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Nietzsche e sua filosofia Por Bruno Carrasco, psicoterapeuta existencial. Introdução A obra de Nietzsche não é de simples compreensão, por ser fragmentária, e, em grande parte escrita sob a forma de aforismos, metáforas e ironia. Os termos que ele aborda, como “além-do-homem”, “moral do rebanho”, “apolíneo e dionisíaco”, entre outros, são abordados em muitos de seus livros, e não apenas num deles. Sendo assim, sua obra possibilita diversas interpretações. Para esta apresentação utilizo como referência algumas obras de Nietzsche, como “O Nascimento da Tragédia”, “Sobre Verdade e Mentira no sentido Extramoral”, “Humano, Demasiado Humano”, “Assim Falou Zaratustra”, “Genealogia da Moral” e “Ecce Homo”. Além disso, alguns comentadores de Nietzsche, como os brasileiros Oswaldo Giacóia Jr. e Scarlett Marton, o francês Jean Granier e o australiano Ashley Woodward. Quem foi Nietzsche? Friedrich Wilhelm Nietzsche (1844-1900) foi um filólogo, filósofo, crítico cultural, poeta e compositor, nascido na atual Alemanha. Ele criticou a religião, a moral, a tradição filosófica, em forma de metáfora, ironia e aforismos. Sua filosofia trata sobre a dicotomia Apolo/Dionísio, a vontade de potência, a "morte de Deus", o Além-Homem e o eterno retorno. Sua filosofia central é a afirmação da vida, que questiona qualquer doutrina que diminua nossas potências existenciais. Seu questionamento sobre os valores e a objetividade da "verdade" influenciaram a filosofia continental: o existencialismo, pós-modernismo e pós-estruturalismo. Suas ideias de superação individual e transcendência tiveram um impacto profundo sobre pensadores do final do século XIX e início do século XX. Biografia Nasceu em 15 de outubro de 1844 no vilarejo de Röcken, no reino da Prússia, próximo a Leipzig, Alemanha. Seu pai era culto e delicado, seus dois avós eram pastores protestantes. Aos 5 anos seu pai e seu irmão faleceram, ele passou a ser educado por sua mãe. Sua família se mudou para Naumburg, com sua mãe, tias e avó. Sua mãe tinha sólidas qualidades morais e um devotamento exemplar. Nietzsche era um aluno modelo, dócil e leal, chamado na escola de “pequeno pastor”. Aos 14 anos ganhou uma bolsa de estudos na escola Pforta em Naumburg. A partir de suas leituras ele começou a se afastar do cristianismo, se interessando pelo estudo da antiguidade clássica grega e latina. Jovem Nietzsche Nietzsche era excelente aluno em grego e em estudos bíblicos, alemão e latim. Nesta época seus autores favoritos eram Platão (427 - 347 a.C.) e Ésquilo (525 - 455 a.C.). Terminado o curso em Pforta, partiu para Bonn para estudar Teologia, porém logo abandonou a Teologia e foi estudar Filologia em Leipzig. Aos 25 anos foi nomeado professor de filologia na Basiléia, na Suíça, onde permaneceu por dez anos. Filologia é o estudo da linguagem, incluindo literatura, história e linguística. Além do estudo da história das formas literárias, estuda também as instituições do pensamento. Ele passou a se interessar por filosofia depois de ler Arthur Schopenhauer, o livro “O mundo como vontade e representação”, onde se interessou pelo seu ateísmo e sua valoração da experiência estética. Nietzsche aos 17 anos (1861) Influências em sua filosofia ● Heráclito de Éfeso (535-435 a.C.) ● Protágoras de Abdera (480-415 a.C.) ● Epícuro de Samos (341-270 a.C.) ● Michel de Montaigne (1533-1592) ● Baruch Espinoza (1632-1677) ● Immanuel Kant (1724-1804) ● Wolfgang von Goethe (1749-1832) ● Friedrich Schiller (1759-1805) ● Max Stirner (1806-1856) ● Arthur Schopenhauer (1788-1860) ● Fiódor Dostoiévski (1821-1881) Nietzsche e a Filosofia Filosofia de Nietzsche “Nietzsche examinou o significado das vastas mudanças produzidas na cultura desde o Iluminismo no âmbito dos valores. Costuma-se dividir a filosofia de Nietzsche em três períodos, nos quais enquadram-se seus principais escritos da seguinte maneira: o período “inicial” (O nascimento da tragédia; Considerações extemporâneas), o período “intermediário” (Humano, demasiado humano; Aurora; A gaia ciência) e o período “tardio” (Assim falava Zaratustra; Além do bem e do mal; O crepúsculo dos ídolos; O anticristo; O Caso Wagner; Ecce homo).” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Aforismos Aforismo é um gênero textual que condensa com precisão complexos conceitos filosóficos. Um aforismo se caracteriza por sua brevidade e concisão, contendo máximas que traduzem amplos conceitos por meio de pequenas sentenças. “Um aforismo honestamente modelado e cunhado não pode “decifrar-se” à primeira leitura. Ao contrário, começa-se unicamente agora a interpretar-se para o qual é necessário uma arte de interpretação. (...) Na verdade, para elevar assim a leitura à dignidade de “arte” é mister, antes de mais nada, possuir uma faculdade hoje muito esquecida, uma faculdade que exige qualidades de vaca, e absolutamente não as de um homem “moderno”: a de ruminar…” (Nietzsche, Prefácio da Genealogia da Moral, 1887) Filosofia Crítica “Nietzsche empreende uma crítica radical das tendências culturais dominantes em seu tempo, caracterizados por uma confiança ingênua nas ideias de evolução e progresso lógico ou natural, no curso dos quais a humanidade teria alcançado o estágio de desenvolvimento em que estaria em condições de, humanizando a natureza e racionalizando a sociedade, aproximar-se do ideal de felicidade universal. Opondo-se ao mecanicismo e a todo o positivismo que é almeja explicar os fenômenos da natureza a partir de um conjunto de leis gerais. Nietzsche contesta até mesmo a legitimidade de pretender obter um conhecimento objetivo dos fenômenos da natureza.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Metamorfose e interpretação Sua filosofia propõe uma nova maneira de se filosofar e de compreender o mundo, reconhecendo a mudança, o devir, a multiplicidade, o contraste, a contradição constante presente nas relações que estabelecemos com os outros. “Uma das intuições mais caras que ele aplaude: a intuição de que não existem substâncias estanques e inertes, e que tudo é uma perpétua metamorfose.” (Granier, Jean. Nietzsche. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009) “Nietzsche recusa de antemão todos os rótulos habituais e coloca o problema do conhecimento num terreno novo e muito promissor: o do pensamento interpretativo!” (Granier, Jean. Nietzsche. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009) O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música Aos 27 anos, Nietzsche publicou “O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música”, onde trata sobre as relações entre a música e a tragédia grega, considerado o primeiro gênero teatral, tendo sido muito encenado durante a Grécia Antiga. As tragédias apresentavam histórias trágicas e dramáticas, derivadas das paixões humanas, envolvendo deuses, semideuses e heróis mitológicos. Todas as tragédias possuíam uma tensão permanente e um final infeliz e trágico, esse gênero transmitia nas pessoas as sensações vividas pelas personagens, num processo tal como uma "catarse", onde o público se envolvia na peça como uma forma de purificação ou purgação dos sentimentos, descarregando os sentimentos e emoções provocados. Alguns termos da filosofia de Nietzsche Apolíneo e Dionisíaco “Apolo representa o lado luminoso da existência, o impulso para gerar as formas puras, a majestade dos traços, a precisão das linhas e limites, a nobreza das figuras. Ele é o Deus do princípio de individuação, da sobriedade, da temperança, da justa medida, o Deus do sonho e das belas visões. Dionísio, por sua vez, simboliza o fundo tenebroso e informe, a desmedida, a destruição de toda figura determinada e a transgressãode todos os limites, o êxtase da embriaguez. Apolo é o patrono das artes figurativas, Dionísio é o Deus da música. A tragédia é a síntese dessas forças antitéticas. Sem destruição, não há criação; sem trevas, não há luz; sem barbárie e crueldade, não há beleza nem cultura.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Apolíneo e Dionisíaco “Nietzsche argumenta que a tragédia combina dois tipos de estética que são usualmente mantidos em separado nas outras artes: o apolíneo e o dionisíaco. Apolo é o deus da beleza; Nietzsche o associava ao sonho, harmonia, forma e artes plásticas (como a escultura). Dionísio é o deus do vinho; Nietzsche o associava à intoxicação, desarmonia, ausência de forma, sublimidade e música. Nietzsche considera a combinação de ambas as estéticas na tragédia como a forma ideal de arte, uma forma que mais bem nos permite lidar com a vida e afirmá-la.” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Críticas à Sócrates Segundo Nietzsche, Sócrates foi o responsável por defender o mundo abstrato do pensamento. Para ele, a tragédia grega vivia o equilíbrio entre Apolo e Dioníso, porém foi invadida pelo racionalismo sob influência “decadente” de Sócrates Apolo é o deus da clareza, da ordem e da harmonia, enquanto que Dioniso é o deus da exuberância, da desordem e da música. Segundo Nietzsche o logos socráticos aniquilou a força criadora da filosofia. Críticas à Sócrates “O surgimento da escola socrática, com extrema valorização do pensamento lógico e da dialética, representaria não um progresso em relação a Grécia pré-socrática, porém o contrário disso. Sócrates e seus contemporâneos já não estaria mais à altura da experiência trágica sobre o mundo, não conseguindo suportar o racionalmente incompreensível - o absurdo da existência. Para poder viver, o homem teórico buscar refúgio na mesma supervisora que está na raiz da ciência moderna; isto é, ele se nutre no otimismo metafísico que está na base da racionalidade dialética: a crença na impotência do logos científico. O otimismo teórico que considera a ciência um remédio universal, que cura a ferida eterna do existir.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Críticas à Sócrates “Nietzsche propõe que essa sabedoria artística foi “corrompida” pelo advento da filosofia na Grécia Antiga, exemplificada pela figura de Sócrates. Em uma palavra, Nietzsche argumenta que a estética trágica foi usurpada pelo ideal socrático de razão. O racionalismo socrático, no entanto, em nome de “ideais mais altos” que encarnam o racional e o bem, nega a realidade do irracional e do sofrimento, desvalorizando, por conseguinte, a vida conforme ela é vivida aqui e agora.” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Críticas ao Platonismo “Uma das primeiras e mais fundamentais tarefas que Nietzsche se atribui é a de refutar e destruir a metafísica platônica.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) “O pensamento metafísico, por conseguinte, decreta que a ambiguidade, as modificações, as misturas do mundo que recaem sob nossa experiência são aparências enganosas.” (Granier, Jean. Nietzsche. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009) Críticas ao Cristianismo “De acordo com ele, os valores supremos postulados pelo homem ocidental estão todos enraizados – e dela dependem – na interpretação “moral cristã” da vida. Nietzsche considera que nenhum dos sistemas existentes de valores seja independente desse paradigma, incluindo a filosofia, ciência, política, economia, história e arte. De acordo com Nietzsche, todos os valores supremos postulados pelas principais tradições do pensamento em todo o decorrer da história ocidental apoiaram-se em um tipo de divinação da natureza. A religião, a filosofia e até mesmo a ciência apoiaram-se em uma visão metafísica do mundo que é idêntica ou similar à postulação de um Deus que estrutura e controla o mundo.” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Moral do Rebanho X Moral dos Senhores “Moral do senhor: senhores são os tipos fortes, capazes de afirmar a si mesmos, lidar com a natureza trágica da vida e legislar sobre seus próprios valores morais. - Moral do escravo: escravos são os tipos fracos, que não conseguem lidar bem com o sofrimento e que, em compensação, desenvolvem uma crença em uma ordem moral do universo.” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) “Adivinha-se a receita dessa felicidade: a eliminação engenhosamente programada de tudo o que, na realidade, é fonte de conflitos, de lutas, de tensão - e, portanto, de superação. Trata-se de reduzir a existência humana a uma sonolência prazerosa e ininterrupta, a uma irresponsabilidade contente. Reconhece-se aí o ideal da “sociedade de consumo” moderna, versão técnica e publicitária do niilismo passivo.” (Granier, Jean. Nietzsche. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009) Morte de Deus “O anúncio, por Nietzsche, da morte de Deus significa o fim do modo tipicamente metafísico de pensar, na medida em que, para ele, o cristianismo, tanto como religião quanto como doutrina moral, constitui uma versão vulgarizada do platonismo, adaptada às necessidades e anseios de amplas massas populares. Para Nietzsche, a morte de Deus é uma expressão simbólica do desaparecimento desse horizonte metafísico, baseado na oposição entre aparência e realidade, verdade e falsidade, bem e mal. Isso significa que não podemos mais sustentar a crença num conhecimento objetivo, que ultrapasse a particularidade de nossos afetos. A morte de Deus implica, portanto, a possibilidade de colocar em questão a crença na origem divina e no valor absoluto da verdade.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Morte de Deus “Nietzsche sentencia não apenas a morte do Deus cristão (no sentido da morte da crença na existência de Deus), mas também a morte de todas as semelhantes explicações metafísicas sobre a vida.” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Críticas ao idealismo "Os homens inventaram o ideal para negar o real." (Nietzsche) "Nosso mundo é muito mais o incerto, o cambiante, o variável, o equívoco, um mundo perigoso talvez, certamente mais perigoso do que o simples, o imutável, o previsível, o fixo, tudo aquilo que os filósofos anteriores, herdeiros das necessidades do rebanho e das angústias do rebanho, honraram acima de tudo." (Nietzsche, em 'Vontade de Potência II') Críticas ao idealismo “Para Nietzsche, o mundo é um caos de vir-a-ser dinâmico; não há um ser estático, uma ordem permanente. Ele rejeita a ideia de que o mundo e a humanidade progridem em direção a algum tipo de objetivo, como sugerem as histórias dialéticas de Hegel e Marx ou o projeto do Iluminismo acerca da emancipação da humanidade. Nietzsche não vê a história como um progresso. Ele escreve que “o século XIX não representa um progresso em relação ao século XVI [...]. A ‘humanidade’ não avança” (VP 90). Para Nietzsche, o mundo do vir-a-ser não tem um objetivo. Como ele escreve, “o vir-a-ser não visa a nada e não atinge nada” (VP 12 (A)).” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Valores como criações humanas “Falta de sentido histórico é o defeito hereditário de todos os filósofos. Não querem aprender que o homem veio a ser, que até mesmo a faculdade do conhecimento veio a ser. Tudo veio a ser; não há fatos eternos: assim como não há verdades absolutas. - Portanto, o filosofar histórico é necessário de agora em diante e, com ele, a virtude da modéstia.” (Nietzsche, em “Humano, Demasiado Humano”) Bom e Mau "Todas as coisas"boas" foram noutro tempo más; todo o pecado original veio a ser virtude original. O casamento, por exemplo, era tido como um atentado contra a sociedade e pagava-se uma multa, por ter tido a imprudência de se apropriar de uma mulher. Os sentimentos doces, benévolos, conciliadores, compassivos, mais tarde vieram a ser os "valores por excelência"; por muito tempo se atraiu o desprezo e se envergonhava cada qual da brandura, como agora da dureza." (Friedrich Nietzsche, em "A Genealogia da Moral") “O que é bom? – Tudo o que eleva o sentimento de potência, vontade de potência, a potência mesma no homem. O que é mau? – Tudo o que vem da fraqueza O que é felicidade – O sentimento de que o poder cresce, que uma resistência foi superada.” (O Anticristo, Nietzsche) Genealogia da Moral “Nietzsche é o filósofo que ousa colocar em questão o valor dos valores. Sua preocupação consiste em trazer à luz as condições históricas das quais emergiram nossos supostos valores absolutos, colocando em dúvida a pretensa sacralidade de sua origem. A explicação de um fenômeno qualquer depende sempre da reconstituição dos momentos constitutivos de seu vir-a-ser, de tal maneira que o sentido atual desse fenômeno não pode ser obtido sem o conhecimento da série histórica de suas transformações e deslocamentos.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Pesquisa Genealógica “A pesquisa genealógica, entendamos esta como uma pesquisa cujo fim, refletindo de alguma maneira sobre a normatividade essencial da interpretação, é apreciar o valor dos valores assim produzidos; em suma, é fazer a crítica das valorações reinantes num determinado momento da história. Ela tem a adequada denominação de “genealogia” porque quer efetuar essa valoração remontando à origem dos atos normativos.” (Jean Granier, Nietzsche) “Chamo ‘moral’ um sistema de juízos de valor que está em relação com as condições da existência de um ser.” (Nietzsche, Vontade de Potência) Pesquisa Genealógica “A pesquisa genealógica se inicia pela observação e descrição rigorosa de uma tal “moral”, prossegue com a análise crítica de seu valor e discute sobretudo a natureza de sua influência, (...) e termina com a apreciação do valor da origem, sendo a moral em exame tratada como um conjunto de “sintomas” pelos quais julga-se o tipo de vida que os produziu.” (Jean Granier, Nietzsche) Afirmação do corpo “Nietzsche recupera o sentido de afirmação do corpo, de afirmação da vivência, e de afirmação dos sentidos. Mesmo, e em particular, como afirmação do sofrimento e da finitude. Como modo natural de potencialização da vida, e de promoção de uma superabundância de suas forças, pela afirmação da potência do retorno da vida. Essa perspectiva ética de afirmação do corpo e dos sentidos, de afirmação da vida, é que vai constituir, posteriormente, um fundamento básico das psicologias e das psicoterapias fenomenológico-existenciais.” (Afonso Fonseca, livro: "Para uma História das Psicologias e Psicoterapias Fenomenológico Existenciais") Além-do-homem “O Übermensch é fundamentalmente um afirmador e um criador. Ele ou ela é alguém que sobreviveu ao niilismo, afirmou a vida (ao lado do sofrimento) no nível mais radical exigido pelo eterno retorno e expresso por sua vontade de potência por meio da ativa criação de valores. O Übermensch é aquele que legisla sobre valores e cria uma visão do mundo por meio de interpretações ativas. (...) É uma constante superação de si mesmo, um constante empenho por crescimento e ainda mais abundância. Como um princípio para a transvaloração dos valores, portanto, o ideal nietzscheano do Übermensch ensina a autocriação, a criação de valores e a interpretação criativa do mundo, e instaura o Eu criador como um fim não a ser finalmente atingido, mas como algo a cuja direção devemos constantemente tender.” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Além-do-homem “O que não provoca minha morte, me torna mais forte.” (Nietzsche) “Não quero ser confundido - isso implica que eu próprio não me confunda.” (Nietzsche) “É preciso aprender a amar-se a si próprio com amor sadio, a fim de aprender a suportar-se a si mesmo e a não vaguear fora de si mesmo.” (Nietzsche) Além-do-homem “Eu vos ensino o além-do-homem. O homem é algo que deve ser superado. (...) Que é o macaco para o homem? Uma zombaria e uma dolorosa vergonha. E justamente isso é o que o homem deve ser para o além-do-homem: uma zombaria e uma dolorosa vergonha. O homem é uma corda estendida entre o animal e o além-do-homem — uma corda sobre o abismo. Um perigoso passar para o outro lado, um perigoso caminhar, um perigoso olhar para trás, um perigoso estremecer e parar. A grandeza do homem está em ser ele uma ponte, e não um fim: o que se pode amar no homem é que ele é uma passagem e um crepúsculo.” (Nietzsche, Friedrich. Assim Falou Zaratustra, 1884) Vontade de Potência “A vontade de potência é o desejo por mais força, mais abundância; ela é o desejo por expansão e crescimento. A vontade de potência manifesta-se também como uma superação de si.” (Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016.) Transmutação dos Valores “Mutação dos valores - essa é a mutação daqueles que criam. Sempre aniquila, quem quer ser um criador.” (Nietzsche, Assim Falou Zaratustra) “Agora entra em jogo a vontade de potência afirmativa, aquela que, optando pela vida contra o nada, decide criar valores em vez de se lamentar servilmente pela morte de Deus.” (Granier, Jean. Nietzsche. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009) Verdade e mentira “A verdade e a mentira são construções que decorrem da vida no rebanho e da linguagem que lhe corresponde. O homem do rebanho chama de verdade aquilo que o conserva no rebanho e chama de mentira aquilo que o ameaça ou exclui do rebanho. (...) Portanto, em primeiro lugar, a verdade é a verdade do rebanho.” (Nietzsche, Vontade de Potência) “Todo conhecimento é inevitavelmente guiado por interesses e condicionamentos subjetivos, ideológicos; o conhecimento resulta da projeção de nossos impulsos e anseios, razão pela qual Nietzsche considera sempre determinado por certa perspectiva, seja individual, seja sócio culturalmente determinada.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Verdade “O que é uma palavra? A figuração de um estímulo nervoso em sons. Acreditamos saber algo das coisas mesmas, se falamos de árvores, cores, neve e flores, e no entanto não possuímos nada mais do que metáforas das coisas, que de nenhum modo correspondem às entidades de origem. Todo conceito nasce por igualação do não-igual. O conceito é formado pelo arbitrário abandono das diferenças individuais, por esquecer-se do que é distintivo, e desperta então a representação. A desconsideração do individual e efetivo nos dá o conceito.” (Nietzsche, Sobre Verdade e Mentira no sentido extramoral) Verdade “O que é a verdade, portanto? Um batalhão móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, enfim, uma soma de relações humanas, que foram enfatizadas poética e retoricamente, transpostas, enfeitadas, e que, após longo uso, parecem a um povo sólidas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões, das quais se esqueceu que o são, metáforas que se tornaram gastas e sem força sensível, moedas que perderam sua efígie e agora só entram em consideração como metal, não mais como moedas.” (Nietzsche, Sobre Verdade e Mentira no sentido extramoral) Conhecimento “O conhecimento é sempre pluralista, e a multiplicação dos “pontos de vista” - o “perspectivismo”, no vocabulário de Nietzsche - proíbe a totalização que levaria aotriunfo de uma interpretação única. Nietzsche não se cansa de guerrear contra o fantasma da totalidade. (...) Compreender é valorar, em outros termos é organizar o mundo segundo o perspectivismo dos valores pelos quais um ser exprime a singularidade de seu engajamento existencial.” (Granier, Jean. Nietzsche. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009) Conceito de “verdade” "Todo conceito surge da igualação de coisas desiguais: exatamente como é certo que nenhuma folha é totalmente idêntica a outra, do mesmo modo é certo que o conceito ‘folha’ é formado pela desconsideração arbitrária dessas diferenças." (Friedrich Nietzsche, em "Sobre Verdade e Mentira no Sentido Extra-Moral".) "Querer a verdade é confessar-se incapaz de a criar." (Nietzsche) “Nietzsche se opõe a supressão das diferenças, à padronização de valores que, sob o pretexto de universalidade, encobre, de fato, a imposição totalitária de interesses particulares; por isso, ele é também um opositor da igualdade entendida como uniformidade.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Saúde e Doença “Não existe uma saúde em si, e todas as tentativas de definir tal coisa fracassaram miseravelmente. Depende do seu objetivo, do seu horizonte, de suas forças, de seus impulsos, seus erros e, sobretudo, dos ideais e fantasias de sua alma, determinar o que deve significar saúde também para seu corpo. Assim, há inúmeras saúdes do corpo; e quanto mais deixarmos que o indivíduo particular e incomparável erga a sua cabeça, quanto mais esquecermos o dogma da "igualdade dos homens", tanto mais nossos médicos terão de abandonar o conceito de uma saúde normal e curso normal da doença. (...) Enfim, permaneceria aberta a grande questão de saber se podemos prescindir da doença, até para o desenvolvimento de nossa virtude, e se a nossa avidez de conhecimento e autoconhecimento não necessitaria tanto da alma doente quanto da sadia; em suma, se a exclusiva vontade de saúde não seria um preconceito, uma covardia e talvez um quê de refinado barbarismo e retrocesso.” (A Saúde da Alma, Friedrich Nietzche, em "A Gaia Ciência") Saúde e doença “É preciso ter um caos dentro de si para dar à luz uma estrela cintilante.” (Nietzsche) “Os doentes e os fracos têm mais espírito, são mais móveis, mais variados, mais divertidos - mais maldosos [...]. Os doentes e os fracos têm em si uma espécie de fascínio. São mais interessantes do que as pessoas saudáveis; o louco e o sano - as duas espécies de homens mais interessantes - e, aparentado a eles, o ‘gênio’” (Nietzsche, Vontade de Potência II) Eterno Retorno “Não se trata de mera aceitação resignada dos acontecimentos do destino, mas de afirmação incondicional que aceita e bendiz cada instante vivido. Por meio desse ensinamento, o homem deve aprender a agir como se a mais ínfima de suas ações devesse se repetir eternamente, de maneira a dar à sua própria existência a bela forma da obra de arte O eterno retorno é a lição que imprime ao instante o selo da eternidade.” (Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000) Referências Bibliográficas ● Giacoia Júnior, Oswaldo. Nietzsche. São Paulo: Publifolha, 2000. ● Granier, Jean. Nietzsche. Porto Alegre: L&PM, 2009. ● Marton, Scarlett. O Pensamento Vivo de Nietzsche. Martin Claret: São Paulo, 1985. ● Nietzsche, Friedrich Willhelm. Obras incompletas. Abril Cultural: São Paulo, 1983. ● Nietzsche, Friedrich. A Genealogia da Moral. Escala, 2013. ● Nietzsche, Friedrich. Assim Falou Zaratustra. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. ● Nietzsche, Friedrich. Ecce Homo. Porto Alegre: L&PM, 2003. ● Nietzsche, Friedrich. Humano, Demasiado Humano. Companhia das Letras, 2005. ● NIETZSCHE, Friedrich. Vontade de Poder. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008. ● Woodward, Ashley. Nietzscheanismo. Petrópolis: Vozes, 2016. EX-ISTO Ex-isto é um espaço online destinado ao estudo, pesquisa e divulgação do existencialismo e sua relação com a psicologia, filosofia, psicoterapia, fenomenologia, literatura e artes. Tem o intuito de compartilhar conteúdos que possibilitem uma compreensão sobre os temas existenciais, por meio de uma linguagem acessível e didática, possibilitando reflexões sobre a existência humana e suas possibilidades. Por Bruno Carrasco, psicoterapeuta graduado em psicologia, licenciado em filosofia e pedagogia, pós-graduado em ensino de filosofia, especializado em psicoterapia fenomenológico existencial e arteterapia. ex-isto existencialismo, psicologia e filosofia www.ex-isto.site www.fb.com/existosendo www.youtube.com/existo
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