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CONTRATOS - INTRODUÇÃO A TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

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DIREITO CIVIL III - CONTRATOS 
PROF. DANIEL PAIVA 
 
UNIDADE I – INTRODUÇÃO À TEORIA GERAL DOS CONTRATOS 
 
1. CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS: 
 
A palavra “contractus” significa unir, contrair. Contudo, não era o único termo 
utilizado no Direito Romano para finalidades semelhantes. Existiam ainda a “convenção” e o “pacto”. 
 
No Direito Romano, convenção e pacto eram conceitos equivalentes e significavam o 
acordo de duas ou mais pessoas a respeito de um objeto determinado. O simples acordo, convenção 
ou pacto, porém, não bastava para criar uma obrigação juridicamente exigível. 
 
Para que se originasse determinada obrigação, havia a necessidade de observância a 
certas formalidades (solenidades), que se exteriorizavam a vista dos interessados. Essas solenidades 
davam força às convenções. Assim, cada uma dessas convenções, sob certas formalidades, 
constituía um contractus. 
 
Modernamente, a ideia de um contrato com predominância da “autonomia da 
vontade” (autonomia privada), em que as partes discutem livremente as suas condições em situação de 
igualdade, deve-se aos conceitos traçados para a figura do contrato nos Códigos francês e alemão. 
 
Tudo se modificou no direito moderno, pois qualquer acordo entre duas ou mais 
pessoas, que tenha por objeto uma relação jurídica, pode ser indiferentemente chamado de contrato 
ou convenção e, às vezes, de pacto, visto este termo ter perdido aquele significado técnico e rigoroso 
que lhe atribuía a linguagem jurídica romana. 
 
O jurista italiano Roberto de Ruggiero chega a afirmar que: “Assim a convenção, isto é, o 
acordo das vontades, torna-se sinônimo de contrato e o próprio contrato identifica-se assim com o consenso.” 
 
2. CONCEITO DE CONTRATO: 
 
Etimologicamente CONTRATO deriva de “contractus” (unir, contrair). Já a doutrina 
costuma conceituar contrato como: espécie de negócio jurídico resultante de um acordo de 
vontades que produz efeitos obrigacionais entre as partes. 
 
Deste conceito, podemos destacar alguns aspectos importantes, tais como: 
 
O contrato é uma espécie de negócio jurídico1, que depende, para a sua formação, 
da participação de pelo menos duas partes (afinal ninguém pode ser credor e devedor de si mesmo). 
 
O contrato exige ainda um consenso, um acordo de vontades. É esse consenso 
que vai formar o contrato, principalmente se o contrato for verbal. O consenso é entre pelo menos 
duas partes. Por isso todo contrato é no mínimo bilateral quanto às partes. 
 
 
1 Negócio jurídico é o ato (manifestação de vontade), com propósito negocial, cujos efeitos jurídicos são os desejados pelas partes e permitidos por 
lei. É justamente nos negócios jurídicos em que o indivíduo pode manifestar sua autonomia privada (liberdade em contratar). 
 
 
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3. PRINCÍPIOS BÁSICOS DO DIREITO CONTRATUAL: 
 
O direito contratual rege-se por diversos princípios, alguns tradicionais e outros 
modernos. Os mais importantes são: 
 
Princípio da Autonomia Privada - Esse princípio assegura a ampla liberdade das partes em 
contratar e se revela de três formas: 
• Liberdade de contratar ou não, sob pena de vício de consentimento; 
• Liberdade de escolher o outro contratante; 
• Liberdade para fixar o conteúdo e abrangência do contrato; 
 
Ver: art. 425 C.C./2002 
 
Princípio da Supremacia da ordem pública - Leia-se função social do contrato. Embora exista a 
autonomia de vontade entre as partes, não é esta absoluta, já que deve respeitar a ordem e o interesse 
públicos, assim como os bons costumes. Com isso nenhum contrato poderá contrariar o interesse 
público de sorte que a autonomia da vontade esbarra no respeito a outros princípios maiores (que 
incumbe à sociedade preservar). 
 
Ver: art. 421 e parágrafo único do art.2035 C.C./2002 
 
Princípio da Boa-fé Objetiva (Ou da Boa-fé Contratual) - Ao estabelecer o princípio da boa-fé 
nas relações contratuais, o Código Civil implementou a concepção de que as condições do negócio 
jurídico (contrato), por suas cláusulas, devem revelar equilíbrio e justiça entre os contratantes. Isto é, a 
boa fé nos contratos significa a honestidade e justiça nas condições gerais estabelecidas. 
 
Ver: arts. 113 e 422 C.C./2002 
 
Princípio do Consensualismo (Ou do Informalismo Contratual) – Por este princípio, basta o 
acordo de vontades para o aperfeiçoamento do contrato, contrapondo-se à idéia do formalismo. 
Decorre este princípio da moderna concepção de que o contrato resulta do consenso, do acordo de 
vontades, independentemente da entrega da coisa. Assim, no direito brasileiro a forma contratual é, 
em regra, livre. As partes podem celebrar o contrato por escrito (por instrumento público ou particular), ou 
verbalmente, a não ser nos casos em que a lei, para dar maior segurança e seriedade ao negócio 
celebrado, exija um maior formalismo. 
 
Ver: arts. 107, 108 e 109 C.C./2002 
 
Princípio da obrigatoriedade da convenção contratual – A ordem jurídica concede a cada um a 
liberdade de contratar e definir os termos e objeto da avença, porém, uma vez delineado o acordo de 
vontades entre as partes, este deverá ser cumprido. Diziam os romanos pacta sunt servanda (o contrato 
deve ser cumprido), princípio que prevalece até hoje. Assim, celebrado o contrato, ele se torna intangível, 
não podendo ser modificado unilateralmente, por apenas uma das partes. Se uma das partes não 
cumprir o contrato, a parte prejudicada exigirá o cumprimento forçado, através do Juiz, ou uma 
indenização por perdas e danos. 
 
Ver: arts. 389, 475 C.C./2002 
 
OBSERVAÇÃO: Em contraposição ao referido rigor contratual, a lei permite, excepcionalmente, que o Juiz, nos 
contratos de longa execução e diante de um fato novo extraordinário, modifique o contrato para manter a igualdade 
entre as prestações (art 478 CC/2002). É a chamada Teoria da Imprevisão (ou cláusula rebus sic stantibus = 
revogável se insustentável) 
 
 
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Princípio da Relatividade dos efeitos do contrato – Os contratos são relativos às partes 
contratantes. Significa que o contrato (seus efeitos) só vincula aqueles que dele participam (res inter alios), 
quem não participa do ato de contratar, em regra, não pode ser compelido a cumpri-lo e nem pode 
exigir o seu cumprimento. Atualmente, este princípio comporta algumas exceções, de modo que, em 
certas hipóteses, terceiros não participantes do ato de contratar, podem eventualmente sofrer seus 
efeitos, vejamos por exemplo: 
 
• Os herdeiros pelas obrigações do falecido, até o limite da herança (art.1.997 CC/2002); 
• Na estipulação em favor de terceiro (art.436 CC/2002); 
• Nas convenções coletivas: no Direito do Trabalho e no Direito do Consumidor, onde se permite que sindicatos 
e associações negociem relações de trabalho e de consumo com os patrões e os fornecedores. (art.611 CLT; art. 
107 CDC); 
• No contrato com pessoa a declarar (art.467 CC/2002); 
• Na promessa de fato de terceiro (art.439 CC/2002). 
 
4. REGRAS GERAIS DE INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS: 
 
Nem sempre o instrumento de contrato traduz a exata vontade das partes. Muitas 
vezes a redação mostra-se obscura e ambígua, criando dificuldades para as partes contratantes na 
execução de suas obrigações contratuais. 
 
Por essa razão não só a lei deve ser interpretada, mas também os negócios jurídicos 
em geral (incluídos os contratos). 
 
Para tanto, o Código Civil estabelece uma série de regras que ajudará a resolver os 
problemas de interpretação dos contratos. Vejamos algumas destas regras: 
 
Busca da vontade real - Esta primeira regra é a mais importante, pois na alma do contrato está o 
consensualismo (acordo de vontades). A vontade real é a desejada pelas partes, que eventualmente pode 
ser diferente da manifestada (vontade declarada). O intérprete não pode ater-sesimplesmente ao sentido 
literal da declaração, porque lhe incumbe também o dever de diligência na precisão do conteúdo do 
negócio almejado pelas partes (vontade real). 
 
Ver: art. 112 CC/2002. 
 
Critério da Boa-fé - O critério da boa-fé deverá nortear toda e qualquer atividade negocial, exigindo 
que as partes se comportem de forma correta não só durante as tratativas, como também durante a 
formação do contrato e durante o seu cumprimento, e por que não dizer, também, quando de sua 
extinção. Dita boa-fé deve ser compreendida como instrumento de imposição de um padrão de 
comportamento leal, correto e honesto entre os contratantes. 
 
Ver: art. 113 (1ª parte) e art.422 CC/2002 
 
Senso médio - Além de agir com lealdade, as partes deverão atuar de acordo com os usos do local 
em que o ato negocial foi celebrado. O intérprete deve raciocinar como faria o homem médio, ou 
seja, a generalidade da população, sem extremos, sem radicalismos e de acordo com os costumes 
(senso médio). 
 
Ver: art. 113 (2ª parte) CC/2002. 
 
 
 
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Negócios jurídicos benéficos e da renúncia - Havendo dúvida tanto no negócio benéfico 
(exemplo: doação, empréstimo, fiança) como na renúncia, o intérprete deve se ater estritamente ao que foi 
declarado pelas partes. Destarte, por serem figuras jurídicas especiais (os negócios benéficos e a renúncia), 
qualquer interpretação relativa à extensão dos seus efeitos, deverá ser estrita, posto que não é 
possível inferir que a parte que beneficiou a outra ou que abriu mão do seu direito, o fez além do 
expressamente declarado no conteúdo negocial. 
 
Ver: art. 114 CC/2002 
 
Função social do Contrato – O contrato não mais se limita a uma leitura meramente individualista, 
sob a atual previsão legal civil-constitucional, a função social e a boa-fé passam a ser orientadores da 
relação obrigacional, bem como instrumentos efetivos de distribuição eqüitativa de direitos e deveres, 
almejada pela justiça contratual, consubstanciada na equivalência das prestações ou sacrifícios, bem 
como na proteção da confiança. 
 
Ver: art. 421 CC/2002 
 
Contratos de adesão – Os contratos de adesão exigem uma forma de interpretação especial e 
diferenciada em relação aos contratos paritários, tendo em vista as desigualdades das partes durante a 
gênese e execução daquele ato negocial (não é facultado aos aderentes o direito de discutir e de contribuir para 
determinar o conteúdo contratual). Sendo assim o Código Civil contempla normas jurídicas interpretativas 
voltadas justamente no sentido de se alcançar à igualdade entre as partes, ao proporcionar o 
equilíbrio necessário para justiça contratual. 
 
Ver: arts. 423 e 424 CC/2002 
 
OBSERVAÇÃO: Regras esparsas – além dos dispositivos já mencionados, há outros poucos artigos esparsos no 
Código Civil estabelecendo regras sobre a interpretação de determinados negócios, tais como: 
• O silêncio como manifestação de vontade (art.111); 
• A transação interpreta-se restritivamente (art.843); 
• A fiança não admite interpretação extensiva (art.819); 
• Em cláusula testamentária suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a 
observância da vontade do testador (art.1.899). 
 
 
QUESTÕES PARA REVISÃO DA UNIDADE 
 
 
01. Assinale a alternativa correta: 
a) A liberdade de forma é princípio contratual básico que não admite exceções, vez que assegurada pela autonomia da vontade. 
b) A boa-fé objetiva é princípio contratual com diversas diferentes funções, não se limitando à regra de interpretação do negócio 
jurídico. 
c) Pelo princípio da liberdade contratual autoriza-se a celebração de qualquer tipo de contrato, desde que sua escolha recaia sobre 
um dos tipos contratuais previstos no Código Civil. 
d) O princípio da "pacta sunt servanda" não admite exceções, uma vez que qualquer revisão do contrato atentaria contra o 
princípio da boa-fé, atualmente consagrado no art. 422 da lei 10.406/2002. 
 
02. A validade de um contrato (na qualidade de espécie de negócio jurídico), requer: 
a) instrumento público; 
b) pessoa física com mais de 18 anos; 
c) duas testemunhas; 
d) agente capaz, objeto lícito e forma prescrita em lei;

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