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Aula 1 – confabulações na Educação Infantil
Breve questionamentos sobre as infâncias 
A criança pequena hoje está com agenda lotada. A televisão que se transforma em babá. Os pais ausentes. Carinho transformado em objeto. Para entender, entretanto, o lugar social que a criança ocupa na sociedade não se pode analisar tais fragmentos de forma isolada. Isso porque cada época irá proferir um discurso que revela seus ideais e expectativas em relação às crianças. 
Como afirmado pela autora a “infância” retratada acima não pode ser generalizada a todos os casos. Sabemos que muitas crianças, ao contrário de agendas lotadas com atividades complementares e diversões, têm agendas lotadas com o trabalho, por exemplo. A diversidade na concepção de infância sempre existiu, mas em determinadas épocas históricas podemos mapear as principais tendências em relação à criança. No que condiz à concepção de infância na modernidade, a autora citada discute alguns aspectos muito importantes para nos ajudar a pensar sobre a infância contemporânea: Na contemporaneidade, entretanto, está acontecendo um processo retrógrado: ao invés de mais resguardadas, as crianças estão emancipando-se. Dois fatores cruciais para que esse processo aconteça são a ausência dos pais e a onipresença dos meios de comunicação. Se antes, na Idade Média, eles serviram para fomentar o desenvolvimento da concepção moderna de infância, hoje a mídia promove a desinfantilização de crianças, provocando, entre outras consequências, a erotização precoce. A televisão, mais que um eletrodoméstico, transformou-se num fato social. É através desse eletrodoméstico que a infância recebe seus ensinamentos e informações sobre o mundo, o que antes, na década de 50, acontecia apenas por seus familiares e pela escola. Mas a TV se adianta: ela inicia o processo de socialização antes que a escola tenha a oportunidade de fazê-lo. No Brasil, a influência da mídia torna-se ainda mais poderosa em virtude de um sistema educacional precário que possibilita, em muitas ocasiões, que a televisão tenha o poder “soberano” de informar, educar e distrair, sem um público capaz de criticá-la.
Aula 2 – “Roda mundo, roda gigante, roda moinho, roda pião, o tempo rodou num instante, nas voltas do meu coração”
A roda do tempo
“O tempo não pede licença para passar!” O mundo muda a todo instante, melhor, nós o mudamos e nos mudamos. Pois bem, de geração em geração, vamos convivendo entre velhas e novas ideias, valores, práticas sociais, influenciados pela cultura e pelos construtores dela. Por isso, tanto o mundo quanto as pessoas se modificam, transformam-se, marcam seus tempos e espaços existenciais. Modificamos a sociedade, a cultura, a ciência, a tecnologia, a história, a economia, a nós mesmos e o nosso contexto, ou seja, ao nos relacionarmos com os “outros”, somos capazes de construir ideias e também de desconstruí-las, somos influenciados e influenciamos os outros.
Professoras, crianças e comunidade escolar: tomando iniciativa com vez e voz
Pensar a educação da infância, diante de tantas mudanças, requer constante reformulação de nós professores, pedagogos e profissionais, que optamos por atuar em instituições dedicadas às crianças. 
No contexto das diversas mudanças ocorridas na sociedade, uma, em especial, nos interessa: a alteração do papel da escola, que deixa de ser a principal vinculadora de informação, pois diferentes mídias assumiram este lugar. Por exemplo, pela tevê e pela internet, temos acesso em tempo real ao que acontece em diversos lugares do planeta. Por outro lado, se as informações que circulam são muitas, cabe à escola a função de ressignificá-las, articulando diversos saberes, sistematizando o conhecimento e, assim, ampliando as possibilidades de a comunidade escolar compreender a si mesma, ao mundo e a agir por decisão, diante da disputa de poder pelo conhecimento legítimo.
Um outro exemplo de mudanças que nos chama a uma reformulação, e que diz respeito às crianças pequenas, é a pouca percepção do adulto em ver nas crianças reunidas um grupo capaz de influenciar o local em que vive, aprendendo e se desenvolvendo entre pares e criando representações culturais acerca das experiências vividas.
 Aula 3 – ser criança significa ter infância?
Infâncias e tecnologia
a) “meu primeiro amor”: relata um menino em seu computador tendo sua “primeira paixão”, onde seu interesse hoje é conhecer meninas.
b) “Pedro e as máquinas”: relata um menino que acorda cedo com o relógio despertando, sem entender muito os números ele sabe que é hora da escola, levanta põe sua roupa de escola, vai para cozinha tomar seu café, ouve a reportagem da tv, sua mãe lhe dá bom dia e o leva para a escola, e no caminho há um engarrafamento onde o menino pega seu ‘game-boy’ e começa uma luta contra os inimigos.
“Crianças” e “infâncias”
Sarmento e Pinto, distinguem os conceitos de criança e infância dizendo que crianças existiram desde sempre, desde o primeiro ser humano, mas o conceito de infância, como construção social, é datado dos séculos XVII e XVIII. Esses autores conceituam a infância como um conjunto de representações sociais e de crenças para a qual se estruturam dispositivos de socialização. 
Como diz Corsaro, a criança é um ser social ativo e criativo que produz a sua própria cultura enquanto contribui, simultaneamente, para a produção das sociedades adultas. Nesse sentido, as crianças são pensadas num período construído socialmente, como categoria que é parte da sociedade – assim como a classe social. 
Para Sarmento a infância não pode ser mais pensada como a idade da “não fala”, mas, ao contrário, nas infâncias devem ser consideradas as múltiplas linguagens das crianças desde o seu nascimento. O autor modifica, ainda, a visão das infâncias como a idade do “não trabalho”, uma vez que os fazeres diários aos quais muitas crianças são expostas caracterizam situações de infância com uma noção de “trabalho”. Não podemos nos esquecer de que estas participam de múltiplas tarefas nos espaços que habitam. 
“Ser criança não significa ter infância”
A invenção da infância: A infância, como ideia de uma época especial para cada ser humano, surge no mesmo tempo das grandes descobertas. Já não se morria tão facilmente e começava a valer a pena o investimento nesses seres tão frágeis. Para as crianças, inventa-se a infância quando se decide deixá-las brincar, ir à escola, ser criança.
Ao inventar a infância, a modernidade cria a idade de ouro de cada indivíduo. Fase em que a vida será perfeita, protegida e tranquila, antes de ser tomada pelas exigências do trabalho. Época ideal de nossas vidas, em que ser criança é não ter qualquer outro compromisso que vá além do gozo puro e simples de sua inocência.
Uma época na qual crianças podem trabalhar como adultos, consumir como adultos, partilhar as informações como adultos, não reconhece o mundo infantil como diferente ou especial. Um mundo onde adultos e crianças compartilham da mesma realidade física e virtual é um mundo de iguais.
 Aula 4 – AS PRÁTICAS EDUCATIVAS PARENTAIS E A EXPERIÊNCIA DAS CRIANÇAS
As práticas educativas dos pais 
Hoje em dia, as mídias costumam alardear que as relações entre adultos e crianças nunca foram tão difíceis. Quase toda semana, apresentam pais enleados, desnorteados, demissionários ou docentes estressados, esgotados, desiludidos e exibem relações conflitantes e até violentas entre adultos e crianças. Atribuem-se inúmeros males à deterioração da relação entre educadores e crianças e mais particularmente ao enfraquecimento da autoridade dos pais e docentes: violências, delinquência, fracassos escolares etc. Para alguns, os problemas devem-se à situação difícil dos pais. Para outros, entretanto, os problemas estariam diretamente vinculados ao comportamento dos pais, quer porque não se opõem a seus filhos, o que faz com que estes não tolerem frustrações e se tornem insuportáveis; quer porque os consideram como iguais, como adultos.As práticas educativas dos pais: algumas tentativas para explicar suas diferenças
Um primeiro conjunto de pesquisas tentou explicar as práticas dos pais pelas estruturas familiais, procurando mostrar que existe uma relação entre a composição das famílias (número de filhos na família, ordem de nascimento e sexo), ou ainda outras características (separações, divórcio, viuvez, recomposição familiar), e as práticas educativas dos pais. Assim, pesquisadores acharam que o sexo da criança influencia os modos de educação, os pais sendo mais estritos com suas filhas que com seus filhos, ou ainda que o divórcio dos pais tem efeitos negativos sobre suas práticas.
Um segundo conjunto de trabalhos tentou explicar as práticas educativas dos pais pelo pertencimento social das famílias. Segundo eles, os pais de classe média tenderiam a manifestar mais controle de si quando de suas interações com a criança: chamam-na à razão, exercem uma disciplina dentro de limites claramente definidos, negociam com ela, recorrem a punições e recompensas que levam em conta as motivações da criança e fazem planos para seu êxito em longo prazo. Em contraste, os pais das classes populares seriam menos propensos a elaborar um projeto educativo para seus filhos e a dedicar tempo para explicar os motivos de suas exigências, e tenderiam a satisfazer seus caprichos e a puni-los sem muito se preocupar sobre a intenção por trás de seus atos.
As consequências das práticas socializadoras dos pais: uma questão controvertida
Também é preciso matizar os resultados das pesquisas sobre as consequências que as práticas educativas dos pais têm sobre os filhos. De modo geral, os trabalhos que enfocam as influências dos pais afirmam que suas condutas afetam a personalidade e outras características dos filhos. Alguns trabalhos, por exemplo, relacionaram os estilos educativos e o desenvolvimento da criança no plano de sua personalidade assim como no de suas relações com os outros. Assim, observou-se que o amor-próprio das crianças varia segundo os graus de autonomia e de apoio concedidos por seus pais: quanto mais o estilo parental se caracteriza por uma comunicação fraca e uma coerção e um controle vigorosos, mais o amor-próprio das crianças é frágil, e vice-versa.
A relação educativa deve também ser situada no contexto do conjunto das relações da criança, especificamente com os mais próximos, nas fronteiras da família, como os avôs por exemplo, os sogros, os meios-irmãos e meias-irmãs, os outros membros de uma família recomposta, ou a rede de parentesco.
O ponto de vista sobre as práticas educativas (o ponto de vista das crianças)
Numa entrevista com crianças de 11 e 12 anos a respeito de suas famílias e mais particularmente de suas expectativas com relação a seus pais. Quase todas têm uma ideia clara do que esperam de seus pais: antes de tudo, amor, apoio, escuta, compreensão, consolo, sem esquecer humor. Logo, as expectativas de ordem afetiva e emocional estão entre as de primeira importância. Também esperam uma “boa educação”, isto é, que seus pais lhes indiquem como se comportar, como se controlar, tudo o que faz com que os outros possam dizer: “esta criança é bem-educada”, e que lhes ensinam regras de interação com os outros, assim como padrões de autodomínio, ou seja, como se controlar. Algumas esperam de seus pais um estímulo à autonomia, um preparo para quando se tornarem “mais velhas”. Outras gostariam que seus pais lhes dessem uma orientação transmitindo-lhes valores como o amor, a escuta dos outros, a honestidade etc. O apoio escolar e o apoio material também são mencionados.
A experiência da autonomia
A autonomia subjetiva e factual das crianças apresenta algumas variações segundo o sexo, a composição da família ou o pertencimento social de seus pais. Assim, por exemplo, os filhos de pais operários têm uma representação subjetiva da autonomia menos forte que a dos filhos de pais de classe média ou executivos superiores e patrões. Em termos de ação, mais particularmente das atividades que implicam uma autonomia concreta (ir sozinho à cidade, cuidar de uma criança pequena, fazer suas lições sem pressão dos pais, trabalhar por dinheiro, dormir na casa de colegas), as diferenças segundo o meio ou o sexo variam em função das atividades e do tipo de responsabilidades implicadas. Por exemplo, cuidar de crianças menores é uma tarefa mais frequente entre crianças cujos pais são operários ou têm uma formação pouco elevada, ao passo que ir dormir na casa de um colega é uma atividade mais frequente entre as crianças de classe média.
Segundo elas, “enfrentar as dificuldades leva à autonomia; as dificuldades obrigam a tomar decisões; sem dificuldades, a gente deixa rolar; os erros cometidos permitem aprender para a próxima vez; sem dificuldades, não precisa ser independente”. Elas desejam mais autonomia, mas têm sentimentos ambivalentes; elas são sensíveis ao que as espera em sua vida de adulto e várias têm medo de crescer. De saída, sua experiência está imersa na ambivalência que caracteriza os indivíduos contemporâneos, ambivalência decorrente de uma busca paradoxal de autonomia e apoio, ao mesmo tempo, que marca sensivelmente sua própria atitude com relação à autonomia.
 Aula 5 – as culturas da infância nas encruzilhadas da 2a modernidade 
A análise da morfologia, da sintaxe e da semântica das culturas da infância na 2° modernidade constitui um objeto central na compreensão das mudanças estruturais contemporâneas. Conhecer “nossas” crianças é decisivo para a revelação da sociedade, como um todo, nas suas contradições e complexidade. Mas é também a condição necessária para a construção de políticas integradas para a infância, capazes de reforçar e garantir os direitos das crianças e a sua inserção plena na cidadania ativa.
As crianças, todas as crianças, transportam o peso da sociedade que os adultos lhe legam, mas fazendo-o com a leveza da renovação e o sentido de que tudo é de novo possível. É por isso que o lugar da infância é um entre-lugar o espaço intersticial entre dois modos – o que é consignado pelos adultos e que é reinventado nos mundos de vida das crianças – e entre dois tempos – o passado e o futuro. 
A institucionalização moderna da Infância
A ideia é uma ideia moderna. Remetidas para o limbo das existências meramente potenciais, durante grande parte da idade da Idade Média, as crianças foram considerados como meros seres biológicos, sem estatuto social ne autonomia existencial. Daí que, paradoxalmente, apesar de ter havido sempre crianças, seres biológicos de geração jovem, nem sempre houve infância, categoria social de estatuto próprio. 
Com efeito, a institucionalização da infância no início da modernidade realizou-se na conjugação de vários fatores.
O primeiro, e decisivo, foi a criação de instancias públicas de socialização. Especialmente através da institucionalização da escola pública e da sua expansão como escola de massas. A escola está associada à construção social da infância.
A criação da escola, o recentramento do núcleo familiar no cuidado dos filhos a produção de disciplinas e saberes periciais, a promoção da administração simbólica da infância – radicalizam-se no final do século XX, a ponto de potenciarem criticamente todos os seus efeitos. Assim, a escola expandiu-se e universalizou-se, as famílias reordenaram os seus dispositivos de apoio e controle infantil, os saberes disciplinares sobre a criança adquiriram autonomia e desenvolveram-se exponencialmente, e a administração simbólica adquiriu novos instrumentos reguladores com a Convenção dos Direitos da Criança e com normas de agências internacionais configuradoras de uma infância global no plano normativo.
Reinstitucionalização na 2a modernidade
Um aspecto nuclear na reinstitucionalização da infância é a reentrada (ou, pelo menos, a visibilização de algo que nunca deixou de acontecer, mas estava escondido) da infância na esfera econômica. As crianças participam na economia pelo lado da produção, especialmente como incremento do trabalho infantil nos países periféricos e semiperiféricos, por efeito da deslocalização da indústria manufatureira com incorporação de reduzida componente tecnológica e em diversas áreas dos países centrais, no que se convencionou designar por “piores formas de trabalho infantil”. Mas também entraram pelo lado do marketing, com a utilização das crianças na promoção de produtos da moda ou na publicidade e ainda pelo lado do consumo, como segmento específico, extenso e incremencialmente importante de um mercado de produtos para a criança. As crianças “contam” na economia e esse é um lado paradoxal do processo de reinstitucionalização, dado que, como vimos, a modernidade caracterizou-se progressivamente pela exclusão das crianças do espaço estrutural da produção.
A escola, por seu turno, de suposta instância de socialização para a coesão social, visibiliza-se como o palco das trocas e disputas culturais, que sendo inerentes a uma sociedade cosmopolita e de circulação facilita das populações, não deixam por vezes de ser violentas. A multiculturalidade contemporânea não se faz sem a disputa das instâncias que procuram estabilizar princípios de justificação educacional. Sobretudo, a escola da 2a modernidade, de massas, heterogênea e multicultural, radicalizou o choque cultural entre a cultura escolar e as diversas culturas familiares de origem dos alunos de proveniência social e étnica diferenciadas.
A família, por seu turno, desenvolve tensões reinstitucionalizadoras em torno de transformações estruturais crescentes. As transformações na estrutura familiar põem a descoberto o caráter mítico de algumas teses do senso comum que veem o núcleo familiar o espaço aproblemático e “natural” de proteção e promoção do desenvolvimento das crianças. Com efeito, este é um lugar problemático e crítico, onde tanto se encontra o afeto como a disfuncionalidade, o acolhimento como o maus-tratos. A vida institucionalizada das crianças, constitui-se como uma forma decisiva para a compreensão da infância na 2a modernidade, pela alteração que opera na centralidade do espaço doméstico.
Afinal, ainda há um lugar para a infância...
Consideramos que a 2a modernidade radicalizou as condições em que vive a infância moderna, mas não a dissolveu na cultura e no mundo dos adultos, nem tão pouco lhe retirou a identidade plural nem a autonomia de ação que nos permite falar de crianças como atores sociais. A infância está em processo de mudança, mas mantém-se como categoria social, com características próprias.
Essa identidade da infância reside, primordialmente, no seu estatuto social face aos direitos sociais – as crianças não têm capacidade jurídica de decisão autónoma, necessitam de proteção e tem uma responsabilidade social em parte depositada em quem exerce o poder paternal. Depois, essa identidade, reside ainda nos fatores sociais que impedem sobre as crianças e que condicionam profundamente as suas formas de existência: há estatisticamente mais crianças pobres que outro qualquer grupo geracional; a compulsividade de frequência de uma instituição escolar – a escola – apenas obriga as crianças; a imensa maioria das crianças não tem rendimentos econômicos próprios. A identidade das crianças é também a identidade cultural, isto é a capacidade de as crianças constituírem culturas não redutíveis totalmente às culturas dos adultos.
A gramática das culturas da infância 
As crianças portuguesas pertencem à cultura portuguesa mas contribuem ativamente para a construção permanente das culturas da infância. Nesse sentido há uma “universalidade” das culturas infantis que ultrapassa consideravelmente os limites da inserção cultural local de cada criança. Isso decorre de fato das crianças constituírem nas suas interações “ordens sociais instituintes”, que regem as relações de conflito e de cooperação, e que atualizam, de modo próprio, as posições sociais, de gênero, de etnia e de cultura que cada criança integra.
*Semântica – ou seja, a construção de significados autônomos e, a elaboração de processos de referenciação e significação próprios; por exemplo, o “era uma vez” de uma criança não tem uma denotação histórica e temporal, significando o passado, mas remete para uma temporalidade recursiva, continuamente convocada ao presente, de tal modo que “era uma vez” é sempre a vez em que é enunciada.
*Sintaxe – ou seja, a articulação dos elementos constitutivos da representação, que não se subordinam aos princípios da lógica formal, mas sustentam a possibilidade da contradição do princípio da identidade; o “então eu era o herói” da criança, exprime bem esta ideia de um ser que outra no que vê e projeta e, por isso, articula na ordem do discurso o real e o imaginário, o ser e o não ser, o estar e o devir, homologizados na sua dupla face.
*Morfologia – ou seja, a especificidade das formas que assumem os elementos constitutivos das culturas da infância: os jogos os brinquedos, os rituais, mas também os gestos e as palavras; o berlinde do jogo da criança não é apenas um objeto esférico, mas é a peça de jogo, a preciosa moeda de troca, o troféu que se obtém ou o artefato mágico que refrata a luz.
A interatividade: o mundo da criança é muito heterogêneo, ela está em contato com várias realidades diferentes, das quais vai aprendendo valores e estratégias que contribuem para a formação da sua identidade pessoal e social. Para isso contribuem a sua família, as relações escolares, as relações de pares, as relações comunitárias e as atividades sociais que desempenham, seja na escola ou na participação de tarefas familiares. Esta aprendizagem é eminentemente interativa; antes de tudo o mais, aas crianças aprendem com as outras crianças, nos espaços de partilha comum. Estabelecem-se dessa forma as culturas de pares, isto é, “um conjunto de atividades ou rotinas, artefatos valores e preocupações que as crianças produzem e partilham na interação com os seus pares”.
A ludicidade: constitui um traço fundamental das culturas infantis. Brincar não é exclusivo das crianças, é próprio do homem e uma das suas atividades sociais mais significativas. Porém, as crianças brincam, continua e abnegadamente. Contrariamente aos adultos, entre brincar e fazer as coisas sérias não há distinção, sendo o brincar muito do que as crianças fazem de mais sério.
A fantasia do real: “o mundo do faz de conta” faz parte da construção pela criança da sua visão do mundo e da atribuição do significado às coisas. No entanto, esta expressão “faz de conta” é algo inapropriada para referenciar o modo específico como as crianças transpõem o real imediato e o reconstroem criativamente pelo imaginário, seja importando situações e personagens fantasias para seu cotidiano, seja interpretando de modo fantasia os eventos e situações que ocorrem.
A reiteração: a não literalidade tem o seu complemento na não linearidade temporal. O tempo da criança é um tempo recursivo, continuamente, continuamente reinvestido de novas possibilidades, um tempo sem medida, capaz de ser sempre reiniciado e repetido. A criança constrói os seus fluxos de (inter)ação numa cadeia potencialmente infinita, na qual articula continuamente práticas ritualizadas, propostas de continuidade ou rupturas que se fazem e são logo suturadas.
 Aula 6 – História do Atendimento à Infância no Brasil
Descobrimento do Brasil e ação dos jesuítas
A primeira forma de atendimento às crianças no Brasil surgiu logo após o seu descobrimento com a chegada dos jesuítas. Os jesuítas tinham o objetivo de civilizar os índios através do cristianismo, mas encontraram bastante resistência com os índios adultos e voltaram-se para as crianças (curumins), que eram afastadas do convívio familiar e passavam a viver na Casa dos Muchachos, local onde aprendiam os hábitos da cultura europeia e eram catequizados. Ao fim da infância essas crianças saíam da Casa dos Muchachos e voltavam para a tribo ou perambulavam pelas cidades, já que muitos não conseguiam se readaptar à vida indígena. Podemospensar que essa prática deu origem à primeira população de rua de nosso país, já que não conseguiam retornar aos antigos hábitos indígenas e também não conseguiam se inserir na sociedade, vagando pelas cidades em busca de um lugar para morar e trabalhar.
Período Colonial (1530 até 1822)
Os filhos de escravos eram incorporados ao trabalho a partir de cinco anos e com 12 anos já eram considerados adultos, inclusive sexualmente usados para reproduzir e aumentar o número de escravos. As crianças brancas em muitas famílias eram cuidadas por amas. A partir de seis anos, frequentavam os colégios religiosos, utilizavam trajes adultos e recebiam castigos.
Nessa época, foi criada a Santa Casa de Misericórdia, que cuidava, a princípio, dos doentes, mas logo começou a receber crianças que eram abandonadas em um dispositivo denominado “roda”, onde quem recebia a criança não conseguia identificar quem a estava abandonando. No séc. XVIII muitas crianças abandonadas na roda morriam devido à falta de condições mínimas de higiene e saneamento na Santa Casa. As que conseguiam sobreviver eram entregues a “criadeiras externas” (mulheres que recebiam uma quantia do governo para cuidar das crianças) até os nove anos. A partir de então eram encaminhadas ao trabalho em fazendas ou na Marinha.
Brasil Independente (1822 até 1889) 
Como uma das consequências da independência do Brasil, temos o inchaço das cidades e a queda da qualidade de vida, levando ao aumento da criminalidade. Adultos e crianças infratoras eram encaminhadas ao mesmo local. Somente em 1861, surgiu o primeiro Instituto de Menores, para onde passaram a ser encaminhadas as crianças infratoras. O Instituto de Menores tinha o objetivo de disciplinar os corpos (uso de castigos corporais) para disciplinar a mente. Com o passar do tempo eram encaminhadas a essa instituição todas as crianças em situação de rua, sendo ela infratora ou não. O Estado passou a tutelar a criança pobre como se fosse criminosa e passou a ensinar-lhe ofícios. As crianças eram separadas por idade e grau de aprendizagem e, posteriormente, encaminhadas à escola de aprendizes de marinheiro.
Brasil República (1889 a 1930)
O Brasil República herda os problemas sociais do Império. Em relação à infância, o Movimento Higienista clamava por uma assistência à infância nos internatos devido às altas taxas de mortalidade infantil.
Os juristas começavam a criar as primeiras leis para os “menores” no início do século XX. Essas leis visavam regular a vida e a saúde dos recém-nascidos, os serviços prestados pelas amas de leite, assim como velar pelos menores infratores ou em situação de trabalho, amparar as crianças pobres, doentes, deficientes, maltratadas e abandonadas; criar instituições como maternidades, creches e jardins de infância.
Estado Novo (Era Vargas – 1930 até 1945)
Durante seu governo também houve uma forte influência nazifascista vinda da Europa, e o Brasil tentou buscar alternativas para o atendimento à infância como forma de “aperfeiçoar a raça”. Acreditava-se que as condutas antissociais eram adquiridas hereditariamente e o meio social faria com que se instalassem ou não. Ou seja, acreditava-se que, se a criança nascesse com uma herança genética para criminalidade e vivesse em um ambiente que favorecesse a marginalidade, ela consequentemente seria um marginal. Como uma tentativa de eliminar uma possível convivência das crianças com a marginalidade, foi criado em 1941 o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), que era um conjunto de normas e regras para instituições públicas e particulares que atendiam crianças. Veiculava-se inicialmente que as instituições regidas pelo SAM eram a única possibilidade para uma boa educação para a criança pobre, e a população carente recebia a orientação para que levassem seus filhos para essas instituições. Mas na verdade tornou-se uma fábrica de delinquentes, na medida em que a criança pobre não infratora convivia com menores infratores. O que tanto se temia inicialmente, que era essa convivência com a marginalidade, acabou acontecendo dentro das próprias instituições.
Ditadura militar (1964-1985)
Em relação à infância, durante o período da ditadura militar, o Estado considerava o menor como “objeto de segurança nacional”. O SAM foi extinto e criada a funabem (Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor), que tinha objetivos de integração da criança na sociedade, ou seja, durante a estada na instituição a criança receberia um preparo para estar no convívio social quando retornasse a sua família, inclusive com um preparo profissional, mas na verdade só mudaram os títulos, o atendimento à criança permaneceu da mesma forma: o assistencialista.
Depois das pressões vindas de organizações não governamentais (Pastoral do Menor, entre outras), em 1989 surge uma legislação para a infância: Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A funabem é extinta e são mais focalizados os direitos da criança e do adolescente ao invés dos deveres, na medida em que passam a ser vistos como sujeitos de direitos. 
A História da Creche no Brasil 
Durante muitos séculos, o cuidado e a educação da criança eram tarefas familiares, principalmente das mulheres. A criança era considerada um adulto em miniatura e logo que superava a fase de dependência de necessidades físicas passava a participar das atividades cotidianas dos adultos e era integrada a esse meio social como um adulto. Apesar do contexto doméstico ser o mais utilizado para a educação das crianças, alguns espaços alternativos foram sendo criados ao longo da história para amparar as crianças em situações desfavoráveis, como é o caso da “roda”. A responsabilidade por esse acolhimento era realizada em geral por entidades religiosas e eram sempre permeadas pelas ideias de abandono e pobreza. Essas ideias geraram concepções negativas acerca das instituições de educação infantil, acentuando sempre um favorecimento da família como a matriz educativa principal.
A creche surgiu na segunda metade do século XIX com a finalidade de amparar as classes populares e liberar a mão de obra pobre feminina. As primeiras creches atendiam ao apelo do movimento higienista, difundindo os preceitos higiênicos entre os menos favorecidos economicamente, e o das mulheres burguesas, na medida em que abrigavam os filhos das empregadas domésticas. Essas iniciativas de proteção à infância estavam relacionadas ao combate das altas de taxas de mortalidade infantil e atribuíam à família a culpa por essa situação. Com isso, a creche foi ganhando a conotação que em parte é encontrada até hoje, como lugar da carência e do abandono. Muitas mães ainda vivem com ambivalência o fato de deixar o filho na creche para continuarem trabalhando.
No final do século XIX é trazido ao Brasil, o jardim de infância. Alguns o criticavam porque consideravam mais um local de mera guarda das crianças. Os Jardins de Infância eram considerados prejudiciais porque tiravam a criança do convívio familiar precocemente. Outros os defendiam por acreditarem que trariam benefícios ao desenvolvimento da criança, já se vislumbrando um aspecto pedagógico influenciado pelo Movimento das Escolas Novas.
O movimento operário nas décadas de 1920 e 1930, liderado principalmente por imigrantes europeus, reivindicava melhores condições de trabalho e locais para o atendimento das crianças durante o horário de expediente. A necessidade de ajuda nos cuidados com os filhos, algumas creches próximas às fábricas foram criadas pelos empresários e usadas nos ajustes das relações de trabalho. A partir de 1923, foi regulamentada a lei que concedia o direito às instalações de creches e salas de amamentação próximas ao ambiente de trabalho.
A instituição de educação infantil deixa de ser pensada como uma instituição assistencialista e começa a ser pensada como um ambiente estimulador, que proporciona bem-estar e condições necessárias para o desenvolvimento infantil, ao menos nas instituições que recebiam as crianças das classes mais favorecidas. Com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacionalaprovada em 1961, o atendimento a crianças menores de sete anos passa a ser incluído no sistema de ensino, ainda que com a finalidade de uma educação pré-escolar, ou seja, não com objetivos próprios, mas sim como um simples preparo para o ensino primário.
Assim, para a população de baixa renda, foram sendo criadas propostas de trabalho para as instituições de educação infantil (creches e pré-escolas) com caráter compensatório, baseados na teoria da privação cultural. As propostas visavam a uma estimulação precoce e ao preparo para a alfabetização.

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