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Social construction: entering the dialogue by Kenneth J. Gergen and Mary Gergen. 
Copyright © 2004 by Kenneth J. Gergen e Mary Gergen. 
Direitos de tradução em português licenciados pelo editor em língua inglesa, Taos Institute 
Publications
Publicado por Taos Institute em 2004
www.taosinstitute.net
Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida – em qualquer meio ou forma, 
seja digital, fotocópia, gravação etc – nem apropriada ou estocada em banco de dados, 
sem a autorização dos detentores dos direitos autorais.
Produção editorial
Anna Carla Ferreira
Copidesque
Leonora Corsini
Revisão
Paulo Henriques
Capa
Ilustrarte Design e Produção Editorial
Editoração eletrônica
Abreu’s System
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE 
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
G317c
 
Gergen, Kenneth J. 
Construcionismo social: um convite ao diálogo / Kenneth J. 
Gergen e Mary Gergen; tradução Gabriel Fairman. - Rio de 
Janeiro: Instituto Noos, 2010. 
 
Tradução de: Social construction: entering the dialogue 
,QFOXL�ELEOLRJUD¿D
ISBN 978-85-86132-14-8
 
1. Percepção social. 2. Psicologia social. 3. Ciências sociais 
��)LORVR¿D�����,QWHUDomR�VRFLDO��,��*HUJHQ��0DU\�0����������,��
Título. 
 
10-4394 CDD: 155.91 
021461 CDU: 159.942.6
Sumário
Por uma apresentação dialogada .............................................7
Capítulo 1 – O cenário da construção social ........................17
Capítulo 2 – Da crítica à reconstrução ..................................35
Capítulo 3 – Construção social e prática pro!ssional ..........55
Capítulo 4 – A pesquisa como prática de construção ............79
Capítulo 5 – Da crítica à colaboração ....................................99
Referências bibliográ!cas ....................................................112
7
Por uma apresentação dialogada: 
Suspendendo as grandes narrativas para a construção 
de novas práticas
1992 – Conhecer Kenneth Gergen foi um evento transforma-
dor em nossos estudos de família quando buscávamos o entendi-
mento das mudanças pelas quais passava o paradigma sistêmico 
na ocasião. Nosso primeiro contato foi o livro El Yo Saturado. 
Desde suas primeiras páginas, o desa!o de suas ideias – múltiplos 
selves – vinha acompanhado pelo nosso fascínio por um cenário 
teórico que dava sentido às experiências pessoais daquele mo-
mento: nossa saturação diante dos avanços tecnológicos!
Desde então, aceitamos o convite para conhecer melhor o 
Construcionismo Social, capaz de articular descrições teóricas à 
nossa experiência cotidiana. Do pessoal ao pro!ssional, logo pu-
demos sentir o quão útil seria esse caminho. 
Da Terapia Familiar ao campo de resolução de con"itos – Me-
diação Transformativa e Justiça Restaurativa, a presença de seu 
“Diálogo Transformador” é notável e fundamental. Igualmente 
importantes são as noções de “autorre"exividade”, “responsabi-
lidade relacional”, “cocriação de realidades”, necessárias na con-
sideração de mundos sociais construídos por nós mesmos, em 
nossas relações mútuas e nossa sociedade. 
Quando ampliamos o foco de nossa prática pro!ssional para 
a capacitação de agentes de mudança em projetos de implantação 
de novas práticas, as ações conversacionais constitutivas de rela-
ções e realidades redobram sua importância. Há um efeito em-
poderador do indivíduo quando este se percebe ator e autor de 
mudança do mundo em que vive e que deseja mudar; quando se 
dá conta de que nossas descrições linguísticas nos implicam em 
uma, e não em outra, forma de estar no mundo. 
Construcionismo Social
8
Nesse contexto de capacitações de processos transformativos 
onde partilhamos a crença de que “para acender uma lâmpada, 
basta saber como ligar o interruptor; porém, sabendo como fun-
ciona uma lâmpada, pode-se fazer in!nitas outras coisas, além de 
acendê-la”, é onde mais temos sentido falta de textos construcio-
nistas que nos ajudem a potencializar esse processo de empode-
ramento do indivíduo e de disseminação de novas práticas. 
Nesse sentido, este livro de Kenneth e Mary Gergen é mais 
uma expressão de seus esforços constantes de “unir a teoria à prá-
tica de forma que dê vitalidade àquela e inteligibilidade a esta”. 
Em forma e conteúdo, o Construcionismo Social é apresentado 
como uma práxis, uma maneira de ser, uma forma de estar no 
mundo, cativando o leitor no diálogo que inaugura sutilmente. 
Seu valor é inestimável por ser uma forma de acesso ao conheci-
mento para aqueles que se aproximam e desejam ampliar o po-
tencial transformador experienciado no processo de aprendiza-
gem de novas práticas.
Vania Curi Yazbek 
Nos últimos dezesseis anos tenho me dedicado a dirigir uma 
organização sem !ns lucrativos na cidade do Rio de Janeiro, o 
Instituto Noos. Constituído por pro!ssionais das ciências sociais, 
humanas e da saúde, o Noos busca metodologias que promovam 
a saúde das relações familiares e comunitárias e as difunde. Tra-
balhamos com terapia de família, terapia comunitária, grupos re-
"exivos de gênero e outras práticas sociais que contribuam para a 
dissolução pací!ca de con"itos familiares e comunitários. 
Desde o início de nossas atividades adotamos uma aborda-
gem relacional sistêmica, no que entendemos ser sua vertente 
construcionista social. Percebemos, no início do nosso percurso, 
Por uma apresentação dialogada
9
que essa abordagem poderia contribuir, de forma intensa e dife-
renciada, para a construção de soluções alternativas nas áreas de 
atenção em saúde mental, desenvolvimento comunitário e social 
e garantia de direitos.
Os problemas enfrentados nessas áreas costumam ser com-
plexos, entendidos como aqueles que possuem múltiplos fatores 
desencadeadores, onde muitas vezes não se consegue delimitar 
com precisão nem mesmo se pertencem à esfera da saúde ou se 
são provenientes das desigualdades econômicas e sociais. Além 
disso, as soluções predominantes costumam vir de fora do gru-
po que vive o problema, impostas por especialistas, a partir de 
um saber cientí!co e acadêmico, deixando, quase sempre, de 
escutar aqueles que vivem a situação que se pretende mudar. 
No Noos, privilegiamos as metodologias participativas e cola-
borativas, que, preferencialmente, utilizem equipes transdisci-
plinares. Acreditamos que as soluções assim construídas serão 
mais abrangentes e, cada participante, seu coautor. Desta forma, 
ganham muito mais chances de serem de fato adotadas e seus 
efeitos perdurarem. 
Apesar do longo tempo de experiência e dos resultados com-
provados, ainda precisamos de subsídios que nos auxiliem na 
difusão teórica do que fazemos. Este livro de Kenneth e Mary 
Gergen contribuirá inequivocamente para enfrentarmos este de-
sa!o, pois, de maneira clara, consegue levar aos leitores, estudan-
tes, pro!ssionais ou curiosos, os fundamentos do construcionis-
mo social, a diversidade de suas aplicações e responder às críticas 
mais comuns que recebemos cotidianamente de nossos pares. E, 
além disso, demonstra o alcance de uma abordagem nova, esti-
mulante e revolucionária.
Carlos Eduardo Zuma
Construcionismo Social
10
O cenário do nosso sistema de saúde se apresenta atualmen-
te bastante focado num esforço de re-organizar suas práticas de 
saúde, com diretrizes que favorecem o desenvolvimento de ações 
mais interativas, horizontais, inclusivas e corresponsáveis. No 
entanto, a forma biologizante, dualista e hierárquica com que o 
sistema de saúde funcionou por muito tempo, tem tornado difícil 
uma mudança nas suas tradicionais práticas, apontando, assim, 
a necessidade de produção de novos conhecimentos na área, que 
apoiem e sustentem tais transformações.
Falando do lugar de psicóloga e pesquisadora inserida na Saú-
de Coletiva e sobretudo interessada nas práticas do cuidado que 
aí se desdobram, particularmente acredito queeste livro possa 
trazer contribuições especiais na compreensão desses novos dis-
cursos propostos na saúde, dando sustentação a eles e legitimida-
de na criação de práticas mais dialógicas. 
O livro descreve com simplicidade e seriedade a importância 
das interações humanas, da responsividade e da coordenação en-
tre as pessoas na produção dos sentidos e das ações no mundo, 
num discurso que tem em sua inteligibilidade a construção dia-
lógica e compartilhada de nossa realidade social. Traz também 
ideias que rompem com o entendimento tradicional do que é ci-
ência, linguagem e identidade. Ao discutirem esses temas como 
produtos de uma construção social, os autores ampliam as pos-
sibilidades de composição de práticas mais progressistas, fortale-
cendo e sustentando a importância do processo de se relacionar. 
Este livro é uma oportunidade para os pro!ssionais de saúde, 
ávidos por novos entendimentos que sustentem novas práticas 
na área, se aproximarem de uma teoria relacional que faz mais 
sentido dentro da proposta atual do sistema de saúde brasileiro. 
Uma oportunidade de entrarem em contato com uma metodolo-
Por uma apresentação dialogada
11
gia que embase e legitime as ideias de corresponsabilidade, coo-
peração, interação e contexto. Uma oportunidade de re!etirem 
sobre o signi"cado da construção social e relacional das ações 
no mundo e suas implicações, compreendendo a importância e 
a complexidade de um diálogo, da interação e do vínculo entre 
pro"ssional de saúde-usuário, que muitas vezes "ca colocado em 
segundo plano em relação a procedimentos técnicos.
A proposta construcionista social apresentada neste livro 
aponta também que não se trata de acabar com protocolos e téc-
nicas, mas também de convidar a pensar todas essas ferramen-
tas como socialmente construídas, dentro de uma lógica e de um 
tempo especí"co. E, por terem sido construídas num determi-
nado momento histórico, podem ser desconstruídas e recons-
truídas caso não estejam sendo úteis para determinada função. 
Neste processo de reconstrução, nada mais potente do que pôr as 
pes soas juntas para o diálogo, para a re!exividade e para a cons-
trução de formas de trabalho que possam ser mais produtivas, 
e"cazes e prazerosas.
Celiane Camargo-Borges
Este livro é um presente para todos os construcionistas bra-
sileiros. Há muito se aguardava a tradução das obras dos Gergen 
para o português. Pois ela chegou da melhor forma! Com um tex-
to claro e abrangente, este livro honra seu título e possibilita o 
início de um diálogo sobre a construção social.
A maneira simples e didática, recheada por vários exemplos, 
tem um forte apelo, facilitando o diálogo sobre as contribuições 
radicais deste jeito de pensar o mundo. A obra é uma síntese 
preciosa sobre as principais dimensões do movimento constru-
cionista e suas implicações para a prática pro"ssional, seja nos 
Construcionismo Social
12
campos da psicoterapia, do desenvolvimento organizacional, da 
educação, da resolução de con!itos e da pesquisa. 
Os pro"ssionais comprometidos com o desenvolvimento co-
munitário encontrarão no livro ferramentas úteis para sua atua-
ção. Ao enfatizar a análise da construção e das consequências dos 
discursos, ele mostra a possibilidade – e, por vezes, a necessidade 
– de mudança destes discursos, rumo a uma sociedade voltada ao 
bem comum. Além disso, ao apontar a importância de buscar-
mos alternativas ao discurso individualista, ele contribui para o 
fortalecimento do trabalho com famílias, grupos e comunidades.
No contexto acadêmico, esta obra permite a pesquisadores em 
ciências sociais e humanas a expansão das sensibilidades críticas, 
ao mesmo tempo em que faz reconhecer os limites das mesmas. 
Desta forma, substitui a crítica antagonista pelo diálogo, levando 
a uma valorização da pluralidade, abrindo espaço para a constru-
ção do mundo de maneira colaborativa.
Para além do campo pro"ssional, este texto pode ser útil a di-
ferentes públicos. Ele convida a novas formas de relação inter-
pessoal, à ampliação das possibilidades de signi"cação, à conver-
gência entre domínios de signi"cados divergentes, diminuindo 
os con!itos e promovendo a convivência humana. 
Simples em sua apresentação e revolucionário em sua propos-
ta, o livro mostra como podemos construir uma vida marcada 
pela ousadia e esperança. Ele já nasce sendo um clássico da lite-
ratura da área no Brasil!
Emerson Rasera
Para mim, este livro é um presente inestimável. 
Eloquente e coloquial, complexo e humilde, poderoso e res-
peitoso.
Por uma apresentação dialogada
13
Um convite ímpar para um diálogo sobre ideias que, de tão 
eloquentes, viram do avesso nossas formas mais habituais de pen-
sar e viver o mundo e nós mesmos. Mas também é um convite 
que, por sua linguagem quase coloquial, inclui a todos. Não é pre-
ciso estar familiarizado com grandes teorizações nem interessado 
nelas para ser bem-vindo a este diálogo. Basta !car curioso para 
conhecer um modo de falar de nós, humanos, como autores e res-
ponsáveis pelo que gostamos e pelo que abominamos, no mundo 
em que vivemos.
Ele é complexo porque complexas são as tramas que nos cons-
tituem. Tão complexas que não é fácil conversar sobre nossas 
verdades. Tramas que nos fazem acreditar que nossas verdades 
(pessoais e pro!ssionais) são melhores que as das outras pessoas. 
E nos fazem sentir que estamos fazendo o melhor quando bus-
camos fazer os outros compartilharem dessas nossas verdades 
“melhores”. Mas, também é humilde porque não se outorga o pri-
vilégio de uma verdade superior. Ao contrário, é um convite para 
legitimar muitas verdades e construir com elas uma vida humana 
mais plural. Uma vida humana onde não caibam práticas sociais 
que trabalhem a favor da dominação de um segmento cultural 
em detrimento de outro.
Ele é um convite poderoso porque poderosas são as ideias 
que nos tiram do lugar (já não tão cômodo) de indivíduo-centro-
-do-mundo. Ideias que nos convidam a prestar mais atenção ao 
modo como nós, humanos, coordenamos nossas ações no mun-
do, e como com nossas relações criamos e sustentamos as reali-
dades em que vivemos. Poderoso pelo paradoxo em que ele nos 
coloca: como humanos podemos tudo, mas sozinhos não pode-
mos nada. Mas é também respeitoso porque reconhece e chama 
para o diá logo as vozes de tantos outros movimentos culturais do 
Construcionismo Social
14
mundo contemporâneo que com ele compartilham da fertilidade 
na construção de futuros possíveis e desejáveis.
Deixe-me explicar melhor de que lugar eu falo. Durante mui-
tos anos trabalhando nos meios acadêmicos, a eloquência, a 
complexidade e o poder do discurso construcionista social foram 
fundamentais para o meu desejo de compartilhar essas ideias. 
Agora, fora da universidade, sinto-me desa!ada a aprender uma 
nova retórica para promover diálogos com pro!ssionais que es-
tão, antes de tudo, seriamente comprometidos em fazer melhor 
o que de melhor já sabem fazer (médicos, advogados, psicólogos, 
assistentes sociais, empresários, administradores, gestores de 
equipes, educadores). Sem deixar de ser denso e transformador, 
o diálogo coloquial, humilde e respeitoso deste livro é, para mim, 
um presente inestimável – daqueles presentes que te chegam no 
tamanho certo e na hora exata. 
Marisa Japur
“Desaprender 8 horas por dia ensina os princípios”
(Manoel de Barros)
Neste livro, Ken e Mary Gergen desenvolvem uma tradu-
ção didática e objetiva do conjunto complexo e revolucionário 
de ideias que compõem o campo da Construção Social. Dando 
ênfase aos processos relacionais a partir dos quais produzimos 
conhecimento sobre o mundo e sobre nós mesmos, os autores 
apresentam uma nova forma de inteligibilidade, que nos tira da 
posição confortável de conhecedores da Verdade e nos compro-
mete com a tarefa de assumir responsabilidadena construção das 
verdades a partir das quais organizamos nossas vidas e relaciona-
mentos. Enfatizando o caráter relacional e situado das realidades 
Por uma apresentação dialogada
15
que criamos em nossas práticas discursivas, os autores nos con-
vidam a assumir participação ativa na construção de um mundo 
mais !exível e plural. 
Assim, este livro tem sido um grande aliado em minha prática 
pro"ssional, sobretudo em minha atuação como pesquisadora, 
terapeuta de família e facilitadora de grupos. Embora pareça na-
tural que o trabalho com famílias e grupos seja necessariamen-
te investido de uma “perspectiva relacional”, esse tipo de práti-
ca ainda se encontra marcada por uma visão estática de família 
(que busca investigar estruturas, papéis e modelos normativos de 
comportamento) e de grupo (que busca de"nir estágios e fases 
de desenvolvimento). Em ambos os casos, prevalece o olhar de 
um terapeuta / coordenador que, do lugar de especialista, busca 
desvendar os jogos e os papéis que as pessoas supostamente de-
sempenham em suas relações. 
Apesar da força dessas teorias de família e de grupo no mun-
do acadêmico, tenho buscado exercer novas posições em minha 
prática pro"ssional, entendendo que trabalhar com famílias ou 
com grupos signi"ca investir na construção de espaços dialógicos 
menos hierárquicos, em que as pessoas sejam efetivamente con-
sideradas como participantes de um processo colaborativo de ne-
gociação de signi"cados. Essa visão construcionista traz também 
para o trabalho com famílias e grupos o compromisso ético com 
a análise dos efeitos de determinadas narrativas na legitimação de 
formas de vida e, assim, cria oportunidade para, num exercício 
colaborativo, investirmos na construção de novas histórias, ricas 
em recursos e potencialidades. 
Ao participarem desse tipo de prática, todos – pro"ssionais, 
familiares ou participantes de grupos – aprendemos que a solu-
ção para os dilemas humanos não reside em descobertas "nais, 
Construcionismo Social
16
objetivas e essenciais, mas em construções conjuntas de pesso-
as em diálogo que, deixando as grandes narrativas em suspenso, 
“desaprendem” e, assim, podem criar novos princípios... 
Carla Guanaes
17
Capítulo 1 
 
 
O cenário da 
construção social 
Uma dramática transformação vem tendo lugar no mundo das 
ideias, e, por toda parte, as tradições estão sendo questionadas. 
Aumenta a incerteza em relação aos padrões universais e o!ciais 
de verdade, objetividade, racionalidade, progresso e moralidade. 
Enquanto a insegurança bate incessantemente à porta, questio-
na-se a fé em todo lugar. Entretanto, dessa situação tumultuada 
emergem novos diálogos e novas vozes de esperança para a exis-
tência humana. São conversações que cruzam continentes e cul-
turas, fazendo-se acompanhar de um grande número de novas 
práticas pro!ssionais – nas organizações, na educação, na tera-
pia, na pesquisa e na assistência social, no aconselhamento, na 
resolução de con"itos, no desenvolvimento da comunidade e em 
muitas outras áreas.
Vários nomes já foram atribuídos a essa revolução de pensa-
mento e de práticas, sendo frequentes denominações como “pós-
-fundamentalismo”, “pós-empirismo”, “pós-iluminismo” e “pós-
-modernismo”. Entretanto, entremeada em todos os debates está 
a noção da “construção social” ou seja, a criação de sentido atra-
vés de nossas atividades colaborativas. A construção social não 
é de autoria de um único indivíduo ou grupo, nem tampouco 
exclusiva e uni!cada; ela pressupõe um signi!cativo comparti-
lhamento entre diferentes comunidades. Os contrastes, tensões e 
incertezas não intimidam, uma vez que a tentativa de estabelecer 
Construcionismo Social
18
uma verdade de!nitiva, uma lógica fundante, um código de va-
lores ou uma lista de práticas seria algo absolutamente contrário 
ao desenvolvimento das ideias defendidas pelos construcionistas 
sociais.
Nós, os autores, ocupamo-nos durante a maior parte de nossas 
carreiras pro!ssionais com diálogos construcionistas, e a intenção 
deste livro é apresentar um relato que permita que alunos, colegas 
e pro!ssionais, ou mesmo aquelas pessoas que são apenas curio-
sas, obtenham um conhecimento básico e avaliem o poder e a for-
ça dessas ideias. Nos dois primeiros capítulos serão delineados al-
guns dos mais importantes desenvolvimentos teóricos, e, a seguir, 
analisaremos o impacto dessas ideias na maneira como vivemos e 
trabalhamos. Nosso foco será as ideias construcionistas em ação, 
seja nas organizações, na psicoterapia, na educação, na resolução 
de con"itos, na pesquisa social ou na vida cotidiana. E também 
trataremos das críticas comumente feitas ao construcionismo.*
A ideia básica: nós construímos o mundo
Embora o construcionismo social se baseie numa ideia maior, 
simples e clara, observamos que, à medida que desvendamos 
suas implicações e consequências, esta simplicidade rapidamen-
te se desfaz. Isto porque esta ideia básica faz com que tenhamos 
que repensar praticamente tudo que nos ensinaram a respeito do 
mundo e de nós mesmos. Ao repensar esses conhecimentos, so-
mos convidados a novas e instigantes formas de ação.
* O termo “construtivismo” é frequentemente tomado como equivalente a “construcionismo”. O 
construtivismo entende que o locus de construção do mundo está dentro da mente ou no inte-
rior do indivíduo. Embora existam certos pontos em comum entre este movimento e o constru-
cionismo social, no presente trabalho empregaremos exclusivamente o termo “construcionis-
mo” para enfatizar a importância atribuída não aos indivíduos, mas às relações, como o locus 
de construção do mundo. (N.R.)
O cenário da construção social 
19
Para terem uma ideia das possibilidades, considerem o co-
nhecimento do senso comum. O que seria mais óbvio do que o 
fato de o mundo estar simplesmente lá fora para que possamos 
observá-lo e entendê-lo? Existem árvores, edifícios, automóveis, 
mulheres, homens, cães e gatos, e assim por diante. Se observar-
mos com atenção, podemos aprender como proteger as !orestas, 
como construir edifícios sólidos e como melhorar a saúde das 
crianças. Agora, vamos virar essas hipóteses con"áveis de cabeça 
para baixo. 
Vamos supor que a"rmássemos que árvores, edifícios, mulhe-
res, homens etc. não existem, até sermos "nalmente convencidos 
que, sim, eles existem. “Bobagem”, vocês diriam. “Olhem ao seu 
redor! Tudo isso já estava aí muito antes de chegarmos!” Parece 
fazer sentido, mas e se convidássemos a pequena Julie, que tem 
um ano de idade, para dar uma volta? Seu olhar vagueia para além 
das árvores, dos edifícios e dos automóveis e ela parece não ser 
capaz de distinguir homens de mulheres. William James a"rmou 
certa vez que o mundo de uma criança é uma “confusão crescente 
e ativa”. Você poderá concordar ou não, mas o mundo de Julie não 
parece ser o mesmo mundo no qual nós, adultos, vivemos. Dife-
rentemente de Julie, percebemos as folhas de outono que mudam 
do verde para o dourado; vemos que a casa à nossa esquerda foi 
construída em estilo vitoriano, que o automóvel passando na rua 
é uma BMW, e que a mulher de pé junto à porta é, na realidade, 
um travesti. O que chega aos nossos olhos pode não ser diferente 
do que Julie vê, mas o signi"cado deste mundo para nós é bem 
diferente. Nós construímos o mundo de forma diferente, e esta 
diferença encontra-se enraizada em nossas relações sociais, a par-
tir das quais o mundo se tornou o que é. 
Construcionismo Social
20
diferentes “vocês” a partir de diferentes pontos de vista
Agora, vamos tomar você, leitor, como objeto da nossa aula: quem é 
você e o que você faz? Imagine-se de pé, diante de um grande grupo 
de pessoas com os mais variados estilos de vida, oriundas de diferen-
tes regiões do mundo. Cada pessoa olhará para você e dirá o que vê 
diante de si, podendoresultar em algo assim:
Para um Você é
Biólogo “um mamífero”
Cabeleireiro “corte do ano passado”
Professor “alguém que tem potencial”
Homossexual “heterossexual”
Cristão fundamentalista “um pecador”
Pai/ Mãe “um sucesso surpreendente”
Artista “um excelente modelo”
Psicólogo “ligeiramente neurótico”
Físico “uma composição atômica”
Banqueiro “um futuro cliente”
Médico “um hipocondríaco”
Hindu “estado imperfeito de Atman”
Amante “uma pessoa maravilhosa”
Ifaluquiano* “cheio de liget”
Se não houvesse ninguém para identi!cá-lo, quem você seria nesse 
caso? Será que você realmente seria algo?
A ideia fundante da construção social parece bem simples, mas, 
ao mesmo tempo, é profunda. Tudo que consideramos real é resulta-
do de uma construção social. Ou seja, de maneira mais contundente, 
Nada é real, a menos que as pessoas concordem que assim o seja.*
* Habitante de Ifaluk, um atol de corais nas Ilhas Cardinas, pertencentes aos Estados Federados 
FC�/KETQPÃUKC��0C�NÈPIWC�FQU�JCDKVCPVGU�FG�N¶��ő.KIGVő�UKIPKſEC�TCKXC��
O cenário da construção social 
21
Sua voz cética poderia replicar: “Quer dizer que a morte não é 
real?”, ou “o corpo?”, ou “o Sol?”, ou “esta cadeira?”... A lista é in!-
nita. É preciso ter muita clareza quanto a este ponto: os constru-
cionistas sociais não dizem “não existe nada”, ou “não há realida-
de”; a questão importante é que quando as pessoas de!nem o que 
é “realidade”, sempre falam a partir de uma tradição cultural. Sem 
dúvida, alguma coisa aconteceu, mas, para descrever este fato, é 
necessário que o mesmo seja representado a partir de um ponto 
de vista cultural particular — numa linguagem particular ou por 
intermédio de um meio visual ou oral particular. 
A título de ilustração, se dissermos “o pai dele morreu”, na 
maioria das vezes estaremos falando a partir de um ponto de 
vista biológico. Construímos o acontecimento como a cessação 
de determinada função corporal (muito embora até os médicos 
possam discordar quanto à de!nição de morte, pois um cirur-
gião especialista em transplantes pode ter uma opinião diferente 
da de um clínico geral). A partir de outras tradições, poderíamos 
ainda dizer “ele foi para o céu”, “ele viverá para sempre no cora-
ção dela”, “este é o começo de um novo ciclo de reencarnação”, 
“foi aliviado de seu fardo”, “viverá no legado de suas boas obras”, 
“sua vida terá continuidade em seus três !lhos”, ou “a compo-
sição atômica desse objeto foi alterada”. O que mais há para ser 
dito fora de qualquer convenção relativa ao entendimento? Para 
a pequena Julie, o acontecimento pode, de fato, não ser absolu-
tamente fora do comum. Para o construcionista, a questão não é 
“nada existe”, mas sim “nada existe para nós”, ou seja: é a partir 
das nossas relações que o mundo se faz preenchido com o que 
nós concebemos como “árvores”, “sol”, “corpos”, “cadeiras” e as-
sim por diante.
Construcionismo Social
22
Num sentido mais amplo, podemos dizer que, ao nos comuni-
carmos uns com os outros, construímos o mundo no qual vivemos 
e, se mantivermos nossas tradições, a vida poderá prosseguir como 
de costume. Desde que façamos as distinções que nos são familiares, 
como, por exemplo, entre homens e mulheres, ricos e pobres, cul-
tos e ignorantes, a vida continuará sendo relativamente previsível. 
Entretanto, tudo aquilo que aceitamos como óbvio também pode 
ser questionado. Por exemplo, não existem “problemas” no mundo 
para que todos os vejam, mas, pelo contrário, construímos mundos 
“do bom” e consideramos “um problema” todos os acontecimentos 
que obstruam o caminho, impedindo-nos de alcançar aquilo que 
mais valorizamos. Será que tudo que construímos como “proble-
ma” não poderia ser reconstruído como “oportunidade”? Da mes-
ma forma, enquanto conversamos, poderíamos estar criando novos 
mundos. Poderíamos construir um mundo no qual existissem três 
gêneros, ou um mundo onde os “doentes mentais” fossem “heróis”, 
ou um mundo em que “o poder de todas as organizações repousasse 
não em líderes individuais, mas em relações”.
É neste ponto que você poderá começar a apreciar o enorme 
potencial das ideias construcionistas pois, para o construcionista, 
nossas ações não são limitadas por qualquer coisa tradicional-
mente aceita como verdadeira, racional ou correta. Diante de nós 
existe um amplo espectro de possibilidades, um convite in!nito à 
inovação, o que, entretanto, não quer dizer que devamos abando-
nar tudo aquilo que consideramos real e bom. De forma alguma. 
Quer dizer, sim, que não estamos presos aos grilhões da história 
ou da tradição. Ao conversar, ouça novas vozes, levante questões, 
avalie metáforas alternativas e brinque nas fronteiras da razão, 
porque, assim, atravessaremos o limiar dos novos mundos de sig-
ni!cado. O futuro é nosso para que o criemos... juntos.
O cenário da construção social 
23
envelhecimento positivo: um estudo de caso
É comum vermos o envelhecimento como um período de declínio: 
entendemos que a infância é um período de desenvolvimento, na 
fase adulta atingimos a maturidade e, na terceira idade, a vida entra 
em declínio. Considere essa construção bastante comum: vivemos a 
nossa idade adulta com pavor de envelhecer, procurando incansa-
velmente meios de “permanecer jovens” ou, pelo menos, de “parecer 
jovens”. Ser velho é ruim e para muitas pessoas a visão do declínio 
também é algo cuja previsão está fadada a se cumprir. “Estou !cando 
velho, preciso reduzir as atividades, exercícios e interesses” e, como 
resultado, o corpo e o entusiasmo pela vida enfraquecem.
Mas se o envelhecimento é uma construção social, por que deve-
ríamos sustentar esta compreensão negativa? Não existiriam manei-
ras que nos permitissem ver o envelhecimento como um processo 
positivo, um período de crescimento, enriquecimento e desenvolvi-
mento? Sentindo-nos desa!ados por essa possibilidade, criamos um 
boletim eletrônico intitulado “Envelhecimento Positivo” [Positive 
Aging]. Nele incluímos um variado material de pesquisa que destaca 
o potencial positivo do envelhecimento. Parece ter sido do agrado 
dos leitores em geral. Como declarou um leitor, “o boletim me per-
mitiu manter a esperança de que continuarei levando uma vida gra-
ti!cante por muito tempo”. 
Os workshops que realizamos com pessoas interessadas no en-
velhecimento positivo também foram extremamente esclarecedo-
res para nós. Desa!amos essas pessoas a reconstruírem os eventos 
mais temidos como, por exemplo, “declínio físico”, “doença crônica”, 
“perda da atratividade física” e “perda de entes queridos”. Os grupos 
foram, em geral, fantasticamente criativos, mostrando, por exem-
plo, que uma doença crônica também oferece oportunidade para se 
avaliar a importância das pessoas amadas, para aprender a ser pa-
ciente e tolerante, para deixar de lado as máscaras, para ter tempo 
de aprender, explorar e criar novas atividades (por exemplo, criar 
um site da família na Internet, participar de grupos de apoio e ajuda 
mútua, desenvolver uma nova habilidade ou escrever poemas). Eles 
nos ensinam que, juntos, podemos produzir novas realidades de en-
velhecimento.
Construcionismo Social
24
Dos jogos de linguagem aos mundos possíveis
A ideia básica do construcionismo social é, ao mesmo tempo, 
simples e desa!adora. Outras dimensões vão se revelando à 
medida que exploramos âmbitos mais amplos das ideias cons-
trucionistas. Começamos focalizando a linguagem, mas, como 
veremos, nossos interesses se ampliam rapidamente para incluir 
todas as formas de vida cultural. 
Linguagem: da imagem à prática
Por muito tempo consideramos a linguagem como uma for-
ma de imagem. Quando os cientistas fazem seus relatos acerca do 
mundo, supomos que suas palavras sejam o retrato !el de suas ob-
servações. Da mesma forma, procuramos noticiários que nos pro-
porcionem uma descrição precisa dos acontecimentos.Embora 
possa parecer óbvio, o simples processo de dar nomes às pessoas 
– Frank, Sally, Ben e Shawn – é bastante emblemático. Porque es-
ses indivíduos di!cilmente vieram ao mundo com seus crachás 
pendurados. Os pais lhes atribuíram esses nomes e, neste sentido, 
foram arbitrários. Exceto, talvez, por questão de tradição familiar, 
Frank poderia ter sido chamado de Ben, Robert, Donald ou rece-
ber qualquer outro nome. Mas, antes de tudo, por que lhes foi atri-
buído um nome? A principal razão é a praticidade. Se, por exem-
plo, precisarem falar a respeito do bem-estar de Sally, veri!car se 
ela está se alimentando bem, se é preciso trocar sua fralda, ou se 
seu irmãozinho Frank está com ciúmes, seus pais utilizam um 
nome para realizar essas tarefas típicas de bons pais e, mais tarde, 
precisarão do nome para outros !ns práticos, como matriculá-la 
na escola e perguntar a Sally por que chegou tão tarde em casa. De 
maneira geral, tanto as palavras que usamos como os nomes que 
O cenário da construção social 
25
atribuímos uns aos outros são usados para efetuar relações. Não 
são imagens do mundo, mas ações práticas no mundo.
Isto é fácil de entender no caso de expressões como “Pare!”, “Pe-
rigo!” ou “Jogue a bola!”, em que podemos ver como os nomes pró-
prios são úteis do ponto de vista social. Entretanto, já não !ca tão 
óbvio no caso de notícias, descrições cientí!cas ou quando se trata 
de contar a alguém como foi o seu dia; nestes casos, as palavras 
parecem funcionar como imagens e podem ser veri!cadas quanto 
à sua exatidão. Mas considere novamente: o fato de um relato pa-
recer ser “exato” ou não é algo que irá depender de uma tradição da 
comunidade (lembre-se do exemplo dos vários “vocês” no início do 
capítulo). Como cada tradição tem seus próprios critérios de juízo, 
acreditar ou não que uma testemunha esteja falando a verdade é 
algo que dependerá do fato de ela utilizar ou não a mesma forma de 
linguagem que usamos. Se os incorporadores estão promovendo o 
desenvolvimento e criando novos bairros ou destruindo espaços 
abertos é algo que depende do que cada um entende por “desen-
volver”. Neste sentido, “falar a verdade” é falar de uma forma que 
con!rme a tradição de uma determinada comunidade. 
Jogos de linguagem e os limites de nosso mundo
O famoso !lósofo Ludwig Wittgenstein introduziu a metáfora 
do jogo de linguagem, que permitiu mostrar como as palavras que 
usamos se encontram embutidas em sistemas de regras ou em con-
venções compartilhadas. Isto é algo que pode ser facilmente veri!-
cado no caso da Gramática, onde existem regras comuns que nos 
impedem de dizer “ela vai em praia” ou “bola bateu ele”. Contudo, 
em qualquer cultura existem muitos jogos de linguagem diferentes, 
ou seja, existem muitas convenções locais usadas para descrever e 
Construcionismo Social
26
explicar; uma vez que alguém faça parte de uma convenção local, 
sua liberdade de expressão !ca radicalmente limitada.
Por exemplo, no caso dos diferentes “vocês”, cada grupo se baseia 
em um jogo de linguagem diferente, uma vez que os biólogos se en-
contram mergulhados em jogos de linguagem diferentes dos jogos 
dos físicos, dos banqueiros ou dos sacerdotes. No momento em que 
precisam descrever “você”, cada um jogará fazendo uso de regras di-
ferentes, cada um criará um signi!cado em seu jogo. Porém, é arris-
cado invadir qualquer uma dessas culturas e fazer uso das próprias 
regras; di!cilmente você perguntaria a um biólogo sobre a alma de 
um sapo, ou pediria a um cabeleireiro a composição atômica de um 
!o de cabelo, sem que sua sanidade mental fosse posta em dúvida. 
Por outro lado, não estamos aqui tratando apenas das regras de 
linguagem, já que as palavras se encontram normalmente incor-
poradas às nossas atividades, na forma como nos movimentamos 
ou nos vestimos, ou mesmo nos objetos que carregamos e no que 
fazemos com eles. No jogo de xadrez, por exemplo, falamos em 
“peões”, “torres”, “xeque-mate” e assim por diante, mas ninguém 
sai na rua gritando “xeque-mate!” sem que as pessoas olhem de 
modo estranho. A frase só faz sentido quando as pessoas estão de-
sempenhando certas atividades especí!cas e fazendo uso de obje-
tos especí!cos. Isto também signi!ca que as palavras que usamos 
informam as pessoas sobre as ações que elas devem realizar. Se al-
guém aponta para um objeto e o chama de “cadeira”, você poderá 
se sentir à vontade para se sentar ali; mas se alguém chama este 
objeto de “antiguidade preciosa”, provavelmente você se sentará em 
outro lugar. Para o construcionista, somos convidados a uma dupla 
escuta: escuta do conteúdo, por um lado, e da importância, por 
outro. Nos termos de Wittgenstein, nossos “jogos de linguagem” 
O cenário da construção social 
27
encontram-se incorporados em padrões mais abrangentes de ati-
vidade, que o !lósofo chamou de formas de vida. De fato, biólogos, 
cabeleireiros e banqueiros estão engajados em diferentes formas de 
vida. As palavras ajudam a manter essas formas de vida, ao mesmo 
tempo em que as formas de vida conferem signi!cado às palavras. 
Concomitantemente, essas formas de vida começam a formar 
os limites de nossos mundos.
O real como o bom
Aprendemos a diferença entre fatos e valores. Que os fatos são 
“reais”, declarações de evidência, objetivos, não in"uenciados por 
desejos, políticas, religião e assim por diante. Em contraste, apren-
demos que os valores são frágeis e subjetivos, que não têm a menor 
base sólida e que representam simplesmente os investimentos parti-
culares do indivíduo. Todos deveríamos concordar com os fatos, em-
bora cada um tenha direito aos próprios valores. O construcionismo 
social desa!a esta distinção que vigorou durante muito tempo. 
Para uma apreciação do argumento, analise três manchetes 
de jornal que descrevem os acontecimentos no momento em 
que o regime iraquiano de Saddam Hussein entrou em colapso 
em 2003:
t� Tropas americanas vitoriosas em Bagdá
t� Império americano declara vitória no Iraque
t� Forças iraquianas se escondem enquanto americanos 
ocupam Bagdá
Cada uma dessas manchetes procura descrever “o que acon-
teceu no Iraque”, mas todas diferem signi!cativamente quanto às 
suas implicações dos acontecimentos. A primeira manchete, de 
um jornal americano, simplesmente considera os americanos vi-
toriosos e expressa sua autocongratulação. A segunda, re"etindo 
Construcionismo Social
28
o ponto de vista de um jornal brasileiro, usa o termo “Império” 
em tom irreverente, indicando que a vitória é apenas uma preten-
são e que o futuro pode se provar diferente. A última manchete, 
ecoando a visão de alguns países árabes, sugere que a “vitória” 
seria tão somente uma “ocupação” temporária e que as forças ira-
quianas estariam se escondendo em meio à população civil, pron-
tas para voltar após a partida das tropas americanas. 
Os eventos narrados podem ser idênticos, mas a descrição dos 
“fatos” depende da tradição segundo a qual cada um estiver escre-
vendo. Para o bem ou para o mal, cada tradição possui seus próprios 
valores e, neste sentido, não existem descrições isentas de valores.
Você poderá objetar e dizer que “inquestionavelmente os fatos 
das ciências naturais são neutros em termos de valores”. Mas ana-
lise mais uma vez: por que aceitamos como imparcial a ideia de 
que a ciência médica “cura” doenças? Isto ocorre porque, em geral, 
atribuímos valor a certas mudanças que os médicos ajudam a pro-
mover no corpo humano e este valor é representado pela palavra 
“cura”. Se alguém descrevesse os mesmos procedimentos médicos 
como “interferências nos processos da natureza”, consideraríamos 
tal declaração parcial. Da mesma forma, se você reduzir o mundo 
à linguagem da física, da química ou da biologia, a linguagem da 
“ação moral” deixará de existir. Se continuar falando exclusivamen-
te em termos cientí!cos,o lançamento de uma bomba atômica em 
Nagasaki ou a realização de experiências biológicas com prisionei-
ros nos campos de concentração deixarão de ser questões de “as-
sassinato” ou de “moral”, já que essas palavras são irrelevantes para 
a ciência como tal. Da mesma forma, forças militares podem atacar 
um país e simplesmente falar dos milhares de civis mortos como 
sendo um “dano colateral”. Certamente as ciências naturais pos-
O cenário da construção social 
29
suem valores, porque analisam dados de forma a permitir que as !-
nalidades de previsão e controle possam se cumprir; seus discursos 
estão atrelados a esses propósitos. Se alguém permanecer exclusi-
vamente no âmbito de uma determinada tradição, outras tradições 
de valor serão consideradas irrelevantes ou serão reprimidas. 
Pluralismo radical
A maioria das pessoas tende a concordar com o fato de que mui-
tas de nossas categorias são construídas socialmente. Todos sabe-
mos, por exemplo, que existem in!ndáveis desacordos quanto ao 
signi!cado de “justiça”, “moralidade” ou “amor”. Entretanto, muitas 
pes soas resistem às ideias construcionistas quando as mesmas se re-
ferem ao mundo físico, ao mundo pré-linguístico do diretamente 
observável. É verdadeira ou falsa a a!rmativa “a Lua é feita de quei-
jo”? Que insensato seria responder “verdadeira”! E não é também 
óbvio que o mundo é redondo e que as estações mudam na Nova 
Inglaterra? Mas analise novamente: se considerarmos que o que é 
real deriva de acordos entre comunidades de pessoas, as a!rmações 
da verdade devem se encontrar no âmbito dessas relações. Ou, mais 
uma vez, a verdade só pode ser encontrada dentro da comunidade; 
porque fora da comunidade há o silêncio. Neste sentido, os constru-
cionistas sociais não adotam as verdades universais, nem a Verdade 
com “V” maiúsculo, às vezes chamada de Verdade Transcendental.
Naturalmente existe a verdade com um “v” minúsculo, ou 
seja, a verdade decorrente dos modos de vida compartilhados 
dentro de um grupo. Às vezes, esse grupo pode ser enorme, como 
o grupo que comumente declara que 2 + 2 = 4. Se uma criança 
disser que a resposta é 3, ela será imediatamente corrigida. Por 
outro lado, os matemáticos poderiam dizer que a resposta 4 está 
Construcionismo Social
30
correta se a base do sistema utilizado for decimal; caso contrário, 
a resposta não é 4. A divisão de pessoas em dois sexos, masculi-
no e feminino, é algo comumente aceito. No entanto, há certas 
culturas que constroem um terceiro sexo, intermediário entre o 
masculino e o feminino. A noção de raças também é uma noção 
desenvolvida no âmbito das comunidades e, em algumas cultu-
ras, as posições sociais foram hierarquizadas em sistemas de clas-
ses ou de castas. Assim, ao perguntar se a Lua é feita de queijo, 
a resposta dependerá da comunidade onde estamos inseridos. 
Num sentido poético poderíamos inclusive dizer que a Lua é a 
deusa antiga, Diana.
A ideia de verdade em uma comunidade é de suma importância 
e, como vimos, todas as construções do verdadeiro estão ancoradas 
nas formas de vida, e todas as formas de vida se caracterizam por 
valores. Isso signi!ca que as a!rmações de verdade encontram-se 
invariavelmente vinculadas às tradições de valor. Assim sendo, 
numa comunidade de cientistas espaciais, é importante saber se é 
verdadeira ou falsa a a!rmação de que um foguete segue uma de-
terminada trajetória, pois esta verdade está vinculada ao valor que 
os mesmos cientistas atribuem ao fato de que os foguetes chegarão 
em segurança ao seu destino. Os psiquiatras procuram a verdade 
sobre a doença mental e tal busca está atrelada aos valores que os 
psiquiatras atribuem ao que consideram formas normais de vida.
Entretanto, nossos problemas começam quando a!rmações lo-
cais de verdade (v) são tratadas como verdade transcendental (V); 
quando uma comunidade acredita que o mundo foi criado pelo 
“Big Bang” e outra defende que o mundo foi criado pelo “Gran-
de Deus” [Big God]; quando uma comunidade a!rma que o ho-
mossexualismo é uma doença e outra insiste que se trata de algo 
O cenário da construção social 
31
 normal; ou quando alguém declara que todos os comportamen-
tos são predeterminados e outro a!rma que as pessoas exercem 
o livre-arbítrio. Tal como na maioria das a!rmações de saber, a 
humildade do local se vê substituída pela arrogância do universal.
O construcionismo social nos exime da tarefa de decidir qual 
tradição, conjunto de valores, religião, quais ideologias políticas 
ou qual ética é a derradeira, transcendentalmente Verdadeira ou 
Correta. A partir de uma perspectiva construcionista, tudo pode 
ser válido para um determinado grupo de pessoas, e as ideias 
construcionistas convidam a um pluralismo radical, ou seja, 
a uma abertura para múltiplas formas de denominar e avaliar. 
Como não há fundamento com o qual reivindicar a superiori-
dade de nossa própria tradição, somos convidados a adotar uma 
postura de curiosidade e de respeito para com as outras tradições. 
O que será que as outras tradições oferecem que não está contido 
em nossa própria tradição? Que aspectos de nossa tradição po-
dem ser compartilhados e úteis para as demais? 
Naturalmente, uma visão pluralista como esta é mais fácil de se 
sustentar em termos abstratos do que no corre-corre da vida coti-
diana. Di!cilmente !caremos calados diante do que enxergamos 
como preconceito, opressão, injustiça e brutalidade. Contudo, 
para o construcionista, a tendência a eliminar aquilo que despre-
zamos é um passo na direção errada. É a Verdade em operação. 
Preferencialmente, o construcionista tende a favorecer formas de 
diálogo a partir das quais possam emergir novas realidades e no-
vos valores. O desa!o não é encontrar a “única e melhor forma”, 
mas criar tipos de relação através dos quais se possa construir o 
futuro de maneira colaborativa. Voltaremos a abordar esses tipos 
de relação no Capítulo 3.
Construcionismo Social
32
Ciência versus religião?
A maioria dos cientistas acredita que existe um mundo real e um 
mundo material independente das pessoas e, além disso, acredita 
ser possível descobrir esse mundo por meio de uma medição sis-
temática (telescópios, microscópios etc.), e representá-lo com pre-
cisão por meio de sistemas simbólicos, inclusive pela linguagem 
e por fórmulas matemáticas. Os cientistas geralmente argumen-
tam que, através de seus métodos, eles conseguem chegar cada vez 
mais perto do mundo como ele realmente é. O sucesso alcançado 
pelas iniciativas cientí!cas, desde a erradicação de doenças fatais 
até o controle da energia atômica, levou muita gente a aceitar o 
poder da ciência como a revelação da Verdade sobre o mundo.
Nem todas as ideias construcionistas desvalorizam as iniciati-
vas cientí!cas, mas, certamente, desa!am a ideia de que a ciência 
revela a Verdade. Tampouco os frutos da ciência justi!cariam tal 
reivindicação. Uma prática efetiva de terapia, por exemplo, não 
torna Verdadeiras as palavras utilizadas para descrever ou expli-
car tal prática. Este é um ponto importante porque, durante sé-
culos, foram usadas a!rmações relativas à Verdade cientí!ca para 
desacreditar as a!rmações das tradições espirituais ou religiosas. 
A ciência serviu de baluarte numa luta de poder em que o contro-
le da sociedade foi arrancado à força das instituições religiosas. 
Diz-se que a ciência trata da verdade, enquanto as tradições reli-
giosas e espirituais se baseiam em fantasias ou mitos.
O construcionismo proporciona uma nova maneira de ver este 
antagonismo. Tanto a tradição cientí!ca quanto a religiosa/espiri-
tual têm suas próprias maneiras de construir o mundo; cada uma 
delas encerra determinados valores e aprova determinadas formas 
O cenário da construção social 
33
de vida. Não há forma de comparação direta entre a verdade das 
tradições e a verdade da ciência,visto que qualquer tipo de men-
suração se dá necessariamente em uma realidade construída por 
alguma tradição. Não podemos medir a verdade do espírito por 
meios cientí!cos, assim como não podemos avaliar a verdade da 
ciência através da sensibilidade espiritual. Além disso, as duas tra-
dições produzem frutos de acordo com seus próprios termos: no 
caso das tradições cientí!cas, são os foguetes espaciais e a energia 
atômica; ao passo que, para as tradições religiosas, são as institui-
ções preocupadas com o ser humano e visões da boa moral. Nenhu-
ma das duas pode produzir em seus próprios termos o que a outra 
oferece. O construcionismo nos pede que eliminemos a tradicional 
oposição Ciência versus Religião. Preferivelmente, adotamos uma 
posição de “ambas/e” quando somos convidados a explorar as con-
sequências positivas e negativas de cada uma delas. 
Foco do capítulo
Podemos ver o construcionismo social como um permanente diálo-
go sobre as fontes daquilo que acreditamos ser o conhecimento do 
real, do racional, do verdadeiro e do bom – com efeito, tudo é sig-
ni!cativo na vida. Talvez seja útil pensar nas ideias construcionistas 
como sendo um guarda-chuva sob o qual se encontram abrigadas 
todas as tradições de signi!cado e de ação. O guarda-chuva constru-
cionista permite que nos movimentemos através das tradições para 
apreciar, avaliar, absorver, amalgamar e recriar. Ao mesmo tempo, 
é preciso reservar um lugar para as próprias ideias construcionistas 
debaixo desse guarda-chuva. Elas também devem evitar a!rmações 
do tipo Verdade transcendental. Ao escrevermos estas palavras tam-
bém nos empenhamos em gerar signi!cado junto com você, leitor. A 
questão importante não é se nossas palavras são verdadeiras ou ob-
jetivas, mas sim o que acontece com nossas vidas quando iniciamos 
esta forma de entendimento. Como esperamos poder demonstrar, 
existem muitos novos e promissores caminhos à frente. 
35
Capítulo 2 
 
 
Da crítica à 
reconstrução
Uma das coisas mais fascinantes sobre o nosso próprio compro-
misso com as ideias construcionistas é a incessante criatividade que 
elas estimulam. Aqueles que buscam a Verdade procuram reduzir o 
mundo a um conjunto !xo e único de palavras. Declarar A Verda-
de é congelar profundamente as palavras, reduzindo desta forma o 
reino das possibilidades para o surgimento de novos signi!cados. 
Em contraste, os construcionistas preferem o diálogo constante e 
aberto, no qual há sempre lugar para outra voz, outra visão e outra 
revisão, e para uma expansão adicional na esfera da relação. 
Neste capítulo, apresentamos uma série de grandes desenvol-
vimentos nos diálogos construcionistas. Inicialmente, levamos a 
contribuição construcionista à re"exão crítica. Essa discussão nos 
prepara para considerar o grande desa!o que as ideias construcio-
nistas trazem à tradição ocidental do individualismo. O construcio-
nismo privilegia, em nosso entender, a substituição do indivíduo 
como fonte de signi!cado pela relação. Finalmente, iremos explorar 
algumas tentativas recentes de reconstruir o conceito de “self”.
Desconstrução e além
À medida que as ideias construcionistas tornaram-se mais dis-
seminadas, também se disseminou a re"exão crítica sobre nossa 
vida cotidiana. Por que isso aconteceu? Porque a partir do mo-
mento em que percebemos que qualquer pronunciamento sobre a 
Construcionismo Social
36
natureza das coisas — seja qual for o status social, as realizações ou 
a aparente genialidade do enunciador — é apenas “uma maneira 
de colocar as coisas”. A partir daí, também nos conscientizamos 
de que poderia ser de outra forma. Cada maneira de construir o 
mundo sustenta certas tradições, carregadas de valores particu-
lares, ao passo que, simultaneamente, ignora tudo o que estiver 
fora delas. Assim, nossa curiosidade sobre quais tradições estão 
sendo respeitadas ou não estão sendo questionadas e que vozes se 
calam ou estão sendo abafadas é despertada. Começamos a nos 
questionar, por exemplo, que tipo de mundo é construído por um 
determinado noticiário, por um discurso político ou por um con-
junto de textos cientí!cos. Quem é favorecido, quem é margina-
lizado? Será que queremos realmente abraçar essa nova maneira 
de construir o mundo? Esta sensibilidade crítica tem se difundido 
cada vez mais no mundo ocidental. Estamos nos tornando mais 
sensíveis às formas pelas quais a televisão constrói vários grupos 
– afro-americanos, mulheres, italianos, idosos, e assim por diante. 
Alguns programas da mídia nos alertam sobre a forma pela qual 
os “fatos são tramados” por políticos e como a ideologia políti-
ca se encontra sutilmente embutida nos noticiários. Os pais estão 
muito preocupados com as atitudes consumistas que a televisão 
passa aos !lhos. Tudo isso aponta para um posicionamento crí-
tico diante dos mundos construídos por outros, e, neste sentido, 
o conhecimento acadêmico construcionista apenas expressa uma 
ampla sensibilidade que já se encontra em movimento. 
Na esfera acadêmica, essa orientação crítica tornou-se extrema-
mente aguçada e, nesse sentido, as teóricas feministas exerceram 
um papel bastante relevante. Já suas primeiras contribuições nos 
!zeram perceber os vieses sutis subjacentes a palavras tais como 
“humanidade”, “policial” e “presidente”; aliás, atualmente, muitos 
Da crítica à reconstrução 
37
questionam a representação masculina de Deus. Outros grupos 
que também sentem o peso opressivo da cultura dominante sobre 
suas formas de vida juntaram-se às acadêmicas feministas. Hoje, 
muito deste pensamento crítico está também presente nos Estudos 
Afro-americanos, nos Estudos Orientais, na Teoria Queer*, nos Es-
tudos Culturais, entre outros. No próximo capítulo, exploraremos 
o trabalho especí!co do movimento da “educação crítica”. 
quem tem o poder? o esperma ou o óvulo?
Um poderoso exemplo de trabalho feminista crítico encontra-se no es-
tudo de Emily Martin sobre os textos médicos que descrevem o processo 
da fertilização humana. A autora observa que a maioria das descrições 
populares segue um padrão de conto de fadas, no qual uma multidão de 
espermas ativos (os heróis da história) se esforça, lutando contra gran-
des adversidades para invadir a fortaleza e penetrar no Óvulo-Princesa. 
Enquanto isso, a princesa permanece passivamente sentada à espera 
do feliz e heroico vencedor do combate. A fertilização é o !nal feliz da 
bem-sucedida conquista do herói. Como ressalta Emily Martin, esta ex-
plicação biológica da fertilização agrega autoridade cientí!ca ao antigo 
mito cultural do macho poderoso e ativo e da fêmea passiva e indefesa. 
Quando assistimos um vídeo sobre o processo de fertilização, ve-
mos virtualmente o esperma ativo penetrar no óvulo passivo. Mas 
será mesmo assim? Emily Martin indaga o que veríamos se nossa 
história retratasse um exótico Óvulo-Sereia que atrai os incautos e 
indefesos espermas para seu esconderijo? Enquanto o Óvulo-Sereia 
os atrai em sua direção, seleciona um dos espermas e destrói os ou-
tros. Neste caso, o óvulo se transforma na força dominante e nossa 
visão do que ocorreu no vídeo muda completamente. 
* Queer Studies no original. A Teoria Queer defende que o gênero é uma construção social e que, por-
tanto, as identidades, papéis e orientações sexuais dos indivíduos não são uma essência, tampouco 
estão relacionados a uma inscrição biológica na natureza humana; são antes formas socialmente va-
riáveis de desempenhar um ou vários papéis sexuais. De modo geral, a Teoria Queer busca ir além 
das teorias feministas baseadas na dicotomia homem x mulher, dando maior atenção aos processos 
sociais amplos que sexualizam a sociedade como um todo de forma a heterossexualizar ou homos-
sexualizar instituições, discursos, direitos. Neste sentido, a Teoria Queer se distingue dos estudos 
gays e lésbicos, pois considera queessas culturas sexuais foram normalizadas e não apontam para 
a mudança social. Daí o interesse em estudar o travestismo, a transexualidade e a intersexualidade, 
bem como as culturas sexuais não-hegemônicas caracterizadas pela subversão ou pelo rompimento 
com normas socialmente prescritas de comportamento sexual e/ou amoroso (N.R.).
Construcionismo Social
38
Certamente, a segunda história é tão verdadeira quanto a primeira 
(e nem um pouco mais politicamente correta!). Ambas são construções 
narrativas do que está ocorrendo, embora as implicações cientí!cas se-
jam totalmente diferentes. A autora, uma médica antropóloga, consi-
dera de fundamental importância que a natureza política de nossas in-
terpretações seja entendida, inclusive porque o resultado disso também 
será uma biologia melhor. Na pesquisa tradicional sobre a infertilidade, 
atribui-se grande importância à mobilidade e à resistência do esperma. 
Ao adotarmos a segunda história – a do óvulo como sereia – a atenção 
se volta para as características do óvulo e à passagem que o esperma 
deve atravessar. No entanto, as duas histórias são limitadas. Será que 
não poderiam existir outras narrativas ou metáforas proveitosas para 
aumentar o nosso entendimento sobre a reprodução humana? 
Os esforços críticos são extraordinariamente importantes 
para o desenvolvimento da democracia, pois frustram a tentati-
va de qualquer grupo que pretenda dominar ou anular os outros 
através de sua construção particular do real e do bom, além de 
multiplicar os controles recíprocos da sociedade que asseguram 
uma participação total. Por exemplo, sabendo que os principais 
jornais reproduzem as notícias a partir de um ponto de vista 
particular e que existem muito poucos jornais independentes, 
as centenas de sites e fóruns de discussão na Internet aumentam 
as possibilidades para a expressão pública. Além de estimular a 
democracia, muitos consideram esse importante trabalho como 
libertador. Quando as pessoas são capazes de ver os limites e os 
vieses naquilo que comumente se aceita como óbvio, elas !cam 
livres para considerar alternativas. 
Contudo, ainda que indispensável para uma sociedade impar-
cial, o impulso crítico também é perigoso, visto que a crítica ques-
tiona a legitimidade do que é dito ou escrito. E, se suas palavras 
estiverem sendo questionadas, é possível que você seja apresentado 
Da crítica à reconstrução 
39
como preconceituoso, egoísta, opressivo ou explorador. Não sur-
preende o fato de que muitas vezes a raiva e o contra-ataque sejam 
a resposta à crítica. Tanto aquele que critica quanto o seu alvo, via 
de regra, acredita no bem que está fazendo, mas, rapidamente, a 
possibilidade de con!ança é destruída e a hostilidade mútua preva-
lece. Neste sentido, tornam-se necessárias novas formas de discur-
so para substituir a tradição da crítica total. Como re"etir de forma 
crítica sem demonizar? Como superamos as barreiras do “fazer 
sentido” isoladamente para construirmos, juntos, futuros mais pro-
missores? Vislumbraremos algumas possibilidades no Capítulo 3. 
Do indivíduo à relação
O que pode haver de mais óbvio do que a constatação de que 
nosso mundo se compõe de indivíduos separados, na maioria 
das vezes dotados da capacidade de tomar decisões conscien-
tes? A partir desta constatação óbvia, favorecemos uma demo-
cracia na qual cada cidadão adulto tem direito a voto, onde há 
tribunais, em que atores individuais são considerados respon-
sáveis por suas ações, onde existem escolas para avaliar o tra-
balho de cada aluno e organizações nas quais os funcionários 
são submetidos individualmente a avaliações de desempenho. 
É basicamente por isto que caracterizamos a cultura ocidental 
como individualista. 
Entretanto, para um construcionista, o fato óbvio do “indi-
víduo como um tomador de decisões consciente” não é algo tão 
óbvio assim. Pelo contrário, vemos isto apenas como uma forma 
de construir o mundo. Aliás, a orientação individualista com re-
lação à vida social não é tão antiga do ponto de vista histórico 
(possivelmente data de três séculos), e não é compartilhada pela 
Construcionismo Social
40
maioria das pessoas no mundo. Não que isto faça com que esta 
orientação seja errada, mas nos permite dar um passo além de 
nossas certezas e indagar sobre os prós e os contras desta con-
cepção. O que podemos ganhar com essa forma de construir o 
mundo? O que podemos perder? Quais são as alternativas? 
Certamente pode-se dizer muita coisa em favor do individua-
lismo, como, por exemplo, que a vida é signi!cativa e importan-
te para muitas pessoas, porque elas se sentem amadas, honradas 
e valorizadas pelo que são. E, para a maioria de nós, não existe 
melhor alternativa à democracia. Ao mesmo tempo, o individu-
alismo tem suas desvantagens. Do ponto de vista individualista, 
somos instados a ver o mundo social como se ele, basicamente, 
fosse constituído de seres isolados. Aprendemos que não pode-
mos penetrar na mentes dos outros e, assim sendo, não pode-
mos conhecer ou con!ar totalmente nos outros. O pressuposto 
de que cada um está apenas preocupado consigo mesmo exige 
um treinamento moral para que passemos a nos preocupar com 
os demais. A autoavaliação transforma-se na dimensão essencial 
em torno da qual vivemos nossas vidas, com medo de sermos 
tratados com desdém, procurando ser sempre melhores do que 
os outros. Num mundo individualista, as relações são relegadas a 
um segundo plano, porque são tratadas como artifícios que, pro-
vavelmente, demandam tempo e que são essenciais apenas nos 
casos em que não somos autossu!cientes. 
É exatamente nesse ponto que as ideias construcionistas vão 
deslanchar. Se uma determinada construção do eu ou do mun-
do vai contra o nosso bem-estar, somos instados a desenvolver 
alternativas. De fato, a partir da perspectiva construcionista, são 
as relações, e não os indivíduos, que constituem a base da so-
Da crítica à reconstrução 
41
ciedade. Vamos ampliar esta possibilidade, não porque a visão 
relacional seja a verdadeira, mas porque, ao entrarmos nessa 
construção, podemos promover novas e mais promissoras for-
mas de ação.
O signi!cado como ação coordenada
Geralmente falamos de signi!cado como algo que mora nas men-
tes dos indivíduos. Pressupomos que as palavras sejam a expressão 
externa das elucubrações internas da mente. Quando perguntamos 
a alguém “O que você quer dizer com isso?”, esperamos que o in-
terlocutor esclareça seus pensamentos privados. Esta concepção de 
signi!cado encontra-se próxima ao cerne da tradição individualis-
ta e considera o indivíduo como a fonte de todo signi!cado. Entre-
tanto, além de seu viés individualista, esta concepção também gera 
um problema insolúvel para o entendimento humano, porque, se o 
signi!cado se encontra “dentro da mente do outro” e a única pista 
“do que acontece lá” são expressões verbais, jamais teremos a capa-
cidade de entender o outro. Nunca chegaremos a veri!car se esta-
mos certos ou não, a não ser por meio do que o outro externaliza. 
Contudo, essas externalizações nos deixam no mesmo dilema, pois 
como poderemos saber o que signi!cam? Entramos então no que 
os estudiosos chamam de “círculo hermenêutico”, um interminável 
círculo no qual cada resposta simplesmente cria outra pergunta. A 
melhor forma de escapar do círculo é abandonar a construção de 
“um mundo interno” onde o signi!cado é criado. Deixamos de nos 
concentrar no signi!cado dentro da mente e focalizamos a manei-
ra pela qual o signi!cado é criado na relação. Passamos do “entre” 
para o “dentro”. Mas como podemos entender o signi!cado como 
algo relacional? 
Construcionismo Social
42
Considere as seguintes proposições:
1. Os enunciados de um indivíduo não têm signi!cado em 
si mesmos.
Um homem passa por uma mulher na rua, sorri e diz: “Oi, 
Anna!” Elanão ouve a saudação e segue seu caminho em silên-
cio. O que ele disse, então? Certamente pronunciou duas pala-
vras. Entretanto, por maior diferença que isso faça, ele poderia 
ter escolhido duas sílabas quaisquer ou simplesmente poderia 
não ter dito nada, pois, sozinho, ele não constrói um signi!cado. 
2. O potencial de signi!cado é concretizado através de uma 
ação complementar.
As expressões de um indivíduo começam a adquirir sig-
ni!cado quando outro indivíduo responde, ou seja, quando a 
outra pessoa agrega uma ação complementar. Se Anna tivesse 
respondido: “Oi! Bom dia...”, ela teria feito das palavras dele um 
cumprimento. Comunicar requer que outros nos concedam o 
privilégio de um signi!cado. Se os outros não tratarem as nos-
sas expressões como comunicação (dizendo, por exemplo, “Isto 
não faz absolutamente o menor sentido”), se não conseguirem 
se coordenar com relação ao que oferecemos (“Isto é uma total 
idiotice”), não teremos produzido o menor signi!cado. 
Combinando essas primeiras duas proposições, vemos que 
o signi!cado não reside em nenhum dos dois indiví duos, mas 
somente na relação de ambos. Tanto a ação quanto o comple-
mento precisam estar obrigatoriamente coordenados para que 
o signi!cado ocorra. É como um aperto de mãos, um beijo, ou 
dançar tango: são sempre necessárias duas pessoas. 
3. A própria ação complementar requer um complemento.
Qualquer complemento age duplamente: em primeiro 
lugar, conferindo signi!cado àquilo que o precedeu e, em se-
gundo, como uma ação que, por sua vez, também requer com-
plemento. Com efeito, o signi!cado conferido permanece em 
Da crítica à reconstrução 
43
suspenso até ser também ele complementado. Considere uma 
mulher em terapia que fala de sua sensação de desamparo por-
que se sente incapaz de lidar com um marido agressivo e com 
um emprego insuportável. O terapeuta pode tomar essas verba-
lizações como expressões de depressão, respondendo “Sim, eu 
entendo que você está deprimida; fale mais a respeito”. Enquan-
to a paciente não apresentar outra questão, este permanecerá 
inativo em termos de signi!cado. Se a paciente simplesmente 
ignorar o que foi dito, terá negado um signi!cado às palavras 
do terapeuta. Por outro lado, se ela disser, “Eu não disse que 
estou deprimida; estou apenas com raiva!”, estará reduzindo a 
declaração do terapeuta a uma a!rmação arrogante. Porém, se 
a paciente disser “Sim, estou terrivelmente deprimida...”, a de-
pressão se torna uma realidade que poderá ser trabalhada em 
conjunto com o terapeuta. De uma forma geral, podemos dizer 
que vivemos nossas vidas dialogicamente. Fazemos sentido só 
em função daquilo que precede e daquilo que segue.
4. As tradições nos oferecem possibilidades de signi!cado, 
mas não determinam o que deve ser.
É importante reconhecer que as palavras e as ações com 
as quais contamos para juntos gerarmos um signi!cado mui-
tas vezes provêm de um outro tempo e de um outro lugar. Se 
alguém o abordasse e começasse a emitir uma série de vogais, 
“aaaaa, eeeee, oooo, uuuu...”, com certeza você !caria intrigado 
e talvez até procurasse a saída mais próxima, porque as ações 
desse indivíduo não fazem parte de qualquer sequência coor-
denada que seja familiar a você. Com efeito, nossa capacidade 
de juntos produzir sentido hoje baseia-se numa história, muitas 
vezes com muitos séculos de existência. Neste sentido, devemos 
a um histórico de coordenações nossa capacidade de nos apai-
xonar, de apoiar uma causa justa ou de acompanhar com prazer 
o desenvolvimento de nossos !lhos. Em cada um desses casos, 
tomamos emprestados os tesouros das relações passadas. 
Mas nós não somos determinados pelo passado. Combinações 
originais de ação/complemento estão em constante movimento. 
Construcionismo Social
44
Pense em uma animada conversa; para qualquer expressão, há 
dezenas de complementos possíveis e signi!cativos. Conforme 
ela vai se desenrolando, traz um resultado que é uma criação to-
talmente exclusiva. Aqui também é possível ver o valor do jogo. 
Quando concordamos em brincar ou em passar o tempo nos di-
vertindo, dizemos e fazemos coisas que não são propriamente 
convencionais. Novas sequências são geradas... o riso corre sol-
to... e até mesmo novas percepções poderão ser criadas. 
O “Eu” relacional
Como é ser um ser humano? Qual é a nossa natureza fundamen-
tal? Estas são perguntas que não nos fazemos com frequência, 
porque mais ou menos pressupomos que nós, seres humanos, 
somos criaturas que têm a capacidade de tomar decisões racio-
nais, sentir emoções e desejos, recordar o tempo passado, e assim 
por diante. Contudo, como já mencionamos anteriormente, essas 
crenças comuns só vieram a ter importância na cultura ocidental 
nos últimos séculos. Foi somente no século XVII, quando Des-
cartes a!rmou “Penso, logo existo”, que se tornou patente o fato de 
que podíamos pensar e que o pensamento era chave para a exis-
tência de uma pessoa. Da mesma maneira, o conceito de “senti-
mento” apareceu apenas por volta do século XVIII; nesse ínterim, 
outras qualidades humanas foram desaparecendo. Por exemplo, 
de certa forma nos esquecemos da importância da “melancolia”, 
um estado emocional que foi descrito em certo momento como 
silêncio macabro e súbitos acessos de raiva. A melancolia era algo 
tão óbvio no século XVII que Robert Burton escreveu um livro 
de 500 páginas a respeito de suas causas e curas. A “alma” foi tida 
como um fato da vida humana por anos, ao passo que hoje mui-
tos a consideram um mito. Da mesma forma, nos últimos sécu-
Da crítica à reconstrução 
45
los, o livre-arbítrio tem sido considerado uma virtude exclusiva 
das pessoas, embora para a maioria dos cientistas, cuja visão do 
mundo é determinista, o livre-arbítrio seja uma evidente !cção.
doença mental como discurso do déficit 
Você toma medicamento contra depressão? Conhece algum jovem que 
tenha sido diagnosticado como portador de TDA (Transtorno do Dé-
!cit de Atenção)? A resposta a essas perguntas vem sendo progressiva-
mente a!rmativa. Contudo, até o século XX, não existiam distúrbios 
mentais com o nome de depressão ou dé!cit de atenção. É interessante 
observar que no ano de 1900 havia apenas um punhado de termos que 
identi!cavam as doenças “mentais” e, até o ano 2000, os pro!ssionais 
da saúde já haviam “descoberto” mais de 400 formas de doença men-
tal. Atualmente, a doença mental representa um dos maiores gastos na 
área da saúde nos Estados Unidos, e os psicofármacos transformaram-
-se num negócio multibilionário. À medida que o discurso do dé!cit 
adquire credibilidade cientí!ca e essas de!ciências se tornam de conhe-
cimento público, também nós acabamos por nos construir dessa forma. 
De acordo com a perspectiva do construcionismo social, a doença 
mental não “existe” no mundo simplesmente à espera de ser desco-
berta. Pelo contrário, nós construímos... ou não... certas ações como 
“doença”. Uma pessoa que está “triste”, “indiferente” ou “na fossa” não 
precisa ser diagnosticada como “doente”. Mais apropriadamente, po-
demos acreditar que a pessoa possa estar precisando de um pouco de 
apoio dos amigos ou da família, de um pouco de sucesso e de reco-
nhecimento, de uma nova namorada ou de tempo para superar uma 
perda. Mas se rotularmos essa pessoa como portadora de “depressão 
clínica”, ela pode acabar sendo encaminhada para um tratamento que 
poderá levá-la, inclusive, a se tornar dependente de antidepressivos 
pelo resto da vida. Se descrevermos uma criança como “transbordan-
do de curiosidade” ou “precisando de muito estímulo”, podemos en-
contrar coisas mais interessantes para ela fazer. Se essa mesma criança 
for diagnosticada como portadora de transtorno do dé!cit de atenção, 
muito provavelmente o especialista lhe prescreverá Ritalina (metilfe-
nidato) por muitos anos. Na condição de construcionistassociais, es-
tamos sensíveis a esses efeitos problemáticos do discurso do dé!cit e 
incentivamos a busca por construções alternativas mais promissoras.
Construcionismo Social
46
Concentremo-nos agora no mundo da atividade mental como 
o consideramos atualmente. Com certeza, falar de nossos pensa-
mentos, sentimentos, desejos e memórias é algo extremamente 
precioso para nós. Qual seria, por exemplo, o valor de um rela-
cionamento íntimo se não acreditássemos estar compartilhando 
nossos sentimentos mais profundos? Contudo, o fato de as for-
mas com que construímos nossas mentes sejam tão importantes 
para nós não as colocam além da re!exão. Vamos considerar que 
as palavras “pensamento”, “emoção”, “desejo” e “memória” cons-
truam um mundo “dentro da cabeça” do indivíduo. Como dis-
cutimos no tópico sobre o Eu Relacional, se o “mundo interior” 
for o aspecto mais importante do signi"cado de existir como um 
ser humano, criaremos um mundo de separação, isolamento e 
con!ito, e talvez não sejamos sequer capazes de explicar como 
é possível a comunicação. Basicamente, ao construirmos essa 
noção de pessoa contribuímos para uma ideologia de individu-
alismo cujas implicações para a vida social não são totalmente 
satisfatórias. 
Para o construcionista, esses problemas também trazem de-
sa"os à reconstrução. O construcionista pergunta: “É possível 
reconstruir o ‘mundo mental’ de tal maneira que ele não seja 
mais privado, ‘aqui dentro’, ‘atrás dos olhos’?” “Será que podemos 
começar a considerar que pensamentos, sentimentos, desejos e 
memórias nascem de relações e que não fazem sentido fora de-
las?” Se formos bem-sucedidos em nossa reconstrução, não nos 
 veríamos mais como seres isolados e independentes, basicamente 
à procura de satisfazer os próprios interesses ou ameaçados de 
extinção pelos competidores. Poderíamos nos ver como resulta-
Da crítica à reconstrução 
47
do de uma relação, e o “Eu versus o Outro” se transformaria no 
“Eu através do Outro”. Vejamos então alguns passos importantes 
para a construção do Eu Relacional. 
A reconstrução relacional da mente
A tarefa de criar o Eu Relacional não é fácil, basicamente, por-
que as palavras para nós disponíveis são fruto de uma tradição 
individualista. Dispomos de milhares de termos que “tornam 
reais” as condições e os conteúdos da mente individual. Po-
demos falar inde!nidamente sobre nossos pensamentos, senti-
mentos, desejos, esperanças, sonhos, ideais, e assim por diante. 
No entanto, dispomos de pouquíssimas palavras para descrever 
relações. É como se tivéssemos uma linguagem extremamente 
rica para descrever as peças de um tabuleiro de xadrez, mas 
poucas para descrever o jogo propriamente dito. Como pode-
remos proceder para que um Eu Relacional faça sentido sem 
tomar como ponto de partida a suposição de mentes indivi-
duais? Muitos acadêmicos estão justamente tentando respon-
der a essa pergunta. 
Considere agora as seguintes hipóteses que começam a am-
pliar as perspectivas.
1. O discurso da mente nasce do diálogo.
Muitos acreditam que as palavras que exprimem esta-
dos mentais sejam imprescindíveis em virtude da existência 
factual de tais estados. Ou seja, pelo fato de o pensamento 
realmente existir na mente, pudemos chegar a desenvolver 
o termo “pensamento”. Em contrapartida, o construcionista 
pode argumentar que não dispomos do substantivo “pensar” 
porque, ao perscrutarmos nossas mentes, identi!camos um 
processo que agora chamamos de “pensamento”. Mas, a!nal, 
Construcionismo Social
48
para que estaríamos olhando já que não podemos enxergar os 
pensamentos no nosso cérebro, e como poderíamos identi!-
car um “pensamento” como oposto a uma “atitude” ou a uma 
“esperança”, se isto fosse possível?
Nossas linguagens nascem no interior de nossos diá-
logos com os outros. A declaração de Descartes a respeito 
de seu “pensar” só é razoável no contexto de uma história 
especial de diálogo. E se, em sua conversa com outros !ló-
sofos, eles lhe tivessem perguntado: “Que diabos você quer 
dizer com a palavra ‘pensar’?” Sem a coordenação humana, 
o discurso permanece vazio. Uma vez que as palavras que 
dirigimos à mente são criadas no diálogo, !ca fácil enten-
der porque termos e expressões aparecem e desaparecem 
ao longo da história e porque é relativamente fácil inventar 
centenas de novos termos para a doença mental. Isto tam-
bém explica porque as diferentes culturas do mundo não 
compartilham o mesmo entendimento a respeito de “como 
as pessoas funcionam”.
2. O discurso da mente adquire valor através do seu uso.
A!rmar que o discurso da mente nasce no diálogo é a!r-
mar também que seu signi!cado depende de seu uso social. 
Não precisamos nos questionar se as palavras que usamos re-
tratam com exatidão nosso estado interno. Se você diz “Eu 
quero muito que você esteja aqui comigo”, a questão não é se a 
palavra “quero” corresponde a uma condição em seu cérebro, 
e sim como essas palavras funcionam dentro de uma relação. 
Quais são as consequências sociais quando você pronuncia 
essas palavras?
Considere todos os termos disponíveis em nosso vocabu-
lário para expressar estados de atração. Você pode dizer “Eu 
admiro você”, “Eu só quero ser seu amigo”, “Você é o máxi-
mo!”, “Eu gosto de você”, “Sou louco por você”, “Eu te amo”, 
“Eu te adoro”, “Você me enlouquece”, “Estou desesperado por 
você” e assim por diante. As possibilidades são praticamente 
Da crítica à reconstrução 
49
in!nitas. Agora, considere o impacto sobre as outras pessoas 
se você usasse uma dessas frases em oposição a outra. De-
pendendo do momento ou a quem você dirige essas palavras, 
as pessoas poderão se aproximar, !car pasmas ou até mes-
mo mandar expedir uma liminar contra você! Dispomos de 
inúmeras formas para falar de atração, não porque existam 
inúmeros estados de espírito, mas em virtude das demandas 
de uma vida complexa de relações. 
3. A linguagem é apenas um componente de ações plena-
mente realizadas.
Até agora colocamos grande ênfase nas palavras – pala-
vras como “pensamento”, “emoção” e assim por diante. Po-
rém, essas palavras evidentemente se fazem acompanhar de 
expressões faciais, posturas, movimentos corporais, gestos 
etc. Tais ações corporais são vitais para o modo como as pa-
lavras irão funcionar. Você pode dizer para alguém “Sinto 
muito por ter te magoado”, mas se essa expressão for acom-
panhada por uma gargalhada ou for feita num tom zombetei-
ro, você poderá se meter em encrenca. Para dar credibilidade 
a esta declaração é preciso que a expressão facial seja séria. 
Neste caso, é interessante pensar nos atores que devem criar 
interpretações convincentes das emoções, seja de amor, raiva, 
ou compaixão. Suas palavras são apenas um componente da 
interpretação corporal completa, e os atores não se questio-
nam a respeito de seus verdadeiros sentimentos, pois estão 
simplesmente preocupados em representar essas emoções. 
É importante frisar que não estamos dizendo que essas 
“performances” sejam super!ciais ou “calculistas”. Por exem-
plo, quando nos encontramos no “calor da ira”, estamos mais 
envolvidos do que o ator no palco. Inversamente, o ator preci-
sa manter sua performance a uma certa distância, porque ele 
deve “representar o papel” e não “exercer o papel”. Da mesma 
maneira que um jogador de basquete salta com ânimo por 
entre vários corpos para poder fazer cesta, devemos “atu-
Construcionismo Social
50
ar” nossas emoções com inquebrantável imersão. De forma 
não muito diferente do ator, necessariamente calculamos os 
efeitos de nossa atuação. Normalmente, não realizamos duas 
performances ao mesmo tempo, dizendo “Agradeço imensa-
mente por sua ajuda” enquanto pensamos “Se eu disser isso, 
ele me ajudará de novo”. Naturalmente, essa dupla atuação é 
possível, mas na maioria das vezes estamos simplesmente“lá”, 
presentes, atuando de forma autêntica.
4. Performances são componentes de sequências relacionais.
O signi!cado de uma palavra depende fundamentalmente 
da frase na qual está inserida. O signi!cado de “bala” depen-
de totalmente da frase: “Dê-me uma bala” em contraposição 
a “Ele foi atingido por uma bala”. Da mesma forma, perfor-
mances de pensamentos ou sentimentos só fazem sentido em 
momentos especí!cos dentro de uma sequência relacional. 
Você não pode sair correndo em direção a um estranho e gri-
tar “Estou furioso!”, e esperar que isto faça sentido. Entretanto, 
se o estranho estiver fugindo depois de ter dani!cado o seu 
carro, essa mesma expressão tem um sentido adequado. Neste 
caso, poderíamos até desaprovar a pessoa que não expressas-
se sua raiva. Existem apenas alguns tempos e lugares em que 
uma determinada expressão seja apropriada do ponto de vista 
relacional; do contrário, ela pode soar, no mínimo, estranha. 
Talvez seja interessante aqui pensar em uma dança, seja 
um samba, um tango ou uma salsa. Os movimentos do casal 
de dançarinos fazem sentido somente nos limites da dança e 
nenhum dos dois dançarinos poderia executá-los sozinho. Os 
movimentos do par são necessários para ocasionar a dança. 
Além disso, para serem bem-sucedidos, os movimentos de um 
dos dançarinos devem estar coordenados com os movimentos 
do outro. Não existem movimentos puramente solo, mas em 
determinados momentos certos movimentos são necessários, 
como, por exemplo, quando um dos dançarinos precisa sina-
lizar ao outro para se preparar para girar no meio da dança.
Da crítica à reconstrução 
51
Da mesma maneira, as performances da mente só fazem 
sentido no âmbito de determinados relações, são esperadas 
em certos momentos dos relacionamentos, não esperadas 
em outros, e exigem a cooperação da outra pessoa para que 
tenham signi!cado. Se um amigo seu complementá-lo, esta 
ação preparará o terreno para que você expresse prazer (ou 
acanhamento). E se você disser algo como “Ah! Isso me deixa 
muito feliz”, estará preparando o terreno para uma resposta 
do tipo “Você merece!”. Cada ação leva a uma próxima, cada 
ação exige outra para se legitimar. Em termos mais gerais, as 
performances da mente não são uma propriedade particular, 
são componentes de relação. 
a dor como evento relacional
Dor é dor, independentemente de como falamos dela. Ou assim, acre-
ditamos que seja. Uma das implicações mais interessantes da visão 
relacional do discurso mental é que, no !m das contas, a dor pode 
não ser um acontecimento tão pessoal assim. Em vez disso, a forma 
como vivenciamos a dor pode depender da história e do contexto 
das relações. Pense num jogador que termina uma partida de futebol 
americano todo contundido, sangrando, e ainda assim diz “Foi muito 
bom!”. Há também o sadomasoquista que paga para que a mulher do-
minadora o chicoteie, além dos penitentes cristãos da Idade Média que 
se auto"agelavam para se aproximar do sofrimento de Cristo na cruz. 
Certamente existe uma sensação física especial em todos esses casos, 
mas quali!cá-las como uma “dor horrível” ou como “uma experiência 
bem-vinda” é algo que vai depender de uma cultura relacional. 
Grandes somas de dinheiro são despendidas anualmente no con-
trole da dor. A maioria desses esforços pressupõe que dor seja dor 
e que sua minimização dependa obrigatória e basicamente da al-
teração da química cerebral. No entanto, do ponto de vista cons-
trucionista, a questão mais importante consiste em ver se somos 
capazes de reconstruir a dor e encaixar a experiência em novas e 
mais promissoras formas relacionais. Arthur Frank, em seu livro 
revolucionário “!e Wounded Storyteller” (O Contador de Histó-
rias Ferido), propõe que nossa experiência de dor depende pri-
mordialmente das narrativas através das quais a dor é entendida. 
Construcionismo Social
52
Por exemplo, na narrativa de restituição (“Eu estava sem dor antes; 
agora estou com uma dor terrível, mas ela logo irá passar”) !ca su-
bentendido que a dor dará lugar a um estado de bem-estar. Nesta 
narrativa, a dor é simplesmente um estorvo indesejável e senti-
mo-nos pessimamente mal até que a normalidade se restabeleça.
A história das cólicas menstruais consiste numa típica narrativa de 
restituição. Mais promissora, entretanto, é a narrativa de busca. Nes-
te caso, vemo-nos como se estivéssemos numa missão em busca de 
maior compreensão, talvez até de uma iluminação espiritual. O so-
frimento permite que sejamos testemunhas, que informemos outras 
pessoas a partir de uma ocasião de sabedoria, o sofrimento adquire 
um signi!cado positivo. As dores do parto podem ser o exemplo mais 
elementar da narrativa de busca, porque a dor, ou seja, a sabedoria e a 
alegria se entrelaçam de maneira indissolúvel.
Ao adotar esta visão relacional, podemos reconstruir tudo o 
que supúnhamos serem eventos pessoais, isolados e “da men-
te” – pensamentos, emoções, planos, ou desejos – como sendo 
eventos fundamentalmente relacionais. Sentir tristeza ou alegria, 
êxtase ou agonia, amor ou ódio, desejo ou desprezo, é participar 
da tradição da relação. Não possuímos esses estados dentro de 
nós, tampouco eles se encontram encerrados nas estruturas do 
cérebro; pelo contrário, somos nós que os executamos ativamen-
te. Esses estados não nos impulsionam para a ação, nem a nossa 
ação os estimula para a vida. Estados e ação são a mesma coisa. 
Sua voz cética poderá responder “Mas eu tenho experiências 
privadas porque geralmente penso ou sinto emoções quando es-
tou totalmente sozinho”. Vejamos: podemos estar isolados de ou-
tras pessoas em termos físicos, mas as atividades que realizamos 
sozinhos estão estreitamente vinculadas à nossa imersão nas rela-
ções. “Sentir tristeza” ou “estar pensando a respeito de um proble-
ma” são, basicamente, atuações parciais, afastadas das circunstân-
Da crítica à reconstrução 
53
cias normais da relação. Neste sentido, “pensar com seus botões” 
é como realizar um diálogo em público, apenas sem ser a perfor-
mance completa de quando falamos com outra pessoa. A tristeza 
na privacidade de um quarto não é essencialmente diferente da 
tristeza vivenciada em público, só que, sozinhos, podemos não 
desempenhá-la “por completo”, com as expressões faciais e a pos-
tura corporal apropriadas. Estar sentado sozinho e sentindo-se 
triste é participar da dança cultural, mas sem a presença de outras 
pessoas. Sem uma história de relações há muito pouco que possa-
mos chamar de “um mundo particular”. 
Foco do capítulo
Neste capítulo tratamos com respeito e apreço os processos relacio-
nais. É a partir da relação que tudo o que consideramos real, racional, 
verdadeiro e de valor emerge. As implicações da ênfase relacional são 
vitais, não só porque permitem desestabilizar a tradição enraizada 
do individualismo, mas também porque somos instados a reconside-
rar muitas de nossas instituições, desde os rituais do relacionamento 
íntimo até nossas práticas na educação, na política e nas leis. Uma 
perspectiva racional desperta o apreço por nossa vida com os ou-
tros, no lugar de uma vida separada dos outros ou contra os outros. 
Centramo-nos no poder gerador da relação e do !uxo de ações co-
ordenadas. Por meio de performances junto aos outros e junto a nós 
mesmos, criamos nossas realidades racionais e emocionais. Aquilo 
que antes era denominado “processos mentais” foi recriado como 
“processos relacionais”. O Eu Relacional passa a existir através das 
relações com outros. Nos dois capítulos a seguir, iremos explorar as 
práticas nas organizações, escolas, processos terapêuticos e na pes-
quisa que levam os conceitos relacionais à ação.
55
Capítulo 3 
 
 
Construção social e 
prática pro!ssional 
Uma coisa é gerar ideias atraentes, mas a questão importante é 
veri!car se existe uma relação produtiva entreas palavras e nos-
sos modos de vida. Nós, autores, vivemos a maior parte de nossa 
carreira pro!ssional na academia e testemunhamos muitas ideias 
interessantes que apareceram e desapareceram. Entretanto, uma 
das razões pelas quais as ideias construcionistas nos atraíram de 
maneira especial se deve ao fato de que elas !zeram e fazem uma 
importante diferença em nossas vidas. Uma vez que a consciência 
da construção se estabelece, torna-se difícil !car quieto. Quando 
nos damos conta de que tudo que aceitamos como real, racional 
e bom o é tão somente em virtude de convenções, começamos a 
fazer perguntas como: “Por que devemos aceitar o que a tradição 
nos oferece?”, “O que estamos deixando de considerar?”, “Não se-
ria melhor se pudéssemos reconstruir?” São perguntas perturba-
doras com in!nitas repercussões.
Neste capítulo, discutiremos o impacto das ideias construcio-
nistas nas práticas pro!ssionais. Ilustraremos os desdobramentos 
em pro!ssões vinculadas a terapias, desenvolvimentos organiza-
cionais, ensino e resolução de con"itos, ou seja, nas pro!ssões 
especi!camente voltadas à mudança do ser humano. Em cada 
uma dessas áreas, as ideias construcionistas estimularam novas e 
interessantes alternativas.
Construcionismo Social
56
Construção social e a mudança terapêutica 
Trabalhar para aliviar o sofrimento individual não é tarefa fácil, e 
a busca pela “melhor forma de terapia” tem sido incessante. Um 
dos benefícios de uma perspectiva construcionista consiste no 
fato de que podemos parar de buscar a solução perfeita conside-
rando que “gosto não se discute”. Tanto para os clientes quanto 
para os terapeutas, os métodos de terapia deveriam ser sensíveis 
aos estilos e preferências pessoais, às diferentes tradições e valo-
res, ou seja, às múltiplas construções do real e do bom. Tradições 
terapêuticas constituem em si mesmas bolsões de signi!cado 
cultural; aliás, por que deveria existir um único sistema de sig-
ni!cado que seja útil para todas as pessoas? Dito isto, existem 
três formas de terapia que são especialmente apropriadas à sensi-
bilidade do construcionista com relação às múltiplas realidades. 
Cada uma delas oferece importantes recursos para a mudança. 
Terapia narrativa: reescrevendo vidas 
Entendemos nossa vida em grande parte a partir das histórias 
nas quais somos os protagonistas. Podem ser histórias sobre tor-
nar-se adulto, se apaixonar, sobre a busca por uma carreira pro-
!ssional e assim por diante. São histórias de sucesso e de fracas-
so, de fazer as coisas bem ou menos bem. Quem poderíamos ser 
se não tivéssemos histórias? Assim, quando um indivíduo passa 
por algum sofrimento em sua vida, esse problema só tem lógica 
a partir de alguma história. Por exemplo, muitas vezes sofremos 
ao nos confrontarmos com uma perda, ao sermos rejeitados, ou 
quando sentimos que nossa vida perdeu o rumo. Entretanto, per-
da, rejeição e falta de rumo na vida não são “problemas que exis-
tem lá fora, na natureza”, e só podem ocorrer no enredo de uma 
%QPUVTWÁºQ�UQEKCN�G�RT¶VKEC�RTQſUUKQPCN�
57
história. O fato de você “perder” alguma coisa (um emprego, um 
ente querido, o amor de alguém) signi!ca que você leva consigo 
uma história própria, onde você é o personagem principal que 
enveredou por um caminho de evolução ou de realização (o !nal 
de uma boa história), ou que sofreu um revés. 
Os terapeutas narrativos têm grande apreço por essas ideias 
e acreditam que, ao “reescrevermos” nossa história de vida, “os 
problemas” podem ser transformados, novas histórias podem 
ser criadas e, a partir delas, novos rumos poderão se abrir. Por 
exemplo, algumas pessoas carregam uma história na qual foram 
bastante feridas por pais abusivos e sentem-se incapazes de se-
guir em frente. No entanto, se tiverem a oportunidade de revisi-
tar sua infância, valorizando o fato de que conseguiram sobrevi-
ver corajosamente e destacando-se como heróis, talvez possam 
começar a enxergar novas opções e alternativas de ação que se-
jam mais otimistas.
O trabalho inovador dos terapeutas de família, Michael White 
e David Epston, focaliza especialmente os potenciais políticos do 
“reescrever a sua história”. A maioria das pessoas vê seus proble-
mas como algo que mora “em suas mentes” e se sente “disfun-
cional”, incapaz como pessoa. De acordo com White e Epston, 
tais narrativas ofuscam a possibilidade de entender os problemas 
individuais como algo que emana de condições sociopolíticas. O 
que costuma ser considerado disfunção pessoal, como a depres-
são, por exemplo, poderia ser “reescrito” de forma tal que permita 
a alguém ver que está atravessando momentos políticos ou eco-
nômicos estressantes. Ao entender que o problema “não está em 
nós, mas no sistema”, desaparece uma camada de dúvidas acerca 
de nós mesmos, abrindo possibilidades para novas alternativas 
Construcionismo Social
58
de ação. White, por exemplo, ajuda os aborígines australianos a 
enxergar sua angústia pessoal como resultado das condições de 
opressão social em que vivem, pois, em sua relação com os pode-
rosos brancos, eles começaram a sentir que haviam perdido seu 
poder. Esta história de luta contra uma força externa é reforçada 
pela demonstração dos preconceitos culturais contra os aborígi-
nes. Quando são construídas histórias alternativas de tenacidade, 
frequentemente consegue-se reduzir a a!ição individual abrindo 
novas perspectivas de ação política.
Terapias breves e focadas em soluções: a magia da palavra
Em geral, os pacientes iniciam a terapia trazendo os proble-
mas que desejam discutir, e, apesar de haver um mérito nessas 
discussões, não deixam de existir de"ciências. De um ponto de 
vista construcionista, quando falamos sinceramente sobre um 
problema, ele se torna mais real e irremediavelmente mais terrí-
vel. Se falarmos por muito tempo a respeito de um determinado 
problema, poderemos acabar nos sentindo aprisionados por ele 
e incapazes de nos defender. A partir de ideias construcionistas, 
os terapeutas cujo foco é a terapia breve, voltada para a solução 
dos problemas, buscam alternativas para substituir a “discussão 
de problemas” que ressaltem as di"culdades do indivíduo. Esses 
terapeutas preferem estimular conversas sobre as forças, os re-
cursos e as possibilidades relacionais. Consideremos, por exem-
plo, o que chamamos de “pergunta milagrosa”, quando pergun-
tamos ao cliente: “O que aconteceria se amanhã você acordasse 
e o problema simplesmente tivesse deixado de existir?” A partir 
desse tipo de pergunta, o terapeuta vai poder ajudar os clientes 
a se transportarem para onde quer que suas fantasias os levem. 
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59
Concentrar-se num futuro positivo em vez de em um “velho pas-
sado ruim” transforma-se na base para passos mais proativos em 
direção à mudança.
As terapias breves também são interessantes quando compara-
das às de longo prazo, tais como a psicanálise. Em contraste com 
uma abordagem construcionista, as terapias psicanalíticas exigem 
anos de sondagem porque constroem a pessoa como possuidora 
de “problemas profundamente arraigados”. Se os problemas são 
de!nidos como algo que está oculto em memórias inconscien-
tes da primeira infância, certamente as longas horas de análise 
parecerão ser algo razoável. No entanto, também podemos cons-
truir o indivíduo de forma diferente, de uma maneira que tenha 
como pressuposto a ideia de que vivemos no aqui e no agora e 
que nosso bem-estar está fundamentalmente vinculado às nossas 
relações atuais. Se adotarmos este posicionamento, a terapia po-
derá ser muito mais breve (e mais econômica). As repercussões 
da terapia também se estruturam de modo diferente porque, em 
vez de sondar um passado conturbado, a terapia se concentra em 
meios que permitam relacionamentos presentes mais adequados. 
Ao fazermos a reconstrução do passadopara o presente e deslo-
carmos o foco dos problemas para as potencialidades, é possível 
esperar mudanças mais rápidas. 
A terapia pós-moderna e a posição do “não-saber” 
As escolas da terapia tradicional baseiam-se na hipótese do 
notório saber, ou seja, terapeutas são pessoas treinadas para reco-
nhecer as causas e as curas dos problemas dos indivíduos (“doen-
ças”). Evidentemente, o que se “sabe” varia enormemente de uma 
escola de terapia para outra. Diferentes escolas sustentam de dife-
Construcionismo Social
60
rentes maneiras que os problemas do indivíduo estariam ligados 
a desejos sexuais reprimidos, falta de amor dos pais, sentimento 
de inferioridade e assim por diante. Um terapeuta comprometi-
do com uma dessas explicações sabe quais são os problemas do 
paciente antes mesmo que ele entre no consultório. A terapia a 
partir da “posição do saber” não reconhece sequer minimamente 
o “saber” do paciente.
Harry Goolishian e Harlene Anderson do Houston-Galves-
ton Institute for Family !erapy propuseram uma alternativa 
denominada posição “do não-saber”. Neste caso, o terapeuta se 
deixa guiar por uma intensa curiosidade a respeito do que di-
zem os clientes e de como eles constroem seu mundo. Tais tera-
peutas não abandonam todo o conhecimento prévio, mas veem 
as experiências dos clientes como possíveis recursos para en-
riquecer o discurso terapêutico. Sobretudo, o terapeuta desen-
volve sua sensibilidade com relação aos novos signi"cados, que 
podem ser construídos a partir das percepções que os clientes 
trazem para a terapia. A mudança cresce a partir das realidades 
do cliente. 
A título de ilustração, considere uma família cujo pai pareça 
ser um tirano. Um terapeuta que adota a postura do “saber” po-
derá rapidamente concluir que esse pai esteja expressando um 
distúrbio de personalidade, o que está provocando uma resistên-
cia rebelde em seus "lhos. Ainda que isto pareça bastante razoá-
vel, o terapeuta que adota a posição do “não-saber” consideraria 
esta hipótese como apenas uma das interpretações possíveis. Ao 
explorar curiosamente o mundo em que o suposto tirano vive, 
é provável que se revelem outras possibilidades. Por exemplo, 
o pai pode revelar que se envergonha por seu nervosismo e que 
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61
gostaria de ser capaz de expressar mais abertamente seu amor 
pelos !lhos. Com esta mudança na conversa, a terapia poderá 
transformar-se. Ao invés de procurar compreender porque papai 
é sempre tão mau, os familiares poderão encontrar formas me-
lhores para se relacionar com ele, que encontrará novas formas 
de se expressar. 
Passemos agora a um segundo local de prática construcionis-
ta: a organização.
A construção social e a e!cácia organizacional
O sucesso de qualquer organização ou empresa depende, subs-
tancialmente, da capacidade de seus membros para uma e!caz 
negociação de signi!cados. Equipes deixam de ser e!cientes 
quando seus membros estão em con"ito, quando os líderes dei-
xam de liderar, quando ninguém entende ou valoriza o que os 
líderes dizem. Assim, não surpreende o fato de que as ideias do 
construcionismo social venham exercendo grande in"uência no 
trabalho organizacional.
Acadêmicos construcionistas vêm destacando que as em-
presas se assemelham a pequenas culturas, e a forma como 
essas culturas são vinculadas entre si tem a ver com o compar-
tilhamento de hipóteses quanto ao que é real e bom. As nar-
rativas de uma cultura são de vital importância, e são particu-
larmente decisivas aquelas que criam um sentido coletivo de 
história e de destino. A maioria dos leitores pode reconhecer 
o poder das histórias em sua família (as bizarrices do vovô, os 
estranhos bolos de aniversário da mamãe, as travessuras do 
cachorro) na criação do significado “nossa família”. Com as 
organizações é bastante semelhante. As histórias podem su-
Construcionismo Social
62
gerir que, através da coragem, perspicácia e do trabalho duro 
evidenciado no passado, o fato de trabalharem juntos pode 
levar a grandes realizações. Vamos analisar duas outras recen-
tes contribuições das ideias construcionistas para as práticas 
organizacionais. 
Da liderança individual à liderança relacional
Quando se pensa num líder famoso, provavelmente se imagina 
um único indivíduo – via de regra do sexo masculino –, abençoa-
do e dotado de habilidades especiais, de sabedoria ou de poder de 
persuasão. De fato, muitos estudos tradicionais sobre liderança or-
ganizacional abraçam a visão do líder como o “Grande Homem”. 
A partir dessa perspectiva, os líderes exercem uma in!uência so-
bre seus liderados, e líderes e"cazes são aqueles que inspiram e 
comandam de maneira a gerar o sucesso organizacional. 
Entretanto, para os construcionistas, essa visão de liderança 
é profundamente falha, pois deixa de considerar a maneira pela 
qual o signi"cado é criado no contexto das relações. Ninguém 
poderá atuar como líder se não se associar a outras pessoas no 
processo de criação de signi"cado. Quando os líderes da ex-
União Soviética controlavam as principais instituições do país, o 
governo entrou em colapso sem que houvesse ocorrido um con-
!ito. O povo não aceitava a realidade construída pelo pessoal de 
cima porque as pessoas haviam negociado uma outra construção 
do destino de seu país. 
Sensíveis à coconstrução de signi"cados e ansiando por melhorar 
a qualidade de vida nas organizações, tanto os teóricos quanto os prá-
ticos hoje se veem atraídos por novas visões de liderança, elaborando 
conceitos e práticas em que a liderança é um processo relacional. 
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63
Um dos mais ricos relatos de liderança relacional pode ser en-
contrado no livro de Wilfred Drath: !e Deep Blue Sea: Rethinking 
the Source of Leadership (O profundo mar azul: repensando a fonte 
da liderança). A liderança relacional surge quando pessoas criam, 
através do diálogo, papéis e atividades de liderança. Nas palavras de 
Drath, entende-se por liderança “não algo que seja propriedade do 
líder, mas um aspecto da comunidade” (pg. XVI). Ao invés de um 
único indivíduo estabelecer programas e objetivos, estes se con!-
guram através de diálogos entre as partes envolvidas. 
Vamos pensar na maneira como funciona um grupo de ami-
gos. Na maioria dos casos, todos os participantes têm o direito 
de se pronunciar quanto ao que o grupo deseja fazer. De vez em 
quando os amigos poderão designar um dos membros como “lí-
der” do grupo. Diferentes amigos apresentarão diferentes habili-
dades ou recursos especiais. Assim, a contínua negociação é vital 
para que a amizade perdure. A aplicação de uma perspectiva rela-
cional à liderança tem implicações revolucionárias. Por exemplo, 
se abandonarmos o modelo do líder como um visionário obce-
cado, perceberemos maior participação dos demais membros do 
grupo, que deixarão de simplesmente executar ordens e de espe-
rar com indiferença as horas passarem. Em vez disso, por seu en-
volvimento pessoal nas políticas e práticas de seu grupo, eles es-
tarão completamente engajados. Elogios e críticas também serão 
distribuídos de maneira mais uniforme. Por exemplo, o salário 
de um CEO, em média, é mais de 500 vezes maior que o salário 
médio de um de seus funcionários, que recebem por hora de tra-
balho. Este é o resultado do modelo de liderança do herói indivi-
dual. Se um CEO fosse considerado como parte de um processo 
relacional, os salários seriam distribuídos mais equitativamente e 
o CEO seria menos culpabilizado pelos insucessos. Além disso, 
Construcionismo Social
64
a ética organizacional poderia melhorar, pois os delitos tendem 
a acontecer quando somente alguns indivíduos tomam decisões 
organizacionais a portas fechadas. Com o diálogo amplo, é mais 
fácil fazer prevalecer as convenções comuns de honestidade.
liderançarelacional em ação
Barbara Waugh é considerada uma líder de visão na atual indústria 
da computação. Por mais de 17 anos, foi Gerente de Recrutamento da 
empresa Hewlett-Packard, e agora encabeça uma iniciativa cuja meta 
é levar as oportunidades da Internet ao mundo em desenvolvimento. 
Barbara Waugh também é uma líder que utiliza forte orientação re-
lacional em seu trabalho, e citamos aqui um trecho de seu livro !e 
Soul in the Computer (A alma no computador):
Sem os meus relacionamentos pessoais e pro"ssionais, dentro e 
fora da empresa, nada em minha vida teria se realizado... A pró-
pria HP é um bom exemplo do poder das relações. A empresa 
foi fundada com base numa relação de amor e de respeito entre 
duas pessoas. Não se trata de uma companhia Hewlett ou de uma 
 Packard, mas da Cia. Hewlett-Packard. A ordem dos nomes não 
foi decidida pela superioridade ou pela inferioridade de cada um, 
mas pelo simples lançar de uma moeda quando os dois jogaram 
cara ou coroa. A empresa cresceu através de centenas de relacio-
namentos signi"cativos, e não apenas pelas relações entre os pares, 
mas também por relações envolvendo postos hierárquicos tanto 
para cima como para baixo...
Não podemos criar ou manter relacionamentos se não estivermos 
dispostos a ouvir com atenção. Ouvir totalmente, sem estar prepa-
rando a próxima observação, sem pensar em reabastecer o carro 
no caminho de volta para casa ou se o "lho conseguiu uma boa 
nota na prova de matemática. Devemos obrigatoriamente desligar 
a incessante “máquina de julgar” que nos impele a decidir quem é 
o mais sabido, o mais correto, o que tem as maiores probabilidades 
de sucesso. Precisamos ver-nos uns aos outros, porque, ao fazer-
mos isso, coisas mágicas acontecem e são muito maiores do que 
podería mos imaginar (p. 200-201).
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65
Investigação apreciativa: inspirando a mudança organizacional
No mundo das empresas são frequentes as referências a “pro-
blemas”. Ouvimos as pessoas dizerem “Temos um problema com 
o Marketing”, “Nosso diretor executivo não tem imaginação”, “Os 
funcionários estão insatisfeitos”, e assim por diante. Imagina-
mos que, se todos os problemas fossem resolvidos, a organização 
funcionaria perfeitamente. Mas será assim mesmo? Quando nos 
concentramos nos problemas individuais, perdemos de vista o 
todo e nossos olhos deixam de focalizar o futuro. Começamos 
a encontrar falhas uns nos outros, tornamo-nos descon!ados e 
adotamos uma posição defensiva. O sonho organizacional parece 
ser sempre adiado, pois os problemas que precisam ser solucio-
nados não têm !m.
Em uma perspectiva construcionista, falar de problemas é algo 
opcional e somente existirão problemas se construirmos o mundo 
dessa forma. Como falar de problemas frequentemente nos desvia 
de nossas metas, podemos perguntar se existem outras formas de 
conversa ou de diálogo que sejam mais e!cazes para a organização. 
Um grupo de especialistas organizacionais nos respondeu com um 
vigoroso “Sim!”. Esse meio poderoso para mobilizar grupos e or-
ganizações chama-se Investigação Apreciativa – IA (“Appreciati-
ve Inquiry” – AI). Este método é uma alternativa às abordagens 
da mudança organizacional focadas em problemas. Aqueles que 
praticam o método da Investigação Apreciativa criam uma visão 
de mundo que prefere enxergar um copo “meio cheio” ao invés 
de um copo “meio vazio”. David Cooperrider, um de seus criado-
res, descreve: “A única coisa mais produtiva que um grupo pode 
fazer, se estiver conscientemente buscando construir um futuro 
melhor, é descobrir o ‘núcleo positivo’ de qualquer sistema para 
depois transformá-lo em propriedade comum e explícita de to-
Construcionismo Social
66
dos.” Cooperrider enfatiza a importância do foco nas forças e nos 
recursos de uma organização, e não em suas áreas problemáticas. 
Ao explorar o núcleo positivo do sistema humano, quanto mais 
os membros do grupo participarem, melhor, mais profundo, e 
mais duradouro será o processo de mudança. No sistema da In-
vestigação Apreciativa, descobrem-se as realidades relacionais do 
grupo. Através do diálogo e da conversa formam-se novas relações, 
e o futuro da organização começa a emergir através desses rela-
cionamentos. Numa sessão clássica de Investigação Apreciativa, os 
membros da empresa são separados em pares e recebem instruções 
para compartilhar histórias a partir desse núcleo positivo. Os par-
ticipantes descobrem os melhores momentos da vida organizacio-
nal. São histórias que dizem respeito, basicamente, às experiências 
na organização nas quais os participantes puderam experimentar 
um sentido de realização, energia e prazer. As histórias podem, por 
exemplo, referir-se a um projeto bem-sucedido do qual aquele que 
narra tenha participado ou a um projeto com o qual os partici-
pantes tenham se sentido altamente estimulados. Essas histórias 
podem ser posteriormente compartilhadas com grupos maiores, 
com o propósito fundamental de extrair delas os elementos da or-
ganização que conferem vida, vitalidade e força às narrativas. 
Ao compartilharem histórias positivas, os participantes come-
çam a discutir o futuro da organização e de que modo poderão tirar 
o máximo proveito desses reservatórios de vitalidade. Com o es-
tabelecimento de uma visão nova e convincente, põem em prática 
planos para propiciar as mudanças desejadas. O processo colabora-
tivo como um todo geralmente desperta entusiasmo e boa vontade, 
além da determinação de realizar grandes feitos. Primordialmente, 
a Investigação Apreciativa assenta as raízes do futuro nas terras do 
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67
passado; os participantes não compartilham apenas “castelos no ar”, 
mas fazem uso do melhor de suas realizações passadas para gerar 
possibilidades realistas e idealistas para o futuro. Durante o proces-
so, são os aspectos colaborativos e relacionais que conferem poder 
ao esforço de mudança, uma vez que através do diálogo e do ato de 
compartilhar, nascem no âmbito do sistema organizacional novas 
realidades que possibilitam uma mudança positiva duradoura. Os 
princípios fundamentais da metodologia da Investigação Apreciati-
va baseiam-se no enfoque da construção social.
Apesar de muitos projetos de Investigação Apreciativa serem rea-
lizados no ambiente corporativo, existem inúmeras outras aplicações 
deste modelo em escolas, igrejas, ONGs e comunidades, bem como 
na vida privada. Alguns praticantes da metodologia IA, tais como 
Jane Watkins e Ralph Kelly, organizam workshops para ajudar as 
pessoas a redescobrir o brilho da paixão que as levou a se casarem; 
o workshop ajuda a estimular relacionamentos amorosos através da 
exploração da positividade. Outros promovem workshops que aju-
dam as pessoas a desenvolverem práticas de liderança e estilos de 
vida pessoais baseados em princípios apreciativos. Consulte as re-
ferências bibliográ!cas no !nal do livro para informações a respeito 
de oportunidades de aprendizado e leituras adicionais sobre Investi-
gação Apreciativa. Passaremos agora a um terceiro contexto onde as 
práticas construcionistas estão "orescendo: a educação.
O construcionismo e a sala de aula
Como professores de Psicologia, notamos que as ideias constru-
cionistas têm efeitos admiráveis sobre nossas práticas de ensino. 
Por exemplo, procuramos, sempre que possível, substituir pa-
lestras por diálogos com os alunos. Por quê? Porque o conceito 
Construcionismo Social
68
tradicional de ensino se vê prejudicado por sua base individua-
lista e pela falha de não reconhecer a produção relacional do 
signi!cado. Assim, não consideramos mais como nosso dever 
“despejar conhecimento sobre nossos alunos”. Ao invés disso, le-
vamos para a sala de aula aquilo que enxergamos como recursos 
que capacitarão os alunos a se envolverem em novos diálogos. 
Entretanto,também acreditamos que os alunos tragam consigo 
relatos úteis do real, do racional e do bom. Através do diálogo 
eles poderão fazer uso de suas habilidades e gerar conversas que 
sejam de valor; ao mesmo tempo, devem aprender a levar em 
consideração o que os outros (inclusive nós, professores) têm a 
dizer. Se a classe for respeitosa e receptiva, os alunos se sentirão 
estimulados e se engajarão. Através do diálogo, terão maior pro-
babilidade de incluir em suas perspectivas pessoais o que temos 
para oferecer a partir da nossa tradição de conhecimento. Tam-
bém aprendemos com eles, de forma que o processo de ensinar e 
o de aprender converge.
Naturalmente não estamos sós em nossa tentativa de colocar 
ideias construcionistas para funcionar na sala de aula. Vamos ex-
plorar agora dois movimentos bastante ativos em Educação que 
foram favorecidos pelas ideias construcionistas. 
Pedagogia crítica e além
Embora políticos e administradores de escolas costumem de-
clarar que a “boa educação” é isenta de vieses políticos ou ideoló-
gicos, o construcionista entende que a educação é inerentemente 
política. Assim, a exigência de pro!ciência em inglês declara que 
todos devem obrigatoriamente falar um idioma, ao que muitos 
nomeariam como idioma dos privilegiados. O simples fato de 
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69
eliminar o ensino de religião das escolas passa a ideia de uma so-
ciedade essencialmente secular. E, de modo mais sutil, favorecer 
métodos experimentais para estudar o comportamento humano 
signi!ca que entendemos melhor os outros se formos desapaixo-
nados e manipuladores. 
Não estamos querendo dizer que o vínculo entre a educação 
e os preconceitos e juízos de valor seja perigoso ou deva ser evi-
tado. Com efeito, muitos dos vieses de nossos currículos e pro-
gramas sustenta as formas de vida preferidas pela maioria (geral-
mente, é apenas nos casos em que não sustentam a nossa forma 
de vida que talvez sejam reconhecidos como vieses!). O fato de 
um professor insistir para que os alunos votem não é considerado 
um viés, mas se ele insistisse para que os alunos votassem pelo 
Partido Democrata, aí sim seria um viés. No entanto, do ponto 
de vista construcionista, podemos também atribuir valor ao fato 
de adquirir uma percepção com relação a esses vieses, compreen-
dendo quem está sendo privilegiado e quem é tornado invisível 
por eles. Ao fazer isto, podemos começar a enxergar alternativas. 
Se prestarmos atenção em quem mais se pronuncia nas discus-
sões em classe e quem !ca mais calado, podemos aprender algo a 
respeito de vozes silenciosas ou ausentes e de como habilitar essas 
vozes silenciosas para que se expressem. 
Há muito tempo essas preocupações vêm se re"etindo no 
movimento pedagógico crítico, bastante inspirado pelo livro de 
Paulo Freire, Pedagogia do oprimido. Freire se preocupava par-
ticularmente com a estrutura de muitos sistemas educacionais 
que basicamente preparam as classes menos privilegiadas para 
vidas de silenciosa servidão. Desde então, vários outros críticos 
vêm se concentrando especialmente nos preconceitos de raça 
Construcionismo Social
70
e gênero embutidos nos currículos e métodos escolares. Em-
bora seja vital evidenciar os preconceitos de classe, de raça e 
de gênero implícitos em nossas tradições de conhecimento, o 
construcionismo convida a darmos outros passos. Em primeiro 
lugar, é preciso expandir as sensibilidades críticas, de modo que 
todas as pessoas, oriundas de todas as tradições, possam com-
preender melhor as lacunas e os silêncios presentes em nossas 
práticas educacionais. Raramente os preconceitos se limitam à 
classe, raça e gênero. Eles também são relativos à religião, pre-
ferência sexual, conhecimentos de habilidades tradicionais (por 
exemplo, redação, música, esportes) e muitas outras questões. 
Começamos a ter que lidar com as múltiplas realidades que 
constituem o maior desa!o da educação. 
Além disso, o construcionista nos incentiva a substituir a crí-
tica antagonista pelo diálogo. Uma coisa é acreditar que nossa 
tradição seja oprimida, mas deixar-nos subjugar pelo opressor é 
bem diferente. O opressor também carrega uma tradição de valo-
res, e, se colocássemos todas as tradições umas contra as outras, 
a vida seria abominável, embrutecida e breve. Como não existem 
meios de!nitivos para julgar as tradições, é importante adqui-
rir habilidades para nos envolver na exploração mútua. Nesse 
contexto, o construcionismo solicita que nos conscientizemos 
dos limites da crítica. Ao enfatizarmos as de!ciências, estaremos 
solidi!cando suas realidades: enxergaremos apenas o negativo, 
e praticamente nada além. Portanto, há um bom motivo para 
complementar as práticas críticas com explorações de positivi-
dade; quando também reconhecemos o que é positivo em outra 
tradição, a exploração mútua tem maior probabilidade de gerar 
novas formas de vida.
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71
Aprendizado colaborativo
O ensino tradicional segue uma orientação individualista, pois 
espera melhorar a mente de um único indivíduo: julga-se o aluno 
por seu “trabalho individual” e as notas são atribuídas individual-
mente. Entretanto, as ideias construcionistas vão levantar questões 
a respeito do individualismo, tanto como uma visão das pessoas 
quanto uma ideologia política. Já argumentamos aqui que o que 
chamamos de “pensamento” individual é de fato um subproduto da 
imersão de alguém nas relações. Se não estivermos equipados com 
uma linguagem de justiça ou de responsabilidade, como poderemos 
pensar nessas questões? E, se considerarmos o indivíduo como a 
unidade básica da sociedade, criaremos uma cultura de isolamento 
e alienação. Por outro lado, se tudo que considerarmos real, lógico 
e desejado, for subproduto da relação, passa a fazer todo sentido 
colocar o processo relacional no centro da prática educacional.
um diálogo sobre práticas pessoais 
ken: Eu gosto desses desdobramentos do Construcionismo em prá-
ticas pro!ssionais, mas você sabe que as ideias construcionistas tam-
bém permeiam a vida pessoal de forma signi!cativa. Talvez fosse útil 
que os leitores pudessem perceber as práticas construcionistas nos 
relacionamentos cotidianos.
mary: Isto é algo que também me parece importante. Ocorreu-me 
uma brincadeira de nós dois a respeito da minha irritação quando 
você chegava tarde para jantar e eu perguntava, em tom acusador, 
por que você tinha chegado àquela hora, ao que você gentilmente 
respondia com a pergunta: “Que desculpa você prefere que eu dê?” 
Depois dessa resposta, era impossível manter o meu papel de espo-
sa magoada e eu caía numa gargalhada. Percebi que você estava me 
lembrando de que há vários modos de construir a realidade e que 
você estava procurando um modo que nos levasse de volta a um bom 
relacionamento.
 
Construcionismo Social
72
ken: Pois é, também me lembro de uma ocasião em que eu cheguei 
em casa, depois do trabalho, de mau humor. Bastou que eu entrasse 
para contaminar o ambiente. Decidimos então que essa não era uma 
boa realidade de vida, e você me pediu que eu saísse e tornasse a 
entrar. A segunda vez foi muito melhor. Desta forma pudemos des-
construir o primeiro encontro e abrimos caminho para um segundo 
encontro mais construtivo. 
mary: Ajuda muito saber que, se criamos um mau momento entre 
nós, esse momento é tão somente uma forma de ser, o resultado de 
uma maneira de construir o mundo e de nos construir um ao outro, 
sendo possível, portanto, buscar alternativas. 
ken: O que me parece maravilhoso, pois, quando eu por alguma 
razão me sinto desanimado, você pode me indicar maneiras de re-
construir positivamente a situação. Você reaviva minha percepção de 
mundo e minhas energias, e eu lhe sou imensamente grato por isso. 
mary: Estou sempre à procura de maneiras que me permitam es-tar de bem com a vida. Isso foi especialmente importante para mim 
em momentos de doenças graves. Também é importante na maneira 
como me relaciono com os outros, inclusive as crianças, colegas, ami-
gos. Sentimentos ruins são resultado de construções ruins, e, como 
nenhuma construção é a Verdadeira, elas podem ser substituídas. O 
desa!o consiste em encontrar a forma de substituir essas construções 
por outras que permitam que nos sintamos bem. Devo dizer que con-
versas com outras pessoas podem ser de grande valia na reformula-
ção dos signi!cados da vida. 
Os educadores estão se voltando cada vez mais para a orienta-
ção relacional, e um resultado importante é o aprendizado colabo-
rativo, ou seja, a aprendizagem com outros e através dos outros. 
Os tipos de práticas dialógicas que discutimos anteriormente são 
apenas um exemplo disso, e talvez a mudança mais festejada rumo 
ao relacional seja a escrita colaborativa. Desde os estudos do ensi-
no fundamental até a universidade, os professores vêm passando 
de tarefas de redação individual à escrita colaborativa. 
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73
Na escrita colaborativa, os alunos formam pares ou peque-
nos grupos, mas sempre trabalhando juntos para produzir um 
trabalho !nal. Como os professores vêm a descobrir, o processo 
colaborativo aproveita as forças e habilidades de todos os mem-
bros do grupo. Alguns alunos podem, por exemplo, ser bons 
em abstrações, enquanto outros talvez ofereçam boas histórias 
que podem ser usadas para ilustrar ideias; alguns podem ter 
percepções estranhas ou inusitadas, enquanto outros podem 
contribuir dando entusiasmo ao grupo; cada um dá uma contri-
buição especial e única ao todo. Além de permitir que os alunos 
contribuam a partir de uma posição de potência e força, os alu-
nos também aprendem uns com os outros. O aluno conceitual 
aprende com o aluno entusiasmado e assim por diante. Além 
disso, todos podem se bene!ciar ao adquirir percepções a partir 
das diversas vozes de avaliação incluídas no trabalho. Assim, 
também estarão mais adequadamente preparados para atuar de 
maneira colaborativa na vida futura. Vamos agora passar para 
um último contexto onde as práticas construcionistas são extre-
mamente valiosas.
Confrontando o con!ito de maneira construtiva
Con"itos estão presentes em todo o mundo – muitos deles são 
apavorantes, outros tantos são devastadores. Por que o con"ito é 
tão prevalente e como podemos construir formas mais sustentá-
veis de vida? Estas, certamente, são perguntas muito antigas, as-
sim como a história das tentativas de reduzir con"itos. Embora o 
construcionismo não ofereça promessas concretas a esse respeito, 
ele oferece um ponto de vista e um rumo às práticas de redução 
de con"itos.
Construcionismo Social
74
Para os construcionistas, a maioria dos con!itos humanos 
pode ter suas origens identi"cadas no processo de produção de 
sentido. À medida que as pessoas se coordenam entre si, também 
geram linguagens compartilhadas sobre o real e o bom. Essas lin-
guagens encontram-se imbricadas em seus costumes e conven-
ções. Ao mesmo tempo, essa criação do “nós” e do “nosso modo” 
cria um domínio externo do “eles” e do “modo deles”. Em geral, 
as pessoas, no âmbito de uma tradição, veem os que estão de fora 
como equivocados, inferiores ou indesejáveis. Na pior das hipó-
teses, as pessoas de fora são vistas como inimigas. Desta forma, 
quando compartilhamos as mesmas opiniões a respeito do real 
e do bom, prevalece a harmonia. Mas quando você “vê do seu 
jeito” e eu “vejo do meu jeito”, encontramo-nos diante da possi-
bilidade do “ou eu ou você”. É como #omas Cleveland escreve 
na obra Natural History (História natural) “...aqueles que provo-
cam guerras geralmente parecem acreditar na maior correção do 
rumo escolhido. É esta capacidade que torna os seres humanos 
uma espécie tão perigosa”. 
Ao abordar o con!ito do ponto de vista construcionista, evita-
se a questão de quem está certo ou quem está errado. Se o nosso 
objetivo é sair do con!ito, a questão central é como fazer conver-
gir domínios de signi"cado divergentes. Em virtude da centrali-
dade da linguagem na construção das realidades con!itantes, da-
mos atenção particular ao diálogo. Será que não existem formas 
de falarmos uns com os outros que permitam uma convivência 
mais amigável?
Esta ênfase no diálogo não é novidade, mas o construcionismo 
nos pede para olhar além dos conteúdos con!itantes dos discur-
sos – considerando as formas da fala: como as coisas são ditas, o 
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75
que se enfatiza, onde se estão os silêncios e assim por diante. Por 
exemplo, se discordamos de algo podemos provocar uma discus-
são. Mas a discussão como forma de conversa nos contrapõe ao 
outro; um lado deve vencer, e o outro, perder. A discussão é, em 
geral, uma “guerra por outros meios”. Então, quais seriam as alter-
nativas a uma discussão para resolver problemas?
O projeto Conversas Públicas
Uma prática muito promissora, desenvolvida por um grupo 
de terapeutas de família da área de Boston, se chama “Projeto 
Conversas Públicas”. A preocupação principal do grupo de te-
rapeutas era o rancor e a violência suscitadas pela discussão da 
questão do aborto, tanto em Boston quanto no país como um 
todo. Com boas pessoas de ambos os lados, todas contundentes 
e intensas em suas reivindicações quanto ao direito moral, e o 
aumento da frequência de homicídios e atividades terroristas, 
a necessidade de novas conversas era premente. A resposta do 
Projeto Conversas Públicas foi criar de uma forma de diálogo 
que não levasse ao ataque, à humilhação ou ao desejo de vin-
gança. O processo de escolher e reunir pessoas e ajudá-las a 
conversar é cuidadosamente planejado. A seguir, um panorama 
do processo. 
Numa noite qualquer, os representantes dos grupos antagôni-
cos são convidados a se reunir. Ao invés de serem postos imedia-
tamente em debate, os grupos primeiro jantam juntos. Durante 
a refeição, não são permitidas conversas sobre os problemas que 
os fazem divergir, e, com efeito, nessa etapa não há como os par-
ticipantes possam identi!car os respectivos posicionamentos dos 
demais. Desta forma, o jantar prossegue com conversas a respeito 
Construcionismo Social
76
de temas e assuntos de interesse geral, como trabalho, crianças, 
o tempo etc. Via de regra, costuma prevalecer o sentimento de 
que todos têm em comum a mesma natureza humana. Quando 
tem início o debate, os facilitadores insistem que os participantes 
falem mais de suas experiências pessoais, ao invés de trocar con-
ceitos e noções mais do que conhecidos por ambas as partes. Eles 
são convidados a narrar as histórias pessoais que tenham relação 
com seus posicionamentos. Muitas vezes, os participantes falam 
da dor ou do sofrimento que vivenciaram a respeito da questão 
em discussão e, apesar de poderem !car na defensiva quando o 
debate é baseado em princípios, as pessoas são capazes de ouvir 
as histórias dos outros com compaixão. O resultado é que come-
çam a entender emocionalmente porque seus oponentes se sen-
tem da forma como se sentem. Num outro momento os partici-
pantes serão convidados a falar de suas “áreas cinzentas”, ou seja, 
das dúvidas e incertezas a respeito do próprio posicionamento. 
Assim, começa a se delinear uma segunda voz, uma voz que !ca 
mais parecida com a voz do oponente. 
Um dos resultados dessa conversa cuidadosamente orquestra-
da, que em geral inclui de seis a dez participantes, costuma ser a 
desintensi!cação do con"ito. Embora não se peça aos participan-
tes que mudem de opinião (de fato não mudam), as razões dos 
opositores conseguem ser entendidas com maior benevolência. 
Além disso, em algumas situações os participantes começam a 
construir novas possibilidades. Por exemplo, no caso do deba-
te “pró-vida”versus “pró-aborto”, os participantes concordaram 
em trabalhar juntos para evitar situações em que o aborto pu-
desse se tornar uma opção. Uma vez, chegaram a combinar de se 
avisarem em casos de perigo iminente. Alguns participantes se 
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77
 entusiasmaram com essas conversações de tal maneira que vol-
taram a se reunir posteriormente para continuar a conversar. Por 
meio da remodelagem de uma determinada forma de conversa, o 
ódio mútuo deu lugar à investigação colaborativa. A abordagem 
construcionista para a resolução de con!itos entende que nenhu-
ma das partes é dona da verdade e que há vários aspectos de um 
determinado problema. O diálogo conjunto pode construir novas 
soluções de forma criativa.
Foco do Capítulo
As práticas terapêuticas, de mudança organizacional, educação e 
redução de con!itos da comunidade foram todas estimuladas por 
ideias construcionistas. Destacamos aqui as práticas da terapia nar-
rativa. Nas práticas de mudança organizacional, examinamos a li-
derança relacional e a Investigação Apreciativa. Dentre as práticas 
educacionais, destacamos a pedagogia crítica e as abordagens do 
aprendizado colaborativo. Através do diálogo e, particularmente, 
através do Projeto Conversa Pública, apresentamos formas de mini-
mizar con!itos. Poderíamos também escrever sobre novas práticas 
de aconselhamento, assistência social, religião e outros. Con"amos 
que nossa discussão estimule o leitor a também localizar outras áreas 
onde essas ideias possam inspirar inovação. O futuro é moldado a 
partir das relações.
79
Capítulo 4 
 
 
A pesquisa como 
prática de construção
Muitas de nossas hipóteses tradicionais a respeito do conhecimento 
e da prática de pesquisa são desa!adas pelas ideias construcionis-
tas. Neste capítulo apresentaremos inicialmente algumas das mais 
importantes mudanças de entendimento promovidas pelo constru-
cionismo. Em seguida, apresentaremos algumas aplicações dessas 
ideias na pesquisa em ciências sociais. Se o construcionismo oferece 
uma visão alternativa do conhecimento, qual a sua repercussão nas 
formas como procuramos conhecer os outros e a nós mesmos?
Reconstruindo práticas de conhecimento 
A busca por conhecimento sempre esteve intimamente associada 
à busca da Verdade. Contrastando com esta tradição, os cons-
trucionistas entendem o conhecimento como produto de deter-
minadas comunidades, sendo orientado por hipóteses, crenças e 
valores particulares. Não existe uma “Verdade para todos”, mas 
uma “verdade no âmbito de uma comunidade”. Pessoas que são 
chamadas de “ignorantes” não são destituídas de todo saber; elas 
simplesmente não fazem parte da comunidade que as considera 
ignorantes e funcionam com um tipo diferente de conhecimento. 
Assim, professores de matemática não sabem mais do que joga-
dores de basquete, da mesma maneira que historiadores não sa-
bem mais do que pedreiros. O saber de cada grupo funciona de 
forma diferente e atende a diferentes !nalidades. Esta mudança 
para a perspectiva da pluralidade de saberes prepara o caminho 
Construcionismo Social
80
para lançarmos outros desa!os construcionistas às tradicionais 
formas de produção de saber.
Perturbando as fronteiras entre as disciplinas 
As disciplinas do conhecimento cientí!co, tais como a Quími-
ca ou a Geologia, estão bastante assentadas na ideia de que existe 
uma verdade objetiva sobre o mundo e que tal verdade pode ser 
descoberta. De acordo com esta tradição, cada disciplina possui 
objetos de estudo especí!cos (por exemplo, os elementos quími-
cos, as espécies animais, a economia, a mente) e cada uma requer 
métodos de pesquisa especializados (experimentos, equipamen-
tos de laboratório, análises de amostras). Esta orientação levou à 
formação de verdadeiras ilhas de produtores de conhecimento, 
que raramente se comunicam entre si e que di!cilmente são in-
teligíveis pelo público em geral. Na maioria dos campi univer-
sitários, cada departamento é alojado num edifício especí!co, 
separado dos demais, e seus habitantes raramente visitam seus 
vizinhos. Os que se encontram nas “torres de mar!m” vão buscar 
menos ainda comunicar-se com o público de fora.
O construcionismo coloca em xeque esse isolamento, porque 
para o construcionista os objetos de pesquisa são construídos pe-
las comunidades de produção de conhecimento a que pertencem. 
As comunidades criam a realidade da química, da psicologia, da 
física, da economia e assim por diante. Como propôs o famoso 
historiador da ciência "omas Kuhn, as comunidades desenvol-
vem “paradigmas”, sendo que um paradigma é constituído pelo 
conjunto compartilhado de hipóteses, métodos, formas de escrita, 
recompensas etc. que mantém a comunidade unida. Paradigmas 
são os “motores” de produção de sentido numa comunidade, e, 
circunscritos nesses paradigmas, os problemas importantes para a 
A pesquisa como prática de construção 
81
comunidade serão resolvidos. Embora existam importantes van-
tagens no âmbito desses paradigmas, também existem limitações. 
Muitas vezes o paradigma funciona como uma venda, porque im-
pede a visão além dele mesmo. Se a sua realidade for “material”, 
por exemplo, qualquer pessoa que falar de “espírito” parecerá não 
fazer absolutamente o menor sentido. Se seu paradigma o desa!ar 
a produzir a !ssura de um átomo, algo que poderia ser útil para 
fabricar uma bomba, perguntas a respeito do bem e do mal das 
guerras parecerão irrelevantes, pois tais perguntas pertencem ao 
reino da política ou da religião, mas não à ciência como tal. 
Portanto, o construcionista tem o desa!o de embaralhar as 
fronteiras entre as disciplinas. Nosso maior bem-estar vem do diá-
logo cruzado, o tipo de diálogo que permite a intersecção de múlti-
plas realidades e de múltiplos valores. A falta de compartilhamento 
ocasiona a cegueira para os valores e para o potencial de tradições 
alternativas. Seria também importantíssimo fazer as disciplinas es-
colares dialogarem com a cultura circundante. Todas as partes se 
bene!ciam através desse tipo de encontro; e mais: o trabalho aca-
dêmico e cientí!co tem maior probabilidade de tratar de questões 
que são signi!cativos para a sociedade. Este aspecto está intima-
mente relacionado com o argumento que discutiremos a seguir. 
Investigando utilidade e valor
Na perspectiva construcionista, a pesquisa cientí!ca que se inse-
re em um determinado paradigma pode ser muito valorizada pela 
comunidade comprometida com o mesmo. Os economistas apre-
ciarão os resultados de uma modelagem econômica, assim como os 
neurocientistas terão grande interesse nos resultados da pesquisa de 
neuro-imagem. Entretanto, os construcionistas também nos pedem 
para considerar a utilidade dessas linguagens e seus resultados fora 
Construcionismo Social
82
dos limites da comunidade. De que maneira a pesquisa econômica 
ou de neuroimagem pode contribuir (ou eventualmente prejudicar) 
as vidas das pessoas em geral? Será que as pessoas de fora das disci-
plinas têm o direito de emitir sua opinião a esse respeito?
Essas são essencialmente questões de atribuição de valor. Que 
formas de vida queremos incentivar? O que desejamos para nos-
sos !lhos e netos? Os historiadores, por exemplo, têm a incum-
bência de relatar a verdade sobre a História. Mas como deveria 
ser descrita a história do Oriente Médio? Dependendo de quem a 
estiver narrando, em que época e com que propósito, ela pode ser 
narrada de muitas maneiras diferentes. Alguns relatos favorecerão 
a religião islâmica, outros não. Algumas narrativas dirão que as 
nações islâmicas não conseguiram embarcar na era da tecnologia, 
enquanto outras a!rmarão que as nações islâmicas conseguiram 
resistir à deterioração de suas tradições. Não há como escapar de 
todas as tradições para escrever essa história e, enquanto estiver-mos envolvidos no con"ito entre os pontos de vista, o diálogo so-
bre essas questões será de importância vital. Se tudo o mais fracas-
sar, a alternativa poderá ser a mútua aniquilação.
Encorajando métodos múltiplos
A pesquisa tradicional pressupõe a existência de um mundo 
de objetos e eventos isolados do pesquisador; é também tarefa do 
pesquisador revelar suas características. Via de regra, isto signi-
!ca fazer uma medição minuciosa e precisa do assunto que está 
sendo pesquisado. Por exemplo, aqueles que acreditam que as 
“atitudes” existem nas mentes das pessoas desenvolvem pergun-
tas para “sondar as atitudes das pessoas”; os que acreditam no 
“processo econômico” podem usar eventualmente o PIB (Produ-
to Interno Bruto) como uma medida do progresso econômico. 
A pesquisa como prática de construção 
83
De fato, há uma crença predominante de que é possível encontrar 
a “verdade através do método”. 
Do ponto de vista construcionista, os métodos de pesquisa re-
!etem hipóteses e valores de uma determinada comunidade. Con-
sequentemente, os métodos não nos oferecem os re!exos da natu-
reza, mas criam o que acreditamos ser a natureza. Se os psicólogos 
valorizam algo chamado de “inteligência” e estão dispostos a de"nir 
certas ações (como resolver problemas verbais) como algo inteli-
gente, naturalmente podem desenvolver uma medida de inteligên-
cia denominada QI. No entanto, as respostas das pessoas a um teste 
de inteligência são apenas indicadores de inteligência congruentes 
com a visão de mundo dos psicólogos. Portanto, os testes de inte-
ligência não re!etem “diferenças de inteligência”. Eles constroem, 
mais propriamente, um mundo no qual essas diferenças de inteli-
gência parecem óbvias. O mesmo vale para as medidas da autoes-
tima, personalidade, funcionamento cognitivo e assim por diante.
Não estamos sugerindo que se abandonem os métodos de pes-
quisa tradicionais, apesar desta visão do poder dos métodos para 
criar realidades. Lembre-se de que toda verdade existe “no con-
texto de uma tradição” e que cada tradição sustenta certos valores. 
Assim, para atingir algumas "nalidades especí"cas, os métodos de 
pesquisa de uma determinada tradição podem agregar uma im-
portante contribuição. Se construirmos o mundo baseado em saú-
de física e doenças e quisermos evitar essas últimas, os métodos 
da pesquisa clínica serão de inestimável valor. Isto, porém, não faz 
com que a ciência médica seja Verdadeira, ou que seus métodos 
sejam superiores em todos os casos. É preciso estar de acordo com 
a tradição e seus valores. Geralmente temos poucas oportunida-
des para questionar esses valores, embora discussões a respeito 
do melhor método para testar a inteligência, por exemplo, sejam 
Construcionismo Social
84
comuns. Mas raramente se dá atenção à questão de se devemos 
ou não aceitar a noção de “inteligência”. Este conceito tem uma 
natureza altamente valorativa: promove certas pessoas às custas de 
outras. Mas não se costuma indagar que tipo de sociedade é cria-
da ao enquadrar todos os seus membros nessa escala de valores e 
a!rmar que cerca de metade dessas pessoas está abaixo da média.
Expandindo formas de expressão
A maior parte das pesquisas cientí!cas é comunicada aos pa-
res por meio de relatórios escritos. Para os que não são membros 
da comunidade cientí!ca, esses relatórios são frequentemente di-
fíceis de entender; mesmo algumas pessoas da própria comuni-
dade consideram-nos maçantes e complexos. Este estilo de escrita 
pode estar em parte relacionado com uma “tradição da Verdade” 
que privilegia declarações precisas acerca dos fatos e abomina os 
estilos retóricos que possam in"uenciar o leitor. Como se costu-
ma dizer, os cientistas devem manter a paixão fora de seus artigos 
de forma a não ofuscar os julgamentos do leitor. Entretanto, se 
entendemos a verdade como uma criação conjunta, essas exigên-
cias com relação aos textos deixam de ser obrigatórias. Em vez 
disso, !camos instigados a ver os textos cientí!cos como uma for-
ma de relação dentro de uma comunidade. 
À luz disso, podemos entender a tradicional escrita cientí!ca 
como apenas uma forma de expressão possível, útil para certos 
propósitos (por exemplo, para a comunicação e!ciente entre um 
grupo de elite de cientistas), ao mesmo tempo em que é limita-
da em outros aspectos. Por exemplo, se o texto cientí!co é diri-
gido apenas aos cientistas, as pessoas que se encontram fora do 
mundo da ciência não poderão participar do diálogo. As ciências 
 tornam-se exclusivistas. No campo das ciências sociais, onde ge-
A pesquisa como prática de construção 
85
ralmente os cidadãos comuns são objeto de pesquisa, esta crítica 
torna-se especialmente importante. As ciências sociais têm uma 
longa história de descobrir defeitos em vários grupos de pessoas, 
que são rotuladas de “não-inteligentes”, “de visão estreita”, “con-
formistas”, “de!cientes mentais”, “preconceituosos” e por aí vai. 
Porém, essas formas de descrição praticamente não oferecem 
qualquer espaço para que as “vítimas” desses julgamentos com-
preendam ou contestem tais descrições. 
Informados por essas discussões, muitos acadêmicos, particu-
larmente da área de ciências sociais, vêm experimentando novas 
formas de escrever. Através de novas formas, constroem-se novas 
realidades. Alguns pesquisadores usam sua “voz pessoal” para apre-
sentar suas pesquisas. Quando está escrito em primeira pessoa, o 
relato se torna mais convidativo à leitura e revela o engajamento 
de “corpo e alma” do cientista. Este tipo de texto também traz im-
plícito que o relato é uma construção e que outros podem lê-lo 
de maneira diferente. Já outros autores experimentam escrever em 
muitas vozes a !m de revelar diferentes perspectivas. Recentemen-
te, uma psicóloga da tribo Maori da Nova Zelândia incluiu em sua 
dissertação três vozes diferentes (e três tipos de fontes): uma voz 
cientí!ca (neutra e objetiva); uma voz pessoal (muito veemente); e 
uma voz Maori (escrita na linguagem de seu próprio povo).
Num caso fascinante, Karen Fox trouxe a voz de uma paciente se-
xualmente violentada pelo padrasto. Mas ela também entrevista este 
padrasto, que está na prisão por abuso sexual. E !nalmente, por ter 
sido ela mesma vítima de abuso sexual, inclui a própria voz. As três 
vozes "uem simultaneamente numa mesma página, de forma que 
o leitor não apenas possa vivenciar as múltiplas perspectivas, mas 
tenha um ganho adicional ao entender a situação através da justapo-
sição dessas vozes. Apresentamos a seguir um pequeno trecho:
Construcionismo Social
86
Ben: autor de abuso sexual
“Quando elas vieram morar 
comigo... Elas nunca tinham 
tido muita coisa. Elas, na 
maior parte das vezes, co-
miam panquecas... Eu as le-
vei a muitos lugares. O pai 
delas nunca tinha feito isso. 
Por isso, eu era muito mais 
presente.”
Sherry: vítima
“Ele nos deu uma vida que 
nunca havíamos tido antes. 
Eu só cheguei a comer car-
ne pela primeira vez aos 7 
anos de idade. Nós sobrevi-
víamos comendo panquecas 
e ovos. Ele nos deu um lar. 
Ele nos ensinou disciplina. 
Nós, crianças, não tínhamos 
freios... De qualquer forma, 
de modo algum suas boas 
ações superaram as más. Isso 
não desculpa o que ele fez. 
Eu sentia amor por ele, como 
se ele fosse um pai.” 
Karen: a pesquisadora
“A esposa, Betty Ann, diz que Ben e 
Sherry eram muito ligados. Eles con-
versavam a respeito de tudo. Ela fala-
va com ele sobre sua menstruação...”
Ben: autor de abuso sexual
“Enquanto nós, acusados de 
crime de violência sexual, 
negarmos o fato, ninguém 
poderá nos ajudar. Temos 
que admitir o que !zemos de 
errado. Eu sei disso agora.”
Sherry: vítima
“Eu acho que ele está come-
çando a entender. Está sendo 
ajudado. Ninguém se cura 
em dois anos.”
Por outro lado, alguém poderia ser até mais ousado e perguntar: 
“Por queessa ênfase na forma escrita de apresentação de um rela-
tório de pesquisa”? Há muitas formas de apresentação disponíveis 
para nós, e as palavras às vezes são muito limitantes. Por que não 
fazer uso de !lmes, gravações, música, arte, dança, multimídia e ou-
A pesquisa como prática de construção 
87
tros? Cada forma de apresentação oferece novas possibilidades para 
construirmos o mundo e para estabelecermos relações dentro e fora 
das comunidades produtoras de conhecimento. Esses desa!os são 
estimulantes e trazem também implicações radicais. No entanto, 
existem os que precederam este tipo de trabalho. Os antropólogos 
utilizaram !lmes para documentar a vida de povos indígenas por 
quase cem anos. Esses registros visuais são geralmente mais infor-
mativos do que os relatos orais disponíveis. Através dos dispositivos 
de gravação podemos compartilhar modos de vida que, de outra 
forma, não poderiam ser documentados. Novas construções do 
mundo podem ser produzidas por intermédio das novas mídias, e 
cada uma delas tem uma capacidade diferente de criar realidade.
a mudança social através da fotografia
Por muitos anos, a pesquisadora social M. Brinton Lykes trabalhou 
com mulheres nas regiões montanhosas da Guatemala. Essas mu-
lheres haviam sofrido muito com as guerras civis que devastaram 
suas terras; seus familiares haviam sido mortos e suas aldeias des-
truídas por tropas inimigas. Como parte dos propósitos da pesquisa 
e para contribuir para a criação de solidariedade entre as mulheres, 
Lykes deu de presente a cada uma delas uma máquina fotográ!ca, 
para que pudessem documentar a destruição e a violência que ha-
via acontecido. Mais tarde, a pesquisadora pediu àquelas mulheres 
que compartilhassem suas fotogra!as e falassem sobre as implica-
ções daquelas cenas em suas vidas. As conversas sobre as fotogra!as 
levaram a uma compreensão mais profunda e mais complexa dos 
eventos, além de ajudarem a abrir caminho para a reconstrução da 
comunidade. Por meio das fotogra!as as mulheres tiveram a opor-
tunidade de expressar sua visão sobre suas próprias vidas e sobre o 
futuro e, por terem compartilhado essa experiência, de desenvolver 
o tipo de solidariedade e inspiração que ajudaram a abrir o caminho 
para a mudança. As fotogra!as e conversas ajudaram-nas a criar no-
vas realidades, realidades que possibilitaram novas visões e novos 
planos para o futuro. Para essas mulheres, o resultado foi uma maior 
esperança com relação ao que poderiam vir a ser.
Construcionismo Social
88
O desabrochar dos métodos da pesquisa social
Estes quatro desafios – romper as fronteiras entre as discipli-
nas; avaliar as funções societais; incentivar os métodos múlti-
plos; expandir formas de expressão – são relevantes em todas 
as áreas de produção de conhecimento. Como se pode imagi-
nar, as ideias construcionistas exerceram maior impacto nas 
ciências sociais e humanas do que nas ciências naturais. Nas 
ciências sociais e humanas, novas práticas de pesquisa pude-
ram florescer. Ilustraremos uma série desses desdobramentos, 
abordando especificamente as explorações pertinentes ao es-
tudo da narrativa, à análise do discurso, à etnografia e à pes-
quisa-ação.
Narrativas do Eu
Na pesquisa tradicional, o cientista social observa e tira con-
clusões sobre os outros, seus motivos, problemas, hábitos, rela-
ções, e assim por diante. Por sua vez, o construcionista pergunta: 
“Por que não permitir que as pessoas falem por si próprias? Será 
que os sujeitos de nossos estudos nos autorizam a falar por eles? 
Acaso sabemos se concordam com as nossas conclusões?” Ao in-
vés de escrever a respeito delas, por que não permitimos que elas 
mesmas retratem suas próprias vidas?
Um importante meio para dar aos sujeitos das pesquisas o 
direito a se expressar consiste nos métodos narrativos. Talvez 
você se recorde de nossa discussão sobre narrativas nos capítu-
los precedentes. Neste caso, os pesquisadores possibilitam que 
as pessoas contem suas próprias histórias. Podem, por exemplo, 
colecionar histórias de vida, analisar autobiogra!as ou localizar 
cartas em arquivos históricos. Assim, a pesquisa narrativa tem 
A pesquisa como prática de construção 
89
sido usada para propiciar novas percepções sobre questões como 
envelhecimento, imigração, criminalidade, uso de drogas, “sair 
do armário” e muito mais. São histórias importantes não apenas 
porque nos dão uma ideia das realidades vivenciadas por outras 
pessoas, mas também porque nos permitem ver a vida a partir 
de seus pontos de vista. 
enfrentando o mito fundador dos grandes feitos 
Para exempli!car uma abordagem narrativa em ação, trazemos a 
pesquisa de Mary Gergen sobre as autobiogra!as de grandes rea-
lizadores americanos. Autobiogra!as de líderes nas áreas de negó-
cios, das ciências, das artes e dos esportes sugeriam que a vida desses 
homens parecia dominada pelo que costuma se denominar “mito 
fundador”, ou seja, o antigo mito de um homem que parte numa 
missão ou numa busca (matar o dragão, derrotar um inimigo) para, 
em seguida, ressurgir como herói iluminado e vitorioso. Esse mito 
funciona aparentemente como um recurso para os homens, ofere-
cendo um modelo básico que orienta suas vidas. Ao mesmo tempo, 
ao examinar autobiogra!as de mulheres realizadoras, a pesquisadora 
encontrou poucas evidências de mito fundador. Em vez disso, as mu-
lheres realizadoras pareciam ser contadoras de histórias medío cres, 
frequentemente descrevendo relacionamentos importantes para elas, 
mas sem relação com suas carreiras. Mary Gergen queria saber se a 
ausência de um mito fundador na vida das mulheres poderia explicar 
por que as mulheres tinham menor probabilidade de serem grandes 
realizadoras. Ou ainda, se não era possível que o modelo comum de 
narrativa fosse muito limitado para abranger as atividades das mu-
lheres contemporâneas. Além disso, considerando um mundo onde 
as relações são essenciais em tudo o que acontece, a pesquisa interro-
gava se o mito fundador seria uma boa forma narrativa para orientar 
a vida de nossos jovens ou uma “camisa de força”. Esta também é uma 
questão de valor, e homens e mulheres muitas vezes têm pontos de 
vistas diferentes neste sentido. 
Construcionismo Social
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Estudos sobre o discurso
O in!uente teórico francês Michel Foucault explicou como vá-
rias comunidades, cientí"cas, religiosas, de governo ou outras, pro-
duzem regimes disciplinares. O regime disciplinar é um conjunto 
de regras que aprendemos e que regulam nossa conduta e nossa 
expressão. Quando absorvemos uma disciplina, aprendemos a nos 
comportar de uma determinada forma e não de outra. Ao invés de 
termos outras pessoas vigiando nossos movimentos, aprendemos 
a nos policiar para não fazer coisas que possam ser consideradas 
tolas, repugnantes ou más. Contudo, as disciplinas também criam 
uma certa cegueira para tudo o que está fora delas; as disciplinas 
simplesmente impedem outras possibilidades, e levam à desquali"-
cação daqueles que se encontram do lado de fora. In!uenciados por 
esses argumentos, muitos pesquisadores construcionistas vêm sen-
do atraídos pela análise do discurso e de seu impacto na sociedade. 
Esses pesquisadores estão particularmente interessados em 
saber como as formas que usamos ao falar ou escrever modelam 
nossos padrões de vida. De que forma as palavras que usamos nos 
convidam a seguir um rumo e nos cegam para outros? Os analis-
tas do discurso desejam elucidar as linguagens segundo as quais 
vivemos, não apenas porque sejam interessantes, mas porque pre-
tendem estimular a mudança social. Pretendem desa"ar e colocar 
em xeque os mundos aceitos como verdadeiros para que possa-
mos ser livres e agir de forma diferente. Por exemplo, quando ob-
servamos a distinção tida como verdadeira entre heterossexual e 
homossexual, ou gay e não-gay, começamos a percebero quanto 
essas categorias são limitadas. Classi"camos um complexo mundo 
de relacionamentos sexuais em duas categorias exclusivas, mesmo 
sabendo que a vida sexual das pessoas é, muitas vezes, bem mais 
A pesquisa como prática de construção 
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complexa. Ao examinar o discurso comum com maior cuidado e 
de maneira mais crítica, somos levados a reconsiderar nossas for-
mas de vida e a buscar novos caminhos. No caso da sexualidade, 
podemos começar criando novos termos, como metrossexual, po-
lissexual, LUG*, bissexual, e assim por diante, que abrem as portas 
para novos modelos de vida cultural. Na opinião de muitos pes-
quisadores, o foco das análises do discurso é a liberação. 
“estou velho demais para isso...”, 
uma explicação assassina
Havia escassez de enfermeiras no estado de Illinois, e o sociólogo 
Chris Bodily se pôs a campo para estudar por que enfermeiras com 
mais de 50 anos de idade não estavam trabalhando e nem pareciam 
interessadas em voltar ao trabalho. Analisando mais de mil respostas, 
o sociólogo !cou impressionado com a fre quência com que se indi-
cava o fator da idade como razão para o afastamento. Comentários 
como “pela minha idade...” ou “seria impossível na minha idade...” 
foram usados como se o fato de não continuarem trabalhando fosse 
simplesmente óbvio. Como destaca Bodily, não há nada com relação 
ao número de anos vividos por uma pessoa que impeça a atividade 
contínua. Usando discursos parecidos, as pessoas dizem, “Estou ve-
lho demais para correr”, “para jogar tênis” ou “para ter um romance 
com alguém”. No entanto, a pesquisa sugere que o declínio da aptidão 
física é resultante da diminuição da atividade física e não o contrário. 
De fato, o nosso potencial físico não declina drasticamente porque 
envelhecemos; pelo contrário, com a idade, ocorre o declínio físico 
principalmente porque deixamos de ser ativos. Mantendo níveis de 
atividade, as pessoas mais velhas podem fazer baixar a pressão san-
guínea, reduzir a ansiedade, melhorar os padrões de sono, fortalecer 
os ossos, melhorar a resistência cardiovascular e se tornar mais sau-
dáveis e mais fortes. A aceitação do discurso comum, “Estou velho 
demais...”, pode ser o convite a uma morte prematura.
* LUG – Lesbian Until Graduation, termo utilizado para designar mulheres que vivem experiências 
homossexuais enquanto estão na escola ou na faculdade, mas depois assumem uma identi-
dade heterossexual.
Construcionismo Social
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Mundos vividos: aventuras etnográ!cas
O objetivo de muitas pesquisas tradicionais é estabelecer um 
conjunto de teorias ou de princípios abstratos na esperança de 
poder prever o comportamento humano. Para muitos constru-
cionistas, as teorias abstratas parecem distantes da vida cotidiana 
e insensíveis às mudanças que ocorrem ao longo do tempo. Além 
disso, nunca se sabe como, quando e onde um conceito abstrato 
se aplica à determinada situação. O resultado é que muitos pes-
quisadores sociais abandonaram as teorias abstratas para favore-
cer a pesquisa etnográ!ca – estudos que elucidam a vida de vários 
grupos de pessoas. O raciocínio é que ao conseguirmos entender 
como outras pessoas vivem e constroem seus mundos, amplia-
mos nossos próprios horizontes, nossas apreciações e nosso po-
tencial de vida. Como consequência, veri!cou-se uma prolifera-
ção dos métodos etnográ!cos. 
Indiscutivelmente o estudo da etnogra!a não é novidade na 
esfera das ciências sociais, embora inicialmente esse tipo de in-
vestigação tenha se desenvolvido na antropologia. Os pesquisa-
dores costumavam viajar para terras distantes e viviam em meio 
a comunidades tribais. Estudaram os habitantes das ilhas Tro-
briand, os balineses, os minangkabau e assim por diante. Com 
o desaparecimento das culturas “exóticas” intocadas pelo mundo 
ocidental, veri!cou-se uma mudança de orientação para as várias 
subculturas nas sociedades modernas. Os sociólogos frequente-
mente se reuniam com os antropólogos a !m de estudar peque-
nas comunidades étnicas, cultos religiosos, pro!ssionais do sexo, 
!siculturistas, gangues de motoqueiros, todos grupos relativa-
mente inacessíveis à cultura geral.
A pesquisa como prática de construção 
93
O estudo da etnogra!a atrai grandemente muitos construcio-
nistas, não apenas porque ilumina construções alternativas do 
mundo, mas também por não exigir o tipo de manipulação e 
enganação que frequentemente acompanha os experimentos la-
boratoriais. Por outro lado, as ideias construcionistas também es-
tão abrindo novos horizontes para a etnogra!a. Vejamos dois dos 
mais interessantes desenvolvimentos:
t� Etnogra!a colaborativa. Cada vez mais os pesquisadores 
se perguntam: “O que me dá o direito de repassar infor-
mações sobre outras pessoas e traduzir suas vidas através 
das minhas palavras? Por que as pessoas não podem ter 
o direito de se de!nir elas próprias para os outros?” Esta 
re"exão estimulou muitos pesquisadores a buscar meios de 
trabalhar de forma colaborativa com as pessoas que preten-
dem estudar. Por exemplo, há muitos anos, James Scheuri-
ch, um colega do Texas, se interessou em dar expressão à 
experiência dos imigrantes mexicanos em seu estado. Ele 
conseguiu a colaboração de dois alunos de pós-graduação 
oriundos de famílias mexicanas que se puseram a criar um 
“happening” de pesquisa para o qual algumas pessoas fo-
ram convidadas a apresentar performances audiovisuais, 
estéticas e intelectuais. Vários imigrantes compartilharam 
suas histórias por escrito, em !tas K-7, fotogra!as e slides. 
As apresentações, com música e poesia, incluíram a parti-
cipação do público presente. O objetivo era apresentar uma 
experiência polivocal em que não houvesse um tema cen-
tral ou uma metáfora dominante. Não houve uma única 
apresentação de imigrante mexicano, e os visitantes, cada 
um de sua maneira particular, puderam entrar em sinto-
nia com os eventos. A ênfase no potencial construtivo de 
cada espectador/participante evitou uma possível rejeição, 
que uma apresentação univocal poderia suscitar. Através 
das apresentações, pôde-se demonstrar que não existe uma 
compreensão simples e única da vida dos outros. 
Construcionismo Social
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t� Autoetnogra!a. Os pesquisadores vêm se questionando 
cada vez mais: “Por que devo dar informações sobre a vida 
dos outros se eu nunca vivenciei o que eles vivenciaram?” 
Este tipo de re!exão estimulou o desenvolvimento da au-
toetnogra"a, ou seja, a revelação das experiências pessoais 
de vida para elucidar uma determinada subcultura. Assim 
Carol Rambo Ronai, por exemplo, escreveu sobre suas ati-
vidades como dançarina erótica e lutadora em ringue de 
lama num “Clube para Cavalheiros”. Sua autoetnogra"a é 
ao mesmo tempo re!exiva e descritiva do sentido de si, dos 
vínculos relacionais com as colegas, seu patrão, o público 
e a atmosfera do clube que envolve esse tipo de pro"ssão. 
Sua história é, ao mesmo tempo, repleta de drama, tensão 
emocional, violência, entusiasmo sensual e transgressão. O 
intuito de Carol, como dançarina e como estudiosa, é mais 
o de fazer com que o leitor conheça as experiências de uma 
dançarina nesse tipo de estabelecimento do que qualquer 
retrato menos emocionante e com menor envolvimento:
Assim que Kitty foi declarada vencedora e saiu do 
ringue, dei-lhe uma palmada no traseiro. Ela olhou para 
mim, cansada, e me ignorou. Dessa vez, dei-lhe outra 
palmada com força. O som do tapa reverberou pela sala. 
A plateia se in"amou... Kitty avançou e saltou para cima 
de mim. A plateia delirava. Para enfatizar o fato de que 
ela havia sido a vencedora, sentou-se sobre o meu tórax 
com seus braços erguidos, num gesto de vitória. Esgo-
tada e humilhada... fui ao camarim para me trocar... 
Minhas emoções eram uma colagem de momentos de 
calma pontuados por acessos de choro... A realidade vi-
brava com o zumbido das máquinas no prédioe amea-
çava me atacar por todos os lados. Desesperada, procurei 
me ocupar com qualquer outra coisa, sufocando o medo 
com uma calma arti!cial. (p. 119-120)
A pesquisa como prática de construção 
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Criando novos mundos: pesquisa-ação
Uma das mais gritantes diferenças entre o tipo de pesquisa pre-
ferida pelos tradicionalistas e pelos construcionistas reside nos pon-
tos de vista contrastantes com relação à mudança pessoal e social. A 
pesquisa tradicional tende a pressupor um alto grau de estabilidade 
na conduta humana. Os pesquisadores dirigem seu foco, por exem-
plo, aos processos cognitivos, à liderança, às diferenças étnicas ou 
à estrutura social como se fossem coisas estáveis e duradouras. Ba-
seando-se principalmente nas teorias neurológicas e evolutivas, os 
psicólogos muitas vezes supõem que as descobertas recentes sejam 
válidas para todos os tempos e culturas. Em contrapartida, os cons-
trucionistas ressaltam o potencial para a mudança do ser humano 
porque percebem como as formas da vida cultural são sustentadas 
por signi!cados e valores compartilhados; mudando os discursos e 
os valores, a vida cultural pode mudar drasticamente. A rápida as-
censão do Maoísmo na China, a deterioração da União Soviética, o 
colapso do Apartheid na África do Sul e o surgimento do terrorismo 
mundial são alguns exemplos. Se a pesquisa de ontem ainda será 
útil amanhã é uma questão que continua sempre em aberto.
A partir deste ponto de vista, os pesquisadores estão sendo cada 
vez mais atraídos pela possibilidade de usar a pesquisa não com o 
propósito de registrar a trajetória do passado para prever o futuro, 
mas para criar imediatamente novos futuros. A pesquisa-ação se de-
dica a esta !nalidade. Originada na década de 1970, a pesquisa-ação 
compartilhou muito do fervor intelectual e político da época. Esses 
pesquisadores não !cavam reclusos em seus laboratórios estudando 
pessoas e animais para publicar artigos em revistas especializadas 
ou para obter ganhos a longo prazo pelos resultados cientí!cos. Eles 
saíram a campo e ofereceram seus serviços aos mais necessitados. 
Tinham, particularmente, a esperança de que as pesquisas pudes-
Construcionismo Social
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sem ajudar a libertar as pessoas das condições políticas e econômi-
cas opressivas e a gerar novas possibilidades de vida para elas. Esta 
forma especial de compromisso com a pesquisa cresceu ao longo 
dos anos, principalmente na Grã-Bretanha, na Escandinávia e na 
América do Sul. No !nal da década de 1990, foi realizado na cidade 
de Cartagena, Colômbia, um Simpósio Mundial de Pesquisa-Ação 
em que se reuniram 2.000 delegados de 61 países. Atualmente, os 
principais objetivos da pesquisa-ação incluem o alívio do sofrimen-
to, o estabelecimento da justiça, a redução de con"itos e o aprimo-
ramento do processo democrático. A pesquisa-ação é utilizada em 
diversas práticas, incluindo o desenvolvimento organizacional, a 
educação, o desenvolvimento comunitário e as terapias. 
Pesquisa-ação em ação
Um centro de ajuda social a meninos e jovens moradores de rua 
em Ottawa, no Canadá, vinha passando por uma crise. Alguns acre-
ditavam que o centro precisava de mais infraestrutura e de mais re-
gras, enquanto outros pensavam que um maior número de orienta-
dores e de funcionários seria fundamental. Outros ainda cogitavam 
que o centro deveria ser fechado a !m de dissuadir os “moleques” 
de !carem vadiando pelas redondezas. O centro era mantido por 
uma agência municipal de atendimento à juventude, que decidiu 
primeiro estudar o que poderia ser feito para depois iniciar a refor-
ma. Entretanto, ao invés de usar o método tradicional de estudar a 
distância e anunciar os resultados, escolheu-se a pesquisa-ação. Os 
pesquisadores desenvolveram um sistema de parceria com os jovens, 
na expectativa de que eles participassem de forma ativa para criar 
outros futuros dentro do centro. Os pesquisadores e os facilitadores 
do centro auxiliaram o processo. A equipe de pesquisa consistia de 
seis jovens, dois facilitadores e um pesquisador externo.
A pesquisa como prática de construção 
97
O primeiro passo da pesquisa-ação, o processo de formação 
da equipe de trabalho, requeria que os jovens viessem a conhecer 
e a con!ar não apenas no processo, mas nos adultos envolvidos. 
O objetivo era avaliar o centro, fazer um diagnóstico e recomen-
dações à agência e ajudá-lo a proporcionar um melhor serviço 
a seus clientes. Todas essas metas foram atingidas num período 
de 18 meses de lutas e sucessos. Ao apropriarem-se do proces-
so, os meninos de rua se engajaram completamente e puderam 
fazer avaliações do centro cuja importância foi vital. Eles se en-
volveram em atividades criativas com os adultos e chegaram a 
preparar um “pacote” que se tornou a base das apresentações para 
grupos de fora e para os outros jovens. Embora o conteúdo deste 
pacote se baseasse em dados consistentes, as apresentações eram 
calorosas, coloridas e cheias de vida e de humor. Por meio desse 
empenho coletivo, o centro se transformou num aspecto vibrante 
na vida dos jovens e contribuiu signi!cativamente para o futuro 
autossustentável da instituição. 
Foco do capítulo
A introdução das ideias construcionistas nas comunidades de pes-
quisa promove a autorre"exão, o entusiasmo e a inovação. Atualmen-
te, as ciências sociais encontram-se num estado de extraordinária 
transformação e o futuro está longe de estar decidido. As ideias cons-
trucionistas favorecem o pluralismo, ou seja, múltiplas vozes, méto-
dos e valores. Dentre as formas de pesquisa que descrevemos aqui 
estão o estudo da narrativa, a análise do discurso, a etnogra!a e a 
pesquisa-ação. Cada uma delas enfatiza uma abordagem construcio-
nista para ampliar a compreensão das realidades sociais e auxilia para 
que a mudança efetivamente ocorra no âmbito das comunidades en-
volvidas. No entanto, com o pluralismo "uindo livremente, também 
preparamos a cena para associações e colisões criativas. Com sorte, 
as transformações irão continuar.
 
99
Capítulo 5 
 
 
Da crítica à 
colaboração
Para muitas pessoas, as ideias construcionistas são profundamente 
preocupantes, pois vão questionar realidades e valores centrais da 
vida cotidiana sem oferecer uma lista precisa de alternativas. Uma 
vez que as ideias construcionistas minam as reivindicações de ver-
dade, objetividade e certeza, elas acabam exercendo também um 
papel central nas assim chamadas “guerras culturais”. Neste caso, os 
críticos questionam a possibilidade de cada subcultura ter direito a 
suas próprias verdades e valores. As ideias construcionistas também 
contribuíram de maneira signi!cativa para “a guerra das ciências”, 
pois os críticos não aceitam que a verdade cientí!ca seja apenas 
uma entre muitas outras. Assim, podemos veri!car que o constru-
cionismo tem sido severamente criticado em vários setores. 
Neste capítulo levantaremos algumas das linhas centrais des-
sas críticas, procurando oferecer respostas convincentes às mes-
mas. No entanto, precisamos estar atentos tanto à forma quan-
to ao conteúdo de nossas respostas. Se fosse o caso de estarmos 
comprometidos com uma única verdade, forma de raciocínio ou 
conjunto de valores, talvez tentássemos demonstrar que as críti-
cas estão simplesmente equivocadas, tendo incorrido em algum 
erro fundamental. Contudo, de um ponto de vista construcionis-
ta, erros fundamentais não existem. Não precisamos entrar numa 
luta para garantir que as perspectivas construcionistas prevale-
çam sobre todas as outras. Em vez disso, podemos usar a críti-
ca como convite ao diálogo e a possíveis colaborações das quais 
Construcionismo Social
100
possam emergir novos entendimentos, percepções ou perspecti-
vas. Por isso, buscamos respostas que não acusem ou alienem o 
formulador da crítica e, sim, respostas que possam nos aproximarpara criar o “novo”. Trataremos aqui de três críticas comuns: a 
crítica do niilismo, do realismo e do relativismo moral.
Do niilismo* a realidades mais ricas
Muitas pessoas !cam alarmadas com o modo pelo qual as ideias 
construcionistas vão minando todas as crenças; queixam-se de 
que, segundo o construcionismo, não se pode mais con!ar na 
ciência para conhecer a verdade, já que a ciência é apenas uma 
história entre muitas. Igualmente, todos os pressupostos da pró-
pria história, da política, da situação mundial, da religião etc., são 
também apenas histórias. Será que isto não nos leva a um va-
zio niilista? Será que não existe nenhuma verdade, nada em que 
possamos verdadeiramente con!ar ou acreditar? E, se tudo o que 
consideramos verdadeiro e bom for uma construção, não estarí-
amos sendo levados à apatia, eximindo-nos da responsabilidade 
de questionar o futuro, ou pior, livrando-nos até mesmo de agir?
Podemos responder a esta acusação dizendo que os constru-
cionistas também têm simpatia por realidades con!áveis. Quem 
não gosta de saber quando uma explicação é verdadeira em con-
traposição a uma outra, falsa? Não desejamos todos nos apegar a 
promessas como “este remédio poder curar sua infecção”, ou “este 
voo vai para São Francisco”? Queremos ter certeza também de 
* Niilismo – Termo usado na maioria das vezes com intuito polêmico, para designar doutrinas que 
se recusam a reconhecer realidades ou valores cuja admissão é considerada importante. Assim, 
*COKNVQP�WUQW�GUUG�VGTOQ�RCTC�SWCNKſECT�C�FQWVTKPC�FG�*WOG��SWG�PGIC�C�TGCNKFCFG�UWDUVCPEKCN�
(Lectures on Metaphysics, I, pp. 293-94); nesse caso a palavra quer dizer fenomenismo. Em 
outros casos, é empregada para indicar as atitudes dos que negam determinados valores morais 
ou políticos. Nietzsche foi o único a não utilizar esse termo com intuitos polêmicos, empregando-
�Q�RCTC�SWCNKſECT�UWC�QRQUKÁºQ�TCFKECN�CQU�XCNQTGU�OQTCKU�VTCFKEKQPCKU�G�´U�VTCFKEKQPCKU�ETGPÁCU�
metafísicas (ABBAGNANO, Nicola. &KEKQP¶TKQ�FG�(KNQUQſC. São Paulo: Martins Fontes, 2007.)
Da crítica à colaboração 
101
que os jornalistas e cientistas não vão deturpar as informações 
que veiculam. Neste sentido, os construcionistas são bem pouco 
niilistas. Há espaço aqui para uma criação colaborativa.
Imbuídos desse espírito, vamos considerar primeiramen-
te as implicações da queixa “É apenas uma construção social”. 
Esta frase é bastante signi!cativa porque nos apegamos à ideia 
de que alguns relatos da realidade não são construções sociais, e 
que alguns são mais “acertados” com relação ao mundo. Se aban-
donamos a visão de que algum arranjo especial de palavras foi 
feito sob medida para o mundo tal como ele é, nos livramos da 
maldição do niilismo, porque o construcionismo não signi!ca 
desistir de algo chamado verdade; em vez disso somos convida-
dos a enxergar todos os tipos de discurso da verdade como ori-
ginários das relações que têm lugar em determinadas condições 
culturais e históricas. Isso não torna as declarações de médicos, 
jornalistas ou pilotos de avião inverídicas ou não-con!áveis. Em 
vez disso, sabemos que suas declarações podem ser muito úteis 
em determinadas circunstâncias. Se estamos de acordo em nossas 
construções sobre doença, sobre a vida ou sobre a morte, vamos 
querer con!ar nas a!rmações médicas de cura; se concordarmos 
com o signi!cado de “voar para São Francisco”, con!aremos na 
verdade das informações do comandante quanto ao nosso desti-
no. No âmbito de uma tradição, as declarações relativas à verdade 
são fundamentais para que as coisas funcionem bem. 
Uma vez estabelecida a importância das verdades locais, esta-
mos preparados para enfrentar duas outras questões importantes: 
em primeiro lugar, existem razões para se querer resistir à tentativa 
de qualquer grupo que pretenda que suas verdades locais sejam 
universais ou que devam suplantar todas as outras. A história hu-
mana adquiriu enormes cicatrizes como resultado das tentativas de 
Construcionismo Social
102
determinados grupos de impor sua verdade sobre os outros, seja 
a respeito de um deus, da justiça, da raça pura ou da natureza do 
mal. A questão é de fundamental importância, considerando-se as 
atuais condições do mundo, quando várias crenças culturais são 
lançadas em crescentes con!itos, e onde existe uma grande pre-
disposição da cultura ocidental a acreditar que suas verdades são 
superiores às verdades de outras culturas. Se desejamos uma con-
vivência pací"ca no planeta, é importante que nenhum grupo em 
particular sinta-se no direito de aniquilar as vozes discordantes. 
Igualmente importante é o fato de que, ao enfatizarmos as 
vantagens de uma verdade local, atraímos ao mesmo tempo 
explorações alternativas às nossas confortáveis visões sobre a 
verdade e sobre o bom. Não se trata aqui de uma mera adver-
tência para não ultrapassarmos as fronteiras de nossas reali-
dades locais, porque também vamos ser estimulados a buscar 
construções alternativas ao verificar que algumas construções 
são extremamente úteis para aqueles que as desenvolveram. 
Neste sentido, um cientista não precisa ignorar o espiritualis-
mo ou mesmo o criacionismo. Estes tipos de formulação de 
verdade não estão disputando um estatuto científico, mesmo 
porque são discursos que atendem a outros propósitos, ofere-
cendo um valor e um significado ao universo que a ciência não 
pode suprir. Ao invés de condenar peremptoriamente aqueles 
que participam das chamadas atividades “terroristas”, poderia 
ser útil entrar em seu mundo de significado e compreender 
como suas ações são justificadas no âmbito de suas comuni-
dades. Através de uma troca total e recíproca, talvez possamos 
encontrar, juntos, meios para a cocriação de alternativas à ani-
quilação mútua. 
Da crítica à colaboração 
103
Além do realismo: corpos, mente e poder
Muito próximos aos que acusam o construcionismo de niilismo, 
estão aqueles que argumentam que as ideias construcionistas não 
contradizem fatos óbvios da vida. Este tipo de resistência é parti-
cularmente intenso em três setores.
Em primeiro lugar, existem os críticos que consideram que o 
corpo humano é central para uma compreensão da vida social; 
para eles, o corpo é uma realidade inescapável. A proposição mais 
frequente é de que nosso corpo nos de!ne, vivenciamos o mundo 
através do corpo e, à medida que ele se modi!ca, muda também 
o signi!cado do mundo e do “eu” para nós.
Em segundo lugar, há os críticos que consideram de importância 
central o mundo particular da mente. Pois não é certo que usamos 
as nossas mentes para interpretar nossas experiências do mundo, e 
que nossas emoções e pensamentos in"uenciam o que fazemos? 
Finalmente, muitos cientistas sociais criticam a falha dos cons-
trucionistas ao lidar com as óbvias desigualdades de poder entre 
os grupos sociais. Segundo esses críticos, se não confrontarmos 
as diferenças de poder, não poderemos aliviar as condições de 
opressão sob as quais tantas pessoas vivem. Se as relações de po-
der não forem incluídas como questão central em nossa análise, 
estaremos implicitamente apoiando o “status quo”; se, por exem-
plo, a pobreza, a opressão, a fome e o genocídio forem somente 
construções, não há motivação para agir. 
Geralmente essas críticas se intitulam realistas, pois pretendem 
se ater a a!rmações de realidade especí!cas; também são chamadas 
de essencialistas, pois declaram que algo como o corpo, a mente ou 
o poder constitui um aspecto essencial ou inegável do mundo, que 
Construcionismo Social
104
antecede a linguagem. Certamente são críticas importantes por-
que, a!nal, quem gostaria de deixar de lado a preocupação com 
o corpo, com a mente ou com as estruturas de dominação e de 
injustiça social? Mas, antes de considerarmos outras maneiras de 
poder colaborar com essas preocupações, é importante destacar 
um mal-entendidofundamental que volta e meia acompanha es-
sas críticas. Em primeiro lugar, as ideias construcionistas funcio-
nam basicamente no que se poderia chamar de metanível. Ou seja, 
são construções que se ocupam da forma como compartilhamos 
os conceitos comuns do real e do bom. Por exemplo, procuramos 
explicar como passamos a entender o nosso corpo como uma 
“máquina” em vez de entendê-lo como um “vasilhame sagrado”. 
As ideias construcionistas preocupam-se com o conceito ociden-
tal da mente e as formas pelas quais este conceito difere do de 
outras culturas. Também apontam para as várias maneiras pelas 
quais o poder é construído e as vantagens ou desvantagens vincu-
ladas a cada um dessas maneiras. Com efeito, os construcionistas 
procuram entender a nossa compreensão e, ao fazê-lo, oferecem um 
conjunto de ferramentas ou discursos que podem ser usados para 
vários !ns. Talvez você se recorde da metáfora do construcionis-
mo como um grande guarda-chuva sob o qual todas as formas 
de construção de realidade podem ser consideradas, inclusive a 
aparente realidade criada pelo próprio construcionismo. 
Infelizmente, os críticos muitas vezes confundem uma cons-
trução de metanível com uma pretensão do construcionista de 
acessar a real verdade sobre o mundo. De acordo com os críti-
cos, se deixarmos de fora o corpo, a mente ou o poder, estaremos 
cegos ao real. Mas esta é uma compreensão equivocada. Quan-
do pensamos em metanível, esperamos simplesmente ampliar a 
Da crítica à colaboração 
105
 consciência dos possíveis, adotar uma orientação para o sentido e 
para o conhecimento, e não gerar uma “nova verdade”. Ao contrá-
rio, sob o guarda-chuva construcionista, queremos considerar ou-
tras realidades. Neste contexto, movimentando-nos sob o guarda-
-chuva vamos trabalhar em colaboração com os proponentes do 
corpo, da mente e das relações de poder. Identi!camos, para tanto, 
três opções principais para trabalhar juntos de maneira criativa. 
1. Juntar-se à produção da realidade 
A metateoria construcionista não exige qualquer via de 
mão única para entender o mundo, e, assim sendo, somos li-
vres para explorar os potenciais de qualquer outra perspec-
tiva existente. Seguramente, a maioria de nós trata o corpo 
e a mente como partes da realidade cotidiana, e não se faz 
qualquer exigência ao construcionista (ou a qualquer pessoa) 
com relação a interromper tais práticas. Embora estejamos 
profundamente engajados nas ideias construcionistas, nós os 
autores participamos de bom grado de conversas a respeito do 
corpo e da emoção. Esses são aspectos de suma importância 
para que possamos efetivamente existir em nossas relações. 
Prontamente nos associamos à construção desta realidade. 
Por outro lado, isso não signi!ca abandonar as ideias cons-
trucionistas. Envolver-se com as realidades locais não signi!ca 
se desfazer do construcionismo, da mesma forma que apreciar 
a música de Mozart não signi!ca abandonar sua paixão pelo 
“blues”. Igualmente, as ideias construcionistas podem ser extre-
mamente úteis quando falamos do corpo, da mente e do poder. 
Muitos acadêmicos, por exemplo, estão preocupados com a 
opressão e a injustiça no mundo e estão comprometidos com a 
mudança do que interpretam como estruturas de poder. Esses 
mesmos acadêmicos voltam-se para as premissas construcionis-
tas para desmontar realidades impostas de cima para baixo pelas 
autoridades o!ciais; mostram como uma declaração “o!cial” de 
um fato é sempre uma construção ideológica que deveria ser con-
Construcionismo Social
106
testada. Será que a capacidade de usar ambos os discursos, tanto 
o construcionista quanto o realista, não nos bene!ciaria a todos? 
Para participar das conversas cotidianas é de suma importância 
compartilhar conversas de “realidade” com outras pessoas.
2. Explorar juntos os limites 
Embora a conversa cotidiana seja caracteristicamente rea-
lista (real para nós, no momento), o construcionismo também 
nos leva a considerar juntos os limites de nossa linguagem. Por 
exemplo, o discurso de poder é importante para nos motivar 
em nossa luta por justiça. Na tradição ocidental, praticamente 
não conseguimos tolerar a ideia de que outras pessoas con-
trolem nossas ações e vivam comodamente às custas de nossa 
escravidão. Entretanto, esta visão de poder também traz em-
butida a discórdia, pois promove os outros (os “poderosos”) 
a vilões, favorecendo uma postura agressiva segundo a qual 
os vilões devem ser obrigatoriamente vencidos. Nós temos 
o poder agora! Naturalmente, quando aqueles que isolamos 
como “poderosos vilões” tomam conhecimento da nossa in-
satisfação, estes assumem uma postura defensiva acreditando 
que têm boas razões para fazer isso e pressupondo que nosso 
objetivo não é apenas destruí-los, mas destruir também tudo 
de bom que criaram. Em pouco tempo, encontramo-nos em 
campos opostos, armados e separados, e as possibilidades de 
trabalharmos de maneira colaborativa por uma sociedade jus-
ta passam a ser ín!mas. Portanto, ao participarmos de con-
versas cotidianas, procuramos estar cientes de suas limitações. 
3. Criar juntos novas visões
A exploração dos limites leva naturalmente a uma opção 
!nal, que é a de trabalharmos juntos para criar novas e pos-
sivelmente mais viáveis formas de entendimento e de ação. 
Consideremos mais uma vez o conceito de poder; porém, ao 
invés de ver o poder como uma estrutura piramidal, onde os 
maus estão no topo e os bons na base, poderíamos pensar no 
Da crítica à colaboração 
107
poder emergindo das relações existentes. Se um número de 
pessoas começa a compartilhar as mesmas opiniões e valores, 
elas tenderão a se organizar para desenvolver um sentido de 
união, para propor programas e planos e, por !m, para poder 
alcançar suas metas de maneira e!ciente. Em resumo, criarão 
um centro de poder. De acordo com esta perspectiva, podem 
existir vários centros de poder, que poderão mudar à medi-
da que as conversas evoluem. Ao vermos o poder distribuído 
desta forma, podemos entender a mudança social como um 
trabalho em conjunto com vários e diferentes grupos, que, 
sem dúvida, vão incluir muitas daquelas pessoas que, de ou-
tra forma, seriam consideradas como os inimigos lá em cima. 
Imaginem uma empresa que criasse um fórum para que cada 
pessoa, cada departamento, cada nível hierárquico, pudesse 
conversar sobre esperanças e sonhos com relação à própria 
organização. Imaginem também uma comunidade ou uma 
municipalidade que abrisse um diálogo convidando cada ci-
dadão – jovens e idosos, ricos e pobres – a compartilhar suas 
esperanças e sonhos para o futuro. O construcionismo não 
abandona as tradições de signi!cado, mas estimula passos em 
direção a uma reciprocidade mais viável.
Além do relativismo moral
Uma última e costumeira crítica ao construcionismo social apon-
ta para o que parece ser uma debilidade moral. Segundo esta 
proposição, o construcionismo parece destruir os fundamentos 
de todas as perspectivas morais sem substituí-las por ideais pró-
prios. Os construcionistas frequentemente propõem que todos 
os pressupostos dos padrões éticos ou dos princípios religiosos 
são produzidos dentro de comunidades especí!cas. Neste senti-
do, esses padrões e princípios não são outorgados por qualquer 
autoridade divina, tampouco são racionalmente necessários ou 
universalmente vinculantes. Os críticos manifestam seu pesar 
Construcionismo Social
108
a!rmando que, desta forma, todos os princípios morais parecem 
ser iguais; como os construcionistas vão poder dizer que bondade 
é melhor do que crueldade, ou que a diplomacia seja preferível 
ao genocídio? Acabaríamos caindo numa posição de “tanto faz, 
quanto tanto fez”.
Naturalmente, ninguém deseja ver seus padrões do bem des-
truídos. Acaso não temos todos nós preferência por determi-
nados estilos de vida? Será quealgum de nós gostaria de ver a 
brutalidade humana ser colocada no mesmo nível de qualquer 
outra forma de tratamento das pessoas? Os construcionistas 
fazem parte da sociedade tanto quanto qualquer outra pessoa, 
e, neste sentido, também contribuem e investem em diversas 
visões do bem. O construcionismo não instiga as pessoas a 
abandonar as suas perspectivas morais, pois isso nos levaria a 
deixar de lado todas as tradições. Ao contrário, o construcionis-
mo nos convida a apreciar as visões locais e a estar atentos para 
quem quiser destruí-las. Sem dúvida, para muitos intelectuais 
foi precisamente o entendimento das ideologias morais como 
construções humanas que lhes permitiu que se pronunciassem a 
respeito. Para as feministas, ativistas de minorias raciais, ativis-
tas dos direitos dos homossexuais, para os grupos de pacientes 
da saúde mental, de!cientes auditivos e de outras minorias, as 
ideias construcionistas têm sido concessoras de poder. O cons-
trucionismo promove o questionamento aberto do “status quo” 
e busca a legitimação de pontos de vista que, de outra forma, 
estariam marginalizados.
Uma vez que tanto os construcionistas quanto seus críticos 
têm interesse em alguma forma de vida moral, o desa!o consis-
te em encontrar um denominador comum para construir um 
Da crítica à colaboração 
109
futuro viável. Essa conversa poderia muito bem começar com 
a seguinte pergunta: “Será que queremos realmente conceder 
a qualquer grupo o direito de declarar seu sistema moral como 
sendo universal e impô-lo ao resto do mundo?” Como o mundo 
é constituído de várias orientações morais, a resposta provavel-
mente será negativa, pois sabemos que as culturas visivelmente 
discordam quanto à exata natureza do bem. A discussão sobre 
se crianças de 8 anos deveriam ou não trabalhar numa fábrica 
de tapetes para ajudar no sustento de suas famílias está aberta 
a argumentações dos dois lados; se Israel deveria se retirar do 
território palestino ou construir um muro para manter os pa-
lestinos fora de seu território também é uma questão que gera 
controvérsia de todos os lados; se o presidente americano de-
veria ter o poder de alterar a Convenção de Genebra com re-
lação a proteger os prisioneiros da tortura quando existe uma 
ameaça terrorista também é um assunto altamente polêmico. 
As tradições de quem deveríamos destruir? A tirania de quem 
deveríamos aceitar?
Nesse sentido, nossos problemas não se devem à falta de 
valores morais das pessoas; todos estamos inseridos em tradi-
ções que valorizam certas ações enquanto condenam outras. 
O maior desa!o reside na abundância de “bens morais” e na 
tenacidade com a qual nos prendemos a eles. Aqui, as ideias 
construcionistas começam a contribuir de forma signi!cativa. 
Se todos os “bens morais” se originam das tradições de relação, 
precisamos primeiro reconhecer a inevitabilidade da diferença, 
não somente a que reside dentro de nossas tradições, mas tam-
bém aquelas que vão surgindo todos os dias. Além disso, sendo 
os valores morais construções culturais, não devemos discutir a 
Construcionismo Social
110
respeito de qual é o sistema superior ou o melhor. A busca pelo 
melhor código moral não é diferente da busca pelo melhor gê-
nero de música ou pela melhor culinária como preparação para 
eliminar todos os outros. Para o construcionista, pelo contrário, 
o desa!o é essencialmente pragmático. Se não quisermos que 
as pessoas nos imponham suas visões com relação ao bem, ou 
não quisermos que os con"itos terminem em genocídio, deve-
mos em conjunto dar início a novas investigações. Precisamos 
nos unir para considerar outros meios práticos de lidar com os 
con"itos de valor. Devemos localizar ou criar práticas e!cazes 
para amenizar as diferenças, cruzando fronteiras e estabelecen-
do novas relações. 
Mais uma vez, os construcionistas podem oferecer contri-
buições signi!cativas, pois, como vimos nos capítulos anterio-
res, as ideias construcionistas incentivaram uma diversidade 
de práticas para melhorar a coordenação entre as pessoas, para 
reunir diferentes indivíduos em prol de uma causa comum e 
para minimizar as diferenças entre adversários. Num sentido 
mais amplo, todas essas práticas possibilitam que as pessoas 
deem um passo além de um único compromisso moral, da úni-
ca crença Verdadeira, e possam conviver com a multiplicidade. 
Essas práticas nos conduzem, no melhor sentido, para além da 
mera tolerância, para uma apreciação do mundo plural, diver-
so. Isto não signi!ca uma posição de relativismo indolente. Em 
vez disso, seremos todos reciprocamente transformados, e es-
tas transformações nos proporcionarão novas formas de vida 
que favoreçam uma convivência melhor. Estamos hoje apenas 
começando a desenvolver as formas de prática necessárias. O 
futuro está agora em nossas mãos.
Da crítica à colaboração 
111
Foco do capítulo
Neste capítulo levantamos as críticas relativas do niilismo, realismo e 
relativismo moral e procuramos responder a cada uma delas. Se exis-
te um problema abrangente com relação à maioria das críticas contra 
o construcionismo, ele consiste numa visão obsoleta da Verdade. De 
maneira geral, os críticos abordam as ideias construcionistas como 
se fossem candidatas à verdade universal. Os críticos do construcio-
nismo acreditam que aceitá-lo como Verdadeiro signi!ca que toda 
e qualquer outra pretensão ao conhecimento seja falha ou falsa. En-
tretanto, como procuramos demonstrar, as ideias construcionistas 
desa!am a hipótese de que exista uma verdade transcendente. Para 
os construcionistas, a linguagem é usada pelas pessoas para realizar 
coisas em conjunto. Quanto mais ricas forem as nossas conversas e 
diálogos, maiores serão nossas aptidões para a coordenação humana. 
Não estamos aqui declarando que as ideias construcionistas sejam 
Verdadeiras, mas que o construcionismo promove novas formas de 
entendimento e de ação. A questão importante refere-se às suas im-
plicações para nosso futuro. A nosso ver, trata-se de um discurso de 
magní!ca utilidade, pois oferece um convite único à multiplicidade 
e à inovação. O construcionismo propicia a esperança de uma forma 
de diálogo que se constrói entre todos, em prol da constante inte-
gração, da invenção de formas de vida e da substituição do con"i-
to mortal pela comunhão que proporciona vida. Esperamos que, ao 
longo da leitura deste livro, os leitores tenham podido apreciar esses 
potenciais.
112
Referências bibliográ!cas
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Construcionismo Social
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Para contatos colaborativos: www.stanford.edu/group/collaborate 
Em resolução de con!itos:
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tions.org (Inclui 25 links com organizações similares de resolu-
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Mais referências sobre Kenneth e Mary Gergen podem ser en-
contradas em suas páginas pessoais:
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Mary Gergen: http://www.de.psu.edu/Faculty/gergen/gergen.html 
Este livro foi composto na tipologia Minion Pro, 
em corpo 11/16, impresso em papel offset 
pela Milograph em setembro de 2010.

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