1984;
Júlio F. Mirabete;
Luís Luisi;
René Ariel Dotti
Damásio de Jesus;
Manoel Pedro Pimentel;
Alberto Silva Franco;
Juarez Tavares;
Miguel Reale Jr.;
Luiz Régis Prado;
Celso Delmanto;
César Roberto Bitencourt etc.
Hoje temos:
Revista do IBCCrim;
Cadernos de Advocacia Criminal (Porto Alegre);
Discursos Sediciosos (revolta, motim, perturbador – RJ);
Ciência Penal (nova em SP).
II - LEGISLAÇÃO PENAL, CIÊNCIA DO DP E POLÍTICA CRIMINAL OU CRIMINOLÓGICA
41 - Política Criminal
É a arte ou ciência do governo com respeito ao fenômeno criminal.
Sua função é de GUIA e de CRÍTICA às decisões tomadas pelo poder político quando seleciona bens (ou direitos) que devem ser tutelados e escolhe os caminhos para efetivar tal tutela (penas). O problema é não ser influenciada pelo discurso de justificação da política.
42 - Política criminal e legislação penal
Toda norma surge de uma decisão política, traduz uma decisão política. Mas:
	Isto não implica que a norma jurídica fique submetida absolutamente à decisão política. Ex.: controle de constitucionalidade.
	Quando a decisão política gera (produz) a norma jurídica, esta é adotada pelo princípio da legalidade. Ex.: não se cria crime por analogia, dizendo que foi a vontade do legislador.
	A decisão política elege o bem jurídico tutelado e este componente político indica o fim da norma na interpretação, muito embora a norma tenha vida própria. É um elemento orientador da proibição e da permissão. Ex.: o Estado não pode fomentar em leis aquelas atividades que proíbe em outras leis: ou não há proibição ou há permissão, como sucede com as atividades desportivas perigosas.
A atividade política tem de fazer parte de um todo, do ordenamento. Não pode ser diferente num caso e noutro sob pena de não existir como sistema.
43 - Política criminológica e saber penal
A política criminal se relaciona com o saber penal:
	Proporciona o componente teleológico interpretativo.
	O saber penal interpreta o seu objeto de conhecimento conforme a ideologia vinculada à política, aplicando-se no caso concreto.
	Não existe interpretação/ciência sem o componente ideológico, político. Existe um compromisso ideológico do penalista e não só a subsunção do caso à norma pura.
Devemos tomar cuidado com as políticas criminológicas que nos são impostas para criticar a sua ideologia – filosofia – e construir o conhecimento conforme a CF – ciência –, já que o jurista não cria a ideologia, só interpreta a norma.
III - O DIREITO PENAL E AS OUTRAS DISCIPLINAS JURÍDICAS
	DIREITO CONSTITU-CIONAL (Dita a política penal e vincula a legislação penal)
	Princípio Republicano (ou democrático) (art. 1º) ( Determina a interpretação lógica e coerente as leis;
Princípio da Legalidade (art. 5º, XXXIX) cujo corolário é o princípio da Reserva legal (II) ( Só é crime aquilo que é proibido por lei.
Princípio da Retroatividade ( A lei mais benéfica retroage para beneficiar o réu.
Princípio da Personalidade ou da Transcendência da pena (XLV) ( nenhuma pena passará da pessoa do delinqüente;
Princípio da Racionalidade (XLVII, letra a, b, c, d, e) e da Humanidade da pena (XLIX) ( proibição de penas cruéis, morte, prisão perpétua etc.;
Competência exclusiva da União para legislar sobre direito penal (Art. 22, I)
	DIREITOS HUMANOS (Fonte de conhecimento do DP – Declaração DH)
	Princípio da igualdade de todos perante a lei e da dignidade da pessoa humana (Arts. I e II da DUDH e 5º, I, VI, VIII);
Direito à vida, à segurança pessoal e à liberdade (art. III). Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado – art. IX;
Princípio da legalidade (XI, n. 2 e CF 5º, XXXIX e XLI e XL);
Princípio da humanidade (art. V e CF 5º, III) ( proibição de tortura etc.;
Direito à privacidade ou à intimidade (XII e art. 5º, X, XI, XII, CF).
	DIREITOPROCESSUAL PENAL
	O DP impõe uma sanção a um delito e o processo penal põe em funcionamento a ação penal;
A sanção penal é a pena e a processual a nulidade;
Quando o DP não pode criminalizar uma pessoa ele absolve, quando o DPP não tem provas ele não permite o início da ação.
	DIREITO DA EXECUÇÃO PENAL
	Faz parte do direito penitenciário, que aspira ser um ramo do conhecimento do DP – objeto próprio com princípios próprios;
O DP fixa o objetivo da pena, a execução penal a forma como se chegará a esse objetivo;
O embasamento legal do direito penitenciário está na CF – art. 24, I (competência da União em concorrência com Estados e DF para legislar – Lei 7.210/84).
	DIREITO MILITAR
	É o ramo mais importante do DP especial, porque tem penas graves;
Trabalha com princípios próprios, de acordo com sua função particular;
Tem um Código Penal Militar, que é de 1969.
	DIREITO CONTRA-VENCIONAL
	É uma ordem de menor gravidade do DP;
Não existe diferença ontológica entre delito e contravenção, só de pena;
É um avanço imperialista do direito administrativo (poder executivo) sobre o DP;
São reguladas pelo Decreto-Lei 3.688/41;
A tentativa não é punível (art. 4º, LCP);
Para a existência da contravenção basta a culpa como regra geral (art. 3º, LCP).
	DIREITO DO MENOR
	Em muitos países é legislado com o DP. Não tem autonomia;
As medidas que se aplicam a menores não são penas, tendem a tutelar o menor, protegê-lo, porque é um ser em inferioridade de condições em relação a um adulto.
Aspira à formação do homem e não à prevenção especial;
É chamado a intervir diante do fracasso da família. Mas isto não pode degenerar para paternalismo;
Na A.L. a situação do menor é pior do que a do adulto: sob o pretexto de formar, retiram-se garantias constitucionais de liberdade, segrega-os influenciando muito mais em sua personalidade do que a um adulto;
Sob o manto de um paternalismo exagerado (ECA) o que se tem na prática é uma discricionariedade quase que absoluta para tratar do menor.
	DIREITO ADMINISTRA-TIVO
	Existe uma tendência – autoritária – do direito Administrativo se ampliar às custas do DP;
Quer-se levar ao direito Administrativo o direito militar e o direito contravencional;
Outra tendência é penalizar questões administrativas = ações sem resultados;
O direito Administrativo prevê sanções disciplinares para integrantes de um corpo (advertência, suspensão, demissão, cassação de aposentadoria e disponibilidade);
As sanções tem caráter reparador e não de prevenção especial – repara a imagem da administração;
Tanto o DP Administrativo, fiscal, econômico, são ramos do direito penal e não do direito administrativo, e por isto devem obedecer aos princípios do direito penal;
O direito Administrativo invade o direito Penal. Ex.: detenção para identificação (contraria o art. 7º, § 3º, do Pacto de S. José). É um sistema de controle e de conduta de massa, embora ilegal.
	DIREITO INTERNA-CIONAL
	O DIPúblico regula as relações entre Estados e o DIPrivado a legislação e a jurisdição nacional que deve ocupar-se de cada caso;
O DIPenal (relação do DIPúblico com o DP) estuda a tipificação internacional de delitos por via de tratados e o estabelecimento da jurisdição penal internacional (cortes internacionais de justiça penal);
O DPInternacional (relação do DIPrivado com o DP) determina o âmbito de validade da lei penal de cada Estado e a competência de seus tribunais penais.
Ambas as modalidades de DP Internacional são ramos do Direito Internacional e por isto obedecem a seus princípios;
O Tribunal de Nuremberg – Tribunal Militar Internacional – foi o 1º Tribunal Internacional;
Não violou o princípio da legalidade porque os crimes já eram definidos nas leis internas dos países (crimes contra a humanidade) e convenções internacionais (crimes de guerra);
Violou a competência e a anterioridade da pena. Foi um Tribunal de vencedores contra vencidos – de exceção;
Positivistas o criticam. Jusnaturalistas o elogiam. Mas a verdade é que nem no direito Anglo-saxão se permite mais fixar delitos por jurisprudência, como quiseram fazer em Nuremberg.
Observações sobre o Direito Penal Internacional, que é ligado ao Direito Internacional Privado:
Existem 4 princípios reitores do Direito Penal Internacional que procuram determinar o alcance da validade espacial da lei penal:
1. Territorialidade ( A lei vigora no território e nos lugares submetidos à sua jurisdição;
2. Nacionalidade ou personalidade ( A lei aplicável é a do país de que é nacional o autor do fato;
3. Princípio real ou de defesa ( aplica-se a lei penal da nacionalidade da vítima ou do bem jurídico, não importando o local do crime ou a nacionalidade do sujeito ativo.
4. Princípio universal ou justiça universal ( É aplicada a lei do Estado que efetuou a detenção do autor do fato.
O CP ocupa-se da matéria nos arts. 5º, 6º, e 7º.
ARTIGO 5º ( Princípio da Territorialidade como regra geral:
O território é definido pelo DIPúblico: espaço aéreo, mar territorial etc.;
O § 1º estendeu a noção de território;
O § 2º diz que a lei brasileira terá efeito sobre estrangeiros...
ARTIGO 6º ( Trata dos crimes à distância (a conduta tem lugar num território e o resultado noutro), de acordo com a teoria da ubiqüidade. O Brasil não optou nem pela teoria da ação, nem pela do resultado, pois poderia gerar um conflito negativo de competência. Agora pode gerar um conflito positivo, que não se explica.
ARTIGO 7º ( Exceções ao princípio da territorialidade:
Princípio real ou de defesa ( os crimes:
- contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
- contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
- contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
- de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
- que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
- praticados por brasileiro;
- praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados;
A aplicação da lei nos casos de justiça universal (tratados e convenções) e princípio da nacionalidade ficam sujeitos a 5 condições:
- entrar o agente no território nacional;
- ser o fato punível também no país em que foi praticado;
- estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
- não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
- não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
46 - O problema dos crimes hediondos e outras discriminações constitucionais
A CF, no art. 5º, XLII (racismo), XLIII (crimes hediondos, tortura, tráfico de entorpecentes e terrorismo), XLIV (ação de grupos armados contra a ordem constitucional e Estado democrático) impede a liberdade durante o processo de pessoas que praticam esses crimes. Sem se preocupar se isto é racional ou humano.
Estas disposições se consubstanciaram na Lei 8.072/90 e 8.930/94, que etiquetaram alguns crimes como hediondos e restringiram direitos constitucionais.
O problema é que o direito à liberdade não pode ser limitado por disposições sem racionalidade:
gravidade do fato;
ameaça de pena in abstrato e in concreto (se a acusação for fraca);
tempo razoável de prisão.
Estas disposições trazem à tona graves distorções constitucionais do Estado Democrático de Direito, levantam o problema de normas constitucionais inconstitucionais e se contrapõem a Convenções Internacionais de Direitos Humanos.
São problemas de vários países, que podem ser levados à julgamento por órgãos internacionais.
O certo seria derrogar as leis que tratam desses crimes e processo, mesmo que ficassemsem lei e sem regulamentação parte da constituição.
IV - RELAÇÕES E DELIMITAÇÃO DO DIREITO PENAL COM A CRIMINOLOGIA E OUTRAS DISCIPLINAS
55 - A criminologia
São chamadas “ciências da conduta” as que estudam a conduta humana do ponto de vista do SER desta conduta.
O DP só determina que condutas devem ser desvaloradas e como se traduz este desvalor em conseqüências jurídicas. Não se pergunta acerca do SER desta conduta:
o que ela representa na biografia do sujeito;
que problemas sociais surgem com condutas criminosas.
Estas são questões de outras ciências: a psicologia e a sociologia, ou seja, das ciências que estudam a conduta humana.
Não se trata de ciências com OBJETOS distintos, mas disciplinas com um mesmo objeto (a conduta humana) e 3 níveis diferentes de complexidade.
A relação entre estas três ciências tem sido tormentosa, existindo mais choques do que aproximação, e a gente fica sem saber muito bem o que é o DP, a psicologia, a sociologia penal.
Está na moda hoje reduzir o DP à sociologia e de outro lado dizer que ele não tem nada a ver com ela: é uma técnica.
Nesse contexto surgiu mais uma ciência que tem por objeto a conduta humana, que é a CRIMINOLOGIA: É a disciplina que estuda a questão criminal do ponto de vista biopsicosocial, ou seja, integra-se com as ciências da conduta aplicadas à condutas criminais.
Oferece dados de utilidade ao DP e para a política criminal, possibilitando uma atuação mais racional no aspecto do controle social.
56 - A criminologia positivista
Até pouco tempo atrás afirmou-se que a criminologia era uma ciência causal-explicativa ( explicava as causas e as origens das condutas delituosas.
Primeira dificuldade:
estabelecer o objeto da sociologia, que vinha dado pela lei penal, ou seja, por um ato do poder público;
esta era a sua primeira contradição: como poderia ser uma ciência asséptica e objetiva ideologicamente se o seu objeto era dado pela política?
Procuraram construir um conceito de delito natural/universal, mas caíram numa criminologia de valores, ideológica.
57 - A criminologia da “reação social”
As várias explicações que foram dadas pela criminologia positivista acabaram por romper o seu horizonte de projeção – OBJETO (conduta de criminalizados). Passa a abarcar o mecanismo mesmo da criminalização e o funcionamento de todo sistema penal como parte do controle social.
Surge a criminologia da “reação social”, superando a “conduta criminalizada”, a partir do reconhecimento de que sem criminalização não há crime.
Novamente a criminologia rompe este objeto e procura explicar todas as “violações aos direitos humanos”. É a briga hoje das chamadas escolas criminológicas: qual é nosso objeto?
O que importa é que:
	Há uma criminologia positivista ou tradicional que estuda a conduta dos criminalizados ( Deixa o DP fora de seu objeto e com isto aceita a ideologia veiculada por ele através das leis. Acaba justificando o sistema penal e de controle social de que faz parte.
	Há uma série de conhecimentos tecnológicos e psicológicos que demonstram o processo de seleção estigmatizante, corrupção e compartimentalização que denunciam o conteúdo ideológico dos discursos jurídicos e criminológicos tradicionais. Não é asséptica.
	A criminologia positivista deixa fora de seu objeto o poder criminalizante e só estuda os criminalizados ( é incompatível com o direito penal da culpabilidade e de ato, mas se enquadra com um DP repressor, porque justifica e não critica a ideologia.
	A conclusão é que é uma ciência nova que faz a crítica do poder criminalizante e quebrou o isolamento que existia entre criminologia, o DP e a política criminal.
58 - As ciências penais
A criminologia abarca a biologia criminal, a psicologia criminal e a sociologia criminal. Estas são aportes feitos à análise e crítica da criminalização a partir de disciplinas distintas, mas se reúnem numa disciplina chamada criminologia: TENTAM COMPREENDER A CRIMINALIZAÇÃO A PARTIR DE SEUS ESTUDOS.
Todas estas matérias estão vinculadas à filosofia, à história, e à política, como pano de fundo de interpretação.
	Normativas 
	Direito penal (ordinária e penal)
	Todas Elas
	
	Direito processual penal
	
	
	Direito de execução penal
	
	Não normativas
		- biologia
Criminologia	- psicologia	criminal
	- sociologia
	Vinculam-se necessariamente à filosofia, à história e à política
	
	Medicina legal (incluída a psiquiatria forense)
	
	
	Psicologia ou sociologia judicial (processo)
	
	
	Criminalística
	
4ª AULA – 01/04/03
CAPÍTULO IV
O MÉTODO E OS PRINCÍPIOS INTERPRETATIVOS DO SABER DO DP
I - O PROBLEMA DO MÉTODO NO DIREITO PENAL
59 - A dogmática
A metodologia do DP como ciência é a metodologia jurídica em geral.
Método significa caminho e está condicionado pela meta que se pretende atingir. Exemplo:
Quando para Feuerbach a meta era a tutela dos direitos subjetivos, o método era partir de tais direitos e reconhecer como fonte do saber penal a filosofia, que era a que permitia acesso aos mesmos.
Se invertermos a proposição, o que vai ser tutelado é o direito objetivo em lugar do subjetivo. O método tende a reduzir-se a uma sujeição à vontade do legislador.
Depois de Feuerbach surgiu:
O método exegético ( redução da ciência a uma mera técnica da análise da letra da lei. Exemplos:
O enciclopedismo francês do séc. XVIII pretendeu compilar em certas obras o saber humano sobre determinados campos do conhecimento. No campo jurídico essa tendência levou à codificação: reunir numa lei tudo o que se refere a determinada matéria, ordenando-os de forma sistemática.
Ao juiz cabia aplicar a lei. Bastava que entendesse seu sentido literal. Ações extremadas chegaram a proibir obras que comentassem códigos.
A ciência jurídica ficou reduzida à interpretação gramatical do texto legal. O método era a interpretação gramatical.
Esse realismo ingênuo reduziu o direito a algumas leis. Também quis explicar o direito como um conjunto de proposições sociológicas. Exemplos:
A Escola Histórica ( defendia que o direito é produto espontâneo do “gênio” de um povo. Tendência claramente romântica, porque as normas são influenciadas pelo mundo.
Método dogmático ( É o mais difundido a tal ponto que se chega a confundir a ciência penal com a dogmática penal.
Quem expôs o método dogmático foi um alemão chamado Rudolf von Ihering (1818-1892), surgindo no âmbito do direito privado.
O método dogmático consiste:
Numa análise da letra do texto;
Sua decomposição analítica em elementos (unidades ou dogmas);
E a reconstrução destes elementos de forma coerente, produzindo uma construção, ou teoria.
Exemplo: excesso na legítima defesa. Lemos o texto do art. 21. Decompomos: o que é legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal. No que consiste o seu excesso. Qual sua natureza jurídica. Quais as formas de excesso que podem existir. Como é punido. Reconstruímos tudo isto e temos uma teoria sobre excesso na legítima defesa.
A conclusão do método dogmático é que se o intérprete parte de dogmas (leis) como são reveladas pelo legislador, a ciência jurídica não pode alterar o conteúdo dessa lei. Você não pode “ajeitar” uma lei inconstitucional para virar constitucional. O máximo que podemos fazer é considerá-la inconstitucional.
60 - O método dogmático como método científico
Ciência é um conjunto de proposições que recebem o qualificativo de verdadeiro (também poderiam ser falsas).
O “V” ou “F” se estabelece pela verificação, no caso das ciências naturais. Ex.: a física me diz que as pedras caem. Pego 10 pedras e solto-as. Verifico que elas caem. Estabeleço então um valor para essa proposição de “V”.
Mas há ciências que não permitem a experimentação, como as ciências humanas. Então a verificação se dá pela observação. Devo olhar a sociedade e ver se aquilo que construí como teoria científica, ou seja, a explicação de uma norma, serve para controlar

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