Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E. K. Hunt & Howard J. jS#erman Traduçiio de Jaime Larty Benéhimol h r. l l (f'#.ED_ ITOKtf\ Y -vbZES Petrópolis 2001 CAPíTULO_ li A transição para o Capitalismo e-a Elaboração do Pensamento Mercantilista A socÚ~dáde medieval era essenciàlmente agrária. A h:i·erarquia social pà~~ava·se: nos vínculos que os indivíduos mantin!Yàm com a terra; àsátividades agrícolas sustentavam todo o sistema soda!. Para· doxalmente, contudo, o cresdmento da produtividade agtk·ola desen- cadeou uma série de mudanças · profundas que se prolóng·a:ra.m pnr vários séd11os, êulminando na dissolução do feudalismo medieval e no surgimetitó do capitalismo. Mudançtis Tecnológicas A substituição do sistema_ .de ,rodízio de cultura em dois campo·s pelo sistt~r:n:ade rodízio em três camp~s- foi o avanç-o tecrtoJé:rgi·co mais · importante 'oCorrido na ldad~ Média. Em verdade, embora iíndâ no século VIH este sistema já tivesse sido introduzido na Europ·a., somente · por volta -do século XI sua utilização se difundiu. O sistema ;primitivo consistia em cultivar a mesma te·rr·a dttrante todo o ano,.- o;..qú~ acarretava o rápido esgotamento do solo e, pass-ado algum_terrfpo, a sua inutilização para a agricultura. Já no s:i:~tema de rodízio em dois campos, metade da terra, depois de ter sid·o cultivada --· no ano anterior., permanecia em pousio para recuperar sua fe'rtilid:ade . Com a .inttoduÇão do sistema de rodízio em três camp·o·s, a terra arável passóu à. ser dividida em três áreas com as mesmas dhí'Jên-sões . No outo~o, . p)~ntava-se centeio ou trigo no primeiro campu, e na · primavera 'oii 'no verão, realizava-se a colheita . No segundo campo, 23 j plantava-se aveia , ou feijão ou ervilha na primavera. O terceiro ficava em pousio. A cada ano, processava-se um rodízio na utilização dos três campos. Em cada campo, alternavam-se as três fases: no primeiro ano. uma cultura de outono, no ano seguinte uma cultura de primavera, no terceiro ano, repouso. . Esta modificação técnica aparentemente simples resultou num aumento extraordinário da produtividade agrícola . O sistema de rodízio em três campos propiciou o aumento em cerca de SOo/o do rendimento das culturas praticadas em qualquer período do ano, na mesma exten- são de terra arável'. ' ; · . . · - Essa não foi a única conseqüência imE.oF-tá'i1te da introdução do novo sistema de rodízio. O crescimel_it0>da produção de aveia e de outras fMragens, semeadas na prin1avera, permitiu aos camponeses alimentar uma quantidade maior· de cavalos, que começaram a substi- tuir os bois como fonte principal de energia nos trabalhos agrícolas. Os cavalos, muito mais rápidos que os bois, contribuíram para a ampliação das áre.as cultivadas que, por sua vez, possibilitou ao campo abastecer centros de mãiór derrsidade populacional.~ o. emprego de cavalos, além de tornar o transporte de ho.mens, mercad~rias e equjpamentos muito mais eficientes, beneficiou também a aragepl da terra: a utilização de um arado movido por uma junta de !?ois exigia o esforço combinado de homens; para operar um anido atrelado_ a um cavalo, bastava um • l'\Uri h ~ homem. No século XIII, o custo do tr~nsporte de produtos agrícolas \tY'pO.-Y-AI sofreu redução c~nsiderável cor'n a adoç·ão, em lugar da carreta de duas rodas, da carroça de 'quatro rodas, com eixo dianteiro provido de pivô . O aperfeiçoamento da tecnologia agrícola e·dos meios de transpor- te ocasionou duas mudanças de grande alcance e importância . Inicial- mente, favoreceu a aceleração do crescimento populacional. As estima- nO tivas históricas mais seguras demonstram que a população européia ~ duplicou entre os anos lbOO e 1300. 2 A segunda mudança importante, · 1 kc .. , intimamente relacionada com a expansão populacional, foi o rápido crescimento da concentração u::bana. Até o ano 1000, excetuando-se alguns poucos centros comerciais mediterrânéos, a população européia aglutinava-se basicamente nos feudos, nas aldeias. As cidades eram, em sua maioria, inexpressivas. Em 1300, inúmeras cidades floresciam por toda a · Europa e não eram poucos os centros urbanos densamente p.ovoados. O crescimento dos centros urbanos tr.ouxe consigo uma especia- lização cada vez maior entre a cidade e o campo. Com a ampliação do J. Lynn Whlte, Jr., Medieval Technology and Social Óange (Oxford: Clarentlon, 1962), p. 71·72. 2. Harry A. Miskimin, The Economy o/ Early RenaisJance Europe, 1300·1460 (Englewood Cl.ifts, N. J.: Prentice-HaU, 1969), ·p. 20. 24 contingente de trabalhadores que emigravam para as cidades e-•rom.· piam seus vínculos com .a terra, a produção de bens man.ufaturados cresceu consideravelmente. O désenvolvimento df\-prqdução manufatu- reira, da especialização econônüca e da produtiv-Idade do trabalho contribuiu para o desenvolvimento do coinércio inter-region_al e de longa c:listância. l.l c/TJesenVolvim~nto. do \r Comércio de Lo~,tga Distância Vários historiadores tomam o descJ ,'. olvimcnto do comé.rcio como a principal c~usa da desintegração da st,ciedade medieval, particular- , mente do seu regime de trocas e de seus costumes. A importância do comércio não pode ser colocada em :lúvida. No entanto, convém lembrar que a expansão comercial ryllc: (,)correu por acidente nem s.e deveu a fatores externos da economia e·uopéia, como, por e.xemp.lo, a ' .J ~ . ' .I ' ' I intensificaçau dos contatos com os .arab.es. Pelo contrano, c.om.o Ja vimos anteriormente, as condições para o desenvolvimento d.o comércio foram criadas pelas transformHções econômicas ocorridas no interior da Europa. O crescimento da produtividade agrícola prop.orcio.nou um excedente de alimentos e de m·ão-de-obra para os mercados tocais e i~ternacionais. A utilização mais racional da energia e dos transportes tornou'· possí.v.el e lucrativa a concentração da indústria flas cidades, a produção em larga escala e a venda dos produtos em (rleréad.os mais amplos e mais-distant~s . ...._As modificações ocorridas na agricultura e na · indústria constituíram .os requisitos necessários para a ~xpans.ão da.s trocas e do comércio. Essa expansão, por sua vez, revigor.ou o des.envol· vimento da indústria e das cidades. .~ ~rias cidades comerciais e industriais foram fundadas em decor- rênci- a expansão do comércio, sobretud? o con;-ércio, de lo.~g.a d.isJân- cia. O crescimento dos centros ur-banos, submetidos a dommaç.ão dos mercacjores capitalistas, provocou uma série de mudança_s i.mp.o.rtant.e.s tanto ~a indústria qu·anto na agricultura. Tais mudanças, s.obret.ud.o a.s que afetaram a agricultura, resultaram no enfraqueci meoto e, final- mente, na dissolução completa dos vínculos tradicionais que manti- nham a coesão da estrutura social e eco11ômica da soc.ie.d_a,de f.e.u.dal. Desde o início da Idade Média, -muitas regiões da Europ.a ma.nti· veram um comércio de longa distância. Este cómércio ad.quiriu uma importância considerável no sul da Eúropa, nOs mares Medit.er~âneo e_ Adriático, e no norte da Europa, no mar do Norte e no mar Blütko. 2.5 ' ·' i I . I .. I I •' , -,i .·: __ Nos territórios compteendidos entre esses dois· centros de irradiação, o -sistema feudal lienhorial permaneceu até uma fase avançada da Idade Média, relativ~mente imune às trocas e ao comércio. A partir : do século XI, as Cruzadas cristãs deram um impulso vigoroso à. expansão do comércio. Entretanto, não se pode encará-las como fator acidental ou externo ao desenvolvimento europeu. Na reali· dade, as Cruzadas não foram empreendidas por razões exclusivamente religiosas, tampouco se deveram às perseguições movidas pelos turcos contra os peregrinos cristãos, pois os turcos mantiveram a política de tolerância adotada pelos muçulmanos. Os reveses sofridos pelos muçul-manos efetivamente deixaram Bizâncio exposta às incursões inimigas, o que, por si só, teria apenas justificado o envio1 de uma ajuda simbólica p~r parte do ~cidente, cujas .relações com B~âiJ.tcio não eram harmo· masas. As razoes fundamentais das Cruzadas devem ser procuradas no I desenvolvimento interno da França, onde este movimento encontrou o seu maior respaldo. A França havia adquirido tfnde ascendência no can texto ~uropeu, ma~ tinha rei. ações comerci~is '[ interesses importan- tes no Onente; além disso, precisava de uma valv?la de escape para dar ·vazão ao descontentamento social que grassava no interior de suas fronteiras. As . Cruzadas receberam apoio também da oligarquia de Veneza, inte~;ssada em expandir o seu comércio e consolidar a influên- cia que exerci,a no Oriente. O desenvolvimento do comérCio com os árabes - e com os vikings , no mar do Norte - estimulou a produção de'· mercadorias para a exportação e a criação de grandes feiras que floresceram do século XII até o final do século XIV. Organizadas -todos os anos nas principais . cidades comerciais européias, as feiras fun.eionavam geralmente durante uma ciu várias semanas. Os mercadores do norte da Europa trocavam > cereais ; peixes , lã, roupas, madeira, pez, laJcatrão, sal e ferro por · especiarias, seda, brocados, vinhos, frutas, buro e prata, entre outras · . mercadorias provenientes do sul da EuroP,a3 • No século XV, os locais onde se reuniam as feiras começavam a se transformar en1 prósperas .cidades comerciais, cujos mercados fundo· navam durante todo o ano. A atividade comercial desenvolvida _por ·.essas cidades era incompatível com as restriçõ!'JS impostas pelos costumes 15 '"ti ·~ '1 € c' ~ 9 c I}) '::í~ . e tradições feudais : A maior pai-te das cidade~ conseguiu, após intensas lutas, libertar-se da tutela dos senhores feudais e da Igreja. Nos centros } ( · comerciais realizavillrt·se operações financeirt_t de câmbio, de liquida· ção de dívidas- e de crédito. ,Tornou-se cor~~nte o uso das letras de Cí _____ . . \'"'. . . . 3. Para uma discussão mais profunda sobre'' o nascimento do comércio, ver Dudley Dillard, Economic Development óf the Nonh At/antic Communiry (Englewood Clills , N. J. : Prentice-Hall, 1967}, p. 3-178 . - 26 ~ .-J t . c câmbio e de outros instrumentos financeiros modernos. tJttta ntwa legislação comerclal f~j elaborada pelos COrtletCiantes de-s·s:a:s cidà:de'S, .Ao contrário· do direito consuetudinário e paternalista que vigo-rav-a n·os feudos, a legislação comerCial foi definida par um có·digo ptedso. · Lançaram-se assim as bases da lei de contratos, das papéis n·e·gociáveis, das representações comerciais, das vendas em leilão, enfim, de uma série de procedimentos característicos do capitalismo moderno. Na indústria:. artesanal feudal, o mestre artesão era, ao me·s-mo tempo, o produtot e o ve~dedor da sua mercadoria. Nas indústria:~ que se desenvolveram nas novas cidades·, voltadas primeiramente -Jiara a exportação, o produtor distanciou-se do comprador final. Agora, os artesãos vendiam, por atacado, seus produtos aos mercadore-s que, por sua vez, transportavam-nos e revendiam-nos a outros merc·adores. Outra diferença importante consistia em que os artesão-s do·s fe·udos eram, geralmente, também agricultores. Ao emigrarem para as cidades, contudo os artesãos renunciaram ao cultivo da terra para se de·dicate-rn exclusiv~mente ao seu ofício, com o qual obtinham renda suficiente para atenderem as suas necessidades. O Sistema Manufatureiro Doméstico e o Nascimento da Indústria Capitalista A necessidade de ampliar a produção e regularizar o ab·ttstednretrto de bens manu-faturados, imposta pela expansão do comércio, levou os mercadores~capitalistas a assumirem um controle cada vez maior sobre ·o processo produtivo. A indústria de tipo artesanal, onde o arte·são era, a um só ter~mo, o proprietário da oficina,_qos instrumentos de trabalho e das mátê~i'as~primas, atuando como pequen~- enipfesário -inrre:r:tenden- , . te, fora -~~bsÍituída em grande parte, no século XVI, pelo ~istêma- manufatúr~iro doméstico (putting·out system) nos ramos industriais · voltados p~_ra- f.1 exportação. Inicialmente o mercadot-capitalist'à limita- va-se a fornecer ao artesão independente a m'!l.téria-prima, te·muneran- do-o par~.; S,i.lé--á'transformasse em pro.dutos acabados-. Desse . modo; o capit~stã":tornava-'se o proprietário do_ produto ao longo d'e todas as _eta-pas dá pr6dúção, ainda que o trabalho continuasse sendo realizado em ofic~nas independentes. Numa fase posterior do sistema tnanufatu- reiro doméstiCo:, o mercador-capitalista passou a ter a propriedade das máquinas e instrumentos de trabalho e, freqüentemente , do prédio no interior do qual a produção se realizava. Contratava os trabalhadores 27 (' .. para acionarem os instrumentos de ·trll:.9.a!ho, fornecia-lhes as maté- ~ rias-primas e apropriava-se dos prod.1.1tg~ ~çªbados. ~ Ao invés de vender o produto acabado. ào mercador, como aconte- ~ cia antes, o trabalhador · passou a _·vender apenas a sua força de \ trabalho. Um dos primeiros ramos indv*·.iai~ ottde o sistema manu- I il fatureiro se desenvolveu foi o das indllstrías têxteis. Os tecelões, os ~ ~ fiandeiros, os pisoeiros e os tintureirps Jch~ram-se numa situação de . -X; · ~ dependência com relação ao mercador-capitalista, pois dele dependia a .l- oferta d~ empregos e, conseqüentemwte; á. possibilidade de sustenta- rem a si mesmos e as suas famílias . . Cabia ~-mercador-capitalista vender os bens produzidos pelos trab~lh~cll)ré(a um preço tal que lhe permitisse pagar os salários, os dell}.âis custos de produção, obtendo ainda algum lucro para si. .· ' Simultaneamente à incorporação do processo produtivo ao controle capitalista, criava-se uma força de trabalho ' total ou parcialmente despojada do capital, que conservava apenas .a possibilidade de vender a sua fo-rça de_ tr<~l?alho. Estas · são ·é).s .dua~ .vertentes do processo de formação do sistema - ~~~nÔmico capitalista. Alguns autores e historia- dores subordinam a existência do capitalismo à expansão do comércio, \ à difusão do espírito comercial na Europa·. No entanto, as trocas e o comércio nunca deixaram de existir durante a era feudal. É verdade que , enquanto as tradições feudais funcionaram comó o princípio organizador da produção, as troca~ e _o comérCio permaneceram à margem do sistema econômico e social. · Em lugar dos costumes e tradi- ções, o mercado e a busca de lucros mónstáríos passaram a determinar como seriam divididas e executadas as tarefas produtivas bem como as oportunidades de trabalho proporcionadàs ; Quàndo isso ocorreu, o si_stenra capitalista estava criado4 • · O capitalismo tornou-se o sistema dominante quandc- as -relações existentes entre os capitalistas e os trabalhador,es nas indústrias de exportação do século XVI invadiram as demais linhas de produção. A expansão do sistema exigia a eliminação da auto-suficiência econômica do feudo bem como a dos costumes e tradições senhoriais . Foi necessá- rio converter a agricultura numa empresa dpitalista em que os traba- lhadore~ fossem obrigados a vender sua força de trabalho para os capitalistas, e esses a comprá-la, quando pudessem obter lucros do processo. . Existia no século XIII, uma indústria têxtil capitalista em Flan- dres. Quando, por diferentes razões, que não cabe analisar aqui, a sua 4. Ver Maurice H. Dobb., Studies · in the. Deve/opment o/ Capitalism (Londres: Routledge & Kegan Paul, 194.6), (A E volução do Capitalismo, Rio de Janeiro : Zahar Editores , 1965), particuta r· m.entç o capítulo IV . 28 prosperidade entrou em declínio, o antagonismo que se gerou entre a riqueza e a pobreza por eJa criadas deu origem, em cerca de12&0, a prolongàdas e violentas lutas de clá~se-· que destruíram q~as~ p~r · completo a indústria da região. No século. XIY, · floresc~u ui? a mdustx;_a têxtil capitalista em Flonença. Como em Flandres. as cond.tções econo· micas adversas despert~ram tens.ões entre a Classe o.perárià, reduzida ~ mais negra! miséria,' e '>O( opulentos empregadores capitalistas, culmi- nando em J~iolentas rebeliões, em 1319 e 1382. O agravamento desses antagonis~~s de classe precipitou o .dec.lín_io da indústria têxtil flore.n· tina, tàl como acontecera anteriormente em Flandres. A Inglitterra conquistou, no século XV, a hegell'lonia do mercado mundial de' produtos têxteis. A solução encontra.ua pela burgu.esia , inglesa para resolver o problema dos conflitos de classe foi rurl:!-.liz.ar a indústria têxtil capitalista. Em Flandres e em Florença, as indústri.as têxteis estavam centralizadas em cidades densamente p.óvoadas ~ onde os trabalhadores eram arrebanhados, o qu{facilitava a eclosão de movi- mentos de r,esistência organizadas; Na Inglaterra, as fábri.cas de pis.o.a- mento se d~spersaram pelo campo, criando pequenos aglome..rap.o.s de trabalhadoreS, isolados uns dos outros, ·r!ificultando, assim, a pxep.ara· ção de movimentos de resistência organizados. Reunindo, de um lado, opule.ntos proprietários de capital . e de outro artesãos despojados de suas propriedades e tran.siorm.àdos e.m trabalhadores,·assalariados, o sistema m·<úiufatureiro foi . um f.e.nôn.emo muito ~ais urbano que rural. Desde o inicio, as empr~sas capitalistas procuraram assegurar posições moi10poli~.tas a partir das .quais p.ud.es. sem explorar, com exClusividade, o mercado para seus pro.d.1.1tos. À medidà, que se fortaleciam as gui1das de ~rivilegiados --'- associa.ç.õ.es de mercadores capitalistas que empregavam 'trabalho assalariad.o ~ multi~ plicavim-se as barreiras protecionistas destinadas a ass.egurar o . seu· mono.&!io. A diferenciação dos regimes de aprendizagem, a in$tituição de p~légios e isenções especiais para os filhos dos propri_etár!os mais abastado~, a cobrança de . taxas excessivamente elevadas para à'agmis· são d~1 ri1ovos membros ·foram algumas das barreiras , qu.e . vis.avam a impédir que os artesãos ambiciosos; porém pobres, co~pettssem ou tivessem .icesso às fileil-as da nova classe capitalista. A imposição, dessas barreiras apressou, de um modo geral~ ~ transformação dos artesãos mais pobres e de seus filhos em um/,\ ofisSlili-i~perária urbana con.síran· gida a sobreviver exclusiv11meni:e às custas · da venda de sua f.or.ça, de trabalho. . .I ~ \( (' b\~ l 29 \L. Q.lc1~' l ~v c c&, <R. r1 l Ç ddcev\ d Q_. ~ '"(,{~ .. ' ..... · •: i - .> ~ -l proprietário de terrás que viVIa exclusivamente de retrdã:s-. Mu:i'tô's · -~ 1 senhore·s feudais se transformaram em proprietários absenteísta·s, uns . O Declínio do Sistema Senhorial Antes que o ~istema capitalista adquirisse sua forma acabada, as relações capitalistas de mercado tiveram que invadir o feudo, bastião do feudalis~o. O fato que possibilitou essa conquista foi o enorme cresci- mento da população das novas cidades comerciais. As cidades, cada vez mais densa-mente povoadas, dependiam das zonas rurais para a obten- ..... ' I:. porque preferiram se mudar para as cidades, outros porcrue viviam distantes de suas terras travando batalhas. O colapso do s1stema senhorial foi precipitado p·or um:a S'é'ri'e de catástrofes que convulsionaram a Europa no final do sé·cu.l'o XIV e dura-nte o século XV. A Guerra dos Cem Anos entre França e Ittglate·rra (1337-1453) produziu uma situação de desordem e descontentam-ento ção de alimentos .e de grande parte das matérias-primas utilizadas pelas .,. indústrias de exportação. Estabeleceu-se uma especialização rural-urba- I ' ~ ~ generalizado nestes países. Os efeitos da Peste Negra foram ainda- mais f ~ na que se ez acompanhar de um vasto intercâmbio de mercadorias "> entre os feudos e as cidades. Os senhores feudais passaram a depender . das cidades para a aquisição de bens manufaturados, como os produtos de luxo . cujo consumo tornou-se iildi~pensável ~~ que só os mercadores · poderiam lhes fornecer. i · Os ca~poneses que cultivavam as terra~· o feudo perceberam também · que podiam trocar o excedente por - nheiro nos mercados · locais de grãos .'-Com esse dinheiro, podiam obt ·r do senhor a comuta- . -.· . .. - r1 ção de suas ob.:igações e~ trabalho. 5 A comutaç'ão possibilitou a muitos _ camponeses a}cançarem uma condição múito próxima à de pequenos empresários independentes. Arrendavam terras do senhor e, com a . venda do rrod~to, p~gavam a renda_ da terra e ainda conservavam parte do excedent~. Este~ s1stema proporciOnou aos camponeses um estímulo ·maior para produzir~m. ampliando o excedente'. comercializável, o que .. os levava a ' o~ter novas comutações que, por sua vez, redundavam em -.l2 $ mais excedentes e renda monetária, e assim por diante. o efeito ? cumulativo d~ste processo solapou, pouco a pouco, os vínculos tradicio- i ~ . nais do fcud~, instaurando, em seu lugar, as r6lações de mercado e a ~ busca de lucros :como princípios organizad<ilres da produção. Em mea- 1:11 dos do s~cU_lq:,XFV, em muitas partes da Eurppa, as rendas em dinheiro excediam o valor das prestações de trabalho. c:dõ no ca111t?· .estr.éit_amente relacionada com a comutação das obriga- ' _Outro fà.tor que contribuiu para a introdução das relações de mer-~ · çoes em servf~o , fot a progressiva alienação das terras senhoriais. A - necessidade de dinheiro para a aquisição de bens manufaturados e ':; c, p~Ç>dutos de 1gxo levou os senhore~ _a optar~m, pelo arr~ndamento de \ ~ suas terras a _ camponeses arrendatanos, ao mves de cultivá-las direta- <J rriénte utilizando os serviços que o servo era obrigado a prestar ao \ senh_or . Este .· .. processo acabou por conveMt~ r o senhor feudal num .. simples l~nd!ord, no sentida moderno do termo, isto é, num simples 5. A comuta.~l!o Implicava a substituição das p,restaçiles de trabalho exigidas do servo por rendas em dmhetro , t. . ' · v 30 devastadores. Às vésperas da Peste (1348-1349) a população da Ingla- terra alcançava cerca de 4 milhões de habitantes. No princíp'io do século XV, as guerras e a peste haviam reduzido a população do país a 2,5 milhões de habitantes. O mesmo ocorreu, com maior ou menor inten-si- dade, nos outros países europeus. O declínio da população provncou uma escasse_z ·desesperada de mão-de-obra; os salários para todas as categorias'_ de _ trabalho eleváram-se abruptamente. As terras, relativa- mente mais -abundantes, tornilram-se menos rentáveis. Pres_siô-nada por essas circunstâncias, a nobreza feudal te·ntou revogar as comutações que havia concedido e restaurar as obrigaçõ-es em forma de trabalho que pesavam sol;lre os servos e camponeses (os camponeses eram antigos servos que haviam alcançado um ce·rto grau de independência, libertando-se eni parte das restrições feudais). No entanto, aprenderiam na prática que era impossível fazer retro·ceder o relógio da história. As relações de mercado já se haviam implantado nas zonas rurais, proporcionando maior liberdade, independência e pro·s:pe- ridade para ps- carhponeses. Estes opuseram uma resistêri-cia vigorosa, por vezes s_angtenta, às tentativas de reintroduzir as antig~ obrigações · feudais. 1"' . Ess_~5hoque_ de interesses-produziu as_fa~osas revoltas camponesas. que eclo(:lir!lm, por toda a Europa, do fina:! -do século --XIV até o princípio ~o século XVI. Um escritor francês da época descre~e1I uma -- cena que il\lstr~ o caráter cruento e brutal que tais revoluções tiveram: "Um band_o, d~ .. ~amponeses matou u.m fidalgo, suspendeu-o e·m um espeto e assou--o sq_bre o fogo diante de sua malher e dos filhos. Dez ou doze hom~n!_Yi?Iêntaram a mulher e, em seguida,forçaram-na a comer da carl}.e -dó marido. Depois mataram a mulher e os filhos. Esses brutos ------- '- ' - _por onde 91Jer que passassem, destruíam as casas da gente ho·ne·sta c '- sólidos castelós". 6 Camponeses rebelados eram massacrados p-ela nobre- za com tanta, ou mais crueldade e ferocidade. 1940~.' p.~oi.'B. _Oras, A lristory of Agn'cultur-e in Europe and Ametica (Nova l·orq·ue·: Ap-p'lcto·n., 31 --1 i I . i ·-J A Inglaterra foi palco de várias revoltas semelhantes no fim do século XIV e no século XV. As mais sangrentas , contudo, ocorreram na Alemanha, no princípio do século XVI. 'A revolta dos camponeses de 1524-1525 foi esmagada pelas tropas ithperiais do Sacro Império Roma- no (Germânico). Dezenas de milhares de 'can:1poneses foram massacra- dos. Calculava-se que, somente na Alemanha, cerca de 1.00.000 pessoas foram mortas. · · Tais revoltas foram aqui mencion.~das para ilustrar o fato de que, na maioria das vezes as mudanças furidameritais na estrutura política e econômica de um sistema social se efetivam so___.menft~pós a eclosão de conflitos sociais violentos e traumáticos .. To'âo sistema econômico gera uma ou mais classes cujos privilégiofdépendem da manutenção do . - . - sistema. E compreensível que essas classes não tenham escrúpulos quando se trata de resistir às mudanças que colocam em risco seus privilégios. A nobreza feudal lutou, na_. ret~guarda, com toda a energia de que dispunha contra o nascente sistema de mercado capitalista. Mas as lbrças que -naquele momento encarnavam o progresso conseguiam, finalmente, afastá-la do caminho. Embora as mudanças fundamentais tenham sido promovidas por ambiciosos iner_cadores e elementos oriun- dos da pequena nobreza, as grandes vítimas desse processo foram os camponeses, sobretudo os que tombaram nas sublevações sociais que caracterizaram esse período. A ironil!- da história, no caso, reside no fato d.e que geralmente lutavam para _prcoteger o status quo. Outras Forças Par-ticipantes da Transição para o ·capitalismo Os primeiros anos do século XVl apresel)taram-se como um divisor de águas na história européia. Assbi.alam-se vagamente a linha que separa, de um lado, a velha e decadente ordem · feudal e, de outro, o sistema capitalista emergente. Após 1500, ocorreram mudanças sociais e econômicas importantes, com freqüência cada vez maior, cuja intera- ção e efeito cumulativo preparam o caminho para a consolidação do sistema capitalista. A população da Europa Ocidental, que permanece- ra relativamente estagnada durante um século e meio, cresceu cerca de um terço no século XVI, alcançando, em 1600, a casa dos 70 milhões de habitantes. O crescimento populacional foi concOmitante ao regime de enclosure (de cercamento dos campos), cujas origens, na Inglaterra, remontam ao século XIII. A nobreza feudal, s.empre e cada vez mais carente de · dinheiro , passou a cercar ou fechar as terras utilizadas até 32 _, ,. então como pastagens comunais, destino.ndo-as à criação de ovelhas, para atender a demanda de lã das indiístrias têxteis ingle.s.a.s, cujo crescimento atingia proporçÕC); sein prec-~ dei1te8. Havia duas vantagens . na criação de ovelhas: os preços elevados ·que a lã alcançava no mercado e a quantidade mínima de mão-de-obra que a manutenç.ão do.s reba- nhos reque,ria. ', ' . O regi~e de enc/osune dos campos atingiu · o auge no fing.l do século XV ~~no século XVI. Em alguml1i áreas, três quartos . ~ nove décimos dos arrendatários foram · expulsps do campo e obrig~Q,o.s a emigrar par;l as cidades, em busca de meios de sobrevivê.nda. O cercamento d.os campos, aliado ao crescimen.to populacional, acelÚou a dissolução dos laços feudais remanescentes, e deu· origem a u,.roi vasta força de trabalho com características novas: inúmeras pessoas víam-se privadas de terras, despojadas das ferramentas e instrumentos de produção, em condições apenas de vender a sua força de trabalho. o movimento migrat6rio para as cidades proporcionou n.ovos contingentes ( de trabalhad~res para as indústrias capitalistas; mais homens para os exércitos e para as forças navais, mais voluntários para colonizar terras · distantes e muitos consumidores em potencial para os pro.dutqs in- dustriais. Outro fator de mudança importante foi o renascimento intelectual ocorrido no século XVI, re&pons.ávcl · pelos progressos cientificas de utilidade práficà .imediata, sobretUd(.) para a navegação. Q, teles.cópio e a bússola possibilitaram aos mar-inhdros navegar com maior precisão e, assim, percorrer distâncias mais longas. S~m essas invenções, teria sido .impossível .a "era das grandes . navegações". Num curto 'p.er:ío.do de tempo, ·os europeus puderam _ projetar em mapas as . rotas ma.t:ítimas para a 1!:1-dia, a ÁfriCa e as Américas. As terras descobertas ne.s:ta época tivera :~ uma dupla importância, Prlmei.ro. resultaram rium rápido e. intens ·Juxo de metais preciosos corri destino à Europa; em s.egup.do lugar, 1 uguraram o chamado período cplonia!. ~ A. - A Broidução européia de ouro e ptata permaneceu estagnada de '1300 a · 500. A rápida expansão do comércio capitalista e a difus.ão do 'sistema de , mercado nos centros ~rbanoi e nas zonas ru'rais provocou uma escassez aguda de di-nheiro, Uma •vez que o dinheiro consistia basicamente em moedas de ouro e pqta._ A carência destes metais tornou-se, assim, crítica. A situação foi parcialmente mitigada quando, por volta de 1450, os portugueses começaram a extrair metais p;redosos da Costa do Ouro, na África. No entilnto, esse problema s.ó foi definitivamente solucionado em meados do século XVJ . . A partir c;!psta época, a situação se inverteu: o fluxo de ouro e pnúu, pro.venle,nte das 33 1 ..> área da produção e do comércio. O termo mercantilismo é empregado, geralmente, para designar essa fase inicial do capitalismo. Mercantilismo: Paternalismo Feudal nos Primórdios do .Capitalismo A primeira fase do mercantilismo, denominada usu almente bulío- "' nismo, refere-se ao período (discutido finterior:mente) durante o qual a Europa se ressentiu da escassez <;!e ~ ou-ro /""~--ptâta em lingotes . Essa escassez tornava insuficiente a quantifi(Óe de dinheiro em circulação para atender o volume do interc~bÍo .de mercadorias que se encontra-• . . . va em rápida expansão. As políticas bulionistas foram projetadas com a finalidade de atrair para os países . que as colocaram em prática um fluxo constante de ouro e prata e, ao mesmo tempo, de preservar o estoque de metais preciosos mediante. a proibição de sua exportação. Tais rest~iç.õ.es .p.erd.urararrL dp final d,a lda.de Média até os séculos XVI l e XVII. A Espanha, para onde fluía a maior parte do ouro proveniente das Américas, foi o pa:ís que aplicou -as . restrições bulionistas durante o maior período de tempo, e que 'impÔs a penalidade mais severa, a morte, para evitar que o ouro e a prata fossem exportados. Entretanto , as necessidades do comércio eram .. ~o prementes, e as perspectivas de lucro para os que se dedicavam à ijnportação de mercadorias estrangei- ras, tão promissoras que, até mesmo, na Espanha, os mercadores-capi- ~ talistas acabaram conseguindo subornar burocratas curruptos e contra- c:5 bandear grandes quantidades de lingotes para fora do país. Os metais f preciosos acumulados pela Espanha, em pouco tempo, espalharam-se por toda a Europa e f.oram amplamente responsáveis-pelo longo período inflacionário descrito anteriorment,e. A Espanha só legalizou a exporta- ção de ouro e prata muito temp_o depois da abolição das restrições "-.... bulionistas na Inglaterra e na Hcjlanda, em meados do século XVI. Superada a fase bulionista, a política mercantilista adotada pelos governos europeus passou a privilegiar a manutenção de uma balança comercial favorável. Suafinalidade continuava sendo a de maximizar as reservas de ouro e prata existentes no país. Para manter uma balança comercial favorá vel, os pagamentos em dinheiro recebidos pelo país deveriam superar o fluxo de dinheiro que abandonava o país . Portanto , intéressava a.os governos , por u:ffi lado, favorecer a exportação de mercadorias e a prestação de certos serviços, como a navegação maríti- ma e os seguros, desde que fossem prestàdos por compatriotas e pagos por estrangeiros . Por outro lado, interessava desencorajar a importação 36 - ., de mercadorias e a t·ontrat ação (lesses mesmos serviçospagos a estran- geiros. Manter uma balanc:a comercial favorável significava enrlquecet o tesouro· do país. Ainda que neste processo . fossem inevitáveis certos pagamentos em ouro e prata, para o ext~rior, o ingresso de metais preciosos fatalmente supera.ria a saída desses metais. Uma das pol.íti~as mais importantes, que visava à ampliação do valor das exportações e~:'l,reduçho das importações, foi a criação dos monopólios ~omerciais. A Ing!aterrl\:, por exemplo, poderia adquirir mercadoria' ~suponhamos de uma região at rasada), a um preço mais vantajoso,s" apenas um mercador inglês l> nrganhasse com os estrangei· ros envolvidos no negócio, ao invés dG vúrios mercadores ingleses competindo entre si para assegurar a transação, forçan'do, deste modo, ~ elevação dos preços. De forma análc>g~ • . os mercadores ingles.es poderiam vender seus produtos para os estrangeiros, . a . pre.ç.os bem mais elevados, se houvesse apena&. um negociante. oferecendo o produto, ao invés de vârio.s ofertantes forçando a qi,iedá dos p·reços ,para atrair os compradores , ; ' . Nada ÍIT\pedia que o governo inglês próil:>isse comerciantes d.o país - de concorrerem entre si, em áreas que estivessem sujeitas á monopólio. iJ No entanto, era muito mais difícil afasta.t ·a concorrência dos comer- ciantes franceses, holandeses ou espanhói~ .. Vários governos tentaram excluir a concorrência dos mercadores estrangeiros organizando impé· rios coloniais controlados pela metrópole e submetidos ao m.onopólio comercial. Assim, as possessões coloniais poderiam fornecú m.atérias- primas baratas_para a metrópole e adquirir dela, a preç.qs e:leva.do.s , produtos manufaturados. · Além da criação dos monppólios, · todos os países da Europa ocidentà1 (exceto a Holanda) promulgaram extensa legislaÇão regula· mentan~o _as ativiciades de exportação e importação. Na Inglaterra, os exporta1 ?res que -enfrentavam dific;uldades para competir co.m os "co· merda s estrangeiros obtinham a restituição de impostos ou ainda, se isso não b~stasse, recebiam subsídios para a exportação. Uma política aduaneita ~eletiva gravava urna longa lista . de matérias-primas com o objetivoifde dificultar a sua exportação, . minimizando, deste modo, o preço que ios mercadores-fabricantes . ingleses pagàvam por elas. Em determinadas ocasiões, quando esses proputos escasseavam no merc.ad_o interno prejudicando as manufaturas do país, o Estado intervinha, proibindo rigorosamente a sua exportação. A indústria têxt.il britânica foi uma das beneficiárias desse tipo ' de proteçiio. No princípio d.O s.éçúlo XVIII, os produtos tê.xteis eram responsâveis. por cerca de metade das exportações inglesas. O governo da Inglaterra ·proibiu a exportaç.ão de grande parte das matérias-primas e produtos semi-acabados, indis· 37 I i I .ti d.l(, i 0~~1 ' o I Cl..>' ! i .. ' ~ o .> t'? ~ ...., ~ .. 3 _, i ,;.:..,. ..;J· ;á~ . (Í . Amér.icas, ,.foi ~ão grand~, que a Europa sofreu a inflação mais galopan- 1 te e duradoura de sua história . No,·deê'orrer do século XVI, os preços na Europa, subiram entre 150 e, 400,t o variando de país para país e de região para região. Os preços .dos produtos manufaturados elevaram-.se bem mais rapidamente do que as "rendas e os salários. A disparidade entre preços e salários persistiu até o final do século XVII. Em conseqüência disso, tanto a c'l'asse dos landlords - proprietários que viviam da renda da terra (a . nobreza feudal) - quanto a classe trabalhadora , forarri prejudicadas, . já que o Úu poder aquisitivo cresceu menos que as suas despesas. Os grandes b6neficiários da revolução dos preços foram os . capitalistas. Seus lucro~ se multiplicavam e; enquanto isso, o valor real dos salários ·. / que paga>,:am · declinava continuamente. G>s lmateriais que adquiriam eram estocados e desta forma se valorizarab. ,... Os lucros eram acumulados sob a f~, a de capital. Capital u -;> ) .- . ·~ · t ~ . 1 designa os materiais necessários para a prod . -o e o comércio de mer- cadorias, As ferramentas, os equipamentos, a: . instalações das fábricas, as matérias-primas e os bens que participa~ do processo produtivo, assim como os meios de transpórte dos bens e o dinheiro - tudo isso é capital. A essê'ncia dosistema capitalista consiste na existência de uma classe de capitalistas que detém a propriedade do estoque de capital. É a propriedade do_ capital que faculta aos capitalistas a obtenção de lucros. Quando .. não são retirados · do proce$so produtivo, os lucros convertem-se em estoque suplementar de capital. Essa acumulação de capital redunda. em mais lucros que, por sua vez, conduzem a uma nova acumulação ainda maior , e assim por ôiante, numa espiral ascendente . f . ~ l J ç '> ... _;w ~ ~iS i I ~ O termo capitalismo designa, com muita propriedade, este sistema cujos pilares são a busca de lucros e a ac4mulação de capital. O capital é a fonte dos lucros e, portanto, a fon,t7 de acumulações de capital ulteriores.- Esse processo, contrariamente à charada do ovo e da gali- nha, teve um início. A acumulação inicial ou acumulação primitiva de capital·, ocorreu no período ora analisado. As quatro principais fontes de acumulação inicial de capital fora171: (1) o rápido crescimento do volume do intercâmbio e do comércio de mercadorias; (2) o sistema de produção r11anufatureiro; (3) o regime de 'enclosure dos campos, e ( 4) a grande inflação de preços. · Houve várias çutras fontes de acumul~ção inicial, alg~;~as das quais nem sempre respeitáveis, e por isso mesmo freqüentemente esquecidas, como, por ex~llbplo, a pilhagem colonial, o tráfico de es'Cravos e a pira-taria. f' Durant~ os séculos XVI e· XVII, o sistema manufatureiro {putting· out system).;;,difundiu-se considerav~lmente, penetrando em quase todos os .ramos in~ustriais. Embora ainda não se pudesse falar em produção 34 fabril do tipo moderno, · o grau de especialização atingido p'éló siste·tna traduziu-se em elevações signi.ficativas da produtividade. Além disso, as inovações técnicas introduzidas nos campos da construção naval e da navegação possibilitaram a redução dos custos de transporte. Esse foi, portanto, um período em que a produção e o comércio expan,di:ram-s·e rapidamente. Pouco a pouco, a nova cla'sse capitalista (ou classe mé·dia ou, ainda burguesia) substituiu a nobreza como a classe econô'mica e socialmente dominante . A formação dos Estados absolutos assinalou o início da transi~â:o para a supremacia de uma nova classe. ·os novos monarcas, fre-qüente- mente, buscavam o apoio da burguesia para derrotar os senhores feudais rivais e para unificar o Estado, transformando-o em um po-der centralizado. A unificação libertou os mercadores da teia de normas - ' ' regulamentos, leis, pesos, medidas e padrões monetários dê caráte'r feudal a que estavam submetidos. Graças ao apoio do Estado, os mercadores puderam também consolidar mercados importantes e con- tar com proteção militar para os seus empreendimentos comerciais. O monarca, por sua vez, dependia dos capitalistas para a obtenção dos 1 recursos necessários para financiar a centralização do poder. Embora à Inglaterratenha sido formalmente unificada bem àtrte·s, ~ a unificação de fato só ocorreu quando Henrique VII (1485-1509) instalou, no pode~, a dinastia dos Tudor. Henrique VIII (1509-1547) e Isabel I ( 1558-1603) concluíram a unificação da nação inglesa ao apoio do Parlamento, que representava as classes médias dos condados e burgos. As revoluções de 1648 e 1688-consolidaram, definitivartrente , a supremacia do Parlamento ou das classes médias burguesas. Durante este período, constituír~m-se outros importante·s estados- nações capitalistas. Luís XI (1461-1483) foi o primeiro monarca que, desde os tempos de Carlos Magno, unjfjcQU efetivamente a França. Dois acontecimentos assinalaram a unificação dà -Espanha: o ca~:amen to de Fernando de Aragão e Isabel de Castela, em 1469 e, em segui.cia ;· à derrota dos árabes. O quarto estado-nação mais importante, a Repúbli- ca Holandesa, só alcançou a sua independência em 1648 quando, finalmente, as força;_ espanholas de ocupação f~a111 derrotadas. No final d~ sééulo XVI e no princípio do século XVII, as grandes cidades s!a--h1glate.rr·a, França, Espanha e Países Baixos (Bélgica e Holandâ), haviam se transformado com raras exceções, etn floresce·n- tes centros econômicos dominados pelos mercadores-capitalistas, que controlavam não apenas o comércio como também boa parte das manufaturas. Nos modernos estados-nações as coalizões formadas por monarcas e capita!ístas haviam arrancado das mãos da nobreza feudal o poder que esta ex~rcia em muitas áreas importantes , sobretudo na 35 .. ·- .. i I. . . I . I I I ! I I I ! .. pensáveis~ à ,indústria têxtil, tais como ovelhas, lã, fios e tecidos de lã penteada , · . . Forám adotadas também medidas visando a desestimular as Impor- tações. A i~mpottação de determinadas mercadorias foi proibida e so~re outras reéaíam taxas alfandegárias tão elevadas que essas mercadonas pratic~mente desapareceram da pauta de importações . Especi~ln:en~e importantes foram as medidas destinadas a proteger as prmc1pa1s indústri~s ·inglesas de exportação contra a concorrência movida pelos fabrican.tes estrangeiros, que se esforç·avam pOr penetrar nos mercados domésticos controlados por essas indústrias. Evidentemente. embora as restrições colocadas em prática nesse período b~neficiassem a alguns capitalistasA prejudicavam . a outros . Como serfà de se esperar, os grupos d'~ 1lhteresse, orgamzados em coalizões, pressionavam, por diversos mei6s, os centros de decisão quer para manter . as restrições, quer para esten ~-las a outras esferas . Os Atos de N~vegação, por exemplo, promulga pela Inglatérra em 1651 c 1660, tinham por finalidade promover a u(\hzação dos navios ing~es~s (fabricados no país e tripulados por súditos 'da Inglaterra) cno comemo de !mporta,ção e exportação. Todas as leis que regulamentava~n o comércio e'xterior e a navegação visavam, em última análise, a ampllar o fluxo mo~~tário que ingressava no país e reduzir o fluxo ·que escoava para forà.: Evidentemente, ·os rumos que as políti.cas protecionistas _da época tomaram, em grande parte , foram determmados pelas pressoes ex'ercidas' pelos diversos grupos de interesse . . . . · Aién\ de disciplinar o comércio exterior , o Estado procurou mterv1r ·na ·esfera ~'cia produção doméstica, controlando-a através de uma mul~i pli~idade · de restrições e regulamentações. ·Afora as isenções· fisca1s , subsídios -e outrás concessões destinadq.:S a estimular a produção das indústrias' voH.adas p.ara a exportação, 9 .Estado promulgou leis regula- mentando, minuciosamente, os métodos de produção e a qualidade dos produtos. Na França, Luís XIV codificou, centralizou e ~stendeu as antigas restri,çi)es .a\?li~adas, até então, de forma descentrahza.da, _r~las guildas. Técnicas específicas de produção torn~r.am-se obngaton~s: amplas medidas de controle de qualidade adqumram força de le1 ; foram, inclusive nomeados, em Paris, fiscais com a missão de zelar pelo cumprimento, a nível local , destas deté~minações . Jean Baptiste Col- bert. ·ministro e conselheiro econômico de Luís XIV, foi o responsável pela aprovação dessa vasta e minuciosa(ihisla~ão. N_a indúst~ia têxtil, por exemplo, especificavam~,.'!e rigidamente as d1mensoes e o numero de ·fios que as peças de tecido Lieveriam ter . . . . . . Na· l!)glaterra, o Estatuto dos Artífices ( 1563) transfenu , deft~J t t· vamente , ·para o Estado , ; as funções desempenhadas pelas antigas 38 guildas artesanais . O poder central assumiu o controle da a:prendi:za- gem dos trabalhadores industriais , das condi~ões de emprego e da alocação da força de trabalho nos diversos tipos de ocupação . O Estado promulgou, também, leis que regulamentavam os salários, a qualidade de vários produtos e outros detalhes concernentes à produção domés- tica . O que significava o amplo controle, exercido pelo Estado , sobre o comércio e a produção doméstica de mercadorias? À primeira vista , a questão parece simples : o Estado utilizava-se de seus podere·s·-·p·ara promover os interesses específicos dos capitalistas . Esta visão é reforça- da pelo fato de que a maior parte dos .escritores, voltados para as suntos econômicos ·que se destacaram nesse período, eram cometcia.ntes ou· funcionários de comerciantes. É inegável que muitos dos estatutos e das medidas protecionistas foram respaldados por grupos de interesse que se beneficiavam com eles. Entretanto, os mercadores e industriais, ou seja; a class·e média capitalista emergente, muitas vezes encontrou nessa teia intrinc·ada d·e regulamentos, um obstáculo ao' desenvolvimento de suas atividades e à obtenção de lucros. Isso explica por que os capitalistas e seus porta- vozes levantaram argumentos , insistentemente, ao longo desse f'l'etío·do, em favor da liberalização dos controles impostos pelo Estado . Os regulamentos econômicos açabaram se transformando em um a maldi- ção para os capitalistas e seus porta.·vozes. Efetivamente, a característi- ca mais marcante.do período mercantilista foi o conflito que se estabe- leceu entre uma ideo.logia econômica ultrapassada, a versão medieval da ética corporativa cristã, e uma nova ordem econômica e social com a qual essa ideologia tornou-se incompatível. O capítulo III discute justamente as conseqüências deste conflito. Resumo Uma série de mudanças profundas provocou o declínio do fe'udalis: mo e a emergência de uma nova economia orientada para o mercado. As mais importantes _dessas mudanças foram os .progressos oco·rridos na tecnologia agríc_o!á/~ntre o século XI e o final do século XIII. Os aperfeiçoa).JielÍtos i.n.troduzidos na tecnologia agrícola desencadeara m . nos sééúÍ~s subseqüentes , uma sucessão de acontecimentos que cu lm i- naram na consolida.ção do capitalismo. O rápido crescimento da população e da concentração utbana favoreceram o ressurgimento do comércio de longa distância . O sistema manufatureiro estruturado nas cidades (putting·out sys tem ) produzia as mercadorias que eram intercambiadas no comércio de longa d istância . J9 I Configurou-se uma especialização ._ ur,biitn.o-rural que .,lessupunha a monetarização das funções econômica~. e d:as atividade·> produtivas. A transformação das relações sociais, fe!Ú{a.i·s- ~m . relações . monetári ::~s de mercado destruiu a base social do feuçi~.H,~,mo. As tentativas de preser- var o sistema feudal culminaram na repressão sangrenta das revo ltas camponesas. , . . Outros processos que contribuíriJ,rp deçisivamente para a instaura- ção do sistema capitalista__)e mercado_Jg,r.am o regime de enclosure (cercamento) dos campos, o renasciment.o . intelectual, ·a exploração colonial, a descoberta de grand~s quantidades,...-dé metais preciosos , a inflação de preços ocorrida nos séC\.1los/ XVf e XVII e a criação dos novos e~tados-nações./_./ ,' As políticas mercantilistas aplicadas nos estágios iniciais do capita- lismó ocasionaram ampla intervenção ~g~yernamental nos processos de mercado, sobretudo nos processos relacioijados com o comércio inter- nacional. Tais políticas tinham por objetivo, de t1m modo geral, assegu- rar elevados -lucros para as grandes companhias de comércio, ampliar as fontes de renda dos governos nacionais e, numa perspectiva mais · ampla, atrair o máximo de metais preciosos para o país. '!-:t.~, .... -...... ,, 40 'I ' ., .. ) ,, ,, CAPÍTULO III O Conflito Latente no Pensamento Mercantilista A étfca pate~alista cristã, quando condenava a aquisição dos bens materiais, entrava em conflito com os interesses dos comerciantes medievais. Esse conflito agravava-se à medida que crescia a importân- cia do comércio de mercadorias. O mercantilismo inglês permaneceu fiel , em seu desenvolvimento, a dois princípios fundamentais'. "O primeiro referia-se às prescrições bíblicas para a promoção do bem· ·estar geral e do bem comum das criaturas que habitavam o mundo corporativo de Deus. O segundo princípio era a tendência a definir, como patrimônio de Deus, a sociedade civil na qual os cristãos resi- diam1" . Nesse período, o Estado começou a tomar o lugar da Igreja, assumindo a função de interpretar e de zelar pelo cumprimento da ética paternalista cristã: A questão essencial, que preocupava os responsáveis pelas primeiras políticas mercantilistas, consistia em saber se deveriam pt!rmitir que a florescente classe dos mercadores se dedicasse à aquisi- ção de lucros, com toda a liberdade, sem considerar as conseqüências econômicas e sociais desse tipo de comportamento. A ética cristã exigia que as atividades dos comerciantes fossem supervisionadas e controlá· das, no interesse do bem-estar de toda a comunidade. I. Neste capitulo, fcxolizan:mos basltamente o mercantífumo ingles. por duas razões: em primeiro lugar, porque o capitalismo industrial desenvolveu-se, antes que em qualquer outro p&ls, na Inglaterra; em segundo lugar, porque a maior parte du id61u que formam a Ideologia capitalista, a nA lindas. mais adiante, no capitulo IV. foram elaboradas na ln,~tlaterra. 2. Will iam Appleman Williams. Tlrt Contoun of llmtrican Hutory (Nova Iorque: Quadrangle, 1966), p. 33. 41 As Origens Medievais das Politicas Mercantilistas Os primeiros indicias de uma politica econômica de tipo mercanti- lista remontam ao reinado de Eduardo I (1272-1307). Esse monarca decretou a expulsão de várias empresas estrangeiras da Inglaterra, estabeleceu o comércio inglês de lã na Antuérpia e, por diversos meios, tentou regulamentar o comércio que se realizava no interior do pais. Eduardo III, que subi~ ao trono pouco tempo depois, ampliou conside- ravelmente o alcance das políticas colocadas em prática por seu ante- cessor. A prolongada guerra com a França (1333-1360) desencadeou uma inflação cujas conseqüências, para os trabal6'adores, foram desas- ' trosas. Eduardo III procurou mitigar os efeitos da inflação fixando preços e salários numa proporção favorável para 'fd trabalhadores. Em troca, exigiu que todos os homens se dedicassenfa toda a espécie de trabalho e serviços disponíveis. "Como sugere es(e qüiproqu6, o mer- cantilismo fundamentava-se na idéia da respon~abilidade mútua, de caráter corporativo. O caminho que conduzia a·· Deus baseava-se no respeito mútuo e .em obrigações recíprocas. Jerusalém era o exemplo a ser seguido"3 • Ricardo Il (1377-1399) ampliou e sistematizou as políticas coloca- das em prática por seus predecessores. Os prineipais problemas que enfrentou durante o seu reinado foram os co~flitos econômicos e sociais, que culminaram na Rebelião Camponesa de 1381 (ver capítulo 11), e a ameaça representada pela concorrência estrangeira. A necessi- dade de reagir com mais vigor à concorrência estrangeira levou-o a promulgar, em 1391, o Ato de Navegação, cuja finalidade era favorecer a frota e os comerciantes ingleses, e atrair ouro e prata para o país. O acúmulo de metais preciosos era indispensável para a concretização de seu programa: converter a Inglaterra num "reino próspero e bem gover- nado" em que todos desfrutassem de maior segurança econômica, atenuando-se as tensões sociais existentes. Henrique Il (1485-1509) deu prosseguimento a essa. política. Ar· mou numerosas expedições marítimas, comandadas por exploradores e aventureiros, e procurou, de várias formas, assegurar a legislação e negociar tratados vantajosos para os comerciantes ingleses. Ao mesmo tempo, submeteu-os a uma série de controles e regulamentos, pois acreditava que a busca de lucros, quand~J~goísta e ilimitada, era prejudicial aos interesses do país e à harmo1i\i social. 3. Willlams, op. cit., p. 34. As questbes apresentadas nas plginas seguintes bueiam·se no livro de Williams. por sinal um exc:cknte livro. 42 Na verdade, Henrique II procurou manter uma politica de equili- brio entre os interesses feudais e os interesses capitalistas. Nem os senhores feudais nem os capitalistas dispunham de suficiente ascendên- cia para fazer pender a balança em seu favor. O rápido crescimento da mineração e da criação de ovelhas durante o seu reinado relegou a um segundo plano a produção de alimentos, o que trouxe conseqüências desastrosas. Por outro lado, os excessos cometidos pelos comerciantes despertaram a hostilidade tanto dos camponeses quanto da aristocracia agrária. Percebendo, talvez, as. implicaçõ~s que isso poderia trazer e em retribuição às medidas adotadas pela Coroa, destinadas a amparar os empreendimentos que realizavam no exterior, os comerciantes submete- ram-se, voluntariamente, às leis que regulamentavam a atividade ma· nufatureira e comercial no interior do país. A Secularização das Funções da Igreja Durante o reinado de Henrique VIII, a Inglaterra rompeu com o catolicismo romano. Esse rompimento foi bastante significativo porque assinalou o final do processo de secularização (ao menos na Inglaterra) das funções desempenhadas, até então, pela Igreja medieval. Sob o reinado de Henrique VIII, "o Estado, convertido em monarquia divina, assumiu o papel e as !unções da antiga Igreja universal. O que Henrique fez, à sua maneira brusca, foi santificar os processos deste mundo;'•. Seu reinado, assim como o de Isabel I, Jaime I e Carlos I (1558-1649), foi marcado por intenso descontentamento social, motiva- do pela determinação, em conseqüência do desemprego, das condições de vida da população. O regime de cercamento dos campos (discutido no capítulo II) foi responsável em grande parte,. pela onda de desemprego que se espalhou pelo país. Outro fator foi o 'deClínio, na segunda metade do século XVI , das exportações dos produtos de l~. que obrigou a mais importante indústria manufatureira inglesa a dispensar grande quantidade de mão-de-obra. Esse período foi convulsionado por freqüentes crises comerciais bastante semelhantes, exceto quanto à regularidade, às fases depressivas dos ciclos econômicos modernos. Além desses fatores, havia ainda o desemprego sazona,f que deixava muitos trabalhadores sem emprego durante quatro meses. 4. Jbid., p. 36. 43 I .: I I I I A população já não podia contar com o auxílio da Igreja para atenuar os efeitos do desémprego e da miséria generalizada. A destrui- çã'o do poder da Igreja resultara no desmantelamento do sistema de assistência social organizado e mantido por ele. O Estado procurou, então, assumir a responsabilidade pela preservação do bem-estar geral da população. Nesse sentido, "os lideres da Inglaterra desenvolveram um amplo e coordenado progr;:tma com a finalidade de reorganizar e racionalizar... a indústria, estabelecendo especificações relativas aos padrões de produção e comercialização"$. Tais medidas visavama estimu- lar o comércio do país, aliviando, deste modo, o problema do desempre- go. E com raras exceções, as políticas propugnadas pelos escritores mercantilistas enfatizavam um ponto comum: a perspectiva de alcançar o pleno emprego. Os mercantilistas davam maior importância às medi- das destinadas s. estimular o · comércio exterior, relegando o comércio interno a um segundo plano, "pois acreditavam que sua contribuição para o emprego, a riqueza e ci poderio da nação era mais 'significativa. As obras escritas após 1600 enfatizavam os efeitos inflacionários do excesso de exportações sobre as importações e a conseqüente ampliação do emprego provocada pela inflação6' ~ . Entre as medidas adotadas nesse período com o objetivo de fomen- tar a indústria, destaca-se a concessão de patentes de monopólio: A primeira patente importante foi conferidá em 1561, sob o reinado de Isabel I. A concessão de direitos de monopólio visava a estimular as invenções e promover o estabelecimento de "n.ovas indústrias. Como era de se esperar, em nome desses. direitos, cometiam-se graves abusos. Os escritores mercantilistas, como os reformadores norte-americanos ante os abusos cometidos no. país no final do século XIX, exasperavam-se diante do complexo sistema de privilégios e clientelas, bem como da infinidade de outros males originados pela concessão de monopólios. Promulgado em 1624, com a intenção de coibir esses males, o Estatuto dos Monopólios declarou ilegais todos os .monopólios, excetuando-se aqueles que envolvessem invenções genuínas ou que efetivamente contri- buíssem para promover um balanço de pagamentos favorável : No entanto, o Estado deixou brechas suficientemente largas para que os abusos persistissem irnpunemente. O Estatuto dos Artífices (1563) estabelecia normas regulamentando as condições de trabalho, o tempo de duração do aprendizado, o teto máx'imo dos salários pagos aos operários, ~em como a periodicidade ~- lbid .. p. 40. 6. William O. Gramoo, Economic Libt rolism, vol: l~Nova Iorque: Rondom House, 1965), p. 59. 44 dos reajustes salariais. O estatuto é importante porque ilustra o fato de · q\le a ética paternalista em que se inspirav.am os atos da Coroa, .jamais conduziu a medidas destinadas a elevar a condição de vida das classes trabalhadoras. Embora os monarcas dessa época se sentissem obrigados a protegê-las: .tal como ~e~s · antecessores medievais, julgavam que estas classes devenam ser lll~fbdas em seu devido lugar. A fixação de taxas máximas de reajuste ~rial beneficiava exclusivamente aos capitalis- tas. Os magistrados {ue estabeleciam esses limites e zelavam pelo cumprimento do estatuto pertenciam à classe dos empregadores. Prova- velmente, os limites fixados pelo Estatuto provocaram a redução dos salários reais dos trabalhadores, uma vez que os preços quase sempre subiam niais rápido que os salários. Para combater o problema do desemprego, da pobreza e da mendi- cância, que haviam adquirido proporções alarmantes na Inglaterra, o Estad_o promulgou, em 1531 e em 1536, a lei dos pobres. A primeira lei estabelecia uma distinçãd entre os "merecedores" e os "não merecedo- res". Somente os pobres t"merecedores" tinham direito a mendigar .. A segunda lei transferia pata cada paróquia d·a Inglaterra a responsabi- lidade pela manutenção de seus pobres, autorizando-a a reunir através o • • , de contnbuições · voluntárias, .um fundo destinado ao sustento dos pobres. Ambas as medidas redundaram num fracasso total. Enquanto isso, o "problema dos indigentes" tomava-se cada vez mais grave. . Finalmente, e~ 15-72, o Estado admitiu o princípio de que os pobres teriam _que ser sustentados por meio de fundos fiscais. Decretou então, um "imp.osto para os ),obres", de caráter compulsório. Em 1576' foi autorizada a criação de "casas de correção" , onde seria'~ internado~ os "indigentes incorrigíveis". As paróquias receberam instruções para ~ba_stecer essas casllf de matérias-primas . 9as quais se ocupariam os md1gentes e vagabu~-os ~ais dóceis. Mui!as outras leis para os pobres foram promulgada penodo compreendido entre meados e o final do século XV.J. . A Lei dos Pobres, \Promulgada pelos T~dor em 1601, representou uma ten~t.iva de · in{~grar toda a legislação concernente ao problema, ~m u_m umco arcab~uÇp legal. Dentre as suas principais disposições, l~clUJa-se o reconhec1,rnento do direito de os pobres receberem assistên- Cia, a cobrança de impostos compulsórios para os pobres a nível das paróqu~as e_ a diferenciação de _tratamento para cada uma das várias categonas de pobres. o~ velhos e os d()Cntes poderiam receber auxílio em s~as casas; as crianças desamparadas, excessivamente novas para se engaJarem como aprendizes. em algum comércio, .seriam internadas; os pobres merecedores e os desempregados tinham direito a receber traba- 45 • lho, conforme o disposto na lei de 1576; já os vagabundos incorrigíveis seriam enviados para casas de correção ou prisões7 • ·Do que foi analisado até aqui, conclui-se que o mercantilismo inglês, à luz da ética paternalista cristã, elevou à condição de princípio a idéia de que "o Estado tinha a obrigação de servir a sociedade, assumindo a responsabilidade de zelar pelo bem·t:star geral da população•." As diversas leis promulgadas nesse perlodo "fundamentavam-se na noção de que. a pobreza, ao invés de ser encarada como um pecado pessoal, constituía uma função do sistema econômico9". Admitia-se que as vítimas das deficiências do sistema econômico deveriam ser socorridas pelos beneficiários desse sistema. ', ~ O Surgimento do Individualismo I Ap6s a guerra civil, que se prolongou d 1648 !l 1660, e a Revolução Gloriosa, em 1688, o governo da lngla erra foi' submetido ao controle da pequena nobreza ('gentry) e da classe ~édia dos capitalistas. A visão do· mundo medieval, subjacente à ética paternalista cristã, foi éclipsada. Nos cem anos subseqüentes, ocorreriam mudanças funda· mentais nas formas e na filosofia de atuação do Estado na sociedade. ~ Em 1776, com a publicação da obra de Adam Smith, a Riqueza das ~Nações, uma nova filosofia individualista - o liberalismo clássico10 - conquistou definitivamente a ascendência na Inglaterra. Enquanto vigo- rou o mercantilismo, a filosofia individualista travou uma luta surda contra a supremacia da antiga visão paternalista do mundo. O liberalis- mo clássico sairia vitorioso dessa luta porque - ao contrário da velha visão medieval do mundo - ele refletia as necessidades da nova ordem capitalista. 1 Ao condenar a avareza, o comportamento aquisitivo e o desejo de acumular riquezas, a ética paternalista cristã medieval rejeitava o que haveria de se tomar a motivação dominante do sistema capitalista. No final do século XVIII, quase todas as fases de produção haviam sido incorporadas à esfera da economia capitálista qe mercado que, para funcionar com· êxito, dependia do desé]'o de "se acumular riquezas em proveito próprio. Nesse contexto, começaram a surgir novas teorias sobre o comportamento humano, segundo,. as: .quais as motivações : ' 7. Para u~ aprofuodameDtO dessa dlscusslo sobre a lei ~;pobres, vu Arthur Birnlc, An E"o-tromic Hútory of tlrt Britis!t lsl~ (Londres: Methuen. 1936), ea~~XIl e XVlll. 8. W~liams, op. cit., p. 41. . ,. ~ . _ 9. lb1d., p. 44. . ···-.··r·' ·"( f' •· 10. Empregamos o adjetho c/4sslco para dUereoclar a rulo do mundo Uberal trad.lclooal daquilo que foi chamado llbenllsmo no Kallo XX. Eisa distinçlo 5eri explicitada melhor no capitulo IV. 46 egoístas e interesseiras constituíam a razão de ser básica, senão única, das ações realizadas pelos homens. Essa concepção do comportamento humano foi sustentada por~ muitos dos escritores eminentes do período. Muitos filósofos e teóricos sociais partiam do princípio de que todo ato humano estava relacionadocom a autopreservação e, portanto, era, em sua essência, um ato egoísta. O nobre inglês Sir Robert Filmer espantou-se com a quantida· de de pessoas que falavam "da liberdade natural do gênero humano; uma opinião nova, perigosa e plausível" com implicações anarquistas." Em sua obra Leviatã, publicada em 1651, Thomas Hobbes desenvolveu, em estilo vigoroso, uma opinião amplamente difundida: todas as moti- vações humanas originavam-se do desejo por tudo o que promovesse o "impulso vital" do organismo (homem). Segundo Hobbes, todas as motivações humanas, inclusive a compaixão, não passavam de manifesta- ções dissimuladas de egoísmo: "A tristeza que um indivíduo sente ante 1 a calamidade que se abateu sobre o próximo é piedade, sentimento que procede da suposição de que calamidade semelhante pode se abater sobre ele próprio; e assim este sentimento é chamado de ... compaixão, J e ... solidariedade ... " 12 • . Excetuando-se os pequenos grupos de interesse que se beneficia- vam com as restrições e regÚlamentações impostas, nessç período, ao comércio e à manufatura; os capitalistas sentiam-se de um modo geral, coagidos e tolhidos pela intervenção estatal, o que os levou a abraçar entusiasticamente as novas doutrinas individualistas. A filosofia indivi- dualista acabou por conquistar o pensamento econômico, inclusive os próprios mercantilistas. l:Jm. historiador, conhecido por suas opiniões cautelosas, afirmou que "a ... maioria das políticas ... mercantilistas par- tiam do princípio de que o interesse próprio governa a conduta indivi· -n dual..."' 3 • Os escritores mercantilistas eram, com raras exceções, capitalistas ou funcionários das grandes companhias comerciais capitalistas. Era natural, portanto, que encarassem as motivações da conduta dos capi- talistas como motivações . universais. Das idéias que os capitalistas tinham a respeito oà natureza' do homein, da necessidade de se liber- tarem das restrições econ.ômicas que tolhiam a realização de seus negócios cotidianos originou-se a filosofia do individualismo, que lan· çou as bases do liberalismo cl~ssico. Contestando as ordenadas concep· 11. Lte Cameron McOonald, W.stern Political Thwry: The Modun A,t• (Nova Iorque: Harc<lurt Brace Jovanovlc~~ .19~2), p. 29. 12. Cirado por Harry K. Olrvetz, Tht E>olution of Libualum (Nova Iorque: CoUien. 1963), p. 28·29. ·. 13. Grampp, op. cit .• p. 69. · 47 •( y \ ções paternalistas, que a Europa herdara da sociedade feudal, os filósofos individualistas proclamavam "o pri.ócipio de que o ser humano tinha direito à independência, à autodeteÍminação, à autonomia, à liberdade, enfim, que o ser humano deveria ser um individuo, uma unidade destacada e não submersa da massa social14". O Protestantismo e a Ética IndividÍllllista Uma das manifestações mais importantes da filosofia individualista foi a teologia protestante, fruto da Reforma Protestante. A nova classe média capitalista desejava libertar-se não apenas das restrições econô- micas, que obstruíam o desenvolvimento da manufatura e do comércio, como também do opróbrio moral que a Igreja católica lançara sobre as suas motivações e atividades. O protestantismo, além de libertá-los da condenação religiosa, converteu em virtudes, as motivações interessei- ras e egoístas, estigmatizadas pela Igreja medieval15• Os iniciadores do movimento protestante mantiveram-se muito próximos das posições sustentadas pela Igreja católica com relação a questões sociais. Durante a revolta camponesa deflagrada na Alema· nha, em 1524, Lutero escreveu um panfleto virulento'.intitulado Contra as Hordas Assassinas dos Camponeses; no qual afirmava que os princi- pes deviam "punir, estrangular ou apunhalar.:. tempos extraordinários em que é digno do paraíso o principe que não teme derramamento de sangue, e não aquele que se entrega a orações". Suas exortações contribuíram para criar o clima que levou a nobreza, imbuída do sentimento de. que cumpria uma grande missão religiosa, a massacrar cerca de cem mil càinponeses. · · ' · Contudo, a despeito do conservadorismo dos fundadores do protes- tantismo, a nova concepção religiosa amplioua influência da filosofia individualista. O princípio básico do protestantismo, o fundamento das I concepções religiosas, que viriam a santificar as práticas econômicas da classe média, era a doutrina de que os homens se justificam não mais pelas obras e sim pela fé. :. Segundo a Igreja católica, os homens justificam-se pelas obras, o que geralmente significava pelas cerimônias e rituais. Nenhum homem se justifica por seus próprios méritos. "A justificação pelas obras ... significava que o. individuo jamais alcançaria 14. McDonald, op. cit., p. 16. . 1~. Há dois C$1\ldos clhsicos sobre a relaçlo exi.stente entre o protestantismo e 0 eapluli.smo: o pnmelto 6 o de Ma>: •Weber, The Prore.stanJ Ethic and thc Spin't of C<lpitalism (Nova Iorque: Scribner, 1958) e o .segundo t o de Rlchard H. T .. woey, Rcll,ion ond the Risc o/ C<lpitolism (Nova Iorque: Mentor Books, 19~). 48 I r : -ç- \ r ! "> ! . .. ' · . a salvação por si mesmo, mas somente através da Igreja. Daí provinha o poderio do clero. A confissão compulsória, a· imposição de penitências a toda população ... be~ como a prerrogativa de conceder a absolvição conferia aos clérigos um poder assustador16". O poder que o clero concentrou em suas mãos dificultou o abandono das doutrinas medie- vais da Igreja católica, ~ue mantinha o indivíduo subordinado à so- ciedade. ~tA Segundo a doutrina protestante da justificação pela fé, as· motiva- ções eram mais importa"l)tes que quaisquer atos o.u rituais. A fé era "nada mais nada menos que a verdade do .coracão"11 • Todo homem deveria escutar o que lhe dizia o coração para saber se seus atos eram motivados por intenções puras e pela fé em Deus. O homem era o juiz de si próprio. A confiança que esta doutrina individualista depositiva na consciência pessoal de cada indivíduo depertou profundo interesse na nova classe média dos artesãos e pequenos comerciantes. "O negociante do século XVI e XVII, de,Gênova, Amsterdam ou Londres consultan- do seu coração, descobritf que Deus havia plantado ali u~ profundo respeito pelo princípio da propriedade privada ... Tais homens sentiam, com honestidade e fervor, que suas práticas.· econômicas, ainda que estivessem em conflito com a lei tradicional da lgr.eja, não constituíam ofensa a Deus. Pelo contrário: glorificavam·no"18• Influenciados pela noção ·insistentemente reafirmada dé que o pró· prio indivíduo interpretava a vontade de Deus, os "puritanos" quiseram espiritualizar (os .' novos) processos econômicos", chegando inclusive a crer que "Deus havia institÚJ..do o mercado e o câmbio19". Foi apenas uma questão de tempo para que os protestantes expusessem o dogma que esperavam fosse .. aceito por todos. Segundo o novo dogma, radical- mente diferente das doutrinas medievais, a. melhor forma de o indivíduo satisfazer a Deus era~exercer com zelo sua missão na terra. A diligência e. a dedicação ao trJi?_alho passaram a ser consideradas como grandes vtrtudes. 'I' A velha desconfianÇa com que o cristianismo encarava os ricos foi "traduzida" para ~Jll~ condenação à extravagância e ~ dissipação desnecessária de riqffezk A ética protestante atribuía grande impor- tância ao ascetismo, à temperança e à frugalidade. Um teólogo que se dedicou âo estudo das relações entre á religião e o capitalismo colocou a questão nos seguintes termos: "A valorização religiosa do trabalho 1~. Christ~ph~r Hill, ""Protestantism and th<: Riso oi Capitallsm"", em O. S. Landes, editor Tht Rcst o/ <Ãprtalcsm (Nova Io""ue: MacmUlan 19~~) p 43 ' 17. lbid. ... • vv' • • 18. /bid., p. 46-47. 19. /bid., p. 49. 49 ..... • . I l ·eficiente, sistemático e constante como a formamais fácil de assegurar a salvação e de glorificar a Deus tornou-se um dos agentes mais poderosos da expansão econômica. As rígidas limitações de consumo por u~ lado,. e a intensificação met6dica da produção, por outro, nã~ podenam detxar _de favorecer a acumulação de capitaFo." Assim, embora nem Calvmo nem Lutero possam ser considerados porta-vozes da nova classe média capitalista, os capitalistas encontraram no contex- to do novo individualismo religioso a religião que lhes convinha. Com 0 passar do tempo "os lucros ... (vieram a ser) encarados como a expres- são da vontade de Deus, como evidência de sua generosidade e prova de sucesso na vocação escolhida por 'Cada um11 ." t t~ As Políticas Econômibas ~e, Caráter ~~.dividua/is~f . . Ao longo do penodo mercanbhsta, as conce~Ções individualistas msp1raram protestos contra a subordinação das questões econômicas às decisões do Estado. A partir de meados do século XVII, quase todos os escritores mercantilistas condenavam os monopólios concedidos pelo ~stado, bem como outras formas de protecionismo e favoritismo, que Imperavam na economia interna (por oposição ao comércio exterior) , Segundo esses críticos, em um mercado competitivo que colocasse em oposição compradores com compradoresi vendedores com vendedores e compradores com vendedores; seria altamente proveitoso para a socie- dade, deixar que os preços flutuassem livremente e encontrassem no mercado seu próprio nivel .de equilibrio. Jóhn· H ales .• um dos primeiros escritores met·cantilistas de renome, sustentou a tese de que a produtivi- dade agrícola poderia ser ampliada consideravelmente se fosse concedi- do aos agricultores: : . · o direito de obterem mais lucros e liberdade para venderem seu produto em qualquer época e em qualquer lugar, a mesma liberdade de que os homens desfrutam em seus outros afazeres. Mas então, sem dúvida, o preço do milho subiria muito mais no primeiro ~o_me~to do que em toda A a exten~~o do process~; ~m compensação, . a elevação de preço tncttana os homens a por màos à obra, a aràr _a terra, -a lavrar terras incultas, a transform_ar as terr~s ce.rcadas para .P.astagem em terras de cultivo; pois todo homem trabalha na com mats sansfaçào na at1v1dade que promete ser de maiores lucros e ganhos, o que re~ultarã forços.amente cereal em fartura e grande. rl9,ueza .. p,ara este reino além de outros v1veres em ma1or abundãncia.l 2 '· • · .; • • . ' 20. Kemper F~Uerton. "Calvinlsm and Cap!talism; an Exp~l!on of the Weber Thesis", em Robe~ W. Green, ed1tor, Prott:Stantism and Capita/ism: Tlrt Wtbt~1_Tiru~ !lnd lts Critics (lexington, Mass .. Heath, 1959), p . 19. "~: ,.. . ..... :·>. 21. lbid., p. 18. . 22. Citado por GraJOpp, op. cit., p. 78. Esse modo de pensar - as restrições impostas à produção e ao comércio, ho âmbito de~ uma nação, são nocivas ao· interesse da coletividade - difundiu-se amplamente, no final do século XVII e princípio do século XVIII, sendo reafirmado em obras de vários autores renomados como Malynes Pettry, North, Law e Childu. Sir Dudley North (1641-1~91) foi, sem dúvida, o primeiro a discutir em termos claros a ética individuâlista, que haveria de proporcionar as bases do liberalismo cláSsico. Segundo North, os homens eram motivados, antes de tudo, pelo interesse próprio. Julgava indispensável para a maximiza- ção do bem público deixar os homens entregues a si mesmos, competin- do num mercado livre. North sustentava que os mercadores e capitalis- tas, que reivindicam leis especiais para regulamentar a produção ou o comércio, "tendem geralmente a considerar seu interesse imediato como a Medida do Bem e do Mal, extensiva a todos. Muitos se preocupam unicamente em aumentar o lucro que retiram de seu Comércio, pouco se importando com o sofrimento dos outros. Todo homem se esforça para que os demais sejam obrigados, na condução dos negócios, a agir subservientemente em proveito do seu Lucro, desde que acobertados pelo Público". z• A melhor maneira de promover o bem comum, afirmava North, era suprimir a maioria das leis restritivas que conferiam privilégios especiais. . Em 1714, Bernard Mandelville publicou "A Fábula das Abelhas: ou Vícios Privapos, Beneficios Públicos" (The Fable of the Bees: or Private Vices, Publick Benefits), onde faz afirmações aparentemente paradoxais: se todos praticassem os vícios considerados · mais degradan- tes pelo velho códico mot<al, o bem comum sairia lucrando. Sustentavá que o egoísmo, a avareza e o desejo de adquirir riquezas tornavam os homens mais industriosos e faziam prosperar a economia. A lógica do paradoxo era evidente: aquilo que os moralistas medievais considera- vam como vícios constituíam as forças motrizes que impulsionavam o novo sistema capitalista. A filosofia econômica, moral e religiosa favo- rável ao capitalismo não mais encarava tais motivações · como vícios. Durante tod() o período mercantilista, os capitalistas lutaram con- tra as restrições gue'dificóltavam a obtenção de lucros. Essas restrições impostas por leis paternalistas eram os vestígios da versão medieval da ética paternalista cristã. Tornou-se impossível conciliá-la com as neces- sidades do novo sistema econômíco, cujo funcionamento se baseava não mais em vínculos tradicionais, mas em obrigações estritamente contra- tuais entre pessoas. Os mercadores e capitalistas, que investiam vultosas 23. /bid .. p. 77-81. . ( 24. Citado por Robert Lekachman, editor, The Varieriu of Economics. vol. I (Nova Iorque: Meridian, 1962) , p. 185. · 51 :~ .... ~ somas em empreendimentos comerciais, já hão podiam contar com a força dos costumes para proteger seus investimentos. O princípio do lucro só seria viável em uma sociedade que prote- gesse os direitos de propriedade e zelasse pelo cumprimento dos com- promissos contratuais, de caráter impessoal, estabelecidos entre indiví· duos. A nova ideologia que se firmou no final do século XVII e no século XVIII justificava as motivações e as relações estabelecidas entre os indivíduos. No capítulo IV, analisaremos ós fundamentos dessa nova filosofia individualista do liberalismo clássico. Resumo Há uma relação de continuidade entre o pensamento social medie- val e o mercantilista. A intervenção do Estado nos processos econômicos foi inicialmente justificada à luz da noção medieval cristã, segundo a qual aqueles a quem Deus concedera pod~r tinham a obrigação de usá-lo em proveito do bem-estar de toda a sociedade. No início do processo de transição para o capitalismo, o Estado assumiu parte das funções antes desempenhadas pela Igreja. A ética paternalista cristã condenava severamente o desejo de acumular r~quezas que haveria de se tornar a força propulsora do sistema capitalista. Foi necessário, portanto; elaborar novas concepções filosóficas e ideológicas que justificassem mo'ralmente o individualismo, a ganância e a busca de lucros. O protestantismo e as filosofias individualistas lançaram os funda· mentos para uma nova ideologia. Nas obras econômicas dos mercanti- listas, percebe-se a influência das noções individualistas, que insistiam na necessidade de conceder maior liberdade para os capitalistas e .de reduzir a intervenção governamental no mercado. O conflito intelectuaL entre os dois pontos de vista fundamentalmente diferentes, refletidos nas obras mercantilistas. só 'se resolveu quando a filosofia e a economia liberal clássica extirparam os últimos vestígios da ética paternalista cristã medieval. 52 I I t I i I I CAPITULO IV I t O Liberalismo Clássico e o Triunfo do Capitalismo Industrial • I . I •• • '', t .O Há um tema comum a todas as obras dos escritores mercantilistas (analisadas· na parte final do capítulo III) que os distingue dos escritores liberais clássicos posteriores. Os mercantilistas defendiam
Compartilhar