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Os primórdios da Psicologia

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OS PRIMÓRDIOS DA PSICOLOGIA
“A psicologia tem um longo passado – não obstante, sua verdadeira história é curta.” (Herman Ebbinghaus, 1908) 
Psicologia tem raízes profundas na Filosofia e se volta para questões que há muito interessam aos filósofos...
• Semelhança ou diferença essencial entre eventos físicos e mentais; se são diferentes, como se relacionam? 
• Conhecimento deriva da nossa singular capacidade de raciocínio ou do acúmulo de experiências sensoriais? 
• O que nos molda? Herança ou ambiente? 
• Pensamentos, sentimentos e atitudes resultam do livre arbítrio ou de leis naturais determinísticas? 
• Fenômenos complexos são melhor compreendidos se dividirmos suas partes componentes?
Primórdios da ciência e filosofia modernas:
RENASCIMENTO 
• Começa no século XV e marca o início da Modernidade. 
• Redescoberta dos textos dos antigos gregos e romanos, especialmente, Platão e Aristóteles que estiveram perdidos para o mundo ocidental por centenas de anos.
Revolução nas artes: Da Vinci, Michelangelo...
Avanços tecnológicos e científicos: Gutenberg (criação de nova prensa tipográfica o que permitiu a popularização da leitura), técnicas para dissecação dos cadáveres (avanços nos conhecimentos da Biologia), Teoria heliocêntrica (Copérnico questiona o antigo modelo geocêntrico que colocava o homem no centro do universo).
Sistema econômico: Mercantilismo (conjunto de práticas, adotadas pelo Estado com o objetivo de obter e preservar riquezas. Visava o desenvolvimento da indústria, o crescimento do comércio e a expansão do poderio naval). 
Sistema social: ascensão da burguesia (não nascemos num lugar determinado pela vontade divina, todos podem aspirar à mobilidade social).
• A velha ordem social, assim como seus dogmas, são questionados e o antropocentrismo volta a prevalecer. 
• Comte: necessidade de maior rigor científico na construção do conhecimento das ciências humanas. O método ideal é o das ciências naturais.
• Problemas e temas da Psicologia passam a ser estudados também pela Fisiologia, Neuroanatomia e Neurofisiologia para se compreender: o psiquismo é preciso compreender os mecanismos e o funcionamento do cérebro. 
Uma das questões filosóficas centrais: “É possível obter um conhecimento seguro/verdadeiro do mundo?”
RACIONALISMO: RENÉ DESCARTES (1596 – 1650)
Descartes foi educado na tradição escolástica, mas, logo começou a questioná-la. 
Dúvida como método: 
o Deve-se questionar tudo. 
o A única coisa sobre a qual não posso duvidar é de que sou eu quem duvida: “Percebi que, enquanto eu desejava pensar que tudo era falso, era necessariamente verdadeiro que eu, que assim pensava, era algo. Desde que esta verdade, “penso, logo, existo”, era tão firme e certa que nem as mais extravagantes suposições dos céticos poderiam abalá-la, julguei ter segurança em poder aceitá-la como o primeiro princípio da filosofia que buscava.” (DESCARTES)
• Racionalista: a verdade só pode advir do uso cuidadoso da razão.
Livro em que descreve as 4 regras básicas para se atingir a verdade sobre um tema: 
1. Não aceitar nada como verdadeiro a menos que se apresente de modo tão claro à mente que não deixe razão para a dúvida. 
2. Analisar os problemas reduzindo-os a seus elementos fundamentais. 
3. Trabalhar sistematicamente indo do mais simples ao mais complexo desses elementos. 
4. Revisar cuidadosamente as conclusões para ter certeza que não omitiu nada. Regras revolucionárias, pois, questionavam o poder da autoridade: só se chega à verdade através da lucidez do próprio raciocínio. 
• Dualista: animais consistem apenas de corpo, o homem possui corpo e mente. 
• Mecanicista: corpo humano funciona como uma máquina complexa. 
• Interacionista: corpo e mente interagem e se afetam mutuamente.
A interação mente – corpo:
• Nervos: pequenos tubos, que procedem do cérebro, por onde circulam os espíritos animais. 
• Espíritos animais (noção que remonta aos antigos gregos): 
o Força responsável por todos os movimentos do corpo. 
o Provém do calor do sangue. 
o São minúsculas partículas, sempre em movimento, encontradas no cérebro, nos nervos e nos músculos.
“[...] dois são os nossos olhos, duas as mãos, duas as orelhas e, finalmente, todos os órgãos de nossos sentidos externos são dúplices. E dado que pensamos apenas um único pensamento acerca de uma determinada coisa num determinado momento, deve necessariamente haver um lugar onde as duas imagens que se nos apresentam através de nossos dois olhos, onde as duas outras impressões procedentes de um único objeto, através dos órgãos duplos dos sentidos, possam unir-se antes de chegar à alma, a fim de não lhe representar dois objetos, em vez de um só.” (DESCARTES)
Glândula pineal: local da interação entre corpo e mente porque... 
o Localização estratégica (no meio da massa encefálica): permite o controle do fluxo dos espíritos animais. 
o É unitária, ou seja, não existe em ambos os lados do cérebro: como a mente (ou alma) é unitária, só pode exercer seus efeitos através de uma estrutura unitária.
• Existem ações deliberadas da mente, ou seja, ela intervém entre a sensação e a reação motora, iniciando o movimento dos espíritos animais no cérebro e ativando os nervos que controlam os movimentos do corpo.
• Não usou o termo reflexo, mas, afirmou que certos músculos podem mover-se automaticamente em reação à certas sensações. 
Exemplo: 
o O fogo toca o pé, causando um puxão nos filamentos do nervo ali existente. Esses filamentos se estendem até o cérebro, onde os espíritos animais são liberados no “tubo” do nervo. 
o Os espíritos são transportados “em parte, para os músculos que retiram o pé do fogo; em parte, para os que fazem os olhos e a cabeça voltarem-se para contemplá-lo e, em parte, para aqueles que servem para levar as mãos à frente e dobrar o corpo para proteger-se”. (DESCARTES, 1637).
Importância para a Psicologia 
o Não resolveu o problema mente-corpo, mas, ao tentar explicá-lo, criou o conceito de ato reflexo; 
o Usando o método fisiológico, buscou explicar outros conceitos psicológicos, como o de memória; 
o Tirou a atenção do estudo da alma para enfocar o estudo da mente, das operações mentais.
EMPIRISMO INGLÊS
• Nosso conhecimento do mundo é construído a partir das experiências que nele vivemos. 
• Esse conhecimento é tecido a partir das associações entre nossas idéias: o empirismo está estreitamente ligado às doutrinas do associacionismo. 
- As questões eram: 
• Como a experiência cria o conhecimento? 
• Como as regras da associação funcionam para organizar esse conhecimento?
Raízes do empirismo inglês estão nas ideias de Francis Bacon e Thomas Hobbes.
FRANCIS BACON (1561- 1626) 
“A verdade é filha do tempo, não da autoridade”. 
“Não se aprende bem a não ser pela experiência”. 
“Só se pode vencer a natureza obedecendo-lhe”.
• A razão, deixada em total liberdade, pode se tornar tão delirante que nada do que produza seja digno de crédito. 
• É preciso dar à razão uma base na experiência dos sentidos, na percepção, desde que, usando o método adequado, se purifique a percepção dos erros e ilusões a que está submetida no cotidiano. 
• Para vencer a natureza é preciso obedecer e para obedecer é preciso disciplinar a mente, eliminar todos os “subjetivismos”.
THOMAS HOBBES (1588 – 1679) 
“O medo dos poderes invisíveis, inventados ou imaginados a partir de relatos, chama-se religião”. 
“O homem é o lobo do homem, em guerra de todos contra todos”. 
“Pactos sem espada são poderes sem força para defender pessoas”.
• Segue Aristóteles: conhecimento se funda na experiência sensível. 
• Visão materialista do homem: o homem resume-se a um corpo; o entendimento e a razão têm fundamento físico. 
• Enquanto corpo que é, o homem é naturalmente egoísta, anti-social, busca a autopreservação, age buscando o prazer e evitar a dor. 
• Convivência social só é possível através de um pacto que precisa ser garantido por um poder despótico. 
• Suas idéias fundamentam o conceito de natureza humana egoísta e interesseira deFreud. 
JOHN LOCKE (1603 – 1704) 
"Os homens são bons ou maus, úteis ou inúteis, graças a sua educação“. 
"Um espírito são em um corpo são é uma descrição breve, porém completa, de um estado feliz neste mundo".
• Sua preocupação era compreender como a mente adquire conhecimento. 
• Não existem idéias inatas: o homem ao nascer é uma folha em branco. 
• Todas as nossas idéias são fruto da aprendizagem.
• O desenvolvimento da mente acontece pelo acúmulo de experiências sensoriais e estas podem ser de 2 tipos: 
o Derivadas das sensações provocadas por estímulos externos. 
o Derivadas da reflexão, ou seja, do funcionamento da própria mente 
• Mas, para que a reflexão acorra é preciso que antes tenha havido a experiência sensorial 
• O sujeito precisa ter guardado um número significativo de impressões sensoriais para que a mente se torne apta a refletir. 
• Na reflexão, o indivíduo recorda impressões sensoriais passadas, rearranjadas em novas formas e esse movimento gera ideias.
• Algumas idéias sobre educação: o Crianças aprendem fazendo as coisas repetidamente, praticando. 
o Castigos são condenáveis 
o Reprovação e aprovação dos pais (reforço secundário) são mais adequadas que recompensas materiais. 
• Determinismo ambiental e essas idéias sobre educação estão na base do Behaviorismo.
ASSOCIACIONISMO 
JOHN STUART MILL (1806 – 1873) 
"Aprendi a procurar a felicidade limitando os desejos, em vez de tentar satisfazê-los.” “Conservadores não são necessariamente estúpidos, mas a maioria das pessoas estúpidas são conservadoras”.
• Para compreender como as ideias se uniam e se guiavam umas às outras e como se tornavam estáveis e duradouras, retomou os princípios de associação propostos por Aristóteles: contiguidade, semelhança e contraste. 
• Ideias complexas não resultam apenas da soma de ideias simples, mas, do modo como estas se combinam (Gestalt: o todo é mais que a soma de suas partes).
Preocupado em conferir cientificidade à Psicologia, propôs métodos de aplicação da lógica indutiva para estudo das questões psicológicas: 
Método da Concordância: 
• Procura-se um elemento comum em várias ocorrências de um fenômeno. 
• “Se X, então, Y”. (ex: gene X é suficiente para que se tenha depressão) 
Método da Diferença 
• Buscam-se provas de que a ausência de um efeito seja sempre acompanhada pela presença de uma causa proposta. 
• “Se não X, não Y”. (ex: gene X é necessário para que se tenha depressão)
Método Conjunto 
• Junção dos dois métodos anteriores. 
• Tem a possibilidade de identificar causas, dentro dos limites da indução (ou seja, nunca se poderá estudar todos os casos). 
- A lógica dos métodos da concordância e da diferença subjaz ao emprego atual do método experimental em Psicologia, sendo o método da concordância correspondente a um grupo experimental, e o da diferença, a um grupo de controle.
Variação Concomitante 
• Subjaz ao método correlacional. 
• Busca-se determinar se as alterações em X se associam às alterações previsíveis em Y. Métodos e princípios do Associacionismo foram levados por Wundt e Helmholtz para a Alemanha e se tornaram parte consistente da Psicologia Científica.
FONTES: 
• FIGUEIREDO, Luís Cláudio M. e SANTI, Pedro Luiz Ribeiro de. Psicologia: uma nova introdução, São Paulo: EDUC, 2003. 
• FREIRE, Izabel R. Raízes da Psicologia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. 
• GOODWIN, C. James. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cultrix, 2005.

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